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A medicalização do sofrimento psíquico na cultura do hiperconsumo

Medicalization of psychic suffering in a culture of hyperconsumption

La medicalización del sufrimiento psíquico en la cultura del hiperconsumo

Resumo

Na atual fase em que se encontra a sociedade de consumo, estão presentes de forma bastante acentuada os valores do hedonismo, da busca incessante pela felicidade através da aquisição de bens materiais, da negação do sofrimento, dos lazeres, da leveza e do hiperindividualismo. O processo crescente de destradicionalização da sociedade tornou o sujeito ao mesmo tempo livre e instável. Com o enfraquecimento da capacidade ordenadora de instituições como igreja e escola, o sujeito tende a buscar no consumo de bens e serviços uma fonte de segurança, além do uso de medicamentos que aliviam o sofrimento psíquico gerado por esse desamparo. Considerando que a medicalização do sofrimento psíquico atinge largas escalas nessa fase da sociedade contemporânea, o presente trabalho propõe-se a investigar os fatores da cultura do hiperconsumo que funcionam como dispositivos que favorecem o processo da medicalização generalizada. Partiu-se de uma pesquisa bibliográfica na qual foram observados alguns atores que difundem o discurso medicalizante, como a publicidade, a psiquiatria hegemônica e a indústria farmacêutica. As informações apresentadas e organizadas na pesquisa resultam na constatação de que a medicalização é produto tanto de interesses da indústria farmacêutica como da demanda do hiperconsumidor por felicidade, bem-estar e ausência de sofrimento.

Palavras-chave:
consumo; medicalização; publicidade; propaganda; sociedade

Abstract

In the current phase in which the consumer society is present, the values of hedonism, the incessant search for happiness through the acquisition of material goods, the denial of suffering, leisure, lightness and hyperindividualism are quite marked. The growing process of detraditionalization of society has made the subject at the same time free and unstable. With the weakening of the ordering capacity of institutions such as church and school, the subject tends to seek in the consumption of goods and services a source of security, in addition to the use of medications that relieve the psychic suffering generated by this helplessness. Considering that the medicalization of psychic suffering reaches large scales in this phase of contemporary society, the present work proposes to investigate the factors of the culture of hyperconsumption that function as devices that favor the process of generalized medicalization. It was based on a bibliographical research in which some actors were observed that spread the medicalizing discourse, such as advertising, hegemonic psychiatry and the pharmaceutical industry. The information presented and organized in the research results in the finding that medicalization is the product of both the interests of the pharmaceutical industry and the demand of the hyperconsumer for happiness, well-being and absence of suffering.

Keywords:
consumption; medicalization; publicity; propaganda; society

Resumen

En la fase actual en la que está presente la sociedad de consumo, los valores del hedonismo, la búsqueda incesante de la felicidad a través de la adquisición de bienes materiales, la negación del sufrimiento, el ocio, la ligereza y el hiperindividualismo son bastante marcados. El creciente proceso de destradicionalización de la sociedad ha hecho que el sujeto sea al mismo tiempo libre e inestable. Con el debilitamiento de la capacidad de ordenamiento de instituciones como la iglesia y la escuela, el sujeto tiende a buscar en el consumo de bienes y servicios una fuente de seguridad, además del uso de medicamentos que alivian el sufrimiento psíquico generado por esta indefensión. Considerando que la medicalización del sufrimiento psíquico alcanza grandes escalas en esta fase de la sociedad contemporánea, el presente trabajo propone investigar los factores de la cultura del hiperconsumo que funcionan como dispositivos que favorecen el proceso de medicalización generalizada. Se basó en una investigación bibliográfica en la que se observaron algunos actores que difundieron el discurso medicalizador, como la publicidad, la psiquiatría hegemónica y la industria farmacéutica. La información presentada y organizada en la investigación resulta en el hallazgo de que la medicalización es el producto tanto de los intereses de la industria farmacéutica como de la demanda del hiperconsumidor de felicidad, bienestar y ausencia de sufrimiento.

Palabras clave:
consumo; medicalización; publicidad; propaganda; sociedad

As tradições estão esgotadas; temos a publicidade e seu poder de promover normas de consumo.

Gilles Lipovetsky (2007)LIPOVETSKY, Gilles. A felicidade paradoxal: ensaio sobre a sociedade de hiperconsumo. São Paulo: Companhia das Letras , 2007.

Introdução

Na atual fase em que se encontra a sociedade de consumo, estão presentes de forma bastante acentuada os valores do hedonismo, da busca incessante pela felicidade através da aquisição de bens materiais, da negação do sofrimento, dos lazeres, da leveza e do hiperindividualismo, sociedade esta descrita por Lipovetsky (2007LIPOVETSKY, Gilles. A felicidade paradoxal: ensaio sobre a sociedade de hiperconsumo. São Paulo: Companhia das Letras , 2007.) através do epíteto “cool”. A destradicionalização da sociedade tornou o sujeito ao mesmo tempo livre e instável: com o enfraquecimento da capacidade ordenadora de instituições como igreja e escola, o sujeito busca o consumo de bens e serviços como fonte de segurança, além da medicalização e do consequente uso de medicamentos que aliviam o sofrimento psíquico gerado por esse desamparo. O discurso psiquiátrico hegemônico e o DSM (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, documento criado pela Associação Americana de Psiquiatria (APA) para padronizar os critérios diagnósticos das desordens que afetam a mente e as emoções), unidos à indústria farmacêutica e à publicidade, funcionam como dispositivos da medicalização. Os valores da sociedade de hiperconsumo internalizados pelo sujeito contemporâneo, no entanto, são importantes fatores para a demanda de medicamentos que melhoram a performance e o humor, já que norteiam a busca do sujeito por felicidade e a produção publicitária que visa vender os medicamentos. Tudo indica que vivemos hoje, segundo a expressão de Kolakowski (1981KOLAKOWSKI, Leszek. A presença do mito. Brasília: UNB, 1981.), uma verdadeira cultura dos analgésicos.

Para a produção deste artigo, a pesquisa bibliográfica foi o método utilizado. Ela consiste em “um procedimento metodológico que se oferece ao pesquisador como uma possibilidade na busca de soluções para seu problema de pesquisa” (LIMA; MIOTO, 2007LIMA, Telma Cristiane Sasso de; MIOTO, Regina Célia Tamaso. Procedimentos metodológicos na construção do conhecimento científico: a pesquisa bibliográfica. Revista Katálysis, Florianópolis, v. 10, n. spe., p. 37-45, 2007. https://doi.org/10.1590/S1414-49802007000300004
https://doi.org/10.1590/S1414-4980200700...
, p. 37). Desta forma, buscamos analisar as relações existentes entre a medicalização e a sociedade de consumo a partir das seguintes questões disparadoras: como ocorre a psiquiatrização da vida na contemporaneidade e quais os dispositivos que contribuem para que esse fenômeno ocorra? De que maneira os valores culturais da sociedade de consumo, a publicidade, a psiquiatria hegemônica e a indústria farmacêutica influem nesta medicalização generalizada? Para tanto, utilizamos como principal referência teórica o pensamento de Gilles Lipovetsky (2007LIPOVETSKY, Gilles. A felicidade paradoxal: ensaio sobre a sociedade de hiperconsumo. São Paulo: Companhia das Letras , 2007.). Além disso, foi realizada uma entrevista em profundidade com um psiquiatra, cujo nome será mantido em sigilo, a fim de confirmar ou refutar as hipóteses levantadas a partir do levantamento bibliográfico.

A sociedade de hiperconsumo

Bem-estar, felicidade e negação do sofrimento. Esses são alguns dos valores da sociedade de consumo, como descreve Lipovetsky (2007LIPOVETSKY, Gilles. A felicidade paradoxal: ensaio sobre a sociedade de hiperconsumo. São Paulo: Companhia das Letras , 2007.). Diante da percepção de uma crescente medicalização do sofrimento, foi desenvolvida a hipótese de que os valores acima citados são os norteadores deste processo. Para obtermos uma resposta satisfatória, compreender o hiperconsumo deve ser o nosso primeiro intuito.

A sociedade capitalista de consumo, como descreve Lipovetsky (2007LIPOVETSKY, Gilles. A felicidade paradoxal: ensaio sobre a sociedade de hiperconsumo. São Paulo: Companhia das Letras , 2007.), é composta por três fases. A fase I começa por volta de 1880 graças às infraestruturas modernas de transporte e ao crescente desenvolvimento dos processos de comunicação. Foi nela que surgiram as máquinas de fabricação contínua que aumentaram a produtividade com custos mais baixos, o que prefigurou a produção em massa. Foi na fase I que se iniciou a democratização do acesso aos bens mercantis, muito embora fosse uma época também marcada por grandes disparidades econômicas e sociais. A hiperprodução acabou gerando uma crise, que desembocou na segunda fase.

Grandes investimentos para a publicidade e para as marcas começaram a surgir. A fase II inventou o consumo-sedução, o consumo-distração com os grandes magazines: estabelecimentos comerciais que vendiam grande quantidade de produtos com um lucro menor. Segundo Lipovetsky (2007LIPOVETSKY, Gilles. A felicidade paradoxal: ensaio sobre a sociedade de hiperconsumo. São Paulo: Companhia das Letras , 2007.), por meio da publicidade e dos grandes magazines aconteceu a democratização do desejo, além de transformações dos locais de venda em palácios de sonho, com decorações luxuosas e vitrines de cor e luz, com ar de festa permanente e clima sensual que propiciavam a compra. “O grande magazine não vende apenas mercadorias, consagra-se a estimular a necessidade de consumir” (LIPOVETSKY, 2007LIPOVETSKY, Gilles. A felicidade paradoxal: ensaio sobre a sociedade de hiperconsumo. São Paulo: Companhia das Letras , 2007., p. 31). Walter Benjamin (2007BENJAMIN, Walter. Passagens. Belo Horizonte: UFMG, 2007.) foi um dos primeiros pensadores a atentar para a presença destes palácios de cristal, os magazines parisienses e suas vitrines chamativas.

Segundo Lipovetsky (2007LIPOVETSKY, Gilles. A felicidade paradoxal: ensaio sobre a sociedade de hiperconsumo. São Paulo: Companhia das Letras , 2007.), a fase II começa a deslanchar em 1950 e é chamada de “a sociedade da abundância”. Com o pós-guerra e a mudança do eixo geopolítico mundial da Europa para os Estados Unidos, o processo de democratização da compra de bens duráveis foi aperfeiçoado. Ela pôs à disposição de quase todos “os produtos emblemáticos da sociedade de afluência: automóvel, televisão, aparelhos eletrodomésticos” (LIPOVETSKY, 2007LIPOVETSKY, Gilles. A felicidade paradoxal: ensaio sobre a sociedade de hiperconsumo. São Paulo: Companhia das Letras , 2007., p. 32). Isso se deu com a difusão do modelo tayloriano-fordista de organização da produção, que tem como característica principal a padronização de produtos fabricados em grandes quantidades. Um dos motivos para tal explosão do consumo e pela relativa estabilidade das relações entre capital e trabalho se deu por conta da guerra fria, a disputa pela hegemonia mundial entre o capitalismo centrado nos Estados Unidos e o socialismo soviético, ameaça sempre presente ao modelo ideal da sociedade de consumo.

Na fase II também se instala a lógica-moda e a obsolescência programada, que buscavam reduzir o tempo de vida das mercadorias pela renovação rápida dos modelos e dos estilos. Trata-se de uma sociedade focada no progresso e no cotidiano “confortável e fácil, sinônimo de felicidade” (LIPOVETSKY, 2007LIPOVETSKY, Gilles. A felicidade paradoxal: ensaio sobre a sociedade de hiperconsumo. São Paulo: Companhia das Letras , 2007. p. 35).

Eis um tipo de sociedade que substitui a coerção pela sedução, o dever pelo hedonismo, a poupança pelo dispêndio, a solenidade pelo humor, o recalque pela liberação, as promessas do futuro pelo presente. A fase II se mostra como sociedade do desejo, achando-se toda a cotidianidade impregnada de imaginário de felicidade consumidora, de sonhos de praia, de ludismo erótico, de modas ostensivamente jovens (LIPOVETSKY, 2007LIPOVETSKY, Gilles. A felicidade paradoxal: ensaio sobre a sociedade de hiperconsumo. São Paulo: Companhia das Letras , 2007., p. 36).

Essa sociedade, para Lipovetsky (2007LIPOVETSKY, Gilles. A felicidade paradoxal: ensaio sobre a sociedade de hiperconsumo. São Paulo: Companhia das Letras , 2007., p. 36), “criou em grande escala a vontade crônica dos bens mercantis, o vírus da compra, a paixão pelo novo, um modo de vida centrado nos valores materialistas”. Porém, desde a década de 80, entre outros fatores advindos do colapso da União Soviética, a denominada sociedade de hiperconsumo sofre nova transformação, dando início à fase III,

que aparece como a que, ampliando incessantemente a gama das escolhas pessoais, liberta as condutas individuais dos enquadramentos coletivos e desenvolve a individualização dos bens de equipamento. Para conceitualizá-la em uma fórmula, a fase III representa a passagem da era da escolha à era da hiperescolha, do monoequipamento ao multiequipamento, do consumismo descontínuo ao consumismo contínuo, do consumo individualista ao consumo hiperindividualista (LIPOVETSKY, 2007LIPOVETSKY, Gilles. A felicidade paradoxal: ensaio sobre a sociedade de hiperconsumo. São Paulo: Companhia das Letras , 2007., p. 104, grifos do autor).

Doravante o consumo em massa deixa de ser suficiente para satisfazer a ânsia do consumidor e cria-se uma relação emocional entre indivíduos e mercadorias, um verdadeiro enamoramento de marcas. O produto doravante passa a ser mais que mero objeto e passa a ser pensado como um conceito, um estilo de vida. A filósofa canadense Naomi Klein cunhou uma curiosa expressão para dar conta dessa paixão do consumidor: casulo de marca (KLEIN, 2008KLEIN, Naomi. Sem logo: a tirania das marcas num planeta vendido. Rio de Janeiro: Record, 2008.). A ansiedade pelo consumo cresce, juntamente com a necessidade de consumir. O hiperconsumismo passa a ser visto como uma forma de lutar contra a fatalidade natural da vida, uma forma de derrotar nossa trágica condição de mortais autoconscientes.

É nesta fase que aparentemente todas (ou quase todas) as instâncias da vida passam a ser mediadas pela esfera do consumo, e não é diferente com a saúde mental. O processo de aceleração generalizado da vida acaba favorecendo que o sofrimento psíquico seja tratado hegemonicamente à base de medicação, visto que o processo psicoterápico, além de demorado, exige um investimento libidinal que nem todos estão dispostos a realizar.

A fase III, ao mesmo tempo em que radicaliza o consumo como se não houvesse amanhã, marca também a época em que se percebe, com uma clareza nunca experimentada, que o planeta que habitamos tem recursos finitos e que, se todos os habitantes mantiverem os atuais níveis de consumo, a crise que virá será inevitável e catastrófica para todos.

Para Lipovetsky (2007LIPOVETSKY, Gilles. A felicidade paradoxal: ensaio sobre a sociedade de hiperconsumo. São Paulo: Companhia das Letras , 2007., p. 128), o hiperconsumo é mais bem definido pela destradicionalização da sociedade; a vida e as escolhas do sujeito passam a ser de sua inteira responsabilidade à medida que exerce o hiperindividualismo na atividade consumidora: “Chega uma hora em que todas as esferas da vida social e individual são, de uma maneira ou de outra, reorganizadas de acordo com os princípios da ordem consumista”.

Uma sociedade tradicional é aquela na qual as instituições já dão como respondidas as questões fundamentais da existência humana: o que é amar e trabalhar, o que é uma família; em que se deve acreditar; por que motivos se deve morrer; por que e para que se vive, de que maneira, segundo que prescrições. Para essas questões fundamentais, a sociedade de consumo não tem uma resposta; em compensação, ela tem muitas (ROCHA, 2005ROCHA, Silvia Pimenta Veloso. O homem sem qualidades: modernidade, consumo e identidade cultural. Comunicação, mídia e consumo, São Paulo, v. 2, n. 3, p. 111-122, mar, 2005. Disponível em: Disponível em: http://revistacmc.espm.br/index.php/revistacmc/article/view/28/28 . Acesso em: 20 jun. 2016.
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, p. 113, grifo do autor).

Rocha (2005ROCHA, Silvia Pimenta Veloso. O homem sem qualidades: modernidade, consumo e identidade cultural. Comunicação, mídia e consumo, São Paulo, v. 2, n. 3, p. 111-122, mar, 2005. Disponível em: Disponível em: http://revistacmc.espm.br/index.php/revistacmc/article/view/28/28 . Acesso em: 20 jun. 2016.
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, p. 114) aponta que “o homem moderno pretende ser livre (das tradições, das normas, das imposições sociais) - e esta é talvez sua maior pretensão; mas, entregues à nossa liberdade, não sabemos como usufruir dela”, do que derivam a angústia e a crise. O consumo, então, “surge como a derradeira esfera de produção de identidade, aquela que permitirá ao indivíduo criar a si mesmo” (ROCHA, 2005ROCHA, Silvia Pimenta Veloso. O homem sem qualidades: modernidade, consumo e identidade cultural. Comunicação, mídia e consumo, São Paulo, v. 2, n. 3, p. 111-122, mar, 2005. Disponível em: Disponível em: http://revistacmc.espm.br/index.php/revistacmc/article/view/28/28 . Acesso em: 20 jun. 2016.
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, p. 115). Importante lembrar que para tudo isso há um custo com o qual a grande maioria da população do planeta não tem condições de arcar. O consumo e sua vertente atual, o hiperconsumo, passam a ser um privilégio de classe e não um direito universal.

É nessa sociedade que o consumidor é encorajado a comprar sempre mais e que novos mercados são criados. Lipovetsky (2007LIPOVETSKY, Gilles. A felicidade paradoxal: ensaio sobre a sociedade de hiperconsumo. São Paulo: Companhia das Letras , 2007., p. 123) descreve o pré-adolescente e o idoso aposentado como exemplos dos novos hiperconsumidores, sendo este último o turboconsumidor emblemático que realiza dispêndios constantes, livre da obrigação do trabalho:

Na fase III, mais nenhuma idade deve escapar às redes do marketing, mais nenhum limite deve deter o expansionismo comercial: da mesma maneira que o tempo do hiperconsumo é contínuo, 24 horas por dia, 364 dias por ano, os indivíduos serão chamados, em breve, a tornar-se turboconsumidores ao longo de toda a vida, de um aos cem anos (LIPOVETSKY, 2007LIPOVETSKY, Gilles. A felicidade paradoxal: ensaio sobre a sociedade de hiperconsumo. São Paulo: Companhia das Letras , 2007., p. 123).

Essas sociedades privilegiam o conforto material e a eliminação dos esforços, “assim, instalam-se novos hábitos que levam os indivíduos a passar da busca do prazer à evitação do sofrimento” (LIPOVETSKY, 2007LIPOVETSKY, Gilles. A felicidade paradoxal: ensaio sobre a sociedade de hiperconsumo. São Paulo: Companhia das Letras , 2007., p. 159-160). A medicalização do sofrimento, então, se encaixa aqui como uma busca de felicidade constante por meio do consumo de medicamentos. É também aqui que vislumbramos o verdadeiro boom das chamadas drogas recreativas, aquelas que, ao invés de curar a doença, expandem a condição de prazer e bem-estar.

Em um tempo marcado pelo enfraquecimento dos enquadramentos coletivos e pela exigência, martelada em toda parte, de tornar-se um eu, ator de sua vida, responsável por suas competências, a tarefa de ser sujeito torna-se extenuante, depressiva, cada vez mais difícil de assumir. Daí decorreriam a emergência dos desequilíbrios psíquicos, a cascata dos sentimentos de insuficiência pessoal e de insegurança interior (LIPOVETSKY, 2007LIPOVETSKY, Gilles. A felicidade paradoxal: ensaio sobre a sociedade de hiperconsumo. São Paulo: Companhia das Letras , 2007., p. 201).

É percebido, então, que a destradicionalização e o individualismo presentes na sociedade de consumo exercem um papel importante nos processos de sofrimento e desamparo vividos pelo sujeito. O consumo (de bens, serviços ou medicamentos) funcionaria como uma tentativa de superá-los.

A medicalização do sofrimento psíquico

“Coisas normais da vida estão sendo encaradas como patologias”, afirma Costa e Silva (apud Aguiar, 2004AGUIAR, Adriano Amaral de. A psiquiatria no divã: entre as ciências da vida e a medicalização da existência. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2004., p. 85), denominando esse processo de “psiquiatrização”. Guarido (2007GUARIDO, Renata. A medicalização do sofrimento psíquico: considerações sobre o discurso psiquiátrico e seus efeitos na Educação. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 33, n. 1, p. 151-161, 2007. https://doi.org/10.1590/S1517-97022007000100010
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, p. 159) afirma que “estamos atualmente [...] convivendo com sofrimentos codificados em termos de uma nomeação própria do discurso médico, que se socializa amplamente e passa a ordenar a relação do indivíduo com sua subjetividade e seus sofrimentos”. Ao fenômeno de interpretação da vida a partir de um saber médico, atribui-se o termo medicalização.

O psiquiatra entrevistado afirma que a medicalização seria a ação de tratar determinados problemas de saúde, física ou psíquica, com o instrumento da medicação. Para ele, a medicalização é também uma forma de patologização do sofrimento. O termo tem sido utilizado para ilustrar os diferentes âmbitos em que esse discurso tem conquistado espaço: medicalização do sofrimento (IGNÁCIO; NARDI, 2007IGNÁCIO, Vivian Tatiana Galvão; NARDI, Henrique Caetano. A medicalização como estratégia biopolítica: um estudo sobre o consumo de psicofármacos no contexto de um pequeno município do Rio Grande do Sul. Psicologia & Sociedade, Porto Alegre, v. 19, n. 3, p. 88-95, 2007. https://doi.org/10.1590/S0102-71822007000300013
https://doi.org/10.1590/S0102-7182200700...
), da infância, da escola (GUARIDO, 2007GUARIDO, Renata. A medicalização do sofrimento psíquico: considerações sobre o discurso psiquiátrico e seus efeitos na Educação. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 33, n. 1, p. 151-161, 2007. https://doi.org/10.1590/S1517-97022007000100010
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), da existência, da vida e do consumo (LIPOVETSKY, 2007LIPOVETSKY, Gilles. A felicidade paradoxal: ensaio sobre a sociedade de hiperconsumo. São Paulo: Companhia das Letras , 2007.).

A competência médica estende-se a todos os domínios da vida para melhorar-lhes a qualidade. [...] Os bens de consumo integram cada vez mais a dimensão da saúde: alimentos, turismo, hábitat, cosméticos, a temática da saúde tornou-se um argumento decisivo de venda. A fase III anuncia-se como o tempo da medicalização da vida e do consumo (LIPOVETSKY, 2007LIPOVETSKY, Gilles. A felicidade paradoxal: ensaio sobre a sociedade de hiperconsumo. São Paulo: Companhia das Letras , 2007., p. 53-54).

Em diversos trabalhos científicos, a medicalização tem sido alvo de críticas que servirão aqui para problematizar este processo, nos fazendo perceber a importância de pesquisá-lo. Criticar, no entanto, não pode ser considerado sinônimo de demonizar. É evidente que a medicalização, bem como a questão dos diagnósticos, tem sua importância e seu papel assegurado. Um diagnóstico pode ser uma ferramenta fundamental para o bom tratamento do sofrimento psíquico, bem como ajudar o paciente em seu processo de autopercepção. O problema acontece quando consideramos fenômenos como a hipermedicalização generalizada bem como a verdadeira epidemia de diagnósticos que ora enfrentamos.

Guarido (2007GUARIDO, Renata. A medicalização do sofrimento psíquico: considerações sobre o discurso psiquiátrico e seus efeitos na Educação. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 33, n. 1, p. 151-161, 2007. https://doi.org/10.1590/S1517-97022007000100010
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) afirma que a medicalização presente na escola revela, por um lado, alunos que, em outros tempos, seriam marginalizados e vistos como ineducáveis, e que agora estão estudando graças ao uso de medicamentos. A autora descobre, por outro lado, a falência do sistema educacional. Um sistema educacional que levasse em conta a subjetividade dos alunos seria o ideal. Entretanto, a medicalização tem agido de maneira a “normalizar” os alunos ditos “ineducáveis’’ por meio do uso de psicotrópicos.

Em vez de revolucionar o ensino e sua estrutura, o Ocidente prefere, pelo contrário, remediar os efeitos das anomalias geradas por um ensino inadequado à nossa época. Remediar os efeitos significa, neste caso, encarregar a medicina de responder onde o ensino fracassou (MANNONI, 1988 apud GUARIDO, 2007GUARIDO, Renata. A medicalização do sofrimento psíquico: considerações sobre o discurso psiquiátrico e seus efeitos na Educação. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 33, n. 1, p. 151-161, 2007. https://doi.org/10.1590/S1517-97022007000100010
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, p. 156).

A respeito disto, Ignácio e Nardi (2007IGNÁCIO, Vivian Tatiana Galvão; NARDI, Henrique Caetano. A medicalização como estratégia biopolítica: um estudo sobre o consumo de psicofármacos no contexto de um pequeno município do Rio Grande do Sul. Psicologia & Sociedade, Porto Alegre, v. 19, n. 3, p. 88-95, 2007. https://doi.org/10.1590/S0102-71822007000300013
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, p. 89) afirmam que a medicalização age “instaurando uma normalidade medicalizada, na qual a expressão do sofrimento [...] não se torna objeto de reflexão e busca de construção de outras formas de ser”.

Ewald e Oliveira (2004EWALD, Ariane Patrícia; OLIVEIRA, Dayse de Marie. Mídia farmacêutica: sociedade de consumo e fabricação da loucura. In: CONFERÊNCIA BRASILEIRA DE COMUNICAÇÃO E SAÚDE, VII, 2004, Recife. Anais... Recife: Consaúde, 2004., p. 6) expõem que “os problemas do espírito, como eram chamados, se transformaram em doenças mentais [...] colocando diante da psicofarmacologia um mercado gigantesco e lucrativo”. A respeito disso, os autores propõem “perguntarmos se isso é reflexo de um silenciamento da subjetividade na sociedade moderna ou se é uma proposta de silenciamento bioquímico do sofrimento psíquico” (EWALD; OLIVEIRA, 2004EWALD, Ariane Patrícia; OLIVEIRA, Dayse de Marie. Mídia farmacêutica: sociedade de consumo e fabricação da loucura. In: CONFERÊNCIA BRASILEIRA DE COMUNICAÇÃO E SAÚDE, VII, 2004, Recife. Anais... Recife: Consaúde, 2004., p. 6).

Para Pessotti (2003PESSOTTI, Isaias. Para compreender a ‘vida dura’. Folha de São Paulo [online], 26 de janeiro de 2003. Disponível em: Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs2601200303.htm . Acesso em: 10 set. 2016.
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), “encontrar um nome para a ameaça ou o sofrimento é uma forma de reduzir a ansiedade. Um diagnóstico médico de depressão reduz a ansiedade do paciente, dá um nome ao seu fantasma”. Para o autor, isso faz com que o sujeito não reflita sobre si mesmo. Desta forma, o que acabamos vivenciando é, ao contrário de uma subjetivação crescente da experiência, uma verdadeira terceirização do sofrimento e da angústia, que passam a ser, não apenas tratados, mas sim substituídos por substâncias que se acredita resolverem magicamente todos os problemas da existência. Giannetti (2002GIANNETTI, Eduardo. Felicidade: diálogos sobre o bem-estar na civilização. São Paulo: Companhia das Letras, 2002., p. 149) enxerga nas “pílulas da felicidade” aspectos da sociedade do desempenho: “a finalidade dessas drogas não é fazer com que o paciente volte à normalidade ou se sinta menos mal, mas sim levar o usuário a ficar ‘mais do que bem’, isto é, a ir além da sua condição normal”.

Diante das crescentes pesquisas envolvendo a medicalização, é possível afirmar que muitos autores comungam que é preocupante o fenômeno da hipermedicalização. Pessotti (2003PESSOTTI, Isaias. Para compreender a ‘vida dura’. Folha de São Paulo [online], 26 de janeiro de 2003. Disponível em: Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs2601200303.htm . Acesso em: 10 set. 2016.
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs...
, p. 43) afirma que no século V a. C. havia um tratamento que “prescrevia, além de dietas, poções ou fármacos que corrigissem o desarranjo humoral, práticas outras que configuravam uma primitiva psicoterapia no tratamento da enfermidade chamada melancolia”. A medicalização na contemporaneidade, no entanto, banaliza os diagnósticos e utiliza medicações como intervenção diante da vida, como afirma Guarido (2007GUARIDO, Renata. A medicalização do sofrimento psíquico: considerações sobre o discurso psiquiátrico e seus efeitos na Educação. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 33, n. 1, p. 151-161, 2007. https://doi.org/10.1590/S1517-97022007000100010
https://doi.org/10.1590/S1517-9702200700...
). Para Pessotti (2003PESSOTTI, Isaias. Para compreender a ‘vida dura’. Folha de São Paulo [online], 26 de janeiro de 2003. Disponível em: Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs2601200303.htm . Acesso em: 10 set. 2016.
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, p. 59), “o que há, na verdade, é uma sociedade depressiva e uma epidemia de diagnósticos de depressão”.

Notícias de três veículos ilustram esta afirmação: a BBC BRASIL (2009)BBC NEWS BRASIL. Depressão será a doença mais comum do mundo em 2030, diz OMS [online], 02 de setembro de 2009. Disponível em: Disponível em: http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2009/09/090902_depressao_oms_cq.shtml . Acesso em: 6 out. 2016.
http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2...
divulgou dados da Organização Mundial da Saúde apontando que “nos próximos 20 anos, a depressão será a doença mais comum do mundo, afetando mais pessoas do que qualquer outro problema de saúde, incluindo câncer e doenças cardíacas”. A Associação Brasileira de Psiquiatria (2010)ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PSIQUIATRIA. Depressão: números impressionam e afetam empresas brasileiras. 19 jul. 2010. Disponível em: Disponível em: http://abp.org.br/portal/clippingsis/exibClipping/?clipping=12089 . Acesso em: 6 out. 2016.
http://abp.org.br/portal/clippingsis/exi...
noticiou que “83.209 brasileiros foram afastados de seus trabalhos devido à depressão” em 2009, doença que foi classificada por eles, é importante sublinhar, como moderna. E o Diário de Pernambuco (2015)DIÁRIO de Pernambuco. Por dias melhores, durma bem à noite [online]. Disponível em: Disponível em: http://hotsites.diariodepernambuco.com.br/local/2015/ViverMais/dia5.shtml . Acesso em: 6 out. 2016.
http://hotsites.diariodepernambuco.com.b...
, informou que “61 mil pessoas foram afastadas do trabalho por conta de depressão no Brasil em 2013”.

Segundo Guarido (2007GUARIDO, Renata. A medicalização do sofrimento psíquico: considerações sobre o discurso psiquiátrico e seus efeitos na Educação. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 33, n. 1, p. 151-161, 2007. https://doi.org/10.1590/S1517-97022007000100010
https://doi.org/10.1590/S1517-9702200700...
, p. 153), desde que o primeiro medicamento psiquiátrico foi produzido em 1952, “a indústria farmacêutica investe, ano após ano, mais e mais recursos no estabelecimento de pesquisas na área da psicofarmacologia e investe grande parcela de recursos no marketing de novas drogas”.

Pessotti (2003PESSOTTI, Isaias. Para compreender a ‘vida dura’. Folha de São Paulo [online], 26 de janeiro de 2003. Disponível em: Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs2601200303.htm . Acesso em: 10 set. 2016.
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), afirma que a vida se ‘psiquiatrizou’, ou seja, está sendo interpretada por uma visão psiquiátrica devido “aos meios de comunicação de massa, à propaganda da indústria farmacêutica e à difusão do DSM”.

É possível afirmar, então, que a medicalização do sofrimento psíquico é crescente na medida em que está atrelada ao marketing e à publicidade, ao consumo e à indústria farmacêutica? Para Aguiar (2004AGUIAR, Adriano Amaral de. A psiquiatria no divã: entre as ciências da vida e a medicalização da existência. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2004., p. 42), o DSM “surge como efeito da presença cada vez maior de grandes corporações privadas no campo da psiquiatria, como a indústria farmacêutica e as grandes seguradoras de saúde”.

O prefácio da versão digital do DSM-5 o define como “uma classificação de transtornos mentais e critérios associados elaborada para facilitar o estabelecimento de diagnósticos mais confiáveis desses transtornos” (ASSOCIAÇÃO AMERICANA DE PSIQUIATRIA, 2013ASSOCIAÇÃO AMERICANA DE PSIQUIATRIA. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais - DSM. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2013., p. 42). Cada diagnóstico é emitido de acordo com a pré-catalogação de sintomas disponíveis no DSM. Pessotti (2003PESSOTTI, Isaias. Para compreender a ‘vida dura’. Folha de São Paulo [online], 26 de janeiro de 2003. Disponível em: Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs2601200303.htm . Acesso em: 10 set. 2016.
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs...
) afirma que esses sintomas são diversos e as suas combinações são variadas, afirmação corroborada pelo próprio DSM-5: “Embora o DSM-5 continue sendo uma classificação categórica de transtornos individuais, reconhecemos que transtornos mentais nem sempre se encaixam totalmente dentro dos limites de um único transtorno” (ASSOCIAÇÃO AMERICANA DE PSIQUIATRIA, 2013ASSOCIAÇÃO AMERICANA DE PSIQUIATRIA. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais - DSM. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2013., p. 42).

O psiquiatra Costa e Silva (apud Aguiar, 2004AGUIAR, Adriano Amaral de. A psiquiatria no divã: entre as ciências da vida e a medicalização da existência. Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2004., p. 85) afirma que a diversidade de diagnósticos psiquiátricos traz mais benefícios “aos interesses e à saúde financeira da indústria que à saúde dos pacientes”. Segundo Guarido (2007GUARIDO, Renata. A medicalização do sofrimento psíquico: considerações sobre o discurso psiquiátrico e seus efeitos na Educação. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 33, n. 1, p. 151-161, 2007. https://doi.org/10.1590/S1517-97022007000100010
https://doi.org/10.1590/S1517-9702200700...
, p. 154), os psicotrópicos participam da nomeação do transtorno, pois “não há mais uma etiologia e uma historicidade a serem consideradas, pois a verdade do sintoma/transtorno está no funcionamento bioquímico, e os efeitos da medicação dão validade a um ou outro diagnóstico”. Sendo assim, afirmamos que os diagnósticos podem ser instrumentalizados como justificativas para a venda de produtos da indústria farmacêutica e que funcionam muitas vezes como um discurso que promove o consumo de medicamentos.

O psiquiatra entrevistado afirma que interessa aos laboratórios farmacêuticos o discurso que sustenta a crença de que a depressão é a doença que mais impacta no trabalho mundialmente. “Interessa que esse discurso ganhe a mídia porque muitas pessoas sem senso crítico acabam entendendo que o sofrimento é uma doença que precisa ser resolvida com medicação”. Para ele, a afirmação de que a depressão é o transtorno que mais incapacita pode ser verdadeira, mas acredita que se trata igualmente de uma intenção mercadológica por parte da indústria farmacêutica.

Para Guarido (2007GUARIDO, Renata. A medicalização do sofrimento psíquico: considerações sobre o discurso psiquiátrico e seus efeitos na Educação. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 33, n. 1, p. 151-161, 2007. https://doi.org/10.1590/S1517-97022007000100010
https://doi.org/10.1590/S1517-9702200700...
, p. 154), a versão revisada do DSM (em 2013 foi lançada a quinta versão) “é atualmente referência mundial de diagnóstico dos transtornos mentais, globalizando o modelo psiquiátrico americano”. Segundo Guarido (2007GUARIDO, Renata. A medicalização do sofrimento psíquico: considerações sobre o discurso psiquiátrico e seus efeitos na Educação. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 33, n. 1, p. 151-161, 2007. https://doi.org/10.1590/S1517-97022007000100010
https://doi.org/10.1590/S1517-9702200700...
, p. 159), “a produção de saber sobre o sofrimento psíquico encontra-se associada à produção da indústria farmacêutica de remédios que prometem aliviar os sofrimentos existenciais”. Uma vez que o sujeito sofre devido a sua própria condição biológica de animal mortal autoconsciente, parece não haver outra saída senão a medicação. Será? “Se o caminho da reflexão e da intenção subjetiva não dão conta do desejo de reduzir o fardo de uma autoconsciência que pesa e faz sofrer, por que não tomar o atalho da intervenção objetiva por meio da manipulação tecnológica”? (GIANNETTI, 2002GIANNETTI, Eduardo. Felicidade: diálogos sobre o bem-estar na civilização. São Paulo: Companhia das Letras, 2002., p. 145).

A promessa de aliviar os sofrimentos existenciais é semelhante às características da sociedade de hiperconsumo, em que o sofrimento parece não ser uma opção. O discurso médico, então, caminha de mãos dadas com os valores e o ethos da sociedade de consumo. “A felicidade é o valor central, o grande ideal celebrado sem tréguas pela civilização consumista” (LIPOVETSKY, 2007LIPOVETSKY, Gilles. A felicidade paradoxal: ensaio sobre a sociedade de hiperconsumo. São Paulo: Companhia das Letras , 2007., p. 348). Para quem não consegue atingir a performance (e, a se crer nos dados disponíveis, esses passam a ser a maioria), tem-se a alternativa medicalizante.

Para nosso entrevistado, o psiquiatra é o instrumento que pode fornecer os medicamentos que vão deixar o sujeito muito melhor a curto prazo, e os valores da sociedade de consumo certamente exercem uma grande influência sobre isso. Ele explica que isso se deve ao american way of life, ideal de vida estável, tranquila e alegre, discurso que se globalizou. Sendo assim, quase não é mais permitido que o sujeito seja triste, “pois esse sujeito não produz ou consome e se torna um prejuízo para a sociedade capitalista”. A tentativa de medicalizar a vida está atrelada a vender mais remédios: “não é à toa que o Prozac, um dos antidepressivos mais vendidos ainda hoje, é apelidado de pílula da felicidade”. Ele afirma que “a felicidade permanente e a qualquer custo continua sendo o ideal de massa perseguido desde o american way of life, e ele está permeando qualquer material de consumo e está nas relações de compra e venda”. Nas famigeradas propagandas de margarina, os ideais de beleza, felicidade e bem-estar físico podem ser vistos com facilidade. Curiosamente, com os ideais de saúde e felicidade acontece o mesmo que com os ideais de beleza: a sociedade de consumo cria ideais inatingíveis e, quando o consumidor não consegue atingir tais ideais, o que acontece quase sempre, ele sofre, e assim passa a recorrer a um produto que não deveria ser tratado como qualquer outro, visto que interfere diretamente no funcionamento bioquímico do organismo.

Pesquisas recentes revelam que o domínio sobre o Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade está sendo alterado desde que ele passou a fazer parte do DSM. “With the changes in the medical setting, important areas of medicalization are moving from a professional-medical dominance to a market dominance”1 1 “Com as mudanças na configuração médica, áreas importantes da medicalização estão migrando de um domínio médico profissional para um domínio de mercado”. Tradução nossa. (CONRAD; BERGEY, 2004 apud BIANCHI et al., 2016BIANCHI, Eugenia et al. Medicalization beyond physicians: pharmaceutical marketing on attention deficit and hyperactivity disorder in Argentina and Brazil (1998-2014). Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 25, n. 2, p. 452-462, 2016. https://doi.org/10.1590/S0104-12902016153981
https://doi.org/10.1590/S0104-1290201615...
, p. 455). Com isso, os índices de diagnósticos de TDAH têm aumentado e ido além das fronteiras dos Estados Unidos, ao que Conrad e Bergey (2014, apud BIANCHI et al., 2016BIANCHI, Eugenia et al. Medicalization beyond physicians: pharmaceutical marketing on attention deficit and hyperactivity disorder in Argentina and Brazil (1998-2014). Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 25, n. 2, p. 452-462, 2016. https://doi.org/10.1590/S0104-12902016153981
https://doi.org/10.1590/S0104-1290201615...
) denominam de iminente globalização do TDAH. Podemos, então, concluir que a medicalização do sofrimento é parte de uma estratégia mercadológica e que os valores do hiperconsumo suscitam o uso de medicamentos.

A propaganda de medicamentos

Segundo Conrad e Bergey (2014 apud BIANCHI et al., 2016BIANCHI, Eugenia et al. Medicalization beyond physicians: pharmaceutical marketing on attention deficit and hyperactivity disorder in Argentina and Brazil (1998-2014). Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 25, n. 2, p. 452-462, 2016. https://doi.org/10.1590/S0104-12902016153981
https://doi.org/10.1590/S0104-1290201615...
, p. 456), o pouco conhecimento sobre o TDAH era o motivo pelo qual seu mercado de medicamentos encontrava-se encolhido na sociedade. E é aqui que a publicidade de medicamentos entra em questão.

Se encararmos o argumento da psiquiatria biológica, o DSM e o tratamento medicamentoso como fatores de um discurso que conduz ao consumo, poderíamos “diagnosticá-lo” com o termo publicidade? Quanto a esta, podemos afirmá-la como um dispositivo pedagógico do consumo? Sobre esse assunto, Lipovetsky (2007LIPOVETSKY, Gilles. A felicidade paradoxal: ensaio sobre a sociedade de hiperconsumo. São Paulo: Companhia das Letras , 2007., p. 174) afirma que “instigando os desejos de consumo, desculpabilizando o gosto pelo gasto, a publicidade teve a ambição de reorganizar completamente os modos de vida tradicionais: criou uma nova cultura cotidiana baseada numa visão mercantilizada da vida”.

Para respondermos a tais questionamentos, é necessário compreendermos o que se entende por publicidade. Este termo é frequentemente utilizado junto ao termo propaganda, podendo assumir o mesmo significado.

Em geral, não se fala em publicidade com relação à comunicação persuasiva de ideias. Neste caso, o termo propaganda é mais adequado, pois inclui objetivos ideológicos, comerciais, etc. O significado do termo publicidade mostra-se mais abrangente no sentido de divulgação, ou seja, tornar público, informar, sem que isso implique necessariamente em persuasão (BARBOSA; RABAÇA, 2001 apud BRANDÃO, 2006BRANDÃO, Eduardo Rangel. Publicidade on-line, ergonomia e usabilidade: o efeito de seis tipos de banner no processo humano de visualização do formato do anúncio na tela do computador e de lembrança da sua mensagem. Rio de Janeiro: PUC, 2006., p. 54).

Para Silva (1976 apud BRANDÃO, 2006BRANDÃO, Eduardo Rangel. Publicidade on-line, ergonomia e usabilidade: o efeito de seis tipos de banner no processo humano de visualização do formato do anúncio na tela do computador e de lembrança da sua mensagem. Rio de Janeiro: PUC, 2006., p. 55), “embora usados na prática como sinônimos, os termos publicidade e propaganda não significam rigorosamente a mesma coisa”. Há uma distinção na origem dos termos: propaganda assumia o sentido de propagação da fé católica e, posteriormente, adquiriu significado político. No século XX, “tornou-se um vocábulo indesejável, devido aos abusos da propaganda nazifascista e seus processos de violentar a consciência das massas” (SILVA, 1976 apud BRANDÃO, 2006BRANDÃO, Eduardo Rangel. Publicidade on-line, ergonomia e usabilidade: o efeito de seis tipos de banner no processo humano de visualização do formato do anúncio na tela do computador e de lembrança da sua mensagem. Rio de Janeiro: PUC, 2006., p. 55).

Publicidade possuía um sentido jurídico no início, mas no século XIX passou a designar um sentido comercial. “Dada a origem eclesiástica da palavra propaganda (ato de propagar a fé) e o sentido político indesejável que tomou posteriormente, preferiu-se durante muitos anos a utilização do vocábulo publicidade” (SILVA, 1976 apudBRANDÃO, 2006BRANDÃO, Eduardo Rangel. Publicidade on-line, ergonomia e usabilidade: o efeito de seis tipos de banner no processo humano de visualização do formato do anúncio na tela do computador e de lembrança da sua mensagem. Rio de Janeiro: PUC, 2006., p. 55):

A partir da década de 1960, o termo “propaganda” conquistou terreno e hoje confunde-se em alguns casos com “publicidade”. Em linhas gerais, “propaganda” compreende a intenção de implantar, incutir uma ideia, uma crença na mente alheia, ou seja, são as atividades que tendem a influenciar o cidadão, com objetivo comercial, religioso ou político-social.

Publicidade, segundo Brandão (2006BRANDÃO, Eduardo Rangel. Publicidade on-line, ergonomia e usabilidade: o efeito de seis tipos de banner no processo humano de visualização do formato do anúncio na tela do computador e de lembrança da sua mensagem. Rio de Janeiro: PUC, 2006., p. 55), “significa divulgar, tornar público, ou seja, é a arte de despertar no público o desejo de compra, levando-o à ação”. A propaganda, por sua vez, é definida pelo Código de Ética dos Profissionais da Propaganda (1957CÓDIGO de ética dos profissionais da propaganda. Outubro de 1957. Disponível em: Disponível em: http://www.secom.gov.br/acesso-a-informacao/institucional/legislacao/arquivo-de-outros-documentos/codigo-de-etica-profissionais-da-propaganda.pdf/view . Acesso em: 10 out. 2016.
http://www.secom.gov.br/acesso-a-informa...
, p. 1) como “a técnica de criar opinião pública favorável a um determinado produto, serviço, instituição ou ideia, visando a orientar o comportamento humano das massas num determinado sentido”. Se analisarmos esta última definição, podemos relacioná-la ao que Habermas denominou o princípio da publicidade. Segundo esse princípio, “as opiniões pessoais de pessoas particulares podem transformar-se numa opinião pública através do debate racional crítico de um público de cidadãos que esteja aberto a todos e livre de dominação” (THOMPSON, 1995THOMPSON, John B. Ideologia e cultura moderna: teoria social crítica na era dos meios de comunicação de massa. 4. ed. Petrópolis, RJ: Vozes , 1995., p. 147).

A propaganda, então, preserva a característica da esfera pública de manter um consenso, porém não a partir de um debate racional crítico, mas a partir de uma lógica mercadológica. Seria, no entanto, um engano afirmar que a propaganda é arbitrária e oposta ao ideal democrático da esfera pública, pois “a publicidade exalta apenas o que é consenso”. Quanto mais a comunicação se pretende criativa e social, mais põe em cena sistemas referenciais que ela não constituiu propriamente, já consagrados pelo corpo social” (LIPOVETSKY, 2007LIPOVETSKY, Gilles. A felicidade paradoxal: ensaio sobre a sociedade de hiperconsumo. São Paulo: Companhia das Letras , 2007., p. 182).

Para Aguiar (2003AGUIAR, Adriano Amaral de. Entre as ciências da vida e a medicalização da existência: uma cartografia da psiquiatria contemporânea. Estados Gerais da Psicanálise: Segundo Encontro Mundial, Rio de Janeiro, 2003. Disponível em: Disponível em: http://egp.dreamhosters.com/encontros/mundial_rj/download/2d_Aguiar_47130903_port.pdf . Acesso em: 10 nov. 2016.
http://egp.dreamhosters.com/encontros/mu...
, p. 11), a maneira como a pessoa “apresentará seus sintomas ao médico será como aprendeu nas revistas semanais e nos programas de televisão, que ensinam os sintomas da depressão”. Estão abertas, portanto, as portas para a automedicação e o autodiagnóstico. Porém, “contrariamente às aparências, a publicidade adapta-se mais à sensibilidade social do que impõe novos caminhos” (LIPOVETSKY, 2007LIPOVETSKY, Gilles. A felicidade paradoxal: ensaio sobre a sociedade de hiperconsumo. São Paulo: Companhia das Letras , 2007., p. 183). Sendo assim, podemos afirmar que a medicalização é uma resposta à demanda do turboconsumidor em vez de uma realidade criada pela publicidade: “a medicalização do existencial é menos a resposta à ditadura do desempenho que o efeito do poder do imaginário do bem-estar e da qualidade de vida, englobando daí em diante o campo psíquico” (LIPOVETSKY, 2007LIPOVETSKY, Gilles. A felicidade paradoxal: ensaio sobre a sociedade de hiperconsumo. São Paulo: Companhia das Letras , 2007., p. 290).

O psiquiatra entrevistado afirma que a recomendação ‘boca-a-boca’ no Brasil é forte. O paciente que vai ao consultório supondo ter determinada condição médica e qual prescrição medicamentosa pode receber, “não é alguém entendido nas questões médicas e farmacológicas, mas é influenciado por alguma fonte que geralmente não é uma fonte médica imparcial e crítica, mas um familiar, vizinho, programa televisivo ou uma pesquisa na internet”.

Os termos publicidade e propaganda, como sinônimos de comunicação, podem ser compreendidos num sentido mais abrangente. De igual modo, os termos transmitir e anunciar podem ser sinônimos de comunicar e publicar. Segundo Hohlfeldt, Martino e França (2001HOHLFELDT, Antonio; MARTINO, Luiz C.; FRANÇA, Vera Veiga. Teorias da comunicação: conceitos, escolas e tendências. Petrópolis, RJ: Vozes, 2001., p. 15-16), as palavras transmitir e anunciar são expressões variantes ou usos figurados de um sentido primordial e mais geral que exprime relação. Esses termos estão de acordo com a etimologia do termo comunicação.

Para o CONAR (2021/2022)CONAR. Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária. Edição 2020/2021. Disponível em: Disponível em: http://www.conar.org.br/codigo/codigo.php . Acesso em: 10 out. 2016.
http://www.conar.org.br/codigo/codigo.ph...
, a propaganda deve ter patrocinador identificado e deve ser ostensiva, ou seja, deve ser percebida como propaganda. A ANVISA (2008, p. 4) faz regulamentações semelhantes:

Fica vedado utilizar técnicas de comunicação que permitam a veiculação de imagem e/ou menção de qualquer substância ativa ou marca de medicamentos, de forma não declaradamente publicitária, de maneira direta ou indireta, em espaços editoriais na televisão; contexto cênico de telenovelas; espetáculos teatrais; filmes; mensagens ou programas radiofônicos; entre outros tipos de mídia eletrônica ou impressa.

O Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária (CONAR, 2021/2022CONAR. Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária. Edição 2020/2021. Disponível em: Disponível em: http://www.conar.org.br/codigo/codigo.php . Acesso em: 10 out. 2016.
http://www.conar.org.br/codigo/codigo.ph...
, p. 41), na súmula nº 2, de 15 de agosto de 1988, define que o produto farmacêutico que só pode ser comercializado mediante prescrição médica “não poderá ser anunciado em veículo de comunicação de massa e sua divulgação poderá ser imediatamente sustada”.

A respeito disso, o psiquiatra entrevistado afirma que há um cuidado em proibir a propaganda de medicamentos tarja preta, por exemplo, porque estes podem causar dependência física e uso abusivo. Ele questiona até mesmo se deveria ser produzida a propaganda de medicamentos isentos de prescrição como Doril, pois “essa propaganda pode não ser pertinente, visto que, no Brasil, a automedicação acontece com facilidade”.

Essas informações veiculadas em revistas e programas de televisão, porém, podem ser classificadas como publicidade, apenas com o objetivo de informar, ou como propaganda, com o objetivo de comercializar? O artigo 5º da Resolução de Diretoria Colegiada nº 96 (ANVISA, 2008ANVISA. Ministério da Saúde. Resolução de Diretoria Colegiada, nº 96, de 17 de dezembro de 2008. Dispõe sobre a propaganda, publicidade, informação e outras práticas cujo objetivo seja a divulgação ou promoção comercial de medicamentos. Disponível em: Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/anvisa/2008/rdc0096_17_12_2008.html . Acesso em: 31 out. 2016.
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegi...
, p. 4-5) regulamenta que as empresas de medicamentos “não podem oferecer [...] brindes, benefícios e vantagens aos profissionais prescritores [...], aos que exerçam atividade de venda direta ao consumidor, bem como ao público em geral”. Não abrangem, porém, “brindes institucionais [...] que não veiculem propaganda de medicamentos, artigos científicos, livros técnicos publicados, revistas científicas e publicações utilizadas para atualização profissional” (ANVISA, 2008ANVISA. Ministério da Saúde. Resolução de Diretoria Colegiada, nº 96, de 17 de dezembro de 2008. Dispõe sobre a propaganda, publicidade, informação e outras práticas cujo objetivo seja a divulgação ou promoção comercial de medicamentos. Disponível em: Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/anvisa/2008/rdc0096_17_12_2008.html . Acesso em: 31 out. 2016.
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, p. 4-5).

Segundo os artigos 27 e 32 (ANVISA, 2008ANVISA. Ministério da Saúde. Resolução de Diretoria Colegiada, nº 96, de 17 de dezembro de 2008. Dispõe sobre a propaganda, publicidade, informação e outras práticas cujo objetivo seja a divulgação ou promoção comercial de medicamentos. Disponível em: Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/anvisa/2008/rdc0096_17_12_2008.html . Acesso em: 31 out. 2016.
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegi...
, p. 10/12), a propaganda de medicamentos de venda sob prescrição e controle especial é “restrita aos meios de comunicação”, como revistas de conteúdo técnico, “destinados exclusivamente aos profissionais de saúde habilitados a prescrever ou dispensar tais produtos”. Segundo o artigo 33 (ANVISA, 2008ANVISA. Ministério da Saúde. Resolução de Diretoria Colegiada, nº 96, de 17 de dezembro de 2008. Dispõe sobre a propaganda, publicidade, informação e outras práticas cujo objetivo seja a divulgação ou promoção comercial de medicamentos. Disponível em: Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/anvisa/2008/rdc0096_17_12_2008.html . Acesso em: 31 out. 2016.
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegi...
, p. 12), “a distribuição de amostras grátis de medicamentos somente pode ser feita pelas empresas aos profissionais prescritores em ambulatórios, hospitais, consultórios médicos e odontológicos”. E para o artigo 35, “as embalagens secundárias das amostras grátis não podem veicular designações, símbolos, figuras, imagens, desenhos, slogans e quaisquer argumentos de cunho publicitário, exceto quando aprovado pela Anvisa” (ANVISA, 2008ANVISA. Ministério da Saúde. Resolução de Diretoria Colegiada, nº 96, de 17 de dezembro de 2008. Dispõe sobre a propaganda, publicidade, informação e outras práticas cujo objetivo seja a divulgação ou promoção comercial de medicamentos. Disponível em: Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/anvisa/2008/rdc0096_17_12_2008.html . Acesso em: 31 out. 2016.
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegi...
, p. 12).

Para o psiquiatra entrevistado, as propagandas acontecem através de material distribuído aos médicos, como amostras grátis de medicamentos e material teórico científico no local de trabalho e nos grandes eventos médicos em forma de simpósios, congressos e jornadas. Para o entrevistado, “esse propagandista pode apresentar um novo remédio, mas cabe ao médico prescrevê-lo ou não, além do cuidado e do senso crítico de que o discurso do representante não é necessariamente uma verdade do que acontece na prática”. O médico deve saber que o propagandista presta um serviço ao laboratório. Segundo o psiquiatra, as amostras grátis incentivam a preferência de um medicamento em detrimento de outro devido a sua maior acessibilidade.

Na regulamentação contida no artigo 42 (ANVISA, 2008ANVISA. Ministério da Saúde. Resolução de Diretoria Colegiada, nº 96, de 17 de dezembro de 2008. Dispõe sobre a propaganda, publicidade, informação e outras práticas cujo objetivo seja a divulgação ou promoção comercial de medicamentos. Disponível em: Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/anvisa/2008/rdc0096_17_12_2008.html . Acesso em: 31 out. 2016.
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegi...
, p. 14), “qualquer apoio ou patrocínio [...] aos profissionais de saúde para participação em eventos científicos [...] não deve estar condicionado à propaganda ou publicidade de algum tipo de medicamento”. Para o artigo 43 (ANVISA, 2008ANVISA. Ministério da Saúde. Resolução de Diretoria Colegiada, nº 96, de 17 de dezembro de 2008. Dispõe sobre a propaganda, publicidade, informação e outras práticas cujo objetivo seja a divulgação ou promoção comercial de medicamentos. Disponível em: Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/anvisa/2008/rdc0096_17_12_2008.html . Acesso em: 31 out. 2016.
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegi...
, p. 14), a Anvisa deve ser informada caso algum evento científico permita a propaganda ou a publicidade de medicamentos.

Uma das hipóteses que levantamos aqui é a de que a publicidade de medicamentos que precisam de prescrição funciona em forma de propaganda indireta e não ostensiva. O artigo 44 parece considerar essa possibilidade ao regulamentar a divulgação de campanhas sociais:

A divulgação de campanha social deve ter como único objetivo informar ações de responsabilidade social da empresa, não podendo haver menção a nomes de medicamentos, nem publicidade destes produtos, da mesma forma que nenhuma propaganda ou publicidade de medicamentos pode se referir às ações de campanhas sociais da empresa (ANVISA, 2008ANVISA. Ministério da Saúde. Resolução de Diretoria Colegiada, nº 96, de 17 de dezembro de 2008. Dispõe sobre a propaganda, publicidade, informação e outras práticas cujo objetivo seja a divulgação ou promoção comercial de medicamentos. Disponível em: Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/anvisa/2008/rdc0096_17_12_2008.html . Acesso em: 31 out. 2016.
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegi...
, p.14).

Se notarmos que a propaganda de medicamentos de venda sob prescrição é hiperregulamentada, podemos afirmar que ela não exerce uma função medicalizante? Essa poderia ser uma resposta plausível, pois este tipo de propaganda é permitido apenas para os profissionais prescritores, enquanto os consumidores não estabelecem contato com ela, não sendo orientados a consumir medicamentos por este dispositivo.

Devemos, então, investigar se há outras formas de propaganda medicalizante. Podemos, por exemplo, considerar como propaganda indireta o ato de propagar tratamentos medicamentosos do sofrimento psíquico por meio de jornais, programas de tv, revistas, blogs e outros meios de comunicação. O financiamento do site da Associação Brasileira de Déficit de Atenção por laboratórios de medicamentos é um exemplo de publicidade medicalizante:

On the website of the Association is stated that it is sponsored, among other institutions, professional associations, federations and national and international companies, by the Novartis and Shire Pharmaceuticals, besides the annuity paid by the members. In the website of the Association, they explain what ADHD is, its causes, diagnosis and treatment, as well as to provide advice for family members and patients, and disseminate activities and considerations of professionals working in this field. Among other actions, the Association provides training to health and education professionals about ADHD2 2 No site da Associação afirma-se que ele é patrocinado, entre outras instituições, associações profissionais, federações e companhias nacionais e internacionais, pela Novartis e Shire Pharmaceuticals, além da anuidade paga pelos membros. No site da Associação, explicam o que é o TDAH, suas causas, diagnóstico e tratamento, bem como aconselhamento aos familiares e pacientes, e divulgam as atividades e considerações dos profissionais que atuam neste campo. Entre outras ações, a Associação oferece treinamento para profissionais da saúde e da educação sobre o TDAH. Tradução nossa. (BIANCHI et al., 2016BIANCHI, Eugenia et al. Medicalization beyond physicians: pharmaceutical marketing on attention deficit and hyperactivity disorder in Argentina and Brazil (1998-2014). Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 25, n. 2, p. 452-462, 2016. https://doi.org/10.1590/S0104-12902016153981
https://doi.org/10.1590/S0104-1290201615...
, p. 458).

Podemos, então, supor que a publicidade, ao desembocar em vendas, considerando o aumento do consumo de medicamentos, se assemelha a uma espécie de propaganda indireta, principalmente porque essa “publicidade”, no caso do TDAH, é patrocinada por laboratórios. A afirmação de Kotler (1988KOTLER, Philip. Marketing: edição compacta. São Paulo: Atlas, 1988., p. 400) sobre publicidade corrobora o que estamos a pesquisar:

Os artigos de jornais e as reportagens parecem aos leitores relatos autênticos, originados das pesquisas da própria mídia. Portanto, os leitores provavelmente considerarão os artigos de jornais sobre produtos e empresas como tendo um grau mais alto de veracidade do que se aparecessem patrocinados por um vendedor.

Ainda a respeito das funções da publicidade, Kotler (1988KOTLER, Philip. Marketing: edição compacta. São Paulo: Atlas, 1988., p. 400) afirma que ela “pode atingir muitos compradores em potencial que, de outra forma, evitam os vendedores e as propagandas. Isto acontece porque a mensagem está embalada de tal maneira que o atinge como uma notícia, em vez de uma comunicação direta de vendas”.

Se o comum entre publicidade e propaganda é o ato de informar, e o que as diferencia, segundo Kotler (1988KOTLER, Philip. Marketing: edição compacta. São Paulo: Atlas, 1988.), é que a primeira não possui patrocinador e a segunda possui um patrocinador identificado, podemos afirmar que o que ocorre na sociedade é a publicidade, ou a propaganda indireta, corroborar a medicalização do sofrimento psíquico.

“O marketing moderno exige, mais do que desenvolver um bom produto, determinar corretamente seu preço e torná-lo facilmente acessível ao cliente. A empresa que quer mais do que apenas vendas eventuais deve desenvolver um programa eficaz de comunicação” (KOTLER, 1988KOTLER, Philip. Marketing: edição compacta. São Paulo: Atlas, 1988., p. 380). Se a comunicação persuasiva é uma estratégia de vendas, podemos enxergar na publicidade de medicamentos aspectos mais profundos do turboconsumismo: a medicalização do sofrimento é apenas uma área, entre tantas outras, de que o hiperconsumo se apropriou. Diante da afirmação de que “o tempo que chega é o da hipermercadoria medicalizada” (LIPOVETSKY, 2007LIPOVETSKY, Gilles. A felicidade paradoxal: ensaio sobre a sociedade de hiperconsumo. São Paulo: Companhia das Letras , 2007., p. 54) e de que, na contemporaneidade, “não se consomem mais apenas medicamentos, mas também transmissões, artigos de imprensa para o grande público, páginas da Web, obras de divulgação, guias e enciclopédias médicas” (LIPOVETSKY, 2007LIPOVETSKY, Gilles. A felicidade paradoxal: ensaio sobre a sociedade de hiperconsumo. São Paulo: Companhia das Letras , 2007., p. 53), podemos concluir que, além da mercantilização dos medicamentos, vivemos a era da medicalização do consumo.

Considerações finais

A sociedade de hiperconsumo é aquela na qual residem os valores do hedonismo, do imediatismo, da negação do sofrimento e do bem-estar. É nela que se encontra o hiperconsumidor que busca a felicidade por meio das aquisições materiais, aquele que desfruta de um mundo dito hiperdemocrático (embora, como descrevemos, não esteja acessível a todos, nem mesmo à maioria da população), possível graças à destradicionalização da sociedade. Foi essa a tarefa da publicidade, ao mesmo tempo que propagou o consumismo. A publicidade, porém, não aponta caminhos, mas “exalta apenas o que é consenso”, como afirma Lipovetsky (2007LIPOVETSKY, Gilles. A felicidade paradoxal: ensaio sobre a sociedade de hiperconsumo. São Paulo: Companhia das Letras , 2007., p. 182).

É nessa sociedade, marcada pelo desejo e pela compra-prazer que, paradoxalmente, o sujeito se encontra mais desamparado. A partir da negação do sofrimento e da busca por bem-estar, ele recorre, além de tantas outras mercadorias, ao consumo de medicamentos. Em uma época marcada pela imediaticidade, em que tratamentos longos e que exigem grandes investimentos financeiros e principalmente libidinais são muitas vezes vistos com desconfiança, a medicalização do sofrimento psíquico cresce como um discurso hegemônico da psiquiatria biológica, em que o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais é utilizado como o principal referencial para diagnosticar os pacientes. Ambos, o discurso psiquiátrico e o DSM, unidos à indústria farmacêutica, se configuram como dispositivos do consumo de medicamentos.

A publicidade de medicamentos que precisam de prescrição, apesar de ser regulamentada pelo CONAR e pela ANVISA, exerce um papel importante na medicalização do sofrimento, apresentando-se em formato de propaganda indireta ou de publicidade informativa em veículos de comunicação. O discurso medicalizante difundido pela comunicação, fenômeno que cresce unido ao consumo de medicamentos, pode ser visto como uma estratégia de vendas, uma comunicação persuasiva a serviço da indústria farmacêutica.

Além dos dispositivos mercadológicos como a publicidade, existe a demanda do sujeito por bem-estar e desempenho. A medicalização é, portanto, produto tanto de interesses da indústria farmacêutica como da demanda do consumidor por bem-estar, felicidade e ausência de sofrimento num mundo cada vez mais dominado pela performance. Enquanto permanecerem estes valores, que norteiam a sociedade, dificilmente conseguiremos romper este ciclo de adoecimento da população e de medicalização crescente do sofrimento psíquico.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Dez 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    10 Abr 2017
  • Revisado
    23 Maio 2022
  • Revisado
    20 Jun 2022
  • Aceito
    15 Ago 2022
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