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Repetir, repetir - até ficar diferente: cartografia de um cuidado

Repeat, repeat - until it becomes different: cartography of a health practice

Repetir, repetir - hasta que sea diferente: cartografía de un cuidado

Resumo

Este artigo é produto de uma pesquisa sobre o cuidado em saúde mental em uma Unidade Integrada de Saúde da Família (USF) do município de João Pessoa-PB. Ela ocorreu no segundo semestre de 2015 e utilizou a cartografia como dispositivo para o rastreamento de acontecimentos, afetos e encontros que servissem de analisadores para a produção desse cuidado. Suas micronarrativas foram produzidas através de consultas individuais, reuniões de equipe e visitas domiciliares, que foram debatidas em discussões coletivas e registradas em diários de campo. Sua síntese se dá aqui, na Narrativa em Quatro Atos de um Acontecimento do Cuidado produzido, significado e capturado por todos os envolvidos na pesquisa. Discutem-se, através dela, as potencialidades da atenção básica na Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) e os ainda persistentes equívocos da centralidade do saber-poder psiquiátrico na reprodução de práticas manicomiais. Conclui-se, assim, que a imersão num território afetivo-existencial amplia e enriquece de potencialidades tanto a produção do cuidado quanto a pesquisa em saúde.

Palavras-chave:
saúde mental; atenção primária à saúde; estratégia da saúde da família

Abstract

This article is the product of a research on mental health care in a Family Health Integrated Unit (USF) in the city of João Pessoa-PB. It occurred in the second half of 2015 and used cartography as a device for tracking events, affections and encounters serving as analyzers for the production of this care. Its micronarratives were produced by individual consultations, team meetings and home visits, which were debated on collective discussions and registered in a field diary. Its synthesis is given here, in a Narrative in Four Acts of a Care Occurrence produced, meant and captured by all those involved in the research. It is discussed, through it, the potential of Primary Care in Psychosocial Care Network (RAPS) and the still persistent misconceptions of the centrality of psychiatric knowledge-power in the reproduction of madhouse practices. It is concluded that immersion in an affective-existential territory expands and enriches both the production of care and health research.

Keywords:
mental health; primary health care; family health strategy

Resumen

Este artículo es producto de una investigación sobre la atención a la salud mental en una Unidad Integrada de Salud Familiar (USF) en la ciudad de João Pessoa-PB. Ocurrió en el segundo semestre de 2015 y utilizó la cartografía como dispositivo de seguimiento de eventos, afectos y encuentros que sirvieron de analizadores para la producción de este cuidado. Sus micronarrativas se produjeron a través de consultas individuales, reuniones de equipo y visitas domiciliarias, que se debatieron en discusiones colectivas y se registraron en diarios de campo. Su síntesis tiene lugar aquí, en la Narrativa de Cuatro Actos de un Evento de Cuidado producido, significado y plasmado por todos los involucrados en la investigación. Se discute, a través de él, el potencial de la atención primaria en la Red de Atención Psicosocial (RAPS) y los conceptos erróneos aún persistentes sobre la centralidad del conocimiento-poder psiquiátrico en la reproducción de las prácticas de asilo. Así, se puede ver que la inmersión en un territorio afectivo-existencial expande y enriquece tanto la producción de cuidados como la investigación en salud.

Palabras-clave:
salud mental; atención primaria de salud; estrategia de salud familiar

1. Introdução

O cuidado em saúde mental na atenção básica exige certo deslocamento e um olhar atento dos trabalhadores da saúde (FRANCO; GALAVOTE, 2010FRANCO, Túlio Batista; GALAVOTE, Heletícia Scabelo. Em busca da clínica dos afetos. In: FRANCO, Túlio Batista; RAMOS, Valéria do Carmo (Org.). Semiótica, afecção & cuidado em saúde. São Paulo: Hucitec , 2010.) para a identificação de problemas e o acompanhamento dos sujeitos e de suas necessidades no território. A insegurança de como atuar diante das demandas desse campo e o sentimento de despreparo de alguns trabalhadores (BRASIL, 2013BRASIL. Ministério da Saúde. Cadernos de Atenção Básica: Saúde Mental. Brasília: Ministério da Saúde, 2013a.) por vezes pressionam-lhes a acionar as equipes especializadas na área, como as dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS). No entanto, esse cuidado não deve ser visto como algo de outro mundo ou para além do trabalho cotidiano na Atenção Básica em Saúde (ABS). Pelo contrário, as ações devem ser concebidas na realidade local, considerando a potência do território, o vínculo e a aproximação na vida das pessoas. Essas ações devem ser pensadas e construídas no cotidiano dos encontros entre profissionais e usuários, em que ambos criam novas ferramentas e estratégias para compartilhar e construir, juntos, o cuidado em saúde. De tal modo que as intervenções em saúde mental possam promover novas possibilidades de modificar e qualificar as condições e os modos de vida, orientando-se pela produção de vida e de saúde, e não se restringindo à cura de doenças.

Nesse sentido, o presente artigo visa a compartilhar e discutir os resultados de uma pesquisa de campo em uma Unidade Integrada de Saúde da Família (USF) do município de João Pessoa-PB e seu território adscrito. Partindo de um movimento cartográfico de rastreamento de acontecimentos do cotidiano, ela teve como objetivo analisar a produção do cuidado em saúde mental nos serviços da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS). Segundo Deleuze (2007DELEUZE, Gilles. Lógica do sentido. São Paulo: Perspectiva, 2007.), os acontecimentos são incorporais e só se apreendem na ação. Eles não podem ser representados a priori e são situações que carregam seu sentido no ato de acontecer. Os acontecimentos são singulares. O próprio cuidado é um acontecimento e não um simples ato (MERHY, 2006MERHY, Emerson Elias. O cuidado é um acontecimento e não um ato. In: I FÓRUM NACIONAL DE PSICOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA: CONTRIBUIÇÕES TÉCNICAS E POLÍTICAS PARA AVANÇAR O SUS. Brasília: Conselho Federal de Psicologia, 2006. p. 69-78.).

A pesquisa aqui se organiza a partir da produção de um Acontecimento do Cuidado em saúde mental cuja significação e captura se deram pela interface estabelecida entre o coletivo de pesquisadores: trabalhadores de uma equipe de Saúde da Família (EqSF) dessa USF, estudantes de medicina da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), que cursavam seu internato em Saúde Coletiva na unidade, e duas pesquisadoras locais.

Toda a discussão que será feita se dará através da Narrativa em Quatro Atos desse Acontecimento, que, acredita-se, aponta tanto as potencialidades da Atenção Básica no cuidado em saúde mental, pela possibilidade da inserção dos seus trabalhadores no mesmo território afetivo-existencial dos usuários em sofrimento psíquico, quanto o perigo da centralidade do saber-poder psiquiátrico na reprodução de práticas manicomiais (FOUCAULT, 1995FOUCAULT, Michel. História da loucura na idade clássica. 4. ed. São Paulo: Perspectiva , 1995.).

Enxergam-se essas questões como pistas importantes para o enfrentamento dos desafios contemporâneos lançados pelo processo de Reforma Psiquiátrica. Principalmente os de como ressignificar a loucura e o sofrimento psíquico nas práticas dos serviços de saúde e superar um modelo de cuidado que regula, estigmatiza e institucionaliza todos aqueles que se desviam da norma (AMARANTE, 1995AMARANTE, Paulo. Loucos pela vida: a trajetória da reforma psiquiátrica no Brasil. Rio de Janeiro: Fiocruz, 1995. ).

Esta pesquisa é parte do Observatório Nacional da Produção de Cuidado em diferentes modalidades à luz do processo de implantação das Redes Temáticas de Atenção à Saúde no Sistema Único de Saúde: avalia quem pede, quem faz e quem usa. Em João Pessoa, a referida pesquisa, denominada Rede de Avaliação Compartilhada (RAC), foi desenvolvida por um grupo de pesquisadores do Grupo de Pesquisa Políticas, Educação e Cuidado em Saúde (GPECS) da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), que estuda a produção do cuidado em cinco redes temáticas na cidade, dentre elas a Rede de Atenção Psicossocial, financiado pelo Ministério da Saúde.

2. Política de Pesquisa e de Narratividade

Utilizou-se a cartografia como dispositivo para rastreamento e acompanhamento de acontecimentos, afetos e encontros que servissem de analisadores do processo de produção de cuidado. Ela tem seu fundamento teórico no trabalho conjunto dos filósofos franceses Gilles Deleuze (1925-1995) e Félix Guattari (1930-1992), principalmente no livro Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia (DELEUZE; GUATTARI, 1995DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia. São Paulo: Editora 34, 1995. v. 1). A cartografia também leva em consideração as contribuições brasileiras de Guattari e Rolnik (2008)GUATTARI, Félix; ROLNIK, Suely. Micropolítica: cartografias do desejo. 9. ed. Petrópolis: Vozes , 2008., Rolnik (2014)ROLNIK, Suely. Cartografia sentimental: transformações contemporâneas do desejo. 2. ed. Porto Alegre: Sulina/UFRGS, 2014., Merhy (2002MERHY, Emerson Elias. Saúde: cartografia do trabalho vivo em ato. São Paulo: Hucitec , 2002. ), Fonseca e Kirst (2002) e Passos, Kastrup e Escóssia (2009PASSOS, Eduardo; KASTRUP, Virgínia; ESCÓSSIA, Liliana da. Pistas do método da cartografia: pesquisa-intervenção e produção de subjetividade . Porto Alegre: Sulina , 2009. ).

Para o presente estudo, analisou-se o cuidado em saúde mental produzido pelos membros de uma equipe de Saúde da Família que se percebia como componente da RAPS do município de João Pessoa-PB. A pesquisa se deu de setembro a novembro de 2015, com encontros semanais, no território da USF, entre duas pesquisadoras locais, dois internos de graduação em medicina da UFPB, trabalhadores de saúde e usuários dessa USF.

Os encontros foram registrados em diários de campo, e algumas conversas foram gravadas com a anuência de todos os envolvidos. Todos os procedimentos realizados atenderam às exigências éticas de pesquisa envolvendo seres humanos, sendo a pesquisa previamente aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da UFPB, sob a CAAE 42554815.0.0000.5188, atendendo aos princípios éticos da Resolução 466/13 do Conselho Nacional de Saúde (BRASIL, 2013BRASIL. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde. Comissão Nacional de Ética em Pesquisa. Página 59 da Seção 1 do Diário Oficial da União (DOU) de 13 de junho de 2013. Jusbrasil, 13 jun. 2013b. Disponível em: Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/diarios/55483111/dou-secao-1-13-06-2013-pg-59 . Acesso em: 5 jun. 2016.
https://www.jusbrasil.com.br/diarios/554...
).

A cartografia propõe uma reversão da metodologia científica tradicional ao situar a imersão do pesquisador no território afetivo-existencial do objeto a ser estudado e a receptividade ativa ao seu campo de forças como pressupostos para a elaboração dos objetivos e dispositivos de pesquisa (PASSOS; KASTRUP; ESCÓSSIA, 2009PASSOS, Eduardo; KASTRUP, Virgínia; ESCÓSSIA, Liliana da. Pistas do método da cartografia: pesquisa-intervenção e produção de subjetividade . Porto Alegre: Sulina , 2009. ). Parte-se, assim, do reconhecimento e da valorização do pesquisador in-mundo (ABRAHÃO et al., 2014ABRAHÃO, Ana Lúcia et al. O pesquisador IN-MUNDO e o processo de produção de outras formas de investigação em saúde. In: GOMES, Maria Paula Cerqueira; MERHY, Emerson Elias (Org.). Pesquisadores IN-MUNDO: um estudo da produção do acesso e barreira em saúde mental. Porto Alegre: Rede Unida, 2014. p. 177.), implicado e imerso no seu território de pesquisa, produzindo interferências e sendo interferido a todo momento no processo de produção do conhecimento.

Essa imersão no território se deu através dos dispositivos da Consulta Individual, da Visita Domiciliar e da Reunião de Equipe, que foram sendo articulados pelos próprios trabalhadores da USF. As micronarrativas produzidas a partir deles e das suas afecções foram elaboradas, analisadas e significadas em discussões com todos os atores envolvidos na produção do cuidado. Para Deleuze (2019DELEUZE, Gilles. Cursos sobre Spinoza (Vincennes, 1978-1981). 3. ed. Fortaleza: EdUECE, 2019., p. 44), as afecções segundo o conceito espinoziano são o próprio “estado de um corpo enquanto sofre a ação de um outro corpo”, sendo, portanto, objeto desta análise, esses estados produzidos nos corpos dos trabalhadores nos encontros produzidos no e pelo estudo. Além disso, o trabalho coletivo de processamento do vivido tem esse efeito na produção de afecções. O mesmo foi feito e escrito a muitos corpos, o que, parafraseando Deleuze e Guattari (1995DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia. São Paulo: Editora 34, 1995. v. 1, p. 10), “eram vários”, e que foram “ajudados, aspirados e multiplicados”.

A in-mundização, como será visto, possibilitou tanto o Acontecimento do Cuidado, narrado adiante em Quatro Atos, quanto o seu acompanhamento pelos pesquisadores. Ao ancorar-se numa propriedade da cartografia, que é dissolver as distinções entre observadores e observados, pesquisadores e participantes, envolvendo todos no processo de produção de sentidos e saberes sobre o que se estuda, a presente pesquisa assumiu sua dimensão compartilhada e convocou os trabalhadores de saúde e internos do curso de medicina diretamente envolvidos na produção do acontecimento do cuidado em questão a se tornarem, também, pesquisadores. Tendo sido acolhida tal convocatória, o grupo de pesquisadores, que eram, inicialmente, duas pesquisadoras locais, foi integrado por muitos, que assumiram a autoria compartilhada pelos sentidos produzidos para o vivido.

A “política de narratividade” (PASSOS; BENEVIDES, 2009PASSOS, Eduardo; BENEVIDES, Regina. Por uma política da narratividade. In: PASSOS, Eduardo; KASTRUP, Virgínia; ESCÓSSIA, Líliana da. Pistas do método da cartografia: pesquisa-intervenção e produção de subjetividade . Porto Alegre: Sulina , 2009. p. 150-171., p. 150) adotada para o Acontecimento do Cuidado se inspirou na obra do dramaturgo italiano Carmelo Bene (1937-2002). Nas suas famosas reelaborações das tragédias de Shakespeare (1564-1616), ele suprimia ou amputava elementos dos personagens principais, levando ao surgimento de uma nova trama com protagonismo daqueles que, na peça original, eram secundários. Deleuze (2010DELEUZE, Gilles. Sobre o teatro: um manifesto de menos; o esgotado. Rio de Janeiro: J. Zahar, 2010. ), em seu ensaio “Um manifesto de menos”, entendeu esse processo como a produção de uma nova potencialidade de teatro e a liberação dos devires minoritários e das linhas de fuga, que se encontravam apenas virtuais nas obras do bardo. As linhas de fuga definem a multiplicidade da própria narrativa e “a realidade de um número de dimensões finitas que a multiplicidade preenche efetivamente” (DELEUZE; GUATTARI, 1995DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia. São Paulo: Editora 34, 1995. v. 1, p. 25). Elas são os fios que produzem conexões e arrastam a subjetividade na sua própria produção.

Neste estudo, a produção narrativa busca dar visibilidade para acontecimentos e devires que permitam a produção de sentidos sobre o cuidado em saúde mental. Nos Quatro Atos, busca-se salientar a rede de cuidados e afetos que foi sendo tecida ao longo do Acontecimento do Cuidado, em vez de tentar representar ou elaborar uma análise psicologizante do protagonista. Essa operação beneana se coloca à distância da maioria dos relatos de caso, que, por vezes, são centrados na doença ou no sujeito doente.

Acredita-se que essa aposta possibilita ao leitor a emergência e o acompanhamento de uma paisagem psicossocial à semelhança do procedimento das claquetes das noivinhas, realizado por Rolnik (2014ROLNIK, Suely. Cartografia sentimental: transformações contemporâneas do desejo. 2. ed. Porto Alegre: Sulina/UFRGS, 2014.), no livro Cartografia sentimental. Radicalizando a proposta de Basaglia (2010BASAGLIA, Franco. Escritos selecionados em saúde mental e reforma psiquiátrica. Rio de Janeiro: Garamond, 2010.), coloca-se tanto a doença quanto o doente entre parênteses para emersão e análise das transformações afetivo-existenciais produzidas pelo trabalho em saúde, pelos pesquisadores e pelos próprios movimentos daquele que foi cuidado.

3. Narrativa em Quatro Atos

3.1. Primeiro Ato: O cuidado-que-decalca-mas-cartografa

Cena 1 - Local: Consultório médico da USF. Dispositivo: Consulta Médica. Personagens: Médico-de-família e Senhora-de-60-e-poucos.

Você observa - “olho nu” (ROLNIK, 2014ROLNIK, Suely. Cartografia sentimental: transformações contemporâneas do desejo. 2. ed. Porto Alegre: Sulina/UFRGS, 2014., p. 31) - o final de uma consulta comum, mas sente - “corpo vibrátil”1 1 O corpo vibrátil é aquele que é “tocado pelo invisível”, o que, nos encontros, tem ampliado seu poder de afetar e de se afetado, de se repelir ou de se atrair. Diferente do “corpo nu”, ele é sensível aos afetos (ROLNIK, 2014, p. 31). (ROLNIK, 2014ROLNIK, Suely. Cartografia sentimental: transformações contemporâneas do desejo. 2. ed. Porto Alegre: Sulina/UFRGS, 2014., p. 31) -, junto ao médico, que a Senhora se encontra ainda bastante angustiada, mesmo com as orientações feitas e a prescrição de um analgésico para lombalgia. Parece que ela tem mais alguma coisa para falar, mas hesita. Como ele já a conhece há algum tempo, pergunta: “Você parece tão preocupada, Dona Senhora. Está acontecendo alguma coisa?”. Súbito alívio nas feições dela. “Meu filho, Doutor…”, surpresa, nas feições dele. A Senhora nunca tinha lhe falado do filho. E relata:

Faz sete anos que ele se isolou dos amigos, da escola, da família… Sete anos que ele se trancou no quarto dele e não falou mais com ninguém… Só sai pra pegar o que comer na cozinha e ir pro banheiro. Ele tem vinte e poucos anos… Eu e o Senhor-pai não sabemos mais o que fazer. Ele era uma criança normal, mas agora nem com a gente ele fala, nem toma banho, nem deixa eu entrar no quarto. A porta fica o tempo todo fechada por dentro...

A surpresa se amplifica por todo o corpo do Médico-de-família. Ele nunca tinha ouvido nada parecido. Continua conversando com a Senhora e agenda uma visita domiciliar para compreender melhor a situação.

Cena 2 - Dois meses depois. Local: Casa da Senhora-mãe. Dispositivo: Visita Domiciliar Conjunta. Personagens: Senhora-mãe, Senhor-pai, Menino-do-quarto, Médico-de-família, Agente-Comunitário-de-Saúde (ACS) e Psicóloga-do-Núcleo-de-Apoio-à-Saúde-da-Família (NASF).

Você vê uma varanda cheia de gente e sente o desânimo de todos ao final dessa que foi a terceira visita à casa onde moram a Senhora-mãe, o Senhor-pai e o Menino-do-quarto. Mesmo com a presença da Psicóloga-do-NASF, convidada pelo Médico, ele continuou sem abrir a porta, como das outras duas vezes, e ainda persistiu calado após tentativas de todos que estavam ali. A Psicóloga-do-NASF então sugere a possibilidade de pedir apoio matricial ao Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), responsável pelo território da USF. A Equipe de Saúde acha a ideia interessante, e os Senhores-pais do Menino-do-quarto concordam. “Eles devem ter mais experiências com essas situações e devem nos ajudar muito”, pensa o Médico-de-família.

3.2. Segundo Ato: A psiquiatria-que-decalca-e-só

Cena 1 - Seis meses depois. Local: Casa do Menino-do-quarto. Dispositivo: Visita Domiciliar Conjunta. Personagens: Senhor-pai, Senhora-mãe, Menino-do-quarto, Médico-de-família, Internos-de-medicina, Psiquiatra-do-CAPS, Assistente-Social-do-CAPS e Estagiária-do-CAPS.

A sala de estar da casa do Menino-do-quarto está cheia. Você reconhece alguns rostos, mas outros são novos. Nota que agora todos se voltam para o Psiquiatra-do-CAPS. Ele irá finalmente dar o seu veredito, depois de conversar com os Senhores-pais e observar a “persistência de um olhar fixo do Menino” numas de suas fotos de infância que havia na parede. A Senhora-mãe tentou falar com o Menino através da porta, mas esta se manteve fechada, e aquele calado, mesmo com toda a insistência da mãe. O psiquiatra opina:

Pela faixa etária, a história que vocês contaram e as fotos da sala, provavelmente estamos diante de um quadro de Esquizofrenia Paranoide. O Menino deve ter se trancado todo esse tempo no quarto por causa de um Delírio de Perseguição. Sendo bem objetivo, é preciso que ele passe a usar antipsicóticos para sair dessa condição e voltar a ter uma vida normal.

Os Internos-de-medicina que haviam começado o estágio na USF do Médico-de-família acharam incrível tamanha capacidade diagnóstica diante de tão poucos elementos. “Parece até o Dr. House”, pensaram. O psiquiatra prossegue:

Acho que o único meio para isso, sendo bem pragmático, é, infelizmente, uma internação compulsória [todos os presentes surpreendem-se]. Médico-de-família, você deve escolher um dia nessas semanas para acionar a Polícia Militar (PM) e o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU). Vocês devem arrombar a porta do quarto, caso ele não coopere, e devem conduzi-lo ao Pronto Atendimento em Saúde Mental (PASM) para aplicação das primeiras doses da medicação. Após três dias, que é o tempo máximo de internação no serviço, ele pode ser conduzido de volta para casa e passar a frequentar o nosso CAPS ou ser internado em um Hospital Psiquiátrico. Vai depender da resposta farmacológica e da conduta do psiquiatra de plantão.

Você sente um nó na garganta do Médico e dos Internos-de-medicina. Tudo aquilo era difícil de engolir. O fantasma da internação os assombraria durante todo o fim de semana.

3.3. Terceiro Ato: A pesquisa-que-afeta-e-é-afetada

Cena 1 - Uma semana depois. Local: Sala de espera da USF. Dispositivo: Reunião de Equipe. Personagens: Médico-de-família, Internos-de-medicina, Pesquisadoras Locais e Equipes da USF.

A sala de espera da USF, local da reunião semanal das equipes, está cheia. Dezenas de trabalhadores de saúde, incluindo o Médico, a ACS do Menino-do-quarto e os Internos-de-medicina, assistem à apresentação de um caso em saúde mental de outra equipe. Ele é relatado por uma ACS, um enfermeiro do mesmo CAPS do ato anterior, mas que não estava na visita ao Menino-do-quarto, e duas pesquisadoras locais. Você ouve o relato e junto dele uma discussão sobre Projeto Terapêutico Singular (PTS), Genograma, Família-Guia, Cuidado Territorial. Você percebe como tudo isso afeta o Médico-de-família e os Internos, como eles comparam tudo o que ouvem com tudo aquilo vivenciado na semana passada, e como vai crescendo um nó em suas gargantas. Nó que agora é desfeito quando, numa conversa logo após a reunião, eles compartilham com os apresentadores do caso suas inquietações em busca de alternativas para além da proposta da “internação compulsória” do Menino-do-quarto. As pesquisadoras se afetam com toda a narrativa, como o estudante, o médico de família e o Enfermeiro do CAPS. Todos, juntos, decidem pensar em linhas de fuga. Deixam um pouco de lado a indicação psiquiátrica e planejam uma nova visita para rediscutir e pensar tudo com a Senhora-mãe e o Senhor-pai.

3.4. Quarto Ato: A repetição-que-faz-diferença

Cena 1 - Dois dias depois. Local: Casa do Menino-do-quarto. Dispositivo: Visita Domiciliar Conjunta. Personagens: Senhora-mãe, Senhor-pai, Senhor-tio, Menino-do-quarto, Médico-de-família, Internos-de-medicina, ACS e Psicóloga-do-NASF.

Eu não tenho nenhum problema em receber vocês. Não posso fazer isso agora porque estou há algum tempo sem tomar banho, trocar de roupa e cortar o cabelo. Se vocês pudessem vir aqui outro dia, eu me prepararia e falaria com vocês. Fazer isso agora e nesse estado seria constrangedor para mim.

Parece inacreditável, mas essa era a resposta do Menino-do-quarto à saudação do Médico-de-família e da Psicóloga-do-NASF na visita seguinte à conversa com as pesquisadoras locais. Ninguém parece acreditar naquela voz que vinha da porta fechada, e todos se sentem eletrizados de êxtase. Aquela visita tinha tudo para ser igual a todas as outras. Nada de diferente foi feito, e, no entanto, tudo está diferente. “Menino, que bom ouvir finalmente sua voz! O que você acha de a gente voltar aqui na segunda que vem? Você poderia se preparar até lá, sair do quarto e conversar com a gente. Ia ser muito bom”, convida o Médico. “Posso, sim. Voltem na segunda, que eu me arrumo e a gente conversa. Até lá!”. Todos se despedem e, ainda atônitos, começam a aguardar ansiosos a próxima visita.

Cena 2 - Uma semana depois. Local: Casa da Senhora-mãe. Dispositivo: Visita Domiciliar Conjunta. Personagens: Senhora-mãe, Senhor-pai, Menino-do-quarto, Médico-de-família, Internos-de-medicina, ACS, Psicóloga-do-NASF e Pesquisadoras Locais.

Logo na chegada da equipe, nota-se a felicidade da Senhora-mãe em contar para todos do filho. Depois de sete anos, naquela manhã, ele tinha ido, pela primeira vez, para fora de casa. Foi até o cabeleireiro da esquina cortar o cabelo, como havia prometido à equipe. Ele aparece empolgado, de banho tomado, roupa trocada e cabelo cortado, esperando na sala. Recebe a todos com sorrisos e abraços e passa algumas horas contado sua história de vida, desde como foi achado bebê pela Senhora-mãe, que é sua mãe adotiva, até os dias de hoje. No final, ele diz que quer muito sair daquela situação, do desânimo que o faz se trancar no quarto. Como o diagnóstico psiquiátrico não faz muito sentido, nem ajudava muito agora, a equipe decide deixá-lo um pouco de lado e ir elaborando, pouco a pouco, junto com o Menino, um novo plano terapêutico que vise à construção de projetos de vida para ele. Estabelecem, juntos, objetivos e uma nova visita na próxima semana.

Cena 3 - Um mês depois. Local: Consultório médico da USF. Dispositivo: Consulta Conjunta. Personagens: Menino-do-quarto, Médico-de-família, Internos-de-medicina e Pesquisadoras Locais.

Observa-se o interior do mesmo consultório do Primeiro Ato, só que agora cheio de pessoas, incluindo o Menino-do-quarto. Todos felizes. É a segunda vez que ele vai à USF sozinho. A primeira foi para um atendimento odontológico, uma das primeiras demandas de saúde que impôs. Hoje, veio para reencontrar a equipe que o acompanhou durante todo esse mês, que o viu sair do isolamento do quarto para dar os primeiros passos no mundo de fora e que o visitou durante todas essas semanas. Agora é ele que visita a equipe. A conversa dura um bom tempo, como das outras vezes. Durante seu transcorrer, tanto o Menino quanto a equipe vão percebendo os avanços e que é hora de um novo começo. Aquele que havia se isolado da sua família e da sociedade não necessita de uma tutela (MERHY, 2004MERHY, Emerson Elias. Cuidado com o cuidado em saúde: saiba explorar seus paradoxos para defender a vida: o ato de cuidar é um ato paradoxal: pode aprisionar ou liberar. Campinas [s.n.], 2004. Disponível em: http://www.yumpu.com/pt/document/view/12817362/cuidado-com-o-cuidado-em-saude-saiba-explorar-seus-uff. Acesso em: 5 jun. 2016.
http://www.yumpu.com/pt/document/view/12...
) mais próxima, almeja liberdade e é capaz de autoproduzir sua vida e sentido. Alta do Caso?

4. Discussão

4.1. Atenção Básica, Saúde Mental e Cartografia

A Atenção Básica possibilita a imersão dos trabalhadores de saúde no mesmo território dos usuários dos seus serviços. Isso se deve tanto à adscrição desse território e de sua população a uma única equipe de saúde quanto à longitudinalidade e à continuidade do cuidado advindas dessa adscrição (TAKEDA, 2013TAKEDA, Silvia. A organização de serviços de atenção primária à saúde. In: DUNCAN, Bruce Bartholow et al. (Org.). Medicina ambulatorial: condutas de atenção primária baseadas em evidências. 4. ed. Porto Alegre: Artmed , 2013. p. 19-31.). A ideia de adscrição é estruturante para a Atenção Básica brasileira. Ela delimita uma unidade geográfica e a população a ela vinculada, à qual está ligada uma equipe de saúde da família e pela qual esta equipe passa a ter responsabilidade sanitária. Essa relação é tão potente e criadora que faz com que a própria noção de território transborde, ultrapasse seu sentido puramente geográfico-epidemiológico e ganhe uma dimensão afetivo-existencial. Nela se tece um plano comum (KASTRUP; PASSOS, 2013KASTRUP, Virgínia; PASSOS, Eduardo. Cartografar é traçar um plano comum. Fractal: Revista de Psicologia, Niterói, v. 25, n. 2, p. 263-280, 2013. ) ou espaço intercessor (MERHY, 2006MERHY, Emerson Elias. O cuidado é um acontecimento e não um ato. In: I FÓRUM NACIONAL DE PSICOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA: CONTRIBUIÇÕES TÉCNICAS E POLÍTICAS PARA AVANÇAR O SUS. Brasília: Conselho Federal de Psicologia, 2006. p. 69-78.), uma interface entre usuário-trabalhador-de-saúde, que habilita certa clínica dos afetos (FRANCO; GALAVOTE, 2010FRANCO, Túlio Batista; GALAVOTE, Heletícia Scabelo. Em busca da clínica dos afetos. In: FRANCO, Túlio Batista; RAMOS, Valéria do Carmo (Org.). Semiótica, afecção & cuidado em saúde. São Paulo: Hucitec , 2010.) e que, no caso do Acontecimento do Cuidado, sensibilizou o Médico-de-família à percepção da hesitação da Senhora-mãe no Primeiro Ato.

Para perceber esse movimento, pode-se dividir o dispositivo da Consulta Médica desse Ato em dois momentos. O Primeiro Momento não ficou em foco na Narrativa. Nele, a Senhora apresentou sua queixa inicial (entendida como “lombalgia”), passou pela anamnese e pelo exame físico do Médico e recebeu dele algumas orientações junto à prescrição de um analgésico. Esse momento foi operado através de um raciocínio feito por decalcomania (DELEUZE; GUATTARI, 1995DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia. São Paulo: Editora 34, 1995. v. 1) como a técnica utilizada por artistas que simplesmente transferem de forma mecânica o desenho de uma superfície para outra. O Médico-de-família percebeu e isolou alguns signos (sinais e sintomas), utilizou-os como pontos de ancoragem para o diagnóstico de uma doença/síndrome clínica, e isso o guiou em uma conduta terapêutica à semelhança da transferência de um desenho. Ele apreendeu o corpo da Senhora como “um objeto [..] a ser decifrado, interpretado”, e “procurou ser sensível aos signos da doença” (DELEUZE, 2003DELEUZE, Gilles. Proust e os signos. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2003., p. 5). Assim, ele põe em operação uma clínica centrada no saber biomédico, que dá visibilidade prioritariamente, quando não exclusivamente, ao corpo biológico e a um raciocínio focado no diagnóstico da doença (CUNHA, 2007CUNHA, Gustavo Tenório. A Construção da Clínica Ampliada na Atenção Básica. 2. ed. São Paulo: Hucitec, 2007.).

Para além desses signos patológicos, pouca ou nenhuma atenção foi voltada aos afetos, às alterações da paisagem psicossocial produzidas pelo processo de adoecimento ou pelo dispositivo clínico em si. Isso só passou a ocorrer no Segundo Momento dessa Consulta, o qual teve sua gênese na percepção da hesitação, na sensação, por parte do corpo vibrátil do Médico-de-família, de que algum afeto da Senhora buscava se expressar. A imersão dele no universo dela, pelo vínculo já estabelecido, e a pergunta feita no momento adequado criaram território para isso. Possibilitaram que ele fizesse cartografia (DELEUZE; GUATTARI, 1995DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia. São Paulo: Editora 34, 1995. v. 1), que fosse além-da-clínica-biomédica, além-dos-sinais-e-sintomas, e que, em seu movimento de produção de cuidado, articulasse o compartilhamento, por ela, da história do seu filho, o Menino-do-quarto. Compartilhamento que, até então, dava-se somente entre pouquíssimas pessoas, pelo sofrimento psíquico, pela sensação de impotência e culpa que ele gerava em sua família.

Nessa narrativa, o Menino-do-quarto conseguiu capturar o desejo do Médico-de-família, e esse foi o móvel de todo o Acontecimento que se deu. Em seu devir-revolucionário, ou seja, aquele que resiste ao que está estabelecido e diferenciado (GUATTARI; ROLNIK, 2008GUATTARI, Félix; ROLNIK, Suely. Micropolítica: cartografias do desejo. 9. ed. Petrópolis: Vozes , 2008.), neste caso à psiquiatria, esse desejo buscou mais conexões e agenciamentos (DELEUZE; PARNET, 1998DELEUZE, Gilles; PARNET, Claire. Diálogos. Rio de Janeiro: Escuta, 1998. ): estabeleceu um espaço intercessor (MERHY, 2006MERHY, Emerson Elias. O cuidado é um acontecimento e não um ato. In: I FÓRUM NACIONAL DE PSICOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA: CONTRIBUIÇÕES TÉCNICAS E POLÍTICAS PARA AVANÇAR O SUS. Brasília: Conselho Federal de Psicologia, 2006. p. 69-78.) entre ele e o Menino, produziu sentido e espessura de real (ROLNIK, 2014ROLNIK, Suely. Cartografia sentimental: transformações contemporâneas do desejo. 2. ed. Porto Alegre: Sulina/UFRGS, 2014.) ao silêncio deste, articulou serviços e profissionais de saúde em torno do quarto e potencializou dispositivos de autoprodução de sentido e cuidado. Acima de tudo, fez com que o Médico se responsabilizasse e se mantivesse, como o carrapato (DELEUZE; GUATTARI, 1997DELEUZE, Gilles; GUATTRI, Félix. Devir-intenso, devir-animal, devir imperceptível. Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia . São Paulo: Editora 34 , 1997. v. 4, p. 8-99.) deleuzeano, grudado a todo processo, mostrando-se atento, implicado e comprometido com o cuidado, do Primeiro ao Último Ato e para além dele.

É importante notar que ambos os métodos, decalcomania e cartografia, guardam lugar e utilidade nas valises dos profissionais de saúde e utilizam distintos sentidos e dimensões das suas corporeidades. O primeiro utiliza o que Rolnik (2014ROLNIK, Suely. Cartografia sentimental: transformações contemporâneas do desejo. 2. ed. Porto Alegre: Sulina/UFRGS, 2014., p. 12) denominou olho nu e se agencia com o visível, permitindo a apreensão “do mundo em suas formas para, em seguida, projetar sobre elas as representações”. Já o segundo, conforme essa mesma autora, agencia-se com o invisível e, através do “corpo vibrátil”, apreende a “alteridade em sua condição de campo de forças vivas que afetam e se fazem presentes nos corpos sob a forma de sensações” (ROLNIK, 2014ROLNIK, Suely. Cartografia sentimental: transformações contemporâneas do desejo. 2. ed. Porto Alegre: Sulina/UFRGS, 2014., p. 12). Utilizando as categorias elaboradas por Merhy (2002MERHY, Emerson Elias. Saúde: cartografia do trabalho vivo em ato. São Paulo: Hucitec , 2002. ), quanto mais orientado por tecnologias duras um trabalho em saúde for, maior será o predomínio dos raciocínios por decalcomania, ao passo que, quanto mais orientado por tecnologias leves, maior será a possibilidade de produção de cartografias.

4.2. Psiquiatria, Isolamento e Poder

O Segundo Ato é bem ilustrativo do que pode acontecer quando o corpo da clínica se reduz ao olho nu e é capturado por tecnologias duras. O psiquiatra, à semelhança do Médico no início da consulta, buscou e apreendeu sinais e sintomas psicopatológicos, projetou sobre eles uma doença mental, “Esquizofrenia Paranoide”, e isso o levou à indicação de uma conduta: farmacoterapia antipsicótica. Ao contrário do Médico-cartográfo, seu raciocínio velou, através de um decalque diagnóstico, as potencialidades que a subjetividade do menino guardava. Seu corpo vibrátil não foi a(fe)tivado (ROLNIK, 2014ROLNIK, Suely. Cartografia sentimental: transformações contemporâneas do desejo. 2. ed. Porto Alegre: Sulina/UFRGS, 2014.) por elas ou por nenhum fator, e isso levou à elaboração equivocada de uma única questão: “como garantir a farmacoterapia mesmo sem a cooperação do Menino?”. Questão que levou a uma única resposta “pragmática”: “através da internação compulsória”.

Esse acontecimento ilustra bem o modo operante da psiquiatria tradicional, e pode-se dividi-lo em dois movimentos: o diagnóstico e o terapêutico. O primeiro, diagnóstico, mostra como essa prática é tributária do saber médico e se ampara numa nosografia da doença mental, advinda da sistematização da observação, descrição e classificação dos doentes mentais pelos seus sintomas (FOUCAULT, 1995FOUCAULT, Michel. História da loucura na idade clássica. 4. ed. São Paulo: Perspectiva , 1995.). Há um recorte desses signos, como o “embotamento afetivo”, o “delírio de perseguição” e o “olhar fixo”; por instrumentos “refinados” (tecnologias duras (MERHY, 2002MERHY, Emerson Elias. Saúde: cartografia do trabalho vivo em ato. São Paulo: Hucitec , 2002. ), como a 5ª edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5) (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais - DSM-5. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2014.); em síndromes universais e “desligadas da história” (SAMPAIO, 1998SAMPAIO, José Jackson Coelho. Epidemiologia da imprecisão: processo saúde/doença mental como objeto da epidemiologia. Rio de Janeiro: Fiocruz , 1998.), como a “esquizofrenia paranoide”. Isso acaba levando a uma padronização do que é aceito como normal pela sociedade e a um estreitamento das formas de lidar e de compreender situações existenciais de sofrimento psíquico, como a do Menino-do-quarto (AMARANTE, 1996AMARANTE, Paulo. O homem e a serpente: outras histórias sobre a loucura e a psiquiatria. Rio de Janeiro: Fiocruz , 1996.).

Esse estreitamento leva ao segundo movimento: o terapêutico. Ele é justificado pelo diagnóstico e consiste numa tentativa de restituição da normalidade (DALMOLIN, 2006DALMOLIN, Bernadete Maria. Esperança equilibrista: cartografias de sujeitos em sofrimento psíquico. Rio de Janeiro: Fiocruz , 2006., p. 73). Como a anormalidade é considerada uma disfunção, essa tentativa é feita pela escolha adequada de “um regulador físico (isolamento) e/ou químico (medicamentos)” (DALMOLIN, 2006DALMOLIN, Bernadete Maria. Esperança equilibrista: cartografias de sujeitos em sofrimento psíquico. Rio de Janeiro: Fiocruz , 2006., p. 73). Isso se dá, geralmente, “mesmo que o ‘usuário’ manifeste o desejo de participar ativamente do tratamento e ofereça elementos para o seu próprio processo de reabilitação” (DALMOLIN, 2006DALMOLIN, Bernadete Maria. Esperança equilibrista: cartografias de sujeitos em sofrimento psíquico. Rio de Janeiro: Fiocruz , 2006., p. 73). O velamento do singular e a captura pelo trabalho morto nesse movimento são tão grandes que, no Segundo Ato, vê-se o psiquiatra chegar a sugerir o isolamento (“internação compulsória”) como forma de lidar com o próprio isolamento do Menino-do-quarto, normalizando-o. Herdeira da noção de “periculosidade social”, que nem era o caso, a psiquiatria, nessa cena, não distingue punição e tratamento, o gesto que pune e aquele que trata (BARROS, 1996BARROS, Sônia. O louco, a loucura e a alienação institucional: o ensino de enfermagem psiquiátrica sob judice. Taubaté: Cabral Editora Universitária, 1996.; FOUCAULT, 2015FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. 42. ed. Petrópolis: Vozes, 2015.).

Esses dois movimentos poderiam ter sido questionados ou refratados pelos outros personagens presentes na cena, mas boa parte deles entrou num grau maior ou menor de ressonância com o discurso psiquiátrico. Isso se deu, provavelmente, pelo saber-poder sobre a doença mental que a psiquiatria acumula desde o final do século XVIII, período central da sua estruturação e legitimação (FOUCAULT, 1995FOUCAULT, Michel. História da loucura na idade clássica. 4. ed. São Paulo: Perspectiva , 1995.). Até o restante da equipe do CAPS, serviço pensado como substitutivo ao modelo manicomial e referência em saúde mental, acabou por se afastar da sua proposta de ruptura com a lógica manicomial, e até a reforçou. Houve pouco movimento de escutar, acolher, cuidar, interagir e inserir, e muito de sequestrar, disciplinar, medicalizar e normalizar (AMARANTE, 2003AMARANTE, Paulo. A (clínica) e a reforma psiquiátrica. In: ______. Archivos de Saúde Mental e Atenção Psicossocial. Rio de Janeiro: Nau, 2003. v. 1, p. 45-65.). Não culpabilizando individualmente nenhum profissional por isso, nem o psiquiatra, é importante entender esse processo como uma captura dos dispositivos da RAPS pela maquinaria manicomial. Maquinaria que não se extingue por força de decreto ou somente pelo fechamento dos manicômios e hospitais psiquiátricos, e que só pode ser superada pela articulação de transformações institucionais, técnicas, políticas, jurídicas e sociais (AMARANTE, 2003AMARANTE, Paulo. A (clínica) e a reforma psiquiátrica. In: ______. Archivos de Saúde Mental e Atenção Psicossocial. Rio de Janeiro: Nau, 2003. v. 1, p. 45-65.). Entendendo que, muitas vezes, as práticas institucionais encontram-se presas ao corpo e à alma daqueles que trabalham com a saúde mental (PELBART, 1990PELBART, Peter Pál. Manicômio mental: a outra face da clausura. Saúde & loucura, São Paulo, v. 2, p. 132-40, 1990. ).

4.3. Cuidado, Repetição e Diferença

A validação dos movimentos diagnósticos e terapêuticos do psiquiatra, no Segundo Ato, não foi absoluta para todos os personagens. Ela sofreu certa resistência por parte do Médico e dos Internos-de-medicina, e isso foi o que possibilitou a territorialização de uma linha de fuga, aqui entendida como a própria expressão do vir a ser de suas infinitas multiplicidades. No Terceiro Ato, a potencialidade de um afeto, “nó na garganta”, buscou passagem, mobilizou outros afetos e produziu transformações nas subjetividades. Processo que se deu, também, porque as pesquisadoras locais estavam inseridas num território existencial comum e praticavam uma receptividade ativa, atenção-mor de cartógrafo (KASTRUP, 2009KASTRUP, Virgínia. O funcionamento da atenção no trabalho do cartógrafo. In: PASSOS, Eduardo; KASTRUP, Virgínia; ESCÓSSIA, Liliana da. Pistas do método da cartografia: pesquisa-intervenção e produção de subjetividade. Porto Alegre: Sulina, 2009. p. 32-51.). Essa receptividade possibilitou um encontro, sobretudo de desejos, e, daí, mais uma vez, a capacidade dos corpos de se afetarem e serem afetados foi capaz de tecer uma rede de cuidados ao Menino-do-quarto (MERHY, 2006MERHY, Emerson Elias. O cuidado é um acontecimento e não um ato. In: I FÓRUM NACIONAL DE PSICOLOGIA E SAÚDE PÚBLICA: CONTRIBUIÇÕES TÉCNICAS E POLÍTICAS PARA AVANÇAR O SUS. Brasília: Conselho Federal de Psicologia, 2006. p. 69-78.).

Notou-se que o Médico-de-família e a Equipe de Saúde, incluindo os Internos-de-medicina e a Psicóloga-do-NASF, conseguiram ouvir e dar sentido ao seu silêncio. Conseguiram ir além da porta e “reconhecer que o sofredor psíquico, ainda que vivendo [trancado no quarto], […] apresenta[va] saúde mental e/ou um potencial para ela, desde que não [se utilizassem] […] de métodos de intervenção que [dificultassem] […] ou até [impossibilitassem] […] o seu desenvolvimento, o seu lugar subjetivo singular” (DALMOLIN, 2006DALMOLIN, Bernadete Maria. Esperança equilibrista: cartografias de sujeitos em sofrimento psíquico. Rio de Janeiro: Fiocruz , 2006., p. 64), como a internação compulsória. Isolamento terapêutico que aniquilaria e objetificaria de formal brutal a sua subjetividade (BASAGLIA, 2010BASAGLIA, Franco. Escritos selecionados em saúde mental e reforma psiquiátrica. Rio de Janeiro: Garamond, 2010.; GOFFMAN, 2001GOFFMAN, Erving. Manicômios, prisões e conventos. 7. ed. Rio de Janeiro: Perspectiva, 2001.). Essa postura mais acolhedora e não-intervencionista, aberta para as potencialidades e possibilidades do Menino, trouxe à tona novos caminhos para se evitar o dano que poderia ter sido causado pelas intervenções médicas propostas.

Veem-se esses caminhos vingarem no Quarto Ato, quando o Menino passa a falar pela porta e a participar ativamente do seu processo de cuidado. Ainda acanhado, ele expõe como compreende e lida com a sua situação, e manifesta verbalmente, pela primeira vez, o seu desejo de conhecer a equipe e de conversar com ela. Podem-se apreender, aí, dois aspectos fundamentais: a repetição-que-vinga e a psiquiatria-que-gora.

A repetição-que-vinga se refere às repetidas visitas domiciliares, cerca de seis, que foram necessárias para que uma modificação na paisagem psicossocial produzisse esse ponto de virada na trama. Cada nova visita produzia a diferença, em vez de reproduzir a mesmice, e houve paciência e persistência da equipe, em especial do Médico-de-família, para se perceberem as mudanças que se processavam no nível molecular. Certos versos do cuiabano Manoel de Barros (1916-2014) sintetizam e capturam bem essa questão em linguagem poética: “Repetir repetir - até ficar diferente. Repetir é um dom do estilo” (BARROS, 2013BARROS, Manoel de. Poesia completa. 2. ed. São Paulo: Leya Brasil, 2013., p. 63). “Dom do estilo” que se mostrou também um Dom da Clínica, e mais, Dom do Cuidado.

A psiquiatria-que-gora se refere à falência da psiquiatria tradicional, isolada em si mesma para lidar com o Acontecimento, com o Encontro, com a situação existencial do Menino-do-quarto. Aponta para a sua não compreensão de que as informações, os signos que ele carregava consigo, estavam na realidade mais conectadas à sua própria vida que a um decalque qualquer de Doença Mental (SARACENO, 1999SARACENO, Benedetto. Libertando identidades: da reabilitação psicossocial à cidadania possível. Belo Horizonte/Rio de Janeiro: Instituto Franco Basaglia, 1999.). O diagnóstico e a terapia psiquiátrica não resistiram à primeira palavra vinda do outro lado da porta e desabaram. O autodiscurso do Menino, pessoa em sofrimento mental, foi tão potente que desafiou e produziu rupturas com os vetores da maquinaria manicomial; foi tão potente que produziu vida e sentido, uma dobra de si mesmo, que, junto da equipe, efetuou transformações em todas as dimensões de sua vida.

5. Conclusão

Conclui-se com este trabalho que a imersão num território afetivo-existencial amplia e enriquece de potencialidades tanto a produção do cuidado quanto a pesquisa em saúde. Essa dimensão, muitas vezes negligenciada na Academia e fora dela, tem a capacidade de propiciar encontros, afecções e afetos, e estes podem gerar mudanças significativas nas subjetividades de usuários e trabalhadores dos serviços e até nas suas lógicas e práticas institucionais. Nela, podem residir, inclusive, outras pistas importantes para os enfrentamentos, no cotidiano, das limitações do modelo ainda hegemônico de pensar e produzir saúde em nossa sociedade: o biomédico.

Acredita-se que outros estudos seriam importantes para aprofundar nossa compreensão das duas dimensões da corporeidade, olho nu e corpo vibrátil, utilizadas pelos trabalhadores de saúde em suas práticas. Sobretudo, seria fundamental entender como se dá a encarnação da última, ou a sua des-encarnação, durante todo processo de formação em saúde dentro e fora das instituições de ensino, dos currículos e serviços.

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  • 1
    O corpo vibrátil é aquele que é “tocado pelo invisível”, o que, nos encontros, tem ampliado seu poder de afetar e de se afetado, de se repelir ou de se atrair. Diferente do “corpo nu”, ele é sensível aos afetos (ROLNIK, 2014ROLNIK, Suely. Cartografia sentimental: transformações contemporâneas do desejo. 2. ed. Porto Alegre: Sulina/UFRGS, 2014., p. 31).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Dez 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    27 Jun 2019
  • Revisado
    09 Jul 2021
  • Revisado
    28 Mar 2022
  • Aceito
    03 Maio 2022
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