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Psicometria brasileira da escala do medo da morte de Collett-Lester

Resumo

Estudo metodológico para avaliar a confiabilidade da escala de medo da morte de Collett-Lester e relacioná-la com a escala de bem-estar espiritual em amostra de 279 pessoas. A estrutura multifatorial da escala foi confirmada por quatro dimensões e 24 itens. A consistência interna obteve α de Cronbach: 0,951. A estabilidade foi confirmada pela correlação de Pearson (r=0,87 e p =0,000). A correlação escala de medo da morte de Collett-Lester ocorreu com três dos quatro fatores da escala de bem-estar espiritual, sendo positiva e variando de magnitudes fracas a moderadas. A escala de medo da morte de Collett-Lester se mostrou confiável à realidade brasileira.

Bioética; Morte; Psicometria

Abstract

Methodological study conducted with 279 individuals to evaluate the reliability of the Collett-Lester fear of death scale and relate it to the spiritual well-being scale. Its multifactorial structure was confirmed by four dimensions and 24 items. Internal consistency obtained Cronbach’s α of 0.951. Pearson’s correlation (r=0.87 and p =0.000) confirmed stability. Collett-Lester fear of death scale showed positive correlation with three of the four spiritual well-being scale items, ranging from weak to moderate magnitudes. The Collett-Lester fear of death scale proved to be reliable for the Brazilian reality.

Bioethics; Death; Psychometry

Resumen

Estudio metodológico que evalúa la confiabilidad de la escala de miedo a la muerte de Collett-Lester y la relaciona con la escala de bienestar espiritual en una muestra de 279 personas. La estructura multifactorial de la escala se confirmó en cuatro elementos y 24 ítems. La consistencia interna obtuvo el α de Cronbach de 0,951. La estabilidad se confirmó mediante la correlación de Pearson (r=0,87 y p =0,000). La correlación de la escala de miedo a la muerte de Collett-Lester ocurrió con tres de los cuatro factores de la escala de bienestar espiritual, siendo positiva y variando de magnitudes bajas a moderadas. La escala de miedo a la muerte de Collett-Lester es confiable al contexto brasileño.

Bioética; Muerte; Psicometría

Morte e nascimento são dois fenômenos inerentes à vida e constituem episódios naturais da existência humana. Crenças culturais e religiosas ajudam a moldar as atitudes diante da morte, entretanto, para algumas pessoas, há dificuldade de enfrentar e encarar o fim da vida 11. Silveira LC, Brito MB, Portella SDC. Os sentimentos gerados nos(as) profissionais enfermeiros(as) diante o processo morte/morrer do paciente. Revista Enfermagem Contemporânea [Internet]. 2013 [acesso 14 fev 2023];4(2):152-69. DOI: 10.17267/2317-3378rec.v4i2.256
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, 22. Souza MCS, Sousa JM, Lago DMSK, Borges MS, Ribeiro LM, Guilherm DB. Avaliação do perfil de atitudes acerca da morte: estudo com graduandos da área de saúde. Texto Contexto Enferm [Internet]. 2017 [acesso 14 fev 2023];26(4):e3640016. DOI: 10.1590/0104-07072017003640016
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Reflexões sobre sentido da vida, existência da alma e possibilidade de vida após a morte são crenças que ancoram comportamentos diante do processo de morte entre os seres humanos. Essas condutas podem ser percebidas e definidas por intermédio de diferentes perspectivas, de natureza positiva ou negativa. As posturas positivas são classificadas como aceitação da morte, enquanto as negativas denotam o medo e o evitamento da morte. O medo da morte é caracterizado pelo pavor que essa possibilidade causa no indivíduo, enquanto o evitamento é definido pela atitude de fazer o possível para não pensar ou falar sobre o tema 22. Souza MCS, Sousa JM, Lago DMSK, Borges MS, Ribeiro LM, Guilherm DB. Avaliação do perfil de atitudes acerca da morte: estudo com graduandos da área de saúde. Texto Contexto Enferm [Internet]. 2017 [acesso 14 fev 2023];26(4):e3640016. DOI: 10.1590/0104-07072017003640016
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Tal situação está intimamente ligada ao medo do desconhecido expressado na concepção de finitude da vida, que causa grande temor e negação. Presente em todas as crenças, valores e culturas, a morte é um dos maiores enigmas que povoa o pensamento humano 33. Praxedes AM, Araújo JL, Nascimento EGC. A morte e o morrer no processo de formação do enfermeiro. Psicol Saúde Doenças [Internet]. 2018 [acesso 14 fev 2023];19(2):369-76. DOI: 10.15309/18psd190216
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É importante evidenciar que a população, em geral, encara a morte com distanciamento e restrições e a considera um fenômeno desprezível. Nesse cenário, as palavras morte e morrer são associadas, seguidamente, a sentimentos de dor, separação e perda. Com isso, a sociedade contemporânea tende a fugir e a se esquivar desse tema, fazendo dele um tabu e algo extremamente temível durante a vida 44. Perboni JS, Zilli F, Oliveira SG. Profissionais de saúde e o processo de morte e morrer dos pacientes: uma revisão integrativa. Pers Bioét [Internet]. 2018 [acesso 14 fev 2023];22(2):288-302. DOI: 10.5294/pebi.2018.22.2.7
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Com os avanços da ciência médica, a morte tornou-se um evento mais previsível e esperado, e as taxas de mortalidade passaram a ser controladas pela medicina. Aos profissionais da área da saúde, sobretudo aos médicos, foram atribuídas a capacidade, mediante os avanços tecnológicos das ciências, de diminuir as taxas de mortalidade e, consequentemente, a responsabilidade pelo prolongamento da vida. A morte deixa de ser evento natural e parte da existência para ser resultado de alterações patológicas, decorrentes de doenças graves. O momento que marca o fim da vida, em alguns casos, resulta na substituição do ambiente familiar pela área hospitalar, em que o indivíduo passa a ser atendido por terapeutas e equipes de saúde 33. Praxedes AM, Araújo JL, Nascimento EGC. A morte e o morrer no processo de formação do enfermeiro. Psicol Saúde Doenças [Internet]. 2018 [acesso 14 fev 2023];19(2):369-76. DOI: 10.15309/18psd190216
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O medo da morte é universal e está relacionado ao instinto de conservação da vida. Ele é importante porque leva o indivíduo a defender sua existência, lutando ou fugindo se for atacado, e a evitar situações que podem pôr sua sobrevivência em risco. O medo da morte pode também levá-lo a adotar comportamentos saudáveis para conservar a saúde e, consequentemente, a vida, o maior tempo possível. No entanto, em certas circunstâncias, pode tornar-se patológico, inibindo suas ações e o impossibilitando de desfrutar da vida 55. Salomé GM, Cavali A, Espósito VHC. Sala de emergência: o cotidiano das vivências com a morte e o morrer pelos profissionais de saúde. Rev Bras Enferm [Internet]. 2009 [acesso 14 fev 2023];62(5):681-6. DOI: 10.1590/S0034-71672009000500005
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O ser humano é o único ser vivo que tem consciência da sua mortalidade 66. Sherman DW, Norman R, McSherry CB. A comparison of death anxiety and quality of life of patients with advanced cancer or AIDS and their family caregivers. J Assoc Nurses AIDS Care [Internet]. 2010 [acesso 14 fev 2023];21(2):99-112. DOI: 10.1016/j.jana.2009.07.007
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, mesmo que seu inconsciente não a aceite. Em determinado momento, o homem é capaz de compreender sua finitude 77. Kübler-Ross E. On death and dying. London: Routledge; 1973. . O medo existente em relação ao fenômeno da morte está intimamente ligado a essa consciência 88. Solomon S, Greenberg J, Pyszczynski T. The cultural animal: twenty years of terror management theory and research. In: Greenberg J, Koole SL, Pyszczynski T, editors. Handbook of experimental existential psychology. New York: Guilford Press; 2004. p. 13-34. .

Há dois grandes medos que o ser humano enfrenta quando se depara com seu momento final: o medo da dor física que antecede a morte, e dessa dor no momento da morte, e o medo da solidão e do abandono, de morrer sem ninguém ao seu lado. Além disso, existem outros medos que permeiam esse momento: o medo de deixar de fazer as coisas que atualmente faz na vida, o medo de como será sua existência após a temida morte, o medo de como ficarão os familiares e amigos, o medo de não ter vivido todas as sensações possíveis de serem vividas antes de morrer 99. Hennezel M, Leloup JY. A arte de morrer: tradições religiosas e espiritualidade humanista diante da morte na atualidade. Petrópolis: Vozes; 2005. .

O medo da morte pode ser decorrente de diversos fatores, como o desconhecimento sobre o que acontece depois de morrer, a incerteza sobre como ter de deixar a vida, o apego a bens materiais e a própria pretensão humana de uma vida longa 1010. Sartori AV, Battistel ALHT. A abordagem da morte na formação de profissionais e acadêmicos da enfermagem, medicina e terapia ocupacional. Cad Bras Ter Ocup [Internet]. 2017 [acesso 14 fev 2023];25(3):497-508. DOI: 10.4322/2526-8910.ctoAO0770
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O homem é envolto do medo da morte. O próprio ciclo da vida leva o ser humano a temê-la. O discurso sobre a morte ao longo da vida humana, implícita ou explicitamente, registra o medo desse desfecho, que se reveste de duas faces: a primeira se refere ao medo da morte dos outros. As pessoas podem sentir medo de que outras pessoas morram. Em segundo lugar, a partir ou não dessa primeira experiência ou contato, as pessoas passam a ter medo da sua própria morte 1111. Oliveira ES, Agra G, Morais MF, Feitosa IP, Gouveia BLA, Costa MML. O processo de morte e morrer na percepção de acadêmicos de enfermagem. Rev Enferm UFPE On Line [Internet]. 2016 [acesso 14 fev 2023];10(5):1709-16. DOI: 10.5205/reuol.9003-78704-1-SM.1005201617
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Nesse sentido, a escala de avaliação do medo da morte de Collett-Lester (EMMCL) foi elaborada nos Estados Unidos e publicada inicialmente no Journal of Psychology , pelo Serviço de Prevenção e Crise do Suicídio em 1969. No entanto, ela só foi publicada formalmente quase três décadas depois, após ter sido revisada por um de seus autores. Essa escala foi desenvolvida na tentativa de resolver as divergências da heterogeneidade de conteúdo observadas em outras escalas destinadas a medir o medo da morte que já haviam sido desenvolvidas na época. A escala produzida por esses autores não contempla itens relativos a funerais e cemitérios 1212. Lester D. The Collett-Lester fear of death scale: the original version and a revision. Death Stud [Internet]. 1990 [acesso 14 fev 2023];14(5):451-68. DOI: 10.1080/07481189008252385
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Collett e Lester, na elaboração da EMMCL, procederam à distinção entre morte e processo de morrer e entre as atitudes de enfrentamento da morte da própria pessoa e de alguém próximo. Essa forma multidimensional de avaliar o fenômeno da morte deu origem a quatro diferentes subescalas:

  1. Medo da sua própria morte: diz a respeito à ansiedade em relação a sua própria finitude, o fim como desfecho, o deixar de existir;

  2. Medo do seu processo de morrer: é a ansiedade quanto a um percurso de sofrimento que conduz à morte, que pode estar associado a alguma doença prolongada, a sua morte lenta e dolorosa;

  3. Medo da morte dos outros: se refere ao sentimento diante da possibilidade de morte de pessoas queridas, geralmente associado à dificuldade de desapego; e

  4. Medo do processo de morrer dos outros: refere-se aos sentimentos diante da possibilidade de doença dolorosa e morte lenta de pessoas queridas 1212. Lester D. The Collett-Lester fear of death scale: the original version and a revision. Death Stud [Internet]. 1990 [acesso 14 fev 2023];14(5):451-68. DOI: 10.1080/07481189008252385
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    13. Collett LJ, Lester D. The fear of death and the fear of dying. J Psychol [Internet]. 1969 [acesso 14 fev 2023];72(2):179-81. DOI: 10.1080/00223980.1969.10543496
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    - 1414. Lester D. The Collett-Lester fear of death scale. In: Neimeyer RA, editor. Death anxiety handbook: research, instrumentation and application. New York: Taylor and Francis; 1994. p. 121-48. .

A EMMCL original de Collett e Lester apresentava 36 itens: nove referentes à medida do medo da própria morte, dez itens relacionados à medida do medo da morte dos outros, seis itens relativos ao medo do seu processo de morrer e 11 itens avaliavam o medo do processo de morrer dos outros. Como os fatores agrupavam os itens de formas diferentes, isso dificultava sua utilização em investigações e na escrita de artigos. Alguns itens estavam formulados na forma positiva e outros na forma negativa. Na escala original, os itens eram formulados na primeira pessoa. A ideia de se criar uma escala dividida por fatores vem da possibilidade de espelhar a natureza multidimensional dos sentimentos experimentados acerca da morte. Embora a escala tenha sido recentemente publicada, ela já vinha sendo amplamente utilizada em diversos estudos por pedido direto aos autores. Foram encontrados resultados relativos à sua validade e garantia, bem como à adequação e à utilidade no contexto da mensuração do constructo medo da morte 1313. Collett LJ, Lester D. The fear of death and the fear of dying. J Psychol [Internet]. 1969 [acesso 14 fev 2023];72(2):179-81. DOI: 10.1080/00223980.1969.10543496
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, 1414. Lester D. The Collett-Lester fear of death scale. In: Neimeyer RA, editor. Death anxiety handbook: research, instrumentation and application. New York: Taylor and Francis; 1994. p. 121-48. .

Uma vez que foram identificadas muitas dificuldades na escala original, tanto para seu emprego nos trabalhos como para escrita e análise de resultados, Lester propôs uma reformulação no instrumento, a fim de tornar homogêneo o número de itens nas quatro subescalas (oito itens para cada). Ele procedeu a uma apresentação sequencial dos itens relativos a cada escala em vez de intercalar itens de várias escalas diferentes. Dessa forma, Lester eliminou alguns itens da escala original, gerou itens novos e alterou significativamente sua ordem de apresentação e sua formulação (passou da primeira para a terceira pessoa) 1212. Lester D. The Collett-Lester fear of death scale: the original version and a revision. Death Stud [Internet]. 1990 [acesso 14 fev 2023];14(5):451-68. DOI: 10.1080/07481189008252385
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A escala foi, então, totalmente concluída, revista e publicada, contendo 32 itens. Procedeu-se à análise psicométrica da escala mediante estudos que testaram sua confiabilidade por meio de teste-reteste e verificaram-se sua consistência interna, a análise fatorial dos fatores e as correlações. Embora esses estudos não tenham mostrado uma análise psicométrica muito sólida, Lester concluiu que com essa revisão conseguiu níveis razoáveis de evidência de validade, confiabilidade e utilidade para os investigadores da área 1414. Lester D. The Collett-Lester fear of death scale. In: Neimeyer RA, editor. Death anxiety handbook: research, instrumentation and application. New York: Taylor and Francis; 1994. p. 121-48. . Em 2003, foram eliminados os itens de cada fator que não contribuíram para a significância do coeficiente α de Cronbach, resultando em uma versão final com 28 itens – que é utilizada até os dias atuais 1515. Lester D, Abdel-Khalek A. The Collett-Lester fear of death scale: a correction. Death Stud [Internet]; 2003 [acesso 14 fev 2023];27(1):81-5. DOI: 10.1080/07481180302873
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A EMMCL tem sido amplamente validada em diversos países e continentes. Os estudos anteriores são considerados parâmetros para novas pesquisas. O Quadro 1 mostra a comparação entre os estudos de validação da EMMCL quanto à avaliação psicométrica.

Quadro 1
Comparação da análise fatorial, confiabilidade interna e correlação da EMMCL em diversos países

Esta pesquisa objetivou realizar uma avaliação das propriedades psicométricas da EMMCL em uma versão adaptada ao português do Brasil, com evidência de validade da estrutura interna da EMMCL, por meio da análise fatorial exploratória, com testagem de sua confiabilidade, e relacionando a escala de bem-estar espiritual (EBE) com a EMMCL.

Método

Este é um estudo de abordagem quantitativa, do tipo metodológico, descritivo e analítico. Os participantes do estudo eram residentes em Pouso Alegre/MG, com diversos níveis de escolaridade, de diferentes classes sociais e moravam tanto na zona urbana quanto na rural. A amostra foi composta por 279 participantes, com média de idade de 40,75 anos (DP=15,45), sendo a maioria do sexo feminino (67,7%).

O número de participantes deste estudo foi calculado para se obter soluções fatoriais estáveis. Para isso, foi utilizado o critério razão itens/sujeito. Para estabelecer o tamanho da amostra, deve-se utilizar no mínimo cinco participantes para cada item 2424. Pasquali L. Instrumentação psicológica: fundamentos e práticas. Porto Alegre: Artmed; 2010. . Portanto, para este estudo, foram utilizados 9,95 entrevistados, considerando o tamanho da amostra mencionado anteriormente. A amostragem foi do tipo não probabilístico por conveniência ou acidental.

Para conseguir uma amostragem com maior credibilidade, foi realizado o pré-teste, para possíveis dúvidas sobre os itens da EMMCL e identificação de vieses. Para que se obtivesse amostra heterogênea e diversificada, foram selecionados, de forma geral, os seguintes segmentos sociais, que compuseram os integrantes do estudo: usuários que aguardavam atendimento médico na unidade básica de saúde; residentes em bairros da zona urbana e rural; profissionais de saúde da rede municipal; docentes de um programa de mestrado em bioética; acadêmicos dos cursos de medicina, enfermagem e fisioterapia; líderes religiosos de igrejas católicas e evangélicas; professores do ensino médio; pessoas que viviam em situação de rua e que frequentavam um centro de acolhimento. Os participantes não apresentaram dúvidas ou dificuldades quanto aos itens dos instrumentos adotados.

Utilizou-se a técnica de autopreenchimento com os participantes de nível de escolaridade superior completo e incompleto. Com os demais, adotou-se o heteropreenchimento dos instrumentos. Os critérios de inclusão foram: pessoas de ambos os sexos, idade igual ou superior a 18 anos, pessoas com capacidades cognitivas e de comunicação preservadas (confirmadas pela aplicação do instrumento de caracterização sociodemográfica e de saúde dos entrevistados).

Os critérios de exclusão consistiram em: pessoas que viveram um momento de luto recentemente, pessoas que se recusaram a responder todos os instrumentos ou parte deles, assim como questões e itens do instrumento, e indivíduos que residiam em instituições de longa permanência para idosos (Ilpi) e que estavam hospitalizados.

A EMMCL, adaptada transculturalmente à língua portuguesa do Brasil, é formada por quatro fatores de sete itens cada, consistindo em escala multidimensional. Seus fatores são: 1) medo da própria morte; 2) medo do próprio processo de morrer; 3) medo da morte de outros; e 4) medo do processo de morrer de outros. As respostas são do tipo Likert e variam de 1 (nada) a 5 (muito). Cada item é composto por cinco níveis de intensidade do medo, que variam entre 1 (nada) e 5 (muito), e deve-se marcar apenas uma resposta em cada item. Os escores são obtidos para a escala total e para cada fator por meio da média das respostas. Os escores médios mais altos indicam maior medo da morte ou do processo de morrer e vice-versa. Essa escala tem sido utilizada e validada em diversas áreas de pesquisa e ainda tem sido adaptada para uso em outros idiomas e países 2525. Oliveira CR Jr, Machado DR, Santos FS, Silva JV, Domingues EAR. Adaptação transcultural da Collett-Lester Fear of Death Scale à realidade brasileira. Rev Pesqui Cuid Fundam [Internet]. 2018 [acesso 14 fev 2023];10(1):210-6. DOI: 10.9789/2175-5361.2018.v10i1.210-216
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Na escala original, não há dados referentes à análise fatorial concernente ao mínimo de carga fatorial e variância total. Com relação à confiabilidade, para estabelecer a consistência interna, utilizou-se o teste α de Cronbach, que apresentou na escala original os seguintes dados: fator 1: medo da própria morte (α de Cronbach=91); fator 2: medo do próprio processo de morrer (α de Cronbach=89); fator 3: medo da morte de outros (α de Cronbach=72); e fator 4: medo do processo de morrer dos outros (α de Cronbach=87).

A EBE é uma das pioneiras no tema da espiritualidade e religiosidade. O bem-estar espiritual é entendido como uma sensação de bem-estar experimentada quando se encontra um propósito de vida, que envolve um significado último para a existência. Essa sensação é uma síntese de saúde, um sentimento de completude e de satisfação com a vida, de paz consigo mesmo e com o mundo.

Para elaborar essa escala, os autores se basearam em estudos que indicavam uma dimensão vertical e outra horizontal para o bem-estar espiritual, as quais se tornaram os dois fatores medidos pela escala: o bem-estar religioso – a análise da dimensão vertical, da satisfação na conexão pessoal com Deus ou algo considerado transcendente – e o bem-estar existencial – a análise da dimensão horizontal referente à percepção de um propósito de vida independente de ser ou não religioso.

Essa escala foi influenciada pela tendência de se avaliar a qualidade de vida nos Estados Unidos, onde havia no referido período um movimento de mensurar esse aspecto por meio de indicadores sociais objetivos. Nesse momento, cada vez mais passou a ganhar espaço o reconhecimento de que as medidas objetivas não eram suficientes para compreender a complexidade do constructo 2626. Paloutzian RF, Ellison CW. Loneliness, spiritual well-being and the quality of life. In: Peplau LA, Perlman D, editors. Loneliness: a sourcebook of current theory, research and therapy. Hoboken: Wiley; 1982. p. 224-37. .

As propriedades psicométricas no Brasil foram evidenciadas pelas análises fatoriais e a solução de dois fatores foi a mais adequada, explicando 47,97% da variância total. Os 20 itens da escala apresentaram cargas fatoriais superiores a 0,38 nos dois fatores. A consistência interna calculada pelo α de Cronbach dos fatores foi de 0,92 para o bem-estar religioso, 0,85 para o bem-estar espiritual e 0,92 para a escala total.

Esse instrumento foi escolhido para este trabalho devido à impossibilidade de se realizar a validação do constructo do tipo convergente, levando em consideração a inexistência, até então, de instrumentos válidos e confiáveis sobre o tema morte no Brasil.

O pré-teste tem as funções de testar o instrumento da coleta de dados, do ponto de vista de sua compreensibilidade, e verificar a ambiguidade das questões e o tempo de duração da entrevista. Para o pré-teste, foram realizadas entrevistas com 28 pessoas residentes em Pouso Alegre/MG, Brasil, que corresponderam a 10% do tamanho total da amostra. Os participantes estavam de acordo com os critérios de inclusão e exclusão da amostra total.

Inicialmente, foi rodada uma análise fatorial confirmatória (AFC) pelo Jasp Team para analisar se a estrutura original da EMMCL geraria adequados índices de ajuste, o que não ocorreu ( comparative fit index – CFI-0,868; Tucker-Lewis index – TLI=0,849; root mean square error of approximation – RMSEA=0,081). Logo, para estudar a estrutura interna da EMMCL, foi realizada a análise fatorial exploratória (AFE), utilizando o método de extração robust unweighted least square (RULS), com rotação Varimax e correlações policóricas, forçando quatro fatores, procedimentos adequados ao nível da medida ordinal, por meio do programa Factor 2727. Lorenzo-Seva U, Ferrando PJ. Factor: a computer program to fit the exploratory factor analysis model. Behav Res Methods [Internet]. 2006 [acesso 14 fev 2023];38:88-91. DOI: 10.3758/BF03192753
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Além disso, foi utilizado o índice de correlação de Spearman para estabelecer a correlação entre a escala EMMCL e a EBE. Para a confiabilidade da escala do ponto de vista da consistência interna, utilizou-se o α de Cronbach e Orion. O índice de correlação de Pearson foi usado para teste e reteste (estabilidade) quando se procedeu à correlação entre a primeira e a segunda aplicação da escala EM20MCL (após 15 dias de aplicação).

Respeitaram-se os preceitos estabelecidos pela Resolução 466/2012 2828. Brasil. Ministério da Saúde. Resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012. Dispõe sobre diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. Diário Oficial da União [Internet]. Brasília, nº 12, p. 59, 13 jun 2013 [acesso 14 fev 2023]. Seção 1. Disponível: http://bit.ly/1mTMIS3
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, do Conselho Nacional de Saúde. Foi obtida a anuência de todos os participantes do estudo por meio do termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE).

Resultados

Para a AFE, o Kaiser-Meyer-Olkin (KMO) foi de 0,915 e o teste de esfericidade de Barlett×2=4026.2 (df=276; p =0.000010). A variância explicada para os quatro fatores foi de 73,34% e os índices de ajuste também foram adequados, a saber: unidimensional congruence (uniCo)=0,943 (o que retrata que os dados não são unidimensionais); RMSEA=0,000 (valores abaixo de 0,01 são excelentes); CFI=1,0 (valores acima de 0,990 são excelentes).

A matriz de rotação apresentada na Tabela 1 ilustra o resultado obtido após a realização da análise fatorial exploratória pelo programa Factor 10.

Tabela 1
Matriz de rotação gerada pelo programa Factor 10, das respostas às variáveis da escala EMMCL após realizar a matriz de rotação, 2019 (n=279)

É possível a existência de quatro fatores da EMMCL, nos quais estão aglutinados 24 itens da escala original. A escala original tinha 28 itens, porém, no processo de fatoração, quatro itens foram excluídos por não terem se agrupado em fator algum, além de apresentarem carga fatorial abaixo de 0,5, valor estabelecido pela atual pesquisa. Os quatro itens excluídos foram (itens 6, 16, 20 e 28): “não pensar ou experimentar novas situações após a morte”, “ter de ver o corpo da pessoa morta”, “sentir culpa por estar aliviado com a morte da pessoa” e “lembrar-se de que um dia você também irá passar por essa experiência”.

O primeiro fator, denominado “sua própria morte”, foi composto de quatro itens, tendo suas cargas fatoriais entre 0,550 e 0,933. Essa dimensão visa avaliar o quanto o entrevistado se sente incomodado com as sensações que dizem respeito a sua própria experiência de morte: “a solidão proporcionada pela sua morte”, “a vida ser curta”, “deixar de fazer muitas coisas após morrer” e “morrer jovem”.

O segundo fator, denominado “medo do seu processo de morrer”, agrupou nove itens, com cargas fatoriais entre 0,565 e 0,929. Essa dimensão avalia a sensação de ansiedade gerada no entrevistado quando ele pensa no processo que vivenciará até sua terminalidade: “como deve ser a sensação de estar morta”, “a desintegração do seu corpo após a morte”, “a decomposição física envolvida”, “a dor envolvida em seu morrer”, “a diminuição da capacidade intelectual em idades mais avançadas”, “suas capacidades ficarão limitadas quando você estiver morrendo”, “a incerteza do quão bravamente você enfrentará o processo de morrer”, “sua falta de controle sobre o processo de morrer” e “a possibilidade de morrer em um hospital, longe da família e dos amigos”.

A terceira dimensão, “medo da morte dos outros”, agrupou cinco itens com cargas fatoriais entre 0,618 e 0,826 e diz respeito à ansiedade gerada no entrevistado quando questionado sobre as sensações ao pensar na morte de pessoas próximas e queridas. Os itens agrupados foram: “perder alguém próximo de você”, “nunca mais ser capaz de se comunicar com a pessoa”, “arrepender-se por não ter estado com a pessoa enquanto ela estava viva”, “envelhecer sozinho, sem a pessoa” e “sentir-se solitário sem a pessoa”.

Por fim, a quarta e última dimensão, “medo do processo de morrer dos outros”, abarcou seis itens com cargas fatoriais entre 0,756 e 0,945 e avalia a angústia que surge quando o entrevistado pensa em como será o processo a ser enfrentado até a morte de uma pessoa estimada. Os itens que fazem parte desse fator são: “ter de estar com quem está morrendo”, “ter de conversar sobre a morte com a pessoa que está morrendo”, “ver a pessoa sofrendo com dor”, “ver a decomposição física do corpo da pessoa”, “não saber o que fazer com a dor da perda quando você está ao lado da pessoa que está morrendo” e “ver a perda das capacidades mentais da pessoa”.

A partir dos resultados obtidos pela análise fatorial exploratória, pode-se confirmar a estrutura multifatorial ou multidimensional da EMMCL. Os quatro fatores da EMMCL apresentaram correlações de Pearson de fracas a moderadas, ou seja, F1×F2=0,619; F1×F3=0,391; F1×F4=0,344; F2×F3=0,526; e F3×F4=0,691, com significância estatística ( p <0,005).

Confiabilidade

Consistência interna e estabilidade

A confiabilidade foi analisada por meio de dois critérios distintos: estabilidade da escala (teste-reteste) e consistência interna ou precisão. Da amostra total de 279 participantes, foram selecionados, aleatoriamente, 30 entrevistados, que foram convidados a fazer o reteste (reaplicação da EMMCL) após um intervalo de 15 dias. A média dos resultados na primeira aplicação foi correlacionada com a média dos resultados da segunda avaliação e então se calculou o coeficiente de correlação de Pearson, cujo resultado foi r=0,87 ( p =0,000).

A consistência interna foi determinada por meio dos seguintes procedimentos: índice de α de Cronbach e Orion. Os resultados desses procedimentos estão disponíveis no Quadro 2 .

Quadro 2
Valores do Orion (confiabilidade geral de pontuações N-EAP oblíquas anteriores totalmente informativas) e de α de Cronbach para EMMCL e seus respectivos fatores (n=279) (Pouso Alegre/MG)

Correlação entre escala de bem-estar espiritual e escala de avaliação do medo da morte de Collett-Lester

Ao relacionar a EMMCL com a EBE, foi encontrada r (relação) de fraca, média e forte magnitude, p (probabilidade) significativa (≤0,05) e um p não significativo (>0,05). A EBE correlaciona-se significativamente com os fatores: “sua própria morte” ( p =0,004), “a morte dos outros” ( p =0,035) e o “morrer dos outros” ( p =0,046), que correspondem aos fatores 1, 3 e 4. Mostra, ainda, correlação significativa com a escala total ( p =0,000). Não houve relação significativa entre o fator 2 da escala EMMCL com a EBE. Esses valores podem ser encontrados no Quadro 3 .

Quadro 3
Valores de correlação da escala EMMCL com os fatores da EBE

Discussão

Após a realização das análises psicométricas da EMMCL, evidenciou-se que os dados obtidos apresentam validade e confiabilidade à realidade brasileira. A avaliação da estrutura interna da EMMCL foi realizada por meio de uma análise fatorial exploratória, utilizando o método de extração RULS, com rotação Varimax e correlações policóricas. É importante citar que a análise paralela demonstrou a existência de apenas dois fatores, no entanto, optou-se pelo modelo de quatro fatores originais.

A escala obtida por meio deste estudo mostrou, em sua versão final, 24 itens, diferentemente da escala original, que conta com 28 itens após sua reformulação. Os itens excluídos da escala original foram: 6, 16, 20 e 28. A escala na versão brasileira também agrupou os itens de forma diferente em cada fator, variando o número de itens para cada um, enquanto na escala original cada fator contém sete itens, totalizando 28 1212. Lester D. The Collett-Lester fear of death scale: the original version and a revision. Death Stud [Internet]. 1990 [acesso 14 fev 2023];14(5):451-68. DOI: 10.1080/07481189008252385
https://doi.org/10.1080/0748118900825238...
.

É relevante mencionar que estudos em diferentes países encontraram composições fatoriais diferentes. Pesquisas em Barcelona, na Espanha 1717. Tomás-Sábado J, Limonero JT, Abdel-Khalek AM. Spanish adaptation of the Collett-Lester fear of death scale. Death Stud [Internet]. 2007 [acesso 14 fev 2023];31(3):249-60. DOI: 10.1080/07481180601152625
https://doi.org/10.1080/0748118060115262...
, no Irã 1919. Naderi F, Esmaili E. Collett-Lester fear of death scale validation and gender-based comparison of death anxiety, suicide ideation and like satisfaction in university students. J Appl Sci [Internet]. 2009 [acesso 14 fev 2023];9(18):3308-16. DOI: 10.3923/jas.2009.3308.3316
https://doi.org/10.3923/jas.2009.3308.33...
e a validação concluída na República Tcheca 2323. Bužgová R, Janíková E. Czech adaptation of the Collett-Lester fear of death scale in a sample of nursing students. Omega [Internet]. 2019 [acesso 14 fev 2023];80(1):20-34. DOI: 10.1177/0030222817725183
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preservaram os quatro fatores. Análises de Quintero e Simkin, realizadas na Argentina, tiveram agrupamentos em dois fatores depois da análise fatorial exploratória 2222. Quintero S, Simkin H. Validación de la escala de miedo a la muerte abreviada al contexto argentino. Psocial [Internet]. 2017 [acesso 14 fev 2023];3(1):53-9. Disponível: https://bit.ly/3ZhwgAt
https://bit.ly/3ZhwgAt...
. O agrupamento em cinco fatores distintos foi encontrado nos estudos realizados no Chile 2020. Espinoza Venegas M, Sanhueza Alvarado O, Barriga O. Validation of Collett-Lester’s fear of death scale in a sample of nursing students. Rev Latinoam Enferm [Internet]. 2011 [acesso 14 fev 2023];19(5):1171-80. DOI: 10.1590/S0104-11692011000500015
https://doi.org/10.1590/S0104-1169201100...
e na Austrália 1616. Mooney DC, O’Gorman JG. Construct validity of the revised Collett-Lester fear of death and dying scale. Omega [Internet]. 2001 [acesso 14 fev 2023];43(2):157-73. DOI: 10.2190/13PW-QPFY-B1PB-2AQA
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. A validação elaborada por pesquisadores na Nigéria resultou na obtenção de três fatores congruentes aceitáveis 1818. Kolawole MS, Olusegun A. The reliability and validity of revised Collett-Lester fear of death and dying scale (version 3) in a Nigerian population. Omega [Internet]. 2008 [acesso 14 fev 2023];57(2):195-205. DOI: 10.2190/OM.57.2.e
https://doi.org/10.2190/OM.57.2.e...
.

Quanto à avaliação da confiabilidade do ponto de vista de consistência interna, foram realizadas análises por meio da verificação do índice de precisão por Orion e α de Cronbach, ambos com valores semelhantes. Valores próximos de α foram encontrados em outros estudos, como na validação realizada na República Tcheca, em que foi encontrado α=0,914 2323. Bužgová R, Janíková E. Czech adaptation of the Collett-Lester fear of death scale in a sample of nursing students. Omega [Internet]. 2019 [acesso 14 fev 2023];80(1):20-34. DOI: 10.1177/0030222817725183
https://doi.org/10.1177/0030222817725183...
; na Argentina, α=0,73 2222. Quintero S, Simkin H. Validación de la escala de miedo a la muerte abreviada al contexto argentino. Psocial [Internet]. 2017 [acesso 14 fev 2023];3(1):53-9. Disponível: https://bit.ly/3ZhwgAt
https://bit.ly/3ZhwgAt...
; na Venezuela, α=0,89 2121. Buccella Sifontes S, Moreira RB, Fernández Urrea D. Validación de la versión española de la escala de miedo a la muerte de Collett-Lester en estudiantes de medicina de la Universidad de Carabobo. Inf Méd [Internet]. 2012 [acesso 14 fev 2023];14(1):47-54. Disponível: https://bit.ly/3KfRudq
https://bit.ly/3KfRudq...
; no Chile, α=0,91 2020. Espinoza Venegas M, Sanhueza Alvarado O, Barriga O. Validation of Collett-Lester’s fear of death scale in a sample of nursing students. Rev Latinoam Enferm [Internet]. 2011 [acesso 14 fev 2023];19(5):1171-80. DOI: 10.1590/S0104-11692011000500015
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; no Irã, α=0,89 1919. Naderi F, Esmaili E. Collett-Lester fear of death scale validation and gender-based comparison of death anxiety, suicide ideation and like satisfaction in university students. J Appl Sci [Internet]. 2009 [acesso 14 fev 2023];9(18):3308-16. DOI: 10.3923/jas.2009.3308.3316
https://doi.org/10.3923/jas.2009.3308.33...
; na Nigéria, α=0,91 1818. Kolawole MS, Olusegun A. The reliability and validity of revised Collett-Lester fear of death and dying scale (version 3) in a Nigerian population. Omega [Internet]. 2008 [acesso 14 fev 2023];57(2):195-205. DOI: 10.2190/OM.57.2.e
https://doi.org/10.2190/OM.57.2.e...
; na Espanha, α=0,92 1717. Tomás-Sábado J, Limonero JT, Abdel-Khalek AM. Spanish adaptation of the Collett-Lester fear of death scale. Death Stud [Internet]. 2007 [acesso 14 fev 2023];31(3):249-60. DOI: 10.1080/07481180601152625
https://doi.org/10.1080/0748118060115262...
; e, finalmente, na Austrália, os estudos chegaram a α=0,93 1616. Mooney DC, O’Gorman JG. Construct validity of the revised Collett-Lester fear of death and dying scale. Omega [Internet]. 2001 [acesso 14 fev 2023];43(2):157-73. DOI: 10.2190/13PW-QPFY-B1PB-2AQA
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. Todos esses valores de α de Cronbach superiores a 0,70 reforçam a consistência interna dessa escala em diferentes países onde a EMMCL já foi validada.

Neste estudo, ainda se calculou o α de Cronbach para cada fator da escala e os resultados encontrados também se assemelham aos registrados na escala total. O α do fator 1, neste estudo, foi de 0,919 (na escala original foi de 0,89). Para o fator 2, nesta validação, obteve-se α=0,954 (enquanto na escala original esse valor foi 0,92). No fator 3, esta pesquisa apontou α=0,945 (sendo que na escala original o α foi 0,78). Finalmente, no fator 4, este estudo chegou ao valor de α igual a 0,928 (na escala original esse valor foi 0,92) 1515. Lester D, Abdel-Khalek A. The Collett-Lester fear of death scale: a correction. Death Stud [Internet]; 2003 [acesso 14 fev 2023];27(1):81-5. DOI: 10.1080/07481180302873
https://doi.org/10.1080/07481180302873...
.

A estabilidade da escala foi confirmada por meio da realização do teste-reteste, que fornece um cálculo do coeficiente de precisão entre os escores de um mesmo sujeito, em um mesmo teste, só que em duas ocasiões diferentes. Neste estudo, esse coeficiente alcançou pelo cálculo da correlação de Pearson r=0,87, para p =0,000, o que mostra que os resultados próximos entre a primeira e a segunda aplicação da EMMCL apresentaram elevada e positiva correlação, evidenciando a estabilidade da escala em questão. Essa correlação também foi identificada em outra validação feita na Venezuela 2121. Buccella Sifontes S, Moreira RB, Fernández Urrea D. Validación de la versión española de la escala de miedo a la muerte de Collett-Lester en estudiantes de medicina de la Universidad de Carabobo. Inf Méd [Internet]. 2012 [acesso 14 fev 2023];14(1):47-54. Disponível: https://bit.ly/3KfRudq
https://bit.ly/3KfRudq...
, em que r=0,716, e no estudo australiano 1616. Mooney DC, O’Gorman JG. Construct validity of the revised Collett-Lester fear of death and dying scale. Omega [Internet]. 2001 [acesso 14 fev 2023];43(2):157-73. DOI: 10.2190/13PW-QPFY-B1PB-2AQA
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, em que r=0,82.

Com relação à evidência de validade relacionada a variáveis externas, a EBE se correlacionou positiva e significativamente com os fatores: “sua própria morte”, “a morte dos outros” e “o morrer dos outros”. Isso indica que a espiritualidade tem relação significativa com a própria morte do indivíduo e com a morte e o morrer dos outros, ou seja, quanto maior a espiritualidade, maior o medo da morte. Não foram encontrados estudos que correlacionassem essas duas variáveis.

Entretanto, Pessini 2929. Pessini L. Morrer com dignidade. Aparecida: Santuário; 1990. esclarece que mesmo as pessoas mais espiritualizadas, segundo a experiência sacerdotal desse autor, apresentam muito medo da morte, principalmente quando ela se torna próxima devido a uma doença grave. Salienta ainda que a possível causa, de acordo com sua inferência, é o desconhecimento do que vai ocorrer. No entanto, a associação entre esses dois temas carece de estudos e confirmações. Não foram identificados estudos que correlacionassem a EMMCL com outra escala de espiritualidade.

A validade estrutural ou fatorial da EMMCL foi mantida com 24 itens em quatro fatores, parcialmente diferentes dos itens que compunham os fatores da escala original. A confiabilidade sob o aspecto de consistência interna evidenciou que a escala é consistente e precisa. Seus itens medem o mesmo fenômeno, que é o medo da morte. No que tange à estabilidade, o pré-teste mostrou a manutenção dos valores muito próximos nas duas aplicações distintas da referida escala. A estabilidade evidencia que a escala em questão, independentemente do tempo, é relativamente estável na sua mensuração.

Na correlação entre a EBE e a EMMCL, identificou-se a presença de correlação da EBE com três fatores da EMMCL, assim como da sua relação com a escala total. Isso registra que o constructo medo da morte se relaciona também a outros fenômenos da sua natureza.

Considerações finais

A finitude da vida tem sido objeto de estudo nas últimas décadas, apesar de ser um tema ainda pouco explorado e não ser um assunto tão confortável. Um dos exemplos dessa afirmação é a elaboração da EMMCL. Esse instrumento tem sido alvo de interesse em diversos países, sobretudo no Brasil. A ferramenta, validada à realidade brasileira, terá dois impactos:

  1. Disponibilidade à comunidade científica, em relação à pesquisa e ao atendimento das pessoas;

  2. Possibilidade de ampliar e obter novos conhecimentos sobre os fenômenos morte e morrer.

Recomenda-se a elaboração de outros estudos de validação e confiabilidade dessa escala, pois isso a tornará mais robusta do ponto de vista estrutural e de confiabilidade. Não obstante, como em todos os processos de validação de instrumentos psicométricos, mais pesquisas devem seguir demonstrando evidências de validade da EMMCL, seja com maiores amostras ou com outros métodos. Cada nova utilização do instrumento, independentemente do contexto, representa um progresso no sentido de aprimorar o valor teórico do conceito em estudo, ou seja, o medo da morte.

Finalmente, considerando que, até então, não havia escala de avaliação do medo da morte em língua portuguesa, pretende-se que a versão brasileira disponível da EMMCL estimule o desenvolvimento de futuras pesquisas sobre o tema. Com isso, tendo em vista o crescente interesse entre os pesquisadores por esse assunto, espera-se que mais estudos sobre morte e morrer possam surgir como resultado de futuras análises.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Jul 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    25 Abr 2022
  • Revisado
    8 Out 2022
  • Aceito
    10 Out 2022
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