Acessibilidade / Reportar erro

EDITORIAL

Este número de Sexualidade, Saúde e Sociedade oferece a seus leitores um amplo leque de problemáticas e questões.

Primeiramente, destacamos dois artigos que expõem cuidadosas análises críticas de noções polêmicas e particularmente espinhosas que, em nossa região, vêm sendo acionadas nos debates contemporâneos relativos ao abuso sexual contra crianças e adolescentes e à legalização do aborto. O texto de José Morán Faúndes e trata genealogicamente a noção de "vida". Explora o caráter político que tal conceito assume no âmbito das acirradas disputas éticas e sociais que, mesmo com o crescente reconhecimento dos direitos sexuais e reprodutivos, continuam a marcar o panorama latino-americano. Na contramão das pretensões de "verdade", especialmente das que são esgrimidas pela hierarquia católica, os autores discutem criticamente o suposto caráter objetivo, neutro e universal de uma noção de "vida" que, apresentada como científica, acaba por invisibilizar as mulheres enquanto sujeitos de direitos. Baseando-se nas discussões da Comissão Parlamentar de Inquérito da Pedofilia, instalada pelo Senado brasileiro em 2008, e em seu próprio trabalho etnográfico junto à Polícia Federal do Rio de Janeiro, Laura Lowenkron aborda de maneira instigante os modos com que a noção de "pedofilia" vem sendo acionada no enfrentamento da violência sexual contra crianças e adolescentes. Discute particularmente o que designa como "realismo representacional", uma relação causal entre fantasia, representação e ação, suposta nos discursos políticos e jurídicos sobre a pornografía infantil na internet.

Outro registro comum presente nos artigos publicados neste número é o desafio analítico de trabalhar, a partir de diferentes universos empíricos, com o que vem sendo convencionalmente designado de enfoque ou perspectiva interseccional. Fruto de investigação realizada junto a homens gays oriundos das elites paulistanas, o artigo de Marcio Zamboni busca, na mesma direção, refletir sobre a reordenação de determinados marcadores sociais de diferença (classe, gênero, raça e geração) na produção de uma forma específica de representação (o nu artístico). O autor procura mostrar de que maneira certas diferenças sociais configuram este tipo de representação ou cena, colocando observadores (artistas) e seus modelos em posições particulares em múltiplas hierarquias sociais interconectadas. Na mesma direção, o texto de Marina Tomasini aborda os jogos cotidianos de (re)produção de diferenças e oposições (de gênero e geração) entre jovens estudantes do sexo masculino oriundos dos setores populares da cidade de Córdoba, Argentina. Através da análise da categoria "bancar o valentão", a autora explora como as manifestações de violências entre colegas possibilita compreender como as relações entre jovens nos primeiros anos do ensino médio (re)criam sistemas de classificação social mais amplos, envolvendo as articulações entre classe e gênero.

Por seu lado, Daniel Kerry dos Santos e Mara Lago chamam a atenção para a diversidade e a complexidade das experiências de envelhecimento narradas por homens com práticas homoeróticas, participantes de sua investigação, realizada na cidade de Florianópolis, Brasil. As narrativas coletadas apontam para as várias possibilidades ético-estéticas e estilísticas dessas "velhices", que excederiam os estreitos limites que se supõe existirem quando de trata de sujeitos "velhos" e "homossexuais".

Finalmente, o presente número traz aos leitores uma versão em português de importante artigo da socióloga americana Janice Irvine,especialmente cedido por ela e por seus editores à Sexualidade, Saúde e Sociedade. Acompanhando a relativamente recente criação de duas novas categorias diagnósticas relativas aos chamados transtornos sexuais, a de "inibição do desejo sexual" e a de "a dicção sexual", o texto traz contribuições fundamentais para a compreensão dos modos contemporâneos de regulação da sexualidade, além de dar continuidade às reflexões apresentadas no conjunto de artigos que compuseram o dossiê Medicalização, sexualidade e gênero, publicado no último número da Revista, para os quais a reflexão de Janice Irvine é referência fundamental.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Jan 2014
  • Data do Fascículo
    Dez 2013
Centro Latino-Americano em Sexualidade e Direitos Humanos (CLAM/IMS/UERJ) R. São Francisco Xavier, 524, 6º andar, Bloco E 20550-013 Rio de Janeiro/RJ Brasil, Tel./Fax: (21) 2568-0599 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: sexualidadsaludysociedad@gmail.com