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Identidade, representações e performatividade: palavras, ações e crucificação na Parada Gay em São Paulo

Identity, Representations and Performativity: Words, Actions and Crucifixion in the Gay Pride Parade in São Paulo

RESUMO

É objetivo deste relato de pesquisa investigar e discutir as implicações de comentários hostis e ofensivos de diferentes internautas às formas de representação da encenação da crucificação de Cristo pela modelo Viviany Beleboni na Parada Gay de São Paulo, em junho de 2015. Além dos conceitos relacionados à representação e à identidade, de Hall (2008)HALL, S. Quem precisa de identidade. In: SILVA, T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes, 2008. p. 103-133. e de Woodward (2008)WOODWARD, K. Identidade e diferença: uma introdução teórica e conceitual. In: SILVA, T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes , 2008. p. 7-72., durante a análise dos dados foram mobilizados também os estudos de atos de fala e de performatividade de Austin (1962)AUSTIN, J. L. How to Do Things with Words. Oxford: Oxford University Press, 1962. e Rajagopalan (2012)RAJAGOPALAN, K. Performativity and the Claims of Scientificity of Modern Linguistics. DELTA, São Paulo, v. 28, n. 1, p. 85-103, 2012. Doi: https://doi.org/10.1590/S0102-44502012000100005
https://doi.org/https://doi.org/10.1590/...
. Os resultados desta pesquisa corroboram os pressupostos teóricos utilizados, segundo os quais a linguagem serve para alterar e criar realidades, e não somente para descrevê-la ou representá-la. O presente estudo permitiu também evidenciar como a dicotomização de diferentes aspectos identitários pode beneficiar um grupo em detrimento de outros.

PALAVRAS-CHAVE:
representação; identidade; performatividade

ABSTRACT

The objective of this research report is to investigate and discuss the implications of the hostile and offensive comments of different Internet users and the forms of representation of the staging of the crucifixion of Christ by the model Viviany Beleboni, during the Gay Pride Parade of São Paulo in June of 2015. In addition to the concepts of Hall (2008)HALL, S. Quem precisa de identidade. In: SILVA, T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes, 2008. p. 103-133. and Woodward (2008)WOODWARD, K. Identidade e diferença: uma introdução teórica e conceitual. In: SILVA, T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes , 2008. p. 7-72. related to representation and identity, during the analysis of the data were also mobilized the studies of speech acts and performativity by Austin (1962)AUSTIN, J. L. How to Do Things with Words. Oxford: Oxford University Press, 1962. and Rajagopalan (2012)RAJAGOPALAN, K. Performativity and the Claims of Scientificity of Modern Linguistics. DELTA, São Paulo, v. 28, n. 1, p. 85-103, 2012. Doi: https://doi.org/10.1590/S0102-44502012000100005
https://doi.org/https://doi.org/10.1590/...
. The results of this research corroborate the theoretical assumptions used, according to which language serves to alter and create realities and not only to describe or represent it. This study also provided an understanding about how the dichotomization of different identity aspects can benefit one group over others.

KEYWORDS:
representation; identity; performativity

1 Introdução

Em junho de 2015, ao acessar a internet, muitos de nós nos deparamos com uma série de reportagens e comentários1 1 Para maiores informações sobre o episódio, Cf. a reportagem da Folha de S. Paulo, disponível em: <https://bit.ly/2RLOrgj>. Acesso em: 10 jun. 2015. a respeito da atitude de Viviany Beleboni, uma modelo transexual que desfilou crucificada à imagem e semelhança de Cristo durante a Parada Gay na cidade de São Paulo. Muitas opiniões acerca da encenação eram manifestações de apoio à causa GLBT,2 2 Gays, lésbicas, bissexuais, travestis, transexuais ou transgêneros. principalmente depois de a modelo ter declarado que sua atitude era uma forma de representar as mazelas que assolam a comunidade gay. No entanto, houve, também, inúmeras manifestações de indignação e repúdio contra a atitude da modelo por parte de diversas pessoas, ligadas ou não a segmentos religiosos mais conservadores.

Utilizando a repercussão na mídia, os comentários ofensivos de internautas em relação ao ocorrido e, também, o fato de que as identidades são marcadas pela diferença, sendo que as diferenças marcadas servem para incluir ou excluir e que, por sua vez, elas podem fomentar relações desiguais de poder entre diferentes grupos (WOODWARD, 2008WOODWARD, K. Identidade e diferença: uma introdução teórica e conceitual. In: SILVA, T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes , 2008. p. 7-72.), me propus, neste artigo, a investigar e a discutir as seguintes questões: a) Quais foram as formas de representação utilizadas por internautas para hostilizar e rechaçar a crucificação encenada pela modelo e quais visões de identidades podem estar sendo construídas a partir dessas formas de representação? b) Quais as possíveis implicações e desdobramentos dos diversos comentários e das diferentes formas de representação da modelo transexual no tocante à perpetuação de práticas de discriminação da comunidade GLBT?

Esta pesquisa foi realizada por intermédio de buscas em diferentes sites na internet, com o intuito de averiguar as opiniões dos mais diversos internautas a respeito da encenação da crucificação de Cristo, realizada por Viviany Beleboni na Parada Gay. A partir das opiniões coletadas, foram filtradas diferentes formas de designação e representação tanto referentes à modelo quanto à sua performance durante a referida manifestação. Esses dados serviram de base para as discussões presentes neste estudo.

Esse artigo encontra-se dividido em seis partes, sendo uma delas esta parte introdutória. As próximas duas partes denominadas Identidades, identificações e representação e Atos de fala e performatividade correspondem às teorias que fundamentaram e embasaram a discussão aqui empreendida. A quarta parte, intitulada Considerações sobre o estudo, refere-se às informações acerca dos caminhos metodológicos percorridos durante a realização dessa pesquisa. A quinta parte, Performatividade em ação: as palavras e suas consequências, é destinada à discussão dos dados coletados. A sexta parte, intitulada Mais algumas considerações, é referente às considerações e conclusões possíveis deste trabalho.

2 Identidades, identificações e representação

Este trabalho encontra-se ancorado nas perspectivas identitárias ligadas aos estudos culturais de Silva (2008SILVA, T. A produção social da identidade e da diferença. In: SILVA, T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes , 2008. p. 73-102.) e considera as formas de representação como elementos muito importantes na construção das identidades. Isso porque as identidades estão em “permanente estado de transformação e de ebulição. Elas estão sendo constantemente reconstruídas. Em qualquer momento dado, as identidades estão sendo adaptadas e adequadas às novas circunstâncias que vão surgindo” (RAJAGOPALAN, 2003RAJAGOPALAN, K. Por uma linguística crítica: linguagem, identidade e a questão ética. São Paulo: Parábola , 2003., p. 71). Nessas constantes reconstruções e adequações, os diferentes grupos humanos se utilizam de variadas formas de diferenciação, nomeação, representação e adjetivação para construírem e demarcarem suas diferenças identitárias. Pesquisas a respeito de questões identitárias ligadas à perspectiva dos estudos culturais se justificam, portanto, pois a identidade está vinculada a condições sociais e materiais, e serve para incluir ou excluir grupos dentro de uma sociedade (HALL, 2008HALL, S. Quem precisa de identidade. In: SILVA, T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes, 2008. p. 103-133.; RAJAGOPALAN, 2003RAJAGOPALAN, K. Por uma linguística crítica: linguagem, identidade e a questão ética. São Paulo: Parábola , 2003.; WOODWARD, 2008WOODWARD, K. Identidade e diferença: uma introdução teórica e conceitual. In: SILVA, T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes , 2008. p. 7-72.). Assim, se “um grupo é simbolicamente marcado como o inimigo ou como tabu, isso terá efeitos reais porque o grupo será socialmente excluído e terá desvantagens materiais” (WOODWARD, 2008WOODWARD, K. Identidade e diferença: uma introdução teórica e conceitual. In: SILVA, T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes , 2008. p. 7-72., p. 14).

Cito Coracini (2003CORACINI, M. J. O olhar da ciência e a construção da identidade do professor de língua. In: CORACINI, M. J.; BERTOLDO, E. S. (org.). O desejo da teoria e a contingência da prática: discursos sobre e na sala de aula (língua materna e estrangeira). Campinas: Mercado de Letras, 2003. p. 193-210., p. 194) para conceituar identidade neste estudo por entendermos que sua definição elucida vários aspectos por nós abordados. Segundo a autora, identidade é algo que se constitui no e do confronto de diversos discursos, ela é construída no e pelo olhar do outro (ou outros), ou seja, pela forma como nos vemos representados na e pela sociedade. A identidade é, ainda segundo a autora, algo que não se estabiliza jamais, mas está sempre em movimento e em transformação. Além disso, dada a complexidade do processo identitário, só nos é possível vislumbrar pontos de identificação que emergem pela linguagem, por onde escapam vozes que constituem a subjetividade.

Segundo Hall (2008HALL, S. Quem precisa de identidade. In: SILVA, T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes, 2008. p. 103-133.), as identificações são necessárias para construir pertenças e posicionar as pessoas dentro da sociedade, que, em vez de estabilizar os sujeitos, é desestabilizada por eles. Nesse sentido, as relações entre identificações e traços de identidades, que são sempre provisórias, são construídas, reivindicadas e se prestam ao papel de inserir ou excluir os sujeitos por meio da linguagem. Freitas (2006FREITAS, A. C. As identidades do Brasil: buscando as identificações ou afirmando as diferenças? In: RAJAGOPALAN, K.; FERREIRA, D. M. (org.). Políticas em linguagem: perspectivas identitárias. São Paulo: Editora Mackenzie, 2006. p. 227-253., p. 240) complementa Hall, ao afirmar que há “uma estreita relação entre as questões de representação, marcação da diferença e construção de identidade”. Assim, é pelo viés da linguagem e, por que não dizer, via sistemas de representação que reivindicamos nossas posições na sociedade, nossas identidades e nossos lugares no mundo.

É por entender que a palavra representação é utilizada comumente com diversos sentidos que julgo necessário elucidar seu sentido neste estudo. Destarte, saliento que será utilizado o conceito pós-estruturalista de representação tal qual empregado por Hall (2008HALL, S. Quem precisa de identidade. In: SILVA, T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes, 2008. p. 103-133.), Silva (2008SILVA, T. A produção social da identidade e da diferença. In: SILVA, T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes , 2008. p. 73-102.) e Woodward (2008WOODWARD, K. Identidade e diferença: uma introdução teórica e conceitual. In: SILVA, T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes , 2008. p. 7-72.), dentre outros. Esses autores e teóricos dos Estudos Culturais abandonam a concepção clássica e mentalista de representação, associada a qualquer interioridade psicológica, e a concebem como um sistema de significação que incorpora “todas as características de indeterminação, ambiguidade e instabilidade atribuídas à linguagem” (SILVA, 2008SILVA, T. A produção social da identidade e da diferença. In: SILVA, T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes , 2008. p. 73-102., p. 91). Segundo Silva (2008SILVA, T. A produção social da identidade e da diferença. In: SILVA, T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes , 2008. p. 73-102., p. 91), na perspectiva pós-estruturalista, a representação é, “como qualquer sistema de significação, uma forma de atribuição de sentido. Como tal, a representação é um sistema linguístico e cultural: arbitrário, indeterminado e estreitamente ligado a relações de poder”.

Para Woodward (2008WOODWARD, K. Identidade e diferença: uma introdução teórica e conceitual. In: SILVA, T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes , 2008. p. 7-72., p. 17), a

representação inclui as práticas de significação e os sistemas simbólicos por meio dos quais os significados são produzidos, posicionando-nos como sujeito. É por meio dos significados produzidos pelas representações que damos sentido à nossa experiência e àquilo que somos. Podemos inclusive sugerir que esses sistemas simbólicos tornam possível aquilo que somos e aquilo no qual podemos nos tornar.

Ainda segundo a autora, a representação estabelece identidades individuais e coletivas, sendo que “os sistemas simbólicos nos quais ela se baseia fornecem possíveis respostas às questões: Quem eu sou? O que eu poderia ser? Quem eu quero ser?”. Nesse sentido, “os discursos e os sistemas de representação constroem os lugares a partir dos quais os indivíduos podem se posicionar e a partir dos quais podem falar” (WOODWARD, 2008WOODWARD, K. Identidade e diferença: uma introdução teórica e conceitual. In: SILVA, T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes , 2008. p. 7-72., p. 17). De acordo com a autora também, todas “as práticas de significação que produzem significados envolvem relações de poder, incluindo o poder para definir quem é incluído e quem é excluído” (WOODWARD, 2008WOODWARD, K. Identidade e diferença: uma introdução teórica e conceitual. In: SILVA, T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes , 2008. p. 7-72., p. 18), decorrendo daí também a importância dos estudos envolvendo representações e construções identitárias. Segundo Silva (2008SILVA, T. A produção social da identidade e da diferença. In: SILVA, T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes , 2008. p. 73-102., p. 91), a “identidade e a diferença são estreitamente dependentes da representação. É por meio da representação, assim compreendida, que a identidade e a diferença adquirem sentido”, sendo que é por meio da representação também “que a identidade e a diferença se ligam a sistemas de poder. Quem tem o poder de representar tem o poder de definir e determinar a identidade” (SILVA, 2008SILVA, T. A produção social da identidade e da diferença. In: SILVA, T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes , 2008. p. 73-102., p. 91). E, assim, problematizar a identidade e a diferença significa “questionar os sistemas de representação que lhe dão suporte e sustentação. No centro da crítica da identidade e da diferença está uma crítica das suas formas de representação” (SILVA, 2008SILVA, T. A produção social da identidade e da diferença. In: SILVA, T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes , 2008. p. 73-102., p. 91).

3 Atos de fala e performatividade

Para analisar os dados abarcados neste estudo, considero, também, o caráter eminentemente ético e político da linguagem, defendido pela pragmática atual ou Nova Pragmática (RAJAGOPALAN, 2010RAJAGOPALAN, K. Nova pragmática: fases e feições de um fazer. São Paulo: Parábola, 2010.), e a máxima austiniana de que dizer é fazer (AUSTIN, 1962AUSTIN, J. L. How to Do Things with Words. Oxford: Oxford University Press, 1962.).

John Langshaw Austin foi o filósofo inglês que primeiro pontuou e defendeu a ação enquanto própria e inerente ao uso da linguagem. Segundo sua teoria e seus estudos dos atos de fala, a linguagem não somente descreve a realidade, mas a altera ou é usada para criar outras realidades. Seguindo os desdobramentos de seus postulados sobre atos de fala, Austin (1962)AUSTIN, J. L. How to Do Things with Words. Oxford: Oxford University Press, 1962., em um primeiro momento, distinguiu os enunciados entre dois tipos: os performativos - aqueles que realizam ações porque são ditos - e os enunciados constativos - os que realizam uma afirmação ou falam de algo. Mais tarde, em meio a debates e reformulações, conforme descrito em Rajagopalan (1990RAJAGOPALAN, K. Dos dizeres diversos em torno do fazer. DELTA, São Paulo, v. 6, n. 2, p. 223-254, 1990., p. 237), o próprio Austin admitiu que o tipo de enunciado tido como constativo nada mais era que um performativo mascarado ou implícito, que teve seu prefácio deixado de lado (RAJAGOPALAN, 2004RAJAGOPALAN, K. Resposta aos meus debatedores. In: RAJAGOPALAN, K.; SILVA, F. L. L. (org.). A Linguística que nos faz falhar: investigação crítica. São Paulo: Parábola , 2004. p. 166-231.). Posteriormente o mesmo autor complementa seu raciocínio ao afirmar que

[n]um mundo onde não há mais dúvidas sobre quem é o soberano, todos os enunciados declarativos proferidos por ele adquirem o status de performativos - enunciados que, quando proferidos de forma declarativa ou afirmativa, instauram sua própria verdade no próprio ato de enunciar. (RAJAGOPALAN, 2005RAJAGOPALAN, K. Non-native speaker teachers of English and their anxieties: ingredients for an experiment in action research. In: LLURDA, E. (ed.). Non-Native Language Teachers: Perceptions, Challenges, and Contributions to the Profession. Boston: Springer, 2005. p. 283-303. Doi: https://doi.org/10.1007/0-387-24565-0_15
https://doi.org/https://doi.org/10.1007/...
, p. 123)

Pinto (2012PINTO, J. P. Pragmática. In: MUSSALIN, F.; BENTES, A. C. (org.). Introdução à linguística: domínios e fronteiras. 1. ed. São Paulo: Cortez , 2012. v. 2, p. 47-68., p. 75, grifos do autor) coaduna com as mesmas ideias e salienta que “[d]izer é fazer: a prática social que chamamos linguagem é, para a Pragmática atual, indissociável de suas consequências éticas, sociais, econômicas, culturais”. Isso porque, segundo Rajagopalan (2012RAJAGOPALAN, K. Performativity and the Claims of Scientificity of Modern Linguistics. DELTA, São Paulo, v. 28, n. 1, p. 85-103, 2012. Doi: https://doi.org/10.1590/S0102-44502012000100005
https://doi.org/https://doi.org/10.1590/...
, p. 93, tradução nossa),

por trás de cada proferimento, por trás de cada expressão que consideramos concreta e auto-suficiente por ela mesma, há um sujeito falante que pretende que aquele proferimento signifique certas coisas ou, ao menos, nós acreditamos que ele tenha tais e tais intenções3 3 Tradução livre realizada pela autora, assim como as demais presentes neste. .

A respeito das consequências éticas, sociais, econômicas e culturais indissociáveis do ato de linguagem, cito também Oliveira (2010OLIVEIRA, J. A. A. Pragmática em sala de aula. In: FREITAS, A. C. (org.). Linguística in focus: linguagem e exclusão. Uberlândia: Edufu, 2010. v. 7, p. 215-235., p. 216, grifos nossos), para quem o uso da linguagem deve ser entendido como

uma ação, um comportamento linguístico e não-linguístico performativo (a performatividade é intrínseca à própria linguagem e não algo que se acrescenta a ela). Ao produzirmos um texto oral, escrito ou gestual, fazemos uso de uma linguagem visando criar efeitos em nossos interlocutores, alterar estados de coisas da realidade ou alterar os próprios estados mentais. Trata-se de um ato intencional e político, aqui entendido como uma articulação individual dentro da dinamicidade semiótica social, que objetiva sempre alterar estados do sujeito ou do mundo.

Contando com o apoio dos autores citados, reafirmo a importância dos estudos dos atos de fala no desenvolvimento de pesquisas sobre as questões identitárias e sobre os sistemas de representação. Isso porque, a partir da consideração da linguagem enquanto ação ética e política, o falar não mais pode ser encarado como forma de declarar ou descrever as coisas do mundo, mas como forma de ação, ou seja, forma de intervenção na realidade. A seguir, passo a considerar os caminhos metodológicos que guiaram o desenvolvimento deste estudo.

4 Considerações sobre o estudo

Este é um estudo qualitativo que priorizou o tratamento interpretativista durante as análises e discussões dos dados. Segundo Chizzoti (2003CHIZZOTI, A. Pesquisas em ciências humanas e sociais. 6. ed. São Paulo: Cortez, 2003., p. 79), “a abordagem qualitativa parte do fundamento de que há uma relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito”, além do mais, “o objeto não é um dado inerte e neutro; está possuído de significados e relações que sujeitos concretos criam em suas ações”. Ou seja, a pesquisa qualitativa pressupõe a consideração das relações entre o ser humano, a sociedade e o mundo.

Para Celani (2005CELANI, M. A. A. Questões de ética na pesquisa em Linguística Aplicada. Linguagem e Ensino, Pelotas, v. 8, n. 1, p. 101-122, 2005.), pesquisadores envolvidos no paradigma qualitativo, especialmente os que trabalham com pesquisas de natureza interpretativista, além de se preocuparem com a produção de conhecimento e com a compreensão dos significados, preocupam-se, também, com a qualidade dos dados. Segundo a autora, os paradigmas quantitativo e qualitativo têm aspectos em comum como os que dizem respeito aos valores fundamentais e aos códigos de conduta e, embora os objetivos e os valores fundamentais sejam realizados de maneiras diferentes,

ambos os paradigmas se preocupam com a produção de conhecimento, com a compreensão dos significados, com a qualidade dos dados; ambos os paradigmas têm por valores fundamentais a confiança, a responsabilidade, a veracidade, a qualidade, a honestidade e a respeitabilidade e não a busca da riqueza ou do poder. (CELANI, 2005CELANI, M. A. A. Questões de ética na pesquisa em Linguística Aplicada. Linguagem e Ensino, Pelotas, v. 8, n. 1, p. 101-122, 2005., p. 106)

Devido ao fato de que, em pesquisas qualitativas de natureza interpretativista, a interpretação do pesquisador é de fundamental importância, não há a pretensão de se chegar a algum tipo de generalização de fatos e/ou de comportamentos observados. Ao invés disso, os pesquisadores buscam investigar e compreender um acontecimento específico de maneira aprofundada. Trata-se, portanto, de um tipo de pesquisa que não trabalha com estatísticas, regras e outras generalizações, mas, sim, com interpretações de uma realidade que, por força das circunstâncias, precisou ser recortada e fragmentada.

Conforme os objetivos, descritos anteriormente, foram elaboradas duas perguntas de pesquisa que guiaram as investigações empreendidas neste estudo. São elas: a) Quais foram as formas de representação utilizadas por internautas para hostilizar e rechaçar a crucificação encenada pela modelo Viviany Beleboni e quais visões de identidades podem estar sendo construídas a partir dessas formas de representação? e b) Quais as possíveis implicações e desdobramentos dos diversos comentários e das diferentes formas de representação da modelo transexual no tocante à perpetuação de práticas de discriminação da comunidade GLBT?

Tais perguntas foram respondidas por meio de análise de postagens de internautas, selecionadas em diferentes sites como Uol, Yahoo, página on-line do jornal Folha de S. Paulo, página on-line da revista Carta Capital e site G1 da Rede Globo, conforme o quadro a seguir.

As postagens que constituem o corpus deste estudo foram coletadas nos sites descritos no Quadro 1 no dia 10 de junho de 2015 e dizem respeito às opiniões de internautas sobre o fato de a modelo Viviany Beleboni ter desfilado, durante a 19ª Parada Gay em São Paulo no domingo do dia 07 de junho de 2015, representando Cristo em sua crucificação. Para a coleta, a pesquisadora digitou “modelo representa Cristo crucificado na Parada Gay” no navegador Google. Logo então, o site forneceu diversos links que abordavam o tema, sendo que os cinco primeiros foram os selecionados. De posse dos cinco primeiros links, procedi à leitura das reportagens e das diversas opiniões postadas logo após o texto das reportagens, nos espaços destinados aos comentários dos leitores.

QUADRO 1
Nomes dos sites consultados e respectivas legendas, elaboradas pela autora

Ao todo foram coletadas 126 (cento e vinte e seis) páginas de opiniões de internautas sobre o referido assunto e, a partir de várias leituras, a pesquisadora destacou manualmente as partes relevantes para a pesquisa nos textos coletados. Estas partes destacadas foram depois copiadas para um documento especial, constituindo o corpus utilizado nas análises deste estudo. Foram consideradas relevantes para essa pesquisa duas categorias de dados. Cada categoria foi utilizada para responder a uma pergunta de pesquisa. A primeira categoria se refere aos adjetivos ou às formas de representação, utilizadas por internautas nos sites pesquisados, para se referirem à modelo, sendo que, tanto as formas respeitosas de tratamento quanto as ofensivas e degradantes foram coletadas nesse momento. A segunda categoria de dados se refere, especificamente, às manifestações e às opiniões dos internautas textualmente expressas nos sites pesquisados.

Na próxima parte, relativa à discussão e análise dos dados, apresento diversos excertos enumerados em ordem crescente. Cada excerto é seguido de uma legenda que aparece entre colchetes - [ ]. Nesta legenda, as duas primeiras letras correspondem às iniciais do nome e sobrenome da pessoa que emitiu a opinião e as duas ou três últimas letras, separadas por um traço (-) correspondem ao site de onde foram retiradas, como no exemplo a seguir:

[01] Eu não tenho religião, mas isso é uma verdadeira “cambada” de desrespeitadores. Zombando de uma pessoa que foi condenada à morte (na cruz) injustamente. [JJ-G1]

Assim, para responder à primeira pergunta de pesquisa foram levadas em consideração as formas de representação ou as expressões utilizadas pelos internautas para se referirem à modelo Viviany Beleboni. A segunda pergunta foi respondida através da análise das manifestações e opiniões dos internautas a respeito do fato ocorrido.

Outrossim, vale mencionar que não procedi quaisquer tipos de adequação à norma culta da língua portuguesa e tampouco foram realizados quaisquer tipos de cortes ou abreviações nas opiniões coletadas. Pontuações, aspas, abreviações e destaques em itálico ou em caixa alta também foram mantidos tal qual aparecem nos textos originais. Tendo tratado das considerações teóricas e metodológicas, passo, então, à análise dos dados deste estudo.

5 Performatividade em ação: as palavras e suas consequências

Considerando as formas de representação como elementos importantes na demarcação das diferenças e na construção das identidades, esse estudo teve como objetivo discutir como a linguagem é utilizada para perpetuar práticas de discriminação em relação à comunidade GLBT. Com esse objetivo em mente foram elaboradas duas perguntas de pesquisa, conforme anteriormente descrito.

Para responder à primeira pergunta de pesquisa, “Quais foram as formas de representação utilizadas por internautas para hostilizar e rechaçar a crucificação encenada pela modelo Viviany Beleboni e quais visões de identidades podem estar sendo construídas a partir dessas formas de representação?”, foram consideradas as formas de representação para se referirem à modelo utilizadas por internautas nos sites pesquisados. Essas formas de representação da modelo foram separadas em dois grupos de palavras. O primeiro grupo refere-se às formas de representação utilizadas pelos internautas que se posicionaram a favor da atitude da modelo ao desfilar crucificada durante a Parada Gay. Nesse grupo foram encontradas expressões como: “artista transexual”; “membro da comunidade LGBT”; “transexual”; “travesti”; “artista crucificada”; “gay”; “ativista gay”; “homossexual”. Esse primeiro grupo de palavras não será submetido à análise ou discussão, pois escapa ao objetivo descrito através da primeira pergunta.

Em oposição a esses internautas, que se utilizaram de expressões que denotam respeito e consideração, encontram-se outros internautas que se posicionaram contra a atitude da modelo. Foram encontradas as seguintes formas de representação dentre esses internautas: “homossexual”; “a pessoa”; “transexual”; “ativista homossexual”; “gay”; “biba”; “devassa”; “impura”; “membro da turminha do Jean Wyllys”; “aberração”; “a atriz”; “ele (ou ela, sei lá)”; “piranha”; “escória”; “tresloucada”; “filha do demônio”; “doente”; “aberração humana”; “representante de uma raça infeliz”; “gay maldito”; “gay desgraçado”; “extraterrestre”; “ordinária”; “ser decadente”.

Conforme pode-se perceber, há algumas formas de se referir à modelo que são comuns aos dois grupos como: homossexual, gay, ativista homossexual e transexual, o que sugere que, mesmo discordando da atitude em questão, algumas pessoas utilizam formas de tratamento não ofensivas ou pejorativas para se referirem à modelo. As demais palavras utilizadas pelas pessoas que discordaram da atitude da modelo foram utilizadas de forma desrespeitosa, caluniosa e ofensiva, como pode ser verificado.

Pode-se notar, também, entre essas formas de representação, a presença de termos que sugerem uma separação entre seres que seriam humanos dos que não seriam, como em: aberração, aberração humana, representante de uma raça infeliz e extraterrestre. A presença de termos como estes exemplifica o fato de que as diferentes formas de representação, nomeação e adjetivação servem para construírem e demarcarem diferenças identitárias (HALL, 2008HALL, S. Quem precisa de identidade. In: SILVA, T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes, 2008. p. 103-133.). Uma vez demarcadas, essas diferenças, no caso por ora analisado, operam uma separação entre um grupo privilegiado de pessoas que se crê legítimos habitantes do planeta terra e com poderes de posicionar e determinar quem pertence ou não a esse planeta, em oposição a outro grupo que é posicionado e que, portanto, não goza do direito de poder dizer, fazer e ser neste mundo.

Entendendo que a construção de identidades se dá por meio da marcação da diferença, conforme pontuado anteriormente, necessário se faz destacar que há diferentes formas de se proceder a essa demarcação. Com base em Hall (2008HALL, S. Quem precisa de identidade. In: SILVA, T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes, 2008. p. 103-133.) e Woodward (2008WOODWARD, K. Identidade e diferença: uma introdução teórica e conceitual. In: SILVA, T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes , 2008. p. 7-72.), considero como uma forma não nociva de demarcação de diferenças as que são baseadas em um “eu” diferente de um “tu” ou “vós”. De fato, essa forma de demarcação de diferenças ocorre com todos nós, já que nos identificamos em alguns momentos com algumas pessoas e nos dizemos assemelhados a outras em diferentes aspectos sem, contudo, jamais nos identificarmos por completo a uma pessoa ou grupo em especial. Nesse sentido, o perigo se instala a partir do momento em que, em oposição à consideração das identidades, das identificações e das diferenças enquanto provisórias e imprecisas (CORACINI, 2003CORACINI, M. J. O olhar da ciência e a construção da identidade do professor de língua. In: CORACINI, M. J.; BERTOLDO, E. S. (org.). O desejo da teoria e a contingência da prática: discursos sobre e na sala de aula (língua materna e estrangeira). Campinas: Mercado de Letras, 2003. p. 193-210.), algumas pessoas se apoiam em uma visão generalizada, essencialista e imutável de identidade para reivindicar o poder e a autoridade para falar em nome de um grupo e representá-lo como um bloco único, homogêneo e hegemônico de cidadãos, em oposição a outro grupo excluído e marginalizado.

Tendo tratado, ainda que brevemente, de algumas formas de representação isoladas de seus contextos enunciativos, passo em seguida a analisar algumas opiniões de internautas a respeito do episódio ocorrido na Parada Gay para, assim, poder responder à segunda pergunta de pesquisa: Quais as possíveis implicações e desdobramentos dos diversos comentários e das diferentes formas de representação da modelo transexual no tocante à perpetuação de práticas de discriminação da comunidade GLBT?

Optei por trazer os excertos em blocos, agrupando-os, na medida do possível, em conteúdos semelhantes, por acreditar que dessa forma eles poderão ser melhor discutidos. As partes em negrito foram destacadas com o objetivo de chamar a atenção para as expressões mais marcantes e violentas nas postagens dos internautas.

[01] Vai chegar tua hora de encarar o outro lado da vida, e aí vamos ver se você, ô, desrespeitoso com os cristãos e com aqueles que apenas suportam a sua existência mas não concordam com as “coisinhas” que você faz, vai ter coragem de colocar sua verborragia para fora. A hora chega para todos e você, ameba jurássica, não é diferente! O problema com você com os teus, é que quanto mais apanha, mais se apaixona!!! [JA-CC]

[02] Tem um lugar joinha e bacana, super adequado pra vocês fazerem essa parada gay! …sabem onde? NO INFERNO! bando de baderneiros sem disciplina! vão para o inferno seus lixos! essa parada dos infernos não acrescenta nada! não representa nada! só um bando de doentes fazendo festa com dinheiro público! Agora vem um ser decadente representar a dor de Cristo…vai para o inferno sua aberração humana! Senhor Prefeito, governador e Presidente eu quero meu dinheiro sendo investido em bem feitorias para a sociedade! educação de verdade, hospitais e médicos! e não pra essa nojeira! [LC-FSP]

[03] Se eu vir um gay desses ou feministas fazendo palhaçada com imagens religiosas, você pode ter certeza que eu vou sair quebrando na p’orrada, não vou nem pensar, vai ser só direto na boca e chute na cara, qualquer homem que honra o que tem no meio das pernas tem que fazer isso, tem que dar um basta nesse desrespeito. [CF-FSP]

[04] ACHO QUE DEVIAM OS GAYS DEVIAM SE MOLHAR COM GASOLINA, E UM ATEAR FOGO NO OUTRO, PARA VERMOS O SOFRIMENTO DESTAS PESTES. [VP-FSP]

Este primeiro bloco é composto de alguns excertos de internautas que demonstram revolta e usam palavras ofensivas para agredir os homoafetivos ou homossexuais, inclusive com ameaças de violência física. Vale destacar que, em vez de se referirem a um caso isolado, o que pode ser constatado nas opiniões dos internautas, foram atitudes baseadas na generalização e divisão dicotômica (WOODWARD, 2008WOODWARD, K. Identidade e diferença: uma introdução teórica e conceitual. In: SILVA, T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes , 2008. p. 7-72.) dos membros da sociedade em dois grupos distintos e bem separados: o dos humanos, supostamente cristãos ou ao menos supostamente detentores dos direitos de representar Cristo e tantos outros ícones em nossa sociedade, como em: “Se eu vir um gay desses ou feministas fazendo palhaçada com imagens religiosas, você pode ter certeza que eu vou sair quebrando na p’orrada”, “qualquer homem que honra o que tem no meio das pernas tem que fazer isso, tem que dar um basta nesse desrespeito” e “essa parada dos infernos não acrescenta nada! não representa nada! só um bando de doentes fazendo festa com dinheiro público! Agora vem um ser decadente representar a dor de Cristo…vai para o inferno sua aberração humana!”. E outro grupo, o dos que não gozam dos mesmos direitos, por serem supostamente considerados menos humanos: “ameba jurássica”, “um ser decadente”, “aberração humana”, “essa nojeira”, “PESTES” e, por extensão, não detentores dos direitos sobre os tais defendidos ícones religiosos e sociais. Ou seja, os internautas que escolheram atacar verbalmente e de forma indiscriminada todo os pertencentes ao grupo dos homossexuais (e em um dos casos ao grupo das feministas também) se consideram no direito de fazê-lo e também se consideram os legítimos representantes da nossa sociedade, da fé cristã e, também, no dever de proteger essas instâncias daqueles supostamente indignos de pertencerem a elas e de as representarem.

Expressões como “você, ô, desrespeitoso com os cristãos e com aqueles que apenas suportam a sua existência mas não concordam com as ‘coisinhas’ que você faz” e “O problema com você com os teus, é que quanto mais apanha, mais se apaixona” intencionam marcar a diferença entre os dois grupos distintos e, sendo o grupo dos homossexuais diferentes e não incluídos no que determina um imperativo social heteronormativo, eles são apenas suportados pelos ditos legítimos integrantes da sociedade. Os dizeres “bando de baderneiros sem disciplina”, “bando de doentes”, “PESTES” e “essa nojeira”, por sua vez, servem para materializar linguisticamente o tratamento generalizado e em bloco único e imutável (WOODWARD, 2008WOODWARD, K. Identidade e diferença: uma introdução teórica e conceitual. In: SILVA, T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes , 2008. p. 7-72.) dispensado aos homossexuais. Esse tipo de atitude, mais do que significar posicionamentos de repúdio a um ato em especial, indica-nos a utilização do discurso da suposta maioria para oprimir um grupo supostamente diferente e tido como não pertencente. Nesse sentido, é perceptível a força de ação e a performatividade (AUSTIN, 1962AUSTIN, J. L. How to Do Things with Words. Oxford: Oxford University Press, 1962.) exercida pelas palavras desses internautas ao disporem e posicionarem em um bloco unitário e marginalizado milhares de cidadãos supostamente não pertencentes à sociedade e, portanto, sem direitos aos seus bens, costumes e crenças.

A desconsideração enquanto um ser humano igual e a exclusão presumida dos homossexuais, ou melhor, destes que são apenas suportados, se torna ainda mais evidente quando são usadas expressões como “eu quero meu dinheiro sendo investido em bem feitorias [sic] para a sociedade! educação de verdade, hospitais e médicos! e não pra essa nojeira”. A partir desse excerto, pode-se perceber que é opinião do(a) internauta que o dinheiro público não pode ser gasto com comunidade GLBT ou na Parada Gay, o que sugere que eles não fazem parte da sociedade, embora é sabido que todos nós, cidadãos, pagamos nossos impostos e temos direito constitucional ao mesmo tipo de assistência estatal. Essa opinião do(a) internauta, ao instituir o lugar da exclusão em relação à assistência estatal à comunidade GLBT, corrobora as palavras de Woodward (2008WOODWARD, K. Identidade e diferença: uma introdução teórica e conceitual. In: SILVA, T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes , 2008. p. 7-72., p. 14), que nos alerta para os perigos de se marcar simbolicamente um grupo como inimigo ou tabu, pois “isso terá efeitos reais porque o grupo será socialmente excluído e terá desvantagens materiais”.

Algo que também chama a atenção é o fato de um dos internautas exprimir a seguinte opinião: “vai ser só direto na boca e chute na cara, qualquer homem que honra o que tem no meio das pernas tem que fazer isso, tem que dar um basta nesse desrespeito”, incitando - por meio das palavras “qualquer homem que honra o que tem no meio das pernas” - a violência de um grupo contra outro. Este é um exemplo que evidencia o discurso naturalizado machista que quer fazer parecer que cabe ao homem “que honra o que tem no meio das pernas” a defesa da sociedade, da moral e dos bons costumes. A esse respeito faço coro às palavras de Woodward (2008WOODWARD, K. Identidade e diferença: uma introdução teórica e conceitual. In: SILVA, T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes , 2008. p. 7-72., p. 17), quando afirma que “os discursos e os sistemas de representação constroem os lugares a partir dos quais os indivíduos podem se posicionar e a partir dos quais podem falar”, cabendo a nós o questionamento desses lugares/discursos, que muitas vezes aparecem como naturalizados e, por isso mesmo, promovem a aceitação de certas atitudes de um grupo em relação a outro.

Acerca do discurso machista naturalizado em nossa sociedade, necessário se faz uma contraposição veemente, pois não se pode mais aceitar a premissa de outrora de que caberia aos homens a defesa da sociedade, da religião e dos bons costumes. Considerando as diferentes formas de ação da linguagem no mundo e a máxima austiniana de que dizer é fazer, mais uma vez nos deparamos com formas de ação calcadas em performativos que não mais condizem com os parâmetros machistas, outrora aceitos em nossa sociedade e que ainda continuam a ecoar nas diferentes instâncias de nossas vidas, travestidos de boas intenções, de objetivos relacionados à proteção da sociedade e de ícones religiosos cristãos.

Assim, a partir de enunciados como os presentes nos excertos [1], [2], [3] e [4] pode-se perceber que, passadas décadas desde que a mulher conquistou o direito ao voto, ao estudo e ao trabalho remunerado, nossa sociedade ainda conserva discursos que colocam o homem heterossexual em posição superior, no direito de não somente falar em nome da sociedade e de representá-la, mas de agir em sua defesa, de lutar para conservar seus costumes e sua moral tradicional. Corroboro as palavras de Silva (2008SILVA, T. A produção social da identidade e da diferença. In: SILVA, T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes , 2008. p. 73-102., p. 91) quando afirma que quem “tem o poder de representar tem o poder de definir e determinar a identidade”. Sendo assim, cabe-nos questionar o fato de que, ainda hoje, parece que somente a alguns segmentos da sociedade são garantidos o direito de tomar a palavra e, em nome de todos os demais, representar e agir sobre as pessoas, difundindo uma visão de mundo como se ela fosse a única e a mais correta. A nosso ver, essas formas de representar e agir sobre o mundo não deveriam ser naturalizadas e menos ainda fomentadas em nossa sociedade. No entanto, infelizmente elas ainda são endossadas devido à presença de diversos discursos já cristalizados, que remontam a centenas de anos e que parecem seguir firmes, apoiados ou confundidos com o discurso religioso, conforme pode ser observado através das opiniões dos internautas presentes nos excertos [1] a [4].

Considerando que ainda hoje em nossa sociedade quem ainda tem o poder de representar e agir é o homem heterossexual, palavras como as mostradas no excerto [03] não apenas excluem os homossexuais dos demais humanos portadores dos direitos de agir e representar, mas as mulheres também. Ou seja, mais do que se tratar de opiniões de internautas a respeito de um fato tido como polêmico, os enunciados analisados deixam escapar, pelo viés da linguagem, que há questões mais profundas a serem discutidas. Essas questões dizem respeito ao modelo de sociedade ainda vigente que, através de práticas discursivas e sistemas de representação pouco questionados, tem se perpetuado ao longo dos tempos.

A esse respeito, acrescento que não somente o modelo hegemônico masculino heteronormativo, outrora aceito, deve ser questionado, mas também o próprio ato de se constituir um lugar privilegiado a determinado grupo social ou a determinado modelo de sociedade e de se permitir a esse grupo, em nome de determinado modelo social, representar ou deliberar questões que sejam de interesse comum aos demais grupos sociais. Nesse sentido, as formas de ação e representação e o suposto direito de agir e representar precisam também ser discutidos e desnaturalizados, caso se queira questionar as políticas de representação vigentes em nossa sociedade.

No próximo bloco foram agrupados excertos que expressam opiniões de quem pretende excluir os homossexuais por meio de ameaças de cunho religioso:

[05] Porque bem sabeis isto: que nenhum devasso, ou impuro, ou avarento, ou ladrão, o qual é idólatra, tem herança no reino de Cristo e de Deus. [IA-YA1]

[06] humilhação vcs vão ver é quando vcs for prestar conta com Deus. Não estou te julgando, estou falando a realidade, Deus não fez homem pra homem nem mulher pra mulher, se não ele teria feito Adão e Ivo, não Adão e Eva. [AL-FSP]

[07] Todos esses Representantes dessa R-a,ç.a Infe--liz Irão Morrer De H.I.V a Míngua Cheios de Feridas e Cobertos Por Bichos em Cima de uma Cama Clamando Por Cristo e Pedindo Perdão, Mais será Tarde de Mais [WD-FSP]

[08] Todos temos a liberdade de escolher o que desejamos ser, até mesmo esses que não querem ser mas, são a escória do mundo; e apesar disso, ainda tem a chance de mudar mas é preciso coragem para arrepender-se e acreditar que o Cristo na Cruz veio para salvar essa escória e simpatizantes e não há outro caminho, é só Jesus. [NC-FSP]

A partir dos excertos [05], [06], [07] e [08] pode-se perceber que, além do direito de ameaçar fisicamente em defesa da moral e dos bons costumes da sociedade, há um grupo de internautas que se considera autorizado a falar em nome dos preceitos da religião cristã, em oposição a outro grupo que não detém a mesma autorização. Nesses excertos o apelo é religioso e a oposição entre os dois diferentes grupos é marcada através do suposto direito de entrar ou não no reino do céu. Segundo os supostos legítimos representantes da sociedade e da palavra do Senhor, há uma chance de os homossexuais serem incluídos, serem considerados seres humanos e terem direito ao Reino do Céu. Mas para isso eles terão que se arrepender de seus atos e seguir “outro caminho”, o caminho de Jesus.

Pode-se verificar que passagens como as desses excertos têm a intenção de disseminar a ideia de que a culpa da exclusão é dos próprios excluídos. Assim, ao sugerirem que os homossexuais podem se arrepender caso queiram ser incluídos no grupo dos que têm o direito ao Reino do Céu, os ditos legítimos representantes da sociedade e da fé cristã querem fazer parecer aos mais desavisados que a exclusão sofrida pelos membros do outro grupo decorre não de atitudes excludentes de um grupo em relação ao outro, mas enquanto fruto da própria escolha dos excluídos. A partir da ótica dos ditos representantes da fé cristã, a marginalização decorre “por opção” dos homossexuais que debandaram para o caminho do pecado, sendo que as portas que os incluiriam no grupo dos humanos supostamente dignos encontram-se sempre abertas, cabendo somente aos supostos pecadores impuros mudarem suas atitudes e terem a “coragem para arrepender-se”.

A partir dessas palavras pode-se verificar que, na verdade, não se trata de uma forma de inclusão, mas sim de demarcação de fronteiras e determinação de espaços de ação e representação e que, caso os homossexuais queiram gozar dos mesmos direitos religiosos dos heterossexuais, terão que se “arrepender de seus pecados” e “deixarem de ser” homossexuais, conforme já mencionado. Como de cada grupo é esperado certos comportamentos ou ações e outras não, a diferenciação e a dicotomização entre os incluídos e os excluídos é realizada por meio de quem tem o poder de institui-la, cabendo ao outro grupo adequar-se e ser incluído ou permanecer em situação de exclusão. Mais uma vez pode-se observar como, por meio de discursos muitas vezes naturalizados, os sujeitos não só constroem “lugares a partir dos quais os indivíduos podem se posicionar e a partir dos quais podem falar” (WOODWARD, 2008WOODWARD, K. Identidade e diferença: uma introdução teórica e conceitual. In: SILVA, T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes , 2008. p. 7-72., p. 17), mas também se utilizam de suas posições para cercear esses direitos a outros que não agem conforme o modelo supostamente instituído.

Assim, sendo as identidades construídas por meio das diferenças e das identificações (HALL, 2008HALL, S. Quem precisa de identidade. In: SILVA, T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes, 2008. p. 103-133.), a própria noção do que vem a ser a heteronormatividade e suas práticas são construídas através do e no confronto com aquilo que ela não é e não pratica. Ou seja, a delimitação da identidade do homem heterossexual está, também, atrelada às práticas do grupo tido como contrário, ou seja, às práticas do grupo dos homossexuais - práticas essas contrárias às dos supostamente pertencentes ao grupo dos heterossexuais. Na medida em que - segundo a opinião dos internautas analisados - cabe aos heterossexuais cuidar da moral, dos bons costumes e dos ícones religiosos, a atitude da modelo Viviany Beleboni, ao representar a crucificação de Cristo, foi considerada uma intromissão, uma invasão da fronteira e do espaço supostamente pertencente ao grupo dos heterossexuais. Ao que nos parece, a atitude da modelo fez com que o outro grupo se sentisse desafiado e ameaçado, propiciando terreno fértil para que discursos de repúdio, desaprovação e mesmo ódio à atitude da modelo emergissem, conforme verificado nos excertos [5] a [8].

No último bloco, trago excertos que contêm passagens que discriminam os homossexuais através da marcação de diferenças baseadas em critérios da suposta “anormalidade” dos homossexuais frente à apregoada “normalidade” dos pertencentes ao grupo dos homens heterossexuais.

[09] Gay parade march for Satan… e esses insanos ainda dizem que homossexualismo não é doença. A evidencia em fatos conclui por si só! [BD-FSP]

[10] Cada vez mais eles desrespeitam mais a sociedade. Eles não querem ser discriminados, mas procuram fazer o possível para contribuir. Onde já se viu aparelho excretor reproduzir? Isto é contra as leis da natureza. Onde ficam nossos filhinhos vendo umas cenas chocantes como aconteceu nesta tal parada. Isto não devia existir pelo bem da humanidade. [ZT-FSP]

[11] O lobby gay vai usar todos os meios para tentar convencer as pessoas de que seu estilo de vida é normal quando não é normal. Se quiserem respeito, também vão ter que respeitar os outros. [FB-FSP]

[12] Hoje são poucas as pessoas que conhecem o sentido real de ser família, e todo esse movimento são contrário aos princípios da família. Desafio a vocês da imprensa à fazerem uma pesquisa com os homossexuais, no qual descobrirão que, mais ou menos, 95% dos homossexuais tem problemas familiares, ou seja, traições entre os pais, pai que bate na mãe, pais ignorantes, pais que não dão as devidas atenções aos filhos, etc…[RG-FSP]

[13] SINTO PENA DOS HOMOSSEXUAIS, POIS SEI QUE SÃO SOFRIDOS, MAGOADOS, COITADINHOS, SENTIDOS, NAO TEM PAZ, FINGEM SER ALEGRES, SAO ESCANDALOSOS, MAS SEI QUE MUITOS ATÉ OS CONSIDERAM O LIXO OU A ESCORIA DO MUNDO, OUTROS ACHAM QUE ELES SAO O COCO DO CAVALO DO BANDIDO, TADINHOS, TENTAM SER ALGUEM, TENTAM APARECER, MAS FAZER O QUE? [JC-FSP]

[14] Muita audacia querer se comparar a Jésus Cristo. A maioria dos que morrem nesse meio, se Matam entre eles ou se envolvem em coisas erradas. Gays que sao cidadaos de bem, respeitam e sao respeitados. [GC-UOL]

[15] da próxima vez se vista de Maomé quero vê se vc tem coragem, o povo evangélico é pacifico, por isso vc tiram com nossa cara, cada um faz o que quer com seu corpo e da sua vida, esse pais é hétero jamais será homo, vão se tratar buscar ajuda ao inves de fazer nós brasileiros passar vergonha no exterior, já não chega a corrupção nesse país?? [TP-FSP]

[16] Com o dinheiro gasto em paradas de glorificação de per versões sexuais ao longo de 4 anos a Prefeitura de São Paulo poderia construir uma creche com excelente infraestrutura para atender a mães trabalhadoras de uma comunidade carente, inclusive algumas mães homossexuais [AE-FSP]

Nesses últimos excertos, as opiniões veiculadas buscam demarcar a cisão entre os dois grupos distintos e ditos homogêneos, conforme já demonstrado, por meio do uso dos critérios de normalidade versus anormalidade, utilizando por vezes critérios biológicos para justificar a exclusão. Mais uma vez é sugerido que cabe aos excluídos a opção pela inclusão, caso queiram se tratar e se adequar ao grupo dos ditos normais. Passagens como “mais ou menos, 95% dos homossexuais têm problemas familiares, ou seja, traições entre os pais, pai que bate na mãe, pais ignorantes, pais que não dão as devidas atenções aos filhos, etc.” atribuem a causa da dita anormalidade dos homossexuais a problemas familiares, enquanto em outras passagens vemos a menção a doenças que podem ser tratadas caso seja da vontade do doente.

Dentre os comentários postados, há um que chama especial atenção: “O lobby gay vai usar todos os meios para tentar convencer as pessoas de que seu estilo de vida é normal quando não é normal”. Esse comentário que se destaca pela pretensão de querer ser um alerta aos membros da sociedade de bem quanto ao desejo de convencimento por parte dos homossexuais de que “seu estilo de vida é normal”. As palavras expressas por meio desse comentário deixam transparecer mais uma vez a suposta obrigação dos cidadãos de bem de proteger a sociedade das mazelas causadas por estes que, segundo a ótica dos homens heterossexuais, faz “nós brasileiros passar vergonha no exterior”.

6 Mais algumas considerações

Por meio deste estudo pôde-se evidenciar que as opiniões veiculadas, mais do que expressar manifestações quanto a um fato isolado, foram utilizadas pelos internautas para demarcar diferenças e excluir um grupo em favor de outro, tido como maioria absoluta e como o legítimo representante da sociedade. Ao fazerem isso, os internautas acabaram por advogar em favor da existência de lugares distintos pertencentes a um grupo e a outro, ou seja, eles demarcaram as posições que cada sujeito deve ocupar na sociedade. Posturas como as desses internautas externam a utilização de uma visão essencialista de identidade com claras pretensões de demarcar o poder e o lugar de quem tem o direito de representar em oposição aos demais, que devem se contentar em serem os representados.

As oposições generalizantes, essencialistas e baseadas em critérios fixos aqui demonstradas foram principalmente construídas em relação a posições binárias e dicotômicas como humano versus não humano; puro, religioso e digno de pertencer ao reino do céu versus impuro, pecador e indigno do reino do senhor; amigo versus inimigo e, ainda, normal versus anormal, corroborando as palavras de Woodward (2008WOODWARD, K. Identidade e diferença: uma introdução teórica e conceitual. In: SILVA, T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes , 2008. p. 7-72.), quando afirma que as identidades são construídas a partir de posições binárias em relação a outras identidades, ou seja, em relação ao que não é. A autora sugere que, apesar desse modelo binário de construção de identidades, há uma forma em que elas podem ser celebradas positivamente, por meio da marcação da heterogeneidade, do hibridismo e da diversidade enriquecedora, como tem advogado alguns grupos sociais ligados a questões de gênero. No entanto, o que foi verificado é que as opiniões dos internautas constituíram práticas que objetivavam demarcar a diferença e construir identidades por meio da exclusão ou da marginalização, utilizando-se de uma visão estereotipada daqueles que são vistos como os “outros”.

Sendo, ao que tudo indica, segundo Woodward, uma característica comum à maioria dos sistemas de pensamento o compromisso com os dualismos, precisamos estar atentos quanto ao fato de que, nesses sistemas, os “termos em oposição recebem uma importância diferencial, de forma que um dos elementos da dicotomia é sempre mais valorizado ou mais forte que o outro” (WOODWARD, 2008WOODWARD, K. Identidade e diferença: uma introdução teórica e conceitual. In: SILVA, T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes , 2008. p. 7-72., p. 50). A autora afirma que a “relação entre dois termos de uma oposição binária envolve um desequilíbrio necessário de poder entre eles” (WOODWARD, 2008WOODWARD, K. Identidade e diferença: uma introdução teórica e conceitual. In: SILVA, T. (org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos Estudos Culturais. Petrópolis: Vozes , 2008. p. 7-72., p. 50). E, neste caso, questionar determinadas formas de representação e discursos disseminados em nossa sociedade significa questionar a alocação de sujeitos em posições binárias, dicotômicas e imutáveis e, em última instância, diz respeito, também, a questionar relações de poder desiguais, opressoras e excludentes.

Referências

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  • 1
    Para maiores informações sobre o episódio, Cf. a reportagem da Folha de S. Paulo, disponível em: <https://bit.ly/2RLOrgj>. Acesso em: 10 jun. 2015.
  • 2
    Gays, lésbicas, bissexuais, travestis, transexuais ou transgêneros.
  • 3
    Tradução livre realizada pela autora, assim como as demais presentes neste.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Ago 2019
  • Data do Fascículo
    Oct-Dec 2019

Histórico

  • Recebido
    14 Fev 2019
  • Aceito
    19 Jun 2019
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