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ELABORAÇÃO DE ÍNDICE DE ACESSIBILIDADE A PARTIR DA ANÁLISE GEOESPACIAL EM REDE

PREPARACIÓN DE UN INDICE DE ACCESIBILIDAD CON EL APOYO DE ANÁLISIS GEOESPACIAL EN RED

RESUMO

Há o intento, por meio de técnicas de geoprocessamento, de elaborar um índice de acessibilidade e, através do mesmo, avaliar a adequação da rede de transporte público ofertada para as diversas regiões e classes sociais presentes na região metropolitana do Rio de Janeiro (RMRJ). Parte-se da premissa de que há uma segregação socioespacial, dessa forma o índice de acessibilidade proposto tem como objetivo avaliar a qualidade da estrutura de transporte público ofertado no que se refere à conectividade a diferentes localidades e empregos, além da facilidade (ou dificuldade) de acesso a diferentes modos de viagem em transporte público. Os resultados obtidos demonstraram que o sistema de transporte público é ineficiente como instrumento para a superação da segregação socioespacial, pois há uma tendência de indivíduos com menores rendas ocuparem áreas com menor nível do índice de acessibilidade proposto. Tal tendência pode ser explicada pela maior qualidade do transporte público nas regiões centrais e pela valorização de regiões com oferta qualificada de transporte, mesmo em regiões periféricas.

Palavras-chave:
Transporte Público; Acessibilidade; Geoprocessamento

RESUMEN

El objetivo de este estudio es, a través de técnicas de Geoprocesamiento, proponer un índice de accesibilidad y, a través de él, evaluar la adecuación de la red de transporte público ofertada a las distintas regiones y clases sociales presentes en la Región Metropolitana do Río de Janeiro (RMRJ, siglas en portugués). Este estudio partió de la premisa de que existe una segregación socio-espacial, que difícilmente será modificada, por lo que el índice de accesibilidad propuesta tiene como objetivo evaluar la calidad de la estructura de transporte público ofertado con respecto a la conectividad a diferentes lugares y locales de trabajo, además de la facilidad (o dificultad) de acceso a los diferentes modos de transporte en el transporte público. Los resultados obtenidos demuestran que el sistema de transporte público es ineficiente como instrumento para la superación de la segregación socio-espacial, ya que hay una tendencia a que las personas con ingresos más bajos ocupen áreas con niveles más bajos del índice de accesibilidad propuesto. Esta tendencia puede ser explicada por el hecho de que la mayor calidad del transporte público se encuentra en las regiones centrales y por la valorización de regiones con oferta calificada de transporte, incluso en las regiones periféricas.

Palabras clave:
Transporte Público; Accessibilidad; Geoprocessamiento

ABSTRACT

The objective of this study is, by means of geoprocessing techniques, to prepare an accessibility index and use it to evaluate the suitability of the public transport network offered to the various regions and social classes present in the metropolitan area of Rio de Janeiro (RMRJ). This study starts from the premise that there is a socio-spatial segregation, which is unlikely to change. Thus, the proposed accessibility index aims to assess the quality of the public transport structure offered regarding its connectivity to different locations and jobs as well as the ease (or difficulty) of access to different public transport modes. The results indicate that the public transport system i is ineffective as an instrument for overcoming socio-spatial segregation, as there is a tendency for individuals with lower incomes to occupy areas with the lowest level on the proposed accessibility index. This tendency can be explained by the higher quality of public transport in the central regions and the increased value of areas with a better supply of transport, even in peripheral areas.

Keywords:
Public transport; Accessibility; Geoprocessing

INTRODUÇÃO

De acordo Echenique (1975)ECHENIQUE, M. El concepto de sistemas, modelos y teorías en los estudios urbanos. In: ECHENIQUE, M. (Ed.). Modelos matemáticos de la estructura espacial urbana: aplicaciones en América Latina. Buenos Aires: Ediciones Nueva Visión S.A, 1975., a estrutura espacial urbana é o resultado de dois processos interdependentes de alocação de objetos e atividades em determinados locais, processos esses que se dão em tempos diferentes, pois as atividades mudam mais rápido do que os objetos físicos. Portanto, a estrutura espacial urbana compreende a estrutura física e a funcional, as mesmas, ao interagirem mutuamente, originam fluxos e movimentos, permitindo o surgimento de novas estruturas e fazendo do espaço urbano um sistema extremamente dinâmico (FRANÇA, 2004FRANÇA, A. Indicadores de desempenho espacial estudo de caso: a cidade de Cutitibanos - SC. Dissertação (Mestrado em Planejamento Urbano e Regional) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2004.). Desse modo, o transporte tem uma função primordial na organização e estruturação do espaço urbano, sendo uma das variáveis que guiará a alocação de objetos e atividades no mesmo.

A existência ou não de uma rede de transporte de qualidade influencia no modo de apropriação do espaço urbano, sua funcionalidade e quais agentes irão ocupá-lo. Em vista disso, o transporte tem um papel cada vez mais relevante na atribuição de valor ao espaço urbano, já que com a crescente urbanização da população e o crescimento das cidades, a acessibilidade se transformou em um fator importante para a qualidade de vida do cidadão. Nesse contexto, segundo Vasconcellos (1996)VASCONCELLOS, E. A. Transporte Urbano, Espaço e Equidade. Análise das políticas públicas. São Paulo: NetPress. 1996., o crescimento descontrolado das grandes cidades ocasionou uma segregação socioeconômica, de modo que as camadas mais pobres foram deslocadas para as áreas periféricas, caracterizadas, em geral, por menos oportunidades e maiores custos relacionados ao deslocamento, o que significa perda de qualidade de vida para essa parcela da população.

Em cidades de países em desenvolvimento, existe uma relevante desvantagem do acesso aos locais de emprego por grupos de indivíduos de baixa renda. Estas desvantagens são originadas pelo custo da habitação em áreas onde há concentração de empregos ou oferta de acesso qualificado aos mesmos, o que leva indivíduos das classes sociais de baixa renda a ocuparem subúrbios com oferta e qualidade do sistema de transportes inadequadas. As condições de acessibilidade desfavoráveis para locais de trabalho para indivíduos de baixa renda em cidades de países em desenvolvimento são uma consequência de um processo histórico em que a dinâmica do desenvolvimento urbano foi/é moldada por especulações no mercado imobiliário, associadas a políticas públicas de planejamento urbano que não contemplaram a equidade social (SILVA, 2011SILVA, M. A. Estudo da Incorporação da Acessibilidade à Atividade na Análise de Demanda por Viagens Encadeadas. Tese (Doutorado em Engenharia Civil). Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo, São Carlos, 2011.).

É imperativa a necessidade de atenuar tais desigualdades socioespaciais, nesse sentido, Rosa (2006)ROSA, S. Transporte e exclusão social: a mobilidade da população de baixa renda da Região Metropolitana de São Paulo e trem metropolitano. Dissertação (Mestrado Em Engenharia de Transportes) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2006. destaca a importância do transporte público como um dos instrumentos para a superação de tal problemática, facilitando o acesso das classes segregadas a um maior número de ofertas de empregos e a outros serviços/atividades presentes nas áreas mais centrais do espaço urbano. Logo, é necessário também o desenvolvimento de ferramentas que facilitem a avaliação da rede de transporte ofertada e que sirva como diretriz para o seu planejamento.

Um dos modos mais pertinentes para se avaliar a adequação de uma rede de transporte é analisando a acessibilidade que tal rede oferece para as diversas regiões e classes sociais presentes no espaço urbano. De acordo com Goto (2000)GOTO, M. Uma análise de acessibilidade sob a ótica da equidade. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil), Universidade de São Paulo, São Carlos, 2000., o estudo da acessibilidade tem grande importância para o planejamento urbano, pois se trata de um instrumento que permite identificar áreas com desigualdades na oferta de infraestrutura básica de transporte, o que, segundo Vasconcellos (2000)VASCONCELLOS, E. A. Transporte Urbano nos Países em Desenvolvimento: reflexão e propostas. São Paulo: Annablume. 2000., faz com que esse tema de estudo esteja diretamente relacionado com a qualidade de vida dos cidadãos.

Existe uma grande diversidade de conceitos para se definir o que é acessibilidade desenvolvidos por diferentes autores: Hansen (1959)HANSEN, W. How accessibility shapes land use. Journal of the American Institute of Planners, v. 25, n. 2, p. 73-76, 1959.; Ingram (1971)INGRAM, D. The concept of Accessibility. Regional Studies, v. 5, p. 101-107. 1971.; Vieckman (1974)VICKERMAN, R. Accessibility, attraction, and potential: a review of some concepts and their use in determining mobility. In: Environment and Planning A 6, p. 675-691. 1974.; Koeing (1980)KOENIG, J. G. Indicators of urban accessibility: theory and application. Transportation Research, v. 9, n. 2, p. 145-172, 1980.; Gutierrez e Urban (1996)GUTIERREZ, J.; URBAN, P. Accessibility in the European Union: the impact of the trans-European road network. Journal of Transport Geography, v. 4, n. 1, p. 15-25, 1996.; Vasconcellos (1996VASCONCELLOS, E. A. Transporte Urbano, Espaço e Equidade. Análise das políticas públicas. São Paulo: NetPress. 1996.); Almeida e Gonçalves (2002ALMEIDA, L. M. W.; GONÇALVES, M. B. Determinação de índices de acessibilidade a serviços escolares. In: CONGRESSO PANAMERICANO DE ENGENHARIA DE TRÂNSITO E TRANSPORTE, 2002, Gramado, Anais... Gramado: PANANM, 2002.); Kim e Hewings (2003KIM, E.; HEWINGS, G. J. D. An application of integrated transport network: multiregional CGE model II: calibration of network effects of highway. Urbana: University of Illinois at Urbana-Champaingn, 35 p., 2003.); Sanches e Ferreira (2003)SANCHES, S. P.; FERREIRA, M. A. G. Avaliação do padrão de acessibilidade em um sistema de transporte de alunos na Zona Rural. In: CONGRESSO DE PESQUISA E ENSINO EM TRANSPORTES, 17., Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro: ANPET, 2003.; Santos et al. (2004)SANTOS, A. C.; ZANDONADE, E.; CAMPOS, V. B. G. Proposta de um modelo para análise de acessibilidade no transporte de cargas. In: CONGRESSO DE PESQUISA E ENSINO EM TRANSPORTES, 18., Florianópolis. Anais...\Rio de Janeiro: ANPET, 2004. ; Castro (2010). Uma das definições pioneiras para acessibilidade é de Hansen (1959)HANSEN, W. How accessibility shapes land use. Journal of the American Institute of Planners, v. 25, n. 2, p. 73-76, 1959.. Para este autor, acessibilidade é o potencial de oportunidades de interação espacial, ou seja, é uma medida de distribuição espacial das atividades em relação a um ponto, ajustadas à habilidade e desejo das pessoas ou firmas em superar a separação espacial. Ingram (1971)INGRAM, D. The concept of Accessibility. Regional Studies, v. 5, p. 101-107. 1971., por exemplo, define a acessibilidade como característica inerente a um lugar com relação à superação de alguma forma de fricção que se verifica espacialmente. Já Kim e Hewings (2003)KIM, E.; HEWINGS, G. J. D. An application of integrated transport network: multiregional CGE model II: calibration of network effects of highway. Urbana: University of Illinois at Urbana-Champaingn, 35 p., 2003. conceituam acessibilidade como uma facilidade na integração espacial ou no potencial de contato entre as atividades das regiões.

Cada conceito de acessibilidade possui uma diferente direção para como o tema que será estudado e qual objetivo da abordagem em questão. Para o presente estudo, será adotada a definição de Silva (2011)SILVA, M. A. Estudo da Incorporação da Acessibilidade à Atividade na Análise de Demanda por Viagens Encadeadas. Tese (Doutorado em Engenharia Civil). Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo, São Carlos, 2011., no qual a acessibilidade pode ser entendida como a facilidade de movimento entre lugares, de forma que quanto mais o custo da viagem decresce (em termos de custo generalizado da viagem) entre dois locais, cresce a acessibilidade, desde que mantida constante a atratividade local. Ou seja, a acessibilidade é o que mensura a facilidade de acesso dos indivíduos aos locais de empregos, lazer, estudo, equipamentos públicos, entre outros, estando relacionada tanto ao uso do solo como à configuração do sistema de transportes (RAIA JR. et al., 1997RAIA JR., A. A.; SILVA, A.N.R.; BRONDINO, N. C. M. Comparação entre medidas de acessibilidade para aplicação em cidades brasileiras de médio porte. In: PANORAMA NACIONAL DE PESQUISA EM TRANSPORTES 1997, VII ANPET, 1997, Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro: Associação Nacional de Ensino e Pesquisa em Transportes, 1997, p. 541-552.).

A acessibilidade foi ainda dividida em dois conceitos complementares para o presente estudo: acessibilidade aos equipamentos de transportes, que se refere a facilidade de se alcançar equipamentos tais como paradas de ônibus, estações de trem, estações de metrô e etc.; e acessibilidade aos destinos, que se refere a facilidade de se atingir um determinado local ou a diferentes destinos, a partir de uma origem.

Uma forma de se avaliar a acessibilidade é através da sua quantificação por meio de indicadores. Assim como há diversos conceitos, também há uma série de indicadores para mensurar a acessibilidade e diferentes classificações para os mesmos: Lee e Goulias (1997)LEE M. S; GOULIAS, K. G. Accessibility indicators for transportation planning using GIS. In: TRANSPORTATION RESEARCH BOARD ANNUAL MEETING, 76TH, Washington, 1997. dividem os indicadores de acessibilidade em: (i) simples medidas de separação; (ii) medidas do tipo gravitacional; e (iii) medidas isocrônicas. Já Raia Jr. (2000)RAIA JR, A. A. Acessibilidade e mobilidade na estimativa de um índice de potencial de viagens utilizando Redes Neurais Artificiais e Sistemas de Informações Geográficas. Tese (Doutorado em Engenharia Civil) - Universidade de São Paulo, São Carlos, 2000. propõe uma classificação dividida em: (i) indicadores do tipo atributo de redes; (ii) indicadores do tipo separação espacial; (iii) indicadores do tipo quantidade de viagens; (iv) indicadores do tipo oferta do sistema de transporte; (v) indicadores que usam dados agregados que combinam aspectos de transportes e uso do solo; e (vi) indicadores que usam dados desagregados que combinam aspectos de transportes e uso do solo. Geurs e Wee (2004)GEURS, K. T.; WEE, B. Accessibility evaluation of land-use and transport strategies: review and research directions. Journal of Transport Geography, v. 12, n. 2, p. 127-140, 2004. propõem a classificação dos indicadores de acessibilidade em: (i) medidas de infraestrutura; (ii) medidas baseadas no local; (iii) medidas de acessibilidade baseadas no indivíduo; e (iv) medidas baseadas na utilidade. Por fim, Curtis e Scheurer (2010)CURTIS, C.; SCHEURER, J. Planning for sustainable accessibility: developing tools to aid discussion and decision-making. Progress in Planning, l. 74, n. 2, p. 53-106, 2010. sugerem uma classificação da seguinte forma: (i) medidas de separação espacial; (ii) medidas de contorno; (iii) medidas gravitacionais; (iv) medidas de competição; (v) medidas de tempo-espaço; (vi) medidas baseadas na utilidade, e; (vii) medidas de rede.

Dessa maneira, fica evidente que a grande diversidade de indicadores varia de acordo com o objetivo e a abordagem do estudo, Kwan (1998)KWAN, M-P Space time and integral measures of individual accessibility: a comparative analysis using a point-based framework. Geographical Analysis, vl. 30, n. 3, p. 191-216, 1998. escreve que cada proposta para quantificar a acessibilidade abrange apenas uma parte do que representa a mesma. Assim sendo, diferentes medidas de acessibilidade são complementares entre si, fornecendo uma descrição de como os indivíduos se comportam em relação a distribuição espacial das atividades, aos destinos de viagem e as características do sistema de transportes. Essa gama de indicadores podem ser combinados em um índice de acessibilidade, o que, de acordo com Saisana et al. (2005)SAISANA, M. et al. Knowledge Economy Indicators: State-of-the-Art Report on Composite Indicators for the Knowledge-based Economy. Joint Research Centre, European Commission, Ispra: Italia, 2005., torna possível agregar uma maior quantidade de informação em um medida única, de mais fácil interpretação e mais sofisticada. Um índice permite resumir mensurações complexas, ajudando a simplificar questões e classificações, contudo podem resultar em conclusões demasiadamente simplistas, o que torna relevante nunca se perder de vista os indicadores que o originaram.

Sendo assim, o objetivo desse estudo é, por meio de técnicas de geoprocessamento, elaborar um índice de acessibilidade e, através do mesmo, avaliar a adequação da rede de transporte público ofertada para as diversas regiões e classes sociais presentes na Região Metropolitana do estado do Rio de Janeiro. Tal índice visa servir, demandando poucos recursos, como um instrumento para o poder público no planejamento de uma rede de transporte coletivo com o objetivo de superar as desigualdades socioespaciais, dessa forma, buscou-se utilizar uma combinação de indicadores de simples aquisição.

ÁREA DE ESTUDO

O estado do Rio de Janeiro está situado na região Sudeste do Brasil e faz limite com os estados de Espírito Santo, Minas Gerais e São Paulo. A área de estudo é a Região Metropolitana do estado do Rio de Janeiro (RMRJ), seguindo a regionalização do Plano Diretor de Transporte Urbano da Região Metropolitana do Rio de Janeiro - 2012 (PDTU 2012), abrangendo 20 municípios: Belford Roxo, Duque de Caxias, Guapimirim, Itaboraí, Itaguaí, Japeri, Magé, Mangaratiba, Maricá, Mesquita, Nilópolis, Niterói, Nova Iguaçu, Paracambi, Queimados, Rio de Janeiro, São Gonçalo, São João de Meriti, Seropédica e Tanguá (Figura 1).

Figura 1
Região Metropolitana do estado do Rio de Janeiro.

A área de estudo possui uma população de cerca de 11.820.000 de habitantes e uma área de aproximadamente 5.680 km². O processo de ocupação da RMRJ se assemelha ao processo ocorrido nas demais regiões metropolitanas brasileiras: uma expansão horizontal permanente, de baixa densidade e voltada para o transporte rodoviário, onde, na maioria das vezes, a expansão urbana não é acompanhada por uma rede estrutural de transporte público de alta capacidade (BARANDIER, 2012BARANDIER, J. R. Acessibilidade da População Alvo do Programa Habitacional para Baixa Renda na Cidade do Rio de Janeiro. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Transportes) - Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2012.). Na RMRJ, o que se observa, a partir da década de 1980, é uma intensificação do processo de ocupação das periferias e de conurbação urbana, incentivada pelas políticas habitacionais. Os investimentos rodoviários, somados à capilaridade do sistema por ônibus e a crescente frota de automóveis, resultaram em maior espraiamento urbano e na consequente desvinculação do uso do solo à acessibilidade estrutural por modos coletivos de alta capacidade (PDTU, 2012).

Esse processo de expansão urbana, desacompanhado de uma rede estrutural de transporte de alta capacidade e combinado com a valorização do solo urbano pela especulação imobiliária, afetou, principalmente, as classes sociais de baixa renda, que passaram a ser "empurradas" para as regiões periféricas.

Atualmente, a RMRJ possui cinco sistemas básicos de transporte público regulamentados: Metrô, Trem, Barcas, BRTs e Ônibus (Figura 2). A rede de metrô é composta por duas linhas com 35 estações, todas localizadas no município do Rio de Janeiro, e 39 composições com capacidade para até 1.800 passageiros por composição. A rede de trens possui oito ramais diferentes com 99 estações, localizadas em 12 municípios, e 185 trens com capacidade variando de 1.035 a 1.800 passageiros por trem. O sistema das barcas possui 5 estações, localizadas nos municípios de Niterói e Rio de Janeiro, tendo um total de 21 embarcações com a capacidade variando entre 500 a 2.000 passageiros por embarcação. O transporte por BRTs é composto por dois sistemas, ambos atendendo somente o município do Rio de Janeiro. Por fim, o transporte por ônibus é atendido por 1.056 linhas municipais e 604 linhas intermunicipais.

Figura 2
Rede de Transporte Público da RMRJ.

Vale destacar que, desde 2009, o Governo do Estado do Rio de Janeiro implantou um sistema tarifário único que permite a integração intermodal com o pagamento de uma única tarifa em toda RMRJ (PDTU, 2012).

MATERIAIS E MÉTODOS

ELABORAÇÃO DE UM ÍNDICE DE ACESSIBILIDADE

Na elaboração de um índice de acessibilidade a escolha dos indicadores que irão compor tal índice é uma etapa imprescindível. A acessibilidade pode ser facilitada, ou dificultada, por diferentes fatores temporais, espaciais, econômicos ou socioeconômicos (SILVA, 2011SILVA, M. A. Estudo da Incorporação da Acessibilidade à Atividade na Análise de Demanda por Viagens Encadeadas. Tese (Doutorado em Engenharia Civil). Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo, São Carlos, 2011.). Dessa forma, o primeiro passo na escolha dos indicadores utilizados é ter claramente delimitada qual parcela do abrangente conceito de acessibilidade se pretende mensurar.

O presente estudo visa mensurar fundamentalmente a acessibilidade ofertada pela rede de transporte público. Levando em consideração que a segregação socioespacial é um fato consumado na maior parte das regiões metropolitanas brasileiras, se pretende, por meio de um índice de acessibilidade, avaliar a adequação do transporte público em contribuir para a superação dessa segregação. Dessa forma, na elaboração do índice proposto, o fator distância entre localidades diferentes não possuiu relevância, mas sim a conectividade entre esses lugares e o modo como tal conexão é feita.

Em outras palavras, o estudo partiu da premissa de que há uma segregação socioespacial, onde as classes sociais de baixa renda são repelidas para as áreas periféricas. Uma vez que esses indivíduos ocupam as regiões mais periféricas, o índice de acessibilidade proposto tem como objetivo avaliar a qualidade da estrutura de transporte público ofertada para os mesmos no que se refere à conectividade a diferentes localidades e empregos, além da facilidade (ou dificuldade) de acesso a diferentes modos de viagem em transporte público. Então, foi determinado a utilização de três indicadores visando mensurar os seguintes fatores:

  • Cobertura espacial dos diversos modos de viagem em transporte público ofertados;

  • Conectividade a diferentes localidades pelos diversos modos de viagem em transporte público ofertados;

  • Conectividade a postos de emprego pelos diversos modos de viagem em transporte público ofertados;

É importante ressaltar que o índice proposto não abrange fatores econômicos como valor da tarifa, já que o sistema de tarifa única implantado na RMRJ permite diferentes integrações e viagens por um mesmo valor tarifário. Por fim, destaca-se que uma importante premissa na elaboração do índice de acessibilidade é que cada modal de transporte possui um grau de importância em facilitar os deslocamentos de acordo com sua capacidade e velocidade.

Indicador 1 - Oferta e cobertura espacial dos diversos modos de viagem em transporte público ofertados

O primeiro indicador selecionado para compor o índice de acessibilidade proposto visa mensurar a abrangência espacial dos diferentes modos de viagem em transporte público ofertados. Esse indicador parte do princípio de que quanto maior a abrangência espacial dos diferentes modos de viagem sendo ofertados para uma determinada localidade, maior será a facilidade nessa localidade em se alcançar tais modos, logo maior será acessibilidade.

Sendo assim, o cálculo do indicador 1 consiste no somatório dos resultados das multiplicações entre a razão cobertura de cada modo de viagem/área total de um determinado local e o peso atribuído ao respectivo modal:

Equação I

I 1 i = 1 k A cobm A Tot × W m

Onde:

I1: Indicador 1;

Acobm: Área de abrangência de cada modo de viagem em um determinado local;

ATot: Área total do respectivo local;

Wm: Peso atribuído a cada modo de viagem;

k: Número de modos de viagem.

Indicador 2 - Conectividade a diferentes localidades pelos diversos modos de viagem em transporte público ofertados

O segundo indicador selecionado para compor o índice de acessibilidade proposto visa mensurar a conectividade a diferentes localidades ofertada pelos diversos modos de viagem a um determinado local, ou seja, o objetivo é quantificar o número de localidades das quais um local específico está conectado por diferentes modos de viagem. Esse indicador parte do princípio de que, a partir de um determinado local, quanto maior o número de destinos alcançáveis por diferentes modos de viagem, maior será acesso a várias partes da área de estudo, logo maior será a acessibilidade.

Sendo assim, o cálculo do indicador 2 consiste no somatório dos produtos das multiplicações entre os números de destinos alcançáveis por um determinado local através de cada modo de viagem e o peso atribuído ao respectivo modal:

Equação II

I 2 = i = 1 k N d m × W m

Onde:

I2: Indicador 2;

Ndm: Número de destinos alcançáveis por cada modo de viagem a partir de determinado local;

Wm: Peso atribuído a cada modo de viagem;

k: Número de modos de viagem.

Indicador 3 - Conectividade a postos de emprego pelos diversos modos de viagem em transporte público ofertados

O terceiro indicador selecionado para compor o índice de acessibilidade proposto visa mensurar a conectividade a postos de emprego ofertada pelos diversos modos de viagem a um determinado local. Dessa maneira, o objetivo é expressar a quantidade de postos de empregos dos quais um local específico consegue alcançar por meios dos diferentes modos de viagem. Esse indicador parte do princípio de que quanto maior o número de postos de empregos alcançáveis por diferentes modos de viagens, a partir de uma localidade qualquer, maior será a possibilidade dos indivíduos dessa localidade ocuparem esses postos e mais fácil será a sua locomoção até o seu trabalho, logo maior será a acessibilidade.

Sendo assim, o cálculo do indicador 3 consiste no somatório dos produtos das multiplicações entre os postos de trabalho alcançáveis por um local específico por meio de cada modo de viagem e o peso atribuído ao respectivo modo:

Equação III

I 3 = i = 1 k N e m × W m

Onde:

I3: Indicador 3;

Nem: Número de postos de empregos alcançáveis por cada modo de viagem a partir de um local;

Wm: Peso atribuído a cada modo de viagem;

k: Número de modos de viagem.

Peso Atribuído a Cada Modo de Viagem (Wm)

Como já mencionado, uma importante premissa na elaboração do índice de acessibilidade proposto é que cada modal de transporte possui um grau de importância em facilitar os deslocamentos de acordo com sua capacidade e velocidade. Sendo assim, para cada modal foi calculado um peso a ser implementado no cálculo dos indicadores, assim como foi calculado um peso para cada modo de integração entre ônibus e os demais modais.

Para o cálculo do peso referente a cada modal de transporte público, os critérios utilizados para atribuir maior ou menor peso se referem a capacidade e velocidade de cada modal, dessa forma se utilizou a seguinte equação:

Equação IV

W m si = C m C max + V m V max ÷ 2

Onde:

Wmsi: Peso atribuído ao modal (sem integração);

Cm: Capacidade média do modal;

Cmax: Capacidade média do modal de maior capacidade;

Vm: Velocidade média do modal;

Vmax: Velocidade média do modal de maior velocidade.

Para o cálculo do peso referente a cada modo de integração entre ônibus e os demais modais, se utilizou a média aritmética entre o peso atribuído ao modal ônibus e o peso atribuído ao respectivo modal de integração, dessa forma se utilizou a seguinte equação:

Equação V

W M int = W o si + W m si 2

Onde:

Wmint: Peso atribuído ao modo de integração entre ônibus e outro modal;

Wosi: Peso atribuído ao modal ônibus;

Wmsi: Peso atribuído ao modal de integração.

Normalização dos Indicadores

Todos os indicadores foram normalizados com o objetivo de compatibiliza-los e que passem a ter o mesmo intervalo, variando numa escala de 0 a 1. Essa normalização é feita a partir da seguinte equação:

Equação VI

X n = X X min X max X min

Onde:

Xn: Valor normalizado;

X: Valor a ser normalizado;

Xmin: Menor valor do referente indicador;

Xmax: Maior valor do referente indicador.

Composição do Índice

A composição do índice de acessibilidade levou em consideração que a acessibilidade possa ser dividida em dois conceitos complementares, assim como já mencionado anteriormente: acessibilidade aos equipamentos de transportes e acessibilidade aos destinos, sendo que o indicador 1 se refere à primeira e os indicadores 2 e 3 se referem à segunda.

Dessa forma, a composição do índice se deu pelo somatório do produto entre cada indicador e a seu respectivo peso, que foi atribuído considerando que a acessibilidade aos equipamentos de transportes e a acessibilidade aos destinos possuem pesos iguais na composição do índice, portanto ao indicador 1 é atribuído todo o peso referente à primeira e os indicadores 2 e 3 dividem o peso referente à segunda:

Equação VII

IA = I 1 × 0 , 5 + I 2 × 0 , 25 + I 3 × 0 , 25

Onde:

IA: Índice de Acessibilidade;

I1: Indicador 1;

I2: Indicador 2;

I3: Indicador 3.

CÁLCULO DO ÍNDICE DE ACESSIBILIDADE

A metodologia para o cálculo do índice de acessibilidade proposto pode ser dividida em quatro etapas principais: aquisição dos dados; tratamento e processamento dos dados; cálculo dos indicadores; cálculo do índice de acessibilidade (Figura 3). É importante destacar que a unidade espacial padrão utilizada nesse estudo corresponde aos setores censitários do Censo/IBGE 2010.

Figura 3
Fluxograma das etapas principais do cálculo do índice de acessibilidade.

Aquisição dos dados

A proposta do presente estudo é a utilização de dados de fácil aquisição, de forma que o cálculo do índice de acessibilidade não demande grandes recursos. Dessa forma, foram utilizados dados públicos georreferenciados (no formato shapefile) e alfanuméricos (no formato xlsx) disponíveis nas esferas estadual e federal (Tabela 1):

Tabela 1
Dados utilizados no presente estudo

Tratamento e Processamento dos dados

O primeiro passo da etapa de tratamento e processamento dos dados consistiu na conversão dos dados georreferenciados para um mesmo referencial geodésico e sistema de projeção, evitando erros de compatibilização em futuras análises espaciais. Sendo assim, todos os dados georreferenciados foram convertidos para o referencial geodésico SIRGAS 2000 e para o sistema de projeção UTM.

Em um segundo momento, os dados alfanuméricos foram relacionados com seus respectivos dados georreferenciados por meio de um Sistema de Informação Geográfica (SIG). Dessa forma, o shapefile de setores censitários passou a ter como atributo a população e a renda per capita de cada setor, assim como o shapefile das zonas de tráfego passou a ter como atributo os postos de emprego de cada zona.

Por fim, a malha viária e a rede de transporte foram processadas no SIG para gerarem uma rede. Segundo Câmara et al. (2001)CÂMARA, G.; DAVIS.C.; MONTEIRO, A.M.; D'ALGE, J.C. Introdução à Ciência da Geoinformação. São José dos Campos: INPE, 2001., em geoprocessamento, o conceito de rede denota as informações associadas a: serviços de utilidade pública (água, luz e telefone), drenagem (bacias hidrográficas), rodovias e etc. No caso de redes, cada objeto geográfico (ex: cabo telefônico, estação de metrô, cano de água) possui uma localização geográfica exata e está sempre associado a atributos descritivos presentes no banco de dados. As informações gráficas de redes são armazenadas em coordenadas vetoriais, com topologia arco-nó, ou seja, a topologia de redes constitui um grafo, que armazena informações sobre recursos que fluem entre localizações geográficas distintas. Para o presente estudo, a rede foi configurada da seguinte forma (Tabela 2):

Tabela 2
Configuração da rede do presente estudo

Cálculo dos Indicadores

a) Definição da área de abrangência de cada modo de viagem e dos pesos (W_m) utilizados no cálculo dos indicadores

A delimitação da área de abrangência de cada modo de viagem foi realizada por meio de análise em rede e é fundamental no cálculo dos indicadores, pois a abrangência de cada modo estabelece quais áreas são atendidas pelo mesmo. Para os modais BRT, metrô, trem e barcas, considerou-se como limite de abrangência a distância de caminhada de 800 metros, na qual o usuário percorra pelas vias existentes de sua origem até as estações (Figura 4). No caso do modal ônibus, foi considerada a distância máxima de caminhada de 500 metros até os pontos de ônibus, que foram alocados a cada 300 metros ao longo dos itinerários das linhas.

Figura 4
Área de abrangência da estação de metrô Botafogo

A área de abrangência foi importante também para identificar as linhas integrantes de cada modo de integração. Desse modo, as linhas, das quais a área de abrangência de uma estação de um determinado modal a contemplasse, foram consideradas linhas de integração com o mesmo. Além disso, a linha, da qual a área de abrangência contemplasse paradas de ônibus de outra linha, foi considerada integrada a mesma.

Para se definir o peso de cada modal (Wmsi) foi necessário, primeiramente, se definir a capacidade e velocidade média dos mesmos. Tais dados foram determinados de acordo com as informações disponibilizadas pelas concessionárias responsáveis por cada um dos modais, com exceção da velocidade média do modal ônibus, determinada a partir da velocidade média histórica das principais vias da área de estudo segundo o aplicativo Google Maps (entre 7hrs e 9hrs). Desse modo, na tabela 3 são apresentados os dados utilizados e os resultados do cálculo do peso de cada modal de transporte (Wmsi) por meio da equação IV.

Tabela 3
Dados utilizados para o cálculo do peso de cada modal de transporte (Wmsi) e os resultados do mesmo

Uma vez calculado o peso de cada modal de transporte (Wmsi), por meio da equação V foi determinada o peso de cada modo de integração (Wmint) (Tabela 4):

Tabela 4
Peso de cada modo de integração(Wmint)

b) Cálculo Indicador 1

O cálculo da oferta e cobertura espacial dos diversos modos de viagem foi realizado por meio da Equação I, de forma que foi considerada a área de abrangência de cada modo de viagem. Portanto, para um setor censitário qualquer, foi calculado a razão entre cobertura espacial da área de abrangência de cada modo de viagem no setor e a área total do mesmo, os valores resultantes foram multiplicados pelo peso correspondente a cada modo de viagem e tais resultados foram somados. Por fim, o valor gerado foi normalizado para originar o indicador 1.

Exemplificando, o setor 330455705060042 possui as seguintes características: totalmente coberto pela área de abrangência do modal ônibus e por todos modos de integração; é parcialmente coberto pelos modais metrô e trem; e não é coberto pelos modais BRT e barcas. Para esse caso, a memória de cálculo do Indicador 1 para o setor 330455705060042 é vista na tabela 5:

Tabela 5
Memória do cálculo do Indicador 1 para o setor 330455705060042

c) Cálculo Indicador 2

O cálculo da conectividade a diferentes localidades pelos diversos modos de viagem em transporte público foi realizado por meio da Equação II, de forma que também foi considerada a área de abrangência de cada modo de viagem. Foi calculado a quantidade de zonas de tráfego conectados a um determinado setor por cada modo de viagem, esses valores foram multiplicados pelo peso correspondente a cada modo de viagem e tais resultados foram somados. Por fim, os valores resultantes foram normalizados para originar o indicador 2.

Vale destacar que, nesse estudo, um setor censitário e uma zona de tráfego são considerados conectados quando ambos estão inseridos na área de abrangência de um mesmo modal ou modo de integração.

Como exemplo, a tabela 6 demonstra a memória de cálculo do Indicador 2 para o setor 330455705060042:

Tabela 6
Memória do cálculo do Indicador 2 para o setor 330455705060042

d) Cálculo Indicador 3

O cálculo da conectividade a postos de emprego pelos diversos modos de viagem em transporte público foi realizado por meio da Equação III, assim como nos outros indicadores, foi considerada a área de abrangência de cada modo de viagem. Foi calculado a quantidade de postos de emprego conectados a um determinado setor por cada modo de viagem, esses valores foram multiplicados pelo peso correspondente a cada modo de viagem e tais resultados foram somados. Por fim, os valores resultantes foram normalizados para originar o indicador 3.

Vale destacar que, nesse estudo, as quantidades de postos de emprego estão espacialmente distribuídas na forma de zonas de tráfego, ou seja, cada zona de tráfego possui uma quantidade "x" de postos de emprego. Sendo assim, um setor censitário é considerado conectado a uma quantidade "x" de postos de emprego quando o mesmo e a zona de tráfego com "x" postos de emprego estão inseridos na área de abrangência de um mesmo modal ou modo de integração.

Como exemplo, a tabela 7 demonstra a memória de cálculo do Indicador 3 para o setor 330455705060042:

Tabela 7
Memória do cálculo do Indicador 3 para o setor 330455705060042

Cálculo Índice de Acessibilidade

Por fim, por meio da Equação VII, foi calculado o índice de acessibilidade para cada setor censitário da área de estudo. Como exemplo, a tabela 8 demonstra a memória de cálculo do índice para o setor 330455705060042:

Tabela 8
Memória do cálculo do Índice de Acessibilidade para o setor 330455705060042

RESULTADOS

Os resultados obtidos para o indicador 1 mostram que os maiores valores se concentram entorno das estações de trem ou metrô e, principalmente, na porção central da RMRJ. Destaca-se que os principais eixos rodoviários da área de estudo também apresentam resultados superiores a 0,5 para o indicador 1 (Figura 5). Em relação aos resultados obtidos para o indicador 2, os maiores valores se concentram nas áreas atendidas por estações de trem e metrô simultaneamente, principalmente, na porção central do município do Rio de Janeiro. O entorno das demais estações de metrô, trem e barcas apresentam, em sua maioria, resultados superiores a 0,5 para o indicador 2 (Figura 6). Por fim, a análise dos resultados do indicador 3 mostra uma similaridade com os resultados do indicador 2, de forma que os maiores valores também se concentram, principalmente, no entorno das estações de trem ou metrô. Contudo, é relevante destacar que as áreas atendidas por estações das barcas não obtiveram resultados superiores a 0,5 para o indicador 3 (Figura 7).

Figura 5
Mapa dos resultados obtidos para o Indicador 1.

Figura 6
Mapa dos resultados obtidos para o Indicador 2.

Figura 7
Mapa dos resultados obtidos para o Indicador 3.

Os resultados obtidos para o índice de acessibilidade (Figura 8) mostram que os maiores valores estão concentrados na porção central da RMRJ, abrangendo a região central e a zona norte do município do Rio de Janeiro, além da porção sul da Baixada Fluminense, incluindo os municípios de Nilópolis, Mesquita, São João de Meriti e a parte sul de Duque de Caxias. Tal resultado é explicado pela presença de diversos modais de alta capacidade atendendo essa região, principalmente trem e metrô.

Figura 8
Mapa dos resultados obtidos para o Índice de Acessibilidade.

A partir da porção central da RMRJ, há diversos eixos com valores acima de 0,5 seguindo as linhas de trem, metrô e BRT e no entorno dos principais corredores rodoviários.

Como esperado, as áreas atendidas por modais de alta capacidade obtiveram melhores resultados para o índice de acessibilidade e as áreas não atendidas por modais de alta capacidade registraram os piores resultados, dessa forma, municípios do Leste Fluminense, como Tanguá e Maricá, apresentaram uma grande predominância de valores abaixo de 0,25.

A média dos indicadores e do índice de acessibilidade por município reforçam a análise anterior, evidenciando que os municípios do Rio de Janeiro, São João de Meriti, Nilópolis, Mesquita e Duque de Caxias possuem as maiores médias referentes ao índice de acessibilidade. Já os municípios com as menores médias referente ao índice de acessibilidade são Tanguá, Maricá, Itaboraí, Seropédica e Mangaratiba, que são municípios periféricos não atendidos por nenhum modal de alta capacidade (Tabela 9).

Table 9
Average Indicators and Accessibility Index by municipality

A maior parte da população (59%) está inserida em áreas com valores entre 0,5 e 0,75 para o indicador 1, somente 11% da população se localiza em áreas com valores acima de 0,75. No que se refere ao indicador 2 e ao indicador 3, a maior parte da população, 62% e 60% respectivamente, ocupa áreas com valores entre 0,25 e 0,5. Em relação ao índice de acessibilidade, mais da metade da população (51%) está em áreas que registram valores entre 0,5 e 0,75; 33% da população está em áreas com valores de 0,25 e 0,5; 13% da população está em áreas com valores entre 0 e 0,25, e; somente 3% da população está em áreas com valores acima de 0,75 (Figura 9).

Figure 9
Percentage of Population X Range of the indicators value and the Accessibility Index.

Como já mencionado, o presente estudo partiu da premissa de que a segregação socioespacial é um fato consumado na área de estudo, onde as classes sociais de baixa renda são repelidas para as áreas periféricas, e, sendo assim, buscou-se avaliar somente o sistema de transporte público ofertado, independente da distância percorrida. Ainda assim, sem levar em consideração o "grau de expulsão" das classes sociais de baixa renda para áreas periféricas da RMRJ, os resultados dos indicadores e do índice de acessibilidade mostraram que há uma correlação direta entre a renda e a qualidade do sistema de transporte público ofertado.

Na Figura 10, é possível visualizar que quanto maior a renda domiciliar per capita, maior são os valores médios dos indicadores e do próprio índice de acessibilidade. A figura 11 reforça a correlação direta entre a renda e qualidade do sistema de transporte público ofertado ao evidenciar que quanto maior o índice de acessibilidade, maior é a renda domiciliar per capita média na RMRJ.

Figure 10
Indicators and Accessibility Index X Average per capita household income in minimum wage numbers.

Figure 11
Average per capita household income in numbers of minimum wages X Average of the Accessibility Index.

Dessa forma, fica claro que a segregação socioespacial na RMRJ, onde quanto menor a renda, maior a tendência de ocupar as áreas mais periféricas, se repete em relação ao atendimento do sistema de transpor público. Portanto, indivíduos com maior renda tendem a ocupar áreas com um melhor atendimento do transporte público do que indivíduos com rendas inferiores na RMRJ.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo demonstrou que o sistema de transporte público na RMRJ é ineficiente como instrumento para a superação da segregação socioespacial, pois há uma tendência de indivíduos com menores rendas ocuparem áreas com menor nível do índice de acessibilidade proposto. Tal tendência pode ser explicada pela maior qualidade do transporte púbico nas regiões centrais e pela valorização de regiões com oferta qualificada de transporte, mesmo em regiões periféricas.

Uma consequência relevante, porém não abordada no presente trabalho, da heterogeneidade espacial do nível de acessibilidade ofertada pelo sistema de transporte público é a formação de ocupações irregulares na forma de aglomerados subnormais nas áreas mais centrais por parte dos grupos sociais de baixa renda e a maior utilização de automóveis particulares por parte dos grupos sociais de maior poder aquisitivos, tais fatores geram uma série de problemas habitacionais, ambientais e de mobilidade urbana.

A presença de modais de alta capacidade (trem, metrô, barcas e BRT) foi um fator importante para se obter bons resultados nos indicadores e no índice do presente estudo. Dessa maneira, regiões com carência de modais de alta capacidade tenderam a apresentar resultados inferiores, isso pôde ser observado, principalmente, na região Leste Fluminense.

O índice de acessibilidade proposto atendeu bem o objetivo do presente estudo, contudo o mesmo não possui a pretensão de abranger integralmente o extenso significado de acessibilidade, de modo que outros indicadores podem ser considerados para estudos posteriores com diferentes objetivos ou visando um aperfeiçoamento de tal índice. Outro ponto importante é que o índice de acessibilidade pode ganhar uma maior utilidade prática se comparado com dados sobre a demanda por viagens.

É relevante frisar novamente que o índice de acessibilidade proposto visa servir como um instrumento para o poder público no planejamento de um sistema de transporte coletivo demandando poucos recursos, dessa forma, optou-se por utilizar critérios simples para definição de pesos para cada modo de viagem e para cada indicador na composição do índice de acessibilidade. Portanto, recomenda-se um aprofundamento em estudos futuros para a definição de tais pesos de acordo com o objetivo de cada trabalho.

Por fim, as técnicas de geoprocessamento foram fundamentais para viabilizar e agilizar as análises e processamentos demandados nesse estudo, além de permitir a compatibilização de uma grande gama de dados de diferentes fontes.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2017

Histórico

  • Recebido
    04 Mar 2017
  • Aceito
    11 Abr 2017
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