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Considerações éticas sobre estudos de vacina controlada com placebo em gestantes

Resumo

O uso de placebo em ensaios clínicos, quando um tratamento comprovadamente eficaz existe, é um dos principais tópicos debatidos na ética em pesquisa contemporânea. Este artigo aborda o quadro ético para o uso de placebo em ensaios clínicos que avaliam a eficácia de vacina em gestantes. Participantes em ensaios de vacina são saudáveis no início e alguns devem ser inoculados durante o estudo para demonstrar a eficácia do produto. Ou seja, participantes tratados com placebo estão sob risco de danos graves e irreversíveis. Se existirem vacinas eficazes, esse risco impede o uso de placebo. Essa interdição deve ser estendida a qualquer ensaio clínico de eficácia de vacina em gestantes, pois a demonstração de eficácia clínica em não gestantes e as respostas imunogênicas comparáveis em gestantes também são preditoras de eficácia na gravidez. Ademais, a eficácia do produto em cenários reais de uso pode ser verificada por estudos observacionais realizados após sua inclusão em campanhas de vacinação.

Vacinas; Placebos; Estudo clínico; Bioética; Equipolência terapêutica; Covid-19; Influenza humana

Abstract

Placebo use in clinical trials, whenever a proven effective treatment exists, is one of the most debated topics in contemporary research ethics. This article addresses the ethical framework for placebo use in clinical trials assessing vaccine efficacy in pregnant women. Vaccine trial participants are healthy at the outset and some must be infected during the study to demonstrate the product’s efficacy, meaning that placebo-treated participants are under risk of serious and irreversible harm. If effective vaccines exist, such risk precludes placebo use. This interdiction should be extended to any clinical trial of vaccine efficacy in pregnant women, because a demonstration of clinical efficacy in nonpregnant individuals and comparable immunogenic responses in pregnant women are predictors of efficacy in pregnancy as well. Moreover, product effectiveness in real-world use scenarios can be ascertained by observational studies conducted after its inclusion in vaccination campaigns.

Vaccines; Placebos; Clinical study; Bioethics; Therapeutic equipoise; COVID-19; Influenza, human

Resumen

El uso de placebo en ensayos clínicos es uno de los principales temas debatidos sobre la ética en investigación contemporánea cuando existe un tratamiento eficaz probado. Este artículo aborda la ética en el uso de placebo en ensayos clínicos sobre la eficacia de vacuna en mujeres embarazadas. Las participantes en los ensayos de vacunas estaban sanas al inicio del estudio, y algunas fueron vacunadas durante el estudio para demostrar la eficacia del producto. Las participantes tratadas con placebo corren el riesgo de sufrir daños graves e irreversibles. Si existen vacunas efectivas, este riesgo impide el uso de placebo. Este impedimento debe extenderse a cualquier ensayo clínico de eficacia de vacuna en embarazadas, pues la eficacia clínica demostrada en mujeres no embarazadas y las respuestas inmunogénicas comparables con las embarazadas son predictores de eficacia en el embarazo. Además, la efectividad del producto se constata en estudios observacionales realizados tras las campañas de vacunación.

Vacunas; Placebos; Estudio clínico; Bioética; Equipoise Terapéutico; Covid-19; Gripe humana

Desigualdades antiéticas legítimas em pesquisa médica contribuem para disparidades injustas em saúde e cuidados com a saúde11. Nowogrodzki A. Clinical research: inequality in medicine. Nature [Internet]. 2017 [acesso 10 jan 2023];550(7674):18-9. DOI: 10.1038/550S18a , 22. Fleurbaey M, Schokkaert E. Unfair inequalities in health and health care. J Health Econ [Internet]. 2009 [acesso 10 jan 2023];28(1):73-90. DOI: 10.1016/j.jhealeco.2008.07.016 . A disparidade de gênero entre participantes de estudos clínicos é um exemplo11. Nowogrodzki A. Clinical research: inequality in medicine. Nature [Internet]. 2017 [acesso 10 jan 2023];550(7674):18-9. DOI: 10.1038/550S18a , 33. Steinberg JR, Turner BE, Weeks BT, Magnani CJ, Wong BO, Rodriguez F et al. Analysis of female enrollment and participant sex by burden of disease in us clinical trials between 2000 and 2020. JAMA Netw Open [Internet]. 2021 [acesso 10 jan 2023];4(6):e2113749. DOI: 10.1001/jamanetworkopen.2021.13749 . Uma análise recente sobre o sexo dos participantes do estudo por carga de doença em estudos clínicos conduzidos entre 2000 e 2020 nos Estados Unidos revelou que a inclusão de mulheres aumentou nas últimas décadas. Apesar do progresso em direção à paridade sexual, a análise mostrou que o desequilíbrio de gênero persistiu com sub-representação dependendo do campo da pesquisa médica33. Steinberg JR, Turner BE, Weeks BT, Magnani CJ, Wong BO, Rodriguez F et al. Analysis of female enrollment and participant sex by burden of disease in us clinical trials between 2000 and 2020. JAMA Netw Open [Internet]. 2021 [acesso 10 jan 2023];4(6):e2113749. DOI: 10.1001/jamanetworkopen.2021.13749 .

Desigualdades dramáticas na participação em pesquisas clínicas também acontecem entre mulheres, sendo bem documentado que gestantes e mulheres em risco de engravidar estão severamente sub-representadas em estudos clínicos randomizados controlados (ECR) de medicamentos necessários para tratar distúrbios que comumente as afetam44. Blehar MC, Spong C, Grady C, Goldkind SF, Sahin L, Clayton JA. Enrolling pregnant women: issues in clinical research. Womens Health Issues [Internet]. 2013 [acesso 10 jan 2023];23(1):39-45. DOI: 10.1016/j.whi.2012.10.003

5. Foulkes MA, Grady C, Spong CY, Bates A, Clayton JA. Clinical research enrolling pregnant women: a workshop summary. J Womens Health (Larchmt) [Internet]. 2011 [acesso 10 jan 2023];20(10):1429-32. DOI: 10.1089/jwh.2011.3118
- 66. van der Graaf R, van der Zande ISE, den Ruijter HM, Oudijk MA, van Delden JJM, Oude Rengerink K et al. Fair inclusion of pregnant women in clinical trials: an integrated scientific and ethical approach. Trials [Internet]. 2018 [acesso 10 jan 2023];19(1):78. DOI: 10.1186/s13063-017-2402-9 . Portanto, muitos medicamentos que poderiam beneficiar essa população não são utilizados durante a gravidez, ou são utilizados independentemente da falta de evidências clínicas de alta qualidade sobre efetividade, regimes de dose mais adequados e perfil de segurança para essa população44. Blehar MC, Spong C, Grady C, Goldkind SF, Sahin L, Clayton JA. Enrolling pregnant women: issues in clinical research. Womens Health Issues [Internet]. 2013 [acesso 10 jan 2023];23(1):39-45. DOI: 10.1016/j.whi.2012.10.003

5. Foulkes MA, Grady C, Spong CY, Bates A, Clayton JA. Clinical research enrolling pregnant women: a workshop summary. J Womens Health (Larchmt) [Internet]. 2011 [acesso 10 jan 2023];20(10):1429-32. DOI: 10.1089/jwh.2011.3118

6. van der Graaf R, van der Zande ISE, den Ruijter HM, Oudijk MA, van Delden JJM, Oude Rengerink K et al. Fair inclusion of pregnant women in clinical trials: an integrated scientific and ethical approach. Trials [Internet]. 2018 [acesso 10 jan 2023];19(1):78. DOI: 10.1186/s13063-017-2402-9

7. Kaye DK. The moral imperative to approve pregnant women’s participation in randomized clinical trials for pregnancy and newborn complications. Philos Ethics Humanit Med [Internet]. 2019 [acesso 10 jan 2023];14(1):11. DOI: 10.1186/s13010-019-0081-8
- 88. Lavallaz JF, Sticherling C. Obstacles for enrollment of women in clinical trials. In: Malik M, editor. Sex and cardiac electrophysiology: differences in cardiac electrical disorders between men and women. London: Academic Press; 2020. p. 903-14. .

As consequências da tragédia da talidomida nos anos 1960 levantaram fortes preocupações sobre testes e uso de medicamentos durante a gravidez88. Lavallaz JF, Sticherling C. Obstacles for enrollment of women in clinical trials. In: Malik M, editor. Sex and cardiac electrophysiology: differences in cardiac electrical disorders between men and women. London: Academic Press; 2020. p. 903-14. , dado o medo de que os medicamentos – mesmo aqueles que aparentemente não prejudicam a gestante – possam prejudicar seriamente o desenvolvimento e a saúde fetal. Na época, a marcante e mal compreendida diferença interespécies na suscetibilidade aos efeitos teratogênicos da talidomida contribuiu para uma grande hesitação em incluir gestantes em ECR99. Schardein JL, Schwetz BA, Kenel MF. Species sensitivities and prediction of teratogenic potential. Environ Health Perspect [Internet]. 1985 [acesso 10 jan 2023];61:55-67 DOI: 10.1289/ehp.856155 . O modo enigmático pelo qual a talidomida causou defeitos congênitos e a falha em prever sua teratogenicidade reforçaram a incerteza sobre se testes laboratoriais anteriores em animais poderiam confiavelmente antecipar a toxicidade do desenvolvimento para humanos99. Schardein JL, Schwetz BA, Kenel MF. Species sensitivities and prediction of teratogenic potential. Environ Health Perspect [Internet]. 1985 [acesso 10 jan 2023];61:55-67 DOI: 10.1289/ehp.856155 .

À medida que a confiança na avaliação pré-clínica de segurança durante a gravidez diminuiu, cresceram dúvidas sobre se a participação de gestantes em estudos de medicamentos poderia prejudicar o feto, mesmo que estudos não clínicos tivessem previsto a improbabilidade de toxicidade do desenvolvimento para humanos.

Complexidade bioética

Pesquisa clínica com gestantes

A pesquisa clínica e o ensaio de medicamentos com gestantes são uma questão ética inerentemente complexa por várias razões, incluindo o fato de a mãe e o concepto serem altamente interdependentes, assim como seu estado de saúde e os riscos e benefícios das intervenções1010. Lassi ZS, Majeed A, Rashid S, Yakoob MY, Bhutta ZA. The interconnections between maternal and newborn health-evidence and implications for policy. J Matern Fetal Neonatal Med [Internet]. 2013 [acesso 10 jan 2023];26 supl 1:3-53. DOI: 10.3109/14767058.2013.784737 . Entretanto, os benefícios potenciais e os riscos previsíveis envolvidos em ensaios de medicamentos são muitas vezes desequilibrados entre mãe e feto.

Doenças durante a gravidez podem perturbar a função placentária e prejudicar o crescimento e desenvolvimento embrionário-fetal, além de resultar na transmissão de infecções de mãe para filho, defeitos congênitos e/ou saúde e viabilidade precárias do nascituro1111. Adams Waldorf KM, McAdams RM. Influence of infection during pregnancy on fetal development. Reproduction [Internet]. 2013 [acesso 10 jan 2023];146(5):151-62. DOI: 10.1530/REP-13-0232

12. Megli CJ, Coyne CB. Infections at the maternal-fetal interface: an overview of pathogenesis and defence. Nat Rev Microbiol [Internet]. 2021 [acesso 10 jan 2023];20(2):67-82. DOI: 10.1038/s41579-021-00610-y
- 1313. Goldstein JA, Gallagher K, Beck C, Kumar R, Gernand AD. Maternal-fetal inflammation in the placenta and the developmental origins of health and disease. Front Immunol [Internet]. 2020 [acesso 10 jan 2023];11:531543. DOI: 10.3389/fimmu.2020.531543 . Algumas infecções com sintomas leves a moderados na maioria das gestantes infectadas – como rubéola, zika, toxoplasmose e outras – podem ter efeitos devastadores em seus fetos1111. Adams Waldorf KM, McAdams RM. Influence of infection during pregnancy on fetal development. Reproduction [Internet]. 2013 [acesso 10 jan 2023];146(5):151-62. DOI: 10.1530/REP-13-0232 , 1212. Megli CJ, Coyne CB. Infections at the maternal-fetal interface: an overview of pathogenesis and defence. Nat Rev Microbiol [Internet]. 2021 [acesso 10 jan 2023];20(2):67-82. DOI: 10.1038/s41579-021-00610-y .

Por outro lado, durante a gravidez, a malária e algumas infecções virais muitas vezes evoluem rapidamente para um quadro clínico grave, colocando em risco a vida materna e, assim, a viabilidade fetal1414. Schantz-Dunn J, Nour NM. Malaria and pregnancy: a global health perspective. Rev Obstet Gynecol [Internet]. 2009 [acesso 10 jan 2023];2(3):186-92. Disponível: https://bit.ly/3jKpqVf
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, 1515. Carlson A, Thung SF, Norwitz ER. H1N1 Influenza in pregnancy: what all obstetric care providers ought to know. Rev Obstet Gynecol [Internet]. 2009 [acesso 10 jan 2023];2(3):139-45. Disponível: https://bit.ly/3DU6uKq
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. A ocorrência de pré-eclâmpsia, uma condição hipertensiva grave relacionada à gravidez tardia, pode exigir o parto por cesárea de um bebê prematuro para salvar a vida da mãe.

Doenças maternas durante a gravidez também podem afetar insidiosamente o desenvolvimento e a saúde pós-natal do feto, ou seja, um dano à saúde induzido pelo pré-natal pode aparecer durante a infância, a adolescência ou mesmo muito mais tarde como deficiências no crescimento pós-natal e no desenvolvimento cognitivo, e como maior risco de desenvolver distúrbios cardiovasculares e psiquiátricos durante a vida adulta1616. O’Donnell KJ, Meaney MJ. Fetal origins of mental health: the developmental origins of health and disease hypothesis. Am J Psychiatry [Internet]. 2017 [acesso 10 jan 2023];174(4):319-28. DOI: 10.1176/appi.ajp.2016.16020138

17. Al-Haddad BJS, Oler E, Armistead B, Elsayed NA, Weinberger DR, Bernier R et al. The fetal origins of mental illness. Am J Obstet Gynecol [Internet]. 2019 [acesso 10 jan 2023];221(6):549-62. DOI: 10.1016/j.ajog.2019.06.013
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- 1818. Arima Y, Fukuoka H. Developmental origins of health and disease theory in cardiology. J Cardiol [Internet]. 2020 [acesso 10 jan 2023];76(1):14-7. DOI: 10.1016/j.jjcc.2020.02.003 . A teoria das origens desenvolvimentistas da doença e da saúde de David Barker é uma hipótese instigante apoiada pelos achados de vários estudos epidemiológicos1616. O’Donnell KJ, Meaney MJ. Fetal origins of mental health: the developmental origins of health and disease hypothesis. Am J Psychiatry [Internet]. 2017 [acesso 10 jan 2023];174(4):319-28. DOI: 10.1176/appi.ajp.2016.16020138

17. Al-Haddad BJS, Oler E, Armistead B, Elsayed NA, Weinberger DR, Bernier R et al. The fetal origins of mental illness. Am J Obstet Gynecol [Internet]. 2019 [acesso 10 jan 2023];221(6):549-62. DOI: 10.1016/j.ajog.2019.06.013
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- 1818. Arima Y, Fukuoka H. Developmental origins of health and disease theory in cardiology. J Cardiol [Internet]. 2020 [acesso 10 jan 2023];76(1):14-7. DOI: 10.1016/j.jjcc.2020.02.003 .

Protecionismo fetal em pesquisa clínica

Considerando a interdependência entre mãe e concepto, um dilema ético surge sempre que os interesses da gestante entram em conflito com os do nascituro em relação a uma intervenção terapêutica ou profilática, ou a uma decisão de interromper deliberadamente a gravidez.

A visão protecionista fetal radical ofereceria soluções simplistas para esse dilema, particularmente se associada à noção de que a vida humana começa na concepção, assim como o direito humano à vida. Nesse contexto, os supostos interesses do nascituro – legitimados pelo chamado “direito à vida fetal” – poderiam eventualmente prevalecer sobre os da gestante em uma variedade de situações médicas1919. Copelon R, Zampas C, Brusie E, Devore J. Human rights begin at birth: international law and the claim of fetal rights. Reprod Health Matters [Internet]. 2005 [acesso 10 jan 2023];13(26):120-9. DOI: 10.1016/S0968-8080(05)26218-3 , 2020. Evans DP, Narasimhan S. A narrative analysis of anti-abortion testimony and legislative debate related to Georgia’s fetal “heartbeat” abortion ban. Sex Reprod Health Matters [Internet]. 2020 [acesso 10 jan 2023];28(1):1686201. DOI: 10.1080/26410397.2019.1686201 .

Por outro lado, ativistas dos direitos das mulheres defendem que o direito humano à vida não começa antes do nascimento1919. Copelon R, Zampas C, Brusie E, Devore J. Human rights begin at birth: international law and the claim of fetal rights. Reprod Health Matters [Internet]. 2005 [acesso 10 jan 2023];13(26):120-9. DOI: 10.1016/S0968-8080(05)26218-3 , ou pelo menos até que o feto em desenvolvimento se torne viável fora do corpo materno – dependendo da qualidade dos cuidados médicos prestados aos prematuros, isso pode ocorrer por volta da 24ª semana de idade gestacional2121. Breborowicz GH. Limits of fetal viability and its enhancement. Early Pregnancy (Cherry Hill) [Internet]. 2001 [acesso 10 jan 2023];5(1):49-50. Disponível: https://bit.ly/3Xju0aH
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.

De toda forma, a idade de desenvolvimento na qual a vida de um ser humano começa é uma questão metafísica e não científica, ou seja, o estágio de desenvolvimento embrionário em que o concepto adquiriria o direito humano à vida é arbitrariamente estabelecido baseado em julgamentos sociais e morais.

Aprofundar-se nessa controversa questão moral dos direitos fetais e nas muitas faces e origens do protecionismo fetal nas sociedades modernas vai além do escopo deste ensaio, portanto, o protecionismo fetal é entendido aqui como uma tendência a priorizar a proteção do feto em detrimento das necessidades científicas e dos interesses da saúde materna em pesquisa clínica.

Fortes pontos de vista do protecionismo fetal na prática clínica e na pesquisa ignoram o fato de que, como mencionado anteriormente, as infecções maternas não tratadas e outras condições mórbidas podem ser severamente prejudiciais ao feto. Ou seja, abster-se de tratar uma gestante doente a partir de medicamentos clinicamente testados com potenciais benefícios para esse grupo pode impactar negativamente a saúde reprodutiva e fetal.

O forte protecionismo fetal em pesquisa envolvendo gestantes foi questionado nos anos 1990 e, em certa medida, suavizado. Não apenas vários ECR com gestantes foram julgados eticamente justificáveis, mas a exclusão padrão dessa subpopulação de ECR de medicamentos que lhes são potencialmente benéficos é cada vez mais vista como discriminatória, injusta e antiética44. Blehar MC, Spong C, Grady C, Goldkind SF, Sahin L, Clayton JA. Enrolling pregnant women: issues in clinical research. Womens Health Issues [Internet]. 2013 [acesso 10 jan 2023];23(1):39-45. DOI: 10.1016/j.whi.2012.10.003

5. Foulkes MA, Grady C, Spong CY, Bates A, Clayton JA. Clinical research enrolling pregnant women: a workshop summary. J Womens Health (Larchmt) [Internet]. 2011 [acesso 10 jan 2023];20(10):1429-32. DOI: 10.1089/jwh.2011.3118

6. van der Graaf R, van der Zande ISE, den Ruijter HM, Oudijk MA, van Delden JJM, Oude Rengerink K et al. Fair inclusion of pregnant women in clinical trials: an integrated scientific and ethical approach. Trials [Internet]. 2018 [acesso 10 jan 2023];19(1):78. DOI: 10.1186/s13063-017-2402-9
- 77. Kaye DK. The moral imperative to approve pregnant women’s participation in randomized clinical trials for pregnancy and newborn complications. Philos Ethics Humanit Med [Internet]. 2019 [acesso 10 jan 2023];14(1):11. DOI: 10.1186/s13010-019-0081-8 , 2222. Farrell R, Michie M, Pope R. Pregnant women in trials of Covid-19: a critical time to consider ethical frameworks of inclusion in clinical trials. Ethics Hum Res [Internet]. 2020 [acesso 10 jan 2023];42(4):17-23. DOI: 10.1002/eahr.500060 .

De uma perspectiva bioética moderna, gestantes não são mais consideradas uma população “vulnerável” que requer proteção especial em pesquisa. Gestantes são plenamente capazes de proteger seus próprios interesses e os dos seus nascituros pelos quais são responsáveis, como qualquer adulto mentalmente competente. Se a gestante não é menor de idade, não tem deficiência intelectual significativa e compreendeu plenamente os riscos e benefícios da pesquisa para si e para o feto, deve-se supor que ela possa fornecer consentimento esclarecido (TCE) válido para participar do ECR44. Blehar MC, Spong C, Grady C, Goldkind SF, Sahin L, Clayton JA. Enrolling pregnant women: issues in clinical research. Womens Health Issues [Internet]. 2013 [acesso 10 jan 2023];23(1):39-45. DOI: 10.1016/j.whi.2012.10.003 , 2323. American College of Obstetricians and Gynecologists. Committee Opinion nº 646: ethical considerations for including women as research participants. Obstet Gynecol [Internet]. 2015 [acesso 10 jan 2023];126:e100-7. Disponível: https://bit.ly/3DW3hKF
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.

A complexidade do quadro científico e ético por trás da realização de ECR durante a gravidez é ainda ilustrada pelo fato de que, dependendo de quem se espera que seja o principal beneficiário da intervenção testada, o pai do nascituro também pode ser obrigado a consentir com a participação da gestante.

Em uma recente minuta de orientação à indústria, a Food and Drug Administration (FDA) dos Estados Unidos da América abordou essa sensível questão ética, afirmando que o consentimento para participação em ECR deve ser dado tanto pela gestante quanto pelo pai da criança se a pesquisa tiver a perspectiva de benefício direto somente para o feto , e somente se este for o caso, exceto se ele for incapaz de consentir por indisponibilidade, incompetência ou incapacidade temporária ou se a gravidez resultar de estupro ou incesto 2424. Food and Drug Administration. Draft guidance for industry: pregnant women: scientific and ethical considerations for inclusion in clinical trials guidance for industry [Internet]. 2018 [acesso 10 jan 2023]. p. 5. Disponível: https://bit.ly/3DU8q5E
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.

Apesar da mudança de paradigma em direção à inclusão em pesquisa clínica, ECR envolvendo gestantes ainda enfrenta complexas questões científicas e éticas. O uso de grupos controlados com placebo em ECR para testar a eficácia de vacinas ou métodos profiláticos é uma questão ética fundamental na pesquisa clínica durante a gravidez.

Questões éticas

Uso de comparadores inativos (placebo) em estudos clínicos randomizados controlados

O uso de controles com placebo em ECR, se houver tratamentos eficazes e seguros para doença ou condição sendo investigada, é um dos tópicos mais debatidos pela ética em pesquisa clínica contemporânea.

Um dos fundamentos da ética profissional médica dispõe que médicos são moralmente obrigados a oferecer a seus pacientes o(s) tratamento(s) que acreditam melhor atender às suas necessidades clínicas individuais. Médicos estão vinculados ao princípio bioético combinado beneficência-não-maleficência pelo Juramento de Hipócrates – “ajudar (fazer o bem) ou pelo menos não fazer mal” –, um compromisso profissional que se aplica tanto à prática clínica dos médicos como ao seu envolvimento em pesquisa clínica2525. Varkey B. Principles of clinical ethics and their application to practice. Med Princ Pract [Internet]. 2021 [acesso 10 jan 2023];30(1):17-2. DOI: 10.1159/000509119 , 2626. Markel H. “I Swear by Apollo”: on taking the hippocratic oath. N Engl J Med [Internet]. 2004 [acesso 10 jan 2023];350(20):2026-9. DOI: 10.1056/NEJMp048092 .

Como pesquisadores clínicos, médicos enfrentam um dilema moral sempre que estão envolvidos em ECR controlado com placebo se os tratamentos comprovadamente eficazes e seguros existem para a doença/condição sendo investigada.

Essa questão ética em pesquisa médica foi evidenciada por um debate ainda não resolvido sobre a validade e aplicabilidade da equipolência/princípio da equipolência clínica2727. Freedman B. Equipoise and the ethics of clinical research. N Engl J Med [Internet]. 1987 [acesso 10 jan 2023];317(3):141-5. DOI: 10.1056/NEJM198707163170304 , 2828. Paumgartten FJR. Equipoise, placebo in clinical trials and Brazilian Code of Medical Ethics. Rev Assoc Med Bras [Internet]. 2021 [acesso 10 jan 2023];67(4):490-5. DOI: 10.1590/1806-9282.20200929 . O termo equipolência significa um estado de equilíbrio ou situação em que as coisas estão perfeitamente equilibradas. Assim, segundo o princípio, pesquisadores clínicos devem estar em um estado de incerteza genuína sobre a eficácia relativa (e/ou segurança) das intervenções terapêuticas sob comparação para que um ECR seja ético.

O conceito de equipolência foi considerado impraticável na prática de pesquisa, portanto, propôs-se substituí-lo pelo de “equipolência clínica”, referindo-se a uma situação na qual existiria uma incerteza profissional coletiva sobre as alternativas de tratamento ou, nas palavras de Freedman, quando não há consenso dentro da comunidade clínica especializada sobre os méritos comparativos das alternativas a serem testadas 2727. Freedman B. Equipoise and the ethics of clinical research. N Engl J Med [Internet]. 1987 [acesso 10 jan 2023];317(3):141-5. DOI: 10.1056/NEJM198707163170304 .

Obviamente, se os médicos/pesquisadores estiverem cientes de que existem tratamentos comprovados e seguros para a doença/condição sendo investigada e acreditarem que o novo tratamento em teste também pode ser eficaz, o uso de placebo ou não tratamento no ECR viola o princípio da equipolência, ou equipolência clínica2828. Paumgartten FJR. Equipoise, placebo in clinical trials and Brazilian Code of Medical Ethics. Rev Assoc Med Bras [Internet]. 2021 [acesso 10 jan 2023];67(4):490-5. DOI: 10.1590/1806-9282.20200929 .

Se – e até que ponto – o uso de placebo no ECR é cientificamente justificável, se existirem tratamentos de eficácia e segurança demonstradas, é uma questão amplamente não resolvida. Um ECR usando comparadores ativos indica se um medicamento experimental (ou vacina) é mais eficaz e seguro, não inferior (estudos de não inferioridade), ou pior que um existente de eficácia e segurança comprovadas2828. Paumgartten FJR. Equipoise, placebo in clinical trials and Brazilian Code of Medical Ethics. Rev Assoc Med Bras [Internet]. 2021 [acesso 10 jan 2023];67(4):490-5. DOI: 10.1590/1806-9282.20200929 . Em contraste, os estudos de controle com placebo mostram se o medicamento/vacina é eficaz e seguro em termos absolutos.

Embora um ECR usando comparadores ativos também possa produzir evidências convincentes sobre a eficácia e segurança de medicamentos (ou vacinas), em circunstâncias específicas, estudos controlados com placebo oferecem vantagens metodológicas, algumas das quais foram apresentadas e discutidas alhures2828. Paumgartten FJR. Equipoise, placebo in clinical trials and Brazilian Code of Medical Ethics. Rev Assoc Med Bras [Internet]. 2021 [acesso 10 jan 2023];67(4):490-5. DOI: 10.1590/1806-9282.20200929 .

Se os investigadores acreditam que placebos podem ser vantajosos ou necessários por razões científicas quando existem tratamentos eficazes e seguros, um conflito pode surgir opondo suas necessidades de pesquisa percebidas às restrições éticas geralmente impostas aos estudos clínicos. A Associação Médica Mundial (WMA)2929. World Health Organization. WMA Declaration of Helsinki: ethical principles for medical research involving human subjects. WMA [Internet]. 2013 [acesso 9 fev 2023]. Disponível: https://bit.ly/3AlTQj1
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propõe a Declaração de Helsinki (DoH), um documento de orientação ética que abre uma exceção, permitindo o uso de placebo quando existem terapias eficazes, ou seja, se o uso de placebo for cientificamente necessário e não resultar em danos graves ou irreversíveis aos participantes do estudo.

Se os participantes do ECR alocados para controle com placebo assumirem riscos à saúde e não existirem perspectivas de benefícios à saúde, seu consentimento pessoal para participar é essencialmente altruísta, o que significa que o valor social do experimento deve ser tal que compense os riscos individuais assumidos. O valor social de um estudo depende da contribuição previsível dos dados que coleta – tipicamente em conjunto com dados de outros estudos – para melhorar os cuidados com a saúde, a saúde pública e, às vezes, atenuar as desigualdades injustas em medicina. O valor social é um requisito fundamental para tornar o ECR eticamente aceitável e é endossado pela DoH, pelos regulamentos brasileiros e pela maioria dos autores3030. Wendler D, Rid A. In defense of a social value requirement for clinical research. Bioethics [Internet]. 2017 [acesso 10 jan 2023];31(2):77-86. DOI: 10.1111/bioe.12325 .

O valor social de um projeto de pesquisa e os riscos e perspectivas de benefícios para os participantes – sejam eles alocados ao grupo experimental ou ao grupo de controle com placebo – devem ser claramente explicados no termo de consentimento. Qualquer que seja o alegado valor social de um ECR, se existir uma opção de tratamento comprovadamente eficaz e segura, qualquer risco de dano grave e irreversível à saúde é inaceitável.

Um problema ético único do ECR na gravidez é que uma pessoa gestante consente implicitamente para si mesma e para o feto pelo qual é responsável. A validade do consentimento baseado no altruísmo, e não em perspectivas de benefícios diretos à saúde, que foi dado por um representante legal (mãe) em nome de outra pessoa (nascituro) que é incompetente (ou incapaz de fazê-lo), é uma questão ética delicada que precisa de mais esclarecimentos.

Assume-se que, na ausência de perspectivas razoáveis de benefícios diretos à saúde da mulher ou do feto, os riscos fetais previstos maiores do que o mínimo são um obstáculo para a realização de ECR durante a gravidez.

De acordo com orientação da FDA, uma das principais condições a serem cumpridas por um ECR durante a gravidez é que (...) se não houver tal perspectiva de benefício, que o risco para o feto não seja maior que mínimo e que o objetivo da pesquisa seja o desenvolvimento de importantes conhecimentos biomédicos que não podem ser obtidos por qualquer outro meio 3131. Food and Drug Administration. Op. cit. p. 4. .

“Risco mínimo” é definido pela orientação da FDA como a probabilidade e magnitude do dano ou desconforto previstos na pesquisa [que] não são maiores em si mesmos do que aqueles normalmente encontrados na vida cotidiana ou durante a realização de exames ou testes físicos ou psicológicos de rotina3232. Food and Drug Administration. Op. cit. p. 6. .

As preocupações éticas sobre o uso de comparadores inativos em ECR foram reforçadas em 1994 por um estudo clínico controlado com placebo realizado em países de baixa e média renda para avaliar se um regime de dose específico de AZT (conhecido como Regime 076) diminuiria a transmissão do HIV-1 de mãe para filho3333. Landes M. Can context justify an ethical double standard for clinical research in developing countries? Global Health [Internet]. 2005 [acesso 10 jan 2023];1(1):11. DOI: 10.1186/1744-8603-1-11 . O tratamento de gestantes infectadas com HIV com uma substância inerte (placebo) foi considerado uma prática moralmente ultrajante, pois, na época, existiam evidências clínicas suficientes demostrando que o AZT era um agente antirretroviral eficaz3333. Landes M. Can context justify an ethical double standard for clinical research in developing countries? Global Health [Internet]. 2005 [acesso 10 jan 2023];1(1):11. DOI: 10.1186/1744-8603-1-11 . Outra questão ética levantada por esse infeliz estudo clínico foi um padrão duplo inaceitável adotado pela indústria farmacêutica para estudos em países desenvolvidos e em desenvolvimento, em que as restrições éticas de pesquisa são geralmente mais frouxas3333. Landes M. Can context justify an ethical double standard for clinical research in developing countries? Global Health [Internet]. 2005 [acesso 10 jan 2023];1(1):11. DOI: 10.1186/1744-8603-1-11 .

Placebos em pesquisa clínica

Declaração de Helsinque, orientação para médicos

Sobre o uso de placebo em estudos clínicos, a declaração DoH de princípios éticos para pesquisas médicas, ao longo de suas sucessivas revisões realizadas pela WMA – que foram sistematizadas e comparadas por Paumgartten2828. Paumgartten FJR. Equipoise, placebo in clinical trials and Brazilian Code of Medical Ethics. Rev Assoc Med Bras [Internet]. 2021 [acesso 10 jan 2023];67(4):490-5. DOI: 10.1590/1806-9282.20200929 – evoluiu da interdição de qualquer uso de placebos, se houver tratamentos comprovadamente eficazes disponíveis – que prevaleceram nos anos 1990 e início de 2000 –, para uma proibição padrão com uma exceção para uso em circunstâncias especiais, introduzida em 2008 e em vigor desde então.

A primeira revisão da DoH, em 1975, proibiu implicitamente o uso de comparadores inativos ou grupos não tratados em qualquer ECR na existência de tratamento eficaz para a doença ou condição sob investigação: Em qualquer estudo médico, a todo paciente – inclusive aquela pertencente a um grupo de controle, caso exista – deve ser dada a segurança dos mais comprovados métodos diagnósticos e terapêuticos 3434. Paumgartten. Op. cit. p. 491. .

A primeira referência explícita à proibição de controles com placebo apareceu na quarta revisão da DoH, feita em 1996: Em qualquer estudo médico deve ser garantido o melhor método corrente de diagnóstico e terapia para cada paciente – incluindo os do grupo-controle, se houver esse grupo no estudo. Isto não exclui o uso de placebos inertes em estudos onde não existam métodos diagnósticos ou terapêuticos comprovados 3434. Paumgartten. Op. cit. p. 491. .

A quinta revisão, feita em 2000, informou claramente que a proibição do uso de placebo em ECR se aplica não apenas a intervenções terapêuticas e diagnósticas, mas também a métodos profiláticos: Os benefícios, riscos, encargos e eficácia de um novo método devem ser testados comparativamente com os melhores métodos profiláticos, diagnósticos e terapêuticos existentes. Isto não inclui o uso de placebo ou de não-tratamento em estudo que não existam métodos profiláticos, diagnósticos ou terapêuticos comprovados 3434. Paumgartten. Op. cit. p. 491. .

Em 2008, na sétima revisão da DoH, a interdição estrita foi afrouxada e o uso de grupos de controle com placebo em ECR, quando existem intervenções comprovadamente eficazes, foi permitido onde, por razões metodológicas convincentes e cientificamente sólidas, o uso de placebo é necessário para determinar a eficácia ou segurança de uma intervenção e os pacientes tratados com placebo, ou não-tratamento, não estará sujeito a qualquer risco de dano grave ou irreversível 3434. Paumgartten. Op. cit. p. 491. .

Na mesma linha, o Código de Ética Médica também proíbe os médicos de manterem (...) vínculo de qualquer natureza com pesquisas médicas, envolvendo seres humanos, que usem placebo em seus experimentos, quando houver tratamento eficaz e efetivo para a doença pesquisada 3535. Conselho Federal de Medicina. Código de ética médica. Resolução CFM nº 2.217/2018. Brasília: CFM; 2019 [acesso 10 jan 2023]. p. 80. Disponível: https://bit.ly/3RT7V1O
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Avaliações da eficácia de intervenções profiláticas e terapêuticas

Uma distinção metodológica básica entre o ECR sobre a eficácia das farmacoterapias e aqueles sobre a eficácia de vacinas – ou qualquer outra intervenção profilática – é que, enquanto no primeiro caso todos os participantes sofrem da doença ou condição a ser tratada, no segundo caso todos os participantes são voluntários saudáveis no início do estudo.

Se uma abordagem profilática for realmente eficaz, os participantes alocados aleatoriamente para o grupo experimental são protegidos e, portanto, a proporção de doentes é menor do que a proporção de participantes do grupo de controle, que adoecem após não receberem nenhuma intervenção ou comparadores inativos (placebos).

Portanto, para testar se uma vacina é eficaz, de modo que a hipótese nula possa ser rejeitada ou não por uma análise estatística robusta, é necessário estimar antecipadamente um número alvo (mínimo) de indivíduos, entre os selecionados para o estudo, que devem ser diagnosticados com a doença contagiosa a ser prevenida antes que o código de cegamento seja quebrado para uma avaliação preliminar (ou final) dos resultados do estudo. Isso está detalhado nas recomendações da Organização Mundial da Saúde para estudos clínicos de eficácia de vacinas3636. Orenstein WA, Bernier RH, Dondero TJ, Hinman AR, Marks JS, Bart KJ et al. Field evaluation of vaccine efficacy. Bull World Health Organ [Internet]. 1985 [acesso 10 jan 2023];63(6):1055-6. Disponível: https://bit.ly/3RT8qsI
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, 3737. Oliveira ACAX, Paumgartten FJR. Ethical issues in placebo-controlled trials of covid-19 vaccines. Cad Saúde Pública [Internet]. 2021 [acesso 10 jan 2023];37(6):e00007221. DOI: 10.1590/0102-311X00007221 .

Com relação à ética em pesquisa, um obstáculo quase intransponível ao uso de placebos em ECR de intervenções profiláticas quando existem vacinas comprovadamente eficazes é que, dependendo da doença/condição a ser prevenida, nenhuma intervenção ou administração de um comparador inativo (placebo) aos participantes do grupo de controle implica sujeitá-los ao risco de danos graves ou irreversíveis3434. Paumgartten. Op. cit. p. 491. que poderiam ser minimizados ou evitados usando um comparador ativo (por exemplo, outra vacina de eficácia comprovada).

Portanto, a exceção da DoH que tornaria aceitável o uso de controles com placebo em alguns ECR quando existem comparadores de eficácia comprovada não é prontamente aplicável para intervenções profiláticas. Por exemplo, em ECR de vacinas contra infecções virais respiratórias potencialmente graves e com risco de vida, como a covid-19 e alguns vírus da gripe, não vacinar os participantes dos grupos de controle significa correr riscos de danos graves e irreversíveis que poderiam ser evitados.

Se um ECR anterior demonstrou a eficácia de outras vacinas para a infecção sendo investigada, estudos adicionais sobre produtos imunizantes para a mesma doença contagiosa devem sempre usar comparadores ativos em vez de inativos3737. Oliveira ACAX, Paumgartten FJR. Ethical issues in placebo-controlled trials of covid-19 vaccines. Cad Saúde Pública [Internet]. 2021 [acesso 10 jan 2023];37(6):e00007221. DOI: 10.1590/0102-311X00007221 . Isso se aplica a qualquer estudo de eficácia de vacina envolvendo homens e/ou mulheres, gestantes ou não.

Ensaios de vacinas e outras intervenções profiláticas em gestantes

Terapias medicamentosas e intervenções profiláticas destinadas ao tratamento de mulheres não grávidas e gestantes são geralmente testadas primeiro em homens e mulheres não grávidas e, se comprovadamente eficazes e seguras para essa população, um ECR adicional é realizado com gestantes3838. Food and Drug Administration. Additional protections for pregnant women, human fetuses and neonates involved in research. FDA [Internet]. 2018 [acesso 23 dez 2021]. Disponível: https://bit.ly/3HOx0WV
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A população grávida ser a última em uma abordagem gradual é uma medida preventiva, uma vez que não apenas um conjunto completo de dados de estudos de segurança não clínicos – testes de toxicidade reprodutiva e de desenvolvimento (Dart) em animais – estará disponível, mas também dados clínicos sobre a eficácia e segurança para adultos, para uma avaliação completa dos riscos para a mãe e o feto3838. Food and Drug Administration. Additional protections for pregnant women, human fetuses and neonates involved in research. FDA [Internet]. 2018 [acesso 23 dez 2021]. Disponível: https://bit.ly/3HOx0WV
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. Por outro lado, se um ECR anterior não demonstrar eficácia em mulheres não grávidas, mães e fetos são poupados de serem desnecessariamente expostos a intervenções que lhes possam ser ineficazes.

No que diz respeito a vacina ou outro método profilático, a inclusão de placebo ou de não tratamento em estudos destinados a avaliar principalmente a segurança – e não a eficácia clínica – da intervenção para gestantes não expõe necessariamente as mães receptoras de placebo e seus fetos a um risco significativo de danos graves e irreversíveis, se a duração do estudo for suficientemente curta. Medidas não farmacológicas concomitantes de proteção são tomadas, e os participantes desprotegidos recebem uma vacina comprovadamente eficaz o mais rápido possível depois que o código de cegamento do estudo é quebrado e os dados obtidos podem ser analisados.

Em outras palavras, se a segurança, e não a eficácia clínica, for o objetivo principal do estudo, um risco relativamente maior para os participantes do grupo de controle com placebo continua existindo, mas o excesso pode ser minimizado de modo que os riscos tomados pelos participantes do grupo de controle e do grupo experimental sejam igualmente baixos.

A inclusão de não tratamento ou controle com placebo em estudos que testam a eficácia clínica de métodos vacinais/profiláticos inevitavelmente sujeita participantes saudáveis a um risco de danos graves e irreversíveis. Se a vacina (ou intervenção profilática) for de fato eficaz, esse risco deve ser maior do que o tomado pelos participantes alocados ao grupo experimental. De fato, alguns dos sujeitos desprotegidos devem adoecer durante o estudo para atingir o número alvo de participantes infectados necessário para eventualmente provar ou refutar a hipótese de que o produto imunizante (vacina) é eficaz3636. Orenstein WA, Bernier RH, Dondero TJ, Hinman AR, Marks JS, Bart KJ et al. Field evaluation of vaccine efficacy. Bull World Health Organ [Internet]. 1985 [acesso 10 jan 2023];63(6):1055-6. Disponível: https://bit.ly/3RT8qsI
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Entretanto, quando uma vacina ou outro produto profilático está pronto para ser testado em um estudo de fase 3 na gravidez, os investigadores clínicos estão cientes de que a intervenção profilática já foi comprovada como eficaz e segura para homens e mulheres não grávidas. Ademais, no que diz respeito às vacinas, os pesquisadores clínicos estão cientes de que, em estudos anteriores de fases 1 e 2 com gestantes, o produto testado suscitou respostas imunogênicas clinicamente relevantes (como o aumento dos níveis sanguíneos de anticorpos neutralizantes)3939. Steensels D, Pierlet N, Penders J, Mesotten D, Heylen L. Comparison of SARS-CoV-2 antibody response following vaccination with BNT162b2 and mRNA-1273. JAMA [Internet]. 2021 [acesso 10 jan 2023];326(15):1533-5. DOI: 10.1001/jama.2021.15125

40. Cromer D, Steain M, Reynaldi A, Schlub TE, Wheatley AK, Juno JA et al. Neutralising antibody titres as predictors of protection against SARS-CoV-2 variants and the impact of boosting: a meta-analysis. Lancet Microbe [Internet]. 2021 [acesso 10 jan 2023];3(1):e52-61. DOI: 10.1016/S2666-5247(21)00267-6
- 4141. Khoury DS, Cromer D, Reynaldi A, Schlub TE, Wheatley AK, Juno JA et al. Neutralizing antibody levels are highly predictive of immune protection from symptomatic SARS-CoV-2 infection. Nat Med [Internet]. 2021 [acesso 10 jan 2023];27(7):1205-11. Disponível: https://go.nature.com/3RLruZE
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Embora não seja uma medida direta de “eficácia” (ou seja, não adoecer é o melhor desfecho primário para a eficácia clínica), o aumento dos níveis de anticorpos neutralizantes induzido pela vacina é uma resposta imunogênica (ou seja, um desfecho substituto válido para a eficácia) que prediz sua eficácia clínica4141. Khoury DS, Cromer D, Reynaldi A, Schlub TE, Wheatley AK, Juno JA et al. Neutralizing antibody levels are highly predictive of immune protection from symptomatic SARS-CoV-2 infection. Nat Med [Internet]. 2021 [acesso 10 jan 2023];27(7):1205-11. Disponível: https://go.nature.com/3RLruZE
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Juntas, uma eficácia clínica comprovada para homens e mulheres não grávidas e uma poderosa resposta imunogênica em gestantes indicam de forma confiável que a vacina investigada deve proteger esse grupo específico de mulheres também. Nessas circunstâncias, é muito improvável que produtos imunizantes comprovadamente eficazes e seguros para mulheres não grávidas não conferissem um grau de proteção clinicamente significativo para gestantes. A proteção materna adquirida se estende ao feto, pois os anticorpos neutralizantes – adquiridos por infecção natural ou vacinação – são transferidos pela placenta e, após o nascimento, pelo leite materno4242. Flannery DD, Gouma S, Dhudasia MB, Mukhopadhyay S, Pfeifer MR, Woodford EC et al. Assessment of maternal and neonatal cord blood SARS-CoV-2 antibodies and placental transfer ratios. JAMA Pediatr [Internet]. 2021 [acesso 10 jan 2023];175(6):594-600. DOI: 10.1001/jamapediatrics.2021.0038 .

Diante desses fatos, surge a questão de saber se a exposição de um grupo de participantes grávidas “receptoras de placebo” (e/ou “não tratamento”) a riscos de danos graves e irreversíveis é eticamente justificável. Nesse caso específico, os participantes do grupo de controle são expostos a riscos de graves danos à saúde para confirmar a eficácia protetora que havia sido antecipada por estudos anteriores com o mesmo produto, ou seja, que o agente imunizante a ser testado é clinicamente eficaz também para gestantes.

Dependendo da doença contagiosa evitável pela imunização, as consequências prejudiciais à saúde de comparadores inativos (placebos) para gestantes podem ser maiores do que as consequências prejudiciais à saúde de comparadores inativos para mulheres não grávidas e homens. Por exemplo, foi relatado que, em comparação com mulheres não grávidas, gestantes apresentam maiores taxas de morbidade e mortalidade associadas a algumas infecções respiratórias virais, como a gripe (H1N1) e a covid-191515. Carlson A, Thung SF, Norwitz ER. H1N1 Influenza in pregnancy: what all obstetric care providers ought to know. Rev Obstet Gynecol [Internet]. 2009 [acesso 10 jan 2023];2(3):139-45. Disponível: https://bit.ly/3DU6uKq
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, 4343. Subbaraman N. Pregnancy and covid: what the data say. Nature [Internet]. 2021 [acesso 10 jan 2023];591(7849):193-5. DOI: 10.1038/d41586-021-00578-y . Por isso, gestantes são geralmente consideradas um grupo prioritário nas campanhas de vacinação contra essas infecções.

Em resumo, mesmo que não haja um estudo clínico sobre a eficácia do produto imunizante em gestantes, uma prova de sua eficácia para mulheres não grávidas, aliada a uma demonstração clínica e não clínica de que é seguro na gravidez, e uma resposta imunogênica de magnitude clinicamente significativa em gestantes devem ser consideradas suficientes para assumir que – até prova em contrário – o produto é eficaz (e seguro) também na gravidez.

Em outras palavras, em ECR elaborados para confirmar a eficácia a uma população gestante de uma vacina comprovadamente eficaz (e segura) para mulheres não grávidas, que causou uma forte resposta imunogênica em gestantes, e que os estudos pré-clínicos não mostraram nenhuma evidência de que poderia ser tóxica para o desenvolvimento, não existiriam razões metodológicas convincentes e cientificamente sólidas [para afirmar que] o uso de placebo é necessário para determinar a eficácia ou segurança da intervenção 3434. Paumgartten. Op. cit. p. 491. .

De qualquer forma, como um grupo tratado com placebo (ou não tratamento) em estudos de eficácia de vacinas implica assumir um risco significativo de danos graves ou irreversíveis 3434. Paumgartten. Op. cit. p. 491. para os participantes do controle, grávidas ou não, a exceção aberta pela DoH para uso de placebo – quando existe uma intervenção comprovadamente eficaz – não é aplicável.

Além disso, mesmo que a eficácia de uma nova vacina não tenha sido avaliada diretamente pelo ECR controlado com placebo, o grau de proteção de gestantes por esse produto imunizante (ou seja, a eficácia da vacina em cenários reais) pode ser avaliado por estudos observacionais. Essa confirmação de eficácia e segurança por estudos epidemiológicos é viável se as gestantes forem vacinadas com o produto em campanhas de imunização em massa.

Por exemplo, um estudo observacional longitudinal envolvendo uma grande coorte com 10.861 gestantes vacinadas (vacina covid-19 mRNA BNT162b2), pareado com 10.861 controles de gestantes não vacinadas, foi realizado após uma campanha de vacinação em massa em Israel4444. Dagan N, Barda N, Biron-Shental T, Makov-Assif M, Key C, Kohane IS et al. Effectiveness of the BNT162b2 mRNA covid-19 vaccine in pregnancy. Nat Med [Internet]. 2021 [acesso 10 jan 2023];27(10):1693-5. DOI: 10.1038/s41591-021-01490-8 . A eficácia vacinal estimada – após a segunda dose – foi de 96% (intervalo de confiança [IC] de 95%, 89-100%) para qualquer infecção sintomática comprovada e 97% (91-100%) e 89% (IC 95%, 43-100%) para as hospitalizações relacionadas à infecção pelo SARS-CoV-2, uma eficácia comparável à estimada para a população em geral4444. Dagan N, Barda N, Biron-Shental T, Makov-Assif M, Key C, Kohane IS et al. Effectiveness of the BNT162b2 mRNA covid-19 vaccine in pregnancy. Nat Med [Internet]. 2021 [acesso 10 jan 2023];27(10):1693-5. DOI: 10.1038/s41591-021-01490-8 .

Os dados produzidos pelo grande estudo observacional de mulheres imunizadas com uma vacina covid-19 mRNA durante a gravidez são consistentes com o ponto de vista aqui apresentado de que uma forte resposta imunogênica em uma população de gestantes, pareada com uma eficácia previamente demonstrada para mulheres não grávidas, prediz de forma confiável a eficácia de um produto para gestantes4444. Dagan N, Barda N, Biron-Shental T, Makov-Assif M, Key C, Kohane IS et al. Effectiveness of the BNT162b2 mRNA covid-19 vaccine in pregnancy. Nat Med [Internet]. 2021 [acesso 10 jan 2023];27(10):1693-5. DOI: 10.1038/s41591-021-01490-8 . A suposição de que o mesmo vale para outras vacinas contra a covid-19 – como vírus inativado e agentes imunizantes baseados em vetores adenovirais – é, portanto, plausível.

Em resumo, o uso de placebos em vez de comparadores ativos é eticamente inaceitável em qualquer ECR, se existirem tratamentos terapêuticos ou profiláticos eficazes e seguros para a doença e se “não tratamento” ou comparadores inativos implicarem riscos de danos graves ou irreversíveis aos participantes. Estudos de eficácia clínica de vacinas inevitavelmente deixam os participantes de grupos de controle ou controle com placebo não tratados desprotegidos e, portanto, expostos a um risco maior de serem infectados. Portanto, se disponível, um comparador ativo deve ser empregado nesses casos.

Sugerimos que esse raciocínio seja estendido para abranger qualquer uso de placebo na fase 3 de ensaios clínicos de vacinas na gravidez. Sustentamos que uma demonstração clara da eficácia da vacina para mulheres não grávidas e homens, e uma resposta imunogênica comparável em gestantes, é suficiente para prever com segurança a eficácia para essa população. Essa é uma hipótese altamente plausível a ser confirmada por estudos observacionais da eficácia da vacina em cenários de uso real. Além de implicar riscos de danos graves aos participantes não vacinados, não existem “razões metodológicas convincentes e cientificamente sólidas” de que o uso de placebos é necessário nesse caso.

Considerações finais

Gestantes estão sub-representadas em estudos clínicos de medicamentos potencialmente benéficos e tal desigualdade de participação em pesquisas tem sido cada vez mais questionada. Em geral, quando um medicamento ou método profilático (vacina) se destina a mulheres não grávidas e grávidas, este é primeiramente testado clinicamente na população não grávida e, se provado eficaz e seguro para essa população, um estudo confirmatório de fase 3 é realizado com as gestantes. Espera-se que essa ordem de testes proteja melhor a mãe e o nascituro.

Entretanto, estudos envolvendo população grávida apresentam um problema ético se a eficácia clínica for determinada pela comparação dos dados de um grupo de intervenção com os de um grupo de controle com placebo. Como explicitamente declarado na DoH, o uso de placebo é eticamente inadmissível se uma intervenção comprovadamente eficaz e segura para a condição médica investigada estiver disponível. Em caso afirmativo, deve ser usado um comparador ativo para verificar a eficácia clínica do produto em teste. A revisão de 2008 da DoH apresenta uma exceção que permite o uso de placebo se houver tratamento eficaz, se houver razões científicas convincentes para usar um comparador inativo (ou não tratamento) no estudo e somente se o uso de placebo não implicar exposição dos participantes a riscos de danos graves e/ou irreversíveis.

Quando um estudo é realizado para investigar a eficácia clínica de uma vacina, os participantes alocados a um grupo de controle com placebo, gestantes ou não, são inevitavelmente expostos ao agente infeccioso – eles permanecem desprotegidos – e, consequentemente, a riscos de danos graves e irreversíveis. Portanto, se existem vacinas comprovadamente eficazes e seguras, o uso de um comparador ativo em vez de um inativo é um procedimento eticamente obrigatório.

Neste artigo, defendemos que existe uma preocupação ética sobre o uso de placebo, mesmo que não haja vacina demonstrada como clinicamente eficaz em gestantes. Como parte de uma pesquisa clínica por etapas, a eficácia clínica de um produto imunizante na gravidez ocorre após estudos anteriores confirmarem sua eficácia e segurança para mulheres não grávidas. Além disso, quando os testes em gestantes começam, a eficácia clínica e segurança para mulheres não grávidas e homens já foi demonstrada, além da disponibilidade de dados não clínicos e clínicos sobre a segurança para gestantes e sobre a magnitude da resposta imunogênica induzida nessa população, um preditor substituto confiável da eficácia clínica geral.

Nessas circunstâncias, surge uma questão: seria eticamente aceitável expor um grupo de gestantes tratadas com placebo a danos graves/irreversíveis apenas para confirmar o que os dados clínicos previamente obtidos indicaram fortemente?

O fato de que algumas infecções preveníveis por vacinas representam maiores riscos à saúde de gestantes do que de mulheres não grávidas reforça o argumento de que o uso de placebo em estudos de eficácia de vacinas na gravidez é antiético.

Por fim, ressalta-se que a eficácia e a segurança de uma vacina para gestantes podem ser avaliadas de forma confiável por estudos observacionais realizados após o uso do produto em campanhas de vacinação em massa que não excluam essa população4545. Shook LL, Fallah PN, Silberman JN, Edlow AG. Covid-19 vaccination in pregnancy and lactation: current research and gaps in understanding. Front Cell Infect Microbiol [Internet]. 2021 [acesso 10 jan 2023];11:735394. DOI: 10.3389/fcimb.2021.735394 .

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Maio 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    04 Jan 2022
  • Revisado
    11 Jan 2023
  • Aceito
    13 Jan 2023
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