O Processo Decisório para o Desenvolvimento da Inovação Sustentável Via Capacidades Dinâmicas nas Cleantechs

Resumo

O objetivo do artigo é apresentar um modelo de como o processo decisório pode impulsionar o desenvolvimento de capacidades dinâmicas para geração de inovação sustentável das empresas cleantech . As cleantechs são organizações altamente tecnológicas que têm como uma de suas principais características a baixa ou nenhuma utilização de recursos não renováveis para produzir qualquer tipo de produto, serviço ou processo. A utilização dessas tecnologias e identificação de oportunidades no mercado torna a inovação sustentável a core competence desse tipo de empresa. Realizou-se um estudo de caso múltiplo de abordagem qualitativa com cleantechs , apoiado pela técnica de análise de conteúdo. A coleta dos dados primários foi feita por meio de entrevistas semiestruturadas, entre outubro de 2020 e dezembro de 2021, utilizando um roteiro de entrevista como instrumento de coleta. Os resultados fornecem um modelo que ilustra como o processo decisório pode impulsionar o desenvolvimento de capacidades dinâmicas para a geração de inovações sustentáveis, por meio de categorias que refletem a sustentabilidade tecnológica, efeitos de transbordamento e impulsionamento para digitalização em tecnologias limpas. A contribuição científica do trabalho é a apresentação de como as organizações podem reestruturar seus modelos de negócios e desenvolver inovações sustentáveis e tecnológicas, proporcionando um salto digital para solucionar gargalos relacionados a racionamento energético, inclusão social por meio de tecnologias de monitoramento, acesso à energia limpa e renovável a baixo custo e outras soluções.

effectuation e causation ; capacidades dinâmicas; inovação sustentável; cleantech

Abstract

This article aims to present a model of how the decision-making process can drive the development of dynamic capabilities for generating sustainable innovation in cleantech companies. Cleantechs are highly technological organizations, one of whose main characteristics is little or no use of non-renewable resources to produce any type of product, service, or process. The use of these technologies and identification of opportunities in the market makes sustainable innovation the core competence of this type of company. A multiple case study was conducted with cleantechs using a qualitative approach, supported by the content analysis technique. The primary data collection was carried out via semi-structured interviews, between October of 2020 and December of 2021, using an interview script as a collection instrument. The results provide a model that illustrates how the decision-making process can drive the development of dynamic capabilities for generating sustainable innovations, by means of categories that reflect technological sustainability, spillover effects, and a drive toward digitalization in clean technologies. The scientific contribution of the study is the presentation of how organizations can restructure their business models and develop sustainable and technological innovations, digitally leapfrogging to address bottlenecks related to energy rationing, social inclusion through monitoring technologies, access to low-cost clean and renewable energy, and other solutions.

effectuation and causation; dynamic capabilities; sustainable innovation; cleantech

Introdução

A inovação sustentável pode ser definida pelo desenvolvimento de novos produtos, processos, serviços e tecnologias que podem colaborar com o bem-estar humano e das instituições. Em busca de desenvolvimento sustentável, a inovação e a sustentabilidade são temas recorrentes nas empresas, governos e instituições (Cillo, Petruzzelli, Ardito, & Del Giudice, 2019). As organizações e empreendedores têm sido impulsionados a adotar tecnologias que proporcionam menor impacto ambiental e social em diferentes setores da economia (e.g. energia, saneamento e transporte) (George, Merrill, & Schillebeeckx, 2020).

Para que essas tecnologias sejam operacionalizadas pelas organizações, o processo decisório do empreendedor deve estar alinhado às premissas ambientais e inclusivas da sustentabilidade para buscar a inovação e o avanço socioeconômico ( Klewitz & Hansen, 2014 ). Da perspectiva da tomada de decisão, o empreendedor pode se orientar majoritariamente por dois tipos de raciocínio, a saber: effectuation e causation ( Sarasvathy, 2001) . Ao se amparar na lógica effectuation , a tomada de decisão tende a ser espontânea, de forma que o empreendedor busque mecanismos que possa controlar. Em contrapartida, na lógica causation , o empreendedor parte de um objetivo, seleciona a melhor forma de alcançar suas metas e mantém o foco no que já foi previsto ( Garrido et al., 2020 ; Sarasvathy, 2001) . Criadas pela motivação empreendedora, diferentes empresas de tecnologia limpa, conhecidas no mercado como cleantechs , buscam articular suas capacidades e recursos no contexto tecnológico e digital para alcançar a inovação sustentável dos negócios (Aagaard, Saari, & Mäkinen, 2021; Bergman, Hajikhani, & Blomqvist, 2019; Gobble, 2012 ; Inigo, Albareda, & Ritala, 2017).

Os autores Cumming, Henriques e Sadorsky (2016), Bergman et al. (2019) e Giudici, Guerini e Rossi-Lamastra (2019), cujos estudos são focados em cleantechs , afirmam que essas empresas são vetores da inovação sustentável, pois carregam em seu cerne a missão de proporcionar soluções de mercado em harmonia com o meio ambiente e a sociedade. Assim, aliam seus interesses de mercado à tecnologia e à digitalização e corroboram positivamente a alocação de recursos ambientais (Cillo et al ., 2019; George et al., 2020 ). Ainda, algumas pesquisas já apresentam a relação entre modelos de negócios de caráter sustentável, que exploram as capacidades dinâmicas em busca de vantagem competitiva por meio de inovações concentradas em soluções voltadas para redução de emissões de carbono, adoção de energias limpas e renováveis, otimização no uso de água e monitoramento do consumo energético para estimular a eficiência dos sistemas interligados de energia ( Brink, 2019 ; Hansen, Grosse-Dunker, & Reichwald, 2009; Inigo et al., 2017) .

Em paralelo, os caminhos dos estudos de inovação sustentável pavimentam o rumo científico entre o processo decisório do empreendedor e a orquestração das capacidades dinâmicas na trajetória do combate às mudanças climáticas por meio de organizações focadas em tecnologias limpas ( Bergman et al., 2019 ; George et al., 2020 ; Strauss, Lepoutre, & Wood, 2017). Esse rumo científico abre direcionamentos para investigar como as inovações sustentáveis se apresentam no contexto das empresas cleantechs ( Aagaard et al., 2021) especialmente, sob a ótica das lógicas de orientação do processo decisório de effectuation e causation (Dias, Iizuka, & Boas, 2019), pois reverberam em soluções que podem proporcionar inovações em processos, organização e produto ( Klewitz & Hansen, 2014) , acelerando o debate e o conhecimento necessários para as discussões multifacetadas do desenvolvimento sustentável (Sachs, Kroll, Lafortune, Fuller, & Woelm, 2021).

O processo decisório é fio condutor para a criação de valor a partir de diferentes tipos de inovação nas cleantechs ( Aagaard et al., 2021 ; Ghorbel, Hachicha, Boujelbene, & Aljuaid, 2021). Segundo os direcionamentos da literatura, permanece em aberto a sua associação direta com os referenciais de capacidades dinâmicas ( Inigo et al., 2017) e inovação sustentável ( Cillo et al., 2019) , de forma que seja possível construir uma lógica científica entre as soluções de negócios das tecnologias limpas que permita aprofundar-se em seus diferentes efeitos para as organizações, economia e sociedade.

Nesse sentido, a lacuna científica que este trabalho busca responder reside nos trabalhos de Ghorbel et al. (2021) e Aagaard et al. (2021) , explicitando que diferentes modelos de inovação devem ser explorados sob a ótica do processo decisório, particularmente da teoria Effectuation . Adicionalmente, Klewitz e Hansen (2014) e Cillo et al. (2019) enfatizam que a inovação sustentável deve ser observada pelas lentes teóricas das capacidades dinâmicas e recursos, explorando contextos de organizações empresariais distintos e inovações em processos, produtos e rotinas.

Baseado no contexto referencial apresentado durante a introdução, a pergunta de pesquisa que guia este artigo é: “Como o processo decisório pode impulsionar o desenvolvimento de capacidades dinâmicas para a geração de inovação sustentável no contexto das empresas cleantechs ? ”. Para atender a pergunta de pesquisa do artigo, o objetivo do trabalho é apresentar um modelo ilustrando como o processo decisório pode desenvolver capacidades dinâmicas para a geração de inovações sustentáveis.

A contribuição científica do artigo reside em apresentar como as organizações podem reestruturar seus modelos de negócios, utilizando o processo decisório como vetor para desenvolver inovações sustentáveis e tecnológicas, proporcionando um salto digital para solucionar gargalos relacionados à racionamento energético, inclusão social por meio de tecnologias de monitoramento, acesso à energia limpa e renovável a baixo custo e outras soluções apresentadas ao longo dos resultados da pesquisa.

Já a contribuição prática está no contexto organizacional das cleantechs , evidenciando o potencial organizacional-inovador desse modelo de empresa, de maneira a consolidar um roteiro de inovações descentralizadas e tecnológicas para os empreendedores, governos e universidades que buscam soluções para os desafios e metas de desenvolvimento sustentável traçadas pela Organização das Nações Unidas (ONU). Para tanto, o percurso metodológico contou com uma pesquisa qualitativa com abordagem de caso múltiplo. Foram aplicadas entrevistas semiestruturadas durante o período de 2020 (outubro) a 2021 (dezembro) em organizações brasileiras caracterizadas como cleantechs .

Contando com a introdução, a estrutura do artigo se divide em seis etapas. A segunda etapa é o referencial teórico, tratando dos principais fundamentos teóricos e referenciais do artigo: processo decisório, teoria de Effectuation , capacidades dinâmicas e inovação sustentável, além da criação das proposições e pesquisas. A terceira etapa descreve o percurso metodológico da pesquisa. A quarta trata da análise de dados realizada a partir da análise de conteúdo. Na quinta etapa, apresentam-se os resultados e discussões dos dados analisados. E, por último, as considerações finais contemplam os direcionamentos, limitações e o atendimento do escopo da pesquisa.

Referencial teórico

Os fundamentos do referencial teórico utilizados para a presente pesquisa abordam: (a) processo decisório: teoria de Effectuation ; (b) capacidades dinâmicas; e (c) inovação sustentável. Os fundamentos condutores foram selecionados em função das características do fenômeno de pesquisa, culminando na elaboração das premissas de proposição, aprofundadas na seção de modelo de proposição.

O fundamento de (a) processo decisório se articula consoante a iniciativa empreendedora sobre a perspectiva da teoria de Effectuation por Sarasvathy (2001) e Sarasvathy, Dew, Read e Wiltbank (2008), que leva ao desenvolvimento de capacidades dinâmicas ( Teece et al., 1997 ). Adicionalmente, as (b) capacidades dinâmicas são exploradas à luz das lentes teóricas propostas por Teece e Pisano (2003) e Teece (2017) , operando o sensing, seizing e reconfiguring , para o desenvolvimento de (c) inovações sustentáveis. Já a inovação sustentável é observada sob os processos de inovação organizacional, inovação de processo e inovação de produtos, na perspectiva socioambiental e econômica dos negócios ( Cillo et al., 2019 ; Klewitz & Hansen, 2014 ).

Processo decisório: teoria de Effectuation

O campo da ciência da tomada de decisão começa a ser evidenciado com o surgimento do livro Comportamento administrativo, de Herbert Simon, em 1947. Simon aborda o processo decisório por uma perspectiva de racionalidade. Para Simon, as decisões são escolhas conscientes entre duas alternativas ou mais com um objetivo bem definido. Os processos de decisão podem ser programados ou não programados. Os programados são rotineiros e repetitivos, e como tal exigem menor esforço do gestor. Por outro lado, os não programados são decisões únicas que exigem planejamento e investigação ( Bertoncini et al., 2013 ).

Outra vertente do campo de tomada de decisão são os processos decisórios alicerceados na perspectiva dos estudos de empreendedorismo que abarcam a ciência da teoria Effectuation ( Dias et al., 2019 ), cujas características conceituais são aprofundadas nesta seção. Nessa perspectiva, o empreendedor é agente tomador de decisões organizacionais para alavancar o desempenho das empresas no mercado, ao adaptar e transformar oportunidades em inovações e contingências em oportunidades ( Ghorbel et al., 2021 ; Roach, Ryman, & Makani, 2016).

Empreendedorismo e inovação são conceitos interdependentes, uma vez que, para gerenciar o processo de inovação, o empreendedor adota a abordagem de effectuation ( Barzotto & Nassif, 2019 ; Ghorbel et al., 2021 ; Roach et al., 2016) . O empreendedorismo está associado à percepção e ao aproveitamento de oportunidades e à criação de novos negócios ou design de negócios de formas novas/inovadoras ( Baron & Shane, 2015 ; Barzotto & Nassif, 2019 ; Shane & Venkataraman, 2000) . A criação e design de negócios, por sua vez, são fundamentais na geração de riquezas e inovações ( Dew & Sarasvathy, 2007) . Logo, é necessário compreender como ocorrem os processos de criação e decisão dos empreendedores ( Ghorbel et al., 2021) e como o esforço dos empreendedores é orientado para adaptar e transformar oportunidades em inovações de sucesso. Adaptação e transformação constituem a ideia-chave da teoria da Effectuation ( Aagaard et al., 2021 ; Roach et al., 2016) .

A teoria de Effectuation se desdobra em duas lógicas complementares, effectuation e causation ( Sarasvathy, 2001 ; Sarasvathy et al., 2008 ). No momento da tomada de decisão, o empreendedor deve dosar as duas lógicas possíveis para se orientar. Essas lógicas podem ser mais espontâneas, um plano ou modelo predefinido ( effectuation ), assumindo um conjunto de meios como dado e focando na seleção de possíveis efeitos que o empreendedor pode criar com aquele conjunto de meios para determinar o que ele pode controlar ( Sarasvathy, 2001 ). Esse processo contrasta com a lógica metódica e ordenada ( causation ), em que um objetivo particular é dado e o empreendedor se concentra em selecionar os meios mais adequados para criar e alcançar aquela meta predefinida, tendo seu foco na previsão ao invés do controle ( Garrido et al., 2020 ; Sarasvathy, 2001 ). Ambas as lógicas de tomada de decisão podem se referir a uma decisão particular ou uma série de decisões, ou até mesmo a uma tendência para enfatizar a causation e/ou effectuation dentro da organização (Harms, Alfert, Cheng, & Kraus , 2021).

A tendência à lógica causal se fundamenta nas metas/objetivos, no planejamento e no reconhecimento de oportunidades, tendo como guia as análises da concorrência, conhecimentos pré-existentes e retornos estimados. Em contrapartida, com a ênfase na visão majoritariamente effectual , o empreendedor se fundamenta em quatro conceitos-chave e em três princípios orientadores para operacionalizar essa lógica ( Sarasvathy, 2001 ; Sarasvathy et al., 2008 ; Kalinic, Sarasvathy, & Forza, 2014). A base conceitual se subdivide em (a) flexibilidade, que compreende o raciocínio guiado pela melhoria contínua, a constante evolução; (b) experimentação, em que a lógica é pautada no aprendizado gradual e na tolerância ao erro; (c) perda justificável, que se pauta no ponto de equilíbrio em que a possível perda (o risco) é aceitável; e (d) compromissos prévios, que abarca as alianças e redes informais, sendo a dimensão referente à seleção e ao compromisso das diferentes partes interessadas ( stakeholders ) ( Barzotto & Nassif, 2019 ; Kalinic et al ., 2014; Sarasvathy, 2001) . Os princípios orientadores são atrelados ao empreendedor/indivíduo: (a) quem eu sou (a personalidade), o que eu sei (a experiência) e quem eu conheço (a rede de contatos) ( Kalinic et al., 2014 ; Roach et al., 2016 ; Sarasvathy et al., 2008) .

Segundo Roach et al. (2016) , os princípios de Effectuation partiram de uma evolução da prática da inovação empresarial. Dessa forma, incluem muitos tipos e concepções da inovação empresarial e estão intimamente ligados à inovação. Os diferentes métodos de inovação impactados pelos processos decisórios podem facilitar a dinamicidade e a abordagem centrada no consumidor, essenciais à validação de modelos de negócios, ciclo de produto, oportunidades e cocriação de novos mercados ( Ghorbel et al., 2021 ; Roach et al., 2016 ).

Ainda, ao equilibrar as lógicas effectual e/ou causal, as ações dos empreendedores desdobram-se em/impulsionam as capacidades dinâmicas compreendidas nas dimensões de sensing, seizing e reconfiguring , a serem aprofundadas mais adiante. Conforme estudos de Sarasvathy (2001) e Sarasvathy et al. (2008) , os empreendedores, ao se pautarem nas lógicas de tomada de decisão, utilizam recursos existentes para identificar oportunidades; identificam oportunidades oriundas de falhas de mercado ao investigar fatores que retardem o alcance de seus objetivos; aproveitam as contingências; estabelecem relações estratégicas com stakeholders e tomam decisões de investimento sob a perspectiva da perda aceitável. Logo, o empreendedor cria e (re)configura os recursos para identificação e aproveitamento de oportunidades ( Roach et al., 2016 ; Sarasvathy, Kumar, York, & Bhagavatula, 2014; Silva, 2020) .

Adicionalmente, Teece et al. (1997) ressaltam que a gestão estratégica é fundamental para alcançar a “adaptação, integração e reconfiguração das habilidades, recursos e competências organizacionais internos e externos” (p. 515). Dessa forma, por meio das lógicas de tomada de decisão, os empreendedores estão impulsionando a identificação ( sensing ), planejamento/aproveitamento ( seizing ) e reconfiguração ( reconfiguring ) de oportunidades, recursos e competências.

Capacidades dinâmicas

As capacidades dinâmicas são habilidades desenvolvidas pelos recursos no ambiente organizacional e são essenciais para o desempenho da empresa ( Teece et al., 1997 ). Construídas ao longo da jornada a partir do conhecimento e de experiências, o conjunto de habilidades que inclui indivíduos, recursos humanos e a propriedade intelectual da empresa possibilita integrar, construir e reconfigurar os negócios ( Strauss et al., 2017 ; Teece, 2017 , 2018 ). Para obter vantagens competitivas sustentáveis, é necessária a definição das habilidades para alocação correta dos recursos e promoção contínua de capacidades que gerem inovação sustentável difíceis de imitar ( Helfat & Peteraf, 2015 ; Teece & Leih, 2016 ; Cillo et al., 2019) .

O estudo de capacidades dinâmicas se fundamenta no estudo da visão baseada em recursos (VBR) proposto por Teece et al. (1997) ao destacar a importância do desenvolvimento dos recursos de capacidades dinâmicas nos processos e rotinas empresariais, enfatizando que essas capacidades são raras, inimitáveis e difíceis de substituir. Na intenção de implementar melhores práticas frente aos concorrentes, Teece et al. (1997) e Teece (2017) dividiram as capacidades dinâmicas em três dimensões, a saber: sensing, seizing e reconfiguring . As dimensões de Teece (2017) estão consolidadas e adaptadas na Tabela 1 sob a perspectiva da pesquisa de Garrido, Kretschmer, Vasconcellos e Gonçalo (2020).

Tabela 1
As dimensões das capacidades dinâmicas

Dimensão	Característica da dimensão das capacidades dinâmicas	Referências
Sense: Perceber ameaças para contornar com oportunidades e tecnologias no mercado.	Investimento em P e D; identificar necessidade do cliente; coletar informações de diferentes fontes; monitorar evolução estrutural e tecnologia do negócio; adquirir, acumular e partilhar conhecimento tácito; desenvolver rotinas para formulação de novas ideias.	Brink, 2019 ; Garrido et al., 2020 ; Inigo et al., 2017 ; Teece, 2017 , 2018 ; Teece et al., 1997 .
Seize: Transformação de oportunidades em novos produtos, serviços e processos	Desenvolver novos produtos e processos; investimento em tecnologia; melhorar, desenvolver novos modelos de negócios; vincular conhecimentos; desenvolver rotinas de internalização de conhecimento para decisões estratégicas	Brink, 2019 ; Garrido et al., 2020 ; Inigo et al., 2017 ; Teece, 2017 , 2018 ; Teece et al., 1997 .
Reconfiguring: Reconfiguração de ativos e estrutura organizacional para garantir a evolução da empresa	Definir parcerias na cadeia de valor; descentralizar atividades; orquestrar ativos, alinhá-los e redistribui-los; Capacidade de integrar, compartilhar e monitorar conhecimento; explorar criação de novos conhecimentos; ampliar redes de colaborações para gerar combinações de recursos; Abandonar combinações e processos que não geram vantagens competitivas.	Brink, 2019 ; Garrido et al., 2020 ; Inigo et al., 2017 ; Teece, 2017 , 2018 ; Teece et al., 1997 .

• Fonte: Adaptado de Garrido et al. (2020) .

O desafio proposto nas empresas é o de buscar lucros de forma sustentável, tendo como ponto de partida, por exemplo, a identificação das capacidades dinâmicas desenvolvidas, o desenvolvimento dos processos da cadeia de suprimentos e o envolvimento de todo conjunto de processos, sendo esses elementos-chave para a criação de novas propostas de valor com baixo custo e que possibilitem a inovação sustentável ( Inigo et al., 2017 ).

As capacidades dinâmicas se apresentam como mecanismo importante para endereçar o processo de inovação sustentável ( Brink, 2019 ; Inigo et al., 2017 ). As empresas precisam preparar seus recursos físicos com habilidades para identificar novas tendências tecnológicas para inovação na perspectiva de mitigar ameaças e gerar novas oportunidades ( Teece, 2010 ).

No sentido de corresponder ao ambiente de novas mudanças, Teece (2017) emprega as capacidades tecnológicas com o intuito de promover a digitalização e a inovação e acompanhar as mudanças articuladas pelos concorrentes. Os autores Achtenhagen, Melin e Naldi (2013) destacam a importância do desenvolvimento das capacidades dinâmicas de ordem superior. Assim, as capacidades tecnológicas desenvolvidas pelos recursos podem ser fontes de geração de novas ideias para a promoção de inovação sustentável da empresa ( Mezger, 2014 ).

As mudanças no panorama global das empresas implicam em novas iniciativas rumo à inovação sustentável ( Inigo et al., 2017 ; Klewitz & Hansen, 2014 ). Essa mudança de chave envolve processos decisórios para inovação, e indivíduos e empresas desenvolvem habilidades para apoiar novas estratégias ( Brink, 2019 ; Klewitz & Hansen, 2014) . Portanto, o processo de decisão para atingir a inovação sustentável, neste estudo, tem profundas ligações com os fundamentos das capacidades dinâmicas ( Cillo et al., 2019) .

Inovação sustentável

Os estudos de inovação tiveram seus primórdios com as obras de Joseph Schumpeter, que traziam um viés econômico/industrial. Para o autor, inovação se traduz na introdução de um novo produto ou em novas combinações de algo já existente (Schumepter, 1934). A inovação e a evolução ocorrem por meio de um ciclo em que um empreendedor atrai outro empreendedor, multiplicando assim os efeitos da rede.

Porém, para este trabalho, adotaremos a linha de Klewitz e Hansen (2014) e Cillo et al. (2019) para observar a inovação sustentável no contexto das empresas cleantech , uma vez que o conceito é posicionado como premissa resultante da articulação entre os fundamentos do processo decisório e de capacidades dinâmicas. A inovação sustentável pode ocorrer sob a perspectiva de três dimensões estratégicas da inovação, que devem estar alinhadas a questões sociais, ambientais e econômicas: (a) inovação de processo; (b) inovação organizacional; e (c) inovação de produto ( Boons & Lüdeke-Freund, 2013 ; Klewitz & Hansen, 2014) . Na sequência, apresentamos a definição das três dimensões de inovação, sob a perspectiva da inovação sustentável, que servem como direcionadoras para a aplicação dos instrumentos de coleta da presente pesquisa:

• Inovação de processo: está associada aos métodos e técnicas para produção de bens e serviços que aumentam a eficiência sustentável das soluções de mercado ( Cillo et al., 2019 ; Gobble, 2012 ). A inovação de processo está associada a utilização de tecnologias limpas para o direcionamento de soluções de mercado que aumentam a eficiência ambiental e ecológica, visualizando um cenário viável economicamente para os negócios. Klewitz e Hansen (2014) reforçam que os processos inovadores estão relacionados às questões de logística, pegada de carbono, produção limpa de energia e ecoeficiência;

• Inovação organizacional: está relacionado à reestruturação de rotinas organizacionais, explorando novas formas de gestão e a capacidade de reconfigurar as características dos ativos da organização ( Cillo et al., 2019 ). Os sistemas tecnológicos utilizados permitem a inovação na organização, adotando novas estruturas de governança que visam metas ambientais, sociais e inclusivas, reverberando nas cadeias de suprimento e fluxos de trabalho nas empresas ( Boons & Lüdeke-Freund, 2013 ; Klewitz & Hansen, 2014) . A automação e a otimização de rotinas via tecnologia e digitalização permitem que a inovação organizacional enderece fatores socioambientais nos modelos de negócios ( George et al., 2020) .

• Inovação de produto: está baseada no refinamento, aprimoramento ou desenvolvimento de novos produtos e serviços, focados em design, materiais e padrões de qualidade que propiciam novidades no mercado via uma abordagem sustentável ( Cillo et al., 2019 ; Hall, Daneke, & Lenox, 2010). Essas inovações podem corroborar a eficiência e a redução do consumo energético e do desperdício de água, o desenvolvimento de fontes não renováveis para fontes renováveis e soluções tecnológicas que podem ser anexadas a produtos e serviços existentes para estimular a sustentabilidade nos negócios de forma inovadora, cobrindo as dimensões sociais, econômicas e ambientais dos negócios ( George et al., 2020 ; Klewitz & Hansen, 2014) .

Entretanto, para compreender essas dimensões na perspectiva da inovação sustentável, é preciso dar um passo para trás e analisar o conceito de inovação sustentável. Esse conceito está enraizado sobre as bases científicas da inovação tecnológica e alocação de recursos para o desenvolvimento de novos produtos e processos, visando a responsabilidade socioambiental dos negócios ( Friedman, 2007 ; Gobble, 2012 ; Hansen et al., 2009 ). A inovação sustentável diz respeito ao desenvolvimento de novos produtos, processos, serviços e tecnologias que contribuam para o bem-estar da humanidade, visando fatores ambientais e sociais e sua capacidade de mitigar impactos, com base na utilização de recursos provenientes e extraídos do meio ambiente ( Cillo et al., 2019 ).

Na perspectiva das organizações, a inovação sustentável é o processo de inovação que consiste na renovação e aprimoramento de produtos, tecnologias e processos organizacionais e reflete economicamente, ambientalmente e socialmente no desempenho das organizações, gerando soluções que reduzem o impacto nos negócios ( Boons & Lüdeke-Freund, 2013 ; George et al., 2020) . Além disso, a inovação sustentável é articulada sobre as perspectivas socioambiental e financeira, integrando os processos e sistemas das empresas que envolvam os trabalhos de pesquisa e desenvolvimento (P&D) nos negócios ( Cillo et al., 2019 ; Klewitz & Hansen, 2014) .

Em revisão aprofundada da literatura, os autores Klewitz e Hansen (2014) apontam que a inovação sustentável pode se manifestar nas empresas em determinados comportamentos estratégicos que estão ligados a tipos de inovação, como: aprimoramento de processos organizacionais, inovações nos produtos, inovação no modelo de negócio e até as mudanças radicais de produtos. Esses tipos de inovação estão sujeitos à interação de diferentes stakeholders (e.g. mercado, governo, agências reguladoras) que estimulam a empresa a adotar seu posicionamento estratégico em busca da inovação sustentável.

Adicionalmente, Cillo et al. (2019) afirmam que a inovação sustentável pode ser estressada na perspectiva de diferentes lentes teóricas ao observar o contexto empresarial. Entre essas lentes teóricas estão fundamentos ligados a capacidades dinâmicas, recursos da empresa e gestão do conhecimento. Para os autores, essas são lentes teóricas do conhecimento científico que devem ser aprofundadas em função de compreender como a inovação sustentável se apresenta em diferentes contextos organizacionais, pavimentando lacunas de pesquisas apresentadas ao longo da literatura científica ( Inigo et al., 2017 ).

Modelo teórico de proposições

Sob a perspectiva da lente teórica de Effectuation , os empreendedores, no momento da tomada de decisão, se fundamentam em conhecimentos, alianças e redes preexistentes ( Silva, 2020 ). Ao longo do tempo o ciclo se retroalimenta, aprimorando-se com mais descobertas, criação e desenvolvimento de capacidades e oportunidades (Chandra, Styles, & Wilkinson, 2015). Assim, empreendedores partem da análise dos recursos e das capacidades da organização para, ao configurar e aproveitar essas capacidades, criar oportunidades em mercados desconhecidos ( Kalinic et al., 2014) . Essa lógica é particularmente benéfica em contextos dinâmicos, em que o principal objetivo é solucionar problemas por meio da criação de oportunidades ( Kalinic et al., 2014) .

Em ressonância, ao investigarem a identificação de oportunidades no contexto de joint ventures , Mainela e Puhakka (2009) se baseiam nos conceitos de effectuation . Em seu estudo, constatam que as oportunidades são identificadas e criadas com base no estado de alerta, na criatividade e na flexibilidade do empreendedor, com uma forte influência das parcerias no resultado da criação. Ainda, as capacidades dinâmicas tornam possível a execução eficaz da intenção estratégica (Shuen, Feiler, & Teece, 2014). Para identificar, desenvolver e explorar oportunidades, é fundamental que o empreendedor seja ágil nas decisões, preciso no timimg e assertivo na geração de valor, sendo então importantes as capacidades dinâmicas do próprio empreendedor (Peiris, Akoorie, & Sinha , 2015).

O empreendedor tem a responsabilidade de alavancar a aplicação dos recursos e capacidades. Da mesma forma, precisa ser capaz de reconfigurar constantemente esses recursos e capacidades para obter outputs diferentes e, assim, criar oportunidades, inovação e vantagem competitiva. Dessa forma, o empreendedor, tal como sua lógica de tomada de decisão, é central para as capacidades dinâmicas. O empreendedor é responsável por alavancar a aplicação dos recursos, de modo que os mesmos recursos possam gerar resultados diferentes em função da sua atuação (Roach et al ., 2016; Sarasvathy et al., 2014 ; Silva, 2020 ). Visto que a Effectuation se desdobra em duas lógicas de tomada de decisão, no presente trabalho, o papel dessas lógicas serão examinados partindo de duas proposições, a fim de explorar ambas por meio da criação e do aproveitamento de oportunidades e capacidades. A influência das duas lógicas de decisão pode ser observada nas três dimensões das capacidades dinâmicas estabelecidas por Teece (2017): sensing, seizing e reconfiguring .

Proposição 1: O processo decisório pautado na lógica effectual impulsiona o aproveitamento das capacidades dinâmicas.

Proposição 2: O processo decisório orientado para a lógica causal permite a identificação e a geração de capacidades dinâmicas.

Desse modo, o que se propõe é que a partir das lógicas effectual e causal há aproveitamento e geração de capacidades dinâmicas. Propõem-se, ainda, que esse processo culmina na geração de inovação sustentável ( Figura 1 ), conforme a proposição 3, apresentada a seguir. Tais proposições são baseadas na literatura exposta acima e serão investigadas por meio do estudo de caso em empresas cleantechs .

Figura 1
Modelo teórico de proposições

Proposição 3: As capacidades dinâmicas articuladas pelo processo decisório geram inovação sustentável.

Metodologia

A abordagem metodológica do presente artigo se pauta em métodos qualitativos descritivos, a serem explicitados a seguir. A pesquisa foi orientada ao estudo de caso múltiplo com empreendedores de organizações cleantech que se adequavam aos critérios estabelecidos. Adicionalmente, aplicou-se a análise de conteúdo com apoio do software MaxQDA, que permitiu a importação das entrevistas transcritas para agilizar a análise e o processo de categorização dos trechos da pesquisa. O uso de softwares para apoiar a análise de conteúdo foi adotado, pois permite a absorção robusta dos dados, possibilitando inferências qualitativas aprimoradas.

Abordagem de pesquisa e método

A pesquisa utilizou o método qualitativo de caráter descritivo para compreender, observar e analisar o fenômeno estudado. Tal método possibilita que os pesquisadores se aproximem do objeto de estudo por meio das lentes teóricas, compreendendo as camadas presentes durante o evento pesquisado. Diante disto, o método permite que os pesquisadores capturem todos os elementos envolvidos durante evento e coletem o máximo de dados possíveis, sendo obrigados a considerar todo e qualquer dado no campo ( Sandelowski, 2000 ).

A pesquisa foi elaborada sobre a observação e análise de múltiplos casos. Os múltiplos casos apresentam semelhanças do fenômeno estudado entre os objetos de estudo, diminuindo a possibilidade da análise de uma perspectiva única do objeto ( Yin, 1994 ). As múltiplas evidências permitem excluir particularidades únicas e, quando convergentes entre elas, elevam a confiança e robustez do método, suportando as inferências com base no referencial teórico ( Zainal, 2007 ).

Por sua vez, tais escolhas em relação ao método utilizado e à abordagem sustentam o interesse em poder responder ao problema de pesquisa por meio do “como”. O que, à luz de outros métodos, tornaria difícil o acesso à identificação e à análise necessárias para suprir as peculiaridades da pergunta em questão ( Sandelowski, 2000 ).

Percurso metodológico para o estudo de caso

O percurso metodológico feito nesta pesquisa é baseado e adaptado do proposto por Hafiz (2008) , dividindo o processo em oito principais etapas. Esse fluxo proposto para o estudo de caso intenciona tratar de forma simples situações complexas. Nesse sentido, a pesquisa busca converter e deixar claro fenômeno em estudo, seguindo conforme o fluxo apresentado na Figura 2 .

Figura 2
Etapas do estudo de caso

Instrumento de coleta e período de coleta

A coleta dos dados primários foi feita por meio de entrevistas semiestruturadas, entre o período de 2020 (outubro) a 2021 (dezembro), utilizando um roteiro de entrevista como instrumento de coleta ( ^{Apêndice 1} ). A utilização desse método de coleta permite que o entrevistador guie a entrevista sob a lente do referencial teórico e, ainda, que o entrevistado tenha liberdade para evidenciar fatos que estejam além da perspectiva analisada e que possam ser relevantes ao estudo ( Yin, 2015 ).

O roteiro de entrevista foi criado com base nas proposições elaboradas à luz do referencial teórico, a fim de obter respostas que pudessem contribuir para compreensão do fenômeno. A utilização desse instrumento de coleta permite que o entrevistador tenha uma preparação prévia e possa verificar se as perguntas estão coerentes com o objetivo do estudo, avaliando possíveis melhorias antes da implementação na pesquisa. Além disso, possibilita que o entrevistador escolha manter ou não as entrevistas sobre o caminho do referencial teórico (Kallio, Pietilä, Johnson, & Kangasniemi, 2016).

Contexto da pesquisa: as empresas cleantech

O objeto de estudo utilizado para analisar o problema de pesquisa consiste nas empresas cleantechs brasileiras. As cleantechs são organizações altamente tecnológicas que têm como uma de suas principais características a baixa ou nenhuma utilização de recursos não renováveis para produzir qualquer tipo de produto, serviço ou processo. A utilização dessas tecnologias e a identificação de oportunidades no mercado tornam a inovação sustentável a core competence desse tipo de empresa ( Bergman et al., 2019 ; Cumming et al., 2016 ).

Dado o contexto, empresas de tecnologia limpa ( cleantechs ) possuem características peculiares, por redobrarem a preocupação com o meio ambiente e fazerem uso de recursos ecologicamente corretos aliados ao uso intensivo de tecnologia. São empresas com foco em tecnologias limpas que são fortes aliadas para promover economia na energia, combater a poluição, a contaminação e o impacto ambiental (Pernick & Wilder, 2007).

As cleantechs possuem quatro principais áreas de atuação: transporte, energia, água e minerais ( De Noronha et al., 2022 ). Esses segmentos de mercado das empresas cleantechs incorporam processos, tecnologia, bens e serviços que foram desenvolvidos para amenizar os efeitos ambientais negativos e possibilitar o uso sustentável de recursos naturais. As cleantechs passaram a existir principalmente pela exigência do mercado, partindo de determinadas necessidades, por exemplo: o tratamento de água, redução de emissão de poluentes no ar, gases de grandes indústrias e redução de energia entre outros ( De Noronha et al., 2022 ). Sendo assim, as cleantechs podem se configurar em indústrias, comércios e diversas cadeias de valores.

O comprometimento central das cleantechs é englobar produtos e serviços de tecnologia apoiado em conhecimento para fornecer conduta superior com menores custos. A proposta dessas empresas é reduzir impactos ecológicos negativos e utilizar recursos naturais de forma responsável ( George et al., 2020 ). Com esse objetivo, suas rotinas organizacionais são consolidadas por processos automatizados amparados na tecnologia e na inovação, permitindo a remodelação dessas rotinas para viabilizar a criação de novos produtos sustentáveis para empresa ( Cillo et al., 2019 ).

As características desse tipo de empresa a colocam em um ambiente de negócio altamente dinâmico, inovador e tecnológico (Giudici, Guerini, & Rossi-Lamastra, 2019). As constantes mudanças do ambiente e os desafios ambientais formam um contexto de futuro incerto e de oportunidades ou necessidades para a emersão do empreendedorismo, indo ao encontro dos objetivos deste estudo (Wüstenhagen, Sharma, Starik, & Wuebker, 2008).

Critérios de seleção da amostra e suas características

Os critérios de seleção das empresas foram: (a) ser uma cleantech e possuir soluções tecnológicas de cunho sustentável; (b) se localizar no Brasil; (c) ter acesso a empreendedores influentes no processo decisório da organização. A decisão de tais critérios se deve à necessidade de compreender as decisões dos empreendedores das empresas envolvidas em um ambiente de negócios altamente dinâmico, tecnológico e inovador e consoante o direcionamento dos fundamentos teóricos selecionados.

Assim, as entrevistas foram realizadas com dezessete empreendedores de empresas denominadas cleantechs sediadas no Brasil. As entrevistas foram conduzidas entre outubro de 2020 e dezembro de 2021 nas modalidades presencial e virtual (via plataformas on-line), com duração média de 38,56 minutos, sendo gravadas integralmente para posterior transcrição de seus conteúdos. No decorrer da coleta, observou-se que havia grande convergência entre os resultados encontrados e não havia aparições de novos dados substancialmente relevantes à pesquisa, atingindo, assim, o ponto de saturação. Dessa forma, não foram coletados mais relatos, e as características da amostra são especificadas na Tabela 2 . Portanto, o ponto de saturação se apresentou em dezessete entrevistas (Guest, Bunce, & Johnson, 2006).

Tabela 2
Características da amostra

Empreendedor entrevistado	Empresa	Escopo de atuação da cleantech	Tempo de entrevista	Data da entrevista
Entrevistado 1	A	Créditos financeiro para implementação de energia solar	42’:12”	Outubro, 2020
Entrevistado 2	B	Comercialização de certificados de energia renovável	37’:11”	Outubro, 2020
Entrevistado 3	C	Monitoramento de consumo energético, otimização e eficiência energética	26’:37”	Dezembro, 2020
Entrevistado 4			44’:02”	Fevereiro, 2021
Entrevistado 5	D	Comercialização de energia solar	35’:01”	Fevereiro, 2021
Entrevistado 6	E	Saneamento e tratamento de água	45’:52”	Abril, 2021
Entrevistado 7			40’:44”	Abril, 2021
Entrevistado 8	F	Comercialização de energia solar	39’:22”	Março, 2021
Entrevistado 9			29’:12”	Março, 2021
Entrevistado 10	G	Energia e mobilidade	31’:23”	Junho, 2021
Entrevistado 11			45’:56”	Junho, 2021
Entrevistado 12	H	Captura de carbono	44’:10”	Agosto, 2021
Entrevistado 13			36’:12”	Agosto, 2021
Entrevistado 14			33’:17”	Agosto, 2021
Entrevistado 15	I	Sistema de monitoramento de parques eólicos	28’:09”	Novembro, 2021
Entrevistado 16	J	Monitoramento de consumo energético, otimização e eficiência energética	49’:12”	Novembro, 2021
Entrevistado 17	K	Consultoria digital para redução de consumo energética e plataforma de serviços de energia	50’:22”	Dezembro, 2021

• Fonte: Elaborada pelos autores.

Níveis de análise da amostra

Devido ao contexto da pesquisa e à seleção das lentes teóricas para observar o fenômeno, foram divididos inicialmente quatro níveis de análise para enquadrar os principais resultados obtidos por meio da análise de dados e avaliação dos relatos. Esses níveis de análise são: (1) nível empreendedor ; (2) nível organizacional ; (3) nível inovações sustentáveis das cleantechs ; e (4) efeitos das inovações de tecnologias limpas . Os níveis de análise da amostra são detalhados nos itens a seguir:

1. Nível empreendedor: está associado à seleção dos empreendedores das próprias cleantechs e suas iniciativas, que estão ligadas às linhas do processo decisório de effectuation e causation . Esse nível compreende as iniciativas empregadas que envolvem contextos das organizações. Também foram considerados a avaliação das soluções que abarcam os clientes das cleantechs e como eles podem ser impactados de forma positiva ou negativa pelas iniciativas empreendedoras e pelo processo decisório.

2. Nível organizacional: compreende as práticas internas que traduzem a lente de capacidades dinâmicas e estão ligadas a iniciativas dos processos decisórios, implicando na forma como as organizações cleantech operam suas soluções em relação às categorias de sensing, seizing e reconfiguring . Esse nível de análise foi observado sobre a perspectiva interna da empresa com suporte empreendedor para a geração de inovação sustentável, criando um eixo teórico para a estruturação de proposições de pesquisa.

3. Nível inovações sustentáveis das cleantechs: representa a aferição das categorias provenientes da referência de inovação sustentável, a partir das categorias: (a) inovação de processo; (b) inovação organizacional; e (c) inovação de produto. Esse nível é observado como um resultado entre a associação dos níveis A e B, visualizando as inovações proporcionadas pelas cleantechs selecionadas para a amostra e suas características tecnológicas e digitais específicas para fomentar inovações de impacto ambiental, social e econômico.

4. Efeitos das inovações de tecnologias limpas: esse nível está ligado aos efeitos causados pelas iniciativas do processo decisório e à relação com o contexto organizacional e de inovação sustentável. São avaliados os principais achados das pesquisas em função da aplicação das inovações conduzidas pelo processo decisório dos empreendedores que reverberam nas organizações.

Técnica de análise de dados: categorias de pesquisa e softwares utilizados

A técnica de análise utilizada foi a análise de conteúdo com triangulação dos dados, percorrendo o caminho de análise baseado em algumas etapas ( Elo & Kyngäs, 2008 ). A técnica de triangulação foi aplicada nesta pesquisa para contribuir com a qualidade dos achados e compor o processo de análise. Os dados coletados foram extraídos das principais fontes, a saber: entrevistas, observações e notas de campo e documentos provenientes de sites e do setor das organizações selecionadas para pesquisa ( Decrop, 1999) .

Triangular os dados contribui com o método de pesquisa qualitativa e reforça a validação dos materiais coletados ( Shenton, 2004 ). Portanto, os processos utilizados nesta pesquisa foram: (a) escolha da abordagem; (b) leitura dos dados coletados; (c) classificação dos dados dedutivos; (d) sistematização dos dados via software ; e (e) categorização dos dados, conforme demonstra a Figura 3 .

Figura 3
Percurso da análise de dados

A técnica de análise de conteúdo permite avaliar e comparar inferências no que diz respeito a valores, sentimentos, intenções e ideologias dos agentes geradores dos dados coletados. Tais dimensões são fundamentais para compreender questões relevantes no processo decisório do empreendedor relacionado às cleantechs e suas capacidades dinâmicas e inovações ( Morris, 1994 ).

O avanço global da tecnologia possibilitou que a criação das categorias e classificação dos dados analisados à luz da análise de conteúdo pudessem ser feitas por meio de sistemas computadorizados. A utilização do software MaxQda para sistematização dos dados sustenta a confiabilidade para a classificação de uma grande quantidade de dados, como é o caso desta pesquisa ( Morris, 1994 ). O software MaxQda permite a importação das entrevistas transcritas e auxilia na análise e interpretação dos dados coletados, facilitando a codificação e o compartilhamento das análises entre pesquisadores. Dessa forma, a escolha pelo uso do software MaxQda para essa pesquisa foi decorrente da necessidade de codificação dos trechos das entrevistas e, adicionalmente, pela agilidade que a sistematização do conteúdo promove. O MaxQda permite que os pesquisadores destaquem partes importantes para a análise e empreguem categorias que forneçam maior robustez à análise de conteúdo.

Inicialmente, foram utilizadas categorias dedutivas, conforme proposto por Elo e Kyngas (2008) . As categorias dedutivas são aquelas criadas com base no referencial teórico, de acordo com a construção do roteiro de entrevista feito previamente. Porém, durante o período de análise dos dados coletados, foi verificada a emersão de categorias relevantes ao estudo e que não estavam previstas no referencial teórico, sendo necessária a criação das categorias indutivas para compreensão completa do fenômeno ( Elo & Kyngas, 2008 ). Neste estudo, as categorias indutivas são denominadas categorias emergentes , para facilitar a compreensão da análise de dados na seção posterior.

Análise e discussão de resultados

Análise de conteúdo

A seção de análise de conteúdo do presente artigo está estruturada sobre a análise dos relatos transcritos durante o trabalho. Para realizar a análise, foi utilizada a abordagem dedutiva, em que foram selecionados os principais relatos representativos das categorias encontradas no referencial teórico e que simbolizam o número de repetição, ilustrando o objetivo estabelecido pelo trabalho ( Tabela 3 ). O número de repetição representa a incidência estatística de repetição identificada pelo software MaxQDA. Tal incidência indica a relevância da categoria teórica operacionalizada durante o estudo, direcionando o aprofundamento do conceito via instrumento de coleta (roteiro). Conforme apontado na seção de metodologia, a técnica empregada é a análise de conteúdo, visando analisar semanticamente o texto proposto, sob as lentes teóricas selecionadas para a pesquisa.

Tabela 3
Relatos, categorias e incidências

Bloco	Categorias de análise	Repetição	Transcrição representativa
Processo decisório	Effectuation	15	“A comercialização de certificados de energia renovável é para qualquer empreendedor que busca tornar seus produtos sustentáveis e estruturar seu modelo de negócios visando o meio ambiente. O empreendedor pode optar pela compra de certificados de energia eólica, solar e biomassa e atestar a ‘renovabilidade’ do suprimento energético do seu negócio. . . Essa tecnologia já é viabilizada também pelo blockchain ”. (Entrevistado 2, 2020) “O crédito e acesso para produzir a sua própria energia solar dão autonomia para os comerciantes não dependerem de uma energia mais cara e não renovável. Os empreendedores passam a ter escolha do tipo de energia, usando um sistema de compensação energética estabelecido pela própria ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica)” (Entrevistado 1, 2020)
	Causation	19	“Os sistemas de monitoramento armazenam os dados em nuvem . . . Podemos planejar as estratégias para os diferentes tipos de consumidor e eles escolhem as melhores opções para reduzir o seu consumo. A tecnologia em nuvem e armazenagem de dados faz com que possamos ofertar diferentes soluções energéticas para o cliente possa economizar em sua conta no cotidiano. Dentre essas soluções para comércios estão desde a troca de borrachas para geladeiras até compra de cotas de energia solar, barateando os custos dos empreendedores e dando uma perspectiva para gastos fixos. . .” (Entrevistado 3, 2020)
Capacidades dinâmicas	Sensing	29	“Os dispositivos existentes dão mobilidade para entendermos o comportamento de consumo de cada cliente . . . Temos uma inteligência que por meio de satélites podemos identificar as diferentes mudanças climáticas e monitorar preços e enviar notificações para os consumidores em períodos gastos . . . Os algoritmos também conseguem mapear dados específicos para diferenciar os clientes e com esses insights podemos melhorar nossa planta de serviços e fornecer opções especificas para diferentes consumidores, dando uma autonomia para escolha de produtos por meio da Internet das Coisas (IoT) nos smart meterings .” (Entrevistado 5, 2021)
	Seizing	22	“. . . possuímos uma rede tecnológica e digital de monitoramento para diminuir os desperdícios e perdas no consumo de água e vazamentos . . . os sensores de inteligência artificial detectam os reparos necessários e com apoio de manutenção é possível resolver e remediar os problemas de vazamento em tempo real. Isso em larga escala pode proporcionar ganhos imensuráveis para moradores de grandes cidades como São Paulo. Para se ter uma ideia, hoje o Brasil perde 38% da água que coleta nos mananciais durante sua distribuição. Para entender a proporção desse volume, se a gente economizasse aproximadamente 20% do que a gente perde, nós já teríamos água suficiente para abastecer os 35 milhões de brasileiros que não tem acesso a água potável. O brasileiro perde muita água e financeiramente isso representa um custo de 10 bilhões de reais todos os anos”. (Entrevistado 7, 2021)
	Reconfiguring	31	“As mudanças nas regras vigentes de comercialização e compensação de energia aplicadas pela ANEEL permitiram a comercialização de cotas de energias solar. Empreendedores donos de padarias, restaurantes e lojas de shopping podem comprar energia sem instalar os painéis solares . . . Foi uma rápida adaptação para o comércio e para as oportunidades que abriram para o setor de energia porque sabemos que o Sistema Interligado Nacional de energia é complexo e conta com uma série de questões estruturais que dependem de transmissão e distribuição de energia para os grandes centros”. (Entrevistado 9, 2021)
Inovação sustentável	Inovação de processo	38	“A renovabilidade da matriz é muito importante para a mobilidade urbana e será fundamental para um futuro sustentável, considerando que a maior parte da frota de automóveis do mundo é a base de gasolina e combustíveis fósseis . . . O lançamento de novos carros, postos de abastecimento elétricos e até readaptação da cadeia produtiva, empurraram as inovações para economia verde, inovação em processos costumeiros liderado por sensores e sistemas inteligentes revolucionaram em áreas como: ciclos de reciclagem, montagem de produtos, substituição de materiais e utilização de matérias primas escassas.” (Entrevistado 11, 2021)
	Inovação organizacional	32	“A retomada verde depende do posicionamento das empresas e sua responsabilidade na produção de energia renovável e limpa. . . As empresas e governo precisam olhar para os seus processos e o tipo de energia, atualizar o seu portfólio para possibilitar outros setores de infraestrutura como o de transporte revitalizarem suas frotas com automóveis elétricos, movidos a hidrogênio e que possam ter estrutura para viabilizar os diferentes tipos de inovação.” (Entrevistado 10, 2021)
	Inovação de produto	30	“A compensação de carbono é uma solução que pode colaborar com a questão das mudanças climáticas, capturando o carbono. Para isso são consideradas a emissão de certificações e utilização de energias renováveis que podem fomentar um consumo sustentável. O IoT e a nuvem ajudam muito para monitorar e criar novos produtos para o mercado em geral, mas acreditamos que o blockchain é o próximo passo para as trocas comerciais de carbono entre as empresas, especialmente em relação ao mercado de certificação . . . Não só startups, mas as grandes empresas precisam acompanhar a tendência tecnológica da comercialização de energia e certificados pelo blockchain , além das soluções de monitoramento que já existem para reduzir a pegada de carbono.” (Entrevistado 12, 2021)
Categorias emergentes	Green spillovers	16	“. . . o consumo de energia no contexto geral influência diversos fatores ligados à infraestrutura e desenvolvimento socioeconômico local quando olhamos as matrizes de energia renovável . . . o Brasil por exemplo, possui mais de 80% da sua matriz renovável e isso torna o país competitivo em termos de recursos renováveis, permitindo explorar o desenvolvimento energético no ponto de vista industrial e acesso à energia limpa . . . Aqui na consultoria vemos que a utilização de novas tecnologias atrai investidores para o setor de energia, que estimulam o desenvolvimento de subsegmentos como linhas de transmissão, portos e parques de inovações para que tecnologias como eólica offshore e hidrogênio sejam viabilizados. Esse tipo de inovação tecnológica é fundamental para a transição energética e o desenvolvimento regional de economias emergentes.” (Entrevistado 17, 2021)
	Sustentabilidade tecnológica	28	“A maior inovação sustentável em termos tecnológicos está ligada a capacidade de identificar os gargalos e gastos do consumidor. Para isso utilizamos sensores e monitoramento via IoT. Acompanhamos o gasto do consumidor e podemos reduzir seu gasto energético, emissão de carbono e até indicar qual o impacto que ele deixou de gerar realizando sua otimização de processo . . . A inteligência artificial e o IoT são muito importantes para nós, pois é uma integração de recursos dos programas computacionais que usamos e a prática consultiva . . . Parece complexo, mas para diminuir o impacto ambiental via sustentabilidade tecnológica, é preciso usar os recursos digitais que temos para orientar os empreendedores.” (Entrevistado 16, 2021)
	Digital leapfrogging para tecnologias limpas	35	“. . . os sistemas de predição e monitoramento funcionam para prever os intervalos de geração de energia, visualizando a otimização de sistemas. Monitorar implica na gestão de dados, utilizando recursos de data analytics e inteligência artificial. A junção dessas tecnologias permite um melhor aproveitamento dos ativos de parques eólicos, proporcionando mobilidade digital para grandes empreendedores . . . O monitoramento real dos dados de geração eólica, ligados por exemplo a constrangimento de energia ou intermitências do sistema, fazem com que os empreendedores possam tomar as decisões rotineiras de forma assertiva para o desenvolvimento contínuo do portfólio de ativos da organização”. (Entrevistado 15, 2021)

• Fonte: Elaborado pelos autores.

Para organizar o formato de análise, o presente artigo divide o trabalho em quatro blocos: (a) processo decisório ; (b) capacidades dinâmicas ; (c) inovação sustentável ; e (d) categorias emergentes , correspondentes às subseções adjacentes do presente artigo. A divisão por blocos se estabelece em função da avaliação cada categoria que representa os subconceitos explorados no referencial teórico ( Elo & Kyngas, 2008 ).

O bloco a, processo decisório, aprofunda os resultados qualitativos na perspectiva das categorias effectuation e causation . O bloco b, capacidades dinâmicas, apresenta os principais relatos referentes às categorias de sensing, seizing e reconfiguring . O bloco c, inovação sustentável, traduz os principais relatos correspondentes à inovação do processo, inovação organizacional e inovação do produto sob a perspectiva sustentável. Já o bloco d, categorias emergentes, representa os achados da pesquisa que emergiram além das lentes teóricas selecionadas para analisar o objeto do estudo.

Dessa maneira, as categorias que se apresentaram com maior relevância foram inovação de processo, digital leapfrogging para tecnologias limpas e inovação organizacional, que podem ser encontradas na Figura 1 , demostrando predominância da percepção de inovação como resultado das ações dos empreendedores. Essas categorias são aprofundadas em triangulação com os relatos e referenciais da literatura nas seções abaixo. Cobrindo, assim, as lacunas de Klewitz e Hansen (2014) e Cillo et al. (2019) e complementarmente explorando as lacunas de Ghorbel et al. (2021) e Aagaard et al. (2021) .

Figura 4
Relevância das categorias

Bloco processo decisório: effectuation e causation

No bloco de processos decisórios é possível constatar uma menor incidência quando comparado às outras categorias, devido à maior dificuldade de mensuração/percepção desse elemento. Ainda assim, os entrevistados evidenciaram a flexibilidade empreendedora ligada ao processo de melhoria contínua nas organizações, implicando na reorganização de recursos empresariais para proporcionar uma inovação de caráter sustentável, fomentando assim o estabelecimento de networking para o desenvolvimento da inovação.

A categoria de effectuation demonstrou que as inovações das cleantechs permitem aos empreendedores aplicarem suas soluções no nível organizacional, visando alavancar o desempenho da empresa reduzindo custos fixos a partir de compromissos prévios estabelecidos no planejamento do modelo de negócios. Esse planejamento conta com as soluções das cleantechs ligadas à eficiência energética e à utilização de energias renováveis por meio da comercialização, permitindo reduzir custos da organização e dar mobilidade à implementação de inovações com menor impacto ao meio ambiente, coordenado pelo processo decisório de effectuation (Entrevistados 1 e 2). Consequentemente, as entrevistas evidenciam na categoria de effectuation que tanto (a) o perfil do empreendedor quanto (b) a rede de contatos ( Kalinic et al., 2014 ; Sarasvathy et al., 2008 ; Roach et al., 2016 ) impulsionam o aproveitamento das capacidades dinâmicas de seizing e reconfiguring , em linha com a P1 deste artigo. Ademais, a flexibilidade empreendedora, que compreende o raciocínio guiado pela melhoria contínua nos modelos de negócios, contribui para compromissos prévios, que abarcam as alianças e redes informais, sendo a dimensão referente à seleção e ao compromisso das diferentes partes interessadas entre empreendedores que adotam soluções de cleantechs e as inovações praticadas pelas empresas ( Barzotto & Nassif, 2019 ; Kalinic et al., 2014; Sarasvathy, 2001) .

Já na categoria causation , observou-se que as novas tecnologias, como internet das coisas (IoT, do inglês Internet of Things ), big data e data analytics , operadas por cleantechs , permitem aos entrevistados reduzir custos fixos e criar novas perspectivas de planejamento estratégico. Esse foi um ponto mencionado pelo Entrevistado 3 que demonstrou soluções inovadoras que acompanham os movimentos dos concorrentes e cauteloso planejamento baseados em metas bem definidas nos planos de ação dos modelos de negócios. Desenvolvem projetos estratégicos de longo prazo visando a minimização de custos organizacionais via digitalização e a prática de soluções sustentáveis a partir de uma base tecnológica ( Kalinic et al., 2014 ; Sarasvathy, 2001 ; Sarasvathy et al., 2008 ). Dessa forma, é possível observar, pela análise semântica das entrevistas, que a lógica causal favoreceu a identificação e a geração de capacidades dinâmicas se apoiando na dimensão sensing (conforme P2).

Bloco capacidades dinâmicas

O bloco de capacidades dinâmicas apresentou alta relevância durante as análises da transcrição ( Tabela 3 ) devido ao seu caráter intermediário para gerar inovação sustentável, via as categorias sensing, seizing e reconfiguring . Os entrevistados demonstraram que a iniciativa empreendedora e seu processo decisório devem contar com as capacidades de sentir, planejar e transformar os negócios para que as empresas possam explorar tecnologias de forma sustentável.

Ao analisar os dados coletados, a interpretação da fala dos entrevistados leva à compressão de que a categoria sensing se apresenta fortemente ligada às inovações que apropriam-se de tecnologias, como IoT , Big Data e nuvem de dados para gerar soluções sustentáveis (Entrevistado 5), pautando-se em soluções de monitoramento de comportamento de consumo de energia e água, soluções para evitar a emissão de carbono, soluções para captura de gases e até adoção de energias renováveis, corroborando o contexto global de contenção das mudanças climáticas e de inclusão social global. Tais soluções se desdobram principalmente da iniciativa empreendedora do processo decisório via effectuation . Os relatos ligados à categoria sensing para o contexto das cleantechs são concomitantes à literatura existente apresentada por George et al. (2020) e Inigo et al. (2017) .

A categoria seizing se manifestou como mecanismo transitório para alocação de recursos tecnológicos, visando a obtenção de ganhos sustentáveis para as empresas de tecnologia limpa. O Entrevistado 7 evidencia um consenso dos dados levantados, indicando que os recursos naturais são finitos e as organizações precisam concentrar suas tecnologias em soluções digitais para complementar as tecnologias existentes, reduzindo gargalos de custos, tecnologia e P&D. Segundo os relatos, a categoria seizing se manifesta nas cleantechs para reestruturação estratégica de soluções existentes, tornando os processos mais limpos e tecnológicos. Todavia, devido aos recursos das cleantechs serem limitados e a elas dependerem de altos investimentos de fundos de investimento e instituições financeiras, o seizing é impulsionado pela iniciativa de empreendedores que buscam o processo de incubação, aceleração e financiamento para reestruturar os recursos e aprofundar conhecimentos tecnológicos para servir soluções inovadoras e sustentáveis ao mercado ( Cillo et al., 2019 ; Cumming et al., 2016 ; Klewitz & Hansen, 2014) .

O reconfiguring se apresentou como traço de contraste para a estruturação de modelos de negócios sustentáveis do ponto de vista socioambiental e competitivo no âmbito organizacional. Os relatos mostraram que o modelo de negócios das cleantechs deve ter flexibilidade para ágil reestruturação, mantendo o foco no ambiente regulatório dos setores de infraestrutura (Entrevistado 9). Temas como descentralização dos sistemas energéticos e autonomia para comercialização de energia são fundamentais para alcançar a sustentabilidade de soluções individuais, a um preço competitivo, oferecido por negócios que se adaptam a ambientes com arcabouço regulatório complexo ( Inigo et al., 2017 ). Por outro lado, as cleantechs também podem ser consideradas engrenagens de reconfiguração para inovação de grandes sistemas de energia, modificando contextos de transmissão, geração e distribuição de energia dos países. A iniciativa empreendedora via causation , visando o usuário final no contexto de fornecimento de soluções, reverbera em efeitos multiplicadores para os grandes setores de infraestrutura, subsidiando com soluções tecnológicas que, além de baratearem os custos, tornam os sistemas renováveis, limpos e com menor impacto ao meio ambiente.

Bloco inovação sustentável

O bloco de inovação sustentável se manifestou na pesquisa como o bloco de análise com maior relevância de repetição ( Tabela 3 ). O papel da inovação de inovação de processo é latente para as empresas cleantech, e é impulsionado pelo processo decisório via effectuation . Por outro lado, a inovação de produto e a inovação organizacional são empurradas principalmente pelo sensing e reconfiguring das capacidades dinâmicas, que conduzem a empresa a adotar processos digitais para reconfigurar seus modelos de negócios.

A inovação de processo se apresentou como a categoria de maior incidência no estudo e está associada à criatividade e rapidez para tomar decisões com base nos recursos disponíveis. Nesse sentido, os relatos da maior parte dos entrevistados (ex.: Entrevistados 11 e 16) identificaram que a utilização de novas tecnologias – como inteligência artificial, IoT e nuvem – são fundamentais para absorver os feedbacks de experimentação e remodelar os negócios para atender demandas sociais e ambientais de setores base da infraestrutura. Possibilitando, assim, a menor utilização de recursos naturais e aplicação dessas tecnologias para criar soluções que monitoram diferentes tipos de consumo, reposicionam as empresas em suas cadeias de suprimento e logística para um menor impacto ambiental, fornecem acesso à energia barata para comunidades e estimulam a criação de projetos sociais de baixo custo via adoção tecnológica em suas soluções. Essas soluções aplicadas pelas cleantechs trazem efeitos econômicos a médio e longo prazo para a sociedade, o meio ambiente e as indústrias adjacentes, reverberando em metas climáticas e ambientais estabelecidas por diferentes governos.

Em paralelo, a inovação no produto também está associada à adoção a utilização de tecnologias que dão mobilidade digital à empresa, contudo, o causation do processo decisório exerce o papel no processo sistêmico de análise e realização de pesquisas que refinam o produto, dando suporte via as categorias sensing e seizing das capacidades dinâmicas. Essas tecnologias viabilizaram a aproximação das empresas, clientes e seus canais de comunicação, construindo de forma colaborativa demandas que viabilizam a integração de sistemas energéticos a partir de fontes renováveis, impulsionando o consumo por meio de certificações ou sistemas de compensação de energia por meio de geração distribuída ou esquemas regulatórios (Entrevistado 12). Dessa forma, as tecnologias permitem a reestruturação e refinamento de produto por meio de um salto digital das empresas cleantech .

Já a inovação organizacional está fortemente associada ao reconfiguring das capacidades dinâmicas e se manifesta nas cleantechs no processo de adaptação ao contexto de rápida mudança tecnológica e às incertezas do arcabouço regulatório, subsidiando a organização com conhecimento para remodelar suas rotinas. Além disso, as tecnologias operadas pelos empreendedores possibilitam estruturas de governança corporativa que influenciam diretamente na inovação de processo e inovação de produto. Os entrevistados 1 e 10 mencionam que, além da utilização das tecnologias de inteligência artificial e nuvem, o gerenciamento de crédito propicia para a organização e os clientes mobilidade para inovar seus modelos de negócios ( Brink, 2019 ; Inigo et al., 2017 ), conseguindo acesso a energias renováveis, como eólica e solar, permitindo reduzir custos de consumo de energia, e com monitoramento em escala para os próprios negócios.

Bloco categorias emergentes

As categorias repetidas encontradas durante a análise de dados e que emergiram além do referencial teórico se apresentam no bloco categorias emergentes desta seção e serão apresentadas como achados de pesquisa, consoante a análise dos dados. Tais categorias são: (a) Green spillovers ; (b) Sustentabilidade tecnológica; e (c) Digital leapfrogging para tecnologias limpas.

Efeitos de transbordamento são identificados ao passo que as cleantechs se apropriam de tecnologias de produção limpa e renovável e com o suporte de investimentos de fundos internacionais. Denominamos esse fenômeno ocorrente nas categorias de green spillovers , pois se refere ao efeito de transbordamento positivo causado pelas soluções de tecnologia limpa, ocasionando o desenvolvimento social e econômico em setores de infraestrutura de base como energia, transporte e saneamento. Esse fenômeno já foi mapeado na literatura em outro contexto por Wang, Zhang e Hu (2021) e Yoshino, Taghizadeh-Hesary e Nakahigashi (2019). Contudo, na perspectiva das cleantechs , os investimentos feitos nesse tipo de empresa colaboram para a transição de matrizes de energia elétrica dos países, estimulando a instalação de energia elétrica, evitando o consumo excessivo de água por monitoramento e até mapeando as condições precárias de saneamento em economias em desenvolvimento, assim como mencionado pelo Entrevistado 17.

A categoria b, sustentabilidade tecnológica , diz respeito às tecnologias que são selecionadas como recurso para fomentar o desenvolvimento sustentável e o alinhamento político-regulatório. Segundo Musango e Brent (2011) , a sustentabilidade tecnológica é compreendida por desenvolvimento tecnológico, desenvolvimento sustentável e dinâmicas de sistema que operam para gerar inovação sustentável nos negócios. Para as cleantechs , a integração tecnológica e digital permite a remodelação de rotinas e a criação de novos produtos que impulsionam a produção sustentável e inovadoras nas empresas. Os riscos ambientais e impactos sociais podem ser reduzidos via soluções empreendedoras endereçadas por tecnologias como inteligência artificial, IoT, 5G e nuvem (Entrevistado 16).

A adoção das tecnologias mencionadas pelos entrevistados na pesquisa (Entrevistado 15) faz que a empresa dê um salto digital nas suas rotinas, e sua orientação para o mercado presente na categoria c, digital leapfrogging , para tecnologias limpas. O conceito de digital leapfrogging se refere à transformação da inovação digital das empresas, causando desenvolvimento socioeconômico e industrial (Estevez, Fillottrani, Linares Lejarraga, & Cledou, 2021; Tim, Cui, & Sheng, 2021) No caso das cleantechs , o digital leapfrogging também corrobora a dimensão ambiental e a inclusão social, reverberando em vantagens competitivas no segmento de mercado da empresa.

Resultados e discussões

A análise de dados via categorias de análise evidenciou alguns resultados elementares para o atendimento do objetivo de pesquisa e que serão apresentados nesta seção. Esses resultados se referem à incidência das categorias e como se relacionam com a literatura, com o modelo do processo decisório para o desenvolvimento de capacidades dinâmicas, com inovação sustentável e com o atendimento das proposições. Os resultados demonstraram que as categorias de análise de processo decisório e capacidades dinâmicas são mecanismos que possibilitam às cleantechs adotarem novas tecnologias para endereçar soluções de cunho inovador e sustentável.

Figura 5
Modelo de processo decisório e o desenvolvimento de capacidades dinâmicas para geração de inovação sustentável e seus efeitos

As categorias exploradas na pesquisa apresentam um modelo que manifesta a sua articulação entre diferentes níveis, que são: (a) Nível 1: empreendedor; (b) Nível 2: organizacional; (c) Nível 3: inovações sustentáveis das cleantechs ; e (d) Nível 4: efeitos das inovações de tecnologia limpa ( Figura 3 ). Adicionalmente, cada um dos níveis apresentados refletem os processos categóricos de análise de dados. O modelo apresenta a associação entre as categorias, ilustrando como o processo decisório pode desenvolver capacidades dinâmicas para a geração de inovações sustentáveis, consoante o objetivo delimitado no trabalho.

Ademais, as proposições foram integralmente atendidas. A P1 se confirmou, visto que a iniciativa empreendedora via processo decisório se associa às categorias de sentir oportunidades e aproveitá-las para trabalhar seus modelos de negócios e gerar inovações de cunho processual e organizacional, incorporando soluções tecnológicas e digitais para os negócios.

Adicionalmente, a P2 também foi confirmada, e, nesse sentido, o processo decisório via lógica causal está associado às categorias de aproveitamento de oportunidades e reconfiguração no nível organizacional, corroborando a inovação de produtos e inovação organizacional, especialmente de caráter tecnológico, acrescentando aos seus modelos de negócios soluções para redução de pegada de carbono em processos, produtos que não impactam o meio ambiente e otimizações nos negócios de caráter sustentável que estão associados especialmente a incrementos processuais, provenientes da decisão empreendedora, ocasionando um salto digital para a sustentabilidade tecnológica.

Por outro lado, a P3 se confirmou ao constatar-se que, apesar das capacidades de dinâmicas serem trabalhadas por meio do processo decisório via confirmação de P1 e P2, o papel do nível organizacional é mecanismo orientador para gerar inovação sustentável nas três frentes: processo, produto e organização, pois trata-se da adoção de novas tecnologias (e.g. IoT, Big Data, blockchain e 5G), mencionadas durante o percurso da entrevista. Confirma-se, também, pela forma como as empresas adaptam seus modelos de negócios para atender desafios do meio ambiente e sociedade. Além disso, o nível organizacional é um caminho intermediário para efeitos na economia e sociedade, causados pelas soluções das cleantechs e apresentados nos achados de pesquisa, como: green spillovers , sustentabilidade tecnológica e digital leapfrogging para tecnologias limpas – efeitos que são posteriores à inovação sustentável operada por capacidades dinâmicas trabalhadas por meio do processo decisório em seus respectivos níveis do modelo apresentado.

Adicionalmente, os achados de pesquisa fornecem um novo horizonte para os estudos que abarcam as lentes teóricas selecionadas (e.g . processo decisório, capacidades dinâmicas e inovação sustentável), fornecendo novos caminhos para observar os níveis de análise. Não obstante, os achados corroboram as lacunas de pesquisa dos estudos de Ghorbel et al . (2021) e Aagaard et al. (2021) , evidenciando que as capacidades das organizações induzidas por peculiaridades do processo decisório via effectuation ou causation podem prover inovações sustentáveis com diferentes abordagens para o mercado, reforçando o atendimento das proposições.

Em consequência, os resultados obtidos por meio do atendimento das proposições também dialogam de forma estreita com as pesquisas da literatura de Klewitz e Hansen (2014) e Cillo et al. (2019) , apresentando a inovação sustentável como propulsora de efeitos tecnológicos e digitais que permite à empresa solucionar gargalos de mercado de caráter socioambiental e econômico, impulsionando investimentos setoriais. Tais achados não só subsidiam as lacunas apresentadas como também abrem portas para pesquisar a sua associação com outros contextos tecnológicos no setor que não estão diretamente ligados ao recorte de pesquisa das cleantechs .

Considerações finais

Este artigo apresentou um modelo que ilustra como o processo decisório pode impulsionar o desenvolvimento de capacidades dinâmicas para a geração de inovações sustentáveis, enfatizando os níveis ligados às categorias de análise. O modelo colabora para responder o “como”, endereçado pela pergunta de pesquisa, e o objetivo traçado pelos estudos.

Adicionalmente, as três proposições endereçadas para testar a construção teórica foram atendidas (P1, P2 e P3), evidenciando a relação conceitual entre os três fundamentos teóricos selecionados para observar o fenômeno das empresas de tecnologia limpa. O contexto de pesquisa e seu processo de análise permitiram identificar conceitos além do referencial teórico: green spillovers , sustentabilidade tecnológica e digital leapfrogging para tecnologias limpas. Esses conceitos devem ser interpretados como novas avenidas de pesquisa para aprofundar como as tecnologias limpas operacionalizadas pelas cleantechs podem causar impactos econômicos no mercado e sociedade.

Ademais, o modelo apresentado pode ser observado por meio da inclusão de novas lentes teóricas que não foram consideradas para a presente pesquisa, subsidiando novas observações para os níveis apresentados. Nessa perspectiva, a contribuição científica reside em preencher as lacunas de Klewitz e Hansen (2014) , Cillo et al. (2019) , Ghorbel et al. (2021) e Aagaard et al. (2021) , evidenciando que as organizações podem reestruturar seus modelos de negócios e desenvolver inovações sustentáveis e tecnológicas proporcionando um salto digital para resolver gargalos relacionados a racionamento energético, inclusão social por meio de tecnologias de monitoramento, acesso à energia limpa e renovável a baixo custo e outras soluções apresentadas ao longo das entrevistas desta pesquisa.

Ainda em relação à contribuição científica, constatou-se que determinadas organizações podem ser um vetor para o desenvolvimento econômico, gerando efeitos de transbordamento de caráter sustentável ( green spillovers ) ( Wang et al., 2021 ; Yoshino et al., 2019 ), ao serem escopo de fundos de investimento e investidores internacionais. Essas características decorrem especialmente das capacidades do empreendedor de operacionalizar tecnologias que permitem a realização do digital leapfrogging para tecnologias limpas, corroborando também as lacunas apresentadas por Klewitz e Hansen (2014) e Cillo et al. (2019) .

Por outro lado, a contribuição prática da pesquisa reside no contexto da pesquisa. As cleantechs , como startups , são propulsoras de inovações e concentram conhecimento tecnológico de forma dispersa, resolvendo desafios da sociedade e do meio ambiente de forma descentralizada. O presente artigo demonstra o potencial organizacional-inovador desse modelo de empresa, servindo como roteiro de inovação para os empreendedores, governos e universidades que buscam soluções para os desafios e metas de desenvolvimento sustentável traçadas pela ONU ( Sachs et al., 2021 ).

Sugestões e direcionamentos para pesquisas futuras e limitações de pesquisa

As limitações da presente pesquisa estão relacionadas a dois pontos principais: (a) contexto da seleção do método estudo de caso múltiplo; e (b) características gerais da amostra. O método de caso múltiplo limita o escopo da pesquisa, pois restringe a seleção dos casos ao escopo do trabalho selecionado para aprofundamento da pesquisa. Desse modo, sugere-se que, para próximas pesquisas, o modelo teórico proposto possa investigar outros fenômenos de pesquisa além dos casos e do contexto aqui abordados. Na mesma perspectiva, as características gerais da amostra apresentaram que a maior parte das cleantechs selecionadas se concentrava no segmento de energia e saneamento. Para futuras pesquisas, sugere-se que os pesquisadores selecionam cleantechs de diferentes áreas de atuação, como transporte e construção.

Como sugestão e direcionamento para pesquisas futuras, os pesquisadores devem aprofundar-se em compreender como o modelo apresentado pode se aplicar a outros contextos organizacionais. Especificamente, as categorias que emergiram como achados devem ser as principais orientações propositivas para novas pesquisas, pois não foi possível aprofundar de forma integral os achados respectivos a: (a) green spillovers ; (b) sustentabilidade tecnológica; e (c) digital leapfrogging para tecnologias limpas, devido ao escopo selecionado para a pesquisa. Seguindo as premissas metodológicas de estudos de caso de Hafiz (2008) , sugerem-se na Tabela 4 caminhos propositivos para que pesquisadores possam se aprofundar em pesquisas futuras e que surgiram durante a análise dos dados da presente pesquisa.

Tabela 4
Sugestões para pesquisas futuras

Caminho de pesquisa com base nos achados	Sugestões para pesquisas futuras
Green spillovers	Identificar como os green spillovers gerados por tecnologias limpas podem impulsionar o desenvolvimento da sociedade e indústria; mapear a relevância dos green spillovers causados pelas cleantechs para o desenvolvimento do comércio internacional; compreender como os efeitos de transbordamento podem intermediar a internacionalização de cleantechs ; analisar qual é a relação entre diferentes tipos de inovação e os green spillovers .
Sustentabilidade tecnológica	Verificar quais as principais tecnologias que fomentam a sustentabilidade e o desenvolvimento sustentável entre as cleantechs (e.g . Big Data , IoT , inteligência artificial, blockchain ); apresentar qual é o papel da sustentabilidade tecnológica para a geração de capacidades e competências ligadas à inovação; compreender como os recursos podem ser alocados para a geração da sustentabilidade tecnológica nas organizações; identificar qual é o papel do empreendedor e o processo decisório para articulação da sustentabilidade tecnológica.
Digital leapfrogging para tecnologias limpas	Compreender como o digital leapfrogging se manifesta nas organizações que adotam tecnologias limpas em seus modelos de negócios; avaliar a relação entre digital leapfrogging e o conhecimento organizacional para produzir inovação sustentável; verificar como o digital leapfrogging para tecnologias limpas pode acelerar o processo de vantagem competitiva das empresas no mercado; mapear quais os principais antecedentes para o digital leapfrogging de organizações focadas em tecnologias limpas.

• Fonte: Elaborada pelos autores

Agradecimentos

Agradecemos as organizações Cleantech que se disponibilizaram a realizar as entrevistas, bem como o suporte de pesquisa da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM). Destacamos o agradecimento para Leonardo Longo, que forneceu o contato e apoio quanto às organizações entrevistadas. Além disso, reforçamos o apoio fraternal de nossas famílias e amigos durante a jornada acadêmica.

Apêndice 1

Roteiro de entrevista

	Categoria	Referências	Perguntas do roteiro de pesquisa
Processo decisório	Effectuation	Dew & Sarasvathy, 2007 ; Kalinic, Sarasvathy & Forza, 2014.	Como você acredita que o processo decisório pode colaborar com o aproveitamento de oportunidades e o desenvolvimento de capacidades e inovações sustentáveis?
	Causation	Sarasvathy, 2001 ; Garrido, Kretschmer, Vasconcellos, & Gonçalo, 2020; Harms, Alfert, Cheng, & Kraus, 2021.	Como a sua organização seleciona os meios adequados para tomar decisões lógicas visualizando suas capacidades e inovações sustentáveis do mercado?
Capacidades dinâmicas	Sensing	Brink, 2019 ; Garrido, Kretschmer, Vasconcellos, & Gonçalo, 2020; Inigo, Albareda, & Ritala, 2017; Teece, 2017, 2018 , 2018 ; Teece, Pisano, & Shuen, 1997.	Quais os mecanismos utilizados pela sua organização para identificar oportunidades de negócios para gerar inovações sustentáveis e novas capacidades?
	Seizing	Brink, 2019 ; Garrido et al., 2020 ; Inigo et al., 2017 ; Teece, 2017, 2018 , 2018 ; Teece et al., 1997 .	Como a sua organização planeja e implementa suas estratégias visando as inovações sustentáveis nos negócios das cleantechs ?
	Reconfiguring	Brink, 2019 ; Garrido et al., 2020 ; Inigo et al., 2017 ; Teece, 2017, 2018 , 2018 ; Teece et al., 1997 .	Como a sua organização se adapta ao contexto tecnológico, utilizando suas capacidades para a criação de inovações sustentáveis?
Inovação sustentável	Inovação de Processo	Cillo, Petruzzelli, Ardito, & Del Giudice, 2019; Gobble, 2012 ; Klewitz & Hansen, 2014)	Considerando a tomada de decisão dos diferentes níveis de gestão da sua empresa e suas capacidades, quais as principais estratégias da sua organização para a inovação processual e sustentável?
	Inovação Organizacional	Boons & Lüdeke-Freund, 2013 ; George, Merrill, & Schillebeeckx, 2020; Klewitz & Hansen, 2014 .	Como a sua empresa visualiza a inovação organização do ponto de vista sustentável? Poderia explicitar como isso ocorre na sua empresa, considerando as suas capacidades e a tomada de decisão dos diferentes níveis de gestão da sua empresa?
	Inovação de Produto	George et al., 2020 ; Klewitz & Hansen, 2014	Como vocês acreditam que a tomada de decisão e as capacidades existentes em sua cleantech podem fomentar a inovação de produtos? Cite exemplos de inovação de produto e como elas se manifestam em sua cleantech ?
Questões adicionais			Gostaria de citar algum tipo de inovação, capacidade ou tomada de decisão que não tenha sido citada durante a sua entrevista? Se sim, mencione algum exemplo ou cite a experiência de caso.

Fonte: Elaborado pelos autores.

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  Os autores agradecem o apoio financeiro da Coordenação de Aperfeiçoamento Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001.

Editora Associada: Amarolinda Klein

Disponibilidade de dados

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  14 Abr 2023
• Data do Fascículo
  Apr-Jun 2023

Histórico

• Recebido
  02 Set 2022
• Aceito
  09 Dez 2022