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Demolições, debates e tentativas de preservação: aproximações a partir dos casos de Salvador e Recife (1910-1930)

Demolitions, debates and preservation attempts: approaches based on the cases of Salvador and Recife (1910-1930)

Resumo

Os chamados “eventos de demolição” constituem uma das expressões mais dramáticas e tensionadas das reformas que marcaram os processos de modernização urbana porque passaram por várias cidades brasileiras, na virada para o século XX. Mais do que os projetos de futuro e as visões de progresso per se, as forças demolidoras permitem indagar e analisar representações em disputa e leituras da cidade, da paisagem e do passado. Permitem também evidenciar e discutir interesses políticos, econômicos e culturais, além de estranhamentos, espantos, lamentos, vozes dissonantes, que expressam certo sentido de tradição e mesmo, pode-se dizer, de preservação. Assim, este artigo aborda casos de demolição em Recife e Salvador dos anos 1910, considerando, por um lado, o contexto mais amplo das reformas urbanas e, por outro, os esforços de criação dos serviços estaduais de proteção aos monumentos nos anos 1920. Para tanto, mobilizamos diversas fontes primárias (matérias de diversos periódicos, fotografias, relatórios oficiais, entre outros), para identificar e discutir falas de agentes sociais, mudanças de palavras, imagens, significados e argumentos inseridos num debate aberto e indefinido sobre a herança da paisagem e estrutura urbana do passado colonial.

Palavras-chave:
Representações; Demolições; Reformas urbanas; Preservação

Abstract

The so-called “demolition events” are one of the most dramatic and tense expressions of the reforms that marked the urban modernization processes of several Brazilian cities on the turn to the 20th century. Beyond futuristic projects or visions of progress per se, the demolishing forces allow us to question and analyze representations in dispute and readings of the city, landscape and past. They lead also to the identification of political, economic, and cultural interests, as well as estrangement, astonishment, regrets, and dissonant voices that pointed to a certain sense of tradition and, we might say, preservation. Thus, this paper aims to discuss some demolitions cases at Recife and Salvador in the 1910s, considering, both the broader context of urban reforms and efforts to create official services to protect monuments in the 1920s. Therefore, we mobilized several primary sources (articles from differents periodicals, photographs, official reports, among others) to identify and discuss speeches of social agents, changes of words, images, meanings and arguments inserted in a wide open and undefined debate about colonial heritage of urban landscape and structure.

Keywords:
Representations; Demolitions; Urban reforms; Preservation

Introdução

De passagem pelas Regiões Nordeste e Norte, em duas grandes viagens em fins da década de 1920, seguindo as sendas de pesquisa de um projeto modernista de “descobrimento do Brasil”, Mario de Andrade não se furtou aos temas prosaicos do cotidiano, ao registro quase etnográfico da vida e das expressões da cultura urbana e rural e suas expressões, às crônicas e miudezas sociais. Não se furtou também a comentar, quer nas notas do diário, quer nos textos escritos para os jornais de São Paulo ou dos Estados por onde passou, temas mais candentes e polêmicos.

Esse material, apenas parcialmente publicado no calor do momento, seria compilado e organizado, em formato de livro, pela primeira vez em 1973. Constituiu-se, assim, como uma fonte privilegiada para discussões, numa perspectiva de história cultural urbana, sobre modernização, patrimônio, arte, arquitetura, paisagem, usos e apropriações das cidades, nesse período conturbado de fins da Primeira República, como já se afirmou1 1 “O Turista Aprendiz” foi relançado recentemente (em 2015) e a edição organizada pelo IPHAN contém novos documentos, fotografias e textos analíticos. Para exemplos dos usos de “O Turista Aprendiz”, na perspectiva de uma história cultural urbana, veja-se José Lira e George Dantas (Lira & Dantas, 2001), José Lira (2005) e Trajano (2008). .

Das polêmicas sobre as quais não deixou de anotar e pensar criticamente, estava a da demolição da Sé de Salvador, cujos debates já se arrastavam havia mais de uma década, mas que ganhara força no final dos anos 1920. Instalado em Natal, Mário escreveria:

Natal é feito S. Paulo: cidade mocinha, podendo progredir à vontade sem ter coisa que dói destruir. Isso é muito importante para nós. O problema da destruição ou conservação da Sé, da Bahia, por exemplo, confesso que por mim não sei resolver [Natal, 29 de dezembro [de 1928], 17 horas] (Andrade, 1973Andrade, M. (1973). O turista aprendiz. São Paulo: Duas Cidades., p. 254)

Esse trecho curto, em meio a notas muitas vezes ensimesmadas, pode ser tomado de maneira significativa também, na medida em que havia um debate então aberto e indefinido sobre a construção de valores e sensibilidades em relação aos elementos e às diversas heranças da paisagem urbana do passado colonial. No mínimo, como reconheceria Mário, era necessário recolocar os termos da discussão.

O problema da Sé está mais é anunciado errado. É muito mais grandioso do que a derrubada ou não derrubada dum casarão pra alargamento de rua. O próprio centro urbano da cidade alta é que se tem de resolver se é prático ou não ficar onde está. Todas aquelas ladeiras, quedas de sopetão, torceduras de terrenos são absolutamente contrárias a qualquer norma utilitária de urbanismo contemporâneo. Não é possível aplainar aquilo e retificar as ruas sem arrasar tudo. Ou se destrói tudo para atualizar aquilo, ou, qualquer paliativo destruirá tradições curiosas e mesmo valiosas que nem a dita Sé, não passando de paliativo e não resolvendo nada — esse é o problema (Andrade, 1973Andrade, M. (1973). O turista aprendiz. São Paulo: Duas Cidades., p. 255, grifo nosso).

As quedas de sopetão e as torceduras de terreno — variantes, diga-se, de termos recorrentes nas representações negativas sobre a cidade colonial brasileira —, mais do que obstáculos à noção prevalente de progresso das propostas e ações urbanísticas de então, conformavam também essa paisagem. Paisagem de tradições “curiosas” e “valiosas”, para as quais as propostas de retificação implicavam apenas em destruição, não em solução.

A menção de Mário à polêmica sobre a Sé de Salvador não é deslocada, portanto. A referência ao debate posto é elucidativa para os propósitos deste artigo, que utiliza a estratégia metodológica de estudar “eventos de demolição” que foram, muitas vezes, emblemáticos do ponto de vista funcional e simbólico dentro do primeiro ciclo de modernização de início do século XX, com o intuito de compreender os processos de disputa — de imagem, de valor, de justificativas — e dos interesses sobre a cidade.

Há uma clara inspiração benjaminiana nesta visada para os escombros, neste “escovar a história a contrapelo” (Benjamin, 2013Benjamin, W. (2013). O anjo da história (Trad. e Org. João Barrento). Belo Horizonte: Autêntica.), buscando as forças pulsantes e extáticas em torno das “ruínas” (então) recentes e questionando não apenas os embates pelo futuro, mas também os apagamentos, os silêncios, os derrotados (como indivíduos, grupos sociais e mesmo ideias e mentalidades) como elementos constitutivos do(s) progresso(s) e da própria modernidade2 2 As inquietações e motivações teóricas e metodológicas de um possível aporte benjaminiano estão em desenvolvimento nas pesquisas que secundam este artigo. . Os escombros podem ser tomados assim tanto em seus aspectos simbólicos, evocativos, de lamento ou saudação, como parte crucial de um tempo específico, um instantâneo da paisagem urbana transtornada e em transformação, quanto pela sua dimensão material, inclusive em seu aspecto mais ordinário do reaproveitamento em novas construções e obras públicas ou privadas.

A história da demolição do antigo templo de Salvador, contada por Fernando da Rocha Peres3 3 As informações do estudo de Peres (2009) foram coletadas em fontes diversas, como cartas, ofícios, pareceres e na grande massa de notícias sobre o assunto, publicadas em periódicos da época (Diário de Notícias, Jornal de Notícias, Gazeta do Povo, A Tarde, entre outros). (2009), é significativa desses processos em disputa e da construção de ideias, argumentos, sensibilidades, consciências. O projeto modernizador implantado na cidade, no primeiro Governo de José Joaquim Seabra de 1912-16, previa a transformação da imagem de determinadas áreas da cidade, dentre as quais a Freguesia da Sé. De maneira geral, o controle da imagem urbana pelos governos e pelas elites no período da Primeira República (1889-1930), como já discutiu Robert Pechman (1990Pechman, R. (1990). Um olhar sobre a cidade: estudo da imagem e do imaginário do Rio na formação da modernidade. In Primeiro Seminário de História Urbana: Cidade e História (pp. 33-43). Salvador: ANPUR., p. 37), funcionou como “[...] um jogo de espelhos, como se fora um reflexo imediato do real, ela substitui a própria realidade”.

A imagem real, concreta, expressa numa nova paisagem urbana, emoldurada por uma nova arquitetura, num espaço renovado, e a imagem representação, construção de um imaginário sobre si mesma, inscrito numa nova visão de dominação que tem a cidade como locus do poder (Pechman, 1990Pechman, R. (1990). Um olhar sobre a cidade: estudo da imagem e do imaginário do Rio na formação da modernidade. In Primeiro Seminário de História Urbana: Cidade e História (pp. 33-43). Salvador: ANPUR., p. 37).

Na construção do imaginário coletivo, Alberto Sato (2005)Sato, A. (2005). Demolición y clausura. Revista ARQ, 59, 58-61. destaca as forças das ações demolidoras para a percepção de que se estava construindo uma cidade moderna. O autor coloca como momento máximo dessas ações demolidoras o processo de modernização das cidades, iniciado ainda no século XIX, quando se celebrou o triunfo de novos padrões sobre o passado insalubre e promíscuo do passado.

Las razones de esta acción demoledora son de diverso tipo y sin duda, los escombros se llevan consigo algún recuero personal o colectivo. También la demolición confirma que es moderno (en el registro del imaginario colectivo) y por ello, cuando se realiza con gran estrépito e instantáneamente, produce el goce íntimo de quien abriga la esperanza de un futuro mejor y borra amargos pasados (Sato, 2005Sato, A. (2005). Demolición y clausura. Revista ARQ, 59, 58-61., p. 58).

As demolições exprimem, invariavelmente, esse jogo de tensões das cidades modernas em construção, dão um sentido mais urgente ao tema da convulsão, do tempo acelerado, das excitações e fraturas. O viés das demolições permite também iluminar uma questão em aberto nos primeiros anos do século XX, com relação à interpretação do passado. Em meio ao discurso progressista de que o antigo era símbolo de atraso e sujeira4 4 Cf. George Dantas (2009), que analisa as representações sobre a cidade colonial como método para compreender a formação da imagem negativa que se tornou recorrente e hegemônica, na historiografia brasileira. , observam-se outras representações e sensibilidades sobre elementos da cidade colonial, apresentadas em fontes diversas, que buscavam a definição de uma tradição5 5 Rebeca Sousa (2016), ao estudar diversos casos de demolição no Rio de Janeiro, São Paulo e Recife, aborda representações em construção, por vezes em disputa, na tentativa de entender mudanças cruciais na paisagem em eventos, como o desmonte do Morro do Castelo (no Rio de Janeiro) ou a demolição dos conventos da Ajuda e do Carmo (em São Paulo). .

A questão da tradição aparece como um debate cultural indefinido e aberto. Otília Arantes e Paulo Arantes (Arantes & Arantes, 1997Arantes, O. B. F., & Arantes, P. E. (1997). Sentido da formação: três estudos sobre Antônio Cândido, Gilda de Mello e Souza e Lúcio Costa. Rio de Janeiro: Paz e Terra., p. 18) afirmam que, na década de 1920, “Balanços da época, poemas meditativos, programas de estudos ou instituições culturais bem planejadas, tudo convergia, solicitado por uma “formação”6 6 Arantes & Arantes (1997) apontam as contribuições de intelectuais, como Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda, Caio Prado Jr., Roberto Schwarz, Lucio Costa, dentre outros, no sentido de definição cultural do Brasil, uma questão que atravessa décadas e que seria crucial no debate entre 1920 e 1940. ainda mal resolvida [...]”. As rápidas transformações ocorridas nas urbes, em princípios do século XX, evidenciaram a necessidade de definir uma tradição. Segundo Eric Hobsbawm (2002Hobsbawm, E. (2002). Introdução: a invenção das tradições. In E. J. Hobsbawm & T. O. Ranger. A invenção das tradições (3a ed., pp. 9-22). São Paulo: Paz e Terra., p. 12), esse processo ocorre com frequência:

[…] quando uma transformação rápida da sociedade debilita ou destrói os padrões sociais para os quais as ‘velhas’ tradições foram feitas, produzindo novos padrões com os quais essas tradições são compatíveis [...] Em suma, inventam-se novas tradições quando ocorrem transformações suficientemente amplas e rápidas [...]

Assim, falas dissonantes ao discurso dominante somam-se, entrecruzam-se e, ainda em fins da década de 1920, manifestam-se por meio de iniciativas locais de preservação. A Bahia, em 1927, e Pernambuco, em 1928, criam as Inspetorias Estaduais de Monumentos Nacionais. No caso de Salvador, as negociações se arrastaram por anos, configurando-se em notícia frequente entre os jornais da época. Em 1928, se sustentaram “[...] sérios argumentos de preservação da igreja principal da Bahia, e não só dela, mas, também por extensão, de todo o conjunto arquitetônico colonial [...]” (Peres, 2009Peres, F. R. (2009). Memórias da Sé (3a ed.). Salvador: Editora Corrupio, Petrobras., p. 71).

Num primeiro momento, a Sé ainda resistiu, por dificuldades em se chegar a um acordo de “bom negócio” para a Arquidiocese na cessão do imóvel à Companhia Circular de Carris da Bahia, que queria racionalizar o percurso do bonde na freguesia. Ao longo da década de 1920, a crescente ameaça de demolição do antigo templo terminou levando o tema a ser debatido em escala nacional. Sobre o caso, se manifestaram as mais variadas filiações sociais, intelectuais7 7 Em 1928, por exemplo, meia centena de letrados membros do meio intelectual baiano assina um Protesto contra a demolição da Sé, que chegou inclusive as mãos do então presidente da república, Washington Luiz (UFBA, 1987). , políticas e profissionais (Peres, 2009Peres, F. R. (2009). Memórias da Sé (3a ed.). Salvador: Editora Corrupio, Petrobras.).

Mesmo com a criação da Inspetoria de Monumentos da Bahia, em 1933, o antigo templo da Sé viria abaixo. Seriam esse e outros casos de demolições, feridas abertas no campo de forças de construção da cidade, que teriam colaborado para a sensibilização da preservação de parte do passado? O que eventos de demolições locais, em princípios do século XX, podem nos revelar sobre outras representações e sensibilidades apresentadas no processo de construção do imaginário moderno? Essas perguntas funcionam, assim, muito mais como balizas para articular fontes primárias e secundárias, discutir possibilidades metodológicas, bem como avançar nas possibilidades de análises de alguns dos casos elencados pelas pesquisas que secundam este artigo.

Demolições para a construção da imagem de uma cidade moderna

As reformas urbanas que foram implantadas em Salvador e Recife, na década de 1910, tiveram, como uma das referências principais, o projeto de (re)construção da imagem do Rio de Janeiro. A capital da República se civilizava, importando o ambiente da Belle Époque parisiense de fins do século XIX, construído por meio de um processo de modernização que teve, como ponto alto, a reforma de Haussmann (efetuada entre 1853 e 1870). Conforme Françoise Choay (2006)Choay, F. (2006) A alegoria do patrimônio. São Paulo: Estação Liberdade, Ed. UNESP., a grande escala de intervenção no tecido histórico-social da cidade catalisou a institucionalização do monumento histórico8 8 Suportes físicos do passado passam a ser inventariados, “tombados”, surgem leis específicas para os monumentos reconhecidos, emergem agentes e abordagens sobre a conservação de elementos da cidade (Choay, 2006, p. 143-144). .

É certo que as diferentes escalas de desenvolvimento e de formas urbanas implicaram em desafios diversos de modernização, nesse contexto de virada para o século XX. Ainda assim, para cidades muito pequenas, como Natal, que tinha pouco mais de 16 mil habitantes por volta de 1910, vários antigos quarteirões coloniais foram demolidos por conta dos projetos de melhoramentos e aformoseamento. E o que dizer dos núcleos urbanos com considerável acervo urbano de arquitetura civil e religiosa, e com uma estrutura viária que ainda se remetia à lógica urbana do período colonial? Quais falas emergem da pressão por demolir determinadas partes do tecido dessas cidades? Especificamente, como Salvador e Recife construíram suas respectivas imagens de modernidade? O que foi preciso apagar/ocultar do passado para a construção do imaginário moderno?

O plano de melhoramentos projetado pelo engenheiro Jerônimo Teixeira de Alencar Lima passou a ser implantado em 1912, no início do primeiro governo de Seabra. Eloísa Pinheiro (2011a) Pinheiro, E. P. (2011a). Europa, França e Bahia: difusão e adaptação de modelos urbanos (Paris, Rio e Salvador) (2a ed.). Salvador: EDUFBA. http://dx.doi.org/10.7476/9788523211912.
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destaca que a construção da Salvador moderna passou por transformar áreas selecionadas da imagem da cidade colonial de Tomé de Souza. A Cidade Baixa foi modificada através de melhorias técnicas na área portuária, de realização de aterros e construção de novos quarteirões, seguindo códigos de posturas da época.

A partir da Cidade Alta, foi construída a extensa e larga Avenida Sete de Setembro, que se configurou como importante via de ligação do antigo núcleo da cidade com as áreas de expansão que cresciam margeando a costa (Figura 1). A construção da avenida pressionou modificações na Freguesia da Sé, inclusive ameaçando o antigo templo de nome homônimo, que resistiu até 1933. Também ocasionou o alargamento e modificação de parte do casario da Rua Chile (antiga Rua do Palácio), demolindo 21 edificações do lado da terra. Nas proximidades, também foi posta abaixo a igreja da Ajuda, com a compensação de se construir outro templo no mesmo terreno, mas com feições ecléticas, à moda da época.

Figura 1
- Trecho da planta de Salvador com identificação de intervenções realizadas no período de 1910 a 1930

Da Rua Chile, através do Largo do Teatro (atual Praça Castro Alves), a Avenida Sete seguia em direção à ladeira de São Bento. Essa subida é marcada pelo convento beneditino e sua monumental cúpula, marco urbano que sobreviveu à pressão do progresso, devido à reação da própria comunidade religiosa, liderada pelo Abade D. Majolo de Caigny.

O alargamento da Avenida Sete transformou as fachadas existentes. A igreja de São Pedro foi demolida e foi construída uma nova, na Praça da Piedade, inaugurada em 1917, com linguagem neogótica. A Rua do Rosário teve suas fachadas e a igreja de nome homônimo mutiladas, para a remodelação de acordo com os padrões estéticos em voga na época. A reforma também foi o destino do prédio do antigo Palácio do Governo, atual sede IGHB e do Convento das Mercês.

Em Recife, o processo de modernização também borrou a imagem do passado, realizando uma série de intervenções físicas no núcleo de fundação da cidade (Figura 2). Segundo Cátia Lubambo (1991Lubambo, C. W. (1991). Bairro do Recife entre o Corpo Santo e o Marco Zero. Recife: Fundação de Cultura da Cidade do Recife., p. 102), o plano implantado a partir de 1909, “[...] evoluiu’ da simples conveniência em se abrir a Avenida do Cais, para uma ‘justificada’ necessidade de se reconstruir uma parcela da cidade”.

Figura 2
- Trecho da planta do Recife com identificação de intervenções realizadas no período 1910 a 1930

Além da abertura da Avenida do Cais (margeando a costa), foram projetadas três vias radiais para distribuir o fluxo, partindo da Praça Santos Dumont para os três principais eixos de acesso ao bairro do Recife. Avenida Marques de Olinda conectou-se com a Ponte Sete de Setembro, a Avenida Central com a Ponte Buarque de Macedo e o alargamento da Travessa do Apolo permitiu a conexão com a via da margem oposta do bairro, denominada Cais do Apolo.

Conforme os relatórios de recenseamento Municipal e da recebedoria do Estado, foram realizadas “[...] em torno de 480 desapropriações de imóveis na reforma do bairro do Recife [...]” (Lubambo, 1991Lubambo, C. W. (1991). Bairro do Recife entre o Corpo Santo e o Marco Zero. Recife: Fundação de Cultura da Cidade do Recife., p. 123). Esse número também foi considerado no Relatório de Saneamento de 1917, realizado pelo Engenheiro Francisco Saturnino de Brito, no âmbito do Plano de Esgotamento Sanitário da cidade. O dado estatístico não contabilizou as edificações consideradas ruinosas, as quais não foram alvo de indenizações (Brito, 1917Brito, F. S. (1917). Saneamento do Recife: descrição e relatórios. Recife: Tipografia da Imprensa Oficial.; Lubambo, 1991Lubambo, C. W. (1991). Bairro do Recife entre o Corpo Santo e o Marco Zero. Recife: Fundação de Cultura da Cidade do Recife.).

A construção da Avenida Marques de Olinda implicou na demolição da Igreja do Corpo Santo, em 1913, e de seu entorno, apagando antigas feições da cidade. A ênfase na circulação rápida pelas vias do bairro ocasionou também a demolição de antigas portas de entrada da cidade. Nas extremidades da ponte Sete de setembro9 9 A ponte de ferro havia sido construída em 1865, em substituição à primeira ponte da cidade, inaugurada em 1644, com intervenção do Conde Maurício de Nassau, no período de domínio holandês. , situavam-se o Arco da Conceição (extinto em 1913) e o de Santo Antônio (em 1917). A modernização da ligação entre o bairro do Recife e o de Santo Antônio implicou na substituição da antiga ponte de ferro (inaugurada em 7 de setembro de 1865) por uma nova estrutura em concreto armado, batizada de Ponte Maurício de Nassau.

Considerações sobre as fontes de pesquisa da história cultural urbana das demolições

Entre as fontes de pesquisa utilizadas para compor a história cultural urbana das demolições, está a grande massa de notícias veiculadas em periódicos da época. Nesse sentido, é importante enfatizar que este tipo de pesquisa, a um só tempo focada em eventos específicos e em contextos históricos e geográficos diversos, buscando outros recortes e ângulos de análise, a partir de novas perguntas, tem se viabilizado tanto pela existência de uma bibliografia consolidada sobre o tema da modernização urbana na Primeira República quanto pela expansão da digitalização de acervos de bibliotecas e periódicos.

O uso dos jornais e revistas especializadas como fonte fundamental para análise cronológica das discussões, com relação aos casos estudados, foi relacionado também aos documentos oficiais produzidos nos contextos das reformas urbanas, como boletins de saneamento, levantamentos topográficos e planos urbanísticos, além de relatórios de obras e contratos, bem como da iconografia (em especial, a dos estúdios especializados, e a utilizada nos periódicos).

É importante estabelecer uma advertência: o foco na pesquisa dos eventos de demolição, principalmente de edificações mais significativas na paisagem da cidade (como igrejas, conventos e portais, por exemplo), deve procurar evidenciar representações, palavras, termos do debate (ou mesmo se houve inicialmente algum tipo de controvérsia), mapeando e discutindo leituras e interpretações para, aí sim, tentar compreender a formação de determinadas noções de valor e tradição, em meio aos escombros e imaginários da modernidade. O que deveria ser preservado? Por quê? Enfim, cabe marcar como premissa a ideia de que o processo que levaria, ao fim e ao cabo, à institucionalização da política federal de preservação do patrimônio, em 1937, foi atravessado por disputas, delimitações, sobreposições, exclusões.

Na década de 1910, enquanto ocorriam demolições de determinadas partes das cidades de Salvador e Recife, periódicos da época demonstram a existência de vozes dissonantes do positivismo puro, evidenciando o dilema do progresso, entre novo e o antigo. Em 1912, os jornais de Salvador noticiaram sem alarde a demolição da modesta Igreja da Ajuda para a construção de uma nova no mesmo terreno. Enquanto o pequeno templo era apagado da imagem da cidade, apresentou-se, em jornais e revistas da época, uma discussão em torno da ameaça de derrubada do Mosteiro de São Bento para a implantação do Projeto de Melhoramentos de Jerônimo Lima10 10 Cf. Assunção (2016), em que consta uma primeira análise das falas em torno da ameaça de demolição do Mosteiro de São Bento. .

A ameaça de perda do patrimônio beneditino foi recebida com surpresa pelo abade Dom Majolo Caigny, por meio de notícias da imprensa. O líder religioso rapidamente se articulou com o Padre José Basílio Pereira, realizando palestras para a comunidade religiosa versando sobre a importância de preservação das igrejas no processo de remodelação da cidade, pelos valores históricos e artísticos das mesmas (Caigny, 1912Caigny, M. (1912, setembro). História do projeto da demolição do Mosteiro de S. Bento da Bahia. A Paladina do Lar, edição especial, 1-32.).

Os líderes religiosos conseguiram também apoio de periódicos da época para registrar as discussões e assim dar visibilidade à sua versão. A Paladina do Lar, para a cidade de Salvador, foi a primeira “[...] revista direcionada e dirigida exclusivamente por mulheres [...]” (Mazzoni, 2010Mazzoni, V. (2010). Memória literária feminina da Bahia: inventário de revista A Paladina do Lar. Salvador: Quarteto Editora., p. 36), publicou inclusive uma edição especial em setembro de 1912 sobre a História do projeto da demolição do Mosteiro de S. Bento da Bahia (Caigny, 1912Caigny, M. (1912, setembro). História do projeto da demolição do Mosteiro de S. Bento da Bahia. A Paladina do Lar, edição especial, 1-32.). O jornal Diário da Bahia abriu espaço para Caigny e Pereira se defenderem de ataques difamatórios11 11 A fala de Caigny sobre a importância de preservar o Mosteiro de São Bento é atacada pelo jornal Gazeta do Povo, dizendo que o abade falou “inverdades” em seu discurso, que o mesmo era “estrangeiro”, “inconveniente” e “metidiço”. Além disso, o periódico levanta dúvidas sobre a administração do líder religioso, questionando a venda de algumas casas do patrimônio beneditino e também sugerindo que Caigny tinha interesses financeiros ocultos na venda do Mosteiro (Caigny, 1912). publicados por periódicos de apoio ao governo, como o Gazeta do Povo.

Sensibilidades em torno da demolição da Igreja da Ajuda apareceriam através da necessidade de homenagear o antigo templo posto abaixo. Nesse sentido, o periódico A Tarde publicou em duas partes a narrativa histórica da edificação. O texto é de autoria do engenheiro Theodoro Sampaio, formado na Escola Politécnica do Rio de Janeiro (em 1877) e que, desde 1904, atuava na área urbano-sanitária no Estado da Bahia.

Com a demolição da velha igreja da Ajuda que ora se inicia, não há como negar que o patrimônio histórico da cidade diminui, perdendo um dos seus monumentos mais antigos. Não é sem pena para os corações bem formados e grande mágoa para os que prudente se inspiram no passado, ver por terra, destruídos, esses muros, mais de uma vez renovados, no mesmo sítio [...] Tem esse valor histórico a velha igreja prestes a desaparecer (Sampaio, 1912Sampaio, T. (1912, 15 de outubro). Igreja da Ajuda – recordações da sua história antiga. A Tarde, Salvador, 1, 1., p. 1).

Os periódicos de Pernambuco registraram, aparentemente sem oposição, as notícias do arrasamento de trecho significativo do antigo núcleo da cidade. Foram anunciados no jornal A Província os leilões de materiais demolidos dos sobrados e da Igreja do Corpo Santo. O periódico registrou o Decreto de n.º 8.691, com o orçamento da abertura da Avenida Marques de Olinda, os editais de concorrência para a demolição do antigo templo e do arco da Conceição, que tiveram contrato diferenciado do restante do casario do entorno. O jornal também registrou os rituais religiosos da última missa e a transferência das imagens sacras, instaladas provisoriamente na igreja Madre de Deus.

As fotografias de fins do século XIX e início do XX também se constituíram em importante fonte de pesquisa, pois tiveram “[...] inegável valor [...] como testemunho, expressão e representação [...]” (Dantas et al., 2015Dantas, G. A. F., Sousa, R. G., & Moreira, B. G. L. (2015). Modernidades instantâneas: fotografia, cultura e transformações urbanas. In Anais do IV Seminário Ibero-americano (pp. 1-18). Belo Horizonte: Escola de Arquitetura da UFMG., p. 1). Roger Chartier (1991)Chartier, R. (1991). O mundo como representação. Estudos Avançados, 11(5), 173-191. http://dx.doi.org/10.1590/S0103-40141991000100010.
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destaca a importância para a história cultural do uso das representações, para evidenciar percepções da realidade em disputa e estratégias impostas por determinados grupos na construção da realidade, num momento imediato ou num porvir, através das possibilidades apresentadas12 12 A construção de uma abordagem das representações em torno dos casos de demolições em Salvador e Recife apresenta interesse não só para discutir os debates em torno dos projetos urbanos construídos, como também para evidenciar sensibilidades em torno da importância de preservar certos elementos do passado, num período que antecede a instituição oficial do patrimônio no Brasil. . Nesse sentido, as narrativas fotográficas ajudaram a construir a imagem e o imaginário da modernidade, ao registrarem a escala das demolições que botaram abaixo quarteirões inteiros. Segundo Sato (2005)Sato, A. (2005). Demolición y clausura. Revista ARQ, 59, 58-61., as forças demolidoras auxiliaram na construção da percepção de que uma nova cidade emergia dos escombros. Paris, pelas lentes de Charles Marville, Rio de Janeiro, de Marc Ferrez, e o Recife, de Francisco du Bocage, compõem álbuns de fotografias das capitais modernizadas, constituindo-se em fonte de pesquisa importante para o estudo da história urbana pelo viés do que foi demolido no processo de reforma (Figura 3).

Figura 3
- Igreja do Corpo Santo pouco antes de sua demolição, entre os escombros da reforma urbana

Na década de 1910, circulavam falas de intelectuais apresentando inquietações com as transformações urbanas, que modificaram o corpo físico da cidade, levando consigo antigas referências e memórias, e rompendo práticas sociais existentes. Na década de 1920, o dilema do progresso se torna mais evidente. Multiplicam-se falas sensíveis às demolições de elementos do passado. Colocam-se questionamentos sobre a imagem de civilidade. Evidenciam-se estranhamentos com a arquitetura importada. Criam-se primeiras iniciativas locais em prol da preservação de artefatos do passado, bens móveis e imóveis.

Em 1922, evidenciam-se, na arte e arquitetura, novas leituras e interpretações do passado. A busca de definição de nacional seria um ponto em comum entre a Semana de Arte Moderna, que ocorreu em fevereiro, em São Paulo, e a exposição para o Centenário da Independência, que ocorreu em setembro, no Rio de Janeiro. A área livre aberta com o desmonte do morro do Castelo foi utilizada para apresentação do Neocolonial como exemplar arquitetônico representativo da nação (Pinheiro, 2011a Pinheiro, E. P. (2011a). Europa, França e Bahia: difusão e adaptação de modelos urbanos (Paris, Rio e Salvador) (2a ed.). Salvador: EDUFBA. http://dx.doi.org/10.7476/9788523211912.
http://dx.doi.org/10.7476/9788523211912...
).

O passado aparece como uma preocupação comum nas falas de agentes sociais de origens diversas, evidenciando-se como elemento fundamental no processo de modernização. Em 3 de dezembro de 1923, o deputado pernambucano Luiz Cedro, com a colaboração de José Marianno Filho, líder do movimento neocolonial, propôs na Câmara o projeto de criação de uma Inspetoria de Monumentos Históricos dos Estados Unidos do Brasil. A proposta foi baseada na primeira lei francesa sobre o tema13 13 Segundo Choay (2006), a lei francesa baseou-se na estrutura centralizada do Estado, que, através do Ministro do Interior, supervisionava a atuação do Inspetor e da comissão de monumentos históricos. O aparato governamental tinha função de “tombar” edifícios para a distribuição de fundos públicos. Para a autora, o sistema sofria de falta de colaboração entre suas partes, morosidade de atuação e carência de recursos. , de 1887, que forneceu respaldo jurídico ao termo monumento histórico14 14 Cf. Clara Malhano (2002, p. 65): os exemplares destacados seriam “[...] edifícios ou imóveis como castelos, palácios, catedrais, igrejas, cuja conservação represente interesse público do ponto de vista da história ou da arte [...]” e os bens móveis, “[...] tapeçarias, estátuas, quadros, móveis e obras de joalheria”. , associando-o a exemplares de escala monumental do sítio urbano e bens móveis.

Ao longo da década de 1920, os exemplares do passado tornam-se assunto de interesse entre diversos periódicos da época, como a revista laica de caráter cultural, intitulada Ilustração Brasileira, que publicou o discurso do deputado pernambucano e também divulgou na íntegra a circular do arcebispo do Rio de Janeiro, chamando o clero a se responsabilizar por suas igrejas e objetos de arte (Pinheiro, 2011bPinheiro, M. L. B. (2011b). Neocolonial, modernismo e preservação do patrimônio no debate cultural dos anos 1920 no Brasil. São Paulo: FAPESP., p. 255).

O legado do período colonial passa a ser reinterpretado, revisitado, como registram as viagens de estudo e interpretação às cidades mineiras e da Região Nordeste. Nesse sentido, Lucio Costa deixa registrado, no jornal A Noite (RJ, em 19 mar. 1924), seu estranhamento com a construção da Avenida Central do Rio de Janeiro. Para Costa, o ambiente importado da Belle Époque parisiense não era representativo da imagem do Brasil e ressaltou a importância de se reinterpretar o passado colonial, a fim de encontrar o “fio da meada”.

Não vou ao extremo de achar que já devíamos ter uma arquitetura nacional [...]. Deveríamos, porém, ter tomado, e isso há muito tempo uma diretriz, e iniciado a jornada aceitando como ponto de partida o passado que, seja ele qual for, bom ou mau existe, existirá sempre, e nunca poderá ser apagado. Para que tenhamos uma arquitetura logicamente nossa, é mister procurar descobrir o fio da meada, isto é, recorrer ao passado, ao Brasil colônia. Todo esforço nesse sentido deve ser recebido com aplausos (Costa, 1924Costa, L. (1924, 19 de março). A alma dos nossos lares. A Noite. Rio de Janeiro (No. 10, pp. 1)., p. 1).

No Recife, os debates em torno da valorização da tradição ganharam ênfase com o movimento regionalista15 15 Cf. Durval Albuquerque (2011) – A invenção do Nordeste e outras artes [síntese de tese de doutorado defendida em 1994/ UNICAMP]; José Lira (1996) – Mocambo e Cidade: regionalismo na arquitetura e ordenação do espaço habitado; Raimundo Arrais (2006) ‒ A Capital da saudade: destruição e reconstrução do Recife em Freyre, Bandeira, Cardozo e Austragésilo. . Gilberto Freyre (1925)Freyre, G. (1925, 11 de janeiro). Artigo 91. Diário de Pernambuco, Recife, 9, 3., em seu texto publicado no Diário de Pernambuco, aciona o caso de demolição da Igreja do Corpo Santo, para mobilizar sensibilidades em torno da necessidade de salvaguardar outros bens nacionais:

Hoje não há cerimônia nem rodeio em alterar por dentro e por fora e mesmo destruir — como no caso da igreja do Corpo Santo, cujo inútil sacrifício à engenharia provocou no seu inteligente traçado o Sr. Saturnino de Britto — uma velha igreja ou um velho monumento ou uma característica nacional qualquer. É exatamente essa sem cerimônia que não deve continuar impune no seu furor. Daí a necessidade de leis municipais — como ainda ontem nos lembrava, a mim e ao sr. Luiz Cedro, [...] visando a defesa de monumentos que sejam características nacionais (Freyre, 1925Freyre, G. (1925, 11 de janeiro). Artigo 91. Diário de Pernambuco, Recife, 9, 3., p. 3).

As demolições realizadas no Recife, na década de 1910, as quais, à primeira vista, não causaram reações, na década de 1920, passam a ser utilizadas para mobilizar discursos em defesa da preservação do passado. Nesse período, o jornalista Anníbal Fernandes ganhou fama de defensor dos monumentos por suas críticas, nos jornais da época, contra as demolições e reformas de fachadas para adequação aos novos padrões estéticos burgueses.

O crescente interesse pelos exemplares do passado acabaria formando, na Bahia e em Pernambuco, um contexto propício à criação das Inspetorias Estaduais de Monumentos Nacionais16 16 Ainda sob influência do projeto apresentado por Luiz Cedro em 1923, quando se tentou instituir uma Inspetoria em nível nacional. Os documentos das Inspetorias Estaduais foram pouco utilizados. Sobre a atuação das Inspetorias, destacam-se, na Bahia, a dissertação de Vanessa Dócio (2014) e os trabalhos de Suely Ceravolo (e.g. 2012), e em Pernambuco, o trabalho de Rodrigo Cantarelli (2010, 2012). , respectivamente, em 1927 e 1928. As Inspetorias tiveram sua atuação associadas aos Museus Estaduais e constituíram-se em tentativas pioneiras de preservação local de bens imóveis e objeto de arte.

Intelectuais ligados aos Institutos Históricos contribuíram para a criação das Inspetorias de Monumentos da Bahia e de Pernambuco. Suely Ceravolo (2012)Ceravolo, S. (2012). A Inspetoria Estadual de Monumentos Nacionais do estado da Bahia: do discurso à ação (1927-1938). In A. Magalhães & R. Bezerra (Orgs.), 90 anos do Museu Histórico Nacional em debate (pp. 122-142). Rio de Janeiro: Museu Histórico Nacional. cita que o historiador Mário Melo (membro do Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico Pernambucano ‒ IGHGP) compartilhou a ideia de criação das Inspetorias estaduais com Francisco Borges de Barros (associado do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia ‒ IAHGP).

Os Institutos Históricos de Pernambuco e da Bahia, formados no século anterior (criados, respectivamente, em 1862 e 1894), teriam assim colaborado para a construção das primeiras leituras institucionalizadas do que se constituiriam os monumentos nacionais desses Estados. Lilia Schwarcz (1993Schwarcz, L. (1993). O espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil 1870-1930. São Paulo: Companhia das Letras., p. 99), ao estudar a trajetória dos Institutos, destaca seu objetivo de

[...] construir uma história da nação, recriar um passado, solidificar mitos de fundação, ordenar fatos buscando homogeneidades em personagens e eventos até então dispersos.

Uma das primeiras ações das Inspetorias da Bahia e de Pernambuco foi selecionar os monumentos que carregariam assim a função de dar suporte à construção da história oficial, contada por um seleto grupo de intelectuais. No inventário da Bahia, o Inspetor Francisco Borges de Barros incluiu exemplares da arquitetura militar, religiosa e civil do período colonial (Barros, 1931Barros, F. B. (1931). Extrato do Relatório de 1930. In Anais do Arquivo Público e Inspetoria de Monumentos (Vol. 18-A). Bahia: Imprensa Oficial do Estado.), a exemplo do forte de São Marcelo, do Convento de São Bento, da Igreja da Sé e o edifício do Diário da Bahia17 17 Esse e outros bens da listagem foram publicados no Extrato do relatório de 1933 dos Anais do Arquivo Público e Inspetoria dos Monumentos (Barros, 1931). . Na listagem de Pernambuco, o Inspetor Anníbal Fernandes reconheceu como monumentos, majoritariamente, as fortalezas militares e a arquitetura religiosa barroca. Entre estes, o Forte do Buraco, a Igreja Madre de Deus, a Igreja Bom Jesus dos Martírios (no bairro de São José) e a Igreja de São Pedro dos Clérigos (em Santo Antônio)18 18 O documento com a listagem dos bens inventariados de Pernambuco não foi encontrado. Nesse caso, adotou-se a relação feita por Rodrigo Cantarelli (2010, p. 79), através dos documentos analisados da Inspetoria Estadual dos Monumentos Nacionais. .

É de se notar a ausência de exemplares da arquitetura civil urbana e rural nas primeiras listas. Contudo, como já apontou Cantarelli (2010Cantarelli, R. (2010). Fatos e ideias que levaram à criação da Inspetoria Estadual dos Monumentos Nacionais em Pernambuco no ano de 1928. Ciência & Trópico, 34(1), 117-134., p. 80), “[...] as causas mais prováveis para a ausência da arquitetura civil nessa listagem tenham sido os acontecimentos envolvendo a demolição do Engenho Megahype”. O imóvel havia sido pré-selecionado para compor o inventário e o proprietário preferiu destruí-lo para evitar as limitações que o bem iria sofrer, sob proteção da Inspetoria. O regulamento do órgão previa penalidades em casos de destruição, degradação ou alteração nos monumentos que estivessem sob sua proteção (Inspetoria de Monumentos, 1929Inspetoria de Monumentos. (1929). Regulamento da Inspetoria Estadual dos Monumentos Nacionais. Ato n° 240 do Exmo Sr. Dr. Governador do Estado de 8 de fevereiro de 1929. Recife: Imprensa Oficial.).

O jornal A Província tornou-se o principal divulgador da atuação da Inspetoria de Monumentos de Pernambuco, durante a direção de Gilberto Freyre, o que demonstra a aproximação das falas sobre a preservação dos bens inventariados com o discurso do movimento regionalista. Schwarcz (1993Schwarcz, L. (1993). O espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil 1870-1930. São Paulo: Companhia das Letras., p. 117) afirma que a elite rural tradicional de Pernambuco “[...] desejava através de seus romantismos culturais preservar o passado como um escudo contra o futuro incerto”.

O relatório da Inspetoria de Pernambuco, publicado em 1930 (referente ao ano de 1929), de autoria de Anníbal Fernandes, destaca o interesse que a defesa de monumentos nacionais vinha recebendo no final da década de 1920. Ele compara a mudança de “mentalidade” com relação à década anterior, período em que foi empreendida a reforma de grande porte no antigo bairro do Recife, demolindo quarteirões inteiros e símbolos do passado.

A preocupação do Governo na defesa do nosso patrimônio artístico e histórico tem dado resultados compensadores [...]. Hoje, felizmente, essa mentalidade se acha inteiramente modificada [...]. Anos atrás, tudo isso não lograria se quer a mais ligeira referência do noticiário da imprensa. E a prova está na derrubada dos Arcos, do Corpo Santo, da velha Sé de Olinda; da venda, como ferro velho, dos canhões de bronze de nossas fortalezas, da retirada de velhos móveis e lustres do Teatro Santa Izabel [...], da exportação por atacado de moveis, prata, louças, etc. (Fernandes, 1930Fernandes, A. G. (1930). Relatório da Inspetoria Estadual dos Monumentos Nacionais: apresentado a 19 de fevereiro de 1930 ao Sr. Secretario da Justiça e Negócios Interiores. Recife: Imprensa Oficial., p. 4).

Em 1929, a ameaça de demolição da Torre Malakoff (antiga edificação do Arsenal da Marinha), para permitir o alinhamento da Rua São Jorge, não passou despercebida. Nos debates em torno do caso, destacaram-se as vozes da Inspetoria de Monumentos19 19 No relatório da Inspetoria de Monumentos de Pernambuco de 1929 ficou documentado o posicionamento da instituição em favor da preservação do imóvel, apesar do mesmo não se encontrar entre os bens pré-selecionados no inventário (Fernandes, 1930). e do Instituto Arqueológico; também houve um forte apoio de periódicos da época, na divulgação dos argumentos em disputa20 20 Cf. Rodrigo Cantarelli (2012) e Rebeca Sousa (2016). . Os estudos de Rebeca Sousa (2016Sousa, R. G. (2016). Escombros e vestígios: os debates sobre os arrasamentos nas reformas urbanas das cidades brasileiras (Rio de Janeiro, São Paulo e Recife no início do século XX) (Dissertação de mestrado). Programa de Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal., p. 162 et seq.) revelam indícios de mudança de sensibilidade apresentados nas falas sobre a Torre, que foi acionada enquanto repositório de memórias de uma antiga urbe que havia perdido sua fisionomia pitoresca com as demolições anteriores.

Esse edifício que a cidade inteira conhece como a torre de Malakoff pode-se dizer que é o último remanescente do velho Recife. Do Recife da metade do século passado, tão cheio de colorido e de pitoresco, com os seus arcos, os seus sobrados meio mouriscos e as suas ruas estreitas que lhe davam um certo ar napolitano. A torre de Malakoff ficou de tal modo ligada à fisionomia da cidade que podemos considerá-la ainda hoje quase o seu monumento característico (Fernandes, 1930Fernandes, A. G. (1930). Relatório da Inspetoria Estadual dos Monumentos Nacionais: apresentado a 19 de fevereiro de 1930 ao Sr. Secretario da Justiça e Negócios Interiores. Recife: Imprensa Oficial., p. 66).

A salvaguarda de relíquias do passado (como a Torre Malakoff) teria a importância fundamental na definição da tradição. Os debates em torno das demolições do corpo físico da cidade, em princípios do século XX, nos ajudam, portanto, a evidenciar leituras locais sobre o legado do passado. Permitem-nos assim entender as sensibilidades e representações em torno de bens antigos como parte de um processo maior em curso no país, de superação da recorrente e hegemônica leitura negativa da cidade colonial.

Considerações finais

A abordagem das reformas urbanas a partir da história cultural, adotando-se fontes de pesquisa de origens diversas e invertendo-se o foco de investigação para o que foi posto abaixo nas cidades, tem apresentado material relevante para discussão. As falas sobre a arquitetura do passado — ameaçadas pela construção dos projetos modernos — revelam disputas, jogos de interesse, visões contrastantes sobre o que deveria ser o porvir.

As demolições da paisagem pitoresca foram utilizadas como estratégia para permitir a percepção, no imaginário urbano, de que se construía uma cidade moderna, borrando a imagem de seu passado de atraso e sujeira. No entanto, nos periódicos da época, a fala de técnicos, intelectuais, de instituições políticas e culturais deixa evidente o dilema do progresso, entre o novo e o antigo.

Nos documentos mapeados, destacou-se o crescente interesse pela interpretação do passado e pelo acervo arquitetônico legado do período colonial. Na década de 1920, evidencia-se o uso das demolições como recursos retóricos, a fim de acionar lembranças, mobilizar sentimentos e fortalecer a necessidade de ações em defesa de exemplares da arquitetura tradicional brasileira.

Em alguns Estados com núcleos urbanos de expressivo legado do período colonial, como Bahia e Pernambuco, sob influência dos Institutos Históricos, formam-se iniciativas pioneiras estaduais de defesa dos seus Monumentos Nacionais. Essas leituras locais, por sua vez, foram levadas em conta na formação da política federal de preservação do patrimônio no Brasil. O inventário nacional tomou como referência os bens listados pelas Inspetorias Estaduais e, entre os bens imóveis reconhecidos, destacaram-se, principalmente, edificações religiosas barrocas, fortalezas e algumas edificações civis de destaque no sítio urbano, ou aquelas que foram residência de personagens da História da nação.

Nesse contexto, observa-se que a definição de uma tradição aparece como uma questão em aberto, não ficou restrita a um determinado grupo, mas assumiu interesse em origens diversas, na imprensa, entre líderes religiosos, intelectuais, políticos e instituições culturais. Questão que se moveu sobre escombros (ou quase escombros, como no caso da Torre Malakoff, preservada, ao final), ora como estorvo, ora como lamento, ora como elemento de composição pitoresca, que evocava, de certo modo, o gosto clássico pelas ruínas; ora também como elemento central nos debates sobre as cidades em transformação, nas primeiras décadas do século XX.

Agradecimentos

À CAPES, pelas bolsas de doutorado e de estágio pós-doutoral no exterior (processo BEX 5757/15-0). À PROPESQ/UFRN e ao Grupo de Pesquisa História da Cidade, do Urbanismo e do Território (HCUrb, Depto. de Arquitetura, UFRN). Pelo acesso aos arquivos consultados, em Salvador, os acervos do Mosteiro São Bento, da Biblioteca Pública Estadual e do Arquivo público do Estado da Bahia. Em Recife, pelo acesso aos acervos da Fundação Joaquim Nabuco (FUNDAJ) e do Arquivo Público do Estado de Pernambuco.

  • 1
    “O Turista Aprendiz” foi relançado recentemente (em 2015) e a edição organizada pelo IPHAN contém novos documentos, fotografias e textos analíticos. Para exemplos dos usos de “O Turista Aprendiz”, na perspectiva de uma história cultural urbana, veja-se José Lira e George Dantas (Lira & Dantas, 2001Lira, J. T. C., & Dantas, G. A. F. (2001). Contrastes e encontros: história, cultura e cidade no Nordeste (Natal e Recife, 1928-1929). In Anais do IX Encontro Nacional da Anpur (Vol. 2, pp. 636-650). Rio de Janeiro: ANPUR.), José Lira (2005)Lira, J. T. C. (2005). Naufrágio e galanteio: viagem, cultura e cidades em Mário de Andrade e Gilberto Freyre. Revista Brasileira de Ciências Sociais, 20(57), 143-209. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-69092005000100009.
    http://dx.doi.org/10.1590/S0102-69092005...
    e Trajano (2008)Trajano, F. S., Fo. (2008). Cartografias difusas, geografias superpostas: cidade e cultura na viagem de Mário de Andrade à Parayba. In Anais do IV Simpósio Nacional de História Cultural (18 p.). Goiânia: ANPUH..
  • 2
    As inquietações e motivações teóricas e metodológicas de um possível aporte benjaminiano estão em desenvolvimento nas pesquisas que secundam este artigo.
  • 3
    As informações do estudo de Peres (2009)Peres, F. R. (2009). Memórias da Sé (3a ed.). Salvador: Editora Corrupio, Petrobras. foram coletadas em fontes diversas, como cartas, ofícios, pareceres e na grande massa de notícias sobre o assunto, publicadas em periódicos da época (Diário de Notícias, Jornal de Notícias, Gazeta do Povo, A Tarde, entre outros).
  • 4
    Cf. George Dantas (2009)Dantas, G. A. F. (2009). A formação das representações sobre a cidade colonial no Brasil (Tese de doutorado). Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo, São Carlos., que analisa as representações sobre a cidade colonial como método para compreender a formação da imagem negativa que se tornou recorrente e hegemônica, na historiografia brasileira.
  • 5
    Rebeca Sousa (2016)Sousa, R. G. (2016). Escombros e vestígios: os debates sobre os arrasamentos nas reformas urbanas das cidades brasileiras (Rio de Janeiro, São Paulo e Recife no início do século XX) (Dissertação de mestrado). Programa de Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal., ao estudar diversos casos de demolição no Rio de Janeiro, São Paulo e Recife, aborda representações em construção, por vezes em disputa, na tentativa de entender mudanças cruciais na paisagem em eventos, como o desmonte do Morro do Castelo (no Rio de Janeiro) ou a demolição dos conventos da Ajuda e do Carmo (em São Paulo).
  • 6
    Arantes & Arantes (1997)Arantes, O. B. F., & Arantes, P. E. (1997). Sentido da formação: três estudos sobre Antônio Cândido, Gilda de Mello e Souza e Lúcio Costa. Rio de Janeiro: Paz e Terra. apontam as contribuições de intelectuais, como Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda, Caio Prado Jr., Roberto Schwarz, Lucio Costa, dentre outros, no sentido de definição cultural do Brasil, uma questão que atravessa décadas e que seria crucial no debate entre 1920 e 1940.
  • 7
    Em 1928, por exemplo, meia centena de letrados membros do meio intelectual baiano assina um Protesto contra a demolição da Sé, que chegou inclusive as mãos do então presidente da república, Washington Luiz (UFBA, 1987Universidade Federal da Bahia – UFBA. (1987). Protesto contra a demolição da Sé, 1928. Salvador: Centro de Estudos Baianos, Universidade Federal da Bahia.).
  • 8
    Suportes físicos do passado passam a ser inventariados, “tombados”, surgem leis específicas para os monumentos reconhecidos, emergem agentes e abordagens sobre a conservação de elementos da cidade (Choay, 2006Choay, F. (2006) A alegoria do patrimônio. São Paulo: Estação Liberdade, Ed. UNESP., p. 143-144).
  • 9
    A ponte de ferro havia sido construída em 1865, em substituição à primeira ponte da cidade, inaugurada em 1644, com intervenção do Conde Maurício de Nassau, no período de domínio holandês.
  • 10
    Cf. Assunção (2016)Assunção, G. L. (2016). Demolições, debates e tentativas de preservação: uma discussão sobre a modernização de Salvador em 1900-1930. In Anais do V Simpósio de pesquisa do PPGAU-UFRN (pp. 1-6). Natal: Universidade Federal do Rio Grande do Norte., em que consta uma primeira análise das falas em torno da ameaça de demolição do Mosteiro de São Bento.
  • 11
    A fala de Caigny sobre a importância de preservar o Mosteiro de São Bento é atacada pelo jornal Gazeta do Povo, dizendo que o abade falou “inverdades” em seu discurso, que o mesmo era “estrangeiro”, “inconveniente” e “metidiço”. Além disso, o periódico levanta dúvidas sobre a administração do líder religioso, questionando a venda de algumas casas do patrimônio beneditino e também sugerindo que Caigny tinha interesses financeiros ocultos na venda do Mosteiro (Caigny, 1912Caigny, M. (1912, setembro). História do projeto da demolição do Mosteiro de S. Bento da Bahia. A Paladina do Lar, edição especial, 1-32.).
  • 12
    A construção de uma abordagem das representações em torno dos casos de demolições em Salvador e Recife apresenta interesse não só para discutir os debates em torno dos projetos urbanos construídos, como também para evidenciar sensibilidades em torno da importância de preservar certos elementos do passado, num período que antecede a instituição oficial do patrimônio no Brasil.
  • 13
    Segundo Choay (2006)Choay, F. (2006) A alegoria do patrimônio. São Paulo: Estação Liberdade, Ed. UNESP., a lei francesa baseou-se na estrutura centralizada do Estado, que, através do Ministro do Interior, supervisionava a atuação do Inspetor e da comissão de monumentos históricos. O aparato governamental tinha função de “tombar” edifícios para a distribuição de fundos públicos. Para a autora, o sistema sofria de falta de colaboração entre suas partes, morosidade de atuação e carência de recursos.
  • 14
    Cf. Clara Malhano (2002Malhano, C. E. (2002). Da materialização à legitimação do passado: a monumentalidade como metáfora do Estado 1920-1945. Rio de Janeiro: Lucerna, FAPERJ., p. 65): os exemplares destacados seriam “[...] edifícios ou imóveis como castelos, palácios, catedrais, igrejas, cuja conservação represente interesse público do ponto de vista da história ou da arte [...]” e os bens móveis, “[...] tapeçarias, estátuas, quadros, móveis e obras de joalheria”.
  • 15
    Cf. Durval Albuquerque (2011)Albuquerque, D. M., Jr (2011). A invenção do Nordeste e outras artes (5a ed.). São Paulo: Cortez.A invenção do Nordeste e outras artes [síntese de tese de doutorado defendida em 1994/ UNICAMP]; José Lira (1996)Lira, J. T. C. (1996). Mocambo e cidade: regionalismo na arquitetura e ordenação do espaço habitado (Tese de doutorado). Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo, São Paulo.Mocambo e Cidade: regionalismo na arquitetura e ordenação do espaço habitado; Raimundo Arrais (2006)Arrais, R. (2006). A capital da saudade: destruição e reconstrução do Recife em Freyre, Bandeira, Cardozo e Austragésilo. Recife: Bagaço.A Capital da saudade: destruição e reconstrução do Recife em Freyre, Bandeira, Cardozo e Austragésilo.
  • 16
    Ainda sob influência do projeto apresentado por Luiz Cedro em 1923, quando se tentou instituir uma Inspetoria em nível nacional. Os documentos das Inspetorias Estaduais foram pouco utilizados. Sobre a atuação das Inspetorias, destacam-se, na Bahia, a dissertação de Vanessa Dócio (2014)Dócio, V. (2014). Sob o signo da pedra e cal: trajetória da política de preservação do patrimônio histórico e arquitetônico no Estado da Bahia (1927-67) (Dissertação de mestrado). Programa de Pós-graduação em História Social, Universidade Federal da Bahia, Salvador. e os trabalhos de Suely Ceravolo (e.g. 2012), e em Pernambuco, o trabalho de Rodrigo Cantarelli (2010Cantarelli, R. (2010). Fatos e ideias que levaram à criação da Inspetoria Estadual dos Monumentos Nacionais em Pernambuco no ano de 1928. Ciência & Trópico, 34(1), 117-134., 2012Cantarelli, R. (2012). Contra a conspiração da ignorância com a maldade: A Inspetoria Estadual dos Monumentos Nacionais e o Museu Histórico e de Arte Antiga do Estado de Pernambuco (Dissertação de mestrado). Programa de Pós-graduação em Museologia e Patrimônio, Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.).
  • 17
    Esse e outros bens da listagem foram publicados no Extrato do relatório de 1933 dos Anais do Arquivo Público e Inspetoria dos Monumentos (Barros, 1931Barros, F. B. (1931). Extrato do Relatório de 1930. In Anais do Arquivo Público e Inspetoria de Monumentos (Vol. 18-A). Bahia: Imprensa Oficial do Estado.).
  • 18
    O documento com a listagem dos bens inventariados de Pernambuco não foi encontrado. Nesse caso, adotou-se a relação feita por Rodrigo Cantarelli (2010Cantarelli, R. (2010). Fatos e ideias que levaram à criação da Inspetoria Estadual dos Monumentos Nacionais em Pernambuco no ano de 1928. Ciência & Trópico, 34(1), 117-134., p. 79), através dos documentos analisados da Inspetoria Estadual dos Monumentos Nacionais.
  • 19
    No relatório da Inspetoria de Monumentos de Pernambuco de 1929 ficou documentado o posicionamento da instituição em favor da preservação do imóvel, apesar do mesmo não se encontrar entre os bens pré-selecionados no inventário (Fernandes, 1930Fernandes, A. G. (1930). Relatório da Inspetoria Estadual dos Monumentos Nacionais: apresentado a 19 de fevereiro de 1930 ao Sr. Secretario da Justiça e Negócios Interiores. Recife: Imprensa Oficial.).
  • 20
    Cf. Rodrigo Cantarelli (2012)Cantarelli, R. (2012). Contra a conspiração da ignorância com a maldade: A Inspetoria Estadual dos Monumentos Nacionais e o Museu Histórico e de Arte Antiga do Estado de Pernambuco (Dissertação de mestrado). Programa de Pós-graduação em Museologia e Patrimônio, Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro. e Rebeca Sousa (2016)Sousa, R. G. (2016). Escombros e vestígios: os debates sobre os arrasamentos nas reformas urbanas das cidades brasileiras (Rio de Janeiro, São Paulo e Recife no início do século XX) (Dissertação de mestrado). Programa de Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal..

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Fev 2018
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2018

Histórico

  • Recebido
    03 Jun 2017
  • Aceito
    26 Jul 2017
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