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Fundamentos ontológicos do debate sobre seleção e edição do genoma* * Pesquisa desenvolvida com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES. * Pesquisa desenvolvida com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES.

Ontological fundamentals of the debate on genetic selection and gene editing

Resumo

Este trabalho problematiza os pressupostos ontológicos assumidos no debate bioético sobre a seleção e edição do genoma humano. Com vistas ao manejo de desordens genéticas, diferentes terapêuticas têm sido empregadas clínica e experimentalmente, desde a década de 1990. Entre as estratégias de tratamento destacam-se a seleção de embriões (mediante diagnóstico genético pré-implantação) e a terapia gênica (mediante edição genética). O desenvolvimento destas técnicas suscita discussões acerca de suas implicações éticas. O presente artigo postula que distintas concepções de humanidade podem ser identificadas nas discussões, as quais fundamentam posicionamentos acerca de intervenções sobre o genoma da espécie. O artigo busca analisar essas concepções, percorrendo três passos. Primeiramente, apresenta-se o contexto biomédico de aplicação da seleção e edição do genoma humano. Em seguida, são evidenciadas discussões sobre os aspectos éticos de tais intervenções. Por fim, explicitam-se diferentes concepções de humanidade que fundamentam as referidas discussões, de maneira a problematizá-las, tendo em vista a noção de justiça distributiva.

Palavras-chave:
seleção genética; edição genética; bioética; justiça distributiva

Abstract

This study discusses the ontological assumptions assumed in the bioethical debate about human genetic selection and gene editing. With a view to managing genetic disorders, different therapies have been employed clinically and experimentally, since the 1990s. Among the treatment strategies, we find embryo selection (by means of pre-implantation genetic diagnosis) and gene therapy (by means of gene editing). The development of these techniques raises discussions about their ethical implications. This article postulates that different conceptions of humanity can be identified in these discussions, grounding ethical positions regarding genome interventions. The article seeks to analyze these conceptions, following three steps. First, the biomedical context of genetic selection and gene editing is presented. Then, discussions on the ethical aspects of these interventions are highlighted. Finally, different conceptions of humanity grounding these discussions are identified and analyzed, considering the notion of distributive justice.

Keywords:
genetic selection; gene editing; bioethics; distributive justice

Introdução

No ano de 1999, na conferência Regras para o parque humano, o filósofo Peter Sloterdijk (2010SLOTERDIJK, Peter. Regras para o parque humano: uma resposta à carta de Heidegger sobre o humanismo. Tradução de José Oscar de Almeida Marques. São Paulo: Estação Liberdade, 2010.) apresenta discussão acerca da atualidade do humanismo, entendido como escola de formação moral e intelectual. Conforme o autor, o humanismo consistiu no principal instrumento pedagógico engendrado pela civilização ocidental, colocado em exercício desde a Antiguidade greco-romana até os dias de hoje (SLOTERDIJK, 2010SLOTERDIJK, Peter. Regras para o parque humano: uma resposta à carta de Heidegger sobre o humanismo. Tradução de José Oscar de Almeida Marques. São Paulo: Estação Liberdade, 2010.). A antropogênese promovida pelo humanismo ao longo da história fundamentou-se no poder da cultura e da erudição, como modo de domesticação dos ímpetos humanos.

Todavia, Sloterdijk constata, na sociedade contemporânea, a crise do humanismo como potência de formação, indagando se a sociedade adotará como prática a reprogramação genética de futuros indivíduos. O autor destaca que o desenvolvimento científico nos investe, hoje, com a capacidade de intervir sobre os mais básicos processos vitais, fazendo crer “de maneira crescentemente explícita - que o homem representa o poder mais alto para o homem” (SLOTERDIJK, 2010SLOTERDIJK, Peter. Regras para o parque humano: uma resposta à carta de Heidegger sobre o humanismo. Tradução de José Oscar de Almeida Marques. São Paulo: Estação Liberdade, 2010., p. 46). O poder biotecnológico conquistado altera a maneira como pensamos o desenvolvimento humano. Aos exercícios e discursos que compõem as antropotécnicas humanistas tradicionais integra-se agora um contingente de saberes e práticas, aptos a reconfigurar toda sorte de organismos e sistemas naturais.

Para Nietzsche (1886/2011)NIETZSCHE, Friedrich. Assim falou Zaratustra: um livro para espíritos livres (1886). Tradução de Mario da Silva. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2011., em Assim falou Zaratustra, o processo de formação humana suscita questionamentos éticos. O autor interroga: quais são os critérios e valores morais envolvidos na criação de pessoas? Que tipo de ser humano pretendeu-se criar, ao longo da história? Quais os interesses que motivaram a criação de pessoas, próprios à nossa civilização? O filósofo reconheceu na cultura uma arena de batalha entre aqueles que buscam apequenar ou emancipar o sujeito.

Ao considerar as intervenções sobre o genoma humano, operadas na atualidade, Sloterdijk (2010SLOTERDIJK, Peter. Regras para o parque humano: uma resposta à carta de Heidegger sobre o humanismo. Tradução de José Oscar de Almeida Marques. São Paulo: Estação Liberdade, 2010., p. 45) declarou ser a marca da era contemporânea que os indivíduos “mais e mais se encontrem no lado ativo ou subjetivo” da criação. Porém, ele entende que “há um desconforto no poder de escolha, e em breve será uma opção pela inocência recusar-se explicitamente a exercer o poder de seleção que de fato se obteve” (SLOTERDIJK, 2010SLOTERDIJK, Peter. Regras para o parque humano: uma resposta à carta de Heidegger sobre o humanismo. Tradução de José Oscar de Almeida Marques. São Paulo: Estação Liberdade, 2010., p. 45).

Desde a década de 1990, diferentes técnicas têm sido desenvolvidas e aplicadas no tratamento de desordens genéticas. Tais desordens podem acometer tanto o DNA nuclear quanto o mitocondrial. No tocante ao DNA nuclear, alterações genéticas associadas a patologias podem ocorrer ora na estrutura ou número de cromossomos, ora na sequência de nucleotídeos. Como forma de tratamento dessas desordens, diferentes estratégias têm sido empregadas clínica e experimentalmente, tais como a seleção de embriões (mediante diagnóstico genético pré-implantação - PGD) e a terapia gênica (mediante edição do genoma).

O PGD consiste em procedimento de reprodução assistida, pelo qual o genoma de embriões é mapeado, a fim de se identificar a ocorrência de mutações associadas a desordens genéticas. Embriões que apresentam tais mutações são descartados, visando-se à implantação apenas de embriões não mutantes (FRAGOULI, 2007FRAGOULI, Elpida. Preimplantation genetic diagnosis: present and future. Journal of Assisted Reproduction and Genetics, v. 4, n. 6, p. 201-207, 2007. https://doi.org/10.1007/s10815-007-9112-2
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). A edição genética consiste em procedimento distinto. Pela técnica, podem-se corrigir mutações no DNA de células germinais, embrionárias ou adultas (somáticas), por meio da eliminação de sequências genéticas ou da sua substituição (CARROLL; CHARO, 2015CARROLL, Dana; CHARO, Robin Alta. The societal opportunities and challenges of genome editing. Genome biology, v. 16, n. 242, p. 1-9, 2015. https://doi.org/10.1186/s13059-015-0812-0
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).

Em fevereiro de 2020, a ANVISA aprovou resolução que dispõe sobre a realização de terapia gênica no Brasil (BRASIL, 2018BRASIL. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução da Diretoria Colegiada - RDC nº 260, de 21 de dezembro de 2018. Diário Oficial da União, Brasília, 28 dez. 2018. Seção 1. Disponível em: Disponível em: http://portal.anvisa.gov.br/documents/10181/2718376/RDC_260_2018_.pdf/dd889184-bd4a-40ea-ae1c-b93155b20ea1 . Acesso em: 27 fev. 2020.
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). A medida permite a condução de pesquisas e a oferta de terapêuticas que envolvem alteração do DNA humano. Todavia, permanece em vigor no país a Lei de Biossegurança (BRASIL, 2005BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Lei nº 11.105, de 24 de março 2005. Regulamenta os incisos II, IV e V do § 1º do art. 225 da Constituição Federal, estabelece normas de segurança e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam organismos geneticamente modificados - OGM e seus derivados, cria o Conselho Nacional de Biossegurança - CNBS, reestrutura a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança - CTNBio, dispõe sobre a Política Nacional de Biossegurança - PNB, revoga a Lei nº 8.974, de 5 de janeiro de 1995, e a Medida Provisória nº 2.191-9, de 23 de agosto de 2001, e os arts. 5º , 6º , 7º , 8º , 9º , 10 e 16 da Lei nº 10.814, de 15 de dezembro de 2003, e dá outras providências. Disponível em: Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2005/lei/l11105.htm . Acesso em: 20 jan. 2017.
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), que proíbe a engenharia genética em célula germinal humana, zigoto humano e embrião humano.

O uso de tais técnicas suscita discussões sobre suas implicações bioéticas. Autores buscam avaliar os impactos da seleção e edição do genoma, refletindo sobre seus riscos e benefícios. Autores assumem diferentes posicionamentos, os quais se fundamentam em distintas concepções ontológicas. De modo a elucidar aspectos do debate, este artigo explicita as distintas concepções de humano presentes nas discussões sobre seleção e edição genéticas. Cumpre problematizar os limites e alcance de tais concepções, tendo em vista o uso refletido da tecnologia.

Características gerais das desordens genéticas

O termo DNA deriva da sigla para deoxyribonucleic acid (em português, ácido desoxirribonucleico). O DNA constitui-se de unidades básicas chamadas nucleotídeos, distribuídos ao longo de uma estrutura em dupla hélice, compostos de uma molécula de açúcar (desoxirribose), um grupo fosfato e uma base nitrogenada. Quatro tipos de bases nitrogenadas formam o DNA: adenina, timina, guanina e citosina (BROWN, 2012BROWN, Terry. Introduction to genetics: a molecular approach. New York: Garland Science, 2012.).

A molécula de DNA está presente em todas as células do corpo humano - com exceção dos glóbulos vermelhos maduros -, compactada no interior do núcleo celular, na forma de cromossomos (DNA nuclear), e também presente em mitocôndrias (DNA mitocondrial). As células somáticas possuem 22 pares de cromossomos autossomos e um par de cromossomos sexuais, totalizando 46 cromossomos. Metade desses cromossomos é herdada da genitora e outra metade do genitor. Já células germinativas (como os gametas) são haploides, isto é, apresentam apenas metade do set de cromossomos das células somáticas (BROWN, 2012BROWN, Terry. Introduction to genetics: a molecular approach. New York: Garland Science, 2012.).

Genes e cromossomos podem sofrer mutações. Tais alterações podem ocorrer de duas formas: por indução ou espontaneamente. Mutações induzidas dão-se, por exemplo, pela exposição a fatores ambientais, como substâncias tóxicas e radiação. Em contrapartida, mutações espontâneas podem ocorrer durante o processo de replicação do DNA (PIERCE, 2016PIERCE, Benjamin. Genetics: a conceptual approach. 6. ed. New York: W. H. Freeman , 2016). Células encontram-se em contínuo processo de divisão. No momento em que uma célula está prestes a se dividir, seu material genético duplica-se, gerando uma cópia para cada cromossomo. O processo de duplicação é acompanhado por enzimas que vistoriam as cópias cromossômicas produzidas, em busca de erros. Caso eles ocorram, serão corrigidos, para então a divisão celular se consumar.

Porém, eventuais erros escapam aos mecanismos de correção, consistindo em mutações transmitidas às células derivadas. Se as alterações acometerem células germinativas posteriormente fecundadas, elas serão herdadas pelos descendentes. Mutações levam a alterações na síntese de proteínas. Em decorrência, as proteínas podem apresentar mau funcionamento, ou ainda, nem chegar a ser sintetizadas. Algumas mutações revelam-se inofensivas, enquanto outras conferem aos organismos capacidades adaptativas. No entanto, certas mutações estão associadas a desordens orgânicas (PIERCE, 2016PIERCE, Benjamin. Genetics: a conceptual approach. 6. ed. New York: W. H. Freeman , 2016).

As desordens genéticas subdividem-se em dois tipos principais: a) as decorrentes de alterações nos cromossomos, relativas a modificações em sua estrutura ou quantidade, acometendo tanto cromossomos sexuais (X e Y) quanto cromossomos não sexuais (chamados autossomos); b) as decorrentes de alterações no nível dos genes (GRIFFITHS et al., 2000GRIFFITHS, Anthony et al. An introduction to genetic analysis. New York: W. H. Freeman, 2000.). Esta segunda categoria subdivide-se em outras duas classes: a) desordens monogênicas, caracterizadas por alterações em um único gene principal; b) desordens poligênicas, cuja causa envolve alterações em muitos genes.

As desordens monogênicas podem ser subsequentemente classificadas em: a) autossômicas dominantes e recessivas, decorrentes de alterações em genes presentes nos cromossomos não sexuais; b) dominantes e recessivas ligadas ao cromossomo X; c) dominantes e recessivas ligadas ao cromossomo Y; d) decorrentes de alterações nos genes mitocondriais (GRIFFITHS et al., 2000GRIFFITHS, Anthony et al. An introduction to genetic analysis. New York: W. H. Freeman, 2000.). Deve-se destacar que a vasta maioria dos distúrbios genéticos apresenta “penetrância incompleta”, tornando o surgimento da doença condicionado a complexas interações epigenéticas e ambientais.

As tabelas seguintes apresentam exemplos de desordens genéticas, organizadas conforme a descrição anterior. As informações estão dispostas em três colunas referentes ao nome da desordem, suas características e mutações associadas.

Tabela 1
Desordens de cromossomos autossomos

Tabela 2
Desordens de cromossomos sexuais

Tabela 3
Desordens monogênicas autossômicas

Tabela 4
Desordens monogênicas ligadas aos cromossomos sexuais

Tabela 5
Desordens poligênicas

Tabela 6
Desordens de alterações em genes mitocondriais

Seleção e edição do genoma: aspectos técnicos e éticos

Ainda que se compreendam relações entre alterações genéticas e determinadas desordens, as intervenções terapêuticas atuais sobre o genoma são limitadas. Desde a década de 1990, tratamentos têm sido desenvolvidos para o controle dessas alterações. Podem-se identificar duas principais abordagens terapêuticas: de um lado, a seleção genética e, de outro, a terapia gênica por edição genética. Enquanto a seleção genética configura prática já estabelecida na reprodução assistida, a edição do genoma é ainda predominantemente experimental.

A seleção efetiva-se por diagnóstico genético pré-implantação (PGD). O PGD inicia-se com a fertilização in vitro de embriões, nos quais será realizada uma biópsia, em busca de eventuais alterações do genoma. Para este rastreio são utilizados métodos como PCR (polymerase chain reaction) e FISH (fluorescence in situ hybridization). Para a biópsia, são retiradas células do embrião, o que pode ocorrer em diversos estágios de seu desenvolvimento, mais comumente no terceiro dia após a fertilização. Se a análise do DNA revelar a presença de mutações problemáticas, descarta-se o embrião, sendo implantados apenas aqueles livres da mutação (FRAGOULI, 2007FRAGOULI, Elpida. Preimplantation genetic diagnosis: present and future. Journal of Assisted Reproduction and Genetics, v. 4, n. 6, p. 201-207, 2007. https://doi.org/10.1007/s10815-007-9112-2
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).

A formação de embriões saudáveis, advindos de casal portador de alterações genéticas, é possível devido aos mecanismos de hereditariedade. Em virtude da combinação probabilística dos genes maternos e paternos, alguns embriões poderão não herdar certas alterações. Aplica-se o PGD, com sucesso, para doenças monogênicas dominantes ou recessivas, assim como para doenças cromossômicas numéricas e estruturais (COOPER; JUNGHEIM, 2010COOPER, Amber; JUNGHEIM, Emily. Preimplantation genetic testing: indications and controversies. Clinics in Laboratory Medicine, v. 30, n. 3, p. 519-531, 2010. https://doi.org/10.1016/j.cll.2010.04.008
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).

Entretanto, a técnica tem seu potencial terapêutico limitado diante das doenças poligênicas e mitocondriais. A seleção de embriões estará sempre restrita às combinações da carga genética dos pais. Ademais, dado que a transmissão de DNA mitocondrial ocorre unicamente por via materna, todos os embriões portam mutações, caso a mãe seja atingida. O PGD apenas conseguiria selecionar, entre os embriões afetados, aqueles com um menor número de genes danificados (COOPER; JUNGHEIM, 2010COOPER, Amber; JUNGHEIM, Emily. Preimplantation genetic testing: indications and controversies. Clinics in Laboratory Medicine, v. 30, n. 3, p. 519-531, 2010. https://doi.org/10.1016/j.cll.2010.04.008
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).

Em contrapartida, intervenções que modificam o genoma são realizadas por métodos de terapia gênica. No final dos anos 1980, William Anderson propôs transpor o princípio da recombinação de genes (utilizada na sintetização artificial de DNA recombinante) para o tratamento de enfermidades. O pesquisador recebeu em 1990 a aprovação da FDA para testar a nova abordagem terapêutica na menina Ashanti DeSilva, então com 4 anos, afetada pela SCID (Imunodeficiência Combinada Grave) (NAAM, 2010NAAM, Ramez. More than human: embracing the promise of biological enhancement. 2. ed. New York: Broadway Books, 2010.).

A doença resulta de uma mutação genética que impede a síntese correta da proteína adenosina deaminase, levando à morte de glóbulos brancos. O tratamento revelou-se bem-sucedido e impulsionou o aperfeiçoamento da terapia gênica. Desde então, conforme Naam (2010NAAM, Ramez. More than human: embracing the promise of biological enhancement. 2. ed. New York: Broadway Books, 2010.), centenas de laboratórios têm realizado experimentos com esta abordagem, para uma grande diversidade de patologias.

A terapia gênica visa corrigir genes mutantes, inserindo cópias regulares no genoma do paciente. Ela pode ser aplicada tanto em células germinativas, quanto somáticas. No primeiro caso, essa substituição dá-se usualmente pela inserção do gene saudável no núcleo de uma célula somática, transferindo-o em seguida para um óvulo, cujo núcleo original foi removido. Fecunda-se então o óvulo por fertilização in vitro, para implantá-lo, a fim de gerar um novo indivíduo (BROWN, 2012BROWN, Terry. Introduction to genetics: a molecular approach. New York: Garland Science, 2012.).

O gene não mutante estará presente em todas as células do futuro organismo e em seus descendentes. No entanto, como mostrará o debate sobre edição genética, a alteração de células germinativas é controversa, e até recentemente o procedimento não havia sido aplicado a humanos. Por sua vez, a terapia gênica em células somáticas, tal como realizada em Ashanti DeSilva, efetua apenas alterações em células adultas, ficando as alterações restritas aos tecidos ou órgãos alvos do tratamento.

O principal desafio da terapia gênica consiste nas formas de “entrega gênica” (gene delivery), isto é, o modo pelo qual se transferem os genes saudáveis para o DNA-alvo. Uma das técnicas de entrega utiliza vírus como vetores. Após inserir o gene não mutante no genoma de vírus, estes são injetados no paciente, com o objetivo de infectar suas células, depositando nelas o material genético desejado. Os vírus são modificados para se replicarem, sem, contudo, provocarem doenças. Os adenovírus depositam seu genoma de forma semipermanente no núcleo da célula infectada e são transmitidos às células-filhas (BROWN, 2012BROWN, Terry. Introduction to genetics: a molecular approach. New York: Garland Science, 2012.).

O uso de certos vetores virais, entretanto, pode produzir danos, e a história da terapia gênica é marcada por alguns infortúnios. De acordo com Naam (2010NAAM, Ramez. More than human: embracing the promise of biological enhancement. 2. ed. New York: Broadway Books, 2010.), há dois grandes problemas com esta abordagem. O primeiro diz respeito à resposta imunológica do organismo hospedeiro. Em 1999, o paciente Jesse Gelsinger morreu como consequência de um ensaio clínico de terapia gênica, destinado ao tratamento da deficiência de OTC (Ornitina Transcarbamilase). Após receber injeções com vetores virais, o paciente sofreu uma reação imunológica severa que culminou em um quadro de falência múltipla de órgãos (SIBBALD, 2001SIBBALD, Barbara. Death but one unintended consequence of gene-therapy trial. Canadian Medical Association Journal, v. 164, n. 11, p. 1612, 2001. Available at: Available at: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC81135 /. Accessed on: 12 jan. 2016.
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).

Ademais, vetores como adenovírus apresentam a limitação de serem pouco precisos quanto aos locais em que eles se acoplam no DNA das células-alvo. Essa baixa precisão não se mostrará problemática caso a região em que o vírus se acople no DNA hospedeiro não realize funções importantes. Todavia, pode haver nessa região genes codificadores de proteínas essenciais, suscetíveis a danos causados pela presença viral. Em consequência dessa ação errática, dois pacientes desenvolveram leucemia após tratamento experimental, conduzido em 2002 pelos pesquisadores Alain Fischer e Marina Cavezzena-Calvo (GORE, 2003GORE, Martin. Adverse effects of gene therapy: gene therapy can cause leukaemia: no shock, mild horror but a probe. Gene therapy, v. 10, n. 1, p. 4, 2003. https://doi.org/10.1038/sj.gt.3301946
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).

Como alternativa, tem-se procurado elaborar outros vetores. Diferentemente dos adenovírus, os chamados vírus adenoassociados (AAV) representam uma promissora ferramenta de entrega gênica. Eles possuem a vantagem de serem tolerados pela população humana, provocando baixa resposta imunológica, e de se alojarem sempre em lugares específicos do DNA-alvo.

Estudos concentram-se também no uso de vetores não virais, como lipossomos, e na injeção direta de genes (naked DNA). No primeiro caso, insere-se o material genético terapêutico em vesículas compostas de dupla camada lipídica, que se fundem com a membrana das células-alvo. No segundo, injetam-se os genes diretamente na corrente sanguínea do paciente, permitindo que algumas células assimilem esse material. (BROWN, 2012BROWN, Terry. Introduction to genetics: a molecular approach. New York: Garland Science, 2012.; NAAM, 2010NAAM, Ramez. More than human: embracing the promise of biological enhancement. 2. ed. New York: Broadway Books, 2010.).

Para além da busca por novos vetores, a terapia gênica viria a se beneficiar de uma estratégia alternativa de modificação do genoma, a saber, a edição genética. Diferentemente dos métodos tradicionais de terapia gênica, a edição genética permite a eliminação de trechos do genoma original e possibilita, ademais, que nova sequência de nucleotídeos seja inserida no local (CARROLL; CHARO, 2015CARROLL, Dana; CHARO, Robin Alta. The societal opportunities and challenges of genome editing. Genome biology, v. 16, n. 242, p. 1-9, 2015. https://doi.org/10.1186/s13059-015-0812-0
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). Experimentos com edição genética já estavam em curso no início da década de 1990.

Tais modificações ocorrem mediante enzimas configuradas por engenharia molecular, sendo elas: 1) meganucleases; 2) Zinc-Finger nucleases; 3) TALEN; 4) CRISPR-Cas9. A edição pode ser realizada tanto em células somáticas quanto em células germinativas. Modificações em células germinativas (gametas e precursores) e em embriões são herdáveis, isto é, transmitidas a todos os organismos descendentes.

Tanto o PGD quanto a terapia genética mediante edição suscitam controvérsias bioéticas, as quais, quando envolvem o PGD, ocorrem em torno de três eixos de objeções: a) objeções sobre a eficácia e segurança da técnica; b) objeções contra a criação de embriões, com base na preferência genética, e suas extrapolações não terapêuticas; c) objeções contra a eliminação de embriões e o ato de seleção “em si” (ROBERTSON, 2003ROBERTSON, John. Extending preimplantation genetic diagnosis: the ethical debate. Human Reproduction, v. 18, n. 3, p. 465-471, 2003. https://doi.org/10.1093/humrep/deg100
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).

No âmbito da discussão sobre eficácia e segurança, destacam-se autores como Scriven e colaboradores (2001SCRIVEN, Paul et al. Robertsonian translocations: reproductive risks and indications for preimplantation genetic diagnosis. Human Reproduction , v. 16, n. 11, p. 2267-73, 2001. https://doi.org/10.1093/humrep/16.11.2267
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). Para eles, o uso da seleção genética é eticamente aceitável, caso seja tecnicamente aperfeiçoada, de modo a minimizar consequências biológicas indesejáveis aos indivíduos. Todavia, para um segundo conjunto de autores o controle técnico da seleção de embriões não é suficiente para admitirmos seu uso. Habermas (2010HABERMAS, Jürgen. O futuro da natureza humana: a caminho de uma eugenia liberal? São Paulo: Martins Fontes, 2010.) ressalta que o procedimento suscita riscos, como o ressurgimento de práticas eugenistas, em sua forma liberal. Já um terceiro conjunto de autores sustenta que o PGD é problemático por interferir no curso reprodutivo natural, revelando um impulso reprovável de dominação e controle, ameaçando transformar pessoas em manufaturas. Kass et al. (2002KASS, Leon et al. Beyond therapy: biotechnology and the pursuit of happiness. New York: Harper Perennial, 2002. ) apoiam-se sobre a premissa de existir uma ordem moral subjacente à natureza e sustentam que embriões possuem estatuto moral de pessoa humana.

No tocante à terapia gênica (na qual se modifica o DNA), os debates problematizam as diferentes classes de aplicação deste procedimento em humanos: terapia de células somáticas, terapia de células germinativas e melhoramento genético. Pioneiro da terapia gênica, Anderson (1985ANDERSON, William French. Human gene therapy: scientific and ethical considerations. The Journal of Medicine & Philosophy, v. 10, n. 3, p. 275-292, 1985.) considera ética a terapia de células somáticas, sendo o benefício do tratamento de doenças sua principal justificação. Porém, o autor adverte que ensaios clínicos humanos devem ocorrem apenas quando os seguintes critérios forem satisfeitos em animais: a) os genes serem inseridos nas devidas células-alvo e permanecerem nelas por tempo suficiente; b) os genes inseridos serem expressos na intensidade adequada; c) os novos genes não afetarem negativamente as células.

Em contrapartida, Anderson (1985ANDERSON, William French. Human gene therapy: scientific and ethical considerations. The Journal of Medicine & Philosophy, v. 10, n. 3, p. 275-292, 1985.) considera controversas a alteração de células germinativas e alterações para fins de melhoramento. Ainda que técnicas permitissem inserir genes em gametas humanos, importantes obstáculos permanecem. Dado que alterações germinativas são transmitidas aos descendentes, quaisquer mutações indesejáveis produzidas pela técnica se integrariam ao patrimônio genético de nossa espécie. A avaliação de sua eficácia e segurança requereria um longo período, exigindo estudos com diversas gerações futuras (ANDERSON, 1985ANDERSON, William French. Human gene therapy: scientific and ethical considerations. The Journal of Medicine & Philosophy, v. 10, n. 3, p. 275-292, 1985.).

O autor não elimina a possibilidade de aplicação da terapia gênica em gametas. Todavia, ele ressalta certas condições a serem atendidas antes de realizarmos o procedimento. Deve haver conhecimento científico significativo acumulado de terapias com células somáticas humanas e de estudos animais com células germinativas, além de amplo consentimento da população geral sobre a prática.

Anderson (1985ANDERSON, William French. Human gene therapy: scientific and ethical considerations. The Journal of Medicine & Philosophy, v. 10, n. 3, p. 275-292, 1985.) opõe-se ao uso da inserção de genes para fins de melhoramento, isto é, para a potencialização das capacidades naturais da espécie humana. Nesse aspecto, ele se distingue de teóricos como Smith, Chan e Harris (2012SMITH, Kevin; CHAN, Sarah; HARRIS, John. Human germline genetic modification: scientific and bioethical perspectives. Archives of Medical Research, v. 43, n. 7, p. 491-513, 2012. https://doi.org/10.1016/j.arcmed.2012.09.003
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). Tais autores afirmam que objeções ao melhoramento, por este modificar aquilo que consideramos normal ou natural, carecem de força lógica. Para eles, “é irracional ver o genoma humano, em seu atual estado natural, como sendo de algum modo perfeito” (SMITH; CHAN; HARRIS, 2012SMITH, Kevin; CHAN, Sarah; HARRIS, John. Human germline genetic modification: scientific and bioethical perspectives. Archives of Medical Research, v. 43, n. 7, p. 491-513, 2012. https://doi.org/10.1016/j.arcmed.2012.09.003
https://doi.org/10.1016/j.arcmed.2012.09...
, p. 507). A evolução legou à humanidade diversas fraquezas genéticas. Assim, havendo ferramentas científicas, como a terapia gênica, que efetuem nosso melhoramento biológico, devemos utilizá-las.

Autores como Lanphier et al. (2015LANPHIER, Edward et al. Don’t edit the human germ line. Nature, v. 519, n. 7544, p. 410-411, 2015. https://doi.org/10.1038/519410a
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) e Savulescu et al. (2015SAVULESCU, Julian et al. The moral imperative to continue gene editing research on human embryos. Protein & Cell, v. 6, n. 7, p. 476-479, 2015. https://doi.org/10.1007/s13238-015-0184-y
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) procuram não apenas avaliar as implicações éticas de cada procedimento, mas contrapor os riscos e benefícios da seleção genética aos da edição genética. Para os primeiros autores, a edição de células germinativas deve ser desencorajada em favor da edição de células somáticas e da seleção genética (LANPHIER et al., 2015LANPHIER, Edward et al. Don’t edit the human germ line. Nature, v. 519, n. 7544, p. 410-411, 2015. https://doi.org/10.1038/519410a
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). Declaram que, uma vez que as modificações do DNA de gametas são herdáveis, os riscos da técnica a tornam inaceitável. Tais riscos consistem principalmente em: mutações off-target, decorrentes da ação errática das enzimas de edição; edição incompleta do genoma (operando-se modificações em apenas um subconjunto de células, resultando no chamado mosaicismo genético); e efeitos imprevisíveis, observáveis somente após o nascimento das futuras gerações (LANPHIER et al. 2015LANPHIER, Edward et al. Don’t edit the human germ line. Nature, v. 519, n. 7544, p. 410-411, 2015. https://doi.org/10.1038/519410a
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). Em decorrência, no manejo de desordens genéticas deve-se optar pela seleção de embriões, e caso seja necessária a modificação do genoma, ela deve limitar-se a células somáticas (cujas modificações não são herdáveis).

Por sua vez, Savulescu et al. (2015SAVULESCU, Julian et al. The moral imperative to continue gene editing research on human embryos. Protein & Cell, v. 6, n. 7, p. 476-479, 2015. https://doi.org/10.1007/s13238-015-0184-y
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) sustentam que a seleção genética não somente é limitada terapeuticamente, em comparação à edição, como também esta última é preferível do ponto de vista moral. Os autores afirmam que, para desordens poligênicas, o PGD se mostra inviável, dado que requereria a criação de incontáveis embriões (SAVULESCU et al., 2015SAVULESCU, Julian et al. The moral imperative to continue gene editing research on human embryos. Protein & Cell, v. 6, n. 7, p. 476-479, 2015. https://doi.org/10.1007/s13238-015-0184-y
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). Ademais, o PGD também se mostra inviável no tratamento de doenças genéticas, para as quais ambos os pais portam mutações.

A tecnologia de edição genética requer a criação e destruição de menos embriões, quando comparada ao PGD, prática que já está incorporada a tratamentos reprodutivos atuais. Enquanto o PGD exige criarmos uma grande quantidade de embriões, a fim de selecionarmos os exemplares não mutantes, a edição genética habilita-nos a corrigir diretamente as mutações em um único embrião (SAVULESCU et al., 2015SAVULESCU, Julian et al. The moral imperative to continue gene editing research on human embryos. Protein & Cell, v. 6, n. 7, p. 476-479, 2015. https://doi.org/10.1007/s13238-015-0184-y
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). Por conseguinte, eventuais controvérsias relacionadas à destruição de embriões (supostamente dotados de dignidade moral) são contornáveis pela edição genética.

Savulescu et al. (2015SAVULESCU, Julian et al. The moral imperative to continue gene editing research on human embryos. Protein & Cell, v. 6, n. 7, p. 476-479, 2015. https://doi.org/10.1007/s13238-015-0184-y
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) acreditam que os benefícios dessa tecnologia envolvem intervir sobre condições não patológicas, como o envelhecimento. Nesse sentido, os autores colocam-se a favor do melhoramento humano. Eles destacam que “o envelhecimento mata 30 milhões de pessoas todo ano e incapacita muitas outras” (SAVULESCU et al., 2015SAVULESCU, Julian et al. The moral imperative to continue gene editing research on human embryos. Protein & Cell, v. 6, n. 7, p. 476-479, 2015. https://doi.org/10.1007/s13238-015-0184-y
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, p. 478). Em vista de resultados promissores atingidos em modelos animais, “em última análise, a edição genética poderia ser usada para retardar ou desativar o envelhecimento em humanos” (SAVULESCU et al., 2015SAVULESCU, Julian et al. The moral imperative to continue gene editing research on human embryos. Protein & Cell, v. 6, n. 7, p. 476-479, 2015. https://doi.org/10.1007/s13238-015-0184-y
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, p. 478).

Concepções ontológicas e suas implicações

Como destacado inicialmente, em 1999 o filósofo Peter Sloterdijk (2010SLOTERDIJK, Peter. Regras para o parque humano: uma resposta à carta de Heidegger sobre o humanismo. Tradução de José Oscar de Almeida Marques. São Paulo: Estação Liberdade, 2010.) profere conferência na qual problematiza a crise do humanismo na contemporaneidade. Para o autor, o humanismo consiste em um conjunto de saberes e práticas voltado à formação moral e intelectual de indivíduos. O humanismo conheceria impasses na atualidade, levando Sloterdijk a se questionar sobre as implicações de tecnologias genéticas como instrumento de antropogênese. Ao longo deste artigo, buscou-se inicialmente evidenciar o advento de tecnologias dedicadas ao controle de desordens genéticas. Tais tecnologias compreendem tanto a seleção de embriões quanto a edição de genes. A aplicação destes procedimentos suscita discussões éticas sobre a legitimidade das práticas, ponderando-se seus riscos e benefícios.

O presente estudo postula a existência de diferentes concepções de humano, assumidas como premissa no debate sobre seleção e edição genética. Tais concepções consistem em: a) concepção ético-jurídica de humano, baseada no paradigma dos direitos humanos; b) concepção naturalista de humano, baseada na teoria da evolução; c) concepção de humano, como dotado de uma natureza a ser conservada; e d) concepção de humano como algo que requer melhoramento contínuo. Elas se referem a formas de compreender e agir sobre pessoas hoje, engendrando diferentes modos de subjetivação. Essas concepções não são excludentes, estando estreitamente articuladas e se sobrepondo em diversos níveis. Tampouco esgotam os sentidos de humano que circulam na atualidade.

A concepção ético-jurídica de humano é evidenciada por autores como Habermas (2010HABERMAS, Jürgen. O futuro da natureza humana: a caminho de uma eugenia liberal? São Paulo: Martins Fontes, 2010.), tendo por fundamento o paradigma dos direitos humanos e a ética deontológica. O referido paradigma propõe a existência de direitos entendidos como inatos e possuindo as propriedades de “universalidade, independência (do reconhecimento social ou legal), naturalidade, inalienabilidade, inconfiscabilidade e imprescritibilidade” (SIMMONS, 2001SIMMONS, Alan John. Justification and legitimacy: essays on rights and obligations. Cambridge: Cambridge University Press, 2001., p. 185). Eles implicam obrigações éticas e legais para com as pessoas, pelo simples fato de elas serem humanas, independentemente de sua nacionalidade, religião, linguagem ou etnia.

O conceito de humanidade neste contexto opera como “ideia reguladora”, em sentido kantiano. Como tal, ela é elaborada no plano transcendental da razão, para então aplicar-se à experiência contingente. É nessa acepção que o paradigma dos direitos humanos se inclui no conjunto de teorias éticas ditas deontológicas. Os direitos humanos contemplam comumente os seguintes conjuntos de responsabilidades: a) direitos à liberdade e à segurança pessoal - como proteção contra a tortura e escravidão; b) direitos civis - como direito à moradia, emigração e casamento; c) direitos políticos - como livre associação política; d) direitos econômicos, sociais e culturais - como acesso à saúde, educação e trabalho (SIMMONS, 2001SIMMONS, Alan John. Justification and legitimacy: essays on rights and obligations. Cambridge: Cambridge University Press, 2001.). No âmbito da saúde, direitos reprodutivos e o uso instrumental de componentes biológicos são também abordados sob esta perspectiva.

Ademais, identificamos uma segunda concepção de humano, a saber, a concepção naturalista, fundamentada na teoria da evolução como sistema explicativo acerca de nossa espécie. Esta concepção é evidenciada por autores como Lanphier et al. (2015LANPHIER, Edward et al. Don’t edit the human germ line. Nature, v. 519, n. 7544, p. 410-411, 2015. https://doi.org/10.1038/519410a
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), Scriven et al. (2001SCRIVEN, Paul et al. Robertsonian translocations: reproductive risks and indications for preimplantation genetic diagnosis. Human Reproduction , v. 16, n. 11, p. 2267-73, 2001. https://doi.org/10.1093/humrep/16.11.2267
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) e Anderson (1985ANDERSON, William French. Human gene therapy: scientific and ethical considerations. The Journal of Medicine & Philosophy, v. 10, n. 3, p. 275-292, 1985.). De acordo com os biólogos Brian e Deborah Charlesworth (2003CHARLESWORTH, Brian; CHARLESWORTH, Deborah. Evolution: a very short introduction. Oxford: Oxford University Press , 2003., p. 13), “as ideias evolutivas fornecem um conjunto de processos naturais que podem explicar a vasta diversidade de espécies existentes, e as características que as tornam tão bem-adaptadas a seu meio, sem recorrer a uma intervenção sobrenatural”. Tais processos naturais consistiram em: mutação do DNA, seleção natural das mutações e deriva genética. Lanphier et al. (2015)LANPHIER, Edward et al. Don’t edit the human germ line. Nature, v. 519, n. 7544, p. 410-411, 2015. https://doi.org/10.1038/519410a
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, Scriven et al. (2001)SCRIVEN, Paul et al. Robertsonian translocations: reproductive risks and indications for preimplantation genetic diagnosis. Human Reproduction , v. 16, n. 11, p. 2267-73, 2001. https://doi.org/10.1093/humrep/16.11.2267
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e Anderson (1985)ANDERSON, William French. Human gene therapy: scientific and ethical considerations. The Journal of Medicine & Philosophy, v. 10, n. 3, p. 275-292, 1985. enfatizam a avaliação da eficácia e segurança das técnicas como critério de sua aceitabilidade

Em articulação a esta concepção ontológica, os autores assumem o utilitarismo como sistema ético. O utilitarismo refere-se à doutrina filosófica originalmente formulada por Jeremy Bentham (1781/1948BENTHAM, Jeremy. An introduction to the principles of morals and legislation (1781). New York: Hafner, 1948., p. 2), segundo o qual “utilidade” designa a “propriedade de certo objeto produzir benefício, vantagem, prazer, bem ou felicidade”, ou, ainda, o ato de “impedir que ocorram desventuras, dores, males ou infelicidade à parte cujo interesse é considerado”. A perspectiva utilitarista sustenta que noções como bem e mal devem ser avaliadas por sua capacidade de maximizar o bem-estar de uma população.

Cumpre, aqui, tecermos algumas considerações sobre estes posicionamentos. Em face das técnicas de seleção e edição genética, sustentamos que princípios deontológicos podem ser articulados a princípios utilitaristas, conciliando o papel inclusivo dos direitos humanos com a maximização do bem-estar material. Tal articulação se daria no âmbito da chamada “justiça distributiva”.

A noção de justiça possui um longo passado. Desde as filosofias aristotélica e platônica, o pensamento ocidental vê-se às voltas com o problema da conduta justa. Nas discussões bioéticas contemporâneas, destaca-se o conceito de justiça distributiva. Conforme Beauchamp e Childress (2008BEAUCHAMP, Tom; CHILDRESS, James. Principles of biomedical ethics. 6. ed. Oxford: Oxford University Press, 2008. ), tal conceito implica a distribuição equânime dos bens e serviços de uma sociedade entre os indivíduos, com base em normas que regulam a cooperação social.

Isso significa alocar recursos mediante, simultaneamente: a) uma abordagem utilitarista que visa maximizar o bem-estar da população; b) uma abordagem igualitária, que defende a equanimidade entre os sujeitos, tanto do ponto de vista de seu valor intrínseco quanto das oportunidades que a eles são oferecidas (BEAUCHAMP; CHILDRESS, 2008BEAUCHAMP, Tom; CHILDRESS, James. Principles of biomedical ethics. 6. ed. Oxford: Oxford University Press, 2008. ).

Por conseguinte, este estudo propõe que a noção de justiça distributiva possa ser considerada como diretriz na aplicação de técnicas de seleção e edição do genoma. Esta diretriz poderá contribuir para assegurar o acesso a tecnologias de média e alta complexidade, de forma que os benefícios de tecnologia sejam igualmente distribuídos.

A terceira concepção identificada compreende o humano como dotado de uma natureza a ser conservada. Ela é evidenciada por autores como Kass et al. (2002KASS, Leon et al. Beyond therapy: biotechnology and the pursuit of happiness. New York: Harper Perennial, 2002. ). Eles defendem a existência de uma natureza humana universal e normativa, cuja modificação acarretaria a violação da dignidade e do respeito para com os indivíduos. A concepção bioconservadora de humano assume que regras morais e proibições devem estar fundamentadas no que afirmam ser a essência humana (BOSTROM, 2005BOSTROM, Nick. In defence of posthuman dignity. Bioethics, v. 19, n. 3, p. 202-214, 2005.).

Eles tomam como “alegações regulatórias” aquilo que Buchanan (2013BUCHANAN, Allen. Beyond humanity: the ethics of biomedical enhancement. Oxford: Oxford University Press , 2013., p. 61) denomina de “alegações descritivas”. Em decorrência, esta concepção de humano implica a tarefa de impedir intervenções técnicas que alterem nossa suposta natureza, tal como o faz a seleção de embriões e a edição de gametas. Declaram existir uma ordem moral subjacente à natureza e conferem estatuto de pessoa humana a embriões.

Alguns aspectos dessa concepção devem aqui ser problematizados. Ressalta-se que ela difere daquela representada pelo paradigma dos direitos humanos. O conceito ético-jurídico de humanidade equivale a uma noção reguladora transcendental, não decorrendo das características naturais da espécie. O conceito conservador de humano se estrutura de modo inverso. Os autores tomam traços e comportamentos humanos “contingentes” e os elevam ao estatuto de essência. Do ponto de vista ético, enquanto a concepção deontológica de humano opera como fator de inclusão, a perspectiva conservadora pode acabar por reforçar a estigmatização e segregação de populações vulneráveis e colocadas à margem da sociedade.

A análise das controvérsias revela, por fim, uma quarta concepção, a concepção transumanista, evidenciada por Smith, Chan e Harris (2012SMITH, Kevin; CHAN, Sarah; HARRIS, John. Human germline genetic modification: scientific and bioethical perspectives. Archives of Medical Research, v. 43, n. 7, p. 491-513, 2012. https://doi.org/10.1016/j.arcmed.2012.09.003
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) e Savulescu et al. (2015SAVULESCU, Julian et al. The moral imperative to continue gene editing research on human embryos. Protein & Cell, v. 6, n. 7, p. 476-479, 2015. https://doi.org/10.1007/s13238-015-0184-y
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). Conforme esta premissa, a condição humana é compreendida como algo que, do ponto de vista biológico, deve ser continuamente melhorado. Tal concepção rompe com o vínculo entre natureza e norma, opondo-se à concepção conservadora. Ela compartilha da definição naturalista de humanidade, proposta pela teoria da evolução. No entanto, ultrapassa essa teoria, ao defender a interferência sobre o curso evolutivo, de modo a dirigirmos deliberadamente os processos de transformação biológica que nos afetam (BOSTROM, 2005BOSTROM, Nick. In defence of posthuman dignity. Bioethics, v. 19, n. 3, p. 202-214, 2005.).

Segundo esta concepção, “a evolução não produz objetos harmônicos, sem falhas: ela remenda produtos instáveis, a maior parte dos quais será destruída rapidamente, até que todos eles eventualmente expirem” (BUCHANAN, 2013BUCHANAN, Allen. Beyond humanity: the ethics of biomedical enhancement. Oxford: Oxford University Press , 2013., p. 156). Autores como Smith, Chan e Harris (2012SMITH, Kevin; CHAN, Sarah; HARRIS, John. Human germline genetic modification: scientific and bioethical perspectives. Archives of Medical Research, v. 43, n. 7, p. 491-513, 2012. https://doi.org/10.1016/j.arcmed.2012.09.003
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) e Savulescu et al. (2015SAVULESCU, Julian et al. The moral imperative to continue gene editing research on human embryos. Protein & Cell, v. 6, n. 7, p. 476-479, 2015. https://doi.org/10.1007/s13238-015-0184-y
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) consideram injustificável a exigência de manter nossa atual constituição física e cognitiva. Esta concepção é evidenciada no debate, pela defesa que apresentam quanto ao uso de tecnologias genéticas para melhoramento humano. Em face da abertura biológica que nos caracteriza, os autores advogam pelo direito de indivíduos reconfigurarem seus corpos e mentes, entendendo esta prática como uma forma de autodeterminação.

Novamente, requer-se problematizar esta concepção ontológica. Por um lado, devemos desfazer associações retóricas entre eugenia e o melhoramento humano da cognição, da expectativa de vida e do vigor físico, como propõe Habermas (2010HABERMAS, Jürgen. O futuro da natureza humana: a caminho de uma eugenia liberal? São Paulo: Martins Fontes, 2010.), ao postular uma eugenia liberal. Por outro lado, devemos ter em vista que a busca pelo contínuo melhoramento biológico pode violar a dignidade humana, ao reforçar a estigmatização de sujeitos vulneráveis, acirrando processos de segregação. Propõe-se, como consequência, que o conceito de justiça distributiva seja adotado em resposta a este impasse ético, assegurando a equanimidade como princípio regulador do desenvolvimento tecnológico.

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  • *
    Pesquisa desenvolvida com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES.
  • 2
    Os dados completos do autor encontram-se ao final do artigo.
  • Errata

    No artigo “Fundamentos ontológicos do debate sobre seleção e edição do genoma”, com número de DOI: 10.22409/1984-0292/v32i2/5607, publicado no periódico Fractal: Revista de Psicologia, vol. 32 (2): 111-119, https://periodicos.uff.br/fractal/article/view/5607, https://www.scielo.br/j/fractal/a/m7VMhhPM575RCPttz6y5Srh/?lang=pt, na página 111, onde se lia:
    Com vistas ao manejo de desordens genéticas, diferentes terapêuticas têm sido empregadas clínica e experimentalmente, desde a década de 1990.
    Leia-se:
    Com vistas ao manejo de condições genéticas, diferentes terapêuticas têm sido empregadas clínica e experimentalmente, desde a década de 1990.
    Onde se lia:
    With a view to managing genetic disorders, different therapies have been employed clinically and experimentally, since the 1990s.
    Leia-se:
    With a view to managing genetic conditions, different therapies have been employed clinically and experimentally, since the 1990s.
    Nas páginas 111-112, onde se lia:
    Desde a década de 1990, diferentes técnicas têm sido desenvolvidas e aplicadas no tratamento de desordens genéticas. Tais desordens podem acometer tanto o DNA nuclear quanto o mitocondrial. No tocante ao DNA nuclear, alterações genéticas associadas a patologias podem ocorrer ora na estrutura ou número de cromossomos, ora na sequência de nucleotídeos. Como forma de tratamento dessas desordens, diferentes estratégias têm sido empregadas clínica e experimentalmente, tais como a seleção de embriões (mediante diagnóstico genético pré-implantação - PGD) e a terapia gênica (mediante edição do genoma).
    Leia-se:
    Desde a década de 1990, diferentes técnicas têm sido desenvolvidas e aplicadas no tratamento de condições genéticas. Tais condições podem acometer tanto o DNA nuclear quanto o mitocondrial. No tocante ao DNA nuclear, alterações genéticas associadas a patologias podem ocorrer ora na estrutura ou número de cromossomos, ora na sequência de nucleotídeos. Como forma de tratamento dessas condições, diferentes estratégias têm sido empregadas clínica e experimentalmente, tais como a seleção de embriões (mediante diagnóstico genético pré-implantação - PGD) e a terapia gênica (mediante edição do genoma).
    Na página 112, onde se lia:
    O PGD consiste em procedimento de reprodução assistida, pelo qual o genoma de embriões é mapeado, a fim de se identificar a ocorrência de mutações associadas a desordens genéticas.
    Leia-se:
    O PGD consiste em procedimento de reprodução assistida, pelo qual o genoma de embriões é mapeado, a fim de se identificar a ocorrência de mutações associadas a condições genéticas.
    Onde se lia:
    Características gerais das desordens genéticas
    Leia-se:
    Características gerais das condições genéticas
    Onde se lia:
    No entanto, certas mutações estão associadas a desordens orgânicas (PIERCE, 2016).
    Leia-se:
    No entanto, certas mutações estão associadas a condições orgânicas (PIERCE, 2016).
    Onde se lia:
    As desordens genéticas subdividem-se em dois tipos principais: a) as decorrentes de alterações nos cromossomos, relativas a modificações em sua estrutura ou quantidade, acometendo tanto cromossomos sexuais (X e Y) quanto cromossomos não sexuais (chamados autossomos); b) as decorrentes de alterações no nível dos genes (GRIFFITHS et al., 2000). Esta segunda categoria subdivide-se em outras duas classes: a) desordens monogênicas, caracterizadas por alterações em um único gene principal; b) desordens poligênicas, cuja causa envolve alterações em muitos genes.
    Leia-se:
    As condições genéticas subdividem-se em dois tipos principais: a) as decorrentes de alterações nos cromossomos, relativas a modificações em sua estrutura ou quantidade, acometendo tanto cromossomos sexuais (X e Y) quanto cromossomos não sexuais (chamados autossomos); b) as decorrentes de alterações no nível dos genes (GRIFFITHS et al., 2000). Esta segunda categoria subdivide-se em outras duas classes: a) condições monogênicas, caracterizadas por alterações em um único gene principal; b) condições poligênicas, cuja causa envolve alterações em muitos genes.
    Onde se lia:
    As desordens monogênicas podem ser subsequentemente classificadas em: a) autossômicas dominantes e recessivas, decorrentes de alterações em genes presentes nos cromossomos não sexuais; b) dominantes e recessivas ligadas ao cromossomo X; c) dominantes e recessivas ligadas ao cromossomo Y; d) decorrentes de alterações nos genes mitocondriais (GRIFFITHS et al., 2000). Deve-se destacar que a vasta maioria dos distúrbios genéticos apresenta “penetrância incompleta”, tornando o surgimento da doença condicionado a complexas interações epigenéticas e ambientais.
    Leia-se:
    As condições monogênicas podem ser subsequentemente classificadas em: a) autossômicas dominantes e recessivas, decorrentes de alterações em genes presentes nos cromossomos não sexuais; b) dominantes e recessivas ligadas ao cromossomo X; c) dominantes e recessivas ligadas ao cromossomo Y; d) decorrentes de alterações nos genes mitocondriais (GRIFFITHS et al., 2000). Deve-se destacar que a vasta maioria dos distúrbios genéticos apresenta “penetrância incompleta”, tornando o surgimento da condição vinculado a complexas interações epigenéticas e ambientais.
    Onde se lia:
    As tabelas seguintes apresentam exemplos de desordens genéticas, organizadas conforme a descrição anterior. As informações estão dispostas em três colunas referentes ao nome da desordem, suas características e mutações associadas.
    Leia-se:
    As tabelas seguintes apresentam exemplos de condições genéticas, organizadas conforme a descrição anterior. As informações estão dispostas em três colunas referentes ao nome da condição, suas características e mutações associadas.
    Na página 113, onde se lia:
    Tabela 1 - Desordens de cromossomos autossomos
    Leia-se:
    Tabela 1 - Condições de cromossomos autossomos
    Onde se lia:
    Tabela 2 - Desordensde cromossomos sexuais
    Leia-se:
    Tabela 2 - Condições de cromossomos sexuais
    Onde se lia:
    Tabela 3 - Desordensmonogênicas autossômicas
    Leia-se:
    Tabela 3 - Condições monogênicas autossômicas
    Na página 114, onde se lia:
    Tabela 4 - Desordens monogênicasligadas aos cromossomos sexuais
    Leia-se:
    Tabela 4 - Condições monogênicasligadas aos cromossomos sexuais
    Onde se lia:
    Tabela 5 - Desordens poligênicas
    Leia-se:
    Tabela 5 - Condições poligênicas
    Onde se lia:
    Nome Características Alterações Doença de Alzheimer Neurodegeneração responsável por perda de memória, alterações do humor e comportamentais, desorientação e problemas com a linguagem. O componente genético da desordem inclui alterações em diversos genes, tais como o gene responsável pela síntese de APP (proteína precursora de amiloide).
    Leia-se:
    Nome Características Alterações Doença de Alzheimer Neurodegeneração responsável por perda de memória, alterações do humor e comportamentais, desorientação e problemas com a linguagem. O componente genético da condição inclui alterações em diversos genes, tais como o gene responsável pela síntese de APP (proteína precursora de amiloide).
    Onde se lia:
    Tabela 6 - Desordensde alterações em genes mitocondriais
    Leia-se:
    Tabela 6 - Condições de alterações em genes mitocondriais
    Onde se lia:
    Ainda que se compreendam relações entre alterações genéticas e determinadas desordens, as intervenções terapêuticas atuais sobre o genoma são limitadas.
    Leia-se:
    Ainda que se compreendam relações entre alterações genéticas e determinadas condições, as intervenções terapêuticas atuais sobre o genoma são limitadas.
    Onde se lia:
    Aplica-se o PGD, com sucesso, para doenças monogênicas dominantes ou recessivas, assim como para doenças cromossômicas numéricas e estruturais (COOPER; JUNGHEIM, 2010).
    Leia-se:
    Aplica-se o PGD, com sucesso, para condições monogênicas dominantes ou recessivas, assim como para condições cromossômicas numéricas e estruturais (COOPER; JUNGHEIM, 2010).
    Na página 115, onde se lia:
    Entretanto, a técnica tem seu potencial terapêutico limitado diante das doenças poligênicas e mitocondriais.
    Leia-se:
    Entretanto, a técnica tem seu potencial terapêutico limitado diante das condições poligênicas e mitocondriais.
    Onde se lia:
    A doença resulta de uma mutação genética que impede a síntese correta da proteína adenosina deaminase, levando à morte de glóbulos brancos.
    Leia-se:
    A condição resulta de uma mutação genética que impede a síntese correta da proteína adenosina deaminase, levando à morte de glóbulos brancos.
    Na página 116, onde se lia:
    Em decorrência, no manejo de desordens genéticas deve-se optar pela seleção de embriões, e caso seja necessária a modificação do genoma, ela deve limitar-se a células somáticas (cujas modificações não são herdáveis).
    Leia-se:
    Em decorrência, no manejo de condições genéticas deve-se optar pela seleção de embriões, e caso seja necessária a modificação do genoma, ela deve limitar-se a células somáticas (cujas modificações não são herdáveis).
    Onde se lia:
    Os autores afirmam que, para desordens poligênicas, o PGD se mostra inviável, dado que requereria a criação de incontáveis embriões (SAVULESCU et al., 2015). Ademais, o PGD também se mostra inviável no tratamento de doenças genéticas, para as quais ambos os pais portam mutações.
    Leia-se:
    Os autores afirmam que, para condições poligênicas, o PGD se mostra inviável, dado que requereria a criação de incontáveis embriões (SAVULESCU et al., 2015). Ademais, o PGD também se mostra inviável no tratamento de condições genéticas, para as quais ambos os pais portam mutações.
    Na página 117, onde se lia:
    Ao longo deste artigo, buscou-se inicialmente evidenciar o advento de tecnologias dedicadas ao controle de desordens genéticas.
    Leia-se:
    Ao longo deste artigo, buscou-se inicialmente evidenciar o advento de tecnologias dedicadas ao controle de condições genéticas.
  • *
    Pesquisa desenvolvida com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES.
  • 2
    Os dados completos do autor encontram-se ao final do artigo.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Jul 2020
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2020

Histórico

  • Recebido
    27 Jan 2016
  • Revisado
    25 Mar 2018
  • Revisado
    06 Fev 2020
  • Aceito
    01 Mar 2020
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