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Mulheres que “Têm Tudo”: Família versus Trabalho em um Estudo de Caso de uma Empresa Norueguesa no Brasil

Resumo

Investigamos a relação entre parentalidade e carreira em uma corporação norueguesa no Brasil, pelas lentes da teoria das Organizações Generificadas de Joan Acker. A estrutura de Acker, especialmente o Processo 4: “o trabalho mental interno de indivíduos dando sentido ao seu lugar e oportunidades na organização generificada” é útil nos níveis social, organizacional e individual. Desenvolvemos a estrutura comparando o trabalho mental de homens e mulheres em relação à parentalidade e oportunidades de carreira. Os resultados mostram que as mulheres querem licença maternidade mais longa, sabendo que a maternidade é um obstáculo. Os homens não querem licença paterna mais longa e não veem a paternidade como obstáculo. No entanto, ambos concordam a respeito do apoio da empresa à vida familiar. Questionamos a ideia de “escolhas” para as mulheres, uma vez que a maternidade é central quando se analisam os obstáculos à carreira. A discriminação é direta; as mulheres veem, mesmo que não saibam exatamente como funciona. “Ter Tudo” é um tema central da insatisfação das mulheres, tanto no Brasil quanto em outros lugares. A exportação de igualdade de gênero no contexto desta empresa multinacional pode ser mais uma expectativa, percepção e/ou mito do que uma realidade, apesar dos discursos oficiais. Uma análise das pesquisas de Acker e autoras brasileiras aponta a necessidade de abordar organizações/carreiras x família considerando parentalidade e trabalho do cuidado, ao invés de maternidade apenas. Este trabalho oferece contribuições práticas para a discussão da diversidade e sugerimos, para estudos posteriores, a inclusão de raça/etnia, orientação sexual e classe.

discriminação de gênero; corporação multinacional; maternidade; paternidade; carreiras

Abstract

We investigate the relationship between parentality and careers in a Norwegian corporation in Brazil, and using Joan Acker’s theory Gendered Organizations, we study how parental life could affect work life. Acker’s framework, especially Process 4: ‘the internal mental work of individuals making sense of their place and opportunities in the gendered organization’ is useful on societal, organizational and individual levels. We develop the framework by comparing men’s and women’s mental work regarding parentality and career opportunities. Results show that women want longer leaves, knowing that maternity is an obstacle. Men do not want longer father leave, and do not see fatherhood as obstacle. However, women agree with men about the company being supportive of their family life. We question the idea of “choices” for women since maternity is central when obstacles to careers are analyzed. Discrimination is blunt; women see it, even if they do not know how exactly it works. “Having it all” is a central theme of lack of satisfaction for women, in Brazil as elsewhere. Exporting gender equality in the context of this multinational company might be more an expectation, perception and/or myth than a reality, despite the current official statements. An analysis based on Acker and Brazilian authors point to the need of approaching organizations/careers x family considering e.g. parentality and care work, rather than maternity only. This work offers practical contributions to the diversity discussion and we suggest, for further studies, inclusion of e.g. race/ethnicity, sexual orientation, and class.

gender discrimination; multinational corporation; maternity; paternity; careers

Introdução

Um estudo em uma empresa norueguesa no Brasil poderia ajudar a compreender a (des)igualdade de gênero em uma organização multicultural. Este estudo de caso único na sede brasileira teve como foco a relação Família e Trabalho, desenvolvendo uma análise em três níveis: individual, organizacional e social.

Considerando o ambiente bi cultural do nosso caso, é importante contextualizá-lo. Em nível social, esses dois países ocupam posições distantes no Índice de Desigualdade de Gênero do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. Em 2019, a Noruega obteve o primeiro lugar e o Brasil o 84º. As posições brasileiras neste índice pioraram nos últimos anos. No ano do estudo, 2015, o Brasil ocupava a 74ª posição no Índice de Gênero.

O Índice de Desenvolvimento Humano também piorou para o Brasil de 2015 a 2020, de 74º para 79º, enquanto a Noruega manteve as mesmas posições. Além disso, a pandemia de Covid provocou um retrocesso de mais de 10 anos na ocupação feminina no mercado de trabalho na América Latina e Caribe (CEPAL, 2021). No Brasil, pesquisas mostraram que as mulheres tiveram maiores chances de perder o emprego do que os homens durante a pandemia. Isso indica que a igualdade de gênero está diretamente implicada em termos de força de trabalho x cuidado infantil, uma vez que escolas e creches foram fechadas durante a pandemia.

A Noruega foi o primeiro país a propor regulamentos para representação de gênero, por meio de cotas de gênero para conselhos de empresas S.A. (para preencher 40% com mulheres). A lei foi ratificada pelo Parlamento em 2003 e implementada em 2006, com um período de carência de dois anos. Embora houvesse resistência significativa a essa política (384 das 563 empresas de capital aberto fecharam o capital para evitar o cumprimento), em 2007 esse objetivo foi “atingido” ( Roth, 2014Roth, J. (2014, July 3). Norway’s gender quotas dispel some myths about token appointments. Women’s Agenda. Retrieved from http://www.womensagenda.com.au/talking-about/world-of-women/norway-s-gender-quotas-dispel-some-myths-about-token-appointments/201407034274#.VTfLKSGqqkp
http://www.womensagenda.com.au/talking-a...
), levando alguns a afirmar que a lei é efetiva, pois os conselhos agora possuem equilíbrio de gênero. Uma proposta de legislação semelhante para o setor privado na Noruega foi adiada.

Vários indicadores, como baixa diferença salarial de gênero e/ou alta proporção de mulheres em cargos gerenciais (com exceção de conselhos e diretoria) sugerem que a Noruega está à frente em termos de diversidade e igualdade de gênero em comparação com o Brasil. Em 2019, a OCDE informou uma disparidade salarial de gênero de 7% para a Noruega1 1 . O Barômetro do Norwegian Work Research Institute de 2019 informa que as disparidades salariais de gênero entre os funcionários em tempo integral na Noruega permanecem em 20%. “Após o ajuste por idade, educação, setor e vários outros fatores, ainda há uma diferença de gênero de 13%.” Em 2017, a Noruega foi classificada em 2º lugar pelo Fórum Econômico Mundial. , enquanto no Brasil os homens ganharam 30% a mais que as mulheres no mesmo ano ( Barros, 2020Barros, A. (2020, May 6). Men earned almost 30% more than women in 2019. Agência IBGE Notícias. Retrieved from https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/en/agencia-news/2184-news-agency/news/27609-men-earned-almost-30-more-than-women-in-2019
https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/en...
).

No Brasil de 2010, as mulheres não eram nem 20% nos altos cargos de instituições públicas ou empresas privadas, de acordo com o Observatório Brasil de Igualdade de Gênero (2009/2010). Desde 2016, não conseguimos encontrar dados atualizados do Observatório de Gênero, pois seu website parece ter sido desativado pelo Governo Federal. A Innovation Norway (2019, p. 23) afirma que o número de mulheres ocupando cargos em conselhos no Brasil é de 8,4%, mas não podemos afirmar com certeza. O (des)equilíbrio de gênero no parlamento também é um aspecto importante quando a cultura de gênero está em análise. A Noruega tinha 40% de mulheres no parlamento até set/2017, enquanto o Brasil tinha cerca de 15%, até out/2018 ( Inter-Parliamentary Union, 2019Inter-Parliamentary Union. (2019). Women in Politics. Retrieved from https://www.ipu.org/resources/publications/infographics/2019-03/women-in-politics-2019
https://www.ipu.org/resources/publicatio...
).

Considerando que a licença parental é um aspecto fundamental para que mães e pais ascendam profissionalmente, ou simplesmente para manterem-se empregados, a comparação de tais políticas nos dois países pode nos fornecer um contexto mais amplo, especialmente quando aprendemos que em países escandinavos a masculinidade hegemônica e papel dos pais vêm mudando ( Johansson & Klinth, 2008Johansson, T., Klinth R. (2008). Caring fathers: The ideology of gender equality and masculine positions. Men and Masculinities, 11(1), 42-62. ).

Na Noruega, os pais e mães podem escolher entre 1 ano de licença (com 100% de cobertura salarial) ou aproximadamente 14 meses (com 80% de cobertura). Tanto a mãe como o pai recebem 15 semanas de licença parental intransferível. Em outras palavras, se o pai não usar essas semanas, ambos perderão. Essa divisão incentiva a igualdade de gênero, principalmente na esfera do trabalho corporativo. Os pais recebem então 16 ou 18 semanas de licença não alocada para compartilhar entre si como acharem melhor.

No Brasil, a legislação garante 4 meses de licença para a mãe e 5 dias para o pai, em organizações privadas, o que é menos da metade da licença norueguesa. No entanto, em 2008, uma nova legislação (Programa Empresa Cidadã) ofereceu a opção de prorrogação da licença, dando um total de 6 meses para as mães e 15 dias para os pais. Para esta prorrogação as empresas podem aderir a um programa opcional: ao oferecer licenças mais longas a seus funcionários, as organizações têm direito a um benefício de dedução fiscal no valor total gasto com a prorrogação.

A creche (e cuidado infantil como um todo) é uma necessidade após o retorno das licenças parentais, ainda mais se as licenças forem curtas. Levemos em conta que quase metade das mulheres que participam do mercado de trabalho formal no Brasil (e, portanto, se qualificam para a política de licenças acima), estão fora do mercado de trabalho formal 47 meses após o afastamento (Machado & Pinho Neto, 2016). Em países onde berçários e creches não são totalmente fornecidos pelo Estado, torna-se importante que as empresas ofereçam o auxílio-creche a seus funcionários. Pode ser oferecido na forma de auxílio financeiro para pagar creches particulares, ou até mesmo disponibilizando uma creche no prédio da empresa. Este seria o caso do Brasil, pois na Noruega os pais podem contar com creches públicas de qualidade. No entanto, se tal benefício é oferecido antes do período de licença terminar – como a empresa estudada ofereceu desde o 3º mês da criança – também pode ser interpretado como uma pressão para que as mulheres retornem ao trabalho antes do término da licença. As mulheres geralmente tentam estender a licença para cinco meses, tirando um mês de seu direito anual de férias. Dias de folga não pagos não são uma possibilidade legal.

Mesmo que esses índices e comparações não ofereçam um panorama completo das realidades de gênero e trabalho, quando observamos uma empresa do Norte Global (particularmente a Escandinávia) com uma subsidiária no Sul Global (Brasil) nos perguntamos sobre possíveis padrões duplos, ou seja, atitude diferenciada na tomada de decisões e políticas da empresa em relação à igualdade de gênero nos diferentes países em que atua globalmente.

No caso dos países nórdicos, observa-se uma retórica sobre exportar a igualdade de gênero para suas subsidiárias, também através de uma administração que seria recrutada para exportar e manter a “norueguesidade”. Uma presunção de exportação de valores nacionais do Norte Global ao Sul Global por meio de expatriados e mobilidade de liderança, enviando noruegueses para governar empresas globais e aplicando políticas empresariais globais. No entanto, se estes atores e agentes não estão de fato vivendo os valores de igualdade, mas apenas respeitando aspectos formalizados por leis e regulamentos contra discriminação (produzindo apenas planos de diversidade ou padrões para legitimação social), então uma possível “exportação” de igualdade não passa de uma farsa. Connell e Messerschmidt (2005)Connell, R. W., Messerschmidt, J. W. (2005). Hegemonic masculinity. Rethinking the concept. Gender & Society, 19(6), 829-859. formularam uma construção da masculinidade dos expatriados, a masculinidade dos negócios transnacionais, argumentando a respeito da falta de lealdade com valores centrais.

“Poucos podem contestar a posição da Escandinávia na vanguarda do movimento de responsabilidade corporativa. — Ethical Corporation” ( McCallin & Webb, 2004McCallin J., Webb T. (2004, January). Corporate responsibility progress in Scandinavia. Ethical Corporation Magazine. Retrieved from http://www.ethicalcorp.com/content.asp?ContentID=1584
http://www.ethicalcorp.com/content.asp?C...
). A frase expressa a retórica mencionada acima. Não pretendemos afirmar que a lógica por trás do transporte de valores nórdicos (de gênero) para o Sul Global seja a única maneira de definir igualdade de gênero – os índices internacionais. Isso fortaleceria uma prerrogativa interpretativa baseada na autoimagem dos países nórdicos de que eles resolveram o problema de gênero. É uma inverdade muito exportada para outros países em desenvolvimento. Strand, Freeman e Hockerts (2015) reforçam tal lógica: “pretendemos que isso sirva de base para ajudar a estabelecer um paradigma de pesquisa globalmente reconhecido dedicado a considerar a Responsabilidade Social Corporativa e a sustentabilidade em um contexto escandinavo”.

Dito isso, este trabalho não objetiva comparar casos/unidades (Brasil e Noruega), mas ilustrar um caso e possivelmente provocar reflexões e questionamentos para futuras comparações, não necessariamente generalizáveis a todos os contextos semelhantes. “O objetivo do estudo de caso não é representar o mundo, mas representar o caso” (Stake, 2000, p. 245 em Mariotto, Zanini & De Moraes, 2014, p. 363).

Quando consideramos o nível organizacional, uma grande empresa multinacional que contemple a questão da reprodução pode impactar diretamente a presença da mulher no mercado de trabalho, e a igualdade de gênero como um todo. Talvez até mesmo ilustrar, de alguma forma, essa ideia de exportar igualdade de gênero, um dos aspectos da Responsabilidade Social Corporativa (CRS). As opções descritas acima colocam um grau significativo de tomada de decisão nas mãos das empresas sobre como propiciar um ambiente em que ter filhos não seja um obstáculo para o avanço na carreira. Essas reflexões surgiram como problema de pesquisa, a princípio, porque uma das autoras trabalhou por alguns anos na empresa-caso, no Brasil, e já teve experiência de vida na Escandinávia. A segunda autora é escandinava.

Intuitivamente, eu não conseguia me ver sendo mãe enquanto trabalhava lá, então resolvi buscar esclarecer os motivos destes meus sentimentos, questionando também se outras mulheres sentiam o mesmo, porque não conversávamos sobre isso”. (Autora)

Esta questão foi então parte de uma tese de mestrado mais ampla, sobre igualdade de gênero, publicada em 2015. Naquela época (e agora) pudemos encontrar alguns estudos dedicados a discutir empresas norueguesas no Brasil, seus desafios e diferenças culturais ( Granli, 2012Granli, T. C. (2012). Cross-cultural adaption in norwegian companies in Brazil (Master thesis). University of Oslo, Oslo. ; Kvaernes, 2010Kvaernes, K. (2010). Differences in doing business in Brazil and Norway, evidence from Norwegian expatriates (Master thesis). Fundação Getulio Vargas, Rio de Janeiro, RJ. ; Souraki, 2019Souraki, S. (2019). Exploring the role of cultural differences in Norwegian-Brazilian business relationships (Master thesis). University of Stavanger, Stavanger, Norway. ; Wold, 2007Wold, A. (2007). Doing business in Brazil: an anthropological study of the interaction between Norwegian and Brazilian business people (Master thesis). University of Oslo, Oslo, Norway.2 2 . O estudo de caso Wold (2007) é na mesma organização e contemporâneo ao tempo em que uma das autoras trabalhou na organizaçã&. Todos os estudos citados nessa parte são do ponto de vista norueguês, nenhum deles em formato de artigo. Nenhum deles aborda questões de gênero ao estudar gestão e diferenças culturais. , mas não há discussão sobre o tema da igualdade de gênero nas subsidiárias norueguesas no Brasil, principalmente sobre maternidade/paternidade de funcionários de tais organizações. Wold (2007)Wold, A. (2007). Doing business in Brazil: an anthropological study of the interaction between Norwegian and Brazilian business people (Master thesis). University of Oslo, Oslo, Norway. estuda a mesma organização que nós, com diferente abordagem. Encontramos uma comparação entre Suécia e Brasil tratando de Gestão Internacional de Recursos Humanos (IHRM) ( Kunde, 2020Kunde, S. (2020, October). International human resource management and maternity: A comparison between Brazil and Sweden. Article presented at XLIV Enanpad, Maringá, PR. ), outro estudo com objetivo semelhante ao nosso, mas com uma subsidiária sueca no Japão (Kemper, Bader & Froese, 2019) e uma análise do discurso de igualdade de gênero em fusões transnacionais entre Dinamarca, Finlândia e Suécia (Tienari, Søderberg, Holgersson, & Vaara, 2005).

Uma vez apresentada a problematização e o contexto, salientamos que este trabalho dedica-se a uma parte/tema de um estudo de caso mais amplo sobre (des)igualdade de gênero, a parte sobre Família e Trabalho. Demais razões para as escolhas das pesquisadoras são descritas nas próximas sessões.

Assim, incluímos o nível individual de análise e também os homens na discussão, com objetivo de compreender como os funcionários desta grande empresa multinacional percebem a relação entre maternidade/paternidade e suas carreiras na organização, o que possibilitaria avaliar possíveis (des)igualdades de gênero na organização.

Um objetivo secundário aborda um nível menos individual e mais organizacional/social, visando lançar luz sobre o que essa percepção expressa a respeito de uma possível exportação de igualdade de gênero no contexto apresentado. É possível que empresas multinacionais no Brasil sejam, ou tornem-se, atores na promoção da igualdade de gênero ao abordar a questão Família x Trabalho? Pretendemos refletir sobre possíveis padrões duplos em relação às questões de gênero na sede/matriz e nas subsidiárias internacionais de empresas privadas estrangeiras do Norte Global.

Por fim, ao discutir a teoria das Organizações Generificadas, de Joan Acker, juntamente com a atual teoria brasileira sobre maternidade e carreiras, pretendemos fazer uma contribuição teórica ao confirmar/negar a validade da estrutura de Processos proposta pela autora como ferramenta para os tempos atuais. Analisamos a possibilidade de aprimorar e desenvolver sua teoria de Processos, especialmente o Processo 4, conforme discutido na próxima Seção. Para tanto, apresentamos como Referencial Teórico abordagens teóricas antigas e recentes, dos (denominados) Norte Global e Sul Global. Esperamos gerar novos subsídios para uma discussão antiga e ainda necessária: maternidade/paternidade e carreiras femininas.

Referencial teórico

Norte Global e hierarquia de gênero

Desde os anos 70, mas principalmente a partir dos anos 80, pesquisadoras de Estudos da Mulher/Estudos de Gênero, Estudos Organizacionais e Sociologia têm investigado a Teoria das Organizações em relação aos papéis de gênero. Uma das razões para tal interesse se dá porque a teoria organizacional tem sido considerada implicitamente generificada, como descrito por Jeff Hearn e Parkin (1993Hearn, J., Parkin, P. W. (1993). Organizations, multiple oppressions and postmodernism. In J. Hassard, & M. Parker (Eds.). Postmodernism and organizations (pp. 148-162). London: Sage. , p. 149) “De forma geral, a Teoria Organizacional tem sido tradicionalmente construída como neutra em termos de gênero. Escrita através de perspectiva, cultura e discurso masculinos, tem defendido teorias de empirismo, racionalidade, hierarquia e outros conceitos masculinizados”.

Tais estudos se desenvolvem pois as organizações, privadas ou públicas, são as instituições econômicas e sociais centrais (por exemplo, locais de trabalho, escolas, universidades, serviços sociais, etc.) e, portanto, onde a maioria das pessoas está em contato/ diário, impactando não só as carreiras, mas a vida privada das pessoas.

Rosabeth Moss Kanter, embora pouco estudada ou mencionada nas escolas de negócios, é pioneira nesse tipo de pesquisa organizacional, e uma das primeiras a abordar a questão de gênero nas organizações privadas, já em 1977, quando desenvolveu o estudo sobre Tokenismo3 3 . Tokenism (posição de token ) é a prática de fazer apenas um esforço superficial ou simbólico para incluir membros de minorias, especialmente ao recrutar um pequeno número de pessoas de grupos sub-representados para dar a aparência de igualdade racial ou sexual dentro de uma organização. . Em seu livro Homens e Mulheres da Corporação, ela discute gênero nas grandes corporações, na direção dos Estudos Críticos de Gestão. No final dos anos 80 e início dos anos 90, Cynthia Cockburn identificou as tentativas que as organizações estavam fazendo na Grã-Bretanha para responder às pressões dos movimentos antirracistas e feministas, autodenominando-se empregadores de “oportunidades iguais”. Cockburn investigou o movimento Oportunidades Iguais, que alegava contratar e promover “independentemente de sexo, estado civil, raça, religião ou orientação sexual e para pessoas com deficiência”. Baseada em diferentes pesquisas no Norte Global, a socióloga norte-americana Joan Acker criou o conceito de Organizações Generificadas em 1990, mostrando que as organizações hierárquicas não são neutras em termos de gênero.

Acker (1999Acker, J. (1999). Rewriting class, race and gender: problems in feminist rethinking. In M. Ferree, J. Lorber, & B. Hess (Eds.), Revisioning Gender (pp. 44-69). Thousand Oaks, CA: Sage. , p. 44) explica que as cientistas sociais feministas partiram da teorização de classe e mulheres, mudando seu foco para estudos empíricos de gênero e trabalho no final dos anos 70. Nos anos 80, ela argumenta que, em resposta às feministas do Terceiro Mundo e às mulheres de cor, a atenção teórica foi direcionada para as intersecções de gênero, raça e classe (e decolonialidade, devo acrescentar). Finalmente, ela argumenta que o feminismo pós-moderno/pós-estruturalista voltou-se para questões de representação, cultura e identidade. As pesquisas e teorias atuais sobre organizações ainda discutem gênero através de todas essas diferentes abordagens, dependendo da ontologia e das epistemologias adotadas/escolhidas por cada acadêmica.

Liisa Husu (2005)Husu, L. (2005). Women’s work-related and family-related discrimination and support in academia. Gender Realities: Local and Global, 9, 161-199. , pesquisadora escandinava, estudou discriminação e apoio relacionados ao trabalho e à família, apontando para o fato de que algumas experiências de discriminação são entendidas como tal apenas em uma fase posterior da carreira dos informantes, não quando realmente acontecem. Ela também chamou atenção para a complexidade de perceber, nomear e reconhecer a desigualdade e discriminação de gênero (p. 167) na Escandinávia. Como aponta Husu, as mulheres que querem ter filhos e exercer a liderança podem ser vistas como “querendo ter tudo”, quando são os homens na mesma posição que já “têm tudo”.

Desta forma, parte do referencial teórico de problematização e base deste trabalho deriva da conceituação de grandes empresas multinacionais, como a empresa estudada, como organizações generificadas, a partir da visão estrutural de Acker. A estrutura organizacional não é neutra em termos de gênero, mas construída sobre uma subestrutura de diferença de gênero profundamente enraizada, em distinções entre mulheres e homens que são parte integrante de muitos processos sociais (Acker, 1992, p. 565). Ao citar processos sociais, Acker refere-se principalmente a instituições, onde mulheres e homens são agentes ativos, fazendo gênero em suas atividades cotidianas. Com exceção da família, todas as instituições foram definidas com a ausência das mulheres, e essa perspectiva reconhece a ordem assimétrica de gênero: a subordinação habitual das mulheres, seja de forma concreta ou simbólica.

Acker (1992Acker, J. (1992). Gendered institutions: from sex roles to gendered institutions. Contemporary Sociology, 21(5). , p. 568) defende a necessidade de mapear a história de gênero das instituições e traçar seus padrões de gênero, e em seu trabalho ela menciona que o objetivo final seria que organizações de grande escala se tornassem mais democráticas e solidárias ( Acker, 1990Acker, J. (1990). Hierarchies, jobs, bodies: a theory of gendered organizations. Gender and Society, 4(2), 139-158. , p. 140). É um equívoco pensar que as organizações têm discursos e processos neutros em termos de gênero, pois, segundo Kanter (1977Kanter, R. M. (1977). Men and women of the corporation. New York: Basic Books. , p. 46), a ética masculina está presente: “enquanto as organizações eram definidas como máquinas neutras em termos de sexo, os princípios masculinos dominavam suas estruturas de autoridade”.

Pesquisa sobre estas organizações poderiam auxiliar no enfrentamento de questões como as imagens culturais de gênero, a segregação do trabalho, a desigualdade de renda e status, e até mesmo aspectos da identidade de gênero, principalmente da masculinidade, que também é produzida por processos e pressões organizacionais. Por exemplo, referente à desigualdade de status, ajudaria a entender por que as mulheres estão sempre concentradas na base das estruturas organizacionais. É o exemplo de teto de vidro apontado por pesquisas com grandes empresas estadunidenses: havia mais empresas lideradas por homens chamados John ( Wolfer, 2015Wolfer, J. (2015, March) Fewer women run big companies than men named John. The New York Times. Retrieved from https://www.nytimes.com/2015/03/03/upshot/fewer-women-run-big-companies-than-men-named-john.html
https://www.nytimes.com/2015/03/03/upsho...
) ou David ( Levesque, 2018Levesque, J. (2018, May 2). For Large US Companies, CEOs named John Outnumber Total Number of Women CEOs. Seattle Business Magazine. Retrieved from https://seattlebusinessmag.com/workplace/large-us-companies-ceos-named-john-outnumber-total-number-woman-ceos/#:~:text=5.3%20percent.,also%20outnumber%20women%2Dled%20businesses.
https://seattlebusinessmag.com/workplace...
) que lideradas por mulheres.

Quando Acker formulou uma maneira de identificar as barreiras à igualdade de gênero nas organizações do trabalho, explicou como as mulheres acabaram nos cargos de nível inferior. Se espera da(o) funcionária(o) uma separação entre sua vida doméstica/privada e sua vida profissional. Certas tarefas são entendidas como exigindo mais responsabilidade ou complexidade, não apenas sendo colocadas em posições hierárquicas mais altas, mas também com melhores pontos (e remuneração). Habilidades mais frequentemente encontradas em homens, como administrar dinheiro, recebem mais pontos do que habilidades mais frequentemente encontradas em mulheres, como habilidades de relações humanas.

Assim, Acker (1990Acker, J. (1990). Hierarchies, jobs, bodies: a theory of gendered organizations. Gender and Society, 4(2), 139-158. , p. 154) concluiu que “o conceito de trabalhador universal exclui e marginaliza as mulheres que não podem, quase por definição, atingir as qualidades de um verdadeiro trabalhador porque fazê-lo é tornar-se um homem”. Ela também argumenta que o trabalhador descorporificado, que ocupa o trabalho abstrato de gênero neutro, não tem sexualidade, emoções e não procria. O trabalhador abstrato é na verdade um homem, com responsabilidade mínima na procriação e controle convencional das emoções. Por fim, Acker explica que são muitos os controles utilizados para manter a hierarquia de gênero, que vão além dos aspectos da legislação e das escolhas organizacionais apresentadas na Introdução:

A manutenção da hierarquia de gênero é alcançada em parte por meio desses controles muitas vezes tácitos baseados em argumentos sobre a reprodução, a emotividade e a sexualidade das mulheres, ajudando a legitimar as estruturas organizacionais criadas por meio de técnicas abstratas e intelectualizadas. Controles mais explícitos, como assédio sexual, relegar mulheres grávidas a faixas de mobilidade de nível inferior e penalizar (ou recompensar) seu gerenciamento de emoções também estão em conformidade e reforçam a hierarquia. ( Acker, 1990Acker, J. (1990). Hierarchies, jobs, bodies: a theory of gendered organizations. Gender and Society, 4(2), 139-158. , p. 151)

Acker entende as organizações de gênero em quatro tipos de processos paralelos e inter-relacionados, utilizados neste trabalho como problematização, formulação e análise de questionários: 1) Produção de divisões de gênero: padronizações generificadas de cargos, salários, hierarquias, poder e subordinação; 2) Criação de símbolos, imagens e formas de consciência de gênero; 3) Interação entre mulheres e homens, mulheres e mulheres, homens e homens que assumem múltiplas formas que “criam dominação e subordinação, e alianças e exclusões”, nas quais as divisões são desenvolvidas e as imagens de gênero são criadas e afirmadas; e 4) O trabalho mental interno dos indivíduos dando sentido ao seu lugar e oportunidades na organização generificada. Todos esses Processos foram analisados ​​no estudo de caso maior.

Este trabalho discute apenas o Processo 4, com foco em Família e Trabalho, discutindo essa relação e como os respondentes a percebem. Portanto, o “trabalho mental interno dos indivíduos de suas oportunidades na organização” em relação à Família. Embora nosso estudo mais amplo discuta todos os quatro processos, o foco deste trabalho é investigar se a discriminação relacionada à maternidade é uma das formas de controle/barreiras às oportunidades que mantêm a hierarquia de gênero. Maternidade, paternidade e vida doméstica podem ser entendidas como conflitantes com o trabalho, uma vez que todos devemos considerar ambas as esferas da vida como separadas, pois Acker argumenta que “muitas obrigações fora dos limites do trabalho torna um trabalhador inadequado para o cargo”.

Os empregos são abstratos e, para que os(as) trabalhadores(as) se adequem a esses empregos, não devem ter corpos, mas o mais próximo de um(a) trabalhador(a) real é o trabalhador do sexo masculino cuja vida se concentra em seu trabalho de tempo integral e vitalício, enquanto sua esposa ou alguma outra mulher cuida de suas necessidades pessoais e de seus filhos (…) A mulher trabalhadora, presumivelmente com obrigações legítimas além daquelas exigidas pelo trabalho, não se enquadrava no trabalho abstrato […] aqueles que estão comprometidos com o emprego remunerado são “naturalmente” mais adequados à responsabilidade e autoridade; aqueles que devem dividir seus compromissos estão nos escalões inferiores”. ( Acker, 1990Acker, J. (1990). Hierarchies, jobs, bodies: a theory of gendered organizations. Gender and Society, 4(2), 139-158. , p. 149)

Por fim, a estrutura da autora também se mostra adequada para nossa problematização e análise, pois esta organização (caso) é uma hierarquia generificada. Na época do estudo, 17% da população estudada era do sexo feminino, apenas 16% por cento das mulheres eram coordenadoras e gerentes, e nenhuma mulher diretora. Tais números confirmam o argumento de Acker de que os cargos de nível inferior são compostos predominantemente por mulheres. Ela explica que complexidade e responsabilidade são definidas em termos de tarefas gerenciais e profissionais: “[...] a responsabilidade de quem cuida de crianças, de quem é responsável por outros seres humanos, ou a complexidade com que se depara a secretária que atende seis chefes diferentes e temperamentais, só pode ser minimamente considerada se for preservada a congruência entre nível de cargo, responsabilidade e complexidade. (1990, p. 149).

Estudos brasileiros sobre carreira feminina x maternidade

Ao considerar a magnitude da literatura brasileira sobre a questão de gênero e trabalho e o tema da discriminação relacionada à maternidade, nossa busca concentrou-se em organizações semelhantes ao nosso caso, grandes empresas privadas, como os casos internacionais apresentados na Introdução. Portanto, a literatura sobre carreira foi considerada mais adequada. Ao pesquisar pelos estudos mais recentes com o termo parentalidade (envolvendo pai e mãe, como faz nossa pesquisa) encontramos principalmente estudos que discutem carreira acadêmica ou infância (sobre direitos e educação). Maternagem também não foi termo fácil de encontrar, estando principalmente relacionado à adoção, lactação, academia, novamente, e seu papel no feminismo negro. Além disso, encontrou-se o termo como referência à maternagem “de mães”, não incluindo outras pessoas nesse trabalho do cuidado ( Emidio & Castro, 2021Emidio, T. S., Castro, M. F. de. (2021). Entre voltas e (re)voltas: um estudo sobre mães que abandonam a carreira profissional. Psicologia: Ciência e Profissão, 41, 1-16. ; Lanzeta & Bittentcour, 2016). Nenhum desses estudos trata de grandes organizações multinacionais.

Por fim, ao buscar a expressão trabalho do cuidado , a maioria dos resultados dizem respeito à área da saúde, cuidado de idosos e doenças. Mesmo Hirata (2012)Hirata, H. (2012). O trabalho de cuidado aos idosos no Japão e alguns aspectos de comparação internacional. Mediações: Revista de Ciências Sociais, 17(2), 157-165. estuda o cuidado de idosos, no Japão, destacando que no Norte Global (o que inclui a Noruega) são majoritariamente as imigrantes que realizam o trabalho remunerado do cuidado, demonstrando uma divisão racial/étnica deste trabalho. No Brasil, o trabalho remunerado do cuidado é realizado majoritariamente por mulheres negras. Se o suporte dado por outras pessoas não é remunerado, então no Brasil é prestado por outras mulheres ( Hirata, 2012Hirata, H. (2012). O trabalho de cuidado aos idosos no Japão e alguns aspectos de comparação internacional. Mediações: Revista de Ciências Sociais, 17(2), 157-165. ), sendo a avó a principal cuidadora (Lopes, Prochnow, & Piccinini, 2010).

No entanto, existem (ou deveriam existir) diversos atores do cuidado na divisão sexual do trabalho, incluindo muitas instituições como o Estado ou o Mercado, a Família, etc., todas com o trabalho da mulher como central ( Hirata, 2016Hirata, H. (2016). O trabalho do cuidado: comparando Brasil, França e Japão. SUR-Revista Internacional de Direitos Humanos, 13(24), 53-64 ).

O trabalho de cuidado interdita oportunidades futuras para todas nós mulheres [...] Então essa economia do cuidado seria muitas coisas: amamentar, cuidar dos filhos, limpar a casa, cuidar dos idosos e doentes. [...]. (Cida Bento em @think_olga em Coelho, 2022Coelho, M. C. (2022). Experiências e proposições de ativismo intelectual feminista em Administração (Dissertation). Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS. , p. 433)

A comida que você compra precisa estar preparada para ser consumida. (Gabriela Chaves no Laboratório Think Olga de Exercícios do Futuro em Coelho, 2022Coelho, M. C. (2022). Experiências e proposições de ativismo intelectual feminista em Administração (Dissertation). Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS. , p. 433)

Como vemos, os termos destacados acima estão bastante ausentes na literatura sobre carreira e a questão da Família e do Trabalho, que geralmente é abordada por meio da maternidade . No entanto, devemos considerar também a ideia de que nem toda funcionária quer ser mãe, nem toda mulher tem esse instinto inato, algo que também pode ser motivado pela realidade do mercado de trabalho ( Colares & Martins, 2016Colares, S. C. dos S., Martins, R. P. M. (2016). Maternidade: uma construção social além do desejo. Revista Iniciação Científica (Unicor), 6(1). ), nossa problematização neste estudo. O status de quem não é (não quer ser) mãe também é discriminado ( Barbosa & Rocha-Coutinho, 2012)Barbosa, P. Z., Rocha-Coutinho, M. L. (2012). Ser mulher hoje: a visão de mulheres que não desejam ter filhos. Psicologia & Sociedade, 24(3), 577-587. . Sem saída. “Deixe-as parir até morrer... elas foram criadas para isso” (Lutero em Federici, 2018, pFederici, S. (2018). Mulheres e caça às bruxas: da idade média aos dias atuais. São Paulo, SP: Boitempo Editorial. , p. 67).

Silvia Federici (2018)Federici, S. (2018). Mulheres e caça às bruxas: da idade média aos dias atuais. São Paulo, SP: Boitempo Editorial. argumenta que o capitalismo foi criado com base no patriarcado, quando as mulheres foram relegadas (e forçadas) à esfera doméstica, sem remuneração por seu trabalho e com papel de reprodução da força de trabalho ( Sousa & Guedes, 2016Sousa, L. P., Guedes, D. R. (2016). A desigual divisão sexual do trabalho: um olhar sobre a última década. Estudos Avançados, 30(87), 123-139. ). No entanto, quando, mais recentemente, as mulheres entraram no mercado de trabalho, elas ainda mantiveram toda a carga de seu papel imposto “no passado” ( Probst, 2015)Probst, E. R. (2015, 2 de setembro). A evolução da mulher no mercado de trabalho. RH Portal. Recuperado de: https://www.rhportal.com.br/artigos-rh/a-evoluo-da-mulher-no-mercado-de-trabalho/
https://www.rhportal.com.br/artigos-rh/a...
. Importa destacar que as mulheres brasileiras mais empobrecidas (que não é a população do caso estudado) sempre trabalharam para sustentar suas famílias ( Losada & Rocha-Coutinho, 2007)Losada, B. L., Rocha-Coutinho, M. L. (2007). Redefinindo o significado da atividade profissional para as mulheres: O caso das pequenas empresárias. Psicologia em Estudo, 12(3), 493-502.4 4 . Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2012), entre 2000 e 2010, o papel da mulher responsável pela família passou de 22% para 37%. Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) do IBGE mostram que os responsáveis na família por cuidar da casa e dos afazeres domésticos eram 92% mulheres e 51% homens em 2004; e 93% mulheres e 58,36% homens em 2014, o que mostra a divisão desigual em relação aos espaços públicos e privados entre mulheres e homens, de modo que as tarefas relacionadas ao lar ainda permanecem significativamente nas mãos das mulheres ( Emidio & Castro, 2021, p , p. 3). .

Resta então às mulheres o “ou”: ou as mulheres não têm filhos e se dedicam exclusivamente à carreira, ou abandonam a carreira e se dedicam exclusivamente à maternidade (Emídio & Castro, 2021). Isso gera uma ideia comum de “Ter Tudo” como crítica às mulheres que querem ambos. Isso pode levar as mulheres a perceberem a maternidade como um sacrifício (Chechi Fiorin, Garcia Dias & Tochetto de Oliveira, 2014).

No contexto atual, a divisão sexual do trabalho pode assumir quatro formas: a de um modelo tradicional, na qual as mulheres são cuidadoras e os homens provedores; o modelo de conciliação, quando as mulheres buscam conciliar trabalho e vida familiar; o modelo de parceria, no qual homens e mulheres compartilham as tarefas domésticas e os cuidados com a família; e o modelo de delegação, quando as tarefas domésticas são delegadas a outras profissionais responsáveis por cuidar da casa e dos filhos. Segundo a autora, a sociedade brasileira reúne os quatro modelos, com prevalência do segundo – aquele em que as mulheres buscam conciliar a vida profissional e familiar. ( Hirata, 2015Hirata, H. (2015). Mudanças e permanências nas desigualdades de gênero: divisão sexual do trabalho numa perspectiva comparativa. Friedrich Ebert Stifung (FES) Análise, 7. , em Emídio & Castro, 2021)

Oitenta por cento das mulheres entrevistadas por Araújo e Scalon afirmam que “as crianças sofrem mais se a mãe trabalha fora de casa” (2006 em Emídio e Castro, 2021). As mulheres que desejam voltar ao trabalho após o parto ficam extremamente preocupadas com as dificuldades de conciliar as duas funções. A maioria das mulheres ainda acredita que Família e Trabalho são escolhas pessoais, como se fossem livres para sustentar suas escolhas, e não inseridas em estruturas (Rocha-Coutinho, 2011; Albertuni & Stengel, 2016, em Emídio e Castro, 2021). As executivas brasileiras de grandes empresas (no Brasil) apontaram a pressão do relógio biológico e a sobrecarga com cuidado dos filhos x jornadas extensas de trabalho como 2 dos 5 obstáculos para suas carreiras, e os outros três são: exigências extremamente altas, diferentes formas de preconceito enraizado e dificuldades com seus esposos e companheiros (Carvalho Neto, Tanure & Andrade, 2010). Os dois últimos obstáculos também podem estar relacionados ao tema Família e Trabalho.

Almeida e Santos (2018)Almeida, V. C., Santos, C. M. (2018). Trabalho, carreira e maternidade: perspectivas e dilemas de mulheres profissionais contemporâneas. Administração: Ensino e Pesquisa, 19(3), 583-605. defendem que o equilíbrio entre vida pessoal e carreira profissional está na raiz da insatisfação manifestada por um grande número de mulheres. Assim, dilemas e dificuldades geram, entre outras coisas, o adiamento da maternidade ( Beltrame & Donelli, 2012Beltrame, G.R., & Donelli, T. M. S. (2012). Maternidade e carreira: desafios frente à conciliação de papéis. Periódicos Eletrônicos em Psicologia – Alethea, 38-39, 206-217. ; Rodrigues, 2008)Rodrigues, M. C. (2008). Vivências da maternidade tardia, cotidiano e qualidade de vida: a perceptiva feminina (Dissertação de mestrado). Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, MG. , ou o adiamento da “decisão”, gerando atualmente novos processos de fertilização artificial, também silenciados na sociedade e na literatura organizacional, por serem estigmatizados.

Observamos então que, possivelmente, todo trabalho que se dedique ao estudo de mulheres executivas e carreiras acabará por chegar ao tema da maternidade, discussão central na questão de desigualdade de gênero no trabalho, quando ela surge de forma mais contundente. A família como central, quando até o casamento é mencionado:

A questão de gênero só surgiu quando se discutiam os papéis familiares, mais especificamente, a maternidade e o casamento. As entrevistadas relataram que a carreira é importante como fonte de realização pessoal, mas sem abrir mão da maternidade e/ou casamento. Deixam claro que enfrentam obstáculos para assumir diferentes papéis, mas não enxergam impossibilidades, mas dificuldades em sua escolha e procuram gerenciar e considerar os diferentes papéis assumidos. (Loureiro, Costa, & Freitas, 2012)

É parte desta discussão os termos teto de vidro e labirintos de cristal, como forma de expressar a somatória de obstáculos para a carreira feminina nas corporações. Há alguns estudos que buscam compreender e abordar os papéis e responsabilidades das empresas na definição de estratégias para eliminar ou pelo menos reduzir os obstáculos, convidando as organizações a se tornarem atores ativos.

Pesquisa contemporânea a este estudo de caso também tentou acessar grandes empresas brasileiras, e as negativas recebidas foram entendidas como conservadorismo e ausência de uma cultura corporativa mais transparente (Teixeira & Gòis, 2015). O privilégio de acesso do nosso estudo de caso, que ocorreu em nível institucional, é muito raro no Brasil. A pesquisa de Teixeira e Gòis foi então realizada analisando documentos em websites sobre iniciativas relacionadas à maternidade, como nós também fizemos. Encontraram nas agendas de grandes empresas: aumento do tempo de licença parental (mãe de 4 a 6 meses e pai de 5 dias a 3 meses, os casos da Petrobrás, Walmart, Natura, TIM, Basf e Unilever); salas de lactação; espaços de creche no escritório para crianças de 0 a 2 anos; benefício/reembolso para cuidados infantis por 2 anos, e alguns outros. Ainda assim, poucas empresas e mudanças muito recentes.

Metodologia

Um estudo de caso único baseado em método misto quantitativo e qualitativo

Pesquisadores da administração no Brasil têm se mostrado grandes usuários do estudo de caso único ( Mariotto et al., 2014Mariotto, F. L., Zanni, P. P., Moraes, G. H. S. M. (2014). What is the use of single-case study in management research? RAE-Revista de Administração de Empresas, 54(4), 358-369. ), principalmente quando tratamos de um caso como este: uma organização de difícil acesso, e um estudo que faz perguntas delicadas, que podem provocar críticas à própria organização. O acesso a um grupo/unidade – ao invés de um estudo de caso múltiplo ou com indivíduos de diferentes empresas – juntamente à autorização da liderança para manter todas as questões sugeridas, são privilégios em pesquisa desta natureza. Portando, agregam à literatura e, além disso, podem influenciar positivamente em conscientização que os funcionários antes não tinham. “Há lugar para um estudo de caso único na construção de teoria, quando o caso é excepcionalmente revelador, ou quando exemplifica muito bem, ou ainda ao oferecer oportunidades incomuns de acesso de pesquisa” ( Mariotto et al., 2014Mariotto, F. L., Zanni, P. P., Moraes, G. H. S. M. (2014). What is the use of single-case study in management research? RAE-Revista de Administração de Empresas, 54(4), 358-369. , p. 361).

O estudo de caso qualitativo é um método flexível (Mayer, 2001; Merriam, 2009; Stake, 1995 em Alberdeen, 2013) e as definições do que é um estudo de caso também variam consideravelmente ( Mariotto et al., 2014Mariotto, F. L., Zanni, P. P., Moraes, G. H. S. M. (2014). What is the use of single-case study in management research? RAE-Revista de Administração de Empresas, 54(4), 358-369. ). Aberdeen (2013)Aberdeen, T. (2013). [Review of Case study research: design and methods (4thEd.)]. Canadian Journal of Action Research, 14(1), 69-71. argumenta que, embora Yin (2009)Yin, R. K. (2009). Case study research: Design and methods. London: Sage Publications. diga ao leitor ao longo de sua obra que deve-se considerar proposições em todas as etapas do estudo de caso, ele não dá uma definição do termo. Para o nosso propósito, definimos um estudo de caso como a descrição de uma situação/realidade organizacional em um período de tempo, que neste estudo é de janeiro a junho de 2015, e uma certa avaliação/acompanhamento um ano depois.

O design holístico de estudo de caso único (uma única unidade de análise) é uma das quatro opções descritas por Yin (2009Yin, R. K. (2009). Case study research: Design and methods. London: Sage Publications. , em Aberdeen, 2013Aberdeen, T. (2013). [Review of Case study research: design and methods (4thEd.)]. Canadian Journal of Action Research, 14(1), 69-71. ), que argumenta que é melhor fazer um estudo de caso único quando o pesquisador deseja estudar, por exemplo, uma pessoa ou um grupo de pessoas. Faz sentido para este estudo ao considerar que a unidade de análise é a população da sede da organização no Sul do Brasil (201 pessoas). Estudos de caso único podem descrever de forma rica a existência de um fenômeno ( Siggelkow, 2007Siggelkow, N. (2007). Persuasion with case studies. Academy of management journal, 50(1), 20-24. ). Quando se utiliza um estudo de caso único, os(as) pesquisadores(as) podem questionar antigas relações teóricas e explorar novas (Gustafsson, 2017).

Neste artigo, combinamos dados qualitativos (não numéricos) e quantitativos (numéricos), coletados principalmente por meio de uma survey, via questionário. Acima de tudo, levamos em conta que os estudos de caso enfatizam o contexto no qual o fenômeno está inserido, os fenômenos dentro de seus contextos (Eisenhardt & Graebner, 2007; Gibbert, Ruigrok, & Wicki, 2008; Numagami, 1998; Pettigrew, 1973; Platt, 2007; Yin, 1994 em Mariotto et al., 2014)Mariotto, F. L., Zanni, P. P., Moraes, G. H. S. M. (2014). What is the use of single-case study in management research? RAE-Revista de Administração de Empresas, 54(4), 358-369. , aspecto profundamente explorado neste trabalho.

Um estudo de caso único pode gerar, refutar ou refinar uma teoria existente ( Mariotto et al., 2014Mariotto, F. L., Zanni, P. P., Moraes, G. H. S. M. (2014). What is the use of single-case study in management research? RAE-Revista de Administração de Empresas, 54(4), 358-369. , p. 360). A conclusão a que se pretende um estudo de caso pode ser ilustrativa ou confirmável, o que pode confundir o design do estudo de caso, e seguirá acontecendo pois ele é inerente à empresa (Gustafsson, 2017). Os propósitos dos estudos de caso são, de acordo com Solberg Søilen e Huber (2006, em Gustafsson, 2017), gerar base para uma discussão sobre um problema concreto. Os artigos nos quais a teoria é construída a partir de casos são, muitas vezes, considerados os mais interessantes (Bartunek, Rynes, & Irland 2006 as cited in Gustafsson, 2017).

Detalhamento dos Procedimentos

Nesta subseção, pretendemos “aumentar a validade do construto de um estudo de caso ao estabelecer um processo claro de evidências que permitam que os leitores da pesquisa reconstruam a forma como os(as) pesquisadores(as) partiram das questões iniciais da pesquisa até as conclusões finais” (Gibbert, Ruigrok, & Wicki, 2008; Yin, 2005 as cited in Mariotto et al., 2014)Mariotto, F. L., Zanni, P. P., Moraes, G. H. S. M. (2014). What is the use of single-case study in management research? RAE-Revista de Administração de Empresas, 54(4), 358-369. .

Inicialmente, o design metodológico foi influenciado pela experiência de trabalho anterior da pesquisadora na organização. A escolha da organização como caso foi a primeira decisão, seguida da escolha pelo Referencial Teórico (1.0) e a problematização do contexto. Isso permitiu que as autoras decidissem sobre temas e processos com base na abordagem estrutural de Acker em relação à unidade de caso/população estudada.

A segunda etapa foi definir as técnicas de coleta de dados, que também dependiam de autorizações que obteríamos da empresa após apresentar ao CEO os temas descritos acima, e um projeto geral com sugestões de etapas. A etapa a) acima proporcionou lentes para iniciar a abordagem com a empresa, que estava fisicamente distante das pesquisadoras, que logo foram informadas pelo RH que os entrevistados não tinham muito tempo disponível. Assim deu-se a escolha por um questionário online para coletar dados numéricos, incluindo opções de resposta aberta. Outro, para coletar dados qualitativos. Entrevistas, observações ou outras técnicas não eram opções. Não seria possível enviar questionários online para unidades produtivas, e na sede não haveria adesão se fossem solicitados dados quantitativos de forma central, dado o tempo que demandaria.

Posteriormente, e antes de formular as perguntas, solicitamos informações ao RH (médias salariais, políticas de licença parental e outros, tais como manual de ética e programas de treinamento com situações de trabalho hipotéticas) e analisamos o website da empresa (que incluía imagens e mensagens). Com base no material e realidades citadas (quem incluíam temas/categorias fornecidos pelos processos de Acker), os temas/categorias surgiram e formaram cada questão do questionário. Diante dos obstáculos que impossibilitaram as demais técnicas de coleta de informações, buscamos esta análise prévia dos dados para proporcionar ao estudo a triangulação necessária (Stake, 2000; Yin, 2009Yin, R. K. (2009). Case study research: Design and methods. London: Sage Publications. em Aberdeen, 2013Aberdeen, T. (2013). [Review of Case study research: design and methods (4thEd.)]. Canadian Journal of Action Research, 14(1), 69-71. ; Mariotto et al., 2014Mariotto, F. L., Zanni, P. P., Moraes, G. H. S. M. (2014). What is the use of single-case study in management research? RAE-Revista de Administração de Empresas, 54(4), 358-369. ). Somado a isso, a soma de dados qualitativos e quantitativos.

A quarta etapa consistiu em formular o questionário e obter a aprovação do diretor de RH. Nosso método de análise de dados foi pré-determinado: objetivamos a análise quantitativa (numérica) advinda das questões, relacionando-a com as informações qualitativas dos respondentes. Dado que o espaço para dados qualitativos do questionário foi limitado, não surgiram novos temas nas respostas dos funcionários, o que poderia acontecer mais facilmente em entrevistas ou observações. Portanto, nenhum dos dados qualitativos do Processo 4 foi selecionado ou filtrado/retirado para análise neste artigo: tudo o que coletamos (para este Processo Família e Trabalho) é discutido aqui, em cada categoria/questão pré-definida.

Por fim, selecionar apenas o 4º Processo de Acker com foco apenas em Família e Trabalho (a partir de uma pesquisa mais ampla que utilizava todos os Processos com diferentes temas), exigiu aprofundar o debate teórico sobre o trabalho do cuidado x carreira, especificamente os estudos brasileiros, conforme discutido acima. Esta literatura não foi utilizada como base na elaboração das categorias/questões, mas ajudou a descrever a existência do fenômeno e examinar as relações teóricas, explorando possibilidades entre dados empíricos e teoria, e as contribuições geradas.

Coleta de material: questionário e reunião/acompanhamento posterior

201 pessoas receberam o e-mail do RH com o link do questionário e 87 responderam. Uma adesão de 43%, o que é considerado um ótimo índice dado o tipo de organização, população e tema. Realizamos um estudo piloto, testando o questionário com cinco pessoas, solicitando feedback e fazendo os ajustes necessários.

Todo o questionário foi composto por 38 questões fechadas de múltipla escolha, em português, língua nativa da maioria da população, exceto alguns executivos noruegueses que não eram nosso principal interesse. Começou com perguntas introdutórias, passando para as mais delicadas e terminando com uma 39ª pergunta aberta, para comentários gerais. Este artigo selecionou como material apenas a introdução e as 4 questões da seção Família e Trabalho.

A Introdução foi a única parte que não pôde ser omitida, para que pudéssemos conhecer o gênero, idade, situação familiar (conjugal e parental) e cargo de liderança (formal, informal, não líder) do entrevistado. Ao elaborar perguntas e opções de resposta que sejam ao menos minimamente adequadas a todos os respondentes, procurou-se não perder o que era mais adequado para a maioria, e algumas vezes isso só foi possível inserindo a opção Outro – Especificar com espaço aberto para escrita, ou “Não se Aplica a Mim”. Estávamos cientes de que pode não ter sido suficiente para evitar o problema.

O Diretor de RH leu as perguntas e demonstrou alguma preocupação, duas ou três palavras foram trocadas, mas a autorização do CEO foi fundamental nessa negociação. Este foi um grande privilégio, que geralmente forma outra camada de obstáculo quando os pesquisadores tentam a análise no nível institucional. Em relação à confiabilidade, Babbie (2010)Babbie, E. (2010). The practice of social research. Wadsworth: Wadsworth Cengage Learning. argumenta que ao apresentar a todos os sujeitos um estímulo padronizado, a survey tem bom desempenho em evitar falta de confiabilidade nas observações feitas pela(o) pesquisador(a).

Em relação ao retorno para a empresa em reunião/acompanhamento, um ano após a conclusão da pesquisa e subsequente envio ao CEO, uma das pesquisadoras reuniu-se com duas representantes mulheres da empresa (áreas de RH e Jurídica), para dar retorno e receber informações sobre os desdobramentos. Foi uma tentativa de cumprir o compromisso ético com a empresa, um acordo de devolução, e coletar algumas informações, reforçando assim também outro ponto forte dos estudos de caso em descrever um fenômeno ao longo do tempo, pela sequência de eventos (Ozcan, Han & Graebner, 2017).

Por fim, os processos de coleta, análise do material e escrita foram permeados de considerações éticas. A pesquisa informou os participantes sobre seu objetivo e tempo necessário, deixando claro que a participação era voluntária. A opção de pular questões também lhes deu liberdade no formato de sua participação. Por se tratar de um web-survey , o consentimento dos respondentes em participar foi considerado igual ao fato de terem optado por responder ao questionário, o que foi claramente explicitado no início. Sem identificação de IP, identificação impossível de respondentes por seu empregador ou publicação que possa revelar pessoas individualmente, apenas as pesquisadoras com acesso a respostas e criptografia de respostas fornecidas pelo Survey Monkey, a única ferramenta aceita pela organização. Este projeto é intelectualmente independente e moralmente livre, pois é um projeto auto subsidiado, com integridade do projeto intacta. O CEO da empresa não exigiu anonimato da empresa, mas para este artigo optamos por mantê-la.

Resultados e discussão

O início do questionário informava se tratar de igualdade de gênero. Logo após o envio obtivemos poucas respostas, mas então duas jovens funcionárias (áreas de RH e Comunicação) decidiram por conta própria andar pelo escritório pedindo às pessoas que se envolvessem. Muito mais mulheres responderam do que homens, o que já indica quem tem os privilégios na hierarquia de gênero de Acker (1990)Acker, J. (1990). Hierarchies, jobs, bodies: a theory of gendered organizations. Gender and Society, 4(2), 139-158. .

Dos 201 indivíduos que receberam o questionário, 87 (43%) responderam, 51 mulheres e 36 homens. Curiosamente, apenas 23 dos 86 líderes formais responderam, 13 deles mulheres. Isso significa que 7 mulheres líderes e 56 homens não responderam.

Como argumenta Acker, se há desigualdade de status, os homens não têm nada a ganhar em ajudar a “entender por que as mulheres estão sempre concentradas na base das estruturas organizacionais”. Isso dificulta o mapeamento das barreiras à igualdade – os controles usados para manter a hierarquia de gênero – que vão além dos aspectos da legislação e das escolhas das empresas. O mapeamento, as escolhas institucionais e o envolvimento dos homens poderiam enfrentar a divisão sexual do trabalho imposta pelo capitalismo ( Hirata, 2015Hirata, H. (2015). Mudanças e permanências nas desigualdades de gênero: divisão sexual do trabalho numa perspectiva comparativa. Friedrich Ebert Stifung (FES) Análise, 7. ). Isso se expressa no grande número de líderes formais homens (o topo da pirâmide) que não participou.

Pergunta/Categoria 1: Gostaria de ter uma licença parental mais longa

Essa pergunta, demonstrada na Tabela 1 , aborda a questão da licença parental, tema que emergiu na problematização teórica quando Acker (1990)Acker, J. (1990). Hierarchies, jobs, bodies: a theory of gendered organizations. Gender and Society, 4(2), 139-158. menciona que a procriação/reprodução não condiz com o trabalhador adequado, que é uma abstração descorporificada: “o trabalhador ideal não pode ter muitas obrigações fora dos limites do trabalho, pois o tornaria inadequado para o cargo [...] cuja vida se concentra em seu emprego em tempo integral e vitalício, enquanto sua esposa ou outra mulher cuida de suas necessidades pessoais e de seus filhos” (1990, p. 149). Ao contextualizar a empresa, foi marcante a diferença de licença parental entre a sede norueguesa e a subsidiária brasileira (Estado como ator), bem como a opção de não prorrogar a licença de 4 para 6 meses, informada pelo RH (Empresa como ator). Daí a importância desta pergunta/categoria.

Tabela 1
: Licença parental mais longa

O questionário não perguntava quais eram ou seriam os possíveis apoios com que os funcionários contavam no cuidado de seus filhos, fossem de uma trabalhadora remunerada ( Hirata, 2012Hirata, H. (2012). O trabalho de cuidado aos idosos no Japão e alguns aspectos de comparação internacional. Mediações: Revista de Ciências Sociais, 17(2), 157-165. ), avós ( Lopes et al., 2010Lopes, R. C. S., Prochnow, L. P., Piccinini, C. A. (2010). A relação da mãe com suas figuras de apoio femininas e os sentimentos em relação à maternidade. Psicologia em Estudo, 15(2), 295-304. ), ou outros atores ( Hirata, 2016Hirata, H. (2016). O trabalho do cuidado: comparando Brasil, França e Japão. SUR-Revista Internacional de Direitos Humanos, 13(24), 53-64 ). No entanto, no contexto brasileiro as mulheres buscam conciliar a vida profissional e familiar ( Hirata, 2015Hirata, H. (2015). Mudanças e permanências nas desigualdades de gênero: divisão sexual do trabalho numa perspectiva comparativa. Friedrich Ebert Stifung (FES) Análise, 7. ), e nesta realidade as licenças parentais são centrais. Pesquisas mais recentes sobre grandes corporações no Brasil, relacionadas à atuação das empresas para enfrentar questões de igualdade de gênero, também tratam centralmente as licenças maternidade e paternidade ( Bendia, 2020Bendia, L. B. (2020). Grandes empresas, equidade de gênero e maternidade: um estudo a partir da percepção dos gestores de diversidade e inclusão. (Dissertação de mestrado). FGV EASP, São Paulo, SP. ; Miguel, Reis, & Santos, 2022).

Os resultados acima, que foram semelhantes para todas as mulheres e mulheres solteiras sem filhos, expressam que as mulheres em geral tendem a refletir sobre a licença maternidade, tendo ou não essa vivência. Em oposição, 82% dos homens solteiros sem filhos nunca pensaram nisso e apenas 20% gostariam de ter uma licença parental mais longa. Os percentuais de líderes homens são semelhantes ao de homens em geral. Isso reforça o argumento de que, para as mulheres com ou sem filhos, a licença maternidade é uma preocupação muito maior do que para os homens, que não consideram haver muita necessidade (ou não se preocupam com isso no futuro) de ficar em casa por mais de 5 dias depois que seu filho nasce.

Uma líder mulher afirmou que “a empresa deveria considerar estender a licença maternidade para 180 dias, também para os pais nas primeiras semanas, já que a mãe precisa muito de ajuda no primeiro mês”. Ela está ciente da possibilidade oferecida pela legislação e do fato de algumas empresas estarem aderindo à ideia, como demonstrado por Teixeira e Gòis (2015).

Se os resultados demonstram que a preocupação com a política de licenças é majoritariamente feminina, expressa até mesmo por lideranças masculinas, entende-se porque os principais obstáculos à liderança executiva feminina são a pressão do relógio biológico e a sobrecarga com o cuidado dos filhos x extensa jornada de trabalho (Carvalho Neto et al., 2010). Um pai que “ajuda” é uma expressão em discussão hoje em dia, pois não expressa responsabilidade compartilhada. Ainda assim, a preocupação em dar essa “ajuda” via afastamentos mais longos do trabalho já significaria um avanço, culturalmente e de forma prática, para as carreiras das mulheres. A melhoria não depende apenas da legislação nacional (decidida por uma grande maioria de políticos homens), mas da vontade das empresas em melhorar (organizações também generificadas). Especialmente por se tratar de uma empresa escandinava, “onde as masculinidades hegemônicas vêm se modificando” ( Johansson & Klinth, 2008Johansson, T., Klinth R. (2008). Caring fathers: The ideology of gender equality and masculine positions. Men and Masculinities, 11(1), 42-62. ). A abordagem dos homens referente a licenças mais longas e paternidade são centrais.

Pergunta/Categoria 2: Minha maternidade/paternidade atual ou futura é um obstáculo para meu crescimento na empresa

O motivo da inclusão dessa categoria foi observar se os respondentes entendem “ter tudo” ( Husu, 2005Husu, L. (2005). Women’s work-related and family-related discrimination and support in academia. Gender Realities: Local and Global, 9, 161-199. ) como um problema real, relacionado a suas carreiras e à empresa. Conforme discutido, “Ter Tudo” está relacionado ao teto de vidro, uma das barreiras e controles que poderiam relegar mulheres à base da pirâmide na hierarquia da organização. A pergunta, ilustrada na Tabela 2 , responde diretamente à pergunta de pesquisa, desta vez relacionando mais diretamente Família e Trabalho do que na Pergunta/Categoria anterior.

Tabela 2
: Maternidade/Paternidade como obstáculo

Chamou atenção que essa pergunta provocou mais respostas qualitativas de mulheres, algumas delas líderes. Uma marcou Outro porque “não pretendo ter filhos”. Essa realidade era esperada, até mesmo como limitação da interpretação do questionário, quando este deixa de representar a realidade de toda a população. A resposta acima pode até ser a causa dos 27% de mulheres que optaram pela resposta “Não, não vai ser um empecilho”.

Também pode representar viés das pesquisadoras em não incluir essa opção (ainda que uma não seja mãe), provavelmente justificada pelo estigma social e pela contínua discriminação a esse status ( Barbosa & Rocha-Coutinho, 2012Barbosa, P. Z., Rocha-Coutinho, M. L. (2012). Ser mulher hoje: a visão de mulheres que não desejam ter filhos. Psicologia & Sociedade, 24(3), 577-587. ), que reforçaria a crença de Lutero de que mulheres nasceram para procriar. Conforme discutido, pode também ser uma opção motivada pela consciência das respondentes sobre as dificuldades de conciliação de ambos os papéis, de “Ter Tudo”. Poderia também ser expresso através da opção “Não sei” da maioria das mulheres. Essa resposta também é intrigante e também pode justificar por que não incluímos “Não Quero ser Mãe” como opção, considerando que, como mulheres, sabemos o quão difícil é realmente saber o que queremos a esse respeito (“Isso depende de…”). Acrescentar esta opção de resposta significaria provocar de forma mais direta um ponto sensível para algumas entrevistadas.

Outra entrevistada expressou “Não sei exatamente como isso afetará a carreira, mas com certeza afetará sua trajetória e velocidade”, claramente ciente dos obstáculos, embora ainda lhe pareçam sutis e ocultos. Então, optar por “Não Sei” pode ter outros motivos, e pesquisar e escrever sobre isso (mais literatura e discussão) pode ajudar várias mulheres a estarem mais conscientes a respeito desta intuição-certeza e terem mais informações para suas tomadas de decisão e estratégias para “Ter Tudo” (ou não serem mães). Conversar com mulheres que já tiveram filhos também seria uma estratégia, como a funcionária mãe que disse que “Já foi um obstáculo”. A sugestão do debate não significa que falar ou ler a respeito resolverá a “escolha” ou as estratégias, pois não se trata apenas de uma questão de poder individual, mas estrutural, como afirma Acker. O adiamento da maternidade ( Rodrigues, 2008Rodrigues, M. C. (2008). Vivências da maternidade tardia, cotidiano e qualidade de vida: a perceptiva feminina (Dissertação de mestrado). Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, MG. ; Beltrame & Donelli, 2012Beltrame, G.R., & Donelli, T. M. S. (2012). Maternidade e carreira: desafios frente à conciliação de papéis. Periódicos Eletrônicos em Psicologia – Alethea, 38-39, 206-217. ) pode ser resultado de não saber exatamente como se dão os obstáculos e quais serão as dificuldades. Esses pontos também são expressos por uma líder: “Ainda não decidi se quero ter filhos, levando em consideração o crescimento e impactos na minha carreira”.

“Pode ser um obstáculo devido ao meu estilo de liderança”. Ela justifica os empecilhos esperados como sua responsabilidade, sua própria atitude como obstáculo, ignorando a estrutura da qual faz parte. Quanta masculinidade ela é obrigada a desempenhar para liderar na organização? Um estilo que cria obstáculos? Por quê? De que forma? Ela está performando muita masculinidade para uma mãe? Kanter (1977Kanter, R. M. (1977). Men and women of the corporation. New York: Basic Books. , p. 46), argumenta que a ética masculina está presente: “enquanto as organizações eram definidas como máquinas neutras em termos de sexo, os princípios masculinos dominavam suas estruturas de autoridade”. Será que o estilo dela, na visão dela, é responsável pela extensão da jornada de trabalho, aspecto que temos visto fazer parte das queixas das mulheres em geral. Ou é porque ela é menos remunerada que o homem na empresa, menos reconhecida, em um fenômeno apontado por Acker como “habilidades mais encontradas em homens, como administrar dinheiro, recebem mais pontos do que habilidades mais encontradas em mulheres, como relações humanas”. Talvez ela acredite que comportar-se como um homem – o que não é adequado a uma mãe – é ser a verdadeira trabalhadora líder: “o conceito de trabalhador universal exclui e marginaliza as mulheres que não podem, quase por definição, alcançar as qualidades de uma verdadeira trabalhadora porque fazer isso é tornar-se um homem”.

Não podemos afirmar com certeza o que ela quer dizer, mas em uma empresa onde as hierarquias de gênero são tão claras, as mulheres sabem que existem obstáculos, mas demonstram algum nível de falta de consciência sobre como esses obstáculos ocorrem, expressos de forma qualitativa e quantitativa. Falta de conhecimento de quais são os efeitos e as reais razões/causas para eles. Elas também expressam o quanto ficam em dúvida sobre a maternidade por causa do trabalho. Quando uma mulher líder vê tantos homens líderes que são pais pouco envolvidos em questões familiares, tendo tempo para colocar um trabalho extra e até socializar com colegas, ela entende o que seria necessário para ser líder, que provavelmente é ter um cônjuge mais dedicado à família. Não esqueçamos que as mulheres pensam que “os filhos sofrem mais se a mãe trabalha fora” (Araújo & Scalon, 2006 em Emidio & Castro, 2021)Emidio, T. S., Castro, M. F. de. (2021). Entre voltas e (re)voltas: um estudo sobre mães que abandonam a carreira profissional. Psicologia: Ciência e Profissão, 41, 1-16. .

Em suma, em meio a toda essa “confusão” (demonstrada pela teoria e pelas respostas), uma percepção é certa: não é um obstáculo para os homens.

Pergunta/Categoria 3: Sinto-me apoiado(a) pela empresa em relação à minha vida familiar e minha maternidade/paternidade

Na Tabela 3 abaixo, observe que em todas as opções de resposta as mulheres se sentem apenas um pouco menos apoiadas pela empresa do que os homens, mas nenhuma mulher líder “Nunca Pensou Nisso”, diferentemente dos homens. Esta Pergunta/Categoria, entre outros aspectos, aproximam-se da relação Família e Trabalho (na empresa). A pergunta 2 anterior, menciona carreira , que pode ocorrer em outras empresas/contextos. Este aborda a empresa em si. Uma maneira diferente e mais direta de nomear a organização. “O mercado e outras instituições” ( Hirata, 2016Hirata, H. (2016). O trabalho do cuidado: comparando Brasil, França e Japão. SUR-Revista Internacional de Direitos Humanos, 13(24), 53-64 ) são atores, têm um papel no trabalho do cuidado, ou seja, a empresa também se encarregaria de dar apoio aos pais e mães.

Tabela 3
: Suporte da empresa à vida familiar

Conforme discutido, poderíamos ter perguntado usando o termo trabalho do cuidado , mais inclusivo do cuidado com idosos e doentes, ainda tão ausente na literatura sobre organizações. Tentamos ser inclusivas usando “Vida Familiar”, como fazemos chamando o tema “Família e Trabalho”, ao invés de Maternidade/Paternidade apenas. Em 2015, e talvez ainda agora, não ficaria claro a que nos referíamos com trabalho do cuidado , então novamente focamos em maternidade/paternidade . Não chamamos de cuidado, nem maternagem, nem parentalidade, termos muito recentes e pouco usados até mesmo na teoria organizacional. Se nem a maternidade é totalmente contemplada pelas grandes organizações, e as licenças paternas não são concedidas integralmente, ainda menos atenção ou direitos são dados a trabalhadores(as) que exercem outro tipo de trabalho de cuidado. Lembrando que o trabalho de cuidado engloba muitas coisas, conforme descrito por Cida Bento.

A categoria “apoio da empresa” também destaca o papel dos líderes e das equipes como um todo, que podem ter um papel de responsabilidade em fornecer suporte, flexibilidade, home office, folgas e outras ações que não sejam necessariamente políticas RH ou imposições legais, mas relacionamentos humanos entre indivíduos, e de liderança.

O que poderia explicar o fato de que, após os dois resultados anteriores, a empresa seja solidária na perspectiva de seus/suas funcionários(as)? Seria medo de que a gestão tivesse acesso às respostas? Apesar de termos informado que não aconteceria. Seria uma percepção de que a empresa não é um ator social responsável pela igualdade de gênero em relação às famílias? É o business as usual , ou seja, um processo que naturalizou algumas práticas e realidades como normais? A próxima pergunta insistiu na questão, mas deu exemplo do que seria “suporte”, diminuindo a abstração. Quando as crianças estão doentes, geralmente não vão à escola/creche, o que requer outro tipo de apoio.

Pergunta/Categoria 4: Quando meus filhos(as) estão doentes, sinto que a empresa é compreensiva com meu problema

Conforme demonstrado na Tabela 4 , a grande maioria respondeu “Não se Aplica a Mim”. Considerando que 65% dos entrevistados não têm filhos, ao responder especificamente sobre crianças doentes, faz sentido escolherem essa resposta. Também poderia representar muitos outros aspectos juntamente com os resultados de questões anteriores, como a dissociação entre o trabalho e os assuntos familiares. Se eles têm uma rede de apoio, então isso não se aplica à sua situação, porque o adoecimento dos filhos não afetaria muito suas rotinas. Somos conduzidos a essas reflexões por uma líder que é mãe e respondeu “Não se Aplica a Mim” quando seus filhos adoecem. Dito isso, ainda há diferenças de gênero nas respostas. Mulheres percebem menos compreensão do que os homens, que já demonstraram de diferentes maneiras não serem muito afetados por essa responsabilidade.

Tabela 4
: Empresa compreensiva

Observe que para todas as perguntas, incluindo a número 4, estamos perguntando quase o mesmo: licença parental, obstáculo, apoio, nível/tipo de apoio em uma determinada situação. São tentativas de tornar os obstáculos às carreiras mais tangíveis e menos abstratos para os entrevistados, para que eles e nós possamos entender melhor suas percepções. Algum tipo de repetição é proposital, já que contradições contundentes ou sutis entre os resultados de cada categoria sinalizam algo.

Por exemplo, 84% dos líderes homens (e 72% do total de homens) percebem que a paternidade não é um obstáculo para eles na organização. Assim, os homens não percebem problemas na relação carreira e a paternidade. Além disso, nenhum funcionário expressou sentir-se Raramente ou Nunca apoiado pela empresa em relação a ter filhos. No entanto, a maioria das mulheres (70%) e alguns homens querem licenças mais longas, e há respostas que indicam obstáculos para ter filhos e uma carreira. Conforme discutimos, elas podem não ter clareza do que esse apoio implicaria, ou mesmo se é papel da empresa fazê-lo.

Destaca-se que a média de idade da população estudada é relativamente baixa para os homens (35 anos) e ainda mais jovem para as mulheres (31), o que também pode estar relacionado à responsabilidade familiar, uma vez que a maioria dos entrevistados (65%) não têm filhos. Pode haver uma estratégia da empresa em não contratar muitas pessoas – ou mulheres – com responsabilidades familiares. Investigar a discriminação etária no trabalho seria outro aspecto importante, exemplo do argumento de Acker sobre o emprego exigir uma separação o doméstico/privado, aceitando apenas certos corpos, relegando mulheres mais jovens sem filhos à base da pirâmide, e evitando contratar mulheres mais velhas que, em sua maioria, são mães.

As respostas dos entrevistados às perguntas sobre Família e Trabalho mostram barreiras à igualdade de gênero. Em primeiro lugar, porque as preocupações relacionadas a ser mãe e funcionária de sucesso são bem diferentes de ser pai e funcionário de sucesso. A maioria dos homens não percebe a necessidade de estar disponível/em casa quando o filho nasce (ou é adotado), oferecida por uma licença mais longa. Portanto, ter um filho não é um obstáculo para a carreira dos homens. A discriminação de gênero relacionada a ter filhos também é evidenciada quando a maioria dos homens tem certeza da inexistência de obstáculos à carreira, enquanto a maioria das mulheres percebe obstáculos, ou não sabe.

Em segundo lugar, observa-se que, para a trabalhadora, a maternidade/paternidade está separada da sua vida profissional, não devendo a empresa ser envolvida ou responsabilizada por isso. Não há resposta objetiva que comprove esta inferência, mas pistas: as mulheres se preocupam em ter mais licenças e sabem que a empresa não oferece essa possibilidade (e poderia), mas ainda evitam afirmar que não se sentem amparadas pela empresa, embora se sintam apoiadas com menos frequência do que os homens quando as crianças estão doentes.

As razões por trás de muitas respostas não são totalmente compreendidas, mas os resultados do Processo 4 Acker (Família e Trabalho) demonstram diferenças de gênero nas percepções sobre maternidade x paternidade como obstáculo, de formas qualitativa e quantitativa. Assim, ao analisarmos as categorias em conjunto, temos a confirmação de pelo menos uma razão do porquê da estrutura desta empresa ser tão desigual em termos de gênero, reiterando a literatura discutida e a proposição de Acker sobre a organização generificada, e de outros estudos: “relegar as mulheres grávidas a trajetórias e mobilidade em cargos inferiores […] em conformidade e reforço à hierarquia” (Acker, 1990, p. 151).

A última parte desta Seção Resultados e Discussão se baseia no Retorno e Reunião/Acompanhamento junto à empresa. Durante nossa reunião, foi informado que a subsidiária havia implantado um projeto para estender a pesquisa às suas unidades produtivas. Constataram, por exemplo, ausência de banheiros femininos, ou de uniformes para funcionárias gestantes. Em seu novo escritório sede, eles fizeram questão de incluir salas de lactação. Três anos após receber o retorno deste estudo, a empresa informou publicamente ter aderido aos Princípios de Empoderamento da Mulher da ONU, proporcionando a extensão da licença parental no Brasil. Um ano depois, em 2019, o Relatório de Investimentos da Noruega no Brasil, da Innovation Norway, incluiu uma nova e interessante seção inteira entitulada Igualdade de Gênero, na última página de seu relatório. Como nos resultados apresentados em nosso estudo de caso mais amplo, a diplomacia norueguesa compara dados de gênero entre os dois países, menciona brevemente as cotas de gênero, fazendo uma tentativa deliberada de mostrar que para a Noruega e suas empresas:

Igualdade de gênero é um indicador-chave de desempenho [...] empresas norueguesas trouxeram para o Brasil elementos dos valores noruegueses e foco em agregar mulheres à força de trabalho e como líderes de suas operações brasileiras. (Relatório da Innovation Norway, 2019, p. 23)

O relatório cita, como exemplo, ações em três diferentes empresas norueguesas no Brasil, empresas públicas. Este estudo de caso é de uma empresa citada como protagonista nos negócios noruegueses. Esse processo pode ser representativo do que está acontecendo atualmente em outras grandes empresas multinacionais no Brasil. No entanto, mulheres executivas de diversas multinacionais no Brasil percebem a maternidade como ainda sendo ainda um dos principais obstáculos para a progressão na carreira das mulheres ( Bendia, 2020Bendia, L. B. (2020). Grandes empresas, equidade de gênero e maternidade: um estudo a partir da percepção dos gestores de diversidade e inclusão. (Dissertação de mestrado). FGV EASP, São Paulo, SP. ; Miguel et al., 2022Miguel, A., Reis, G. L. R., Gomes, N. C., Santos, R. M. (2022). Maternidade e mercado de trabalho. Tornando a maternidade uma aliada nas organizações multinacionais no Brasil. Revista Estudos e Negócios Academics, 2(3), 73-81. . Além disso, há pesquisas com abordagens que colocam individualmente nas mulheres a responsabilidade de encontrar estratégias, tais como Verni (2018)Verni, M. T. (2018, November 14) A maternidade e o mercado de trabalho. Petit Papillon. Retrieved from https://www.petitpapillon.com.br/blog/maternidade-volta-ao-trabalho.
https://www.petitpapillon.com.br/blog/ma...
. Um estudo de 2017 afirma que na maioria dos Melhores Lugares para se Trabalhar no Brasil, as licenças maternidade e paternidade ainda são o mínimo exigido pela legislação ( Bianconi, 2017Bianconi, G. (2017, 30 de maio). Na maioria das “melhores empresas para trabalhar” do Brasil, licenças maternidade e paternidade ainda são as mínimas exigidas por lei. Gênero e Número. Retrieved from https://www.generonumero.media/reportagens/licenca_maternidade_paternidade/
https://www.generonumero.media/reportage...
).

Toda esta discussão, que relaciona os dados deste estudo de caso único e a literatura internacional e nacional sobre o tema, demonstra que em qualquer trabalho que se dedique ao estudo das trabalhadoras de grandes empresas e suas carreiras aparecerá a maternidade como central para a discussão dos obstáculos. É neste ponto que a questão de gênero surge de forma mais contundente para mostrar as desigualdades de gênero no trabalho. Ainda que pesquisas sobre o tema sejam mais frequentes, estudos capazes de acessar a população de uma única grande multinacional no Brasil estão quase ausentes, senão totalmente. Particularmente aqueles que pretendem refletir sobre a duplicidade de critérios em relação às questões de gênero nas sedes e subsidiárias internacionais de empresas do Norte Global.

Husu (2005)Husu, L. (2005). Women’s work-related and family-related discrimination and support in academia. Gender Realities: Local and Global, 9, 161-199. argumenta que após a implementação da legislação de igualdade na Finlândia, a discriminação de gênero contra as mulheres tornou-se mais sutil, incluindo a discriminação relacionada à maternidade. Este estudo mostrou que isso não é verdade na realidade brasileira, nem mesmo em uma subsidiária escandinava, conhecida por “índices modelo de igualdade de gênero”. A desigualdade é mais visível no Brasil – “com controles ostensivos” ( Acker, 1990Acker, J. (1990). Hierarchies, jobs, bodies: a theory of gendered organizations. Gender and Society, 4(2), 139-158. , p. 151) – porque temos menos igualdade numérica e hierárquica, maior diferença salarial e licenças parentais muito mais curtas. Estes aspectos também expressam a falta de envolvimento de outros atores importantes, como o Estado, e a responsabilidade que recai nas demais mulheres, tendo como consequência cuidadoras, remuneradas ou não, em situação de maior vulnerabilidade.

Os resultados demonstram que as funcionárias dessa empresa percebem a discriminação na maternidade como algo sutil, no sentido de que muitas ainda não a entendem ou nomeiam, mesmo que a maioria das mulheres saiba que existe. A maioria dos homens não reconhece ou nega a discriminação. O equilíbrio entre vida pessoal e carreira profissional está na raiz da insatisfação manifestada por grande parte das mulheres, mesmo que não a expressem de forma clara ou objetiva. Confirma a ideia de que ou as mulheres não têm filhos e se dedicam exclusivamente à carreira, ou abandonam a carreira e se dedicam exclusivamente à maternidade (Emídio & Castro, 2021). Cria-se então um julgamento negativo referente às mulheres que desejam as duas coisas, as que querem “Ter Tudo” ( Husu, 2005)Husu, L. (2005). Women’s work-related and family-related discrimination and support in academia. Gender Realities: Local and Global, 9, 161-199. . Isso tende ou pode fazer com que as mulheres percebam a maternidade como um sacrifício ( Chechi Fiorin et al., 2014)Chechi Fiorin, P., Garcia Dias, A. C., & Tochetto de Oliveira, C. (2014). Percepções de mulheres sobre a relação entre trabalho e maternidade. Revista Brasileira de Orientação Profissional, 15(1), 25-35. , principalmente se adiarem a maternidade a um ponto de sofrerem com processos de fertilização. Uma consequência contemporânea da relação relógio biológico x carreira, ainda ausente na literatura.

Conclusões

Este estudo de caso único em uma grande empresa norueguesa no Brasil expressa as percepções dos funcionários sobre a relação de sua parentalidade com suas carreiras. Demonstrou que os homens (muitos deles em posição de liderança) não estavam interessados em participar de uma pesquisa sobre igualdade de gênero, então as mulheres foram as que mais responderam. Afinal, o que eles têm a ganhar mudando uma estrutura organizacional masculina? “Se a população de funcionárias de escritórios pudesse competir com os homens nesse trabalho, as probabilidades de promoção para os homens seriam drasticamente reduzidas” ( Acker, 1990Acker, J. (1990). Hierarchies, jobs, bodies: a theory of gendered organizations. Gender and Society, 4(2), 139-158. , p. 154). Este estudo propõe que pesquisas sobre organizações e gênero evitem entrevistar apenas mulheres, e passem a incluir e ouvir homens para melhor compreender as masculinidades hegemônicas. Nosso estudo agrega entrevistados do sexo masculino, enriquecendo a teoria de gênero e de masculinidade e, em termos práticos, convocando-os para a discussão acerca igualdade de gênero. Afinal, homens detém o poder nos diversos atores, Estado, Mercado e em muitas outras instituições. Talvez até em seus relacionamentos com as mães de seus filhos.

Os resultados quantitativos e qualitativos demonstram que a maioria das mulheres, mais do que os homens, percebe a maternidade como um obstáculo e gostaria de ter uma licença-maternidade mais longa. Uma quantidade representativa de mulheres sente que a empresa não é sempre compreensiva quando seus filhos estão doentes. Os homens, ao contrário, não veem a paternidade como obstáculo, não querem mais licença-paternidade e sentem que a empresa é frequentemente compreensiva quando seus filhos estão doentes. Apesar das mulheres perceberem sua realidade como descrito acima, concordam com os homens que a empresa as apoia quando se trata de suas famílias.

Entre outros aspectos já discutidos, os resultados demonstram uma cultura de pais não responsáveis ​​e/ou não participantes, e consequente insatisfação das mulheres em relação à questão da maternidade e do trabalho. Este estudo confirma e reforça as proposições teóricas das organizações generificadas elaboradas por Joan Acker em 1990Acker, J. (1990). Hierarchies, jobs, bodies: a theory of gendered organizations. Gender and Society, 4(2), 139-158. . Infelizmente, se três décadas depois das proposições da autora, isso ainda é verdade, então esse tipo de denúncia ainda é necessária. Além disso, aponta para o fato de que as mulheres em 2015 não viam a empresa como ator em reduzir os obstáculos que enfrentam em termos de Família x Trabalho. Os homens nem se preocuparam com isso. Em outras palavras, a divisão sexual do trabalho denunciada por Hirata pode ter sido internalizada nas mulheres como algo que elas deveriam lidar consigo mesmas, em nível individual, em seu pouco espaço para “escolhas”. Destacamos a necessidade de dar um passo além, olhando para as consequências e desenvolvimentos contemporâneos desta realidade para as mulheres, organizações e sociedade como um todo: adiamento; processos de fertilização; desistência do trabalho; decisão de não ser mãe, etc.

Ainda que a maternidade deva ser estudada como construção social que vai além do significado biológico, a análise em três níveis confirma a centralidade da discriminação da maternidade no Brasil na carreira das mulheres. Sugerimos a realização de mais estudos sobre organizações e trabalhos que abordem o tema em termos de parentalidade (incluindo pais), maternagem (incluindo outras pessoas no processo de criação de um filho, remuneradas ou não), trabalho de cuidado (incluindo o cuidado de outras pessoas vulneráveis pessoas para além das crianças, como os idosos e doentes) e família, não só tornando uma discussão mais inclusiva como mais ilustrativa de uma contemporaneidade complexa.

As percepções dos funcionários, “seu trabalho mental interno dando sentido ao seu lugar e oportunidades na organização de gênero” (Processo 4 de Acker), e outras informações fornecidas sobre a empresa, mostraram desigualdade de gênero na organização estudada. Pesquisas brasileiras mais recentes com funcionários de grandes empresas multinacionais começaram a abordar a questão da maternidade dentro de uma discussão mais ampla de igualdade e diversidade de gênero, mostrando que as empresas estão fazendo novos esforços por meio de políticas de benefícios e mais flexibilidade para reter talentos femininos. Tal avanço não é consenso na literatura brasileira.

É necessária mais investigação de casos semelhantes, bem como um melhor acesso dos investigadores às organizações multinacionais, para relatar estruturas, progressos, obstáculos, soluções práticas existentes, etc. Maiores estudos podem contribuir para mudança da realidade atual das organizações, onde são adotadas apenas as obrigações legais em termos de maternidade ( Santos & Hilal, 2018Santos, C., Hilal, A. V. G. (2018). Same, same but different? Women’s experiences with gender inequality in Brazil. Employee Relations, 40(3), 486-499. ), endereçando assim políticas e estruturas de apoio à maternidade como parte da responsabilidade social e corporativa, em direção a um desenvolvimento sustentável ( Starik & Kanashiro, 2013)Starik, M., Kanashiro, P. (2013). Toward a theory of sustainability management: Uncovering and integrating the nearly obvious. Organization & Environment, 26(1), 7-30. .

Assim, este trabalho visa contribuir com a literatura ao fornecer uma análise nos três níveis: individual, organizacional e societal – um aspecto que não pode ser abordado apenas por entrevistas com indivíduos de várias empresas diferentes (culturas organizacionais). Adicionalmente, estes aspectos não podem ser abordados por estudos que apenas analisam documentos, faltando outros níveis que possam lidar com a dificuldade organizacional de implementação, discutindo o “como” implementar ( Engert & Baumgartner, 2016Engert, S., Baumgartner, R. J. (2016). Corporate sustainability strategy – bridging the gap between formulation and implementation. Journal of Cleaner Production, 113, 822–834. ). Oferece uma contextualização bicultural que pode ser utilizada na investigação de outras empresas multinacionais e suas estratégias globais.

As percepções dos funcionários (seu trabalho mental interno dando sentido ao seu lugar e oportunidades na organização) evidenciou desigualdade de gênero na organização estudada. Pesquisas brasileiras mais recentes com funcionários de grandes empresas multinacionais passaram a abordar a questão da maternidade como parte de uma discussão mais ampla sobre igualdade e diversidade de gênero, mostrando que as empresas estão realizando novos esforços, alguns avanços que não são consenso na literatura. São necessária mais pesquisas de casos semelhantes, e esperamos mais transparência para melhor acesso dos pesquisadores a organizações multinacionais, como a que tivemos. Este trabalho demonstrou estruturas, avanços, obstáculos, soluções práticas implantadas, etc. Assim, contribui com a literatura ao fornecer uma análise nos três níveis – individual, organizacional e social – aspecto que pesquisas que entrevistam diferentes indivíduos de diversas empresas (culturas organizacionais) não conseguem abordar. Tampouco se torna possível em estudos que apenas analisam documentos, carecendo de outros níveis. Além disso, oferece uma contextualização bicultural que pode ser replicada na investigação de outras empresas multinacionais.

Há um discurso crescente sobre a exportação da igualdade de gênero no contexto apresentado. No entanto, vimos que a fala não foi praticada. Há uma retórica de que a Noruega é mais igualitária em termos de gênero do que o Brasil, e seus negócios no exterior também deveriam ser. Os colaboradores desta organização atribuíram 2,5 ao nível de igualdade de gênero no Brasil (numa escala 1 menos igual e 5 mais igual) e 4,0 à Noruega. Porém, em 2015, as respostas dos líderes masculinos demonstraram que a igualdade de gênero não era sua preocupação. Mais recentemente, um perfil público no LinkedIn de uma alta liderança da empresa falou sobre seu papel de pai, com imagens, e os países nórdicos promoveram um debate sobre igualdade de gênero em Brasília.

Não podemos afirmar que as empresas multinacionais no Brasil são ou podem se tornar atores na promoção da igualdade de gênero abordando a questão Família e Trabalho, pois percebeu-se que a divisão do trabalho dentro das empresas segue o regime de gênero da sociedade onde atua ( Teasdale, 2013Teasdale, N. (2013). Fragmented sisters? The implications of flexible working policies for professional women’s workplace relationships. Gender, Work & Organization, 20(4), 397-412. ). As organizações podem desempenhar um papel na mudança das masculinidades hegemônicas atuais no Brasil? Isso significaria romper com os regimes de gênero que regulam regras e arranjos que definem os papéis sociais de mulheres ou homens em todas as esferas, públicas e privadas (Ortlieb & Sieben, 2009; Walby, 2003)Walby, S. (2003). Policy developments for workplace gender equity in a global era: The importance of the EU in the UK. Review of Policy Research, 20(1), 45-64. . Pesquisas recentes argumentam que empresas e organizações em geral devem se tornar novos atores ao lidar com questões sociais complexas, como gênero (Durbin, Page & Walby, 2017). Precisamos de mais investigação sobre organizações similares, sua relação com outros atores sobre o tema, mais dados qualitativos, melhor conhecimento das masculinidades em suas sedes, etc. Notadamente, este é um trabalho para todos os atores envolvidos, inclusive do Estado.

Portanto, nossa conclusão secundária é que uma empresa que atua em diferentes países do mundo, com diferentes legislações, reforça a diferença de gênero de cada sociedade. No nosso caso, a empresa vem de uma cultura (considerada) mais igualitária de gênero, que não é reproduzida na menos igualitária subsidiária brasileira.

Esta pesquisa contribui para o corpo da teoria em Estudos Organizacionais, Gênero e Organização, Masculinidades, Carreiras e Estudos Críticos de Gestão, tanto para a literatura do Norte quanto do Sul Global. Acrescenta vozes masculinas à teoria que discute maternidade e carreira (parentalidade), demonstrando ideias locais tradicionais acerca de papéis de gênero em relação à família e ao trabalho. Ilustra um diálogo entre teoria e dados empíricos sobre um tema e contexto que está sendo investigado com acesso privilegiado, aprimorando a literatura sobre igualdade de gênero nos negócios ao olhar para essa relação entre o Norte Global e o Sul Global.

Os estudos de caso único têm o potencial de um método que pode ir além das contribuições empíricas, podendo fornecer contribuições teóricas por meio de uma análise em três níveis sobre igualdade de gênero e trabalho: individual, organizacional e social. Este aspecto é uma das principais contribuições do nosso trabalho, relacionado com as proposições teóricas de Acker. Sua abordagem estrutural provou ser contemporânea e aplicável como lentes. Desenvolvemos e aprimoramos suas proposições envolvendo-as com a literatura brasileira atual sobre grandes corporações e carreiras femininas, também adicionando uma abordagem multicultural (Norte e Sul) ao seu Quadro de Processos, especialmente o Processo 4. Sugerimos que a parentalidade esteja no centro do Processo 4 , agregando ao seu modelo e processos para estudar organizações de gênero.

Houve contribuições diretas para a organização estudada e seus funcionários, exemplo de que pesquisas como esta podem ser mais seguras e úteis para a empresa do que os líderes podem imaginar. Também, gerou material para a tendência recente em Gestão da Diversidade e Inclusão, e Cursos/ Programas no tema. Nosso estudo não se limitou a diagnosticar, mas também propor e avançar de forma prática e teórica.

Uma das limitações deste trabalho é não ter incluído outros marcadores de identidade em nosso questionário. Sugerimos, ao longo do texto, diferentes e mais profundas pesquisas e abordagens. Destacamos a necessidade de mais estudos independentes que perguntem aos participantes sobre sua etnia/raça, orientação sexual, origem de classe, possíveis deficiências e outros marcadores. Comparar realidades de maternidade/paternidade e carreiras na empresa estudada com diferentes marcadores poderia ter dado mais insights sobre os obstáculos. Além disso, vemos a necessidade de estudos que, no mesmo modelo e caso semelhante a este trabalho, discutam direitos LGBTQIA+, inclusão e discriminação dentro de uma mesma empresa em mais de um país. A mesma abordagem poderia ser aplicada às questões étnico-raciais nos diferentes contextos nacionais da organização, bem como a outros marcadores sociais. Novas e importantes formas de entender a política global da empresa, a legislação e as percepções dos funcionários em diferentes culturas, informando a sociedade e a teoria organizacional sobre a (re)produção transfronteiriça de (des)igualdades de gênero.

Agradecimentos

As autoras agradecem à liderança da empresa estudada por sua autorização e apoio, bem como aos respondentes pela participação.

References

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Notas

  • 1
    . O Barômetro do Norwegian Work Research Institute de 2019 informa que as disparidades salariais de gênero entre os funcionários em tempo integral na Noruega permanecem em 20%. “Após o ajuste por idade, educação, setor e vários outros fatores, ainda há uma diferença de gênero de 13%.” Em 2017, a Noruega foi classificada em 2º lugar pelo Fórum Econômico Mundial.
  • 2
    . O estudo de caso Wold (2007)Wold, A. (2007). Doing business in Brazil: an anthropological study of the interaction between Norwegian and Brazilian business people (Master thesis). University of Oslo, Oslo, Norway. é na mesma organização e contemporâneo ao tempo em que uma das autoras trabalhou na organizaçã&. Todos os estudos citados nessa parte são do ponto de vista norueguês, nenhum deles em formato de artigo. Nenhum deles aborda questões de gênero ao estudar gestão e diferenças culturais.
  • 3
    . Tokenism (posição de token ) é a prática de fazer apenas um esforço superficial ou simbólico para incluir membros de minorias, especialmente ao recrutar um pequeno número de pessoas de grupos sub-representados para dar a aparência de igualdade racial ou sexual dentro de uma organização.
  • 4
    . Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2012), entre 2000 e 2010, o papel da mulher responsável pela família passou de 22% para 37%. Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) do IBGE mostram que os responsáveis na família por cuidar da casa e dos afazeres domésticos eram 92% mulheres e 51% homens em 2004; e 93% mulheres e 58,36% homens em 2014, o que mostra a divisão desigual em relação aos espaços públicos e privados entre mulheres e homens, de modo que as tarefas relacionadas ao lar ainda permanecem significativamente nas mãos das mulheres ( Emidio & Castro, 2021, pEmidio, T. S., Castro, M. F. de. (2021). Entre voltas e (re)voltas: um estudo sobre mães que abandonam a carreira profissional. Psicologia: Ciência e Profissão, 41, 1-16. , p. 3).
  • Verificação de plágio
    A O&S submete todos os documentos aprovados para a publicação à verificação de plágio, mediante o uso de ferramenta específica.
  • Disponibilidade de dados

    A O&S incentiva o compartilhamento de dados. Entretanto, por respeito a ditames éticos, não requer a divulgação de qualquer meio de identificação dos participantes de pesquisa, preservando plenamente sua privacidade. A prática do open data busca assegurar a transparência dos resultados da pesquisa, sem que seja revelada a identidade dos participantes da pesquisa.
  • Financiamento: A primeira autora recebeu apoio financeiro da Universidade de Uppsala (Erasmus Mundus Euroculture Consortium) por seu vínculo como aluna, recebendo por dois semestres a bolsa Erasmus Mundus. A segunda autora esteve vinculada como pesquisadora no decorrer desta pesquisa no Centre for Gender Research da Universidade de Uppsala.

Disponibilidade de dados

A O&S incentiva o compartilhamento de dados. Entretanto, por respeito a ditames éticos, não requer a divulgação de qualquer meio de identificação dos participantes de pesquisa, preservando plenamente sua privacidade. A prática do open data busca assegurar a transparência dos resultados da pesquisa, sem que seja revelada a identidade dos participantes da pesquisa.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Ago 2023
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2023

Histórico

  • Recebido
    17 Jan 2022
  • Aceito
    26 Set 2022
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