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A lesbianidade materializada nos corpos (nem tão) femininos

The materialized lesbianity on (not so) feminine bodys

La lesbianidad materializada en cuerpos (ni tan) femeninos

Resumo

O presente artigo apresenta resultados uma pesquisa cujo tema compreendeu a lesbianidade na Internet. O Tumblr foi selecionado como lugar de análise, mais especificamente páginas de mulheres autoidentificadas como lésbicas ou que por meio dos conteúdos de seus Tumblrs demonstraram interesse no tema da lesbianidade. O material analisado compreendeu imagens retiradas dessas páginas. Neste artigo, o tema principal é o corpo, um dos âmbitos de análise que emergiram da pesquisa. A metodologia compreendeu estudos de imagem, com base em Rosa Fischer (2002), a desconstrução com base em Derrida (2002), e o referencial teórico foi fundamentado em conceitos de Foucault (2008, 2010), Judith Butler (2000, 2004, 2013) e Preciado (2002, 2008). As análises mostraram a sexualidade e o gênero como elementos que possibilitam a materialização da lesbianidade nos corpos das imagens analisadas por meio da ruptura com o regime mulher-feminina-heterossexual.

Palavras-chave:
gênero; sexualidade; corpo; imagem

Abstract

The article presents analyzed lesbianity on the Internet, with Tumblr selected as a place of analysis, specifically pages of women self-identified as lesbians or that through the contents of their Tumblrs showed interest lesbianity. The material analyzed comprised images taken from these pages. In this article, the main theme is the body, one of the scopes of analysis that emerged from the research. The methodology used was based on Rosa Fischer (2002), deconstruction based on Derrida (2002), and the theoretical reference based on concepts of Foucault (2008, 2010), Judith Butler (2000, 2004, 2013) and Preciado (2002, 2008). The analysis showed sexuality and gender as elements that allow the materialization of lesbianity in the bodies of the images analyzed through a rupture with the woman-female-heterosexual regime.

Key words:
gender; sexuality; body; image

Resumen

El presente artículo presenta resultados de una investigación cuyo tema comprendió la lesbianidad en la Internet. El Tumblr fue seleccionado como lugar de análisis, más específicamente páginas de mujeres auto-identificadas como lesbianas, y que por medio de los contenidos de sus Tumblrs demostraron interés en el tema de la lesbianidad. El material analizado comprendió imágenes retiradas de esas páginas. En este artículo, el tema principal es el cuerpo, uno de los ámbitos de análisis que emergió de la investigación. La metodología comprendió estudios de imagen, con base en Rosa Fischer (2002), la deconstrucción con base en Derrida (2002), y el referencial teórico fue fundamentado en conceptos de Foucault (2008, 2010), Judith Butler (2000, 2004, 2013) y Preciado (2002, 2008). Los análisis mostraron la sexualidad y el género como elementos que posibilitan la materialización de la lesbianidad en los cuerpos de las imágenes analizadas, por medio de la ruptura con el régimen mujer-femenina-heterosexual.

Palabras clave:
género; sexualidad; cuerpo; imagen

Introdução

Parece estranho, na atualidade, pensar nas relações que estabelecemos com/na web e não remeter, quase instantaneamente, às mídias (ou redes) sociais. De fato, o rol de possibilidades é extenso: desde mídias sociais mais abrangentes, como o Facebook, até as bastante específicas, como o LinkedIn. Segundo Danah Boyd e Nicolle Ellison (2007BOYD, Danah M. & ELLISON, Nicole B. 2007. “Social Network Sites: Definition, History, and Scholarship”. Journal of Computer-Mediated Communication. Vol. 13, Issue 1, p. 210-230, October. Disponível em: https://doi.org/10.1111/j.1083-6101.2007.00393.x [Acesso em Março de 2019].
https://doi.org/10.1111/j.1083-6101.2007...
), de modo geral as mídias sociais caracterizam-se como um espaço em que à/ao usuária/o é solicitado criar um perfil público, conectar-se com outras/os usuárias/os e ter acesso às conexões feitas por estes. Assim, quaisquer sites ou aplicativos que possibilitem este tipo de interação já comporiam uma mídia social. Apesar deste aspecto, são poucas as características que são constantes em todas as mídias sociais, mas uma primordial, a nosso ver, está na possibilidade de criação de um espaço para as pessoas expressarem um pouco os seus medos, desejos, aspirações e/ou aspectos de suas vidas em geral. Tal possibilidade mostra-se um importante recurso para indivíduos se assumirem homossexuais, ainda que na vida off-line muitas e muitos continuem mantendo segredo.

É importante lembrar que são várias as pesquisas que pensam a relação entre (homo)sexualidade e mídias sociais, dentre as quais destacamos as de Richard Miskolci (2013MISKOLCI, Richard. 2013. “Machos e Brothers: uma etnografia sobre o armário em relações homoeróticas masculinas criadas on-line”. Estudos Feministas, Florianópolis. N. 21 (1), p. 424, jan.-abr.) e as de Luiz Felipe Zago (2013ZAGO, Luis Felipe. 2013. “‘Armários de vidro’ e ‘corpos-sem-cabeça’ na biossociabilidade gay on-line”. Interface - Comunicação, Saúde, Educação. Vol. 17, n. 45.). Apesar de compreenderem estudos sobre/com homens, sinalizam de que forma se atualizam as possibilidades de vivências homoeróticas a partir da web.

Atentas a tais fenômenos, temos particular interesse em analisar como usuárias que se dizem/se mostram lésbicas no espaço on-line têm se apropriado deste lugar para falar da lesbianidade. Assim, percebemos nas mídias sociais lugar potente para estudar estas questões, e de tantas possibilidades, optamos por uma que é reconhecida por ser uma espécie de mistura de blog com Twitter: o Tumblr.

Dito isto, este artigo objetiva apresentar alguns resultados de uma pesquisa sobre a utilização do Tumblr por usuárias que demonstram interesse na lesbianidade, buscando discutir os modos de produção e constituição de tal sexualidade nessa plataforma. Para tanto, analisamos os conteúdos que foram disponibilizados em algumas páginas de autoras assumidamente lésbicas. Estes conteúdos compreenderam exclusivamente imagens.

Apresentamos, assim, o questionamento que mobilizou a pesquisa da qual emergiu o presente texto, entendendo os Tumblrs como artefatos culturais e, portanto, como produtores de pedagogias de gênero e de sexualidade. A pergunta norteadora da pesquisa - como se constitui a lesbianidade nos Tumblrs selecionados? - suscitou alguns desdobramentos, que serão aqui elencados.

O primeiro compreendeu o que se entende por lesbianidade na perspectiva que adotamos. Como efeito, assumimos a lesbianidade em sua dimensão subjetiva, podendo compor uma posição de sujeita e, portanto, algo que diz mais do que simplesmente a inclinação/desejo sexual de alguém. A lesbianidade, neste sentido, emergiu como subjetividade em tensão com as relações de gênero em sua matriz heterossexual (Butler, 2013BUTLER, Judith. 2013. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Trad. Renato Aguiar. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira.). Tal concepção não implicou uma confusão entre gênero e sexualidade, mas assumiu ambas as subjetivações como interdependentes, como interseccionalidades (Hirata, 2014HIRATA, Helena. 2014. “Gênero, Classe e Raça: Interseccionalidade e Consubstancialidade das relações sociais”. Tempo Social - Revista de Sociologia da USP. Vol. 26, n. 1, p. 61-73, jun.). O segundo emergiu como consequência do primeiro e provocou um desdobramento: como abordar a lesbianidade desde uma perspectiva que suscite discussões não apenas sobre sexualidade, mas também sobre gênero? As discussões tratadas no presente artigo abarcaram justamente esta questão, tendo como foco os corpos presentes nas imagens analisadas.

As imagens que compõem este trabalho foram selecionadas a partir de quatro Tumblrs: love-my-girlfriend, n-surte-sorria, lovee-fuck-you e butchlife. O material coletado compreendeu o período de agosto a outubro de 2014. Com este material, e tendo como pano de fundo a interseccionalidade de gênero e sexualidade, foi possível, neste artigo, abordar duas dimensões analíticas, uma com enfoque na sexualidade como elemento desestabilizador da matriz cis-heterossexual, e outra com o enfoque no gênero.

Para apresentar os dados oriundos dessa pesquisa, o artigo foi organizado da seguinte forma: primeiramente, uma discussão sobre o Tumblr, sobretudo de um ponto de vista metodológico, atentando para seu funcionamento e para as ferramentas metodológicas que possibilitaram as análises. Em segundo lugar, a dimensão analítica da sexualidade enquanto elemento desestabilizador da matriz cis-heteronormativa tornou-se o foco. Sequencialmente, a segunda dimensão de análise foi apresentada, com enfoque no gênero como elemento também desestabilizador. Por fim, as considerações finais resgataram e sintetizaram os resultados.

Modos de olhar para o Tumblr

Nos blogs tradicionais, as publicações podem acontecer de várias formas, por meio de textos com imagens, vídeos, links. O que diferencia o Tumblr de outros blogs é seu formato. Nele, as imagens imperam, e textos longos são escassos.

Dito isto, apostamos em uma perspectiva teórico-metodológica para a presente pesquisa. Como efeito, compreendemos que os marcos teóricos com os quais trabalhamos também delineiam o fazer metodológico, em concordância com Marlucy Paraíso (2012PARAÍSO, Marlucy Alves. 2012. “Metodologias de pesquisas pós-críticas em educação e currículo: trajetórias, pressupostos, procedimentos e estratégias analíticas”. In: MEYER, Dagmar Estermann & PARAÍSO, Marlucy Alves (orgs.). Metodologias de pesquisas pós-críticas em educação. Belo Horizonte: Mazza Edições.). Assim, dentre as teorias que guiam nossos modos de olhar para o Tumblr, situamos primeiramente o conceito de Pedagogias Culturais. Para a referida autora, tal conceito diz respeito a uma compreensão pedagógica da cultura, uma vez que esta produz formas de aprender por meio de seus vários artefatos. A cultura, nesta perspectiva, é entendida como produtora de saberes, de verdades, de discursos, e, por que não, de resistências. Neste sentido, o Tumblr constitui um artefato cultural que (re)produz pedagogias culturais. Mais especificamente, o Tumblr emerge, segundo esta ótica, como produtor de pedagogias da sexualidade (Louro, 2000LOURO, Guacira Lopes. 2000. “Pedagogias da sexualidade”. In: LOURO, Guacira Lopes. O corpo educado: pedagogias da sexualidade. 2ª ed. Belo Horizonte: Autêntica .), constituindo modos de ser/estar lésbica.

Diante disso, nosso trabalho metodológico consistiu sobretudo em descrever as possibilidades de sexualidade e de gênero que são acionadas nas páginas analisadas, além de problematizar tais possibilidades, com o enfoque sobre as interseccionalidades que estes dois âmbitos (o de gênero e o de sexualidade) podem produzir. Entretanto, antes de dar início ao trabalho descritivo-analítico, foi preciso encontrar Tumblrs que dedicassem seu conteúdo ao tema da lesbianidade. Assim, recorremos a pesquisas por meio da própria ferramenta de busca oferecida pelo Tumblr, a partir das palavras-chave “lesbianidade, homossexualidade feminina, lésbicas”. Diversos foram os resultados e, destes, pré-selecionamos 30 páginas dedicadas exclusivamente a postagens sobre lesbianidade.1 1 Muitas dessas páginas seguiam umas às outras, e uma característica comum de todas elas consistiu no interesse apenas em páginas de/sobre lesbianidade. Sobre isso, Boyd e Ellison explicam que, ainda que as SNSs (Social Network Sites) possam ser criadas para agregar diversos grupos de pessoas, com frequência encontram-se segregações dentro delas. Destas 30, reduzimos para 14 páginas, porque muitas já não eram mais alimentadas há algum tempo.

A observação destes 14 Tumblrs nos permitiu criar alguns critérios de seleção. O primeiro baseou-se em um fenômeno da plataforma, chamado tumblr girlfriend. Como o nome sugere, consiste na relação afetiva entre usuárias de Tumblrs, que se torna explícita através de referências à página da namorada em sua própria página. Em virtude deste critério, selecionamos dois Tumblrs: http://love-my-girlfriend.tumblr.com e http://lovee-fuck-you.tumblr.com.

O segundo critério emergiu da existência de apenas um Tumblr dentre os observados, dedicado ao tema da lésbica butch,2 2 Termo da língua inglesa utilizado para referenciar um estilo de vestimenta e/ou comportamentos que, num gradiente de expressão de gênero, aproximam-se da masculinidade. nomeado http://butchlife.tumblr.com. O terceiro e último critério consistiu em uma delimitação em razão de uma regularidade. Assim, foi selecionado, dentre os outros Tumblrs, o que foi atualizado mais frequentemente: http://n-surte-sorria.tumblr.com.

De agosto a outubro de 2014, permanecemos observando e coletando materiais das páginas selecionadas e, em seu conjunto, este material nos permitiu a criação de três grandes categorias: o corpo, o amor e, por último, o sexo. As análises abordadas neste artigo dizem respeito prioritariamente à categoria o corpo.

Após a seleção, nós nos deparamos com dois grandes desafios. O primeiro, uma questão ética, que nos limitava em relação a quais imagens poderiam ser estudadas. Com base em uma ferramenta nomeada “reblog”, tornou-se possível identificar quais postagens não consistiam em imagens de autoria da usuária da página observada, e este foi o conteúdo selecionado. Ademais, salientamos que na seção de regras da comunidade3 3 Disponível em: http://www.tumblr.com/policy/en/community [Acesso em: 28.04.14]. do Tumblr existe um tópico intitulado “what is Tumblr not for” (para que não serve o Tumblr) e em nenhum dos itens listados constava - até a conclusão desta pesquisa - a proibição quanto à reprodução dos conteúdos públicos disponibilizados no Tumblr em outros locais, ou a impossibilidade de utilização destes conteúdos para fins de pesquisa. Ainda assim, optamos por assumir nossa presença enquanto pesquisadoras na plataforma Tumblr, com uma página criada e na qual estava discriminado nosso objetivo. Assumimos também a possibilidade de quaisquer usuárias bloquearem o nosso acesso às suas páginas, o que nunca aconteceu.

O segundo grande desafio consistiu no próprio trabalho analítico com imagens. Tem pertinência, então, a pergunta de Rosa Fischer (2002FISCHER, Rosa Maria Bueno. 2002. “Problematizações sobre o exercício de ver: mídia e pesquisa em educação”. Revista Brasileira de Educação. N. 20, maio/jun./jul./ago.: 83-84): “como estudar as imagens, textos e sons da mídia [...], tendo como pressuposto que não extrairemos das imagens representações acabadas, mas antes possibilidades de significação, datadas e bem localizadas [...]”? Neste sentido, assumimos que das imagens emergiriam discursos, sendo estes entendidos aqui no sentido com que Foucault teorizou (2008FOUCAULT, Michel. 2008. A arqueologia do saber. 7ª ed. Trad. Luiz Felipe Bacta Neves. Rio de Janeiro: Forense Universitária.), isto é, enquanto um processo, inacabado e contínuo. Assim, das imagens analisadas emergiram enunciados, indícios, pistas de lesbianidade constituída nos corpos, na relação sobretudo entre gênero e sexualidade.

Ademais, em concordância com a perspectiva adotada, operamos com possibilidades, ao invés de determinismos. Para Fischer (2002FISCHER, Rosa Maria Bueno. 2002. “Problematizações sobre o exercício de ver: mídia e pesquisa em educação”. Revista Brasileira de Educação. N. 20, maio/jun./jul./ago.), as visibilidades da imagem surgem de um trabalho árduo que consiste em abri-la, “rachá-la”, pois é a partir de tal esforço que conseguimos extrair enunciados que não estão escamoteados, mas que também não são tão evidentes. De fato, os discursos, as possibilidades produzidas pelas imagens consistem muitas vezes em naturalizações que não nos convocam, em um primeiro contato, a um exercício crítico. Outras vezes, entretanto, estas possibilidades podem produzir a condição para um exercício crítico, uma resistência às naturalizações, às verdades “inabaláveis”.

Por conseguinte, mostrou-se produtivo focar em uma estratégia descritivo4 4 Como afirma Paraíso (2012: 38), “somente descrevendo, e em detalhe, podemos compreender o que somos, o que fizeram de nós […]. Enfim, só descrevendo, e em detalhe, podemos encontrar estratégias para nos transformarmos em alguém diferente do que nos fizeram ser”. -analítica desestabilizadora de saberes e verdades, descrever e problematizar as relações de poder impulsionadoras dos discursos presentes nos Tumblrs, bem como as articulações ou os conflitos destes discursos com outros. Para tanto, princípios da desconstrução, de Jacques Derrida (2002DERRIDA, Jacques. 2002. A escritura e a diferença. Trad. Maria Beatriz Marques Nizza da Silva. São Paulo: Perspectiva.), foram empregados. Em primeiro lugar, a hierarquia que constitui os binarismos emergiu como elemento a ser pensado com base nas imagens analisadas. Conforme explica Jonathan Culler (1999CULLER, Jonathan. 1999. Sobre a Desconstrução: teoria e crítica do pós-estruturalismo. Trad. Patrícia Burrowes. Rio de Janeiro: Record/ Rosa dos Tempos.: 122),

Desconstruir uma oposição é mostrar que ela não é natural e nem inevitável mas uma construção, produzida por discursos que se apoiam nela, e mostrar que ela é uma construção num trabalho de desconstrução que busca desmantelá-la e reinscrevê-la, isto é, não destruí-la mas dar-lhe uma estrutura e funcionamento diferentes.

Além da relação hierárquica, a interdependência entre binarismos é outro elemento presente nas análises, que prioriza consequentemente uma visão relacional. Como salienta Guacira LouroLOURO, Guacira. 2004a. Um corpo estranho - ensaios sobre sexualidade e teoria queer. Belo Horizonte: Autêntica . (2004b: 43LOURO, Guacira Lopes. 2004b. “Conhecer, pesquisar, escrever...”. Texto apresentado no Encontro da Associação Nacional de Pós-Graduação em Educação. ),

Trabalhando para mostrar que cada polo contém o outro, de forma desviada ou negada, a desconstrução indica que cada polo carrega vestígios do outro e depende desse outro para adquirir sentido. A operação sugere também o quanto cada polo é, em si mesmo, fragmentado e plural.

Neste sentido, os binarismos se fazem presentes nas análises na medida em que os discursos carregam em si marcas de construções binárias que, mais do que estabelecerem lugares de contradição, expõem uma espécie de interdependência, sempre relacional.

Por último, em relação às operações metodológicas realizadas sobre/com as imagens, importa destacar o lugar da linguagem. De acordo com Butler (2013BUTLER, Judith. 2013. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Trad. Renato Aguiar. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira.), a linguagem nos subjetiva, nos interpela, seja por meio da produção de gênero ou de sexualidade, tudo ressignifica através da linguagem, e é por meio dela que a própria força subversiva de nossas análises encontra possibilidade de existência, mediante o questionamento das produções linguísticas imagéticas.

A partir das considerações sobre imagens, desconstrução, discurso e linguagem, buscamos delimitar de que forma se deu nosso olhar sobre as imagens dos Tumblrs analisados. Cabe, a seguir, apresentar as análises.

Corpo lésbico, corpo feminino: A sexualidade em relação com o gênero

Um ponto comum entre todas as imagens analisadas é a presença e o protagonismo das mulheres. São figuras de mulheres, sobre mulheres, provavelmente muitas delas feitas para mulheres (tendo em vista a vasta quantidade de fotografias e desenhos com enfoque na relação amorosa-sexual entre este gênero). Sendo assim, elas nos apresentam, em um primeiro momento, uma distinção. Com base na diferença entre o corpo nomeado masculino e feminino, uma série de outras diversidades visuais foram constituídas como próprias - e exclusivas - de cada gênero. Estas, discursivamente construídas, se fazem presentes de diversas formas nas estampas, sendo uma delas por meio do corpo dos indivíduos que as compõem. Neste sentido, indagamos: Como estes corpos, que emergem das imagens, são (ou não) tornados sujeitos do gênero feminino? Como se constituem generificados e consequentemente se relacionam com a questão da sexualidade, para além de seu “destino” biológico?

Judith Butler (2013BUTLER, Judith. 2013. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Trad. Renato Aguiar. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira.) indica o gênero como o fator que possibilita a um corpo existir, produzindo inteligibilidade. Butler (2000: 154) introduz o conceito de performatividade, do filósofo inglês J.L. Austin, nos estudos de gênero e sexualidade, definindo-o como “prática reiterativa e citacional pela qual o discurso produz os efeitos que ele nomeia”. Reiterativa, uma vez que é resultado de um processo constantemente reafirmado sobre os corpos e as existências, das mais diversas formas e por meio de diferentes âmbitos, organizações e instituições. Citacional, porque, enquanto prática, precisa sempre de um referente, o qual está destinada a citar. Entretanto, antes de torná-lo um conceito sobre um fenômeno social estanque, são justamente estas duas características que produzem a condição para que o caráter normativo da performatividade seja exposto e, sobretudo, para que seu efeito crie as condições para a mudança. Como prática, a reiteração e a citacionalidade distanciam-se de uma reprodução perfeita, exata e inteira, o que implica uma produção que já não pode ser considerada plenamente “mais do mesmo”.

Por meio da performatividade, a autora expõe o caráter construtivo não apenas dos discursos sobre gênero, mas coloca o próprio sexo e a sexualidade como efeitos da linguagem, além de defender a inexistência destes fora do discurso que os nomeia e que consequentemente os constitui (Butler, 2000BUTLER, Judith. 2000. “Corpos que Pensam: sobre os limites discursivos do sexo”. In: LOPES, Guacira Louro (org.). O Corpo Educado: pedagogias da sexualidade. Trad. Tomaz Tadeu Silva. Belo Horizonte: Autêntica.). A partir do conceito de performatividade butleriano, Preciado (2002PRECIADO, Paul B. 2002. Manifiesto contra-sexual. Madrid: Opera Prima.) localiza, na nomeação do corpo, uma espécie de mesa de operações performativa, porque seus efeitos delimitam os corpos, as funcionalidades dos órgãos e os limites entre um funcionamento “normal” e “perverso”. Assim, o corpo nascido apenas com vulva é definido como uma “menina” e, em virtude disto, deslocado para um lugar regido por expectativas de feminilidade. Como efeito, tal corpo é obrigado a encenar e, dessa forma, citar o gênero feminino para se manter viável em termos sociais, além de fazer uso de seus órgãos genitais, como a vulva, dentro das delimitações de gênero impostas a estes.

A delimitação da feminilidade se dá, para o autor, em um contexto histórico em que disciplina, punição e regulação estão implicadas. Para Preciado (2008PRECIADO, Paul B. 2008. Testo Yonqui. Madrid: Espasa Calpe S.A.), o poder que rege o gênero e a sexualidade perpassa desde as instituições disciplinadoras (prisão, escola, igreja, quartel, hospital etc.) até os próprios textos científicos, as estatísticas e as questões geográficas, assim como os manuais, constituindo as verdades do gênero normal e também do anormal, da sexualidade e da raça.

Os discursos de (re)produção do gênero mostram seus efeitos nas imagens dos Tumblrs.

Figura 1

Figura 2

Figura 3

Nestas imagens, discursos de feminilidade emergem através da repetição de atos estilizados (Butler, 2013BUTLER, Judith. 2013. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Trad. Renato Aguiar. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira.). Isto quer dizer que poses, roupas, cabelos e corpos que compõem as fotografias são constituídos por uma série de discursos sobre o que é ser feminina. Nesse processo, tais corpos também jogam com o que pode ser lido como sensual, sexy, excitante, dentro dos limites de gênero. Tais limites não são atemporais; fazem sentido e produzem efeitos em um determinado tempo e contexto.

Assim, o feminino constitui-se não como efeito de diferenças biológicas, mas sim de uma educação do corpo, de discursos que constituirão os limites entre masculino e feminino, temporalmente e culturalmente localizados, mas que são naturalizados justamente porque compõem saberes que já possuem valor de verdade. São estes saberes que permitem ler os corpos das imagens do Tumblr como femininos, num reconhecimento quase instantâneo. Também é dessa forma que o efeito da norma naturaliza-se e é invisibilizado, ocultando que tais corpos necessitam de uma série de investimentos, aprendizagens e limites para estarem ali.

A exposição do seio em “1” permite classificar este corpo como feminino. O resultado naturalizador da língua, portanto, torna-se claro. Assim, ao ver o seio, já descartamos, via de regra, a possibilidade de identificar o gênero masculino. A exibição do seio evoca a sensualidade na medida em que tal parte do corpo feminino é tida como zona erógena e mostrá-la é algo da ordem do privado. Sua apresentação, portanto, está vinculada com o proibido. Sua relação com a nudez feminina é notória - diferentemente da masculina, em que todo o dorso do corpo poderá estar à vista na rua sem ser considerado nudez - e socialmente a nudez feminina é, ao mesmo tempo, exposta - vide produtos midiáticos como pornografias, revistas, audiovisuais, publicidades - e velada - servindo algumas vezes de motivo socialmente legitimado para o estupro de mulheres5 5 Pesquisa do IPEA causou polêmica ao trazer em seu resultado que 65% das/os brasileiras/os concordavam com a afirmativa “mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas”. Posteriormente, foi revelado que houve um erro na contagem, e a porcentagem caiu para 26%. Mesmo o dado compreendendo uma minoria, ainda assim revela uma crença social. Disponível em: http://g1.globo.com/brasil/noticia/2014/04/ipea-diz-que-sao-26-e-nao-65-os-que-apoiam-ataques-mulheres.html [Acesso em: 13.03.2015]. - e neste jogo é produzida.

Em “2”, a roupa branca, que parece uma camisola, pode remeter a aspectos de uma pureza e inocência infantis, associadas às mulheres e tidas como sensuais, porque outros elementos entram em jogo. Entre estes elementos estão: o tamanho da roupa, revelando boa parte do corpo da menina/mulher; a pele extremamente branca;6 6 Sant’Anna (1995) evidencia que em 1900 muitas publicidades já focavam em produtos de beleza que buscavam “branquear a pele” - e daqui provêm discursos racistas que atribuem à mulher bem branca a pureza, a inocência e uma beleza clássica. os cabelos compridos e coloridos. Todos estes elementos, em conjunto, constituem a feminilidade na imagem, assim como as pernas depiladas, que por muito tempo não foram uma preocupação feminina, mas que hoje podem tornar abjeto7 7 Abjeto é o corpo cuja materialidade “não importa”. Ele impõe os limites entre o normal e o anormal, expondo sua necessidade de existência para que o normal se constitua como tal. No limite, corpos abjetos são aqueles cujo próprio direito à vida é questionado (Butler, 2004). o corpo da mulher que não as tem assim.

Em “3”, o que está à mostra é uma parte da coxa e da bunda, e também a calcinha, que expõe em um de seus nomes sua mais forte característica: roupa íntima. Compõe-se, assim, uma imagem da ordem do privado, do íntimo. A posição do corpo arqueado e a região inferior “empinada” podem fazer alusão ao ato sexual em que à mulher é designado o lugar de penetrada/passiva, lugar este que é constituído segundo uma lógica cis-heteronormativa, em que à mulher é designada a passividade. Tal posição do corpo também pode dizer respeito à utilização do salto alto para elevar a bunda, e consequentemente à crença de que o corpo feminino tem que estar com “tudo em cima”. A magreza e a branquitude adentram esta lógica como elementos indispensáveis ao corpo belo feminino. As meias até as coxas e a blusa larga, assim como o local em que a mulher se posiciona (a cama), jogam com a relação entre roupa para dormir e sexo, e se referem a uma certa inocência erótica em razão da mistura de características mais adultas (a nudez) e infantis/juvenis.

A inocência, elemento que compõe, pelo menos, duas das três imagens apresentadas, tem uma importante relação com a construção de uma feminilidade normativa e, por isso, tem um passado histórico. Jane Felipe (2006FELIPE, Jane. 2006. “Afinal, quem é mesmo pedófilo?”. Cadernos Pagu, Campinas. N. 26, p. 201-223.) evidencia que em diversas sociedades, em momentos históricos, a associação entre sedução e o corpo infantil foi feita. A autora observa que uma série de produtos midiáticos acionaram e ainda acionam corpos infanto-juvenis de forma extremamente sedutora, em um processo nomeado por ela de pedofilização. Seja nas roupas, nas expressões, nas falas, seja nos modos de se comportar e de agir, crianças e jovens aprendem a chamar a atenção das/os adultas/os agindo como pequenas/os adultas/os, e assim também são erotizados. O corpo infantil é apresentado como objeto de consumo e desejo para o deleite masculino, principalmente no que diz respeito às jovens meninas, o que pode acabar por levá-las a pautar sua valorização social no embelezamento do corpo e nos trejeitos das mulheres adultas (Felipe, 2006).

O fenômeno social descrito acima, ao qual Felipe (2003FELIPE, Jane. 2003. “Erotização dos corpos infantis”. In: LOURO, Guacira; FELIPE, Jane & GOELLNER, Silvana (orgs.). Corpo, gênero e sexualidade: um debate contemporâneo na educação. Petrópolis: Vozes. p. 54-66., 2006) chamou de “pedofilização”, também funciona em outra direção. Na medida em que crianças são convocadas a adotar trejeitos adultos, mulheres adultas, por sua vez, são instadas a utilizar a infância como fetiche, investindo nas potencialidades de sedução através da infantilização em seus corpos. Denise Sant’Anna (1995SANT’ANNA, Denise Bernuzzi de. 1995. “Cuidados de si e embelezamento feminino: fragmentos para uma história do corpo no Brasil”. In: SANT’ANNA, Denise Bernuzzi de. Políticas do Corpo. São Paulo: Estação Liberdade.) evidencia que, antes dos anos 1950, conselheiros da beleza feminina (médicos e escritores moralistas) já prescreviam que a aparência feminina deveria expor uma alma pura, com vistas a manter o corpo belo, fecundo e limpo. Assim, fez-se desejada e celebrada na mulher a demonstração de pureza. A relação de tal característica com a infantilidade se atualiza ainda hoje e, nesse jogo, a sensualidade e a beleza da mulher se constituem nas imagens “2” e “3”.

Em razão das possibilidades que os corpos das imagens “1”, “2” e “3” acionam, não apenas o gênero entra em questão, mas também a sexualidade se faz aparente. Nestas fotos, em uma primeira análise, pode-se dizer que os discursos que delas emergem não escapam às normas de gênero e, então, a sexualidade pode não ser problematizada. Isto porque há uma suposta linearidade entre gênero e sexualidade (Louro, 2009LOURO, Guacira Lopes. 2009. “Heteronormatividade e Homofobia”. In: JUNQUEIRA, Rogério Diniz (org.). Diversidade Sexual na Educação: problematizações sobre a homofobia nas escolas. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria da Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade/ Unesco.), sendo que, nesta relação, caberá ao gênero produzir a falsa sensação de estabilidade por meio da dicotomia formada por dois sexos fixos e coerentes, além de complementares: macho/fêmea, homem/mulher, masculino/feminino, pênis/vulva. Assim, a matriz heterossexual permanecerá assegurada, constituindo uma ordem compulsória (Butler, 2013BUTLER, Judith. 2013. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Trad. Renato Aguiar. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira.). Esta mesma matriz dificulta o questionamento sobre o gênero que interpela aqueles corpos e, consequentemente, também naturaliza sua (hetero)sexualidade.

Contudo, em outro sentido, a sexualidade se apresenta como elemento que desestabiliza os discursos de gênero até então emergentes destas fotografias. Em sua relação com o erotismo, a performatividade de tais corpos mobiliza “fantasias e fantasmas: situações, referências, imagens, fragmentos de memória e sensações que, mesmo sendo gestados em torno e no campo das normatividades, apontam para além delas” (Gregori, 2008: 442GREGORI, Maria Filomena. 2016. “Risco e êxtase nas práticas eróticas”.Cadernos Pagu, Campinas, SP. N. 47, p. 424-444, nov. ISSN 1809-4449. ). Consequentemente, em sua relação com o desejo, o erotismo constituinte das imagens joga com as fronteiras da (hetero)sexualidade, atravessando-as (: 442) ou, pelo menos, provocando-as, e o faz principalmente de acordo com o local de onde são contempladas: Tumblrs de/sobre mulheres lésbicas. Neste cenário, a lesbianidade enquanto sexualidade emerge como possibilidade. Assim, em um contexto afeito a transgressões sexuais, como propõe a construção erótica (: 442), a lesbianidade pode instituir-se como mais uma transgressão do erótico, porque implica a constituição da sexualidade lésbica como pressuposto nos corpos ali expostos. Neste sentido, mesmo os corpos que se formam segundo uma performatividade de gênero feminizada podem, no contexto dos Tumblrs de mulheres autoidentificadas lésbicas, insurgir-se e se tornar questionadores da mesma matriz (heterossexual) que, em um primeiro momento, parecem (re)afirmar.

Com base nas imagens analisadas, o erotismo e a sensualidade compõem uma certa feminilidade normativa, já que performativa, ao passo que, ao provocarem os limites da sexualidade, possibilitam que a heterossexualidade já não seja um pressuposto nos corpos ali expostos pelo lugar que ocupam. Desta maneira, a própria construção de gênero hegemônica entra em questão, uma vez que, em uma perspectiva interseccional, um elemento (des)estabiliza o outro, ou seja, se estes corpos, constituídos com base em uma feminilidade hegemônica, já não sustentam a heterossexualidade, a tríade mulher-feminina-heterossexual sofre uma ruptura, desestabilizando sua lógica relacional.

Entretanto, há outras formas de resistência que se configuram ainda pela via performativa, e que este artigo propõe desdobrar. A seguir, a relação entre gênero e sexualidade será abordada segundo uma outra possibilidade.

Corpo feminino, corpo lésbico: o gênero em relação com a sexualidade

Voltamos aqui nosso olhar analítico para outras imagens do Tumblr, a partir sobretudo do seguinte questionamento: a citacionalidade, condição própria da performatividade, poderia abrir brechas para se escapar das normas? Para pensar nesta questão, recorremos a corpos que nos possibilitam dar enfoque aos desvios da norma, aos pontos em que a performatividade de gênero e sexualidade expuseram, de forma talvez mais imediata, seu caráter de construção histórico-social.

Figura 4

Figura 5

As imagens apresentadas revelam dois corpos. Em “4”, os seios, a cintura fina, os cabelos longos, a ausência de pelos e a lingerie constituem tal corpo como sujeito do feminino, (re)citando aspectos que se repetem nos corpos feminizados. Entretanto, em “5”, os peitos são pequenos, mas em alguma medida avantajados na primeira e na terceira imagem e, neste ponto, referenciais de uma feminilidade podem não encontrar citacionalidade. Ademais, a magreza, destituída de curvas, também resiste à feminilidade, ao passo que a ausência de pelos oferece indícios de um corpo que não é sujeito do masculino. Dessa forma, esta imagem mais escapa da tentativa de torná-la sujeita de um gênero do que se ajusta a ela.

Na esteira do pensamento de Butler (2013BUTLER, Judith. 2013. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Trad. Renato Aguiar. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira.), os indivíduos sempre escapam de serem tornados sujeitos de um gênero. De fato, por meio da citacionalidade, a performatividade contribui não só para que seu caráter normativo seja exposto, mas também para que o efeito que produz crie a possibilidade de mudança. Assim, desmancham-se dicotomias, e torna-se claro que elas estão implicadas umas nas outras, isto é, que um elemento não só precisa, mas cita o outro em alguma medida para se fazer dicotômico e assim existir, criando probabilidades de desmanche de tal sistema. Neste sentido, em “4” e “5” há escapes potentes para pensar o gênero feminino e a lesbianidade.

Apesar de apresentar um corpo em alguma medida normativo em termos de feminilidade, na imagem “4” localizamos o primeiro escape. O corpo com dildo está em uma posição sensual - as mãos nos seios, as pernas abertas - vestindo roupas provocativas, e estas compõem uma espécie de feminilidade normativa, além dos outros elementos corporais já citados. Contudo, o dildo proporciona um outro efeito à imagem. Já não é apenas uma mulher em uma pose sensual e feminizada.

Algumas correntes feministas e de ativismo lésbico compreendem o dildo como a reprodução do pênis e, dessa forma, classificam o sexo com a prótese como heteronormativo. Assim, ao recorrerem ao dildo, lésbicas estariam indo ao encontro de discursos que retiram o estatuto de sexo da relação sexual entre duas mulheres, porque, nessa lógica, o sexo só existe quando há um pênis que penetra uma vagina.

Tendo como ponto de partida os argumentos acima, Preciado (2002PRECIADO, Paul B. 2002. Manifiesto contra-sexual. Madrid: Opera Prima.) propõe compreender o dildo para além da afirmação imediata de seu caráter mimético. Para tanto, recorre ao estatuto performativo da prótese, para problematizá-la como algo que expõe o caráter construído daquilo que, em um primeiro momento, buscou imitar. Ao simular o pênis e sua performance - e sobretudo performatividade - sexual, o dildo desloca do corpo (e do pênis) seu estatuto de produtor de prazer “natural”, e evidencia a possibilidade de modificação protésica do contorno do corpo. No limite, o autor infere que o dildo, acoplado ao corpo, indica que os órgãos que naturalizamos como sexuais (e como femininos e masculinos) “sofrem um processo semelhante de transformação plástica”8 8 “[...] han sufrido ya un proceso semejante de transformación plástica”. (Preciado, 2002, p. 63, tradução nossa). Assim, antes de “imitar” o pênis, o dildo mostra como se naturaliza e se constitui a sua autenticidade, porém, mais do que isso: o dildo, ao expor a construção do pênis como órgão sexual substituível, oportuniza que a própria finalidade do pênis seja questionada. Encontra-se, então, possibilidade para criação.

Desta forma, para Preciado (2002PRECIADO, Paul B. 2002. Manifiesto contra-sexual. Madrid: Opera Prima.), o dildo acoplado ao corpo desloca e desterritorializa o lugar de produção do desejo e do prazer, isto é, retira-o do orgânico e o produz enquanto construção. O prazer que o corpo sente ao utilizar o dildo não pertence a ele (corpo), antes, apropria-se dele, limita-se a uma norma que dita como se dá este prazer. O autor evidencia que a prótese desperta a questão da falsidade e da simulação no sexo, convocando os indivíduos que fazem uso dele a se interrogarem sobre a subjetividade e a verdade do sexo.

Com o dildo “extraído” do corpo masculino, é o próprio estatuto de natural deste corpo (masculino) que entra em questão. Para Preciado (2002PRECIADO, Paul B. 2002. Manifiesto contra-sexual. Madrid: Opera Prima.), a prótese, portanto, possibilita a desconstrução da heterossexualidade enquanto referência, impossibilitando ao pênis permanecer no lugar de origem da diferença sexual.9 9 Torna-se evidente o caráter de origem das diferenças sexuais atribuído ao pênis quando olhamos para certas compreensões a respeito dele e da vulva no corpo. Com frequência, o pênis é percebido como “algo a mais”, enquanto a vulva seria a “falta de”. Benitez (2009) explica que, em filmes com travestis femininas, as chamadas publicitárias “mulheres com algo a mais” ou “fêmeas com vários centímetros a mais de satisfação” reinam. Nessa relação, a vulva se dá como ausência do pênis, enquanto este se dá como presença (e não como ausência da vulva). Outrossim, o autor sugere que o dildo mostra a possibilidade de que diferentes órgãos/objetos possam ser ressignificados enquanto sexuais por sua proximidade semântica, complementando que, nessa relação, “todo es dildo, incluso el pene” (: 65). Assim, o dildo ultrapassa, em performance, performatividade e estética aquilo que buscou antes imitar, tornando-se o referente perfeito, inclusive para o pênis. A tecnologia supera o corpo, retirando deste sua verdade de origem e fonte primeira de prazer.

No corpo em que o dildo está acoplado (imagem “4”), a sua presença permite ressignificar mais uma questão não abordada por Preciado (2002PRECIADO, Paul B. 2002. Manifiesto contra-sexual. Madrid: Opera Prima.). Maria Gregori (2003GREGORI, Maria Filomena. 2003. “Relações de violência e erotismo”. Cadernos Pagu. N. 20, p. 87-120. : 100), ao problematizar as performances no erotismo contemporâneo, pergunta-se por que, diante de tantas subversões, da busca para violar o “instituído” (: 100), uma característica permanece hegemônica: a feminização do corpo a ser “violado”. Ainda que a autora reconheça que este corpo pode ser tanto de uma mulher quanto de um homem, denuncia que ambos os corpos precisam passar por um processo de feminização para que ocupem este lugar. Entretanto, ao olharmos para a imagem “4”, discursos que atribuem a função penetrativa/ativa ao corpo nascido com pênis e, posteriormente masculinizado, entram em jogo com discursos de uma sensualidade e de um corpo efeminado, possibilitando a ressignificação de ambos. Como argumenta Butler (2004BUTLER, Judith. 2004. Lenguage, poder e identidad. Trad. Javier Sáez e Paul B. Preciado. Madrid: Editorial Sintesis.: 117), “se o texto atua uma vez, poderá atuar novamente, e é possível que dessa vez o faça contra o ato precedente, sendo que esta re-significação abre possibilidades a uma leitura alternativa da performatividade e da política”. Assim, a presença do dildo na imagem revela, no limite, que no corpo feminizado podem haver escapes a essa lógica feminino-masculino, mostrando não apenas o efeito constituidor de tais categorias, mas também sua precariedade. Como efeito, a função de “imitação” do dildo é sobrepujada, e sua presença subverte a função sexual hegemônica atribuída ao corpo que o porta. Consequentemente, o feminino, na imagem, alarga-se e se (re)faz.

Contudo, mesmo a presença do dildo na imagem “4” parece não gerar dúvidas a respeito do gênero impresso no corpo que o comporta. Na imagem “5”, porém, há outra possibilidade. Nela encontramos um corpo que dificulta o processo de tornar-se sujeito de (um) gênero. As características citadas anteriormente, aliadas ao fato de a imagem ter sido compartilhada em um Tumblr dedicado a lésbicas butch, favorecem a leitura de tal indivíduo por meio do gênero feminino. A certeza, contudo, não parece se fazer presente.

Ao relembrarmos os escritos de Foucault (2010FOUCAULT, Michel. 2010. O governo de si e dos outros. Trad. Eduardo Brandão. São Paulo: Martins Fontes.) sobre enunciados performativos, entra em questão o estatuto de quem faz a enunciação. Este corpo cita que gênero? Teria ele autoridade para citar o gênero feminino? Os gestos que o constituem são masculinizados, a forma como tira a camisa, o cabelo curto, o rosto sério e que encara o/a espectador/a, as pernas abertas numa atitude de imposição espacial exagerada, parecem deslocar este corpo. Contudo, tais gestos e a constituição corporal não permitem uma leitura indubitável do gênero masculino. Nas fronteiras, este corpo cita uma série de discursos contraditórios entre si, emergindo não apenas como possibilidade, mas como uma crítica, como uma exposição da precariedade do gênero enquanto produtor e, consequentemente, classificador do corpo. Pode, sem dúvida, ser deslocado para o lugar de abjeto, porém, ao ser protagonista de um ensaio fotográfico sensual, provoca sua existência como corpo/sujeita que desperta desejo.

Desejo, portanto, é uma das formas pelas quais a (homo)sexualidade se faz aparente. Ainda no caso da imagem “5”, é sabido que a desestabilização do gênero pode provocar o questionamento da sexualidade, ou seja, discursos que articulam a lesbianidade com corpos que performatizam a masculinidade podem ser acionados. Entretanto, no corpo exposto na referida imagem tal performatividade de gênero (re)cita elementos de uma masculinidade feminizada (ou de uma feminilidade masculinizada, talvez) e esta construção é atravessada por uma sexualização, no sentido de tornar este corpo sujeito de desejo.10 10 Ainda que se possa assumir que esta é uma construção andrógina, nos parece importante situar que este corpo, para ser produzido enquanto andrógino, precisa contradizer-se em termos de feminilidade e masculinidade, uma vez que, segundo a perspectiva teórica com a qual trabalhamos, não há existência generificada fora desse jogo (Butler, 2013). Assim, ao mesmo tempo em que há um esforço de subversão, há também um esforço de integração (Gregori, 2003GREGORI, Maria Filomena. 2003. “Relações de violência e erotismo”. Cadernos Pagu. N. 20, p. 87-120. ), de forma a fazer o corpo que vemos desejável. Talvez por isso a ausência de alguns elementos considerados “demasiadamente masculinos”, como a presença de pelos ou de músculos avantajados. Desta forma viola-se o instituído, mas não demasiadamente, não a ponto de tornar inviável qualquer possibilidade de integração.

Na imagem “4”, em outro sentido, pode ser invocada a associação da utilização do dildo com o sexo lésbico, associação que já acontecia nos stag films do início do cinema (Abreu, 2012), que eram feitos exclusivamente para o público masculino. Neste sentido, os stag films marcam o desenvolvimento de uma lógica cis-heteronormativa que fetichiza as relações sexuais entre mulheres. Contudo, é preciso assumir, conforme a perspectiva teórica que aqui se configura, que na medida em que a heterossexualidade emerge como elemento questionável nestas imagens, as normas que regem as performatividades de gênero e sexualidade são colocadas também em questão. Assim, as imagens deixam entrever a precariedade da dicotomia heterossexual-homossexual, visto que, em “4” o corpo que comporta o dildo é não apenas um corpo feminizado, sensualizado, mas heterossexualizado (e, consequentemente, constituído no lugar de passivo) na medida em que o dildo é escondido. Quando o dildo é exposto, provoca uma contradição, e assim a própria lógica heterossexual e heteronormativa pode ser desestabilizada. O corpo sensual, sujeito de desejo e feminizado é o corpo que pode/vai penetrar.

Dessa forma, os corpos das imagens “4” e “5” podem ter seu estatuto heterossexual colocado em questão sobretudo em virtude das lógicas de gênero que são desestabilizadas nos elementos aqui trabalhados. Assim, a própria sexualidade é problematizada, a nosso ver, por duas vias: primeiramente, pelo lugar que as imagens ocupam enquanto oriundas de Tumblrs de mulheres lésbicas; em segundo lugar, pela via de uma lógica cis-heteronormativa que, mesmo quando a serviço de fetichizar tais corpos ou torná-los abjetos, inevitavelmente mostra sua ineficácia como regime que pretensamente produz a inteligibilidade de todos os corpos, gêneros e sexualidades humanas. Mais uma vez, a tríade mulher-feminina-heterossexual sofre uma ruptura, se não propícia à criação, pelo menos produtora de uma importante resistência.

Considerações finais

A problematização do corpo em uma perspectiva focada na sua construção sócio-histórico-cultural acaba por deslocá-lo de compreensões biologicistas e naturalizantes. Dessa forma, assumimos o corpo como composto não apenas de órgãos, pele, pelos e músculos, mas também de cor, formato e gestualidades. Como efeito, as construções de gênero e sexualidade trabalharam de forma interseccional nos corpos das imagens selecionadas, constituindo-os enquanto sujeitos generificados e sexualizados. Com isto, foi possível problematizar esse processo, evidenciando principalmente dois movimentos. O primeiro situou o quanto a sexualidade pode emergir como elemento desestabilizador do gênero, ainda que este seja constituído por meio de uma feminilidade hegemônica, conforme foi possível evidenciar nas imagens “1”, “2” e “3”. Nestas, a matriz heterossexual sofreu deslocamentos em razão do lugar em que estas imagens foram publicadas, isto é, em Tumblrs de/sobre mulheres lésbicas. Consequentemente, a construção de feminilidade, em alguma medida, desestabilizou-se, posto que construída a partir de uma sexualidade (presumida) lésbica, em contraponto com a matriz heterossexual (também presumida) que constitui a cis-heteronormatividade.

O segundo movimento debruçou-se sobre o gênero como elemento desestabilizador da (hetero)sexualidade. Neste sentido, tanto o dildo na imagem “4” quanto o próprio corpo orgânico na imagem “5” desafiaram os pressupostos de uma feminilidade que respalda a construção hegemônica do gênero feminino. Desta forma, a sexualidade como pressuposto heterossexual acabou deslocada, o que foi reforçado pelo local de onde as imagens emergiram: os Tumblrs. Ainda nesta segunda análise evidenciamos que, por meio de uma construção de gênero atravessada pela produção do desejo, tais corpos resistiram ao lugar de abjetos e, com isto, possibilitaram uma inteligibilidade mais ampliada a respeito do gênero e também da sexualidade.

Diante destes resultados, importa ressaltar ainda que as análises não procuraram “revelar” o gênero ou a sexualidade “real” dos corpos, mas sim movimentar possibilidades que, de alguma forma, romperam com ou, quiçá, fraturaram a matriz cis-heterossexual que produz hegemonicamente os corpos. De fato, tais problematizações acerca das imagens aqui expostas pretenderam permanecer no rol de possibilidades. Das imagens, como já foi mencionado, não buscamos limites, mas sim possibilidades que se constituem enquanto tais porque investimos em mostrar o caráter construído de muitas das naturalizações expostas.

Por fim, importa mencionar que o trabalho, na íntegra, foi disponibilizado a todas as usuárias dos Tumblrs analisados, e divulgado para toda a comunidade do Tumblr através de uma página da pesquisa. Esta foi a forma que encontramos de oferecer um retorno e de agradecer a estas usuárias por manterem suas páginas acessíveis a nós.

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  • 1
    Muitas dessas páginas seguiam umas às outras, e uma característica comum de todas elas consistiu no interesse apenas em páginas de/sobre lesbianidade. Sobre isso, Boyd e Ellison explicam que, ainda que as SNSs (Social Network Sites) possam ser criadas para agregar diversos grupos de pessoas, com frequência encontram-se segregações dentro delas.
  • 2
    Termo da língua inglesa utilizado para referenciar um estilo de vestimenta e/ou comportamentos que, num gradiente de expressão de gênero, aproximam-se da masculinidade.
  • 3
    Disponível em: http://www.tumblr.com/policy/en/community [Acesso em: 28.04.14].
  • 4
    Como afirma Paraíso (2012: 38), “somente descrevendo, e em detalhe, podemos compreender o que somos, o que fizeram de nós […]. Enfim, só descrevendo, e em detalhe, podemos encontrar estratégias para nos transformarmos em alguém diferente do que nos fizeram ser”.
  • 5
    Pesquisa do IPEA causou polêmica ao trazer em seu resultado que 65% das/os brasileiras/os concordavam com a afirmativa “mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas”. Posteriormente, foi revelado que houve um erro na contagem, e a porcentagem caiu para 26%. Mesmo o dado compreendendo uma minoria, ainda assim revela uma crença social. Disponível em: http://g1.globo.com/brasil/noticia/2014/04/ipea-diz-que-sao-26-e-nao-65-os-que-apoiam-ataques-mulheres.html [Acesso em: 13.03.2015].
  • 6
    Sant’Anna (1995SANT’ANNA, Denise Bernuzzi de. 1995. “Cuidados de si e embelezamento feminino: fragmentos para uma história do corpo no Brasil”. In: SANT’ANNA, Denise Bernuzzi de. Políticas do Corpo. São Paulo: Estação Liberdade.) evidencia que em 1900 muitas publicidades já focavam em produtos de beleza que buscavam “branquear a pele” - e daqui provêm discursos racistas que atribuem à mulher bem branca a pureza, a inocência e uma beleza clássica.
  • 7
    Abjeto é o corpo cuja materialidade “não importa”. Ele impõe os limites entre o normal e o anormal, expondo sua necessidade de existência para que o normal se constitua como tal. No limite, corpos abjetos são aqueles cujo próprio direito à vida é questionado (Butler, 2004).
  • 8
    “[...] han sufrido ya un proceso semejante de transformación plástica”.
  • 9
    Torna-se evidente o caráter de origem das diferenças sexuais atribuído ao pênis quando olhamos para certas compreensões a respeito dele e da vulva no corpo. Com frequência, o pênis é percebido como “algo a mais”, enquanto a vulva seria a “falta de”. Benitez (2009) explica que, em filmes com travestis femininas, as chamadas publicitárias “mulheres com algo a mais” ou “fêmeas com vários centímetros a mais de satisfação” reinam. Nessa relação, a vulva se dá como ausência do pênis, enquanto este se dá como presença (e não como ausência da vulva).
  • 10
    Ainda que se possa assumir que esta é uma construção andrógina, nos parece importante situar que este corpo, para ser produzido enquanto andrógino, precisa contradizer-se em termos de feminilidade e masculinidade, uma vez que, segundo a perspectiva teórica com a qual trabalhamos, não há existência generificada fora desse jogo (Butler, 2013BUTLER, Judith. 2013. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Trad. Renato Aguiar. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira.).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Abr 2019
  • Data do Fascículo
    Abr 2019

Histórico

  • Recebido
    01 Nov 2017
  • Aceito
    22 Ago 2018
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