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Coletividade e iniciativas empreendedoras locais no desenvolvimento de um mercado tradicional municipal

Collectivity and local entrepreneurialism in the development of a traditional municipal market

Resumos

Neste artigo, analisamos o mercado da tecelagem tradicional do município de Resende Costa (MG), resultado da articulação entre ações coletivas e empreendedoras locais. Por meio da sociologia econômica e da economia espacial, podemos identificar inter-relações entre ações privadas e coletivas. Para análise desse mercado, foram aplicados 664 questionários domiciliares e 69 comerciais em uma amostra intencional de entrevistados que se autodenominaram diretamente envolvidos com o mercado da tecelagem tradicional. A partir destes, inicialmente, observou-se, nas últimas duas décadas, que tal mercado passou por uma série de transformações organizadas burocraticamente e controladas socialmente pelos proprietários dos estabelecimentos comerciais. Este artigo pretende contribuir com uma análise da sociologia da organização econômica entre laços fortes e iniciativa empreendedora em um território. O resultado desta análise indica que o mercado foi influenciado, inicialmente, por ações estruturantes do Estado, por uma produção dispersa nos domicílios, pela divisão do trabalho e pela organização burocrática comercial que controla seus serviços produtivos para atender, por um lado, as pressões de consumo e, por outro lado, a solidariedade entre indivíduos de um território.

Desenvolvimento local; Redes sociais; Empreendedores locais; Imersão social da ação econômica; Sociologia das organizações


This paper analyzes the traditional weaving market in the municipality of Resende Costa (MG) as a result of the relationship between collective action and local entrepreneurs. Through economic sociology and economy of space, we can identify interrelationships between private and collective actions. For the analysis of this market 664 questionnaires were applied in homes and 69 in commerce to gain a sample of those directly involved with the traditional weaving market. From these we could see that in the last two decades this market has undergone a series of organized transformations bureaucratically and socially controlled by the owners of commercial establishments. This article provides an analysis of the sociology of economic organization between strong ties and entrepreneurial initiative in a territory. The result of this analysis indicates that the market was influenced initially by structuring actions of the State, by a dispersed production in homes, by the division of labor and by a commercial bureaucratic organization that controls its commercial production services to meet on the one hand, the pressures of consumption and on the other hand, solidarity among people in an area.

Local development.; Social networking; Local entrepreneurs; Social Embeddedness of economic action; Sociology of organizations


ARTIGOS

Coletividade e iniciativas empreendedoras locais no desenvolvimento de um mercado tradicional municipal1 1 Os pesquisadores contaram com apoio financeiro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), por meio do edital MCT/CNPQ 03/.

Collectivity and local entrepreneurialism in the development of a traditional municipal market

Gustavo Melo SilvaI; Jorge Alexandre Barbosa NevesII

IDoutor em Sociologia pela Universidade Federal de Minas Gerais. Professor do Departamento de Ciências Administrativas e Contábeis da Universidade Federal de São João del-Rei, São João del-Rei/MG/Brasil. Endereço: Universidade Federal de São João del-Rei, CTan, Prédio Direito. São João del-Rei/MG. CEP: 36300-000. E-mail: gustavomelosilva@yahoo.com.br

IIDoutor em Sociologia pela University of Wisconsin (Madison/EUA). Professor do Departamento de Sociologia e Antropologia da Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG, Belo Horizonte/MG/Brasil. E-mail: jorgeaneves@gmail.com

RESUMO

Neste artigo, analisamos o mercado da tecelagem tradicional do município de Resende Costa (MG), resultado da articulação entre ações coletivas e empreendedoras locais. Por meio da sociologia econômica e da economia espacial, podemos identificar inter-relações entre ações privadas e coletivas. Para análise desse mercado, foram aplicados 664 questionários domiciliares e 69 comerciais em uma amostra intencional de entrevistados que se autodenominaram diretamente envolvidos com o mercado da tecelagem tradicional. A partir destes, inicialmente, observou-se, nas últimas duas décadas, que tal mercado passou por uma série de transformações organizadas burocraticamente e controladas socialmente pelos proprietários dos estabelecimentos comerciais. Este artigo pretende contribuir com uma análise da sociologia da organização econômica entre laços fortes e iniciativa empreendedora em um território. O resultado desta análise indica que o mercado foi influenciado, inicialmente, por ações estruturantes do Estado, por uma produção dispersa nos domicílios, pela divisão do trabalho e pela organização burocrática comercial que controla seus serviços produtivos para atender, por um lado, as pressões de consumo e, por outro lado, a solidariedade entre indivíduos de um território.

Palavras-chave: Desenvolvimento local. Redes sociais. Empreendedores locais. Imersão social da ação econômica. Sociologia das organizações.

ABSTRACT

This paper analyzes the traditional weaving market in the municipality of Resende Costa (MG) as a result of the relationship between collective action and local entrepreneurs. Through economic sociology and economy of space, we can identify interrelationships between private and collective actions. For the analysis of this market 664 questionnaires were applied in homes and 69 in commerce to gain a sample of those directly involved with the traditional weaving market. From these we could see that in the last two decades this market has undergone a series of organized transformations bureaucratically and socially controlled by the owners of commercial establishments. This article provides an analysis of the sociology of economic organization between strong ties and entrepreneurial initiative in a territory. The result of this analysis indicates that the market was influenced initially by structuring actions of the State, by a dispersed production in homes, by the division of labor and by a commercial bureaucratic organization that controls its commercial production services to meet on the one hand, the pressures of consumption and on the other hand, solidarity among people in an area.

Keywords: Local development. Social networking. Local entrepreneurs. Social Embeddedness of economic action. Sociology of organizations.

Introdução

Neste artigo, analisou-se o mercado de produção e comercialização de utensílios domésticos e peças decorativas têxteis do município de Resende Costa (MG). Desde a década de 1980, a atividade turística regional incrementou a demanda para produtos herdados da tradição da colonização desse território de Minas Gerais, como em Tiradentes, com a retomada de atividades produtivas artesanais em prata; e, em Resende Costa, com a produção da tecelagem tradicional em teares manuais de madeira (OLIVEIRA; JANUÁRIO, 2007; VIEIRA FILHO et al., 2006).

Essa mesorregião de Minas Gerais é denominada de Campo das Vertentes e tem, hoje, uma série de atividades econômicas turísticas que foram possíveis graças ao contexto histórico, às políticas públicas e do interesse ao iniciativa privada, as quais estão presentes, conforme Oliveira e Januário (2007), no entorno das cidades de São João del Rei e Tiradentes. Essas duas cidades foram objeto de investimentos públicos a partir de programas de governo como, por exemplo, o "Programa de Incentivo ao Desenvolvimento do Potencial Turístico da Estrada Real" e a formação do "Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes".

O cenário socioeconômico regional, a partir da década de 1980 do século XX, foi caracterizado pelo potencial turístico, principalmente o vinculado ao patrimônio histórico e cultural, que está relacionado com a exploração do ouro no século XVIII, e tem, atualmente, como desafio a sustentabilidade da atividade econômica na região. Entretanto, as ações do Estado, que possibilitaram e estimularam empreendedores dessa região de Minas Gerais a explorarem, atualmente, as atividades turísticas, foram impulsionadas, inicialmente, por iniciativas estruturantes, tanto regionais como locais, que ocorreram no final da década de 1970 e princípio de 1980. Podemos citar como exemplos dessas ações a construção da Ferrovia do Aço, que corta a região e viabilizou a migração de população rural local para a sede dos municípios, o asfaltamento da malha rodoviária que possibilitou o acesso a duas rodovias nacionais (BR040 e BR381), a captação, tratamento e distribuição de água potável, e a expansão da rede educacional e dos serviços dos correios. Essas ações estruturantes do Estado viabilizaram, por um lado, concentração de trabalhadores na sede dos municípios que ofereciam infraestrutura de serviços básicos. Entretanto, no final da década de 1980, após o término da execução das obras, esses trabalhadores buscaram outras opções de ocupação de sua força de trabalho. Por outro lado, essas ações possibilitaram a melhoria do acesso para turistas e para a distribuição da produção local (SANTOS; SILVA, 1997).

O turismo regional contou com ações estruturantes do Estado na mesorregião, seja para promoção dessas atividades econômicas ou de melhoria da qualidade de vida dos moradores locais. Por exemplo, no caso do município de Resende Costa, a produção têxtil tradicional foi uma atividade econômica que se beneficiou com o aumento da atividade turística regional. Entretanto, a produção têxtil doméstica não foi uma realidade econômica exclusiva desse território, já que esta faz parte da história econômica mineira dos séculos XVIII e XIX. Conforme Macedo (2006), o fenômeno da indústria têxtil do século XIX, na Capitania de Minas Gerais, fica evidente a partir de dados das Listas Nominativas de 1831-1832, em que a população ocupada distribuía-se em 28,34% no ramo de atividade de produção de fios e tecidos, e 9,44% na produção de peças do vestuário. Resende (2001), utilizando a Lista Nominativa de 1831, aponta que o Distrito da Lage, atual município de Resende Costa (MG), registrava 1.243 habitantes - 665 homens e 578 mulheres - em que 30,33% dos habitantes e destes 66,22% das mulheres ocupavam postos de trabalho na produção doméstica têxtil.

A produção doméstica da tecelagem tradicional de Resende Costa, já no final do século XX, despertou atenção, e alguns trabalhos acadêmicos tentaram dar conta desta realidade da vida econômica dos habitantes desse local (SANTOS; SILVA, 1997; SANTOS et al., 1998). Com o trabalho de Santos e Silva (1997), foi reconhecido, por meio da história oral, a herança da tradição familiar dos moradores desse município. Santos et al. (1998) apresentam, como resultados de seu estudo, em que abordaram 1.322 domicílios e entrevistaram moradores de 499 domicílios do perímetro urbano do município de Resende Costa, a existência de 811 trabalhadores informais e 495 teares de madeira, que produziam 20 tipos de produtos comercializados por 37 estabelecimentos comerciais. Conforme dados da Prefeitura Municipal de Resende Costa, no ano de 1985, existia um estabelecimento comercial de artesanato, e, em 1995, a relação de contribuintes que exerciam a atividade de artesão chegou a 25 estabelecimentos (SANTOS; SILVA, 1997).

Esses estudos apresentam evidências de que o mercado da tecelagem tradicional de Resende Costa (MG), nos séculos XVIII e XIX, era, basicamente, de produção doméstica, sendo que, no final do século XX, com o aumento na escala de tal produção, esta passa a ser comercializada em estabelecimentos específicos de artigos da tecelagem tradicional. Neste artigo, esse fenômeno socioeconômico municipal foi estudado a partir da análise da congruência de interesses individuais e do capital social. Nesse território municipal, empreendedores locais vislumbraram uma oportunidade gerada pela integração da singularidade tradicional de seus moradores, com ações de infraestrutura do Estado e macroeconômicas. A questão problema que norteou este trabalho foi: como ações coletivas e iniciativas empreendedoras, nesse território municipal, auxiliaram na estruturação e organização econômica do mercado da tecelagem tradicional?

Este artigo buscou contribuir com uma análise da sociologia da organização econômica, entre laços fortes e iniciativa empreendedora, no mercado da tecelagem tradicional de Resende Costa (MG). O estudo de caso indicou que a associação dos interesses privados de empreendedores com o capital social das famílias foi fator socioeconômico determinante na construção desse mercado. O trabalho apresenta, inicialmente, o referencial teórico sobre economia espacial e sociologia econômica e das organizações, posteriormente foram descritos os procedimentos metodológicos. Em seguida, o mercado da tecelagem tradicional foi descrito e analisado a partir de dados coletados em 2009. Na última seção, são apresentadas as considerações finais e pontuadas possibilidades de estudos futuros que podem apontar possíveis continuidades para análise de mercados locais.

Mercado de Produção Territorializado: expansão da divisão do trabalho, redes sociais e organização econômica

A divisão do trabalho social, como estrutura de sustentação e fonte de solidariedade de mercados, nesta seção, foi explorada como uma categoria analítica da organização industrial, seja por setores econômicos ou em cadeias de produção, que esteja localizada em uma cidade, região ou nação, ou seja, em mercados produtivos territorializados. Conforme Conti (2005), a compreensão do desenvolvimento e da modernização econômica pode ser realizada a partir de análises das características dos sistemas de produção territorializados, por um lado, no município, como esfera autônoma da organização político-administrativa do país. Por outro lado, podem ser compreendidos como consciência associativa de participação da vida política da comunidade local, portanto, o capital social, ou seja, o estoque de valores e comportamentos coletivos, expressos por dada comunidade, é considerado como ingrediente fundamental para seu desenvolvimento e modernização. A imersão territorial dos atores pode fomentar a competitividade no sistema local, com a implantação de hábitos, convenções e normas de comportamento, que são estimulados por meio da proximidade geográfica, que transcendem as tradicionais relações cliente-fornecedor e proporcionam a formação de redes formais e informais de colaboração e interação. Essas redes se formam por meio de mercados locais de trabalho, convenções e regras formuladas para o desenvolvimento de relações e conhecimento empresarial (CONTI, 2005).

Nesses arranjos produtivos locais (APL), o sucesso econômico de cada organização passa a depender de sua capacidade de especialização naquilo que consegue estabelecer vantagens comparativas efetivas e dinâmicas. Conforme Diniz et al. (2006), essas vantagens são decorrentes do estoque de atributos e da capacidade contínua de inovação, que leva países e localidades, ou seja, territórios, à criação de organizações locais para sua promoção, como os parques e incubadoras tecnológicos. Para Lemos (2006), a relação entre economia e geografia só adquiriu relevância na teoria econômica num período relativamente recente. Essa realidade é observada por meio de sistemas de produção territorializados que têm nas economias externas locais, conforme Suzigan et al. (2005), o cerne da discussão de clusters, porque são elas que determinam a própria existência da aglomeração ao proporcionarem custos reduzidos para firmas aglomeradas.

Para a economia, o território é encarado, essencialmente, como agregado de atores que, em dadas circunstâncias, podem comportar-se como ator coletivo. Nesse sentido, o território nunca cria redes diretamente, mas favorece a constituição de relações entre atores socialmente próximos. Ao mesmo tempo, as redes de relações locais interagem com outros níveis territoriais, por meio da interação de atores que pertencem, simultaneamente, a uma rede local e uma supralocal. Os territórios ligam-se à economia global por promoverem a própria especialização, portanto, permitem a difusão de estratégias e escolhas destinadas a promover e fortalecer os sistemas ou agrupamentos presentes com a geração de valor econômico. No entanto, nos territórios, o desafio é de natureza organizacional, que envolve a coordenação de atores e de seus princípios de ação e comunicação (CONTI, 2005).

Segundo Markusen (2005), o estudo de regiões econômicas tenta construir teorias que têm como tema central a causalidade do desempenho da economia regional. Entretanto, por um lado, nessas teorias, o comportamento microeconômico da empresa e da organização industrial não é explorado como um tema central. Por outro lado, trabalhos como os de Gereffi(1994), Gereffi et al. (1994), Piore e Sabel (1984) e Raynolds (1994) dão continuidade à análise sociológica do fenômeno econômico da divisão do trabalho e sua consequente organização em redes produtivas territorializadas. Esse processo, também, é decorrente de uma realidade de produção em massa e de flexibilização produtiva de pequenas organizações integradas em redes que dependem de cooperação, bem como de competição (PIORE; SABEL, 1984; RAYNOLDS, 1994). Conforme Gereffi et al. (1994), a rede de produção organizacional permite, mais adequadamente, a formulação de ligamentos, correlações de processos entre micro e macroestruturas sociais dentro de unidades de análises de contextos globais, nacionais e locais.

Esta organização interprodutiva, enquanto uma rede social, constitui um tema de relevância sociológica por buscar compreender o fato social não a partir da liberdade individual, mas da ação coletiva que se coloca às vontades individuais (MARTINS, 2004); ação coletiva imersa na ação dos indivíduos e que garante, também, a sua existência. Para tanto, devem existir cuidados metodológicos na abordagem das redes sociais de unidades produtivas, para que estas não sejam utilizadas em escalas geográficas únicas, como as cadeias globais, e sejam abandonadas realidades de interesse de análise, a exemplo de redes regionais, nacionais e locais. Estas podem representar a imersão de variáveis importantes que não têm ênfase em uma rede social que leve em consideração, na sua constituição, somente a atividade econômica global, mas, sim, a singularidade histórica da população dos territórios (DICKEN et al., 2001).

Pode-se perceber que uma das principais características competitivas, denominadas como atuais dentro do discurso empresarial e, até mesmo, de políticas de desenvolvimento econômico, é a necessidade das empresas atuarem de forma conjunta e associada em determinados territórios, sejam estes distritos industriais, regiões, municípios ou cidades. Essa suposta modernidade vem estimulando políticas de promoção do desenvolvimento socioeconômico de territórios, especificamente denominados como arranjos produtivos locais. Entretanto, vale ressaltar que Durkheim (1999) refletia sobre a divisão do trabalho social em que diferentes cidades tendem, cada vez mais, a certas especialidades, de tal modo que foram distinguidas, em cidades universitárias, de funcionários, de fábricas, de comércio, de águas e de gente que vive de rendas. Em certos pontos ou certas regiões, concentram-se grandes indústrias de construção de máquinas, fiações, manufatureira de tecidos, curtumes, altos-fornos e indústria açucareira, as quais trabalham para todo o país. Aí se estabelecem escolas especiais, a população operária se instala e a construção de máquinas se concentra, enquanto as comunicações e a organização do crédito se acomodam às circunstâncias particulares. Portanto, a aglomeração é uma possibilidade concreta para o desenvolvimento empresarial a partir de estruturas organizacionais baseadas na associação, complementariedade, compartilhamento, troca e ajuda mútua. As aglomerações têm como referência as redes, que também compõem a estrutura social de mercados e reforçam a discussão durkheiminiana de que a competição também gera a solidariedade. As redes reforçam, conforme Olave e Amato Neto (2001), o conceito de colaboração mútua, a fim de que as empresas individualmente possam sobreviver e se manter competitivas no mercado internacional.

As análises atuais de redes priorizam uma análise técnico-econômica em detrimento de uma análise das relações sociais em atividades econômicas que, antes de serem da esfera da economia, pertencem à vida social. Para Durkheim (1999), o mercado amplia-se com a existência de mais necessidades a satisfazer e que um novo aumento da população e da densidade industrial cria as bases para uma nova dinâmica da concorrência, sendo necessário existir, em algum lugar, ou uma eliminação ou uma nova diferenciação. O aumento das necessidades do mercado a serem satisfeitas propicia e fomenta a divisão do trabalho social que, consequentemente, tem como resultado a multiplicação das organizações industriais e comerciais em territórios produtivos. Para que as unidades sociais possam diferenciar-se, é necessário antes de qualquer coisa que sejam atraídas ou agrupadas em virtudes das semelhanças que apresentam. A vida coletiva não nasceu da vida individual, mas, ao contrário, foi a segunda que nasceu da primeira. É apenas sobre essa condição que se deve explicar como a individualidade pessoal das unidades sociais pôde formar-se e crescer sem desagregar a sociedade. Para que a divisão do trabalho possa nascer e crescer, não basta que existam nos indivíduos germes de aptidões especiais, nem que eles sejam estimulados a variar no sentido dessas aptidões, mas é necessário, além disso, que as variações individuais sejam possíveis (DURKHEIM, 1999). Portanto, a análise do fenômeno econômico das redes interorganizacionais de produção podem ser compreendidos a partir da imersão territorial dos atores sociais.

Neste sentido, o foco de análise da rede para este artigo é baseado em Smelser e Swedberg (1994), portanto, considera o processo econômico, suas conexões e interações entre economia e sociedade. O mercado é analisado como estrutura social e não simplesmente como processo racional instrumental de definição de preços ou como lugar físico de relações de troca, em que a competição e as informações são perfeitas e definidas em termos de demanda e suprimento. O mercado para a sociologia econômica, portanto, consiste em relações sociais entre indivíduos que podem aumentar e reduzir, dependendo das circunstâncias (SWEDBERG, 1994).

Para a nova sociologia econômica, os interesses econômicos de mercado estão imersos em redes pessoais e grupos sociais. O mercado não se constitui de firmas isoladas, como nos modelos de concorrência perfeita da ciência econômica, mas de aglomerados de firmas que formam uma estrutura social (SWEDBERG, 1994). Conforme Granovetter (1994), um ponto importante que distingue os grupos econômicos de simples aglomerados financeiros, como os conglomerados, é a existência de solidariedade social e de uma estrutura social entre as firmas que o compõem. Solidariedade essa que está imersa em laços ou vínculos sociais, como os familiares, de amizade ou étnicos. As redes sociais se justificam economicamente por facilitar a circulação de informações e assegurar confiança ao limitar os comportamentos oportunistas (GRANOVETTER, 2002). Até este ponto, o referencial nos permite atentar para a sociologia das estruturas socioeconômicas. E nesse sentido, portanto, a rede social é um conceito que complementa a discussão de Durkheim (1999), especificamente da estrutura das sociedades industriais, definindo uma tipologia para as relações sociais. Um dos aspectos importantes que a perspectiva de rede retoma na discussão da sociologia econômica de Durkheim (1999) é o papel da confiança entre os atores, principalmente como forma social objetiva de regulação das partes.

O capital social dessas redes seria uma consequência das relações de confiança, portanto, uma síntese das relações micro e macrossociais, em que são considerados laços fortes e fracos, com foco na formação e desenvolvimento de redes sociais, observando-se nestas as influências tanto individuais quanto coletivas para a construção social dos mercados.

Entretanto, para compreendermos o cotidiano dos mercados, temos que entender sua organização econômica. Para tanto, podemos recorrer à sociologia das organizações, que nos apresenta, de forma sintética, categorias analíticas complementares para compreensão das organizações em mercados como construções sociais. As redes territoriais produtivas compostas por laços sociais fortes e fracos podem ser consideradas como organizações burocráticas com utilidade econômica.

Conforme Paixão (1997), as organizações formais são instrumentos de implementações de papéis e cumprem missões. A organização social enquanto forma burocrática tem seu funcionamento ideal caracterizado, conforme Weber (2002), por ações racionais de formalização, profissionalização, estabelecimentos de rotinas, impessoalidade e de divisão entre trabalho dirigente e dirigido. Para a perspectiva weberiana, a burocracia é igual à organização, ou seja, é um sistema em que a divisão do trabalho se dá racionalmente, visando determinados fins; portanto, nessa perspectiva, a ação burocrática é a coerência de meios e fins visados.

Conforme Merton (1967), uma estrutura social formal e racionalmente organizada tem como seu tipo ideal a burocracia. Esta utiliza-se da administração para o controle das relações dos indivíduos com os instrumentos de produção; portanto, acarreta o aprofundamento da separação entre indivíduos e seus instrumentos de produção (MERTON, 1967). A ação burocrática pode causar, conforme Merton (1967), disfunções burocráticas, já que as ações passadas que obtiveram bons resultados na esfera da eficiência econômica podem redundar em reações inapropriadas para novas realidades organizacionais. Esse fato pode, conforme esse autor, advir da obediência às regras que originalmente foram concebidas como meio e transformam-se em fim. Portanto, os mesmos elementos que favoreceram a eficiência em determinado momento produzem ineficiência em casos específicos, por exemplo, por meio de conflitos entre as partes, pelo não atendimento de necessidades físicas e sociais do grupo ou, até mesmo, pela arrogância e insolência do burocrata que despreza as relações humanas. A causa dessa realidade, muitas vezes, está no fato da burocracia ser uma estrutura secundária da organização social, que tem como objetivo o interesse de alguns indivíduos e não de todo o grupo no ambiente social em que essa realidade está imersa.

Conforme Thompson (1976), a racionalidade técnica da organização, especificamente com fins empresariais, pode ser avaliada por dois critérios: instrumental e econômico. O primeiro analisa se as ações produzem os resultados desejados; portanto, a tecnologia instrumental perfeita é aquela que viabiliza os resultados. O critério econômico analisa a eficiência dos resultados, ou seja, se estes foram obtidos com a mínima despesa de recursos necessários. A racionalidade empresarial é um conjunto de atividades que pode ser subdividido em atividades de entrada, tecnológicas e de saída. As atividades de entrada estão relacionadas aos insumos necessários ao processo de produção. As atividades tecnológicas podem ser compreendidas como os processos produtivos, e as atividades de saída, com os bens e serviços oferecidos ao mercado. Em qualquer subconjunto de atividades da organização empresarial ocorrem adaptações e modificações que compõem sua dinâmica organizacional técnica, ou seja, estritamente para se ter resultados positivos instrumentais e econômicos. Essas adaptações e modificações têm como objetivo principal viabilizar ganhos competitivos que, para serem executados, demandam, conforme Thompson (1976), coalizões dominantes entre seus participantes.

Conforme Crozier (1981), o processo burocrático inclui o cálculo racional, mas, também, o enfrentamento ao mesmo tempo em todos os níveis das exigências de uma racionalidade utilitária e da resistência dos meios humanos. Portanto, se configura como um problema de relações de poder que tem no fenômeno burocrático uma estratégia de controle da força de trabalho. O poder nas relações de trabalho organizacionais pode ter como principal meio de ação, conforme Crozier (1981), a manipulação de informações ou regulamentação do acesso a estas, a exemplo das que se referem às fontes de insumos e de potenciais mercados de consumo. São informações que dão à organização possibilidades de predição e que resultam em controle e poder, os quais podem ser caracterizados como poder hierárquico funcional ou de perito. O poder hierárquico funcional está na posição hierárquica superior da estrutura organizacional, que é proporcionada pela propriedade dos meios de produção e pelas informações estratégicas do mercado. O poder de perito, por sua vez, decorre do processo de divisão do trabalho, em que o coordenador passa a ser o conhecedor de toda a técnica de produção (CROZIER, 1981).

As ações em prol da impessoalidade e das disfunções burocráticas estão relacionadas ao contexto social, já que a ação organizacional está relacionada com o ambiente social. A compreensão da realidade das transformações organizacionais pode ser feita a partir da identificação das relações entre a sociedade e os fenômenos econômicos que se materializaram no dia a dia, nos procedimentos das organizações, por meio das ações de seus tomadores de decisão que expressam comportamentos que são influenciados por indivíduos e coletividades. A análise da estrutura social de organizações e mercados pode nos auxiliar a compreender, objetivamente, a vida social e pode apresentar realidades de relações entre atores de diversas esferas da vida cotidiana.

Percurso Metodológico

Este estudo teve como característica metodológica fundamental pesquisa descritivo-analítica (SELLTIZ et al., 1975), por descrever e analisar o caso do mercado da tecelagem tradicional como construção social, a partir de suas características específicas, imersas no município de Resende Costa (MG). Esse tipo de pesquisa tem como objetivo primordial a descrição de características de determinada população ou fenômeno ou, então, o estabelecimento de relações entre variáveis. Uma de suas características mais significativas está na utilização de técnicas padronizadas de dados, como o questionário e a observação sistemática (GIL, 2006; VERGARA, 2007).

A estratégia utilizada para coleta de dados foi associar pesquisa bibliográfica e documental com pesquisa quantitativa. A pesquisa pode ser caracterizada, conforme Gil (2006), como bibliográfica, já que para ser desenvolvida foi utilizada análise de material já elaborado, constituído, principalmente, por dados de pesquisas sobre a tecelagem local, o município e a microrregião do estado de Minas Gerais. A pesquisa documental assemelha-se, segundo Gil (2006), à bibliográfica, entretanto, enquanto nesta a fonte principal de análise são livros e materiais impressos, na pesquisa documental, as fontes são muito mais diversificadas e dispersas, podendo ser de documentos que, de alguma forma, já foram analisados, como relatórios de pesquisa, relatórios de empresas, tabelas estatísticas, atas de associações etc.

Os dados primários da pesquisa foram quantitativos e coletados a partir de um survey, que é instrumento adequado, conforme Babbie (1999), para a observação sistemática de possíveis regularidades sociais. Como a pesquisa se destinou somente à população relacionada com o mercado da tecelagem, esta pode ser caracterizada como população-objeto da pesquisa, conforme recomenda Costa Neto (1999). A amostragem dessa população-objeto foi não probabilística e intencional (BABBIE, 1999; COSTA NETO, 1999), por entrevistar indivíduos em domicílios e em estabelecimentos comercias relacionados diretamente com alguma atividade do processo produtivo ou comercial da tecelagem tradicional do município.

Para a coleta de dados, foram elaborados dois questionários estruturados: domiciliar e comercial. Tanto um como outro têm, ajustadas as especificidades de cada unidade de observação, aproximadamente 95 variáveis cada, que foram agrupadas em módulos referentes ao perfil socioeconômico do respondente e da unidade de observação, caracterização das atividades produtiva e comercial, organização do trabalho, características e consumo de insumos e equipamentos, perfil da produção e percepções dos entrevistados sobre o mercado. A operacionalização da pesquisa de campo contou com a participação de 17 estudantes universitários residentes no município, que foram os responsáveis pelo preenchimento do survey e, por meio de entrevistas realizadas, pela coordenação da pesquisa no ano de 2009. A tabulação consistiu na transcrição das variáveis contidas no questionário para colunas de uma planilha do software Microsoft Excel versão Office-2003. Algumas variáveis da planilha do software foram reorganizadas em outras planilhas do mesmo software para a realização de estimativas que mostram a grandeza monetária, volume da produção de peças e comercialização dos produtos locais da tecelagem tradicional.

Mercado da Tecelagem Tradicional de Resende Costa: contribuições da coletividade familiar e da iniciativa empreendedora comercial

O território econômico, neste caso, delimitado pela sede do município de Resende Costa, foi definido, por um lado, como uma esfera autônoma da organização político-administrativa do país e, por outro lado, como consciência associativa de participação, portanto, de acordo com Conti (2005), do capital social da comunidade local. No mercado da tecelagem tradicional desse município, nos interessou as consequências do capital social na ação coletiva, a partir de hábitos, convenções e normas de comportamento que, como veremos, propiciou a formação de redes formais e informais de colaboração e interação. Os pontos comuns existentes entre interesses próprios, que têm como consequência uma atuação coordenada para alcançá-los, foram identificados em domicílios produtores e estabelecimentos comerciais da tecelagem tradicional local. O universo de pesquisa tratado neste trabalho, conforme dados da Prefeitura Municipal de Resende Costa (2009a; 2009b), por meio do Setor de Cadastros, se refere ao perímetro urbano do município que, em julho de 2009, contabilizava 3.178 imóveis edificados e 95 lojas de artigos de artesanato.

O mercado da tecelagem tradicional de Resende Costa foi caracterizado por meio de dados que representam uma amostra intencional de 664 domicílios e 69 estabelecimentos comerciais. Essa é uma amostra de um universo de 2.655 domicílios visitados no perímetro urbano da sede do município, dos quais 796 foram autodefinidos pelos entrevistados como um domicílio em que existia alguma atividade produtiva da tecelagem tradicional. Destes, 109 moradores não responderam ao questionário, e outros 23 questionários foram excluídos da amostra. Também, foram visitados 76 estabelecimentos comerciais formais de insumos e de produtos da tecelagem do município e que tinham funcionamento diário para atendimento a consumidores, dos quais 69 proprietários responderam ao questionário. Nesta realidade, temos dados que indicam um território especializado em uma tecelagem tradicional, cujo enraizamento em sua ocupação ocorreu em meados do século XVIII. As discussões e reflexões de Durkheim (1999) sobre a divisão do trabalho social, em que diferentes cidades tendem, cada vez mais, a certas especialidades, serviram para afirmarmos que, no final do século XX e princípio do século XXI, formou-se uma cidade especializada na tecelagem tradicional local, objeto deste estudo Entretanto, como veremos, a organização formal, fazendo uso de Paixão (1997), desta tecelagem tradicional, inicialmente, tinha como papel cumprir a missão de produzir o vestuário dos moradores de determinados domicílios coloniais no século XVIII. Já atualmente, no início do século XXI, está organizada socialmente enquanto uma forma burocrática, nos moldes propostos por Weber (2002).

Caracterização do processo produtivo e da organização do mercado

O material mais frequente no processo produtivo domiciliar da tecelagem era o retalho (57%), seguido pela utilização conjunta da linha e retalho (19,9%), linha (16,5%), retalho e fiado (4,6%), lã (0,4%) etc. A origem do fornecimento desses materiais foi respondida por 658 entrevistados, dos quais 41,79% compravam-os nos estabelecimentos comerciais do município, enquanto 58,56% não compram esses insumos e tinham acesso por meio do comprador de seus produtos. As 664 unidades de produção domiciliar consumiam, aproximadamente, 20 t de linha e 103 t de retalho e transformavam-os em vários produtos da tecelagem tradicional, com equipamentos específicos do processo produtivo. Os equipamentos mais frequentes nos domicílios eram tesouras e teares (69,4%), tesouras (24,7%) e teares (4,8%). Foi informado por 483 entrevistados a existência de 848 teares, com a incidência por domicílio de, no mínimo, um e, no máximo, 17 teares; 610 entrevistados relataram a existência de 1.396 tesouras, com a incidência por domicílio de, no mínimo, um e, no máximo, 15 tesouras. A propriedade dos teares informada pelos 483 entrevistados que responderam a essa questão foi de 80,84% dos moradores, portanto 19,15% dos teares não eram de propriedade dos moradores. Os 102 entrevistados que responderam sobre os teares de terceiros informaram que 72,55% eram de propriedade do comprador da produção e que 27,45% eram de propriedade de familiares.

O acesso dos domicílios produtores aos insumos (58,56%) e aos teares (19,15%) por meio do proprietário dos estabelecimentos comerciais pode indicar uma ação racional empresarial na organização do mercado local. Por um lado, tal realidade de organização burocrática do processo produtivo indica uma racionalidade técnica, de acordo com Thompson (1976), que pode estar presente nessa ação que tem como resultado desejado o atendimento do volume da demanda, por parte dos comerciantes, que coordenam a divisão de atividades de entrada, tecnológicas e de saída do processo produtivo. Os comerciantes podem utilizar dessa burocracia para exercer seu poder no processo produtivo, a partir da manipulação ou regulamentação de acesso a informações estratégicas do processo, o que garante a estes o poder hierárquico funcional e de perito, conforme indicado por Crozier (1981)

Nesse mercado, a produção domiciliar mais frequente era a prestação de serviços produtivos, seja de tecer ou preparar material para os estabelecimentos comerciais da tecelagem tradicional do município. Em 58,56% dos domicílios, os entrevistados afirmaram que os estabelecimentos comerciais também forneciam insumos e alguns comerciantes locais eram proprietários dos equipamentos, ou seja, dos teares. Esses estabelecimentos comerciais são o elo entre a produção domiciliar e o consumo final da tecelagem tradicional; uma organização econômica que é, de acordo com Paixão (1997), um instrumento tecnicamente ordenado de consecução de fins instrumentais, coordenados pelos proprietários dos estabelecimentos comerciais.

Portanto, os comerciantes inovaram com critérios de racionalidade, ou seja, implantaram uma burocracia com racionalidade instrumental e econômica (THOMPSON, 1976). A técnica tradicional foi dividida e especializada tanto inter como intradomiciliar e, em 2009, 68% dos entrevistados não conheciam todo o processo produtivo e eram remunerados a partir da produtividade no trabalho. O empreendedor comerciante se posicionou no mercado como um elo organizacional que manipula fontes de insumos e de consumo da produção domiciliar, o que dá a esses empreendedores dos estabelecimentos comerciais possibilidades de predição, e resulta em controle e poder hierárquico, por sua posição na estrutura social desse mercado, e de perito, por serem os comerciantes os atuais conhecedores de toda a técnica tradicional (CROZIER, 1981).

Os comerciantes desenvolviam suas atividades gerenciais e promoviam suas iniciativas empreendedoras locais no seu próprio estabelecimento comercial. As relações com trabalhadores nos estabelecimentos comerciais não se restringiam somente aos que estavam formalmente vinculados aos estabelecimentos comerciais. Tal fato tem sua evidência fortalecida com a informação dada por 54 proprietários de que estes possuíam 543 fornecedores, sendo que existiam estabelecimentos com, no mínimo, um fornecedor e, no máximo, com 65 fornecedores, uma média de 10 fornecedores por estabelecimento comercial. Para 49 proprietários, os fornecedores locais representavam 66,5%, sendo que existiam estabelecimentos com, no mínimo, um fornecedor e, no máximo, 36 fornecedores, uma média de 7,4 fornecedores locais por estabelecimento.

A existência de fornecedores do município e de outras localidades se devia ao fato de que os estabelecimentos comerciais do mercado local possuíam, no total, 2.323 tipos de artigos em 53 estabelecimentos comerciais, sendo que a quantidade mínima de variedade de produtos por estabelecimento comercial era de dois tipos e no máximo de 466 produtos. Do total de tipos de produtos existentes nos 53 estabelecimentos comerciais, 54,33% eram originários da produção domiciliar de Resende Costa (MG). Portanto, as iniciativas empreendedoras dos proprietários dos estabelecimentos comerciais, no início do século XXI, consolidaram a organização burocrática da produção local e incluíram produtos importados de outras localidades produtoras para composição dos portfólios de seus estabelecimentos.

As peças da tecelagem tradicional do município que compunham o portfólio de produtos dos estabelecimentos comerciais eram produzidas, conforme os proprietários, nos seguintes locais: 40,6% nos domicílios dos fornecedores, 16% nos domicílios dos fornecedores e em galpão do proprietário do estabelecimento, 7,2% no domicílio do proprietário do estabelecimento, 5,8% nos domicílios dos fornecedores e no do proprietário do estabelecimento, 2,9% em galpão do proprietário do estabelecimento, 2,9% no próprio estabelecimento comercial e 24,6% dos proprietários não responderam sobre o local de produção. O galpão não era o único tipo de ativo fixo que os proprietários tinham investido nesse mercado, posto que, dos 69 proprietários entrevistados, 42 afirmaram possuir teares e, destes, 38 relataram que possuíam um total de 230 teares, tendo cada proprietário, no mínimo, um, no máximo, 23 e, em média, seis teares. Os proprietários dos estabelecimentos comerciais que afirmaram possuir teares (42 entrevistados) informaram, também, que 33% desses equipamentos estavam nos domicílios dos fornecedores, 26,1% nos seus próprios domicílios, 19,5% nos domicílios dos fornecedores e em galpão de sua propriedade, 14,3% em galpão de sua propriedade e 7,1% nos domicílios dos fornecedores e no estabelecimento comercial. Portanto, esses dados confirmam, também, a indicação da existência da racionalidade técnica, conforme Thompson (1976) e das configurações de poder, segundo Crozier (1981).

Elos organizacionais: domicílio produtor e estabelecimento comercial

Os elos organizacionais do mercado da tecelagem tradicional são o domicílio produtor e o estabelecimento comercial. Como descrito em seção anterior, os domicílios, objeto de análise desta pesquisa, exercem a função produtiva ofertando produtos e serviços para o mercado local de estabelecimentos comerciais especializados em produtos da tecelagem tradicional local.

O domicílio produtor foi identificado a partir da autodefinição do entrevistado como executor de alguma atividade produtiva da tecelagem tradicional. Este elo era uma atividade econômica dividida e especializada em produtores de peças (64,6%), fornecedores de novelos (20,6%), fornecedor de novelos e produtor de peças (6%), comerciante e produtor de peças (4,3%), fornecedor de novelos de fio (1,4%), acabamento de peças (0,3%) e outros (2,8%). A maioria dos entrevistados (36,7%) estava no mercado de produção há menos de cinco anos. Os dados indicam, por meio do aumento gradativo entre cinco e 20 anos, que o mercado da tecelagem tradicional expandiu suas atividades nos últimos 10 anos. Os 664 entrevistados nos domicílios produtores tinham 83 famílias de origem paterna, sendo que as 10 mais frequentes correspondiam a 65,2% dos entrevistados e as duas mais frequentes correspondiam a 34.8% dos entrevistados. A família foi, para 16,9%, a principal motivação para ingresso na atividade e, para 61,9 dos entrevistados, o meio de socialização no trabalho.

A atividade produtiva e econômica domiciliar da tecelagem tradicional está imersa em relações sociais, por meio da ação coletiva que emerge de laços fortes entre os atores, conforme proposto por Granovetter (2002), os quais se concentram em 10 famílias mais frequentes, possibilitando a circulação de informação e de capacitação dos trabalhadores nas técnicas da tecelagem tradicional. Vale ressaltar que 34,8% dos domicílios tiveram como origem, de acordo com Pinto (1992), duas famílias que ocupam este território desde seu povoamento, tempo em que a produção não era organizada economicamente para proporcionar ganhos monetários, decorrentes da coordenação de atividades ou, até mesmo, da remuneração pela execução de serviços produtivos descrito na seção anterior.

O sistema produtivo deste mercado pode ser compreendido a partir das informações dos entrevistados no domicílio produtor, os quais eram, em sua maioria, em 2009, prestadores de serviços. Os que comercializavam o serviço de tecer representavam 42,1% dos entrevistados; o serviço de picar retalho representava 6,9%; e o de enrolar o novelo de retalho, 4,6%. Para os entrevistados, as funções dos domicílios produtores mais representativas foram, para 28,9%, produzir e vender peças da tecelagem; para 5,8%, comercializar novelos de retalho e; para 4,4%, vender retalho picado. As peças mais produzidas eram o tapetinho, tapete, jogo americano e guardanapos. Chama atenção, conforme os dados, a produção unitária mensal, em 2009, de 131.088 tapetinhos, o que, comparada com a que foi registrada por Santos et al. (1998), em 1996, indica que a produção desta peça aumentou aproximadamente 240% no período analisado.

O elo organizacional comercial do mercado da tecelagem tradicional passou, nos últimos 20 anos, por uma expansão considerável. Entre os anos de 1988 e 1998, foram abertas e ainda estavam em funcionamento (até julho de 2009) 29 lojas de artigos de artesanato. Entre os anos de 1999 e 2009, foram abertas, e ainda estão em funcionamento, 63 lojas de artigos de artesanato. A primeira década da organização comercial da produção local representava 31,5% das organizações comerciais de 2009, e a segunda década, 68,5% das organizações do início do século XXI. Entretanto, a maior expansão do comércio local ocorreu entre 2004 e 2009, sendo que 54,35% das lojas de artigos de artesanato tiveram sua abertura neste intervalo temporal.

A função dos 69 estabelecimentos comerciais que tiveram os proprietários entrevistados não se restringia ao escoamento da produção. Para 69,6% dos proprietários, sua função era produzir e comercializar as peças; para 15,9%, apenas comercializar as peças; e para 11,6%, fornecer insumos, produzir e comercializar as peças. A inovação empreendedora de organizar comercialmente a produção local, também, fez uso do capital social das famílias no processo de institucionalização do mercado local. Os 69 entrevistados nos estabelecimentos comerciais tinham 28 famílias de origem paterna, sendo que as 10 mais frequentes correspondiam a 72,4% dos entrevistados, e a mais frequente correspondia a 31.9% dos entrevistados. A família foi o meio de socialização na rotina comercial para 58% dos entrevistados. A organização comerciante tem como papel cumprir a missão de integrar a produção diluída nos domicílios produtores com os consumidores, entretanto, não deixa de estar imersa em relações tradicionais familiares.

Nos estabelecimentos comerciais, foram encontrados 191 trabalhadores que eram, em sua maioria, da própria família do proprietário. As ocupações mais frequentes estavam relacionadas com a atividade principal do estabelecimento, ou seja, realizar a comercialização e a organização burocrática da produção. Destes, 39,1% eram vendedores e 37,6%, proprietários. A origem dos trabalhadores dos estabelecimentos comerciais estava na família, que, no mercado local, exerce um papel fundamental nas suas atividades econômicas. Em 37,8% dos estabelecimentos comerciais, os trabalhadores eram empregados e familiares, em 24,6% familiares, em 18,8% eram empregados e 18,8% dos entrevistados não responderam este questionamento.

Especialização do trabalho, redes e família

Nesse arranjo produtivo local, o mercado da tecelagem tradicional de Resende Costa, o sucesso econômico de cada organização, domiciliar produtiva ou comercial, dependeu de sua capacidade de especialização naquilo que esses grupos sociais conseguiram estabelecer como vantagens comparativas efetivas e dinâmicas (DINIZ et al., 2006). Ficou evidente, nos domicílios produtores visitados, a especialização, como, por exemplo, a partir das funções de produção de peças e fornecedores de novelos. Os 1.072 trabalhadores domiciliares se diferenciaram em ocupações referentes às atividades de tecer, enrolar novelos de retalho, picar retalho e acabar peças. A maioria das unidades produtoras empregava, em suas atividades, no mínimo, um trabalhador, que representava 38,7% dos domicílios, e no máximo 15 trabalhadores, que representavam 1,6% dos domicílios. Os trabalhadores domiciliares tinham as seguintes ocupações: 61,1% tecer; 8,6% enrolar novelos de retalho; 7,6% picar retalho; 5% tecer e enrolar novelos de retalho; 4,6% picar e enrolar novelos de retalho; 3% tecer e picar retalho; 2,3% acabar peças; 2,3% tecer e acabar peças; e 14.1% exercem outras combinações dentre essas ocupações.

Outra inovação na organização do mercado local pode ser compreendida a partir da análise da racionalidade burocrática, conforme Thompson (1976), do empreendedor comerciante que controlava a saída dos produtos e serviços dos domicílios produtores, por meio do controle da remuneração variável. Essa organização possibilitava uma jornada de trabalho flexível com coletas de produção em dias predeterminados. Os trabalhadores dos domicílios tinham uma remuneração variável e uma jornada de trabalho diária flexível. A maioria dos trabalhadores, ou seja, 22,5%, tinha uma jornada de oito horas, mas também havia 17% que trabalhavam durante seis horas, 15% quatro horas, 3,6% cinco horas, 10,1% menos de três horas e 2,6% acima de onze horas.

A inovação empreendedora de organizar burocraticamente o mercado tradicional local também gerou disfunções burocráticas (MERTON, 1967), quando aprofundou a separação dos indivíduos dos seus instrumentos e modificou o processo de produção com a alteração do ritmo de trabalho. Os entrevistados responsáveis pelos domicílios produtores consideravam como a principal reclamação dos trabalhadores as dores (31,3%), seguidas de baixa renda (29,2%), insumos (7,2%), doenças (4,5%) etc. Esses dados indicam, por um lado, que a especialização do trabalho modificou o processo, caracterizando-o como uma ação rotineira e repetitiva de tarefas; e, por outro lado, que a intensificação do ritmo de trabalho estimulado pela remuneração variável pode ser causa das reclamações decorrentes do adoecimento dos trabalhadores.

O estabelecimento de vantagens comparativas efetivas e dinâmicas com a especialização não se restringiu, nesse mercado, à produção domiciliar. O elo comercial da tecelagem tradicional se especializou nas funções de produzir e comercializar peças, comercializar peças e fornecer insumos. As 191 pessoas ocupadas nos estabelecimentos comerciais, também, se especializaram como vendedores e como gestores. A ampliação da divisão e especialização do trabalho tradicional municipal indica, como defendido por Durkheim (1999), que esse mercado vem ampliando suas atividades com a criação de novas diferenciações produtivas, seja no elo domiciliar ou comercial. Conforme a perspectiva durkheiminiana, essa realidade é esperada e normal. A diferenciação do município promoveu em suas organizações econômicas uma extensa divisão do trabalho social que indica tanto um acirramento da competição como, também, a emergência de relações econômicas como fonte de solidariedade. Essa expansão fica evidente com as informações proporcionadas pelos dados dos entrevistados sobre o tempo de atuação na tecelagem tradicional e, também, a partir dos dados oficiais da Prefeitura Municipal sobre a abertura das lojas de artigos de artesanato.

As ações inovadoras de especialização e organização do trabalho, promovidas nesse território pelo empreendedor comerciante, foram associadas às relações sociais que propiciaram a construção social do mercado de tecelagem tradicional. Neste, a relação entre economia e geografia foi uma realidade que pôde ser observada por meio de sistemas de produção territorializados (LEMOS, 2006), os quais tiveram nas economias externas locais, fatores determinantes para própria existência da aglomeração (SUZIGAN et al., 2005). As ações destes proporcionaram custos reduzidos para seus empreendimentos aglomerados, como, por exemplo, os proporcionados pelo capital social das famílias de origem, identificadas nos domicílios produtores e nos estabelecimentos comerciais, as quais exercem, também, o papel de organizar socialmente a produção local. Entretanto, como salienta Conti (2005), o território nunca cria redes diretamente, mas favorece a constituição de relações entre atores socialmente próximos. No mercado da tecelagem tradicional do município em questão, as redes foram formadas a partir dos laços familiares. Como já descrito, foram identificadas 83 famílias de origem paterna nos domicílios produtores e 28 famílias de origem paterna nos estabelecimentos comerciais.

Das famílias desse território, emergiu a confiança das relações econômicas, que ficou evidente com o pequeno número de famílias que concentram, proporcionalmente, a maioria dos domicílios produtores e dos estabelecimentos comerciais. A família foi uma instituição importante desse grupo social, moderando suas relações econômicas e motivando os indivíduos para o ingresso na atividade, seja ela produtiva ou comercial, bem como foi o principal meio de socialização no trabalho dos entrevistados. Conforme Granovetter (1994), um ponto importante que nos auxilia a distinguir os grupos econômicos familiares de simples aglomerados financeiros, como os conglomerados, é a existência de solidariedade social e de uma estrutura social entre as firmas que o compõem, neste caso, a partir dos laços familiares que unem os indivíduos em seus domicílios produtores e estabelecimentos comerciais.

Para Durkheim (1999), o mercado amplia-se com a existência de mais necessidades a satisfazer, e um aumento da população e densidade industrial cria as bases para uma nova dinâmica da concorrência, sendo necessário haver uma eliminação ou uma nova diferenciação do trabalho social. Portanto, o aumento das necessidades do mercado local, neste caso, propiciou e fomentou a divisão do trabalho social, o que, consequentemente, resultou na multiplicação das organizações domiciliares produtoras e dos estabelecimentos comerciais. Essas unidades sociais - domicílios produtores e estabelecimentos comerciais - se diferenciaram, inicialmente, devido à oportunidade de serem atraídas por grupos familiares que apresentavam semelhanças, como a mesma herança de uma técnica no setor têxtil com valor para o mercado turístico local que, como descrito na introdução, vem sendo fomentado nos últimos 20 anos por ações estruturantes do Estado.

Expansão econômica e racionalidade empresarial imersa em laços familiares

O mercado turístico regional estimulou a tecelagem tradicional como uma atividade econômica que tem a importância monetária similar à dos repasses públicos, os quais representam as maiores fontes orçamentárias e de recursos financeiros que movimentam a economia local, como o Fundo de Participação Municipal (FPM). Por um lado, em 643 domicílios produtores, existia em 2009 uma receita mensal de R$ 393.686,64, com faturamento domiciliar mínimo de R$ 6,90 e máximo de R$ 13.500,00, o que para a economia municipal representa um montante de recursos anuais estimados em R$ 4.724.239,68. A receita média anual por domicílio, a partir da estimativa apresentada, é de R$ 7.347,18. O destino da venda da produção domiciliar foi informado por 532 entrevistados que comercializavam as peças e serviços para 158 compradores locais, que eram os responsáveis não só pela compra, mas pelo fornecimento de insumos e definição de rotinas de remuneração e programação da produção domiciliar. Por outro lado, as entrevistas com 51 proprietários dos estabelecimentos comerciais permitiram a realização de algumas estimativas sobre o faturamento bruto mensal estimado em R$ 605.440,50, sendo o faturamento mínimo de R$ 230,00 e o máximo de R$ 110.600,00, com o faturamento médio de R$11.871,38.

A tecelagem tradicional do município exposta nos estabelecimentos comerciais, nos últimos anos, teve sua representatividade no portfólio comercial modificada. Essa mudança deve-se ao fato de parte (20,2%) do destino da comercialização, em 2009, estar voltada para turistas que frequentavam os estabelecimentos. No estudo de Santos et al. (1998), a comercialização, em 98% dos estabelecimentos, se destinava a lojistas de outros municípios e estados. Tal fato não descaracteriza os estabelecimentos comerciais de artesanato, que podem ser tipificados como atacadistas, já que a comercialização em 64% dos estabelecimentos tinha como destino os lojistas de outros estados; em 4,3%, a lojistas de outros municípios de Minas Gerais; em 2,9%, a lojistas de Resende Costa; e em 2,9%, a lojistas de outros municípios de Minas e outros estados.

O que ficou evidente é que o mercado da tecelagem tradicional do município de Resende Costa (MG), nas últimas duas décadas, passou por uma série de transformações no trabalho e na sua organização social, mesmo mantendo as características tradicionais familiares. Entretanto, vale ressaltar que a transformação de uma produção domiciliar em um sistema produtivo dividido e especializado, conforme analisado por Thompson (1976), neste caso, foram iniciativas empreendedoras locais dos proprietários dos estabelecimentos comerciais que detinham as fontes de fornecimento e consumo e controlavam socialmente a produção domiciliar, por meio da remuneração variável e a partir da produtividade dos domicílios produtores. Essa realidade, de fato, foi uma mudança socioeconômica da produção doméstica têxtil, em meados do século XIX, para uma produção em massa que se fundamenta na troca mercantil, no início do século XXI.

A competição acirrada era uma realidade não só no mercado consumidor, mas também no mercado de produção, no qual os proprietários dos estabelecimentos comerciais exerciam o papel de organizar e racionalizar o sistema produtivo. Ficou claro que a diferenciação e competição vêm gerando solidariedade, como evidenciado por Durhkeim (1999), Piore e Sabel (1984) e Raynolds (1994), entre os comerciantes, formando redes de pequenas empresas integradas por laços sociais, principalmente familiares, e que dependem da cooperação, mas também de competição. A confiança necessária para o desenvolvimento da tecelagem tradicional desse território foi proporcionada, como preveem Amato Neto (2000) e Suzigan et al. (2007), por uma aglomeração de unidades interligadas num mix de competição e cooperação, que foi possível graças à expansão econômica da tecelagem tradicional, proporcionada pelo setor turístico, bem como devido às relações familiares que exerciam o papel do contrato social.

Embora a realidade de tal mercado seja consequência da singularidade tradicional desse território povoado no século XVIII, cujos moradores se vestiam e sobreviviam com a produção doméstica têxtil no final do século XX, alguns empreendedores souberam aproveitar as oportunidades do mercado turístico regional associando o conhecimento tradicional para o atendimento da demanda por produtos turísticos e pela facilidade de acesso a insumos, os refugos de malharias. Conforme Santos e Silva (1997), a oferta de refugos de malharias de São João del-Rei, Divinópolis e Juiz de Fora, em Minas Gerais, e Petrópolis e Teresópolis, no Rio de Janeiro, possibilitaram a transformação de uma produção doméstica para uma produção domiciliar em massa, altamente especializada, mediada por relações familiares e pela troca econômica. Esta realidade socioeconômica foi possível a partir da necessidade de satisfazer necessidades de consumo, por um lado, dos produtores e comerciantes remunerados por suas atividades no sistema produtivo tradicional e, por outro lado, dos turistas e lojistas de outros municípios que, em Resende Costa, buscavam os produtos de sua tecelagem tradicional e de outros artigos definidos genericamente como artesanais.

A diferenciação das relações de fornecimento e venda das unidades produtivas do mercado indica, baseando-nos em Silva e Neves (2012), que os laços familiares estruturaram socialmente o mercado aqui analisado e influenciaram os processos sociais por meio da posição dos atores em uma rede socioeconômica que emerge no momento da aquisição de insumos dos domicílios produtores e de compra de produtos pelos estabelecimentos comerciais. De acordo com Granovetter (1994 e 2002), esses atores econômicos não levam em conta somente seus interesses próprios, mas também, em particular, no mercado aqui analisado, o contexto institucional tradicional, ou seja, a instituição família, que pode propiciar condições de coesão social, exercendo o papel de regulação do contrato e de garantia dos direitos individuais daqueles que estão envolvidos diretamente com o processo produtivo no momento da troca mercantil, seja no fornecimento de insumo ou na venda da produção domiciliar para o estabelecimento comercial local.

Tradicionalismo e confiança, empreendedorismo e desenvolvimento local

Os interesses econômicos do mercado da tecelagem tradicional de Resende Costa estavam imersos em uma estrutura social guiada pelos laços familiares, portanto coletivos, dos quais emerge a solidariedade social entre os indivíduos em seus domicílios e estabelecimentos comerciais, o que proporcionou uma sinergia entre a ação coletiva de determinados grupos familiares, empreendedores domiciliares e comerciantes. Conforme Granovetter (2002), a solidariedade está imersa em vínculos sociais, neste caso, familiares, que facilitam a circulação de informações e asseguraram confiança ao limitar os comportamentos oportunistas na estrutura social do mercado. Entretanto, mesmo existindo uma mediação ou, até mesmo, um contrato social, no sentido durkheiminiano, endossado por famílias frequentes nos domicílios e nos estabelecimentos comerciais, tais redes sociais não nos possibilitam compreender integralmente como esse sistema produtivo, complexo e altamente especializado foi cristalizado no território em questão, promovendo o desenvolvimento local.

O que ficou evidente nas relações de trabalho e produtivas do mercado analisado foi que existia uma conciliação, mesmo que assimétrica, do interesse individual do homo economicus e da população local. Os comerciantes, promotores de iniciativas empreendedoras locais, buscavam maximizar seus lucros a partir de uma base comum de conhecimento tradicional que viabilizou a remuneração da força de trabalho local, que era detentora desse saber e que estava imersa em relações entre famílias e comerciantes. Tanto os produtores domiciliares da tecelagem tradicional, quanto os proprietários dos estabelecimentos comerciais foram afetados em suas ações e atitudes por relações sociais, como na socialização do trabalho e na confiança no relacionamento de troca, nos momentos de satisfação das necessidades de fornecimento ou de venda da produção domiciliar. Entretanto, a estrutura social deste mercado pode ser caracterizada como redes família-fornecedor e família-comprador (SILVA; NEVES, 2012), em que famílias, comerciantes e fornecedores tem posicionamentos na rede com papeis de intermediação de relações que podem se configurar, de acordo com o pressuposto de Crozier (1981), como um problema de relação de poder que tem no fenômeno burocrático uma estratégia de controle da força de trabalho.

A cadeia produtiva desse mercado era controlada pelos comerciantes, principalmente os que associavam em seus negócios o fornecimento de insumos e a compra da produção domiciliar. Os estabelecimentos comerciais eram organizações formais que constituíam, de acordo com Paixão (1997), instrumentos de implementação de papéis e cumprimento de missões. Portanto, por meio de uma racionalidade técnica em atividades de entrada e saída (THOMPSON, 1976), com a implementação de uma organização burocrática, nos moldes de Weber (2002), com ações racionais, estabelecimento de rotinas impessoais e divisão do trabalho, foi fortalecida uma rotina de entrega de insumos e coleta de produção, remunerada pela produtividade individual. Entretanto, a inovação empreendedora no processo produtivo, de organizar burocraticamente a produção e comercialização, pode ter gerado o que Merton (1967) denomina de disfunções burocráticas, evidentes nas reclamações dos trabalhadores. A dor no corpo foi a principal reclamação dos trabalhadores e pode ter como causa a busca constante por melhores remunerações devido ao aumento do ritmo do trabalho repetitivo ocasionado pela divisão e especialização de seu trabalho, o que está em consonância com a pesquisa de Oliveira (2006).

Os proprietários dos estabelecimentos comerciais da tecelagem tradicional idealizaram e executaram iniciativas empreendedoras que organizaram burocraticamente a tecelagem tradicional de Resende Costa (MG), no final do século XX. Estes foram responsáveis por resolver os problemas rotineiros, como a distribuição de insumos, aquisição e conseqüente remuneração por serviços. Entretanto, a introdução do retalho em escala, substituindo as linhas como o principal insumo da tecelagem tradicional, foi uma decisão dinâmica e uma inovação com dimensões administrativas e, também, políticas, por terem moldado novos processos organizacionais que demandaram experiência e perfil empreendedor. A introdução de um insumo em escala, associado com a divisão do trabalho social possibilitaram a produção domiciliar em escala. A busca pela burocratização das organizações do mercado da tecelagem tradicional pode ter sido motivada pela absorção da lógica, por parte do comerciante, de que, dividido e especializado, o trabalho vivo poderia ser controlado, além de ser dominado pela falta de conhecimento dos trabalhadores de todo o processo produtivo. A utilização da racionalidade técnica, então, não seria justificada simplesmente pela eficiência econômica, mas, também, pela relação de poder na coletividade envolvida e institucionalizada no sistema de produção têxtil tradicional do município em questão.

Entretanto, vale ressaltar, conforme Durkheim (1999), que a vida coletiva não nasce da vida individual, mas, ao contrário, a segunda que nasce da primeira. É apenas sob essa condição que se deve explicar como a individualidade pessoal das unidades sociais pôde formar-se e crescer sem desagregar a sociedade. Para que a divisão do trabalho possa nascer e crescer, não basta que existam nos indivíduos germes de aptidões especiais, nem que eles sejam estimulados a variar no sentido dessas aptidões, mas é necessário, além disso, que as variações individuais sejam possíveis (DURKHEIM, 1999). Como pôde ser identificado na realidade socioeconômica do local aqui estudado, as mudanças que ocorreram no cotidiano de seus moradores e, especificamente, na produção doméstica têxtil foram consequências de pressões de mercado que estabeleceram a diferenciação do trabalho social nos domicílios, bem como a organização e racionalização da tecelagem tradicional, por meio da iniciativa empreendedora local do comerciante. O mercado do município de Resende Costa consome a produção dos domicílios e remunera o trabalho pela produtividade, consequentemente, estimulando o aumento da especialização das atividades produtivas. Por outro lado, tal realidade foi consequência de pressões sociais por trabalho e renda, viabilizando a sobrevivência de parte dos indivíduos que ocupam esse território.

Considerações Finais

A compreensão das pressões sociais que demandaram alternativas de soluções e de suas consequentes decisões pode ser feita a partir da análise do processo de transformação não só da produção tradicional como uma organização que busca a eficiência econômica, mas da comunidade local desde sua ocupação em meados do século XVIII que, por meio da emergência das tradições familiares e de iniciativas empreendedoras, proporcionaram para a coletividade o desenvolvimento de um mercado local.

A organização do mercado da tecelagem tradicional foi possível, por meio dos empreendedores locais, com a utilização de práticas como a divisão das tarefas, a especialização do trabalho, controle rígido da produção e remuneração baseada em produtividade. O desenvolvimento socioeconômico desse mercado pode ser compreendido a partir das novas combinações desenvolvidas pelos empreendedores locais, proprietários dos estabelecimentos comerciais, que atuaram com racionalidade empreendedora e burocrática. Os proprietários dos estabelecimentos comerciais exerceram poder a partir do conhecimento sobre os canais de fornecimento e consumo, o que representou um elo entre a demanda e a oferta do mercado com a produção domiciliar.

A racionalização burocrática da estrutura social e produtiva do mercado da tecelagem tradicional local, mesmo que informal, ocorreu em uma manufatura de produção em massa, consequência da busca dessa sociedade pela eficiência econômica de sua produção. Tal eficiência ocorreu com a operacionalização da produção de baixo custo unitário, um diferencial competitivo que viabilizou o sucesso e a sobrevivência da produção têxtil local, e que só foi possível graças à densidade moral da estrutura social desse mercado, formada por vínculos familiares. Entretanto, essa racionalização culminou com a disfunção burocrática de um processo de perda do conhecimento produtivo bicentenário, herdado da singularidade tradicional de um mercado imerso em relações familiares. O sistema produtivo que se configurou de forma semiautônoma era controlado pela organização burocrática com uma técnica racional e intencional de remuneração variável a partir da produtividade, que levou, também, à ocorrência da disfunção burocrática da organização, o que vem gerando o adoecimento dos trabalhadores.

Esse mercado, construído desde meados do século XVIII com a produção domiciliar autônoma, teve o seu trabalho social dividido e especializado durante aproximadamente dois séculos, impulsionado direta e indiretamente pela atuação do Estado, disseminado pela tradição familiar e organizado burocraticamente por empreendedores locais no final do século XX. Entretanto, as disfunções e os problemas vivenciados tanto pelos produtores quanto pelos comerciantes indicam a necessidade de políticas públicas e de programas de Estado em prol do desenvolvimento local sustentável e para a resolução dos seus problemas coletivos.

Especificamente, os dados apresentados indicam a necessidade de políticas com foco na preservação do patrimônio imaterial e material e no estímulo à organização social, como, por exemplo, nas demandas por preservação da técnica têxtil tradicional e do acervo de equipamentos tradicionais. Há necessidade de estímulo à formação de organizações hibridas, entre a esfera pública e privada, para proposição de alternativas que minimizem os problemas socioeconômicos existentes, como, por exemplo, o desenvolvimento de novos produtos para a tecelagem local e a melhoria da qualidade de vida no trabalho.

Novos estudos podem ser desenvolvidos para dar resposta à necessidade de continuidade da profissionalização da gestão de mercados territoriais, que também viabilizem a mediação das relações de trabalho. Outros estudos comparativos podem indicar alternativas de organizações hibridas entre atores públicos e privados, que possam responder sobre as necessidades de compartilhamento de investimentos e custos de operacionalização do mercado local.

Artigo recebido em 03/02/2011.

Última versão recebida em 15/02/2013.

Artigo aprovado em 03/04/2013.

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    Os pesquisadores contaram com apoio financeiro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), por meio do edital MCT/CNPQ 03/.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      10 Jul 2013
    • Data do Fascículo
      Jun 2013

    Histórico

    • Recebido
      03 Fev 2011
    • Aceito
      03 Abr 2013
    • Revisado
      15 Fev 2013
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