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Contágios deleuzianos acerca do corpo da/na clínica* * Apoio: CNPq

Deleuzian contagions about the body of/in the clinic

Contagios deleuzianos en el cuerpo de/en la clínica

Resumo

A presente pesquisa propõe investigar o conceito de corpo no pensamento do filósofo Gilles Deleuze e suas possíveis interfaces com a clínica, tendo como intercessores alguns de seus diálogos com Nietzsche e Espinosa. Para isso, buscaram-se as definições de corpo segundo esses autores. Para o primeiro, o corpo é relação de forças, e, para o segundo, é caracterizado pelo seu poder de afecção. A partir da leitura de Deleuze sobre eles, a corporeidade pode ser entendida como processualidade, permeada pelos estados intensivos que perpassam os corpos. Os encontros teóricos de Deleuze fazem a clínica pensar de que forma o corpo pode ser instrumento de invenção de si, pois é daí que se dão os processos de subjetivação. A experimentação, assim, se constitui como compromisso ético de uma clínica que se inventa a cada encontro. Problematiza-se, então, a potência da clínica para lançar os corpos para o exercício da criação.

Palavras-chave:
corpo; clínica; afecções; produção de subjetividade

Abstract

This research proposes to investigate the concept of the body according to the philosopher Gilles Deleuze and its possible interfaces with the clinic, using as intercessors some of his dialogues with Nietzsche and Espinosa. For this, we sought the definitions of body for Nietzsche and Espinosa. For the first, the body is a relation of forces, and for the second, it is characterized by its power of affection. Based on Deleuze’s reading of them, corporality can be understood as processuality, permeated by the intensive states that pass through bodies. Deleuze’s theoretical encounters make the clinic think about how the body can be an instrument of self-invention, as this is where the processes of subjectivity occur. Experimentation, therefore, constitutes an ethical compromise of a clinic that is invented at each meeting. Therefore, the potency to cast the bodies for the exercise of creation is problematized.

Keywords:
body; clinic; affections; production of subjectivity

Resumen

Esta investigación se propone indagar en el concepto de cuerpo en el pensamiento del filósofo Gilles Deleuze y sus posibles interfaces con la clínica, teniendo como intercesores algunos de sus diálogos con Nietzsche y Espinosa. Para ello se buscaron las definiciones de cuerpo según estos autores. Para el primero, el cuerpo es una relación de fuerzas, y para el segundo, se caracteriza por su poder de afecto. A partir de la lectura que hace Deleuze de ellos, la corporeidad puede entenderse como procesualidad, permeada por los estados intensivos que permean los cuerpos. Los encuentros teóricos de Deleuze hacen que la clínica reflexione sobre cómo el cuerpo puede ser un instrumento de autoinvención, ya que es aquí donde se producen los procesos de subjetivación. La experimentación, por tanto, constituye un compromiso ético de una clínica que se inventa en cada encuentro. Se cuestiona entonces el poder de la clínica para lanzar cuerpos para el ejercicio de la creación.

Palabras-clave:
cuerpo; clínica; afectos; producción de subjetividad

A intenção do trabalho é investigar o conceito de corpo a partir do pensamento do filósofo Gilles Deleuze e suas possíveis aproximações com os saberes e práticas da clínica. É evidente que conexões entre psicologia e outros campos dos saberes para se pensar o corpo fazem parte da formação do psicólogo, não se trata de um assunto obscuro no meio acadêmico e nas ciências psicológicas. A bibliografia sobre o corpo é vastíssima, ele foi estudado por diferentes campos de saberes ao longo da história, como a medicina, a filosofia, a psicanálise, a antropologia, as ciências sociais, etc.

O que nos interessa aqui é partir do conceito de corpo em Deleuze e de alguns de seus diálogos com Nietzsche e Espinosa para problematizar o corpo. A riqueza de conceitos e o modo como eles são imbricados por Deleuze nos permite uma abertura para se pensar o corpo na clínica de um modo singular e distante daqueles enfatizados pelas abordagens psicológicas hegemônicas.

Definir corpo para esses autores é conhecer o que se passa nele: as forças e os afetos.1 1 Esses conceitos serão mais bem explicados no próximo tópico deste artigo, intitulado “Corpo como lugar de afecções”. As forças, em termos nietzschianos, podem aumentar ou diminuir a vontade de existir do corpo, uma vez que elas variam em quantidade e qualidade. Do mesmo modo, os afetos, conceito de Espinosa, são a passagem do corpo de um estado a outro, experimentando uma maior ou menor potência de agir. Trazer a questão do corpo formulada por Espinosa para a experiência clínica implica atravessar os campos da arte, da ciência, da filosofia e da política (PASSOS; BENEVIDES, 2004PASSOS, Eduardo; BENEVIDES, Regina. O que pode a clínica: a posição de um problema e de um paradoxo. In: FONSECA, Tania Mara Galli; ENGELMAN, Selda (Org.). Corpo, Arte e Clínica . Porto Alegre: UFRGS , 2004. p. 275-286.).

Nesse sentido, Deleuze é o nosso intercessor por excelência. É através dele que nos esforçaremos por ter algo a dizer sobre o corpo e algumas das suas interfaces com a clínica. A filosofia deleuziana pode ser designada como uma pragmática dos encontros. O encontro serve para nos acordar, nos provocar estranhamentos ao experimentar variações no sentir e no pensar não determinados a priori. É nos encontros que o filósofo se lança para o exercício do pensamento, já que este não é o desempenho natural de uma faculdade, mas uma força inventiva (DELEUZE, 1976DELEUZE, Gilles. Nietzsche e a filosofia. Rio de Janeiro: Editora Rio, 1976.). O encontro exerce uma espécie de violência ao nos forçar a pensar, porque é algo que sacode o pensamento, torna-o inevitável, uma necessidade.

Partiremos dos encontros de Deleuze com Nietzsche e Espinosa para chegarmos perto do que seja uma filosofia prática. Fraga (2013FRAGA JÚNIOR, Órfilo Rodrigues. Corpo, força e potência: Nietzsche e Spinoza no pensamento de Deleuze. 2013. 114 f. Dissertação (Mestrado em Filosofia) - Programa de Pós-graduação em Filosofia, Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, 2013. Disponível em: Disponível em: https://repositorio.ufu.br/bitstream/123456789/15569/1/Orfilo%20Rodrigues.pdf . Acesso em: 13 maio 2020.
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) nos aponta a dificuldade, no pensamento de Deleuze, em falar de Nietzsche sem falar de Espinosa e vice-versa, como se os dois travassem uma amizade forte com Deleuze. Esses três autores discutem política sem falar de uma filosofia política de fato. Isso porque eles trazem a política para as relações cotidianas, concretas, e para o embate de forças no corpo e no pensamento (FRAGA, 2013FRAGA JÚNIOR, Órfilo Rodrigues. Corpo, força e potência: Nietzsche e Spinoza no pensamento de Deleuze. 2013. 114 f. Dissertação (Mestrado em Filosofia) - Programa de Pós-graduação em Filosofia, Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, 2013. Disponível em: Disponível em: https://repositorio.ufu.br/bitstream/123456789/15569/1/Orfilo%20Rodrigues.pdf . Acesso em: 13 maio 2020.
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).

Eles nos chamam para viver uma ética de valorização do corpo como criação de si. Deleuze lança uma prática filosófica na qual a problematização de conceitos é a sua principal arma e instrumento inventivo. Uma vez que os problemas têm maior potência criativa que as respostas, experienciar o corpo envolve a vivência dos conceitos, integra os afetos ao pensamento e combate a tradicional dicotomia entre corpo e pensamento, a hierarquia entre os saberes, como se estes estivessem em um lugar separado do corpo.

Buscar um conceito de corpo dentro da formação de psicólogo se impõe como problema, como necessidade, já que boa parte das abordagens psicológicas se concentrou em outros temas, a exemplo da teoria do desejo na psicanálise e das teorias sobre o comportamento na psicologia experimental. Não que o corpo não seja estudado, mas o modo de explorá-lo limita-se a um corpo orgânico, sistematizado em funções, ainda que articulado com o psiquismo (BORGES, 2016BORGES, Hélia. O movimento: o corpo e a clínica [online]. São Paulo: Cia do eBook, 2016. Disponível em: Disponível em: https://books.google.com.br/books?id=MCLcCwAAQBAJ&lpg=PT13&dq=nas%20dobras%20do%20corpo%20por%20uma%20cl%C3%ADnica%20das%20intensidades&hl=pt-BR&pg=PT13#v=onepage&q&f=false . Acesso em: jul. 2016.
https://books.google.com.br/books?id=MCL...
).

Daí a necessidade de ver o corpo como um lugar de passagens de forças e afetos, não como um sistema de funcionamento tal qual uma máquina orgânica ou como um catalisador que expressa e representa sintomas psíquicos apenas. A intenção aqui não é separar aqueles que trabalham terapeuticamente com o corpo e que utilizam as mais diversas técnicas corporais dos que tratam o corpo na ordem da palavra ou do comportamento ou das sinapses. Não se trata, por exemplo, de pensar o corpo na clínica a partir de uma teoria concernente às terapias corporais pura e simplesmente: “Importa menos as técnicas utilizadas: sejam manipulações corporais ou não, que a postura ética e a experiência estética: uma escuta onde a abertura do corpo para a receptividade da vitalidade do outro esteja presente nos encontros” (BORGES, 2016BORGES, Hélia. O movimento: o corpo e a clínica [online]. São Paulo: Cia do eBook, 2016. Disponível em: Disponível em: https://books.google.com.br/books?id=MCLcCwAAQBAJ&lpg=PT13&dq=nas%20dobras%20do%20corpo%20por%20uma%20cl%C3%ADnica%20das%20intensidades&hl=pt-BR&pg=PT13#v=onepage&q&f=false . Acesso em: jul. 2016.
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, p. 6).

É nessa potência sensível e receptiva, que ganha consistência no encontro com outros corpos, que Espinosa nos convida a pensar: “O fato é que ninguém determinou, até agora, o que pode o corpo [...]. Pois ninguém conseguiu, até agora, conhecer tão precisamente a estrutura do corpo que fosse capaz de explicar todas as suas funções” (ESPINOSA, 2009ESPINOSA, Baruch. Ética. Belo Horizonte: Autêntica, 2009., p. 101).

Se é impossível conhecer toda a capacidade de um corpo, do que ele é capaz, isso quer dizer que ele vai além e aquém da expressão psíquica, ou, como na psicossomática, de uma organicidade originada das emoções. Espinosa não fala de uma relação de causalidade entre as instâncias do corpo e da mente, não há separação entre o psíquico e o físico: o corpo é definido pelo seu poder de afecção. Essa afirmação, portanto, refuta a suposta superioridade da alma e da mente conforme o raciocínio cartesiano (ESPINOSA, 2009ESPINOSA, Baruch. Ética. Belo Horizonte: Autêntica, 2009.).

O raciocínio cartesiano também é atacado por Nietzsche (1983NIETZSCHE, Friedrich. Assim falou Zaratustra. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1983., p. 51): “Quero dizer a minha palavra aos desprezadores do corpo [...] Eu sou todo corpo e nada além disso; e alma é somente uma palavra para alguma coisa do corpo”. Para o filósofo, o corpo é uma composição de forças (DELEUZE, 2002aDELEUZE, Gilles. Espinosa: filosofia prática. São Paulo: Escuta, 2002a.). Podemos perceber quais forças estão movendo um corpo e, assim, é possível ativar o seu poder de afecção. O corpo é um modo de conhecimento ao qual não convém uma definição pronta e acabada.

Tal afirmação nietzschiana parece contagiar Deleuze quando ele propõe uma composição horizontal de saberes para pensar uma filosofia do corpo. Nossa empreitada procura dar consistência à afirmação de que corpo e pensamento, corpo e produção de conhecimento são indissociáveis. Desejamos implicar o corpo na teoria para que se construa um saber prático de modo a vivenciar os conceitos que se estuda: “[...] uma filosofia do corpo é uma filosofia prática, no sentido de estar às voltas com problemas de apreciação de modos de vida, isto é, de agir, de perceber, de sentir, de pensar” (ZEPPINI, 2010ZEPPINI, Paola Sanfelice. Deleuze e o corpo: articulações conceituais entre Deleuze, Nietzsche e Espinosa em função da problemática do corpo. 2010. 153 f. Dissertação (Mestrado) - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2010. Disponível em: Disponível em: http://repositorio.unicamp.br/jspui/handle/REPOSIP/278826 . Acesso em: 12 out. 2019.
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, p. 15).

Corpo como lugar de afecções

Nietzsche (1983NIETZSCHE, Friedrich. Assim falou Zaratustra. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1983.) diz que a alma não é outra coisa senão uma coisa do corpo no seu texto “Dos desprezadores do corpo”. Alma, consciência ou psiquismo são conceitos que não existem fora de um corpo.

Nesse sentido, Gil (2004GIL, José. Abrir o corpo. In: FONSECA, Tania Mara Galli; ENGELMAN, Selda (Org.). Corpo, Arte e Clínica . Porto Alegre: UFRGS , 2004. p. 13-28.) nos fala de algo que decompõe as relações tradicionais entre consciência e corpo. Ele entende a consciência não como aquela espacial que temos de um órgão ou de uma sensação física que podemos localizar. Não há “consciência de” porque consciência e corpo estão impregnados. Nas palavras do autor, os movimentos do corpo produzem texturas que invadem a consciência. Não temos elementos opostos: uma tessitura comum atravessa os dois, pois o pensamento e os movimentos corporais se impregnam em uma zona fronteiriça com o mundo. A única consciência que existe, portanto, é a consciência do/no corpo, pois “não há consciência sem que os movimentos corporais intervenham nos movimentos da consciência” (GIL, 2004GIL, José. Abrir o corpo. In: FONSECA, Tania Mara Galli; ENGELMAN, Selda (Org.). Corpo, Arte e Clínica . Porto Alegre: UFRGS , 2004. p. 13-28., p. 17).

Essa noção de impregnação provoca uma ruptura na dualidade pensamento/corpo. Ela vai ao encontro do conceito de corpo em Deleuze, além de trazer uma materialidade para o pensamento. Falar de uma corporalidade, ou corporeidade, seria falar das propriedades ou qualidades do que é corpóreo: as forças e os afetos. Mas que movimentos são esses que se passam no corpo? Como se dá esse contato com o mundo? São problemas que se enunciam no modo com que se define o corpo.

Tarefa difícil essa de definir o que se efetiva na processualidade dos encontros. O corpo é objeto incansável de decifração no meio científico e suas encruzilhadas interdisciplinares:

[...] é impossível, apreendê-lo de uma vez por todas, compreendê-lo em algumas linhas. Seu conhecimento é interminável tanto quanto são diversificadas as bases culturais que, da medicina à religião, passando pela filosofia e pela antropologia, o constituem e o transformam (SANT’ANNA, 1995 apud LIBERMAN, 1997LIBERMAN, Flavia. O corpo como produção da subjetividade. Cadernos de Subjetividade - Dossiê: Corpo, São Paulo, v. 5, n. 2, p. 371-383, 1997. Disponível em:Disponível em: http://docs.google.com/fileview?id=0Byhsw-4JHq9gNTY4NmY1MGUtZWU4MC00ZjBmLTllYTAtOTU5NTZhZjk1MTZh&hl=pt_BR . Acesso em: 18 ago. 2020.
http://docs.google.com/fileview?id=0Byh...
, p. 373).

Tentemos embarcar em alguns conceitos que possam levar a clínica para outras paragens menos familiares e que desse estranhamento possam advir novos modos de fazer/pensar o corpo da/na clínica e seus atos de cuidar do que acontece no corpo, tanto dos profissionais quanto de seus pacientes. Um conceito deleuziano de corpo é forjado a partir dos encontros do autor com Nietzsche e Espinosa como algo vital para a afirmação da vida e da filosofia. Pensar a complexidade dos encontros ao criar conceitos leva o filósofo a vivificar a filosofia em suas experiências (DELEUZE, 2002bDELEUZE, Gilles. A imanência: uma vida…. Educação & Realidade [online], Porto Alegre, v. 27, n. 2, p. 1-9, 2002b. Disponível em: Disponível em: https://seer.ufrgs.br/educacaoerealidade/article/view/31079 . Acesso em: 13 maio 2020.
https://seer.ufrgs.br/educacaoerealidade...
).

Ao criar essa filosofia do corpo que é filosofia da vida, Deleuze não se reduz a um historiador da filosofia que busca uma suposta identidade Nietzsche-Espinosa, mas sua singularidade consiste em traçar um plano comum entre esses dois autores (FRAGA, 2013FRAGA JÚNIOR, Órfilo Rodrigues. Corpo, força e potência: Nietzsche e Spinoza no pensamento de Deleuze. 2013. 114 f. Dissertação (Mestrado em Filosofia) - Programa de Pós-graduação em Filosofia, Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, 2013. Disponível em: Disponível em: https://repositorio.ufu.br/bitstream/123456789/15569/1/Orfilo%20Rodrigues.pdf . Acesso em: 13 maio 2020.
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). E o que atravessa os dois é o exercício da filosofia como criação de conceitos, de modos de vida. É uma valorização da vida, que não se separa do corpo orgânico e não se localiza em uma dimensão transcendente àquela vivida na materialidade dos corpos e encontros. A essa dimensão Deleuze dará o nome de plano de imanência.

O plano de imanência não é um conceito, nem o conceito de todos os conceitos […] O conceito é o começo da filosofia, mas o plano é a sua instauração. […] é o plano de imanência que constitui o solo absoluto da filosofia sobre os quais ela cria seus conceitos. Ambos são necessários, criar conceito e instaurar o plano, como duas asas ou duas nadadeiras (DELEUZE; GUATTARI, 1992DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. O que é a filosofia? São Paulo: Editora 34, 1992., p. 45/52).

Foi aí onde ele encontrou nos conceitos espinosanos uma potência nietzscheana, e foi o que fez a leitura do filósofo francês adquirir reverberações inéditas. A filosofia prática é um fazer que busca aumentar a potência de vida. Fazer a vida querer a si mesma, ao invés de buscar conceitos que a defina. Juntos, esse trio, embora distanciados um do outro no tempo cronológico, atua em três embates: contra a consciência, contra os valores morais e contra as paixões tristes (ZEPPINI, 2010ZEPPINI, Paola Sanfelice. Deleuze e o corpo: articulações conceituais entre Deleuze, Nietzsche e Espinosa em função da problemática do corpo. 2010. 153 f. Dissertação (Mestrado) - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2010. Disponível em: Disponível em: http://repositorio.unicamp.br/jspui/handle/REPOSIP/278826 . Acesso em: 12 out. 2019.
http://repositorio.unicamp.br/jspui/hand...
).

Operar no plano de imanência começa aqui por levantar questões sobre a definição do corpo. Deleuze, baseando-se em Espinosa, propõe-se a tomar o corpo não para afirmar uma superioridade deste em relação à mente, mas para dizer que o corpo não está a serviço dela e de qualquer outro fundamento que opere no pensamento. Pois é o corpo que nos força a pensar. Essa é uma forma de atentar para a experiência e para os encontros que vivemos no cotidiano. A vivência é uma forma de produzir conhecimento a partir e através do corpo.2 2 Em Nietzsche, vivência (Erlebnis) e experimento (Erfahrung) são dois termos que diferem na etimologia. A primeira é condição de possibilidade para a segunda. Cada vivência é sentida na pele, cujo conteúdo é impossível de se determinar racionalmente. Não basta um querer vivenciar, a vivência é algo que altera as condições de existência de um indivíduo. A vivência, portanto, caracteriza-se pela sua dimensão estética. Enquanto o experimento está sujeito à instrumentalização da razão e vinculado ao conhecimento, a vivência é um contra-conceito da razão (VIESENTEINER, 2009).

Segundo Espinosa, todo corpo é composto pelas suas relações de movimento e de repouso, ou seja, pelas velocidades e pelas lentidões que caracterizam as pessoas. O que define um corpo é o seu poder de ser afetado. O que é e o que pode um corpo se desdobram na mesma questão: de que afetos o corpo é capaz (ESPINOSA, 2009ESPINOSA, Baruch. Ética. Belo Horizonte: Autêntica, 2009.).

Mas os afetos de Espinosa referem-se não a sentimentos afetuosos, mas às afecções, entendidas como modificações que um corpo é capaz de causar no outro. Deleuze dirá que a afecção é uma mistura de corpos, pois se opera no corpo uma passagem de um estado a outro. Essa passagem pode aumentar ou diminuir a potência de agir do corpo. O corpo, assim, experimenta uma variação na sua força de existir, e essa variação é chamada afeto (DELEUZE, 2002aDELEUZE, Gilles. Espinosa: filosofia prática. São Paulo: Escuta, 2002a.). Considerando os encontros alegres e tristes, dizemos que os afetos são tristes quando diminuem a potência de agir, e alegres quando aumentam essa potência:

Alguns corpos se encontram e convêm entre si, isto é, compõem-se aumentando ou conservando a relação característica de cada um. Tais encontros produzem afetos alegres ou alegria, e são, por isso, bons encontros. Alguns corpos, por outro lado, se encontram e não convém entre si, ou não convém a um deles. Tais encontros produzem afetos tristes ou tristeza, decompondo a relação característica de um ou de outro corpo, ou mesmo de algumas de suas partes (FRAGA, 2013FRAGA JÚNIOR, Órfilo Rodrigues. Corpo, força e potência: Nietzsche e Spinoza no pensamento de Deleuze. 2013. 114 f. Dissertação (Mestrado em Filosofia) - Programa de Pós-graduação em Filosofia, Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, 2013. Disponível em: Disponível em: https://repositorio.ufu.br/bitstream/123456789/15569/1/Orfilo%20Rodrigues.pdf . Acesso em: 13 maio 2020.
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, p. 71).

Espinosa (2009ESPINOSA, Baruch. Ética. Belo Horizonte: Autêntica, 2009.) faz um elogio aos afetos alegres e aos bons encontros. De seu lado, Nietzsche compõe a sua ética seguindo uma balança parecida com a da alegria/tristeza e nos apresenta a relação de forças que se passa no corpo. Ele caracteriza duas forças que existem no corpo e que se opõem em qualidade e quantidade. Temos forças superiores e inferiores, dominantes e dominadas, fortes e fracas, segundo sua quantidade; forças ativas, que comandam e afirmam algo, e forças reativas, que obedecem e se ressentem, segundo sua qualidade. A primeira age pela via da transformação, criação de formas de vida e inauguração do novo; a segunda age pela conservação e adaptação (DELEUZE, 1976DELEUZE, Gilles. Nietzsche e a filosofia. Rio de Janeiro: Editora Rio, 1976.).

O elemento que diferencia uma força na sua qualidade e quantidade é a vontade de potência. A vontade de potência é o querer, que é complemento interno às forças. Para saber qual o valor e o sentido que rege algo é preciso perguntar sobre quais forças movem o corpo em determinado momento: “Jamais encontraremos o sentido de alguma coisa (fenômeno humano, biológico ou até mesmo físico) se não sabemos qual é a força que se apropria da coisa, que a explora, que dela se apodera ou nela se exprime” (DELEUZE, 1976DELEUZE, Gilles. Nietzsche e a filosofia. Rio de Janeiro: Editora Rio, 1976., p. 5).

Assim como Espinosa vai em busca da valorização dos afetos alegres, Nietzsche defende uma afirmação das forças ativas, pois, segundo ele, o mundo encontra-se dominado pelas forças reativas e valores ressentidos, de negação da vida. Uma vez que as potências e capacidades do corpo são desconhecidas pela moral (o Bem e o Mal), por Deus ou pela ciência cartesiana, a pergunta feita por Espinosa (2009)ESPINOSA, Baruch. Ética. Belo Horizonte: Autêntica, 2009. sobre o que pode um corpo depende cada vez mais das composições ou decomposições que ele experimenta com outros corpos:

Isso vale para nós, para os homens, não menos do que para os animais, visto que ninguém sabe antecipadamente os afetos de que é capaz; é uma longa história de experimentação, uma demorada prudência, uma sabedoria espinosista que implica a construção de um plano de imanência ou de consistência (DELEUZE, 2002aDELEUZE, Gilles. Espinosa: filosofia prática. São Paulo: Escuta, 2002a., p. 130).

Uma vez esboçadas essas aproximações entre Espinosa e Nietzsche, em que Deleuze compõe uma aliança contra a moral cartesiana de superioridade da alma sobre o corpo, sendo a alma nada mais que uma “coisa do corpo” (NIETZSCHE, 1983NIETZSCHE, Friedrich. Assim falou Zaratustra. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1983.), aprofundemos mais nos desdobramentos da teoria das afecções, que acreditamos interessar à clínica. Tanto para Nietzsche quanto para Espinosa, o corpo é visto nas relações que estabelece. Para Espinosa, na relação com outros corpos, o que se produz são afecções, e para Nietzsche nas relações o que se produz entre forças ativas e reativas é a vontade de potência.

Deleuze capta nesses dois autores um possível plano que atravessa os corpos em seus estados intensivos, não biológico nem simbólico. Ao mergulhar nesse pensamento que sustenta o plano de afetos proposto por Espinosa, é possível relacionar as intensidades de um corpo com a sua zona de afecções. Mas o que seriam esses estados intensivos do corpo?

Rolnik (2004ROLNIK, Suely B. “Fale com ele” ou como tratar o corpo vibrátil em coma. In: FONSECA, Tania Mara Galli; ENGELMAN, Selda (Org.). Corpo, Arte e Clínica . Porto Alegre: UFRGS , 2004. p. 231-238.) chama a atenção para uma qualidade sensível dos corpos que é diferente da percepção sensorial, realizada pelos sentidos. Ela descreve duas maneiras de apreender o mundo como matéria, ou seja, pelo corpo. Uma é pela forma e a outra é pelo campo de forças. Cada uma ativa diferentes potências da subjetividade.

Captar a forma é um processo de percepção, exercício dos sentidos. Captar forças é conhecer por sensações, no encontro do corpo com o mundo pela propagação de ondas nervosas ou níveis de excitabilidade. Esse corpo é chamado de vibrátil, diferente do corpo sensível, movido pelos sentidos. “Sensível” e “vibrátil” são potências diferentes do corpo: a apreensão operada pelos sentidos atua no nível da representação, enquanto as sensações provocadas pelo outro desdobram na capacidade expressiva do corpo (ROLNIK, 2004ROLNIK, Suely B. “Fale com ele” ou como tratar o corpo vibrátil em coma. In: FONSECA, Tania Mara Galli; ENGELMAN, Selda (Org.). Corpo, Arte e Clínica . Porto Alegre: UFRGS , 2004. p. 231-238.).

Ora, vibrar remete a movimentos micro, finas ondas que se propagam nos corpos. Sensações da ordem do sutil, invisíveis e imperceptíveis aos sentidos, acostumados com macromovimentos. Rolnik (2004ROLNIK, Suely B. “Fale com ele” ou como tratar o corpo vibrátil em coma. In: FONSECA, Tania Mara Galli; ENGELMAN, Selda (Org.). Corpo, Arte e Clínica . Porto Alegre: UFRGS , 2004. p. 231-238.) fala de certo anestesiamento do corpo, em que essas vibrações finas estariam adormecidas nos modos de produção de subjetividade contemporânea. Dessa forma, o corpo se encontraria fechado para experimentar essas sensações sutis que são do campo dos afetos.

Diante desse anestesiamento, somos convocados a criar outras políticas de subjetivação que atuem como resistência à subjetividade capitalística (ROLNIK, 2004ROLNIK, Suely B. “Fale com ele” ou como tratar o corpo vibrátil em coma. In: FONSECA, Tania Mara Galli; ENGELMAN, Selda (Org.). Corpo, Arte e Clínica . Porto Alegre: UFRGS , 2004. p. 231-238.). Se pensarmos o corpo que experimenta sensivelmente o espaço, sendo atravessado pelas forças ativadas nos encontros, estaríamos falando de uma abertura às intensidades. Isso significaria uma disponibilidade do corpo para uma experiência estética com o mundo.

Não sabemos o que pode um corpo, pois a resposta a essa pergunta se impõe a qualquer modo apriorístico de pensar e viver (ORLANDI, 2009ORLANDI, Luiz B. L. Deleuze. In: PECORARO, Rossano (Org.). Os filósofos. Petrópolis: Vozes , 2009. v. 3, p. 256-279. Coleção Clássicos da Filosofia.). Por outro lado, podemos conhecer as forças pelos efeitos que elas causam no corpo, e isso significa se abrir às pequenas vibrações. Trata-se de aliar-se às sensações para produzir conhecimento com o corpo. Trata-se de uma experiência estética da existência porque lança o corpo de início numa experiência de desassossego e estranhamento, condição de possibilidade para a emergência de processos de criação e que podem, talvez, ajudar a “destravar” os corpos dos terapeutas e pacientes.

Não é fácil ser um homem livre: fugir da peste, organizar encontros, aumentar a potência de agir, afetar-se de alegria, multiplicar os afetos que exprimem ou envolvem um máximo de afirmação. Fazer do corpo uma potência que não se reduz ao organismo, fazer do pensamento uma potência que não se reduz à consciência (DELEUZE; PARNET, 1998DELEUZE, Gilles; PARNET, Claire. Diálogos. São Paulo: Escuta , 1998., p. 51).

A clínica e suas possibilidades de encontro

Seguindo o pensamento de Rolnik (2004ROLNIK, Suely B. “Fale com ele” ou como tratar o corpo vibrátil em coma. In: FONSECA, Tania Mara Galli; ENGELMAN, Selda (Org.). Corpo, Arte e Clínica . Porto Alegre: UFRGS , 2004. p. 231-238.), pode-se pensar em como a clínica pode ter um compromisso ético com a experimentação e um olhar estético sobre a existência. O caminho não poderia ser outro a não ser pelo corpo. Segundo Nietzsche (1983NIETZSCHE, Friedrich. Assim falou Zaratustra. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1983.), o impulso criador não está na consciência, na alma ou no espírito, mas localiza-se no corpo. Ele é chave para uma vida como obra de arte se fazendo permanentemente (SANDER, 2011SANDER, Jardel. Corpo-dispositivo: cultura, subjetividade e criação artística. Artcultura (UFU), Uberlândia, v. 13, n. 23, p. 129-142, 2011. Disponível em: Disponível em: http://www.seer.ufu.br/index.php/artcultura/article/view/15129 . Acesso em: 12 jul. 2020.
http://www.seer.ufu.br/index.php/artcult...
). Impregnado por esse modo de vida, à clínica cabe perguntar em quais práticas produz-se uma experiência estética. Quais ações e condutas levariam o sujeito a ampliar a capacidade de criar e agir, reinventando suas relações com o mundo e com o outro? (LIMA, 2012LIMA, Elizabeth M. F. de Araújo. Artes menores: criação de si e de mundos nas ações em saúde mental. In: AMARANTE, Paulo; NOCAM, Fernanda (Org.). Saúde mental e arte: práticas, saberes e debates. São Paulo: Zagadoni, 2012. p. 39-52.)

Tecemos aqui, então, um ponto de encontro entre clínica e arte, o que pode nos dizer de um modo de fazer clínico. É preciso pensar com o corpo, não apenas sobre ele, pois o corpo é um campo de experimentação permanente e por onde se dão os processos de subjetivação. É no corpo que se engendram as possibilidades de criação de si e do mundo, pois é por ele que se produz os encontros que aumentam ou não seu poder de afecção.

À clínica pouco caberia uma definição assertiva de corpo, mas compor práticas de contágio dos corpos. São os afetos a matéria-prima da clínica, no momento em que esta se abre para a criação de modos de estar no mundo: “supõe a tarefa de nos afastarmos das forças que procuram submeter a existência humana à vida biológica e fazer proliferar as práticas de si, que inventam simultaneamente um mundo [...]” (LIMA, 2012LIMA, Elizabeth M. F. de Araújo. Artes menores: criação de si e de mundos nas ações em saúde mental. In: AMARANTE, Paulo; NOCAM, Fernanda (Org.). Saúde mental e arte: práticas, saberes e debates. São Paulo: Zagadoni, 2012. p. 39-52., p. 50).

Precisamos afirmar a processualidade que compõe os corpos em relação, que se contrapõe à ideia de corpo-identidade, condicionado aos discursos e saberes instituídos e às definições prontas, sejam elas biológicas ou psicológicas. A processualidade do corpo diz respeito à sua potência de invenção, e é aí que se inscreve o corpo vibrátil.

Esse corpo, por sua vez, é constituído por relações de porosidade e troca com o seu redor, uma vez dotado de uma superfície permeável às forças e afetos. A noção de contágio desenvolvida por Gil (2004GIL, José. Abrir o corpo. In: FONSECA, Tania Mara Galli; ENGELMAN, Selda (Org.). Corpo, Arte e Clínica . Porto Alegre: UFRGS , 2004. p. 13-28.) transborda a dicotomia entre o sentir e o pensar no/do corpo e afirma a ideia de impregnação da consciência pelos movimentos do corpo. O pensamento e os movimentos corporais se impregnam no virtual, de onde se atualizam os movimentos de um e de outro ao mesmo tempo, desde que um plano de composição adquira consistência para que formas e forças possam imanar. É assim que o corpo vai captar os mais ínfimos movimentos, as mais finas vibrações de outros corpos. O corpo-consciência se comunica com outros corpos pelos seus movimentos inconscientes. Essa comunicação é chamada de contato-osmose ou contágio (GIL, 2004GIL, José. Abrir o corpo. In: FONSECA, Tania Mara Galli; ENGELMAN, Selda (Org.). Corpo, Arte e Clínica . Porto Alegre: UFRGS , 2004. p. 13-28.).

A passagem das pequenas percepções - que Rolnik (2004ROLNIK, Suely B. “Fale com ele” ou como tratar o corpo vibrátil em coma. In: FONSECA, Tania Mara Galli; ENGELMAN, Selda (Org.). Corpo, Arte e Clínica . Porto Alegre: UFRGS , 2004. p. 231-238.) chama de vibrações -, movimentos invisíveis, de um inconsciente a outro, se dá por intensidades afetivas (GIL, 2004GIL, José. Abrir o corpo. In: FONSECA, Tania Mara Galli; ENGELMAN, Selda (Org.). Corpo, Arte e Clínica . Porto Alegre: UFRGS , 2004. p. 13-28.). É sob esse aspecto que podemos perguntar que aberturas a clínica dá para acolher essas pequenas percepções, esses corpos vibráteis. Essa comunicação de inconscientes não se refere à clínica da escuta analítica; é uma clínica que capta as sutilezas dos encontros, que se abre para o que se gesta além/aquém das concepções a priori sobre o corpo que sugerem uma causa x e um efeito y. Não queremos aqui saber como o corpo funciona ou o que ele está a representar afinal, mas como ele afeta e é afetado.

Esse fazer clínico pode ser visto como um fazer ampliado para o que há de assignificante em meio às palavras e seus significados a serem desvendados. Na experiência estética, importa menos os significados e mais as forças que movem o corpo e que o convocam para a produção de subjetividade. A clínica deve facilitar os processos de criação que podem estar pedindo passagem. Isso permite que se conheça o mundo pelas forças recebidas no contágio de um corpo pelo outro (RESENDE, 2013RESENDE, Catarina Mendes. Escutar com o corpo: a experiência sensível entre dança, poesia e clínica. 2013. 218 f. Tese (Doutorado) - Programa de Pós-graduação em Psicologia da Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2013.). “[...] Uma psicoterapia bem-sucedida poderia ter uma eficácia semelhante à do processo de criação artística, no sentido de produzir mutações no campo da subjetividade” (DELEUZE; GUATTARI, 1976DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. O Anti-Édipo: capitalismo e esquizofrenia. Rio de Janeiro: Imago, 1976., p. 173).

O campo da subjetividade é atravessado pelos movimentos da consciência-corpo, e a noção de impregnação de Gil (2004GIL, José. Abrir o corpo. In: FONSECA, Tania Mara Galli; ENGELMAN, Selda (Org.). Corpo, Arte e Clínica . Porto Alegre: UFRGS , 2004. p. 13-28.) tem aqui ênfase maior: as relações da consciência com o mundo e os objetos se dão pelo corpo, entidade do vivido (RESENDE, 2013RESENDE, Catarina Mendes. Escutar com o corpo: a experiência sensível entre dança, poesia e clínica. 2013. 218 f. Tese (Doutorado) - Programa de Pós-graduação em Psicologia da Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2013.). Não se trata de tomar uma consciência reflexiva dos afetos e ritmos que perpassam o corpo, como se estes fossem externos a ela, pois são eles que oferecem passagem ao cuidado de si e do mundo. O corpo permite a fluência do movimento e, com isso, uma ampliação da capacidade sensorial. Isso só acontece porque os movimentos do corpo emergem na superfície da consciência para preenchê-la de pequenas percepções. O vivido pelo corpo está na vizinhança entre o sentido e o pensado (RESENDE, 2013RESENDE, Catarina Mendes. Escutar com o corpo: a experiência sensível entre dança, poesia e clínica. 2013. 218 f. Tese (Doutorado) - Programa de Pós-graduação em Psicologia da Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2013.). Um limiar com toda a sua sutileza, que insurge entre as categorias “maiores” estudadas pela ciência, sejam estas categorias: a consciência, o corpo, as emoções, os sentimentos, o comportamento, entre outras.

E dentro da clínica? Estamos atentos ao que transborda aos movimentos visíveis do corpo? Onde está a capacidade de se surpreender consigo mesmo? Onde o corpo é capturado por uma força que escapa à sua condição de organismo? São questões que provocam uma abertura do corpo da/na clínica (COSTA; MOEHLECKE; FONSECA, 2004COSTA, Fabiana Tomazzoni; MOEHLECKE, Vilene; FONSECA, Tania Mara Galli. Abrir o corpo da clínica. In: FONSECA, Tania Mara Galli; ENGELMAN, Selda (Org.). Corpo, Arte e Clínica. Porto Alegre: UFRGS, 2004. p. 299-304.).

Para além da dicotomia entre o sentir e o pensar, abrir o corpo é deixar-se permeável ao encontro. “Perceber o mundo ou a si próprio é já investir forças, afetos, memórias, e entrar em devir, entrar numa zona de indiferenciação, de mistura ou de contato” (RESENDE, 2013RESENDE, Catarina Mendes. Escutar com o corpo: a experiência sensível entre dança, poesia e clínica. 2013. 218 f. Tese (Doutorado) - Programa de Pós-graduação em Psicologia da Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2013., p. 43). É construir um plano de imanência na clínica, que sustente os fluxos que surgem dessas misturas.

A escuta das pequenas percepções envolve terapeuta e paciente. É mais que uma análise dos movimentos não verbais do paciente. É entrar na composição junto dele, quase como numa dança. Qualidades podem ser captadas: velocidade, espessura, amplitude, peso, presença, textura, respiração, tônus, tom, sonoridade... Há mais para acolher do que apenas o conteúdo verbal, a palavra, ou traduzir as expressões não verbais em significações psíquicas ou neurobiológicas. Estar atento às sensações torna mais ricas as trocas. Contudo, o contágio só acontece quando os corpos convêm entre si, não se estabelece em todo encontro, apesar de ter a potência para emergir em qualquer encontro.

O ponto a que se quer chegar é que, sensíveis ao que se passa no corpo, podemos problematizar sobre o que se passa na clínica e em que medida pode-se aumentar o poder de afetação dos corpos que se encontram nesse lugar. Não é algo que acontece apenas quando trabalhamos com técnicas corporais, mas é algo que constitui qualquer relação com o mundo.

O olhar estético se encontra com a política do corpo, outro ponto de contágio com a clínica. Se o fazer artístico é constituído pelos processos de criação de si e do mundo, o corpo é fio condutor para abrir novos olhares e ressignificações. Ao pensar e sentir sobre que afetos o corpo é capaz, somos convidados a fazer uma outra política, mais afinada com as sensações que nos perpassam. Experimentando o que aumenta ou diminui sua potência de existir, o corpo se abre às condições de possibilidade para um bom encontro.

A clínica, atenta a esses acontecimentos em que um corpo se agencia em um fluxo de criação, rearranja seus dispositivos de acolhimento, para se contagiar e se reinventar como clínica singular a partir das vibrações desses encontros. A clínica, assim, se torna um território propício para a criação de si e do mundo, experimenta uma amplidão, ao mesmo tempo em que deve caminhar com prudência para lidar com os excessos. A prudência é necessária para sustentar e dosar a potência inventiva do corpo a fim de evitar a desintegração, cair no vazio, ver-se paralisado ou afundado (RESENDE, 2013RESENDE, Catarina Mendes. Escutar com o corpo: a experiência sensível entre dança, poesia e clínica. 2013. 218 f. Tese (Doutorado) - Programa de Pós-graduação em Psicologia da Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2013.).

A clínica aqui implica uma postura ética e política na medida em que se compromete com o exercício de problematização das suas práticas a fim de acolher um corpo que resiste aos modos de subjetivação dominantes. A emergência do que Guattari e Rolnik (1999GUATTARI, Félix; ROLNIK, Suely. Micropolítica: cartografias do desejo. Petrópolis: Vozes, 1999.) chamam de subjetividade capitalística e seus dualismos diversos: mente/corpo, consciência/inconsciente, sentir/pensar, empírico/intensivo, orgânico/campo de forças, muitas vezes capturam a clínica e a podem tornar triste e ressentida. Daí o rigor necessário em não ceder à repetição de abordagens psicológicas com suas sedutoras tecnologias que prometem eficácia e verdade.

O saber do corpo, portanto, é avesso aos especialismos clínicos e à reprodução de um conhecimento pronto, linear e atemporal, sem atravessamentos. Eis o caráter desviante da clínica, atenta a uma zona permeável às forças da alteridade, que lança o corpo a outros territórios de referência e que constituem a mutabilidade da subjetividade (GUATTARI, 1992GUATTARI, Félix. Caosmose: um novo paradigma estético. São Paulo: Editora 34 , 1992.). Afinal, o que pode a clínica? “Percorrer estas modulações da questão, passar da clínica à arte, à filosofia e à política é ter que habitar este espaço intervalar do entre-domínios, do que não é totalmente isto ou aquilo, do que está nesta operação da conjunção ‘e’, lá onde proliferam encontros e composições” (PASSOS; BENEVIDES, 2006PASSOS, Eduardo; BENEVIDES, Regina. Passagens da clínica. In: MACIEL, Auterives; KUPERMANN, Daniel; TEDESCO, Silvia (Org.). Polifonias: clínica, política e criação. Rio de Janeiro: Contracapa, 2006. p. 89-100., p. 89).

Por uma clínica do/no corpo

Um acontecimento microscópico estremece o equilíbrio do poder local

(DELEUZE; GUATTARI, 1995DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Mil Platôs: capitalismo e esquizofrenia. São Paulo: Editora 34 , 1995. v. 1. , p. 25)

O percurso traçado pelo presente trabalho coloca a clínica em um plano transdisciplinar. Ao explorar regiões de vizinhança, ela experimenta toques com outros saberes, outras áreas de conhecimento. Buscar uma amplidão é ir atrás de novas conexões. Uma nova conexão sempre é possível. Um diálogo com o fora da clínica: as artes, a política, a filosofia, a ciência (PASSOS; BENEVIDES, 2004PASSOS, Eduardo; BENEVIDES, Regina. O que pode a clínica: a posição de um problema e de um paradoxo. In: FONSECA, Tania Mara Galli; ENGELMAN, Selda (Org.). Corpo, Arte e Clínica . Porto Alegre: UFRGS , 2004. p. 275-286.).

Isso só é possível pela experiência, ela nos coloca como corpo que vive trocas com outros corpos, em cenários múltiplos. O problema destacado aqui envolve buscar qualidades e propriedades do que é corpóreo na composição das relações clínicas (BORGES, 2016BORGES, Hélia. O movimento: o corpo e a clínica [online]. São Paulo: Cia do eBook, 2016. Disponível em: Disponível em: https://books.google.com.br/books?id=MCLcCwAAQBAJ&lpg=PT13&dq=nas%20dobras%20do%20corpo%20por%20uma%20cl%C3%ADnica%20das%20intensidades&hl=pt-BR&pg=PT13#v=onepage&q&f=false . Acesso em: jul. 2016.
https://books.google.com.br/books?id=MCL...
). Assim, o microscópico de que Deleuze e Guattari (1995DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Mil Platôs: capitalismo e esquizofrenia. São Paulo: Editora 34 , 1995. v. 1. ) falam trata dos processos afetivos-intensivos vividos no corpo.

Capaz de agir contra o anestesiamento do corpo vibrátil, a clínica é capaz de perguntar: o que se passa quando esse corpo entra em cena? Não sabemos o que pode um corpo, mas podemos conhecer as suas composições, os seus afetos. Para além de indicar um modo de fazer, fala-se de um modo de estar da/na clínica (RESENDE, 2013RESENDE, Catarina Mendes. Escutar com o corpo: a experiência sensível entre dança, poesia e clínica. 2013. 218 f. Tese (Doutorado) - Programa de Pós-graduação em Psicologia da Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2013.).

Ao invés de situar a clínica em uma prática, talvez seja mais interessante criar condições para que novas práticas venham à tona. É um modo de resistir às políticas de subjetivação dominantes, coladas às formas instituídas e à vida orgânica e performática. É preciso uma clínica que esteja do lado da processualidade da vida, regida por afecções. Somos convidados a nos colocar em uma zona de confronto com um deslocamento. Operar no plano das sensações “é diferente de dizer que se relaciona com o sentimento psicológico, pois ela nos leva, não a uma exploração de interioridades, mas justamente a sair de nós mesmos” (RAUTER; RESENDE, 2015RAUTER, Cristina; RESENDE, Catarina. Arte, clínica e transdisciplinaridade. Polêm!ca, Rio de Janeiro, v. 15, n. 3, p. 1-12, 2015. https://doi.org/10.12957/polemica.2015.19362
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, p. 6). O caminho clínico, portanto, vai ao encontro de uma corporeidade que é processualidade, considerado seu caráter mutável e contingente. Contingência essa conduzida pelo regime de afecções do corpo. Quanto mais a clínica se abre para essa comunicação pelos seus movimentos corporais (movimentos que, já sabemos, não são necessariamente físicos), mais experimentamos uma afinação entre o sentir e o pensar.

Uma vez que, pela experiência e experimentação, exploramos nossa capacidade de composição por afetos, vamos além do que já conhecemos sobre nós mesmos, sobre o sentir e o pensar. Um outro sentir é possível, um novo pensar é possível. Outros, que não só aqueles instalados no nosso corpo segmentarizado, capitalizado. Ainda que o corpo esteja capturado por esses modos, a qualquer momento o devir nos arrasta para outro lugar em que se cruzam as linhas visíveis do saber com as mais finas vibrações. E, por mais grosseiras e rudes que estejam as forças reativas em determinado tempo na história, a sutileza se faz resistência.

Acenamos para a possibilidade de a clínica se reinventar. Reinvenção que se dá pelo corpo e convoca a uma abertura para a potência autopoiética da vida: a vida produzindo a si mesma. Quem sabe não seja esse um caminho para que nossos corpos se destravem um pouco, afinal, e se permitam uma delicada soltura?

Referências

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    » http://repositorio.unicamp.br/jspui/handle/REPOSIP/278826
  • 1
    Esses conceitos serão mais bem explicados no próximo tópico deste artigo, intitulado “Corpo como lugar de afecções”.
  • 2
    Em Nietzsche, vivência (Erlebnis) e experimento (Erfahrung) são dois termos que diferem na etimologia. A primeira é condição de possibilidade para a segunda. Cada vivência é sentida na pele, cujo conteúdo é impossível de se determinar racionalmente. Não basta um querer vivenciar, a vivência é algo que altera as condições de existência de um indivíduo. A vivência, portanto, caracteriza-se pela sua dimensão estética. Enquanto o experimento está sujeito à instrumentalização da razão e vinculado ao conhecimento, a vivência é um contra-conceito da razão (VIESENTEINER, 2009VIESENTEINER, Jorge Luiz. Experimento e vivência: a dimensão da vida como pathos. 2009. 337 f. Tese (Doutorado) - Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2009. Disponível em: Disponível em: http://www.repositorio.unicamp.br/handle/REPOSIP/280812 . Acesso em: 14 ago. 2019.
    http://www.repositorio.unicamp.br/handle...
    ).
  • *
    Apoio: CNPq

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Out 2021
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2021

Histórico

  • Recebido
    10 Out 2017
  • Revisado
    15 Mar 2020
  • Revisado
    07 Mar 2021
  • Aceito
    02 Jun 2021
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