Acessibilidade / Reportar erro

Legislação de proteção animal para fins científicos e a não inclusão dos invertebrados - análise bioética

Animal protection legislation for scientific purposes and the non-inclusion of invertebrates a bioethical analysis

La legislación de protección animal para fines científicos y la no inclusión de los invertebrados - un análisis bioético

Resumos

A legislação que regulamenta o uso de animais para fins científicos nos países ocidentais segue princípios semelhantes, diferindo apenas em complexidade e extensão. Em geral, a lei protege apenas os vertebrados por considerá-los dotados da capacidade de ter experiências subjetivas como dor e sofrimento. Estudos utilizando parâmetros fisiológicos, neuroanatômicos e comportamentais evidenciam a senciência em invertebrados como cefalópodes e decápodes, dando-lhes o direito de proteção legal em alguns países. Sugerimos uma abordagem de senciência com requisitos elementares, não restritos apenas aos vertebrados. Fatores socioeconômicos e o especismo parecem influenciar a não atribuição de senciência aos invertebrados. Portanto, fica evidente a necessidade de uma análise bioética para fundamentar a inclusão desses animais na legislação. O "benefício da dúvida" é corroborado pelos argumentos da "continuidade evolutiva" e do "princípio da precaução". Nesse ínterim sugerimos que a utilização dos invertebrados para fins científicos seja criteriosa e responsável.

Invertebrados; Legislação; Senciência; Experimentação animal; Especismo


Animal welfare legislation in Western countries follows similar principles, differing mainly in complexity and scope. The legislation basically protects vertebrates, since it considers them capable of having subjective experiences such as pain and suffering. Studies utilizing physiological, neuroanatomical and behavioral parameters indicate that invertebrates like cephalopods and decapods are sentient beings, and thus eligible for legal protection in some countries. We suggest an approach to sentience that uses basic requirements, not restricted to vertebrates. Social and economic factors as well as species seem to influence the non-attribution of sentience to invertebrates. Thus, it is evident the need for a bioethical analysis to substantiate their inclusion in the legislation. The "benefit of doubt" is supported by the arguments of "evolutionary continuity" and "principle of precaution". In the mean time we suggest that the use of invertebrates for scientific purposes should be cautious and sensible.

Invertebrates; Legislation; Sentience; Animal experimentation; Specism


La legislación reguladora del uso de animales para fines científicos en países occidentales sigue principios similares, distinguiéndose en complejidad y extensión. En general, la ley protege apenas a los vertebrados, considerándolos dotados de capacidad de tener experiencias subjetivas como dolor y sufrimiento. Estudios utilizando parámetros fisiológicos, neuroanatómicos y comportamentales demuestran sintiencia en invertebrados como cefalópodos y decápodos, dándoles el derecho de protección legal en algunos países. Sugerimos un enfoque de sintiencia con requisitos elementales, que no se restrinjan únicamente a vertebrados. Factores socio-económicos y el especisismo parecen influir en la no atribución de sintiencia a invertebrados. Así, se hace evidente la necesidad de un análisis bioético para fundamentar la inclusión de esos animales en la legislación. El "beneficio de la duda" es corroborado por los argumentos de "continuidad evolutiva" y "principio de precaución". En ese ínterin, sugerimos que la utilización de los invertebrados para fines científicos sea criteriosa y responsable.

Invertebrados; Legislación; Sintinencia; Experimentación animal; Especisismo


  • 1
    Franco NH. Animal experiments in biomedical research: a historical perspective. Animals. 2013;3(1):238-73.
  • 2
    Conn PM, Rantin FT. Ethical research as the target of animal extremism: an international problem. Braz J Med Biol Res. 2010;43(2):124-6.
  • 3
    Crook RJ. The welfare of invertebrate animals in research: can science's next generation improve their lot? Journal of Posdoctoral Research. 2013;1(2):9-20.
  • 4
    Nuffield Council on Bioethics. The ethics of research involving. London: Nuffield Council on Bioethics; 2005. p. 335.
  • 5
    European Commission. Animals used for scientific purposes. [Internet]. 2014 (acesso 25 abr. 2013). Disponível: http://ec.europa.eu/environment/chemicals/lab_animals/home_en.htm
  • 6
    Harvey-Clark C. Iacuc challenges in invertebrate research. ILAR J. 2011;52:213-20.
  • 7
    Brasil. Decreto nº 24.645, de 10 de julho de 1934. Estabelece medidas de proteção aos animais. [Internet]. (acesso abr. 2013). Disponível: http://legis.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=39567
  • 8
    Brasil. Decreto-lei n° 3.688, de 3 de outubro de 1941. Lei das Contravenções Penais. [Internet]. (acesso abr. 2013). Disponível: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3688.htm
  • 9
    Brasil. Lei n° 6.638, de 8 de maio de 1979. Estabelece normas para a prática didático-científica da vivissecção de animais e determina outras providências. Diário Oficial da União. 10 maio 1979;Coleção 2:6.537.
  • 10
    Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal; 1988.
  • 11
    Conselho Nacional de Saúde (Brasil). Resolução nº 196, de 10 de outubro de 1996. [Internet]. Aprova as diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. Brasília: Ministério da Saúde/Conselho Nacional de Saúde; 1996 (acesso abr. 2013). Disponível: http://conselho.saude.gov.br/resolucoes/1996/Reso196.doc
  • 12
    Brasil. Lei nº 9.605/98. Lei de Crimes Ambientais. Diário Oficial da União. 12 fev. 1998;seção I:1.
  • 13
    Brasil. Lei nº 11.794, de 8 de outubro de 2008. Regulamenta o inciso VII do § 1º do art. 225 da Constituição Federal, estabelecendo procedimentos para o uso científico de animais; revoga a Lei nº 6.638, de 8 de maio de 1979, e dá outras providências. Diário Oficial da União. 9 jan. 2008; Seção I:1.
  • 14
    Russel WMS, Burch RL. The principles of humane experimental technique. London: Methuen; 1959.
  • 15
    Brusca RC, Brusca G. Invertebrados. Rio de Janeiro: Guanabara; 2007. p. 968.
  • 16
    Aristóteles. História dos animais: livros I - IV. Lisboa: Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa; 2006. p. 326.
  • 17
    Wilson-Sanders S. Invertebrate models for biomedical research, testing, and education. Ilar J. 2011;52:126-52.
  • 18
    The C. elegans sequencing consortium. Genome sequence of the nematode C. elegans: a platform for investigating biology. Science. 1998;282(5.396):2.012-18.
  • 19
    European Food Safety Authority. Scientific Panel on Animal Health and Welfare (2005). Aspects of the biology and welfare of animals used for experimental and other scientific purposes. Efsa J. 2005;292:1-46.
  • 20
    Duncan IJH. The changing concept of animal sentience. Appl Anim Behav Sci. 2006;100(1-2):11-9.
  • 21
    Dawkins MS. Who needs consciousness? Anim Welf. 2001;10 (suppl 1):19-29.
  • 22
    Wemelsfelder F. The scientific validity of subjective concepts in models of animal welfare. Appl Anim Behav Sci. 1997;53(1-2):75-88.
  • 23
    Boissy A, Manteuffel G, Jensen MB, Moe RO, Spruijt B, Keeling LJ et al Assessment of positive emotions inanimals to improve their welfare. Physiol Behav. 2007;92(3):375-97.
  • 24
    The Cambridge Declaration on Consciousness. In: Francis Circk Memorial Conference; 7 Jul. 2012; Cambridge. Consciousness in human and not human animals. [Internet]. Cambrigde: The Memorial; 2012 (acesso 20 jan. 2014). Disponível: http://fcmconference.org/img/CambridgeDeclarationOnConsciousness.pdf
  • 25
    Mills DS. Sentience. In: Marchant-Forde JN, McGreevy PD, Morton DB, Nicol CJ, Phillips CJC et al, editors. The encyclopedia of applied animal behaviour and welfare. Wallingford: Cabi Publishing; 2010. p. 540.
  • 26
    Nagel T. What is it like to be a bat? Philosophal Review. 1074;83(4):435-50.
  • 27
    Olsson IAS, Sandoe P. Animal models of dementia: ethical considerations. De Deyn PP, Van Dam D, editors. Animals model of dementia. Totowa: Humana Press; 2011. p. 15-33. (Neuromethods, v. 48).
  • 28
    Bentham J. Uma introdução aos princípios da moral e da legislação. São Paulo: Abril Cultural; 1984. p. 63. (Os Pensadores).
  • 29
    Broom DM. Cognitive ability and sentience: which aquatic animals should be protected? Dis Aquat Org. 2007;75(2):99-108.
  • 30
    Magalhães-Sant'Ana M. Consciência animal: para além dos vertebrados. Jornal de Ciências Cognitivas. [Internet]. mar. 2009 (acesso 20 jan. 2014). Disponível: http://jcienciascognitivas.home.sapo.pt/09-03_santana.html
  • 31
    Carruthers P. Invertebrate minds: a challenge for ethical theory. The Journal of Ethics. 2007;8(1):275-97.
  • 32
    Sherwin C. Can invertebrates suffer? or, how robust is argument-by-analogy? Anim Welf. 2001;10:103-18.
  • 33
    Elwood R. Pain and suffering in invertebrates? Ilar J. 2011;52:175-84.
  • 34
    Smith ESJ, Lewin GR. Nociceptors: a phylogenetic view. J Comp Physiol A. 2009;195:1.089-106.
  • 35
    Andre RG, Wirts RA, Yesu T. Insect models for biomedical research. In: Woodhead A, editor. Nonmammalian animal models for biomedical research. Boca Raton, FL: CRC Press; 1989. p. 61-72.
  • 36
    Ryder R. Victims of science: the use of animals is research. London: Open Gate Press; 1975.
  • 37
    Arluke A, Sanders CR. Regarding animals. Philadelphia: Temple University Press; 1996.
  • 38
    Costa S. Especiessismo: percepções sociais portuguesas e guineenses sobre os outros. In: VI Congresso Português de Sociologia; 25-28 jun. 2008; Nova de Lisboa. Mundos sociais: saberes e práticas. Lisboa: Associação Portuguesa de Sociologia; 2008.
  • 39
    Kellert SR. Values and perceptions of invertebrates. Conservation Biology. 1993;7:845-55.
  • 40
    Mason GJ. Invertebrate welfare: where is the real evidence for conscious affective states? Trends Ecol Evol. 2011;26(5):212-3.
  • 41
    Horvath K, Angeletti D, Nascetti G, Carere C. Invertebrate welfare: an overlooked issue. Ann Ist Super Sanita. 2013;49:9-17.
  • 42
    Mather JA. Philosophical background of attitudes toward and treatment of invertebrates. Ilar J. 2011;52:205-12.
  • 43
    Hawkins R. Ethics and evolutionary continuity: comments on De Waal, Lyons, Moran, and Kraemer. Between Species. [Internet]. 2002 (acesso 20 jan. 2014);13(2). Disponível: http://digitalcommons.calpoly.edu/bts/
  • 44
    Jonas H. Ética, medicina e técnica. Lisboa: Vega; 1994. p. 172.
  • 45
    Smith SA, Scimeca JM, Mainous M. Culture and maintenance of selected invertebrates in the laboratory and classroom. Ilar J. 2011;52:153-64.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Maio 2014
  • Data do Fascículo
    Abr 2014

Histórico

  • Aceito
    05 Fev 2014
  • Recebido
    29 Abr 2013
  • Revisado
    17 Jul 2013
Conselho Federal de Medicina SGAS 915, lote 72, CEP 70390-150, Tel.: (55 61) 3445-5932, Fax: (55 61) 3346-7384 - Brasília - DF - Brazil
E-mail: bioetica@portalmedico.org.br