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Cuidados paliativos em uma metodologia ativa de ensino

Resumo

O presente estudo avalia o conhecimento sobre cuidados paliativos de estudantes de medicina dos últimos anos nas universidades que adotam a metodologia de aprendizagem baseada em problemas no Nordeste do Brasil. Observou-se que 78% dos estudantes não tiveram informações suficientes sobre cuidados de pacientes em situação terminal, e apenas 55% conheciam a definição de cuidados paliativos da Organização Mundial da Saúde. Quanto aos conhecimentos específicos, os estudantes demonstraram um nível de acerto insatisfatório nos domínios dispneia, problemas psiquiátricos e gastrintestinais; aceitável no domínio dor e excelente em filosofia dos cuidados paliativos e habilidade de comunicação. Durante o internato houve ganho de conhecimento quanto a manejo da dor, dispneia e problemas psiquiátricos. Portanto, verificou-se que os estudantes entram em contato com o tema, porém apresentam déficit significativo nas questões relacionadas ao manejo de sintomas comuns em cuidados paliativos.

Cuidados paliativos; Educação médica; Aprendizagem baseada em problemas

Abstract

This study evaluates the knowledge about palliative care of medical students in their final years at universities that adopt problem-based learning methodology in Northeast Brazil. It was observed that 78% of the students did not have sufficient information on the care of terminally ill patients, and only 55% knew the World Health Organization’s definition of palliative care. Regarding specific knowledge, students showed an unsatisfactory level of achievement in the domains of dyspnea, psychiatric and gastrointestinal problems; acceptable in the pain domain and excellent in philosophy of palliative care and communication skills. Knowledge regarding pain management, dyspnea and psychiatric problems improved during the internship. Therefore, it was found that students come into contact with the subject but have a significant deficit in issues related to the management of common symptoms in palliative care.

Palliative care; Education, medical; Problem-based learning

Resumen

Este estudio evalúa el conocimiento de cuidados paliativos por los estudiantes de medicina de los últimos años en universidades que adoptan la metodología de aprendizaje basado en problemas en el Noreste de Brasil. El 78% de los estudiantes no tenía suficiente información sobre la atención a pacientes terminales, y solo el 55% conocía la definición de cuidados paliativos de la Organización Mundial de la Salud. Respecto a los conocimientos específicos, los estudiantes demostraron un insatisfactorio nivel de precisión en los dominios disnea, problemas psiquiátricos y gastrointestinales, aceptable en el dominio dolor y excelente en la filosofía de cuidados paliativos y habilidades de comunicación. En el internado adquirieron conocimientos sobre el manejo del dolor, la disnea y los problemas psiquiátricos. Se constató que los estudiantes tienen contacto con el tema, pero presentan un déficit significativo en temas relacionados con el manejo de los síntomas comunes en los cuidados paliativos.

Cuidados paliativos; Educación médica; Aprendizaje basado en problemas

O cuidado paliativo (CP) é uma abordagem multidisciplinar direcionada a pacientes que enfrentam doença grave e ameaçadora da vida 11. Gomes AL, Othero MB. Cuidados paliativos. Estud Av [Internet]. 2016 [acesso 13 abr 2022];30(88):155-66. Disponível: https://bit.ly/3pEIbfW
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, 22. Figueiredo MG, Stano RC. O estudo da morte e dos cuidados paliativos: uma experiência didática no currículo de medicina. Rev Bras Educ Med [Internet]. 2013 [acesso 13 abr 2022];37(2):298-307. Disponível: https://bit.ly/44exQGj
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. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), os CP previnem e aliviam o sofrimento por meio da identificação precoce, avaliação e tratamento correto da dor e outros problemas, sejam eles físicos, psicossociais ou espirituais 33. World Health Organization. Palliative care. WHO [Internet]. 2020 [acesso 13 abr 2022]. Disponível: https://bit.ly/3mflScb
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, e devem ser oferecidos no início do curso da doença. Entretanto, a ciência tem investido na luta contra o fim da vida, contribuindo para o culto à medicina curativa e aversão ao processo de adoecimento e morte 44. Santos DC, Silva MM, Moreira MC, Zepeda KG, Gaspar RB. Planejamento da assistência ao paciente em cuidados paliativos na terapia intensiva oncológica. Acta Paul Enferm [Internet]. 2017 [acesso 13 abr 2022];30(3):295-300. DOI: 10.1590/1982-0194201700045 .

Este artigo visa mostrar como está a formação dos estudantes de medicina sobre CP no modelo de aprendizagem baseada em problemas (ABP). Desde 2001, o Ministério da Educação ressalta a importância de adotar metodologias ativas de ensino 55. Miranda UJ Jr. Problem based learning como metodologia inovadora no ensino de graduação em saúde. Rev Port Med Geral Fam [Internet]. 2016 [acesso 13 abr 2022];32(1):12-3. DOI: 10.32385/rpmgf.v32i1.11685 ; contudo, apesar dos diversos estudos que analisam o conhecimento de estudantes de medicina sobre CP 66. Lemos CF, Barros GS, Melo NC, Amorim FF, Santana AN. Avaliação do conhecimento em cuidados paliativos em estudantes durante o curso de medicina. Rev Bras Educ Med [Internet]. 2017 [acesso 13 abr 2022];41(2):278-82. DOI: 10.1590/1981-52712015v41n2RB20160087

7. Dalpai D, Mendes FF, Asmar JA, Carvalho PL, Loro FL, Branco A. Pain and palliative care: the knowledge of medical students and the graduation gaps. Rev Dor [Internet]. 2017 [acesso 13 abr 2022];18(4):307-10. DOI: 10.5935/1806-0013.20170120

8. Malta R, Rodrigues B, Priolli DG. Paradigma na formação médica: atitudes e conhecimentos de acadêmicos sobre morte e cuidados paliativos. Rev Bras Educ Med [Internet]. 2018 [acesso 13 abr 2022];42(2):34-44. DOI: 10.1590/1981-52712015v42n2RB20170011

9. Vasconcelos MCC. Avaliação do conhecimento sobre cuidados paliativos entre estudantes de medicina de uma universidade no nordeste do Brasil [monografia] [Internet]. Aracaju: Universidade Federal de Sergipe; 2017 [acesso 13 abr 2022]. Disponível: https://bit.ly/3NJ76XL
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10. Pinheiro TR. Avaliação do grau de conhecimento sobre cuidados paliativos e dor dos estudantes de medicina do quinto e sextos anos. Mundo Saúde [Internet]. 2010 [acesso 13 abr 2022];34(3):320-6. Disponível: https://bit.ly/3JKaoIZ
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- 1111. Nakazawa Y, Miyashita M, Morita T, Umeda M, Oyagi Y, Ogasawara T. The palliative care knowledge test: reliability and validity of an instrument to measure palliative care knowledge among health professionals. Palliat Med [Internet]. 2009 [acesso 13 abr 2022];23(8):754-66. DOI: 10.1177/0269216309106871 , não existem pesquisas que especifiquem a metodologia de ensino das universidades estudadas.

O objetivo deste trabalho é avaliar o conhecimento sobre CP de estudantes de medicina de quinto e sexto anos nas universidades que adotam a metodologia ABP no estado de Sergipe.

Método

O presente estudo tem caráter exploratório, descritivo, transversal e de abordagem quantitativa, e é parte de um projeto aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Federal de Sergipe (CEP-UFS) que visa avaliar o conhecimento de internos e médicos sobre CP. A população foi composta por estudantes de quinto e sexto anos nas universidades de Sergipe (públicas e privadas) que adotaram ABP como metodologia de ensino. A coleta dos dados aconteceu entre março e junho de 2018.

Os critérios de inclusão foram: estar matriculado nas universidades que adotam a metodologia ABP e no internato. Os alunos responderam ao questionário após assinarem o termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE), o que garantiu total anonimato para os sujeitos da pesquisa, conforme Resolução 466/2012, do Conselho Nacional de Saúde (CNS) 1212. Brasil. Ministério da Saúde. Resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012. Define diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2012 [acesso 10 abr 2023]. Disponível: https://bit.ly/3m1Zwuw
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.

Devido à impossibilidade abranger todos os estudantes que poderiam ser incluídos, foi elaborado um cálculo amostral que estimou uma população de 300 alunos matriculados em instituições que empregam metodologia ativa de ensino. Considerou-se erro amostral de 5%, nível de confiança de 90% e a hipótese de que no máximo 10% dos alunos têm conhecimento em CP, encontrando-se um número mínimo de 143 estudantes. Foram coletados 151 questionários para que se garantisse a representatividade e significância estatística da amostra 1313. Calculadora online . SurveyMonkey [Internet]. [s.d.] [acesso 13 abr 2022]. Disponível: https://bit.ly/3D8iaZf
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.

Os dados foram coletados por meio de questionário criado pelos autores com base em instrumentos da literatura e composto de três etapas: 1) registro de dados sociodemográficos dos participantes; 2) aplicação de questionário baseado em instrumento validado na Colômbia 1414. León MX, Corredor M, Ríos F, Sanabria A, Montenegro M, Gónima E et al. ¿Qué perciben los estudiantes de medicina sobre sus conocimientos en dolor: análisis de la situación en Colombia. Med Paliat [Internet]. 2007 [acesso 13 abr 2022];14(1):33-9. Disponível: https://medes.com/publication/24964
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com questões referentes à autoavaliação geral sobre CP, adaptadas na forma de cinco questões fechadas, com resposta sim ou não; e 3) análise de seis domínios – filosofia, dor, dispneia, problemas psiquiátricos, problemas gastrintestinais e comunicação de más notícias – por meio de instrumento validado no Japão 1111. Nakazawa Y, Miyashita M, Morita T, Umeda M, Oyagi Y, Ogasawara T. The palliative care knowledge test: reliability and validity of an instrument to measure palliative care knowledge among health professionals. Palliat Med [Internet]. 2009 [acesso 13 abr 2022];23(8):754-66. DOI: 10.1177/0269216309106871 , adaptado para 23 questões divididas nos seis domínios, com três opções de resposta: verdadeiro, falso e “não sei”.

As variáveis categóricas foram descritas por meio de frequência absoluta e percentagem, comparadas entre os grupos por meio do teste qui-quadrado. Foram considerados significativos resultados com níveis descritivos para o valor de p inferiores a 5% ( p <0,05). Para análise estatística foi empregado o programa IBM Statistical Package for the Social Sciences versão 25.0 (Armonk, NY).

Resultados

A partir das variáveis obtidas no questionário sociodemográfico, verificou-se que 91% tinham 20-29 anos de idade e 65% eram do gênero feminino. Os graduandos do quinto ano foram maioria (71%).

No que se refere à autoavaliação (Tabela 1 do Apêndice), relataram insuficiência de informações sobre cuidados de pacientes em situação terminal 78% dos alunos; sobre o manejo da dor, 43%; e sobre os principais sintomas em CP, 55%. Declararam haver aprendido o bastante sobre os principais sintomas de CP 55%; e sobre técnicas de comunicação, 84,1%.

Quanto aos conhecimentos específicos (Tabela 2 do Apêndice), o domínio com mais acertos foi o de filosofia (87,7%); com mais erros, o de dispneia (41,5%); e respostas “não sei” estiveram mais presentes no domínio dos problemas gastrintestinais (43%). No domínio filosofia, quase 80% responderam que CP pode ser indicado junto ao tratamento curativo.

Ao se tratar de dor, a maioria (91%) respondeu que o uso a longo prazo de opioides induz dependência e 82% afirmaram que seu uso deve ser limitado pelo risco de depressão respiratória. Já no domínio dispneia, 27,2% disseram que não se deve empregar morfina para aliviar esse sintoma e 30,5% não souberam responder. Quanto aos problemas psiquiátricos, 25% marcaram que benzodiazepínicos são eficazes para delirium e cerca de 24% declararam não saber a resposta.

Com relação a problemas gastrintestinais, 44% dos alunos afirmaram que o paciente em estágio final do câncer necessita de maior ingesta calórica e apenas 17% reconheceram o uso de esteroides na melhora do apetite em pacientes com câncer avançado.

Quase todos (98,7%) afirmaram que a comunicação é uma habilidade que pode ser aprendida e 77,5% relataram que informações incertas devem ser omitidas, pois causam ansiedade adicional.

Na autoavaliação por etapa do curso, verificou-se que alunos do 10º período receberam mais informações sobre pacientes em situação terminal (31%), e que mais estudantes do 12º (84%) conheciam a definição de CP da OMS e 61,5% receberam mais informações sobre manejo da dor. Os internos do 11º período foram os que obtiveram mais informações sobre manejo de sintomas comuns em CP (50%).

O conhecimento sobre CP por domínios foi classificado como insatisfatório (menos de 50% de acertos), aceitável (50% a 70% de acertos), desejável (71% a 80% de acertos) e excelente (mais de 80% de acertos).

O resultado do conhecimento sobre os domínios específicos foi excelente em filosofia do CP (87,7%) e comunicação (88%), aceitável em dor (51,9%) e insatisfatório em dispneia (37%), problemas psiquiátricos (48%) e problemas gastrintestinais (28%). Entretanto, quando analisado o período de ingresso no internato (9º) e o último da graduação (12º), apurou-se conhecimento insatisfatório nos domínios dor, dispneia e problemas psiquiátricos para os alunos do nono período e aceitável para os do 12º. Quanto aos problemas gastrintestinais, os dois grupos obtiveram resultado insatisfatório.

Discussão

A formação médica ainda prioriza a doença e a cura 44. Santos DC, Silva MM, Moreira MC, Zepeda KG, Gaspar RB. Planejamento da assistência ao paciente em cuidados paliativos na terapia intensiva oncológica. Acta Paul Enferm [Internet]. 2017 [acesso 13 abr 2022];30(3):295-300. DOI: 10.1590/1982-0194201700045 , o que torna pouco importante o aprendizado sobre o curso natural das patologias e compromete o contato dos estudantes com pacientes sem possibilidade de cura 22. Figueiredo MG, Stano RC. O estudo da morte e dos cuidados paliativos: uma experiência didática no currículo de medicina. Rev Bras Educ Med [Internet]. 2013 [acesso 13 abr 2022];37(2):298-307. Disponível: https://bit.ly/44exQGj
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, 1515. Moraes SA, Kairalla MC. Avaliação dos conhecimentos dos acadêmicos do curso de Medicina sobre cuidados paliativos em pacientes terminais. Einstein (São Paulo) [Internet]. 2010 [acesso 13 abr 2022];8(2):162-7. DOI: 10.1590/s1679-45082010ao1464 . Some-se a isso o incentivo às especializações e o uso massivo da tecnologia, que contribuem para a fragmentação do paciente em órgãos e para a desvalorização da escuta e do desenvolvimento de boa relação médico-paciente 22. Figueiredo MG, Stano RC. O estudo da morte e dos cuidados paliativos: uma experiência didática no currículo de medicina. Rev Bras Educ Med [Internet]. 2013 [acesso 13 abr 2022];37(2):298-307. Disponível: https://bit.ly/44exQGj
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: busca-se incessantemente a cura e nega-se a morte, adotando-se atitudes que podem comprometer a qualidade de vida do paciente 11. Gomes AL, Othero MB. Cuidados paliativos. Estud Av [Internet]. 2016 [acesso 13 abr 2022];30(88):155-66. Disponível: https://bit.ly/3pEIbfW
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– condutas vedadas pelo Código de Ética Médica que, inclusive, ressalta a importância de se oferecer CP em caso de doença incurável e terminal 1616. Conselho Federal de Medicina. Código de Ética Médica: Resolução CFM nº 1.931, de 17 de setembro de 2009 [Internet]. Brasília: CFM; 2009 [acesso 13 abr 2022]. Disponível: https://bit.ly/3RT7V1O
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.

Estudos mostram que os médicos não recebem educação satisfatória sobre CP 66. Lemos CF, Barros GS, Melo NC, Amorim FF, Santana AN. Avaliação do conhecimento em cuidados paliativos em estudantes durante o curso de medicina. Rev Bras Educ Med [Internet]. 2017 [acesso 13 abr 2022];41(2):278-82. DOI: 10.1590/1981-52712015v41n2RB20160087 , 99. Vasconcelos MCC. Avaliação do conhecimento sobre cuidados paliativos entre estudantes de medicina de uma universidade no nordeste do Brasil [monografia] [Internet]. Aracaju: Universidade Federal de Sergipe; 2017 [acesso 13 abr 2022]. Disponível: https://bit.ly/3NJ76XL
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, 1717. Conceição MV. Conhecimento sobre cuidados paliativos entre médicos residentes de um hospital universitário [monografia] [Internet]. Aracaju: Universidade Federal de Sergipe; 2017 [acesso 13 abr 2022]. Disponível: https://bit.ly/3PFBOn7
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: uma pesquisa realizada em Porto Alegre mostrou que 89,4% dos estudantes de medicina relatam não ter recebido informações suficientes sobre cuidado de pacientes em situação terminal 77. Dalpai D, Mendes FF, Asmar JA, Carvalho PL, Loro FL, Branco A. Pain and palliative care: the knowledge of medical students and the graduation gaps. Rev Dor [Internet]. 2017 [acesso 13 abr 2022];18(4):307-10. DOI: 10.5935/1806-0013.20170120 ; na presente amostra, esse percentual é de 78,1%.

Quando questionados sobre a definição de CP da OMS, 43,7% dos sujeitos relataram que não a conheciam. Embora esse seja um percentual alto, foi inferior a estudos semelhantes, como os de Pinheiro 1010. Pinheiro TR. Avaliação do grau de conhecimento sobre cuidados paliativos e dor dos estudantes de medicina do quinto e sextos anos. Mundo Saúde [Internet]. 2010 [acesso 13 abr 2022];34(3):320-6. Disponível: https://bit.ly/3JKaoIZ
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, Dalpai e colaboradores 77. Dalpai D, Mendes FF, Asmar JA, Carvalho PL, Loro FL, Branco A. Pain and palliative care: the knowledge of medical students and the graduation gaps. Rev Dor [Internet]. 2017 [acesso 13 abr 2022];18(4):307-10. DOI: 10.5935/1806-0013.20170120 e Vasconcelos 99. Vasconcelos MCC. Avaliação do conhecimento sobre cuidados paliativos entre estudantes de medicina de uma universidade no nordeste do Brasil [monografia] [Internet]. Aracaju: Universidade Federal de Sergipe; 2017 [acesso 13 abr 2022]. Disponível: https://bit.ly/3NJ76XL
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.

Com relação à abordagem do manejo da dor na graduação, estudo com alunos de medicina de uma universidade de Sergipe que adota a metodologia tradicional 99. Vasconcelos MCC. Avaliação do conhecimento sobre cuidados paliativos entre estudantes de medicina de uma universidade no nordeste do Brasil [monografia] [Internet]. Aracaju: Universidade Federal de Sergipe; 2017 [acesso 13 abr 2022]. Disponível: https://bit.ly/3NJ76XL
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relatou que 76,1% dos discentes negaram ter recebido informações suficientes sobre o manejo desse sintoma. Na presente pesquisa, foi encontrado percentual inferior (43%), o que sugere que os alunos do sistema ABP do estado de Sergipe tiveram maior contato com manejo da dor.

Sobre o manejo de sintomas comuns em CP, o estudo realizado em Porto Alegre com estudantes de medicina dos últimos anos da graduação informa que 80,9% da amostra não obteve esse conhecimento 77. Dalpai D, Mendes FF, Asmar JA, Carvalho PL, Loro FL, Branco A. Pain and palliative care: the knowledge of medical students and the graduation gaps. Rev Dor [Internet]. 2017 [acesso 13 abr 2022];18(4):307-10. DOI: 10.5935/1806-0013.20170120 . Nosso levantamento chegou a resultados menores (57%), indicando que mais alunos avaliados no presente inquérito tiveram contato com o tema.

No quesito comunicação de más notícias, esta pesquisa trouxe resultados superiores aos encontrados em uma universidade de Porto Alegre 77. Dalpai D, Mendes FF, Asmar JA, Carvalho PL, Loro FL, Branco A. Pain and palliative care: the knowledge of medical students and the graduation gaps. Rev Dor [Internet]. 2017 [acesso 13 abr 2022];18(4):307-10. DOI: 10.5935/1806-0013.20170120 e em universidades do estado de São Paulo 1010. Pinheiro TR. Avaliação do grau de conhecimento sobre cuidados paliativos e dor dos estudantes de medicina do quinto e sextos anos. Mundo Saúde [Internet]. 2010 [acesso 13 abr 2022];34(3):320-6. Disponível: https://bit.ly/3JKaoIZ
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, em que respectivamente 40,4% e 36% dos estudantes afirmaram ter aprendido sobre instrumentos de comunicação e postura médica diante da transmissão de más notícias.

Esses dados, superiores em relação aos estudos comparados, permitem supor que o sistema de ABP favorece resultados positivos quanto às questões de autoavaliação sobre CP. Com relação aos conhecimentos específicos, houve baixa frequência de acertos em praticamente todos os domínios e ganho de conhecimento durante o internato, quando se comparam os alunos de quinto e sexto ano do curso.

Se necessário, CP deve ser iniciado no diagnóstico, concomitantemente ao tratamento curativo, quando disponível 11. Gomes AL, Othero MB. Cuidados paliativos. Estud Av [Internet]. 2016 [acesso 13 abr 2022];30(88):155-66. Disponível: https://bit.ly/3pEIbfW
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, 33. World Health Organization. Palliative care. WHO [Internet]. 2020 [acesso 13 abr 2022]. Disponível: https://bit.ly/3mflScb
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, 1818. Academia Nacional de Cuidados Paliativos. Manual de cuidados paliativos: ampliado e atualizado [Internet]. 2 a ed. São Paulo: ANCP; 2012 [acesso 13 abr 2022]. Disponível: https://bit.ly/44eP4nd
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; entretanto, 17,2% dos alunos deste estudo responderam que CP só deve ser oferecido àqueles pacientes que não dispõem de tratamento curativo. Somente um aluno de 12º período errou essa questão, o que permite supor que os estudantes do sistema de ABP têm contato com a filosofia do CP em algum momento do internato, pois chegam ao último período cientes de que a indicação de CP não está restrita ao fim de vida.

Os acertos em filosofia do CP foram superiores aos de uma pesquisa realizada em uma universidade do estado de Sergipe que adota a metodologia tradicional de ensino 99. Vasconcelos MCC. Avaliação do conhecimento sobre cuidados paliativos entre estudantes de medicina de uma universidade no nordeste do Brasil [monografia] [Internet]. Aracaju: Universidade Federal de Sergipe; 2017 [acesso 13 abr 2022]. Disponível: https://bit.ly/3NJ76XL
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, e semelhantes aos realizados com médicos de um hospital universitário no mesmo estado 1717. Conceição MV. Conhecimento sobre cuidados paliativos entre médicos residentes de um hospital universitário [monografia] [Internet]. Aracaju: Universidade Federal de Sergipe; 2017 [acesso 13 abr 2022]. Disponível: https://bit.ly/3PFBOn7
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.

No domínio dor, foi observado percentual significativo de erros nas questões sobre efeitos adversos dos opioides. Considerando que dor é comum em CP, e que opioides são essenciais para o tratamento desse sintoma 33. World Health Organization. Palliative care. WHO [Internet]. 2020 [acesso 13 abr 2022]. Disponível: https://bit.ly/3mflScb
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, é indispensável conhecer as drogas que podem ser usadas para analgesia e seus efeitos adversos mais frequentes.

Entre 40% e 95% dos doentes que recebem analgesia com opioide sofrem de constipação, que pode ser prevenida, tratada e investigada nesse contexto: indica-se uso de laxante profilático, concomitante ao início do tratamento 1818. Academia Nacional de Cuidados Paliativos. Manual de cuidados paliativos: ampliado e atualizado [Internet]. 2 a ed. São Paulo: ANCP; 2012 [acesso 13 abr 2022]. Disponível: https://bit.ly/44eP4nd
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. O estudo mencionado, entretanto, revela desconhecimento do tema, pois 25,8% dos internos de medicina não souberam responder sobre a eficácia do uso de laxantes para prevenir constipação por opioide e 16,6% discordaram da eficácia da associação na prevenção desse efeito adverso. Vasconcelos 99. Vasconcelos MCC. Avaliação do conhecimento sobre cuidados paliativos entre estudantes de medicina de uma universidade no nordeste do Brasil [monografia] [Internet]. Aracaju: Universidade Federal de Sergipe; 2017 [acesso 13 abr 2022]. Disponível: https://bit.ly/3NJ76XL
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mostrou que apenas 42,2% saberia conduzir ou prevenir esse sintoma – percentual menor que o de nossa pesquisa (57,6%), porém igualmente preocupante.

O desconhecimento sobre o uso adequado de opioides e a crença nos mitos que os envolvem é uma das causas do “subtratamento” da dor 1919. Ribeiro S, Schmidt AP, Schmidt SR. Uso de opioides no tratamento da dor crônica não oncológica: o papel da metadona. Rev Bras Anestesiol [Internet]. 2002 [acesso 13 abr 2022];52(5):644-51. DOI: 10.1590/S0034-70942002000500015 . A hesitação em usar essas substâncias devido ao risco de depressão respiratória é comum 99. Vasconcelos MCC. Avaliação do conhecimento sobre cuidados paliativos entre estudantes de medicina de uma universidade no nordeste do Brasil [monografia] [Internet]. Aracaju: Universidade Federal de Sergipe; 2017 [acesso 13 abr 2022]. Disponível: https://bit.ly/3NJ76XL
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, 1111. Nakazawa Y, Miyashita M, Morita T, Umeda M, Oyagi Y, Ogasawara T. The palliative care knowledge test: reliability and validity of an instrument to measure palliative care knowledge among health professionals. Palliat Med [Internet]. 2009 [acesso 13 abr 2022];23(8):754-66. DOI: 10.1177/0269216309106871 , 1919. Ribeiro S, Schmidt AP, Schmidt SR. Uso de opioides no tratamento da dor crônica não oncológica: o papel da metadona. Rev Bras Anestesiol [Internet]. 2002 [acesso 13 abr 2022];52(5):644-51. DOI: 10.1590/S0034-70942002000500015: 82,1% dos alunos desta pesquisa limitariam a dose do opioide por medo desse efeito adverso grave, mas infrequente quando a medicação é prescrita corretamente 1818. Academia Nacional de Cuidados Paliativos. Manual de cuidados paliativos: ampliado e atualizado [Internet]. 2 a ed. São Paulo: ANCP; 2012 [acesso 13 abr 2022]. Disponível: https://bit.ly/44eP4nd
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, 1919. Ribeiro S, Schmidt AP, Schmidt SR. Uso de opioides no tratamento da dor crônica não oncológica: o papel da metadona. Rev Bras Anestesiol [Internet]. 2002 [acesso 13 abr 2022];52(5):644-51. DOI: 10.1590/S0034-70942002000500015 .

Quanto à dependência psicológica, praticamente não existem casos descritos na literatura quando o opioide é adequadamente prescrito; a dependência é ainda mais rara em paciente com dor crônica 2020. Higgins C, Smith BH, Matthews K. Incidence of iatrogenic opioid dependence or abuse in patients with pain who were exposed to opioid analgesic therapy: a systematic review and metaanalysis. Br J Anaesth [Internet]. 2018 [acesso 13 abr 2022];120(6):1335-44. DOI: 10.1016/j.bja.2018.03.009 . Entretanto, a presente pesquisa demonstra que esse mito contribui para o subtratamento da dor 1919. Ribeiro S, Schmidt AP, Schmidt SR. Uso de opioides no tratamento da dor crônica não oncológica: o papel da metadona. Rev Bras Anestesiol [Internet]. 2002 [acesso 13 abr 2022];52(5):644-51. DOI: 10.1590/S0034-70942002000500015: 91,4% dos estudantes consideraram a dependência como fator de limitação ao uso dessa classe de fármacos. O mesmo ocorreu no Canadá, onde 73,2% dos médicos relataram que o risco de dependência é uma barreira para prescrição de analgésicos opioides 2121. Roy E, Côté RJ, Hamel D, Dubé PA, Langlois E, Labesse ME et al. Opioid prescribing practices and training needs of Québec family physicians for chronic noncancer pain. Pain Res Manag [Internet]. 2017 [acesso 13 abr 2022];1365910. DOI: 10.1155/2017/1365910 .

A neuroadaptação e a “pseudoadição” são eventos que podem ajudar a sustentar esse mito. O primeiro é um mecanismo neurofarmacológico que, à semelhança do acionado por corticosteroides, induz efeitos adversos se a medicação for retirada de forma súbita 2222. Chiu AW, Contreras S, Mehta S, Korman J, Perreault MM, Williamson DR, Burry LD. Iatrogenic opioid withdrawal in critically III patients: a review of assessment tools and management. Ann Pharmacother [Internet]. 2017 [acesso 13 abr 2022];51(12):1099-111. DOI: 10.1177/1060028017724538 . A “pseudoadição” é uma síndrome iatrogênica caracterizada pela demanda de aumento da dose do opioide para o manejo adequado da dor 1010. Pinheiro TR. Avaliação do grau de conhecimento sobre cuidados paliativos e dor dos estudantes de medicina do quinto e sextos anos. Mundo Saúde [Internet]. 2010 [acesso 13 abr 2022];34(3):320-6. Disponível: https://bit.ly/3JKaoIZ
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, 2020. Higgins C, Smith BH, Matthews K. Incidence of iatrogenic opioid dependence or abuse in patients with pain who were exposed to opioid analgesic therapy: a systematic review and metaanalysis. Br J Anaesth [Internet]. 2018 [acesso 13 abr 2022];120(6):1335-44. DOI: 10.1016/j.bja.2018.03.009 , 2323. Weissman DE, Haddox JD. Opioid pseudoaddiction: an iatrogenic syndrome. Pain [Internet]. 1989 [acesso 13 abr 2022];36(3):363-6. DOI: 10.1016/0304-3959(89)90097-3 , mimetizando o comportamento compulsivo presente na dependência psicológica; contudo, está mais está relacionada à sensação que ela proporciona que à analgesia 2424. Nascimento DC, Sakata RK. Dependência de opioide em pacientes com dor crônica. Rev Dor [Internet]. 2011 [acesso 13 abr 2022];12(2):160-5. DOI: 10.1590/S1806-00132011000200013 .

Também foi detectado desconhecimento quanto ao uso de opioides para o manejo da dispneia. Sabe-se que de 20% a 90% dos pacientes com câncer podem apresentar o sintoma e que a morfina é a droga de primeira escolha no contexto de fim de vida 2525. Jansen K, Haugen DF, Pont L, Ruths S. Safety and effectiveness of palliative drug treatment in the last days of life: a systematic literature review. J Pain Symptom Manage [Internet]. 2018 [acesso 13 abr 2022];55(2):508-21. DOI: 10.1016/j.jpainsymman.2017.06.010 ; no entanto, quase 60% dos internos deste estudo não reconhecem ou discordam que o uso da morfina alivia a dispneia.

Com relação à hipersecreção brônquica, estudos mostram o potencial do uso de anticolinérgico para reduzir a respiração ruidosa (“sororoca”), importante desencadeador de angústia para o paciente e sua família 1818. Academia Nacional de Cuidados Paliativos. Manual de cuidados paliativos: ampliado e atualizado [Internet]. 2 a ed. São Paulo: ANCP; 2012 [acesso 13 abr 2022]. Disponível: https://bit.ly/44eP4nd
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. Porém, apesar de tamanha importância, quase metade dos internos avaliados nesta pesquisa desconhecem o uso do anticolinérgico para esse quadro. Esse resultado é semelhante ao estudo de Conceição 1717. Conceição MV. Conhecimento sobre cuidados paliativos entre médicos residentes de um hospital universitário [monografia] [Internet]. Aracaju: Universidade Federal de Sergipe; 2017 [acesso 13 abr 2022]. Disponível: https://bit.ly/3PFBOn7
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, em que quase 40% dos médicos não souberam ou não concordaram que anticolinérgicos podem ser usados para esse fim.

Delirium é frequente em CP e um importante preditor de mau prognóstico 2626. Arcanjo SP, Saporetti LA, Curiati JA, Jacob-Filho W, Avelino-Silva TJ. Características clínicas e laboratoriais associadas à indicação de cuidados paliativos em idosos hospitalizados. Einstein (São Paulo) [Internet]. 2018 [acesso 13 abr 2022];16(1):eAO4092. DOI: 10.1590/S1679-45082018AO4092: multifatorial, ocorre em indivíduos vulneráveis expostos a fatores de risco 1818. Academia Nacional de Cuidados Paliativos. Manual de cuidados paliativos: ampliado e atualizado [Internet]. 2 a ed. São Paulo: ANCP; 2012 [acesso 13 abr 2022]. Disponível: https://bit.ly/44eP4nd
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. O uso de fármacos é um importante fator precipitante e, nesse contexto, os benzodiazepínicos são frequentemente associados ao desenvolvimento, agravamento e prolongamento desse estado de confusão mental 2727. Garpestad E, Devlin JW. Polypharmacy and delirium in critically III older adults: recognition and prevention. Clin Geriatr Med [Internet]. 2017 [acesso 13 abr 2022];33(2):189-203. DOI: 10.1016/j.cger.2017.01.002 . Contudo, quase metade dos alunos não sabiam responder ou indicariam benzodiazepínicos para o tratamento desse distúrbio psiquiátrico. Além disso, a morfina, comumente utilizada em CP, foi associada às causas de delirium por quase 50% dos estudantes, embora esse efeito seja pouco relacionado ao uso de opioide 99. Vasconcelos MCC. Avaliação do conhecimento sobre cuidados paliativos entre estudantes de medicina de uma universidade no nordeste do Brasil [monografia] [Internet]. Aracaju: Universidade Federal de Sergipe; 2017 [acesso 13 abr 2022]. Disponível: https://bit.ly/3NJ76XL
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, 1818. Academia Nacional de Cuidados Paliativos. Manual de cuidados paliativos: ampliado e atualizado [Internet]. 2 a ed. São Paulo: ANCP; 2012 [acesso 13 abr 2022]. Disponível: https://bit.ly/44eP4nd
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Foi apurada baixa frequência de acertos nas questões relativas ao manejo de problemas gastrintestinais. Apesar da necessidade de mais estudos sobre o uso de esteroides para a melhora do apetite em pacientes com câncer, a literatura traz evidências de efetividade dessa associação 2828. von Gunten CF, Gafford E. Treatment of non-pain-related symptoms. Cancer J [Internet]. 2013 [acesso 13 abr 2022];19(5):397-404. DOI: 10.1097/PPO.0b013e3182a65ecf . Contudo, 83,4% dos estudantes dessa pesquisa não souberam responder ou discordaram que esteroides melhoram o apetite de pacientes com câncer – percentual semelhante ao estudo realizado por Vasconcelos 1111. Nakazawa Y, Miyashita M, Morita T, Umeda M, Oyagi Y, Ogasawara T. The palliative care knowledge test: reliability and validity of an instrument to measure palliative care knowledge among health professionals. Palliat Med [Internet]. 2009 [acesso 13 abr 2022];23(8):754-66. DOI: 10.1177/0269216309106871 , em que 85,2% dos estudantes não souberam responder ou não associaram os esteroides à melhora da inapetência.

Em relação à comunicação, os estudantes conseguiram altos índices de acertos: a maioria (98,7%) respondeu que a habilidade de comunicação pode ser aprendida, o que está de acordo com dados da literatura 2929. Trickey AW, Newcomb AB, Porrey M, Piscitani F, Wright J, Graling P, Dort J. Two-year experience implementing a curriculum to improve residents’ patient-centered communication skills. J Surg Educ [Internet]. 2017 [acesso 13 abr 2022];74(6):124-32. DOI: 10.1016/j.jsurg.2017.07.014 .

Já sobre a transmissão de informações incertas a pacientes e familiares, 77,5% dos estudantes da presente pesquisa acreditam que existem informações que devem ser omitidas aos pacientes e familiares devido à possibilidade de causar ansiedade adicional. O dado indica descompasso com o previsto no art. 34 do Código de Ética Médica, que afirma ser vedado ao médico deixar de informar ao paciente o diagnóstico, o prognóstico, os riscos e os objetivos do tratamento, salvo quando a comunicação direta possa lhe provocar danos, devendo, nesse caso, fazer a comunicação a seu representante legal 1616. Conselho Federal de Medicina. Código de Ética Médica: Resolução CFM nº 1.931, de 17 de setembro de 2009 [Internet]. Brasília: CFM; 2009 [acesso 13 abr 2022]. Disponível: https://bit.ly/3RT7V1O
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Ao se comparar a aprendizagem apenas de alunos do nono e décimo segundo períodos, verificou-se ganho de conhecimento nos domínios filosofia, dor, dispneia e problemas psiquiátricos, apesar da baixa frequência de acertos nos três últimos. O conhecimento de problemas gastrointestinais foi insatisfatório em todos os períodos.

No domínio da comunicação, a diferença entre alunos do primeiro e último ano do internato não foi significativa, o que indica aquisição de habilidades de comunicação antes do internato. O ganho de conhecimento em filosofia e no domínio da dispneia, de questões mais específicas ao contexto do CP, permite supor que os alunos das universidades estudadas foram instruídos sobre o tema durante o internato, embora o conhecimento sobre dispneia entre os alunos do último ano da graduação se encontre no limiar do aceitável (52% de acertos).

Dentre as limitações deste estudo, é preciso mencionar que os estudantes de um mesmo período foram divididos em grupos e entraram no internato em rodízios diferentes. O contato com CP pode ocorrer durante o rodízio de clínica médica, quando se lida com paciente sob esses cuidados. Portanto, aprender sobre CP não depende do período de internato, mas do acompanhamento de paciente nessa condição durante a passagem pelo módulo de clínica médica; isso prejudicou a análise do ganho de conhecimento durante o internato.

Outra limitação é a escassez de competências sobre CP dentre os conhecimentos específicos avaliados pelo questionário, haja vista a imensidão de conhecimentos necessários para o adequado manejo desses pacientes. O instrumento utilizado, portanto, oferece uma análise simplória das informações necessárias ao conhecimento sobre CP. Finalmente, a quantidade de alunos avaliados também é uma limitação: uma amostra maior traria mais relevância estatística ao estudo.

Considerações finais

Constata-se carência no ensino de CP para a amostra estudada, em conformidade com a literatura disponível, que revela que a maioria dos profissionais vive no limbo quando se trata de paliação. Os alunos da metodologia ABP tiveram maior percepção de aprendizado de CP, mas a diferença foi pouco significativa nas questões de conhecimentos específicos quando comparados com outros estudos. Foi aferido conhecimento excelente em filosofia e comunicação, aceitável em dor e insatisfatório em dispneia, problemas psiquiátricos e problemas gastrintestinais, e constatou-se ganho de conhecimento durante o internato nos domínios filosofia, dor, dispneia e problemas psiquiátricos.

É razoável supor que os alunos estão sendo expostos ao tema de maneira superficial, uma vez que o contato com CP não resulta em conhecimento de questões específicas. A curva crescente de aprendizado não isenta as instituições da necessidade de aprimorar o ensino dessa temática, dada a grande quantidade de erros nas questões de conhecimentos específicos. Conclui-se que é preciso reformular o currículo médico, quer implementando, quer aprimorando as disciplinas que tratam de CP, com o intuito de oferecer as competências necessárias para lidar com decisões de fim de vida.

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  • Aprovação CEP-UFS 2.017.565

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Out 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    2 Fev 2020
  • Revisado
    14 Abr 2023
  • Aceito
    15 Maio 2023
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