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Bioética, cuidados paliativos e libertação: contribuição ao “bem morrer”

Resumo

Os avanços tecnológicos na área da saúde reforçam a importância da bioética na garantia de direitos fundamentais relativos não só à vida, mas também à morte. Este artigo apresenta uma reflexão sobre o morrer e as contribuições que a bioética tem dado ao assunto, seja por meio dos princípios tradicionais de autonomia e dignidade, seja por meio da defesa de uma nova categoria: a libertação, proposta pela bioética de intervenção com base em Paulo Freire. Trata-se de pesquisa qualitativa, de abordagem hermenêutica, reflexiva, sociocrítica e analítica, cujo objetivo é demonstrar que a libertação pode contribuir para formar profissionais e pacientes mais críticos, comprometidos e livres, capazes de enfrentar um momento de tanta vulnerabilidade como é o momento da morte. O artigo defende que a adoção do conceito de libertação na reflexão bioética sobre cuidados paliativos pode contribuir ao processo de “morrer bem”.

Cuidados paliativos; Autonomia pessoal; Respeito

Abstract

Technological advances in the health field reinforce the importance of bioethics in guaranteeing fundamental rights related not only to life, but also to death. This article reflects on dying and the contributions that bioethics has made to the topic, either by the traditional principles of autonomy and dignity, or by the defense of a new category: liberation, proposed by intervention bioethics based on Paulo Freire. This qualitative research study, with a hermeneutic, reflective, sociocritical and analytical approach, aims to show that liberation can contribute to train more critical, committed and free professionals and patients, capable of facing a moment of such vulnerability as the moment of death is. The article argues that adopting the concept of liberation in the bioethical reflection on palliative care can contribute to the “dying well” process.

Palliative Care; Personal Autonomy; Respect

Resumen

Los avances tecnológicos en el ámbito de la salud refuerzan la importancia de la bioética en la garantía de derechos fundamentales relativos no solo a la vida, sino también a la muerte. Este artículo presenta una reflexión sobre el morir y las contribuciones de la bioética al tema, ya sea por medio de los principios tradicionales de autonomía y dignidad, ya sea por medio de la defensa de una nueva categoría: la liberación, propuesta por la bioética de intervención con base en Paulo Freire. Se trata de una investigación cualitativa, de enfoque hermenéutico, reflexivo, sociocrítico y analítico, cuyo objetivo es demostrar que la liberación puede contribuir a la formación de profesionales y pacientes más críticos, comprometidos y libres, capaces de enfrentarse a un momento de tanta vulnerabilidad como es el momento de la muerte. Este artículo defiende que la adopción del concepto de liberación en la reflexión bioética sobre los cuidados paliativos puede contribuir al proceso de “morir bien”.

Cuidados paliativos; Autonomía personal; Respeto

Apesar de a morte ser um evento incontestável, quanto mais avançamos científica e tecnologicamente, mais tentamos aplacá-la e domá-la. Quando a vida corpórea passa a ser absoluta e buscada a qualquer custo, independentemente da dignidade, saímos do campo terapêutico para o da idolatria, e por vezes a medicina participa dessa luta desmedida contra a morte. Discutir o fim da vida envolve questões que estão além de conflitos entre profissionais e pacientes ou familiares. É necessário refletir de forma madura sobre questões físicas, espirituais, sociais e emocionais, a fim de decidir de forma equânime sobre o próprio corpo e, consequentemente, lidar com a dor, com consciência dos limites biológicos e tecnológicos.

Crenças e conceitos têm sido redefinidos e impulsionados por um enorme e rápido progresso científico que traz novas tecnologias e gera perspectivas diversas. Nesse contexto, os conceitos de saúde e doença também são redefinidos sob a perspectiva de um bem-estar social que, por vezes, vem acompanhado do consumismo desmedido de produtos e serviços gerados pela indústria farmacêutica e pela “indústria médica” de serviços.

A crença popular do médico como “ser divino”, mediador entre deuses e humanos, era observada antes mesmo de Hipócrates e foi perpetrada pela concepção da medicina como sacerdócio 11. Beier M, Iannotti GC. O paternalismo e o juramento hipocrático. Rev Bras Saude Mater Infant [Internet]. 2010 [acesso 28 abr 2021];10(2 Supl):383-9. DOI: 10.1590/S1519-38292010000600017. Essa visão ainda hoje fundamenta a prática paternalista, fazendo alguns indivíduos acreditarem que o médico tem poderes divinos e pode vencer a morte. Com isso, gera-se um crescente entusiasmo por testes diagnósticos, produtos, medicamentos e intervenções ilimitadas, o que expõe grande parte da sociedade a riscos desnecessários.

Este artigo discute as contribuições da bioética ao campo dos cuidados paliativos, apresentando a “libertação”, proposta pela bioética de intervenção a partir das ideias de Paulo Freire, como categoria a ser inserida na discussão. O objetivo é demonstrar que a libertação, aliada à filosofia dos cuidados paliativos, pode conduzir à “boa morte”. A pesquisa, de abordagem qualitativa, hermenêutica, reflexiva, sociocrítica e analítica, é dividida em três momentos: 1) revisão de fontes secundárias (documentais) relativas à reflexão bioética sobre a morte; 2) revisão, também a partir de fontes secundárias, sobre cuidados paliativos, focando especialmente seu papel central na defesa de uma boa morte; e 3) análise da relação entre cuidados paliativos e bioética, enfatizando o papel da libertação nos cuidados paliativos ao final da vida.

A morte: questão bioética

A sobrevida de pacientes com doenças graves tem sido factível em decorrência dos avanços tecnológicos. Mas o uso indiscriminado desses avanços, somado à ausência de comunicação entre pares e à subtração da autonomia dos indivíduos, tem levado ao adiamento desmedido da morte, aumentando o sofrimento do paciente e seus familiares. Contestando esse tipo de medicina, Ivan Illich 22. Illich I. A expropriação da saúde: nêmesis da medicina. 3ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira; 1975. rejeitava a ideia de que a saúde fosse uma função, processo ou comportamento limitado a cumprir normas gerais concebidas por especialistas e executadas como um imperativo categórico. Em sua última década de vida, o autor, reivindicando para si a suprema liberdade de morrer sem diagnóstico, chamou atenção para a necessidade de recuperar a arte de sofrer e de morrer perdida pelo Ocidente 22. Illich I. A expropriação da saúde: nêmesis da medicina. 3ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira; 1975..

O mesmo progresso tecnológico que viabiliza a vida suscita questões éticas entre profissionais de saúde e gera desigualdade de poder e de conhecimento que desequilibra as relações. Cada época, cada sociedade, tem seu ideal sobre o fim da vida. Atualmente, prima-se pela longevidade e pela ausência de dor e sofrimento, numa perspectiva que evita pensar na morte, mas, quando o faz, anseia por um processo rápido e indolor 33. Mendes JA, Lustosa MA, Andrade MCM. Paciente terminal, família e equipe de saúde. Rev SBPH [Internet]. 2009 [acesso 28 abr 2021];12(1):151-73. Disponível: https://bit.ly/3vJ9Bi3
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O mais comum é que se utilizem todos os recursos disponíveis à prorrogação da vida – como, por exemplo, a oxigenação por membrana extracorpórea, muito usada hoje em pacientes com síndrome da angústia respiratória aguda relacionada à covid-19, mesmo sem dados suficientes que atestem sua necessidade 44. Ramanathan K, Antognini D, Combes A, Paden M, Zakhary B, Ogino M, et al. Planning and provision of ECMO services for severe ARDS during the COVID-19 pandemic and other outbreaks of emerging infectious diseases. Lancet Respir Med [Internet]. 2020 [acesso 28 abr 2021];8(5):518-26. DOI: 10.1016/S2213-2600(20)30121-1. Assim, paradoxalmente, numa sociedade que prima pela ausência de dor, produz-se excessivo e desnecessário sofrimento, desconsiderando a qualidade de vida. Essa situação é chamada na literatura de “distanásia”, que consiste na obstinação terapêutica, com adoção de tratamentos fúteis que adiam desnecessariamente a morte 55. Pessini L, Bertachini L, editores. Humanização e cuidados paliativos. São Paulo: Loyola; 2004.. Em oposição à distanásia, estão os cuidados paliativos ao fim da vida, que buscam fornecer conforto e aliviar a dor do paciente, evitando transformar a morte em um longo e doloroso processo.

Uma das críticas de Illich 22. Illich I. A expropriação da saúde: nêmesis da medicina. 3ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira; 1975. à medicina moderna se referia ao caráter interventor do ato médico em decisões que caberiam ao indivíduo. Essas intervenções afetam desde o atendimento gestacional, quando o médico decide quem nasce e como nasce, até a terminalidade da vida, quando o médico decide o tipo de morte e os níveis de dor a que os pacientes serão submetidos, a depender de seu estado de debilidade física. Tais ingerências suprimem a autonomia do paciente e seu direito de tomar decisões relativas ao próprio corpo, descartando discussões sobre dor e finitude e inserindo o indivíduo em um ambiente por vezes antagônico ao seu modo de vida 22. Illich I. A expropriação da saúde: nêmesis da medicina. 3ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira; 1975..

Georges Canguilhem 66. Canguilhem G. O normal e o patológico. Rio de Janeiro: Forense Universitária; 2000., em sua obra O normal e o patológico, também opina nesse sentido quando defende contundentemente que cada um deve definir para si o que é normal, tendo presente a singularidade de sua condição. Dessa maneira, a medicalização da vida, ao propor uma normatização universal, impede que o indivíduo defina o que é normal em sua situação particular.

Outro ponto levantado por Illich 22. Illich I. A expropriação da saúde: nêmesis da medicina. 3ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira; 1975. é que, quanto mais informado for o indivíduo, mais coerente será a tomada de decisão – entendida como exercício de poder sobre o próprio corpo –, impedindo que a vida fique à mercê do sistema social, política e econômico dominante. Assim, promover a autodeterminação e a autonomia somente será viável por meio da educação, transcendendo a individualidade e indo em direção ao coletivo 22. Illich I. A expropriação da saúde: nêmesis da medicina. 3ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira; 1975..

A evolução biotecnológica e biocientífica fez surgir muitos conflitos de interesses e conceitos, pois enquanto para alguns basta prolongar a vida ou adiar a morte, para outros viver com dignidade é também morrer com dignidade, sem abrir mão da autonomia para decidir a que tratamentos se submeter ou não e como e onde morrer. É comum que se questione a capacidade do paciente em se autodeterminar de forma válida. Porém, quando se impede que um enfermo sem possibilidade de cura faça suas opções, viola-se o princípio da dignidade humana, pois impor ao paciente a vontade de um terceiro é negar que todo indivíduo é sujeito de direitos. Dessa forma, evolução científica-tecnológica requer uma reflexão crítica que envolva os princípios da bioética. Em cada caso concreto, deve-se estabelecer limites com base no respeito à autonomia e à autodeterminação do paciente.

A bioética procura estabelecer um elo de comunicação entre ciência e tecnologia, indivíduo e sociedade, procurando construir uma ética responsável e solidária. O avanço científico e tecnológico na área da saúde, que envolve vida e biologia, traz para a sociedade contemporânea situações até então nunca pensadas, que geram a necessidade de debater limites ao manejo da vida, formular instrumentos jurídicos compatíveis com a atual conjuntura e refletir sobre a responsabilidade dos profissionais da saúde.

Contra uma visão reducionista que pauta o indivíduo a partir de proibições e regramentos normativos estáticos que desconsideram costumes sociais e o pluralismo moral contemporâneo, a bioética pensa o ser humano de forma multi, inter e transdisciplinar. Para esse campo do conhecimento, o indivíduo deve ter suas decisões respeitadas, desde que estas não interfiram na liberdade de escolha de outros indivíduos 77. Garrafa V. Genoma, pesquisa com seres humanos e biotecnologia: proteção pelo direito. In: Costa AB, Sousa JG Jr, Delduque MC, Oliveira MSC, Dallari SG, editores. Introdução crítica ao direito à saúde [Internet]. Brasília: Cead/UNB; 2008 [acesso 28 abr 2021]. p. 423-34. (O Direito Achado na Rua; 4). Disponível: https://bit.ly/3h6ilKS
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Especialmente as bioéticas latino-americanas, como a bioética de intervenção, têm incorporado diversas categorias além das principialistas 77. Garrafa V. Genoma, pesquisa com seres humanos e biotecnologia: proteção pelo direito. In: Costa AB, Sousa JG Jr, Delduque MC, Oliveira MSC, Dallari SG, editores. Introdução crítica ao direito à saúde [Internet]. Brasília: Cead/UNB; 2008 [acesso 28 abr 2021]. p. 423-34. (O Direito Achado na Rua; 4). Disponível: https://bit.ly/3h6ilKS
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, realçando, por exemplo, a importância da dignidade e criando conceitos inovadores como o de libertação. Esse conceito, proposto pela bioética de intervenção com base em Paulo Freire, defende a percepção do “eu” e do “outro” em relação com o meio em que estão inseridos 88. Freire P. Pedagogia da indignação: cartas pedagógicas e outros escritos. São Paulo: Editora Unesp; 2000.. Nesse sentido, pessoas vulneráveis, como aquelas que estão no fim da vida, devem lutar conscientemente contra as injustiças criadas pelas fronteiras estabelecidas pela realidade excludente, perseguindo a autonomia e os melhores resultados na assistência.

Ao mesmo tempo que melhora os insumos e permite diagnósticos mais rápidos e assertivos, em alguns casos, quando desconsidera a vontade do indivíduo em um caso concreto, o progresso cientifico-tecnológico pode ameaçar a dignidade da pessoa humana. Embora caiba ao profissional médico propor o tratamento e a tecnologia adequados a cada caso, não se pode deixar de fora da tomada de decisão o maior interessado, isto é, o paciente. Muitas vezes, influenciado pela cultura da cura, o médico deixa de observar se a proposta terapêutica adotada será realmente benéfica. No entanto, respeitar a autonomia do paciente é lhe dar visibilidade como cidadão com seu lugar de fala, dotado de convicções, valores culturais e capacidade de tomar decisões relativas ao próprio corpo. A autonomia, portanto, implica a convalidação social das escolhas do indivíduo 99. Beauchamp TL, Childress JF. Princípios de ética biomédica. 3ª ed. São Paulo: Loyola; 2002..

Mill, Dworkin e Rawls convergem com essa perspectiva ao defender que, para se chegar a um processo justo, é necessário reconhecer a capacidade do indivíduo de agir de forma livre, genuína, racional, igualitária e individual. Salvo em casos pontuais, como o das crianças, respeitar a autonomia é praticar a não interferência 1010. Herring J. Relational autonomy and family law. Cham: Springer; 2014.. Assim, atualmente, a relação médico-paciente não deveria mais estar associada ao paternalismo, mas a uma relação autônoma, na qual o paciente decide, dentro dos limites legais e éticos, sobre propostas terapêuticas. É sabido que a vida é um bem jurídico indisponível; porém, a vida deve ser vista em sua completude, e morrer dignamente se relaciona com o conceito de dignidade da pessoa humana.

Mas como garantir o respeito ao paciente sem prognóstico de cura ou acometido por uma doença grave, que muda o curso natural de sua vida? Como preservar sua autonomia e dignidade? Esse questionamento encontra resposta na proposta de Cicely Saunders: Ao cuidar de você no momento final da vida, quero que você sinta que me importo, pelo fato de você ser você, que me importo até o último momento de sua vida e, faremos tudo que estiver ao nosso alcance, não somente para ajudá-lo a morrer em paz, mas também para você viver até o dia de sua morte 1111. Saunders C. Velai comigo: inspiração para uma vida em cuidados paliativos. Rio de Janeiro: FSS; 2018. p. 94..

Cuidados paliativos ao fim da vida

O conceito contemporâneo de cuidados paliativos, atualizado em 2002 pela Organização Mundial da Saúde (OMS), define esse tipo de assistência como abordagem que promove a qualidade de vida de pacientes (e familiares) que enfrentam doenças ameaçadoras da vida, por meio da prevenção e alívio do sofrimento, identificação precoce, avaliação correta e tratamento da dor e de outros problemas de ordem física, psicossocial e espiritual 1212. World Health Organization. National cancer control programmes: policies and managerial guidelines [Internet]. Geneva: WHO; 2002 [acesso 28 abr 2021]. p. xv-xvi. Disponível: https://bit.ly/33pwXx3
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Além de atualizar o conceito, a OMS instituiu os princípios para a atuação da equipe multiprofissional de cuidados paliativos: aliviar a dor e outros sintomas desconfortáveis; afirmar a vida e encarar a morte como processo normal; não antecipar nem adiar a morte; promover o cuidado holístico; disponibilizar um sistema de apoio que instigue o paciente a ter uma vida o mais ativa possível, até o momento de sua morte; auxiliar os familiares durante a doença do paciente e no período de luto; lidar com as necessidades do paciente e de seus familiares por meio de uma abordagem multiprofissional; melhorar a qualidade de vida e influir positivamente no curso da doença; iniciar precocemente os cuidados paliativos, junto com terapêuticas de prolongamento da vida; e empreender esforços para reduzir as situações clínicas estressantes 55. Pessini L, Bertachini L, editores. Humanização e cuidados paliativos. São Paulo: Loyola; 2004.,1313. World Health Organization. Op. cit.. A OMS também recomendou que o controle efetivo da dor e dos sintomas dos pacientes em cuidados paliativos deve integrar as políticas públicas de saúde – medida que, no Brasil, foi incluída na Política Nacional de Humanização da Saúde 1313. World Health Organization. Op. cit.,1414. Brasil. Ministério da Saúde. HumanizaSUS: documento base para gestores e trabalhadores do SUS [Internet]. Brasília: Editora do Ministério da Saúde; 2010 [acesso 28 abr 2021]. Disponível: https://bit.ly/3errZpC
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Quanto à origem do termo, a palavra “paliativo” tem sua origem no substantivo pallium, que significa “manto” ou “coberta” (metaforicamente, tapar, cobrir, resguardar aquilo que não pode ser curado) 55. Pessini L, Bertachini L, editores. Humanização e cuidados paliativos. São Paulo: Loyola; 2004., e no verbo palliare (proteger), que remetem a uma interpretação ampliada do cuidado, não restrita à cura física, mas capaz de abranger outros aspectos da essência humana: espirituais, sociais e psicológicos 1515. Melo AGC, Caponero R. Cuidados paliativos: abordagem contínua e integral. In: Santos FS, organizadores. Cuidados paliativos: discutindo a vida, a morte e o morrer. São Paulo: Atheneu; 2009. p. 257-67.. Oficialmente, os cuidados paliativos surgem na década de 1960, no Reino Unido. O objetivo inicial era proporcionar um ambiente seguro e confortável para a pessoa que recebe o diagnóstico de uma doença grave, sem possibilidades terapêuticas de cura.

A precursora dos cuidados paliativos foi Cicely Saunders, médica, assistente social e enfermeira que disseminou mundialmente uma nova filosofia sobre o cuidado. Essa filosofia se baseava em dois pilares: eficiência no controle da dor e de outros sintomas que surgem no estágio final de uma doença, e extensão do cuidado a aspectos psicológicos, sociais e espirituais do paciente e de seus familiares. Assim, os cuidados paliativos buscam preservar a dignidade do paciente e dar suporte para que ele e sua família enfrentem os desafios de uma nova etapa da vida 1616. Cervelin AF, Kruse MHL. Espiritualidade e religiosidade nos cuidados paliativos: conhecer para governar. Esc. Anna Nery [Internet]. 2014 [acesso 28 abr 2021];18(1):136-42. DOI: 10.5935/1414-8145.20140020.

Em suma, os cuidados paliativos visam: dar assistência integral ao paciente fora de proposta terapêutica de cura, controlar efetivamente a dor, proporcionar qualidade de vida física, emocional, psicológica e familiar, e respeitar a autonomia e a autodeterminação 1717. Drane J, Pessini L. Bioética, medicina e tecnologia: desafios éticos na fronteira do conhecimento humano. São Paulo: Loyola; 2005. p. 53-64.. A prática, portanto, está assentada sobre alguns pilares: o direito à autonomia, à preservação da identidade social, e à dignidade da vida e da morte 1818. Menezes RA, Barbosa PA. A construção da “boa morte” em diferentes etapas da vida: reflexões em torno do ideário paliativista para adultos e crianças. Ciênc Saúde Coletiva [Internet]. 2013 [acesso 28 abr 2021];9(18):2653-62. DOI: 10.1590/S1413-81232013000900020.

Os cuidados paliativos não se relacionam exclusivamente com o fim da vida e atos médicos, uma vez que seus objetivos vão além da defesa de uma boa morte, exigindo a atuação de uma equipe multiprofissional. No entanto, os próximos parágrafos se centrarão nos cuidados paliativos especificamente na terminalidade da vida.

É necessário entender que os conceitos de vulnerabilidade e proteção são intrínsecos ao itinerário de vida e morte. Tal itinerário é permeado por situações de vulnerabilidade inerentes ao fim da vida, cabendo ao profissional fornecer ao paciente a proteção necessária e promover a aceitação da finitude humana, reconciliando o enfermo com desdobramento natural da doença até a morte. Para isso, o profissional que presta cuidados paliativos deve estabelecer uma relação baseada na escuta, no conhecimento, no respeito e na valorização do outro em toda a sua complexidade, compreendendo que o paciente assistido é um ser humano imbuído de uma biografia e crenças pessoais.

A vulnerabilidade do paciente terminal nos leva a propor que a proteção deveria ser o primeiro dos princípios morais a direcionar escolhas nos cuidados paliativos. Inicialmente, o sentido conferido à palavra grega ethos, origem de ética, era o de “proteção”, que na época homérica (por volta do século VIII a.C.) indicava abrigo contra perigos externos. Posteriormente, por volta do século V a.C., sem perder completamente o sentido inicial, a palavra ampliou seu significado e passou a designar costumes e hábitos necessários à convivência harmônica entre cidadãos. Ethos então passou a se referir a uma forma de garantir os bons costumes, evitando a anarquia social. Já no século IV, a palavra indica uma característica da personalidade, sentido que bem depois, no século XVIII, Immanuel Kant ressignifica, conferindo-lhe status de qualidade inerente ao agente moral e iniciando a teoria do exercício da autonomia pessoal 1919. Kant I. Fundamentação da metafísica dos costumes. São Paulo: Companhia Editorial Nacional; 1964..

Voltando à concepção de morte, vale a pena lembrar alguns autores que refletiram a respeito. Para um dos homens mais poderosos de Roma, o estoico Sêneca, viver era aprender a morrer. Para o filósofo cético francês Michel de Montaigne, filosofar era aprender a conhecer o aproximar-se da morte. E para o filósofo existencialista alemão Martin Heidegger, viver e morrer, na condição de vulnerabilidade, fazem parte da experiência humana enquanto ser-aí (Dasein) 2020. Heidegger M. Ser e tempo. Petrópolis: Vozes; 1989..

Seguindo por essa linha, nos termos de Norbert Elias, a atitude contemporânea diante da morte é consequência do processo civilizador: Como outros aspectos animais, a morte, tanto como processo quanto como imagem mnemônica, é empurrada mais e mais para os bastidores da vida social durante o impulso civilizador. Para os próprios moribundos, isso significa que eles também são empurrados para os bastidores, são isolados 2121. Elias N. A solidão dos moribundos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar; 2001. p. 19.. Assim, para além de um processo inexorável, a morte é também uma construção social. Ela pode vestir várias roupagens, a depender da cultura e dos significados a ela atribuídos 2222. Rodrigues IG. Os significados do trabalho em equipes de cuidados paliativos oncológico domiciliar: um estudo etnográfico [tese] [Internet]. Ribeirão Preto: Universidade de São Paulo; 2009 [acesso 28 abr 2021]. DOI: 10.11606/T.22.2009.tde-08012010-130039. Como observa Ariès:

A vida na sociedade medieval era mais curta; os perigos, menos controláveis; a morte, muitas vezes mais dolorosa; o sentido da culpa e o medo da punição depois da morte, a doutrina oficial. Porém, em todos os casos, a participação dos outros na morte de um indivíduo era muito mais comum. Hoje sabemos como aliviar as dores da morte em alguns casos; angústias de culpa são mais plenamente recalcadas e talvez dominadas 2323. Ariès P. O homem diante da morte. Rio de Janeiro: Francisco Alves; 1982..

Tendo refletido a respeito da morte, é conveniente refletir sobre a “boa morte”, categoria central neste trabalho, diretamente relacionada à morte digna, direito fundamental da pessoa humana, uma vez que se refere ao respeito à escolha do indivíduo sobre como morrer, especialmente em contextos nos quais sua independência e capacidade funcional estão comprometidas 2424. Dadalto L. Morte digna para quem? O direito fundamental de escolha do próprio fim. Pensar [Internet]. 2019 [acesso 28 abr 2021];24(3):1-11. DOI: 10.5020/2317-2150.2018.9555. A dignidade é um dos alicerces do Estado democrático de direito, porém, para torná-la efetiva em todas as fases da vida, é necessário refletir sobre o significado da morte, do sofrimento e da proteção nesse momento final 2525. Martini SR, Sturza JM. A dignidade humana enquanto princípio de proteção e garantia dos direitos fundamentais sociais: o direito à saúde. Cad Ibero-Amer Dir Sanit [Internet]. 2017 [acesso 28 abr 2021];6(2):25-41. DOI: 10.17566/ciads.v6i2.367.

Bioética e cuidados paliativos: autonomia e dignidade

As contribuições da bioética aos cuidados paliativos têm sido historicamente pautadas nos princípios de dignidade e autonomia. Nesse sentido, é importante esclarecer o significado desses princípios e sua aplicabilidade na assistência paliativa.

A preocupação com a dignidade da pessoa humana remonta à Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, promulgada na França em 1793. Desde então, esse valor vem sendo objeto de convenções e pactos internacionais. Um marco para essas convenções e pactos é o período pós-Segunda Guerra, quando o mundo lidava com graves violações perpetradas contra o ser humano: torturas, tratamentos desumanos, busca por uma raça pura, extermínio dos que não se enquadravam no ideal de perfeição. Após essas violações, a comunidade internacional buscou maneiras de resgatar o direito à vida e a uma vida digna, ratificando documentos que asseguravam os direitos da pessoa humana 2626. Hunt L. A invenção dos direitos humanos: uma história. São Paulo: Companhia das Letras; 2007.. Aos países que assinassem esses tratados não caberia mais suprimir direitos alegando hierarquia entre diferentes normas.

Em 1948, a Organização das Nações Unidas (ONU), por meio da Declaração Universal dos Direitos Humanos, estabeleceu que nenhuma pessoa poderia ser submetida a tortura ou castigo cruel, desumano ou degradante. A declaração também assegurava o direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal 2626. Hunt L. A invenção dos direitos humanos: uma história. São Paulo: Companhia das Letras; 2007.,2727. Brasil. Senado Federal. Direitos Humanos: atos internacionais e normas correlatas [Internet]. 4ª ed. Brasília: Senado Federal; 2013 [acesso 28 abr 2021]. Disponível: https://bit.ly/3xNzBL7
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. Em 1984, a Assembleia Geral da ONU adotou a Convenção das Nações Unidas Contra a Tortura, Penas Cruéis e Outros Tratamentos Desumanos ou Degradantes, que passou a vigorar em 1987, sendo ratificada pelo Brasil em 28 de setembro de 1989 2727. Brasil. Senado Federal. Direitos Humanos: atos internacionais e normas correlatas [Internet]. 4ª ed. Brasília: Senado Federal; 2013 [acesso 28 abr 2021]. Disponível: https://bit.ly/3xNzBL7
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Com a Constituição Federal de 1988, a saúde passou a ser considerada direito do cidadão e dever do Estado brasileiro. Junto com o direito à saúde, a Carta Magna afirmava o direito à vida, que por sua vez engloba a dignidade 2626. Hunt L. A invenção dos direitos humanos: uma história. São Paulo: Companhia das Letras; 2007.,2727. Brasil. Senado Federal. Direitos Humanos: atos internacionais e normas correlatas [Internet]. 4ª ed. Brasília: Senado Federal; 2013 [acesso 28 abr 2021]. Disponível: https://bit.ly/3xNzBL7
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. Assim, pode-se dizer que o princípio da dignidade da pessoa humana é um dos pilares da sociedade contemporânea brasileira.

A dignidade humana também é preconizada pelos instrumentos internacionais que norteiam as discussões bioéticas, tais como a Declaração Universal sobre o Genoma Humano e os Direitos Humanos, a Declaração Internacional sobre os Dados Genéticos e a Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos, adotadas pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), e a Convenção de Oviedo, acordada no âmbito do Conselho da Europa 2424. Dadalto L. Morte digna para quem? O direito fundamental de escolha do próprio fim. Pensar [Internet]. 2019 [acesso 28 abr 2021];24(3):1-11. DOI: 10.5020/2317-2150.2018.9555. No entanto, como aponta Albuquerque, apesar de a “dignidade humana” estar presente em todos esses documentos, não há consenso sobre a definição do conceito 2828. Albuquerque A. Dignidade humana: proposta e uma abordagem bioética baseada em princípios. Rev Direitos Garantias Fundamentais [Internet]. 2017 [acesso 28 abr 2021];18(3):111-38. DOI: 10.18759/rdgf.v18i3.1140.

No presente texto, assume-se a premissa de que a dignidade é um valor intrínseco ao ser humano do qual sobrevêm três princípios: respeito à pessoa, não instrumentalização, e vedação de tratamento humilhante, desumano ou degradante 2929. Albuquerque A. Direitos humanos dos pacientes. Curitiba: Juruá; 2016.. Portanto, não se pode dissociar a dignidade humana do direito à vida. Ambos os valores apontam para a máxima do Estado democrático de direito: a efetividade dos direitos fundamentais.

Já o princípio da autonomia nasce da necessidade de reestruturar as relações culturais, filosóficas, políticas e econômicas, pois, se pensamos, por exemplo, na sociedade medieval, veremos uma relação de completa subordinação ao divino, ao poder do rei e da Igreja, tanto nas relações entre senhores e vassalos como nas relações familiares. Na época, o termo “autonomia” ainda não era utilizado com sua conotação moderna. Prevalecia a ideia de livre-arbítrio enquanto escolha entre o bem e o mal, pois todas as relações estavam diretamente ligadas ao divino.

Assim, Santo Agostinho, em sua obra De libero arbitrio, não apenas definiu o que seria “livre-arbítrio” (o poder humano de escolher entre uma conduta benéfica ou maléfica), mas também “liberdade” (a prática adequada do livre-arbítrio) 3030. Selleti JC, Garrafa V. As raízes cristãs da autonomia. Petrópolis: Vozes; 2005.. No entanto, séculos depois, Martinho Lutero propôs que, se existe predestinação, então não há que se falar em “livre-arbítrio”, logo a liberdade humana seria uma falácia. Na verdade, pode-se dizer que a Reforma Protestante, iniciada por Lutero e continuada por Calvino, é um divisor de águas para a autonomia, pois, mesmo que à época os motivos do movimento tenham sido outros, o direito de liberdade teológica implica decisões autônomas 3030. Selleti JC, Garrafa V. As raízes cristãs da autonomia. Petrópolis: Vozes; 2005..

A partir de Descartes, a visão do divino deixa de ser central, e se concede ao homem a independência de experimentações baseadas no livre-arbítrio de um sujeito dotado de razão e consciência. Posteriormente, Kant fortalece esse respeito à autonomia enfatizando o poder de escolha e o reconhecimento do indivíduo, estabelecendo um marco importante para a filosofia ocidental. Para Kant, a autonomia é uma forma de respeito à dignidade humana 3131. Tonetto MC. Sobre a caracterização do conceito de dignidade em Kant. Princípios [Internet]. 2013 [acesso 28 abr 2021];20(33):181-94. Disponível: https://bit.ly/33iTJ9Q
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Na bioética, o conceito de autonomia é definido desde diferentes perspectivas. A mais tradicional, que remete ao principialismo de Beauchamp e Childress 99. Beauchamp TL, Childress JF. Princípios de ética biomédica. 3ª ed. São Paulo: Loyola; 2002., afirma a capacidade do indivíduo de fazer escolhas pessoais referentes a sua vida e ao seu corpo. No entanto, para a bioética de intervenção, como proposta por Garrafa 3232. Garrafa V. De uma “bioética de princípios” a uma “bioética interventiva”: crítica e socialmente comprometida [Internet]. Brasília: Agência Nacional de Vigilância Sanitária; 2003 [acesso 28 abr 2021]. Disponível: https://bit.ly/3epNrLI
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, não é suficiente relacionar a autonomia à esfera individual, uma vez que o contexto social deve ser observado na tomada de decisões, pois situações de vulnerabilidade a que o indivíduo pode estar submetido afetam diretamente sua autonomia 3232. Garrafa V. De uma “bioética de princípios” a uma “bioética interventiva”: crítica e socialmente comprometida [Internet]. Brasília: Agência Nacional de Vigilância Sanitária; 2003 [acesso 28 abr 2021]. Disponível: https://bit.ly/3epNrLI
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A compreensão dominante e individualista da autonomia, que aparece na prática clínica e na pesquisa, sustenta-se na no pensamento de que as pessoas idealmente tomam decisões independentes e racionais, que maximizam o ganho. Nas últimas décadas, porém, essa visão tem sido desafiada por diversas perspectivas teóricas (dentre elas a da bioética de intervenção) que defendem uma concepção de autonomia de tipo relacional. Essas perspectivas argumentam que identidades, necessidades, interesses e a própria autonomia das pessoas são sempre moldadas por suas relações com os outros 3333. Dove ES, Kelly SE, Lucivero F, Machirori M, Dheensa S, Prainsack B. Beyond individualism: is there a place for relational autonomy in clinical practice and research? Clin Ethics [Internet]. 2017 [acesso 28 abr 2021];12(3):150-65. DOI: 10.1177/1477750917704156.

Além disso, a autonomia relacional tem por premissa descentralizar as decisões por meio de uma rede de apoio ao indivíduo/paciente. Este modelo de autonomia pode ser encontrado, por exemplo, em alguns autores franceses que veem a autonomia com cautela, para além do indivíduo, pois uma prática médica centrada no indivíduo seria antagônica aos interesses coletivos 3434. Le Coadic R. L’autonomie, illusion ou projet de société?. Cahiers internationaux de sociologie [Internet]. 2006 [acesso 17 maio 2021]; 2(2):317-40. Disponível: https://www.cairn.info/revue-cahiers-internationaux-de-sociologie-2006-2-page-317.htm
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. No conflito entre autonomia e solidariedade, a autonomia se caracteriza sobretudo por um estado de empoderamento, enquanto a solidariedade está mais voltada a indivíduos em estado de vulnerabilidade 3535. Fainzang S. From solidarity to autonomy: towards a redefinition of the parameters of the notion of autonomy. Theor Med Bioeth [Internet]. 2016 [acesso 28 abr 2021];37(6):463-72. DOI: 10.1007/s11017-016-9385-5.

Justamente um dos conceitos centrais (o de habitus) de um importante pensador francês, Pierre Bourdieu, se baseia numa concepção relacional de autonomia. Bourdieu argumenta que o indivíduo só é autônomo a partir de suas construções sociais e individuais, e isso fica claro na própria definição de habitus: um sistema de disposições duráveis e transponíveis que, integrando todas as experiências passadas, funciona a cada momento como uma matriz de percepções, de apreciações e de ações – e torna possível a realização de tarefas infinitamente diferenciadas, graças às transferências analógicas de esquemas 3636. Bourdieu P. Sociologia. São Paulo: Ática; 1983. p. 65..

Assim, o conceito de habitus pode ser entendido como ponte relacional entre construções sociais externas e experimentações individuais. A coexistência de distintas instâncias de socialização, com projetos múltiplos e maior circularidade de valores e referências identitárias, configura um campo diversificado da socialização 3737. Montagner MA. Trajetórias e biografias: notas para uma análise bourdieusiana. Sociologias [Internet]. 2007 [acesso 28 abr 2021];9(17):240-64. Disponível: https://bit.ly/3enYsNG
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Mas não é só na França que o conceito de autonomia relacional tem sido trabalhado. Também em outros países do Ocidente o princípio da solidariedade tem ancorado a prática autônoma. Essa coexistência entre autonomia e solidariedade é mais eficaz na proteção do indivíduo, e não há oposição entre os dois princípios, mas uma complementaridade que promove o senso de responsabilidade em relação à pessoa vulnerável. Desse modo, a bioética tem mostrado que a autonomia é uma capacidade da pessoa humana para deliberar com base em seus desígnios e nos meios adequados para lograr êxito, tendo por fio condutor suas crenças, convicções e valores morais ou normativos.

Filósofos importantes para a bioética, como Immanuel Kant 1919. Kant I. Fundamentação da metafísica dos costumes. São Paulo: Companhia Editorial Nacional; 1964., reforçam que a liberdade dos indivíduos pode coexistir em harmonia, desde que haja respeito ao modo de agir peculiar a cada indivíduo, sem que se imponham escolhas pessoais ao outro. Já John Stuart Mill, em sua obra On liberty, admite como limitador da liberdade individual o dano – físico ou espiritual – que possa atingir o coletivo 3838. Prudente MG. Bioética: conceitos fundamentais. Porto Alegre: Edição do Autor; 2000..

A bioética também contribui com esse debate ao afirmar que a autonomia se encontra ligada ao pluralismo moral, de maneira que as escolhas autônomas dos indivíduos estão sempre relacionadas com os contextos em que vivem e interagem. Outra contribuição é a definição de que respeitar decisões autônomas é uma premissa para assegurar a dignidade da pessoa humana, e que, para garantir o respeito ao pluralismo moral e preservar o direito à autodeterminação de indivíduos que têm sua capacidade mitigada, deve se considerar questões culturais, sociais, econômicas e jurídicas.

Essas contribuições são essenciais não apenas para discussões relativas à autonomia e à dignidade, mas especialmente para o debate sobre cuidados paliativos. Isso porque, quando se volta o olhar a esses cuidados, observa-se que a medicina paliativa é praticada principalmente em situações relacionadas a morte, sofrimento, dor e incapacidade multidimensional 3939. Guevara-López U, Altamirano-Bustamante M, Viesca-Treviño C. New frontiers in the future of palliative care: real-world bioethical dilemmas and axiology of clinical practice. BMC Medical Ethics [Internet]. 2015 [acesso 28 abr 2021];16. DOI: 10.1186/s12910-015-0003-2. Em todas essas circunstâncias a dignidade e a autonomia estão fortemente comprometidas, e importantes determinantes sociais, culturais, econômicos e jurídicos estão presentes. Daí a importância de se defender uma autonomia relacional intimamente ligada à dignidade.

Os aportes da bioética em termos de autonomia e dignidade também são importantes porque reconhecem que, para tomar decisões, o paciente em cuidados paliativos precisa refletir com clareza sobre objetivos de vida, interesses familiares, sistema de significados, seu eu interior e trajetória. E a dor, o medo do desconhecido e o sofrimento podem comprometer a capacidade intelectual nesse processo de tomada de decisões. Nesse contexto, a bioética, por meio especialmente dos princípios abordados, pode contribuir para restaurar essa competência, ajudando o paciente, ou seu representante legal, a fazer escolhas que preservem a autonomia e a dignidade 4040. Drane J, Pessini L. Bioética, medicina e tecnologia: desafios éticos na fronteira do conhecimento humano. São Paulo: Centro Universitário São Camilo; 2005. p. 127-40..

Finalmente, cabe salientar que ser autônomo não significa necessariamente ser reconhecido como agente autônomo, pois tal reconhecimento depende do respeito efetivo às escolhas do indivíduo, mesmo que baseadas em crenças e valores particulares. Conforme a bioética, o indivíduo autônomo deve ter capacidade reflexiva para decidir sobre seus propósitos, ser coerente em suas escolhas e não sucumbir a coações externas 99. Beauchamp TL, Childress JF. Princípios de ética biomédica. 3ª ed. São Paulo: Loyola; 2002..

Cuidados paliativos ao fim da vida e libertação

A bioética, surgida na década de 1970 como instrumento de reflexão sobre questões morais e práticas que careciam de uma abordagem interdisciplinar, tem se desenvolvido muito nos últimos vinte anos. De início, esse campo de estudo se preocupou exclusivamente com questões biomédicas e biotecnológicas, tradicionalmente associadas às pesquisas com seres humanos em países desenvolvidos, como os Estados Unidos. No período, a expressão mais importante da bioética se deu em 1979, com o Belmont Report, que instituiu três princípios: autonomia, beneficência e justiça, conferindo uma nova perspectiva à análise ética das pesquisas envolvendo seres humanos 4141. Beauchamp T, Childress J. Principles of biomedical ethics. Nova York: Oxford University Press; 1979.-4242. Rodrigues Filho ER, Prado MM, Prudente COM. O princípio da autonomia como fundamento do consentimento livre e esclarecido. Estudos Vida e Saúde [Internet]. 2015 [acesso 28 abr 2021];42(4):613-25. DOI: 10.18224/est.v42i4.4380.

Na Encyclopedia of bioethics, obra publicada nos Estados Unidos em três diferentes edições (1978, 1995 e 2004), a bioética foi definida como o estudo sistemático das dimensões morais – incluindo visão, decisão, conduta e normas morais – das ciências da vida e da saúde, utilizando uma variedade de metodologias éticas num contexto interdisciplinar 4343. Reich WT. Encyclopedia of Bioethics. 2ª ed. New York; MacMillan, 1995.p. XXI.. Porém, posteriormente, o campo foi ampliado, o que fica evidente, por exemplo, nos pressupostos da bioética de intervenção previamente mencionada 3232. Garrafa V. De uma “bioética de princípios” a uma “bioética interventiva”: crítica e socialmente comprometida [Internet]. Brasília: Agência Nacional de Vigilância Sanitária; 2003 [acesso 28 abr 2021]. Disponível: https://bit.ly/3epNrLI
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. Essa ampliação incluiu determinantes sociais, econômicos, políticos e culturais à reflexão moral, bem como a análise de situações anteriormente não abordadas, como pobreza, exclusão e vulnerabilidade – e não apenas do ponto de vista biológico.

Precisamente com base na vulnerabilidade, as bioéticas mais recentes, de ruptura, altamente politizadas e defensoras dos direitos humanos – e dentre elas, como exemplo mais consolidado, a bioética de intervenção –, propuseram a inclusão do conceito freiriano 4444. Freire P. Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra; 2005. de libertação nesse campo do conhecimento. O intuito é defender uma reflexão concreta, crítica e comprometida, que conduza à transformação social.

A libertação, como definida por Freire, contribui para formar indivíduos que, além de refletir, ajam, e mesmo em meio a sua vulnerabilidade entendam que são os protagonistas de suas vidas e da luta por defender seus interesses 4545. Manchola-Castillo C, Garrafa V. Enfoques participativos latinoamericanos para la educación en bioética. In: Unesco, editor. Manual de Educación en Bioética la agenda curricular en bioética: abriendo horizontes, volumen 1. México: Unesco; 2021. p. 3-11.. Em outras palavras, a libertação defende a existência de um indivíduo cuja liberdade (em relação à miséria, mas também em relação ao sofrimento e à dor) só será alcançada por meio da reflexão crítica, pela qual o dominado deixa de ser oprimido pelo dominador, pois já não tem medo de ser livre. No campo da saúde, isso significa quebrar a hegemonia principialista e fugir do determinismo biológico e cultural 4646. Laraio RB. Cultura: um conceito antropológico. 26ª ed. Rio de Janeiro: Zahar; 1986..

Por isso defendemos que a libertação pode ser uma nova contribuição da bioética aos cuidados paliativos. Acreditamos que – como propõe Elisabeth Kübler-Ross 4747. Kübler-Ross E. Sobre a morte e o morrer: os que os doentes terminais têm para ensinar a médicos, enfermeiras, religiosos e a seus próprios parentes. 9ª ed. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes; 2008., talvez a maior paliativista de todos os tempos – o paciente deve ser posto em evidência sem deixar de lado sua existência humana. É preciso partir do respeito à individualidade e à trajetória do paciente a fim de promover uma reestruturação institucional que atenda ao melhor interesse do sujeito.

A libertação também revela a necessidade de defender uma formação profissional que liberte o estudante da área da saúde, para que entenda que sua tarefa é tanto educar como aprender do paciente, numa relação de liberdade na construção dos saberes. Além disso, construir um pensamento crítico, por meio de uma prática libertadora, passa por identificar as próprias limitações e enfrentar temores, para que aquilo que se desconhece não seja visto como adversário. E aqui falamos em reconciliar vida e morte, considerando, como aponta Moller 4848. Moller LL. Direito à morte com dignidade e autonomia. 22ª ed. Curitiba: Juruá; 2007., que é difícil para o ser humano aceitar a finitude, especialmente em sociedades em que as tecnologias de prolongamento da vida têm gerado uma crescente obstinação no adiamento da morte.

Para debater a morte desde uma perspectiva bioética baseada na libertação, deve-se considerar todos os elementos que envolvem o final da vida. É preciso, por exemplo, tentar responder ao questionamento feito por Kovács 4949. Kovács MJ. Bioethics oncerning life and death. Psicol USP [Internet]. 2003 [acesso 28 abr 2021];14(2):115-67. DOI: 10.1590/S0103-65642003000200008: é possível uma boa morte? Para tanto, é necessário assumir como premissa que uma morte digna, humanizada, não pode ser prolongada, nem abreviada, e o sofrimento deve ser evitado. Vale a pena refletir também sobre casos específicos, por exemplo, sobre como pacientes acometidos por doenças degenerativas como a demência se enquadram no padrão aqui proposto 4949. Kovács MJ. Bioethics oncerning life and death. Psicol USP [Internet]. 2003 [acesso 28 abr 2021];14(2):115-67. DOI: 10.1590/S0103-65642003000200008.

A discussão ainda está longe de ser concluída. Como mostra Logue 5050. Logue BJ. When hospice fails: the limits of palliative care. Omega [Internet]. 1994 [acesso 28 abr 2021];29(4):291-301. DOI: 10.2190/EG0J-T0G5-1LJ4-KTPW, ainda há uma cisão dentro da teoria dos cuidados paliativos, pois, apesar de tais cuidados promoverem a qualidade de vida, por vezes a discussão passa ao largo do direito de morrer, uma vez que a assistência paliativa nem sempre é acessível ou disponibilizada a todos os pacientes 5050. Logue BJ. When hospice fails: the limits of palliative care. Omega [Internet]. 1994 [acesso 28 abr 2021];29(4):291-301. DOI: 10.2190/EG0J-T0G5-1LJ4-KTPW. E eis aqui mais um ponto para cuja solução a bioética pautada pela libertação também pode contribuir.

Espera-se que tenha ficado claro, com a argumentação desta seção, que a bioética pautada pela libertação pode responder a dilemas práticos prementes apresentados pelos cuidados paliativos. Devido a seu sólido arcabouço teórico e interdisciplinar, tal abordagem promove a interação entre os profissionais da saúde e sustenta as ações numa reflexão crítica, que considera os diversos determinantes de determinada situação 5151. Manchola-Castillo CC, Garrafa V. Interfaz entre bioética y relaciones internacionales. Salud Pública Méx [Internet]. 2016 [acesso 28 abr 2021];58(4)476-82. DOI: 10.21149/spm.v58i4.8031.

Considerações finais

A “boa morte” se ancora na qualidade de vida promovida pelos cuidados paliativos. Entretanto, para alcançá-la, é necessário que o paciente tenha consciência de sua condição de terminalidade, que a aceite, e seja capaz de tomar decisões autônomas. É preciso abandonar a ideia de que morrer é um processo que deve ser escondido e deixar de maquiar a morte com eufemismos, pois a libertação não pode coexistir com o medo.

Resolver conflitos, solucionar pendências, sentir-se confortável, participar das decisões terapêuticas e partilhar com a equipe quando e como deseja que ocorra o momento final são atos que fazem parte do “morrer bem”. Entretanto, para que isso seja factível, não basta conhecer o diagnóstico, é preciso conhecer também o prognóstico do paciente. Daí a importância de que a bioética, além dos tradicionais princípios de dignidade e autonomia, leve a ideia de libertação para os cuidados paliativos.

Infelizmente, nem todos os pacientes estão suficientemente preparados para compreender a dimensão de sua doença – e aqui esbarramos em questões morais e éticas que têm sido objeto de pesquisas e debates. Assim, não há padrões e princípios universais, pelo simples fato de que o indivíduo não é uma métrica com proporções imutáveis. E considerar essa complexidade é outra das contribuições essenciais do conceito de libertação, em seu caráter crítico e comprometido.

Como este texto mostrou, nossa sociedade tem buscado institucionalizar a vida e a morte, empreendendo uma busca por longevidade que quase chega a negar a condição humana. Por outro lado, há esforços no sentido de resgatar a “boa morte” por meio do respeito à autonomia do paciente e de cuidados que preservam a dignidade e a liberdade do indivíduo. A conciliação entre esses polos opostos somente será alcançada mediante a educação e a reflexão crítica propostas pela libertação.

Assim, convém refletir sobre o papel da educação em saúde, uma vez que dela depende a concretização da libertação nas práticas atuais de assistência e formação. Nesse sentido, a educação com foco no paciente é não apenas desejável, mas obrigatória, para garantir que os cuidados paliativos, especialmente ao fim da vida, contribuam para uma boa morte, com autonomia e dignidade. Para isso, são necessárias políticas públicas e ações intersetoriais que envolvam diversos profissionais (não apenas da área da saúde). Nesse ponto, a bioética de intervenção também é muito útil, tendo em vista sua defesa irrestrita do papel do Estado na garantia dos direitos dos cidadãos4545. Manchola-Castillo C, Garrafa V. Enfoques participativos latinoamericanos para la educación en bioética. In: Unesco, editor. Manual de Educación en Bioética la agenda curricular en bioética: abriendo horizontes, volumen 1. México: Unesco; 2021. p. 3-11..

Finalmente, destaca-se que não foi pretensão deste trabalho esgotar o tema abordado, mas apenas demonstrar que o conceito de libertação, levado aos cuidados paliativos, dentro da ótica da bioética de intervenção, pode contribuir com a construção da “boa morte”.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    6 Set 2021
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2021

Histórico

  • Recebido
    3 Ago 2020
  • Revisado
    2 Fev 2021
  • Aceito
    29 Abr 2021
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