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A vida no centro: a experiência metodológica do Brongo do Pau Miúdo

Life at the center: the methodological experience of Brongo do Pau Miúdo

Resumo

O artigo apresenta uma análise crítica e propositiva sobre ações de transformação urbana, a partir de registros do trabalho no Brongo do Pau Miúdo, em Salvador, realizado nos anos 1980 por equipe coordenada pelo arquiteto Sylvio Sawaya. Em 2018, nós realizamos uma visita a campo, após retomarmos os métodos de leitura e representação desenvolvidos pela equipe do arquiteto, direcionados a apreender e sintetizar os pactos de convivência e usos do território de modo a incorporá-los no ato de projetar. Para tanto, utilizamos como método a revisão do material produzido pela equipe, além de explorar experiências sobre cartografia social e a leitura antropológica como ferramental complementar para a intervenção urbana. Está organizado em três partes: i) contextualização do processo nos anos 1980; ii) análise sobre processos coletivos no planejamento e no projeto de intervenção urbana em territórios populares; e, iii) reflexão sobre o habitar como forma de resistência política. Assinalamos, por fim, que os princípios e métodos de intervenção urbana mais próximos da prática cotidiana dos moradores parecem apontar para alternativas ao modelo de desenvolvimento excludente, que neutraliza e oculta singularidades e conflitos inerentes aos territórios.

Palavras-chave:
Intervenção Urbana; Processos Participativos; Construção Coletiva da Cidade; Projeto Urbano; Cartografia Social

Abstract

The paper presents a critical and propositional analysis of actions to transform the urban landscape, based on records of work in Brongo do Pau Miúdo, in Salvador, carried out in the 1980s by a team coordinated by the architect Sylvio Sawaya. In 2018, we carried out a field visit, after resuming reading and representation methods developed by the architect's team, aimed at apprehending and synthesizing the coexistence pacts and use of the territory in order to incorporate them into the act of designing. We used as a method the review of the material produced by the team, in addition to exploring social cartography and anthropological reading as a complementary tool for urban intervention. We have organized it into three parts: i) a contextualization of the process in the 1980s; ii) an analysis of collective processes in planning and designing urban intervention in popular territories; and, iii) a reflection on dwelling as a form of political resistance. Finally, we point out that the principles and methods of urban intervention closer to the daily practice of the residents seem to point to alternatives to the exclusionary development model, which neutralizes and hides singularities and conflicts inherent to the territories.

Keywords:
Urban intervention; Participatory Processes; Collective Construction of the City; Urban Project; Social Cartography

Introdução

Desde os anos 1970, a cidade de Salvador via seus morros de bordas abruptas serem ocupados com grande rapidez. A lógica seguia, de certa maneira, o procedimento tradicional de caminhos no dorso seco dos morros a partir do qual a ocupação se dava em ladeiras que eram consolidadas e mantidas pelos moradores. Sem a presença do poder público, que chegava depois com a implantação de equipamentos e algumas redes de infraestrutura, Salvador foi se desenvolvendo com um crescimento sem Estado e sem Mercado, tal qual o processo descrito por Maricato ao tratar das cidades brasileiras: “aparentemente constata-se que é admitido o direito à ocupação, mas não o direito à cidade” (MARICATO, 2003Maricato, E. (2003). Metrópole, legislação e desigualdade. Estudos Avançados, 17(48), 151-166. http://dx.doi.org/10.1590/S0103-40142003000200013.
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, p. 154).

Foi, no entanto, nos anos anteriores, sobretudo nas décadas de 1940 e 1950, que as ações transformadoras da cidade de Salvador passaram a contar com técnicos cuja formação congregava procedimentos herdados da cultura europeia. O Plano de Avenidas de Salvador, resultado das reflexões encabeçadas por Mário Leal Ferreira desde a década de 1940, foi um plano de caráter modernista, assim como muitas ações que se sucederam na capital baiana, sobretudo no século XX. Por que terá sido vencedora essa decisão política? Como interpretar essas propostas no âmbito do que pretendemos como a construção de uma Civilização Brasileira?

Os projetos das avenidas de Salvador resultaram na inversão da lógica de ocupação até então vigente. Na forma de ocupação original do sítio, as vias principais coincidiam com as linhas de cumeadas, algo que se refletia na estrutura da territorialização das comunidades soteropolitanas, em geral organizadas a partir de ladeiras, travessas daqueles caminhos antigos nos topos de colinas e morros. Com a aplicação do Plano, o avesso da cidade ficou à mostra. Essa forma de ocupação das encostas íngremes e das cumeeiras elevadas não é inédita no Brasil, estabelecendo-se como único padrão e alternativa historicamente encontrada pelos mais pobres para resolver seus problemas de moradia, já que desassistidos pelo Estado (MARICATO, 1996Maricato, E. (1996). Metrópole na periferia do capitalismo: ilegalidade, desigualdade e violência. São Paulo: ed. Hucitec.).

No levantamento do Brongo do Pau Miúdo, sobre o qual o artigo se debruça, empreendido na década de 1980, resquícios dessa forma de ocupação original eram visíveis. Nele, as cumeadas aparecem habitadas por aqueles de renda maior, enquanto as ladeiras e os fundos dos vales eram ocupados como espaço compartilhado por famílias de baixa renda. Convém esclarecer que entre as Unidades Espaciais resultantes da divisão para o planejamento de Salvador dos anos 1980 está o território da Liberdade, com grande concentração de bairros com população de baixa renda. Dentre estes, há o atualmente chamado Pau Miúdo, cuja parte setentrional corresponde a uma grota, que, por sua precariedade quanto à infraestrutura, era chamada Brongo do Pau Miúdo. Esta denominação hoje foi abandonada, possivelmente pela conotação pejorativa que se atribuiu desde então ao termo Brongo – grota profunda ou área urbana pouco desenvolvida (Figura 1).

Figura 1
Compreensão da ocupação do Brongo do Pau Miúdo e da sua condição geomorfológica. Fonte: acervo do arquiteto Sylvio Sawaya.

Diferente dos mapas temáticos, a equipe coordenada por Sylvio Sawaya, responsável pelo levantamento dos anos 1980, elaborou uma série de cartografias que compreende a temporalidade do Brongo, suas sobreposições, apagamentos e o que se mantém. O mapa de evolução urbana da área (Figura 2), diferente do método tradicional, registra lote a lote as adições e as subtrações em cada construção no período de 30 anos, de 1946 a 1976, num estudo minucioso possível apenas através do estabelecimento de relações de confiança mútua e de escuta ativa entre equipe e moradores. O mapa de uso do solo (Figura 3), mapeia todos os pontos de alimentação local – como quitanda, padaria, o mercadinho, os bares e bilhares; além das áreas institucionais, como a escola de corte e costura, a roça de candomblé, a escola de datilografia, o centro protestante, áreas de cultivo (que denominam como pontos de permacultura), entre outros. O fato de mapear as centralidades, reconhecê-las e, sobretudo, nomeá-las garante a compreensão do território na chave dialética centralização-fragmentação, sem que o capital seja alçado à condição de variável independente, explicação última e total do fenômeno, e sem que se negligencie a totalidade. A centralidade, como explica Lefebvre (2008), é o pressuposto fundamental da urbanidade, em que pode haver a confluência, em pontos específicos, da diversidade de sujeitos e objetos

Figura 2
O mapa mostra a evolução urbana do bairro do Pau Miúdo, com indicação de construções desde pelo menos a década de 1940. Fonte: acervo do arquiteto Sylvio Sawaya.
Figura 3
Pau Miúdo e adjacências – localização de comércio, serviços e instituições, sinal de vitalidade urbana do bairro. Fonte: acervo do arquiteto Sylvio Sawaya.

Essas ladeiras ali encontradas, frequentemente pronunciadas, representavam os espaços comunitários. O levantamento dessa ocupação acabou por resultar na verificação da intensa participação popular no desenho e na apropriação dos espaços coletivos intersticiais, consolidados ao longo do tempo. Na figura 4, por exemplo, verifica-se o levantamento minucioso dos caminhos organizados pelos moradores, assim como a condição em que se encontravam. Essa abordagem compreende não só as organizações do território a partir dos próprios moradores quanto das condicionantes naturais do sítio, reconhecendo o percurso das águas, os espaços mais íngremes e os pontos de paradas. Muito antes, algo similar havia sido usado por Saturnino de Brito quando do traçado viário na cidade de Santos, no qual consolidou alguns dos caminhos sinuosos utilizados por muares para vencer o alagadiço entre o Largo da Matriz, no centro antigo, e a praia (MAZIVIERO, 2008Maziviero (2008). Memória e Identidade Urbana em Santos: usos e preservação de tipologias arquitetônicas da Avenida Conselheiro Nébias. (Dissertação de mestrado). FAU USP, São Paulo.). Em oposição à rigidez modernista, defendida por Le Corbusier, que insistia na diferença entre as mulas e os homens como metáfora para a ruptura completa com o passado em curso, esse método busca reconhecer os fluxos existentes para usar sua logística própria e agenciar a inteligência coletiva.

Figura 4
Condição dos caminhos no Brongo do Pau Miúdo, ladeiras em sua maioria. Fonte: acervo do arquiteto Sylvio Sawaya.

A compreensão dessa dinâmica colocou a luz em sinais da experiência cotidiana materializada tanto nos espaços coletivos quanto nas ligações entre as casas. Sobretudo as áreas de convívio mostraram-se muito frequentadas e estruturadoras da comunidade, pois conformavam o lugar onde a vida se apresentava plena. Intrinsecamente relacionados com as áreas internas das moradias contíguas, aquelas ladeiras já eram, na ocasião, sonorizadas por rádios e toca-fitas de moradores locais. Funcionavam como zonas de transição/intersecção entre o espaço doméstico e as áreas de domínio comunitário no cotidiano.

A experiência do levantamento do Brongo do Pau Miúdo fez com que o arquiteto Sylvio Sawaya, na condição de coordenador da equipe, despertasse para a visão dessa vida plena que ali se desenrolava. Esse fenômeno não era, no entanto, reconhecido por projetos como os das persistentes avenidas modernistas, iniciadas a partir das visões capitaneadas por Mário Leal Ferreira nos anos 1940-50.

Sawaya, formado pela FAUUSP em 1967, após ter trabalhado com arquitetos da chamada Escola Paulista, realizou uma experiência de projeto de uma rede de cidades em Rondônia, o que lhe proporcionou incursões pelo interior do Brasil (SILVA et al., 2018Silva, L. O. P. F., Carranza, E. G., & Rosselli, D. (2018). Caminhos outros na arquitetura paulista. A produção de Sylvio Barros Sawaya. Arquitextos, 19(222.00).), passando a inquietar-se com as contradições que percebia no planejamento urbano funcional, ao mesmo tempo em que se ocupava do reconhecimento do espaço popular e sua forma de ocupação. Na ocasião em que desenvolveu os trabalhos em Salvador, questionava os procedimentos modernistas nos projetos de forma geral e nos projetos urbanos em particular. Décadas mais tarde o arquiteto irá se destacar como um daqueles que retoma a terra crua como material de construção, algo imemorial e muito presente nas camadas populares no Brasil, em busca da essência de uma ação transformadora humana. Sua presença em Salvador, naquele momento, foi catalisadora de uma postura de revisão e reinterpretação, que se colocava criticamente face às propostas de transformação urbana em andamento.

Na observação dos ritmos e ajustes produzidos nos espaços públicos do Brongo do Pau Miúdo, evidenciou-se que existia nesta ocupação (e em ocupações congêneres) uma organização e formas de apropriação específicas. No levantamento, reconhecem e mapeiam as condições gerais das construções, os materiais utilizados, sua posição em relação às vielas e ladeiras, como também o comércio de consumo imediato, aqueles de consumo eventual e o que denominam de consumo cotidiano. Espacializam minuciosamente as ruas, as pontes, os desníveis, as escadarias, as rampas, as escadas e as rampas associadas, os principais espaços de lazer, os minadouros, as árvores e bananeiras e os brejos (Figura 5). Vem daí a conclusão de que negar a existência dessas linguagens antropologicamente próprias resultaria em desequilíbrios nos diferentes momentos do projeto, desde sua concepção até sua implementação, se desconectada da prática cotidiana.

Figura 5
Mapa com indicação de materiais utilizados e condições gerais nas construções, localização de elementos urbanos e arborização no Brongo do Pau Miúdo. Fonte: acervo do arquiteto Sylvio Sawaya.

Entretanto, na esteira do avanço das políticas neoliberais e de seus reflexos na produção do espaço urbano, com a intensificação do quadro de exclusão socioespacial, os grupos dominantes de Salvador, que já compartilharam seus espaços de vivência com as famílias de baixa renda no passado, passaram a reagir diante do crescimento da cidade. A partir dos anos 1990, cresceu expressivamente o número de shoppings centers, condomínios fechados, segurança privada e controle de circulação, inclusive no Pau Miúdo (CALDEIRA, 2000Caldeira, T. P. R. (2000). Cidade de Muros: Crime, Segregação e Cidadania em São Paulo. São Paulo: Editora 34/Edusp.). O crescimento exponencial urbano se deu acompanhado pela instauração de uma cidade fragmentada, subtraindo aspectos da sociabilidade urbana, que eram estabelecidos no compartilhamento das ladeiras, no contato com o outro no domínio da vida pública.

É precisamente esse modelo de produção do espaço urbano, frequentemente apoiado na manutenção de formas tradicionais de intervenção urbana hegemônicas e excludentes, que nos impõe o desafio de investigar e propor formulações e experimentos alternativos a essa lógica binária, que oscila entre mercado e estado. Operar nas brechas compõe um dos desafios do planejamento e do projeto urbano contemporâneos para intervir em territórios populares: assumir formas de mediação e de proposição que contemplem as condicionantes concretas comumente negligenciadas nas propostas participativas tradicionais. Demonstramos, a seguir, como esses elementos da vida cotidiana foram abordados e representados no trabalho elaborado nos anos 1980 através de um novo enfoque socioespacial, que reconhecia nos conflitos e nas disputas os principais insumos para a elaboração da proposta. Posteriormente, apresentamos nossos achados mais recentes sobre a mesma área, utilizando a cartografia social e a leitura antropológica como métodos de investigação complementares para o planejamento e o projeto urbano.

E o que vamos fazer com nossos bêbados?

Essa pergunta foi apresentada ao arquiteto Sylvio Sawaya durante o período em que realizou o trabalho no Brongo do Pau Miúdo, trecho de bairro na cidade de Salvador. Segundo depoimento dado aos autores, enquanto os técnicos debatiam a renovação das escadarias nas ladeiras daquele local, os moradores estavam preocupados com sua dinâmica cotidiana. No âmbito do poder público, propunha-se um desenho tido como racional para as novas escadas – a serem implantadas em grande escala –, articulando circulação e drenagem, com geometria regular. Pensava-se em um desenho que facilitasse os processos de produção, montagem e manutenção das peças pré-moldadas, algo compatível com o que se observava como desafio quanto ao acesso dos bairros de baixa renda de Salvador. Estava em discussão, naquele momento, a importante experiência liderada pelo arquiteto João Filgueiras Lima, o Lelé, na Companhia de Renovação Urbana de Salvador (RENURB) (EKERMAN, 2017Ekerman, S. K. (2017). Lelé: arquitetura, urbanismo e engenharia na reestruturação de bairros populares. Arquisur Revista, 7(12), 34-45. http://dx.doi.org/10.14409/ar.v7i12.6779.
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).

A inquietação dos moradores das ladeiras tinha como elemento central a forma então existente nas escadas esculpidas no terreno, com degraus de pisos longos e sem ritmo regular, numa geometria orgânica que disputava a narrativa com o olhar pautado pela ciência dura e pela técnica. Apesar das importantes questões relacionadas ao manejo das águas pluviais que necessitavam de solução, o desenho ia ao encontro de dinâmicas próprias da comunidade que se utilizava daqueles caminhos (Figura 6): os bêbados, parentes ou conhecidos da comunidade que ali passavam, na pior das hipóteses, ao se desequilibrarem levariam um tombo pequeno, acomodando-se em algum dos patamares irregulares. Evitava-se, assim, uma queda vertiginosa, anunciada pelas escadas regulares e geometricamente irrepreensíveis, que estavam em processo de desenvolvimento para aquelas áreas de encostas com ocupação precária.

Figura 6
Ladeira no Brongo do Pau Miúdo, foto realizada durante o levantamento por parte de equipe coordenada pelo arquiteto Sylvio Sawaya. Fonte: acervo do arquiteto Sylvio Sawaya.

A inquestionável capacidade técnica da equipe da RENURB de então teria recebido insumos importantes caso interações com os moradores dos bairros como o Pau Miúdo e tantos outros no Vale do Camurujipe tivessem sido levadas adiante. Ajustes e variações nos planos e projetos poderiam ter sido pensados em uma participação mais abrangente, algo que não se efetivou em função de inúmeras condicionantes. Adotando a perspectiva da flexibilidade como princípio, o projeto das passarelas realizadas posteriormente em Salvador foi menos controverso. No trabalho sobre o Pau Miúdo, se, por um lado, a equipe técnica se deparava com uma série de contradições da cidade vivida, por outro, foi capaz de utilizar o conflito e as disputas como método de leitura, conformando uma abordagem sensível e diferenciada com potencialidade de fornecer insumos para soluções projetuais mais próximas da dinâmica local.

O mesmo ocorreu sobre a divisão territorial da cidade, elaborada pelo OCEPLAN (Órgão Central de Planejamento), escritório público de projetos de Salvador que sucedera, na década de 1980, o emblemático escritório dos anos 1940/50, conhecido pelo projeto das avenidas de fundo de vale e de escolas que irão, a partir de então, servir de base para os projetos das Escolas Parque. No âmbito da discussão do OCEPLAN sobre as chamadas Unidades Espaciais, para efeito de planejamento e gestão, Sawaya e sua equipe decidiram empreender uma verificação da pertinência dos perímetros propostos. Buscavam compreender a relação dos perímetros administrativos com a espacialização das comunidades locais, suas relações de pertencimento e localização que configuravam um “bairro” como instrumentos de apreensão da realidade e de exercício da cidadania. A discussão proposta pela equipe era justamente a de compreender a dimensão territorial ou espacial de uma comunidade, mais evidente em situações em que as relações cotidianas e suas dinâmicas de ocupação não estivessem perdidas, ao menos completamente.

A região da Liberdade, relativamente próxima do centro histórico de Salvador, corresponde a uma grande concentração de população de baixa renda da cidade. É parte do Vale do Camurujipe, que corta o território soteropolitano de norte a sul, sendo assim fundamental para a cidade que se ampliava. Estratégico, nesse sentido, debruçar-se sobre esse vale, sobretudo na sua porção norte, de ocupação popular já de várias décadas (Figura 7, Figura 8).

Figura 7
Mapa com Divisão da cidade de Salvador em Unidades Espaciais. Fonte: acervo do arquiteto Sylvio Sawaya, com destaque para a UE da Liberdade feito pelos autores.
Figura 8
Bairro do Pau Miúdo e adjacências. Fonte: acervo do arquiteto Sylvio Sawaya.

O trabalho de levantamento do Pau Miúdo que aqui recuperamos foi feito, no âmbito da OCEPLAN, com a equipe coordenada por Sylvio Sawaya, contratado com a atribuição de se responsabilizar por enraizar na escala local as ações previstas no Plano Diretor. Para tanto, aglutinou-se um grupo de aproximadamente oito servidores públicos (alguns estagiários) ligados àquele órgão oficial de planejamento da cidade de Salvador com a tarefa de verificar in loco a confiabilidade das delimitações estabelecidas à distância, redesenhando as fronteiras em contato com o território, enquanto “sujeitos” envolvidos em uma potencial metodologia alternativa ao planejamento funcional dominante. Ao se investigar a adequação e pertinência das chamadas Unidades Espaciais, a descoberta foi ainda maior, a saber, a importância da cultura popular no reconhecimento do espaço urbano, cuja ação vai no sentido da constituição de espaços de convívio com características a serem respeitadas.

Nos últimos anos, temos trabalhado com o levantamento realizado nos anos 1980, dentro da OCEPLAN, como base para a reflexão acadêmica. Naquele momento, as equipes se consolidaram para aprofundar e ampliar as possibilidades de planejamento de Salvador e, ainda que uma delas tenha concluído o levantamento do Pau Miúdo, o trabalho não teve continuidade. Ao contrário, foi engavetado em nome da manutenção de um procedimento convencional de planejamento funcional, baseado em ações de técnicos, distantes de dinâmicas populares.

A decisão de Sylvio Sawaya, em conjunto com os técnicos da administração pública que o contrataram, por investigar o Pau Miúdo se deu a partir de caminhadas pela região da Liberdade que, acompanhando o processo em curso em Salvador como um todo, após um período de relativa estagnação quanto ao crescimento econômico e populacional durante a primeira metade do século XX, vinha crescendo com vigor e mostrava uma perspectiva de transformação urbana.

Carlos Nelson, na década anterior, havia se debruçado sobre a questão dos ritmos e especificidades locais quando trabalhava junto a favelas cariocas. Mais tarde, Sérgio Magalhães, também no Rio de Janeiro, defendeu uma maneira de agir segundo a qual as propostas de reurbanização deveriam ser desenvolvidas em consonância com a participação popular, propiciando distintas maneiras de ver e a possibilidade de conceber espaços diversos, de modo a superar as verdadeiras muralhas virtuais que separavam as linguagens distintas das ocupações formais e informais (MAGALHÃES, 2002Magalhães, S. (2002). Sobre a Cidade: Habitação e Democracia no Rio de Janeiro. São Paulo: PRO Editores.). Algo que deveria ser tratado com cuidado, sem uma afirmação autoritária de um padrão predeterminado e com a perspectiva de escuta no que se refere a saberes localmente sedimentados (Figura 9).

Figura 9
Mapa com indicação de divisão do Brongo do Pau Miúdo com indicação de casas que tiveram levantamento de medidas - o levantamento indica um olhar cuidadoso para o que se apresentava. Fonte: acervo do arquiteto Sylvio Sawaya.

Nos anos 60 e 70, vários arquitetos apresentaram revisões radicais sobre a prática da arquitetura e do urbanismo, reconhecendo na experiência da cidade existente a base para novas propostas e procedimentos metodológicos para leitura da realidade e intervenção no espaço urbano, que incorporassem as dinâmicas em curso e a participação direta da comunidade. Destacam-se os trabalhos fundamentais de Kevin Lynch, Gordon Cullen, Yona Friedman, John Turner, Christopher Alexander, Jan Gehl, além da tecnolatria de Archigram, das propostas revolucionárias dos Situacionistas, do humor e linguagem pop de Archizoom, das impactantes intervenções do Superstudio. Arquitetos como John Turner (1968)Turner, J. (1968). Housing Priorities, Settlement Patterns and Urban Development in Modernizing Countries. Journal of the American Institute of Planners, (34), 354-363. http://dx.doi.org/10.1080/01944366808977562.
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e, posteriormente, John Habraken (2000)Habraken, N. J. (2000). The structure of the ordinary: Form and Control in the Built Environment. Cambridge: MIT Press., estavam interessados em reformular estratégias projetuais que restituíssem o poder de decisão e de participação aos moradores, sendo imprescindível o reconhecimento do seu ambiente sociocultural, além da rede de relações comunitárias que tecem no território. Christopher Alexander (1976)Alexander, C. Gili, G., ed (1976). Urbanismo y participación: el caso de la Universidad de Oregón. Barcelona: ed. Gustavo Gili. corroborou com essa perspectiva afirmando que somente os habitantes são capazes de reconhecer suas próprias necessidades e de avaliar se os espaços públicos e os edifícios atendem ou não suas expectativas e prioridades.

Percebe-se, assim, a defesa da equipe quanto ao respeito às preexistências. Em outras palavras, o levantamento do Brongo do Pau Miúdo baseia-se em referências relacionadas à presença e à participação da população na urbanização do lugar. Fica claro que há dinâmicas a serem respeitadas em territórios populares como o do Pau Miúdo quando de ações urbanísticas que nelas reverberam. Há uma escuta necessária para entender o que a população tem a dizer, como e onde vivem. Trata-se da influência do espaço na afirmação da identidade, funcionando como elemento ativador desse processo no qual a memória e a identidade são reconstruídas e reafirmadas cotidianamente através da ação coletiva (LÉVI-STRAUSS, 1957Lévi-Strauss, C. (1957). Tristes Trópicos. São Paulo: Anhembi.).

A agenda atual dos intensos movimentos de moradia, no entanto, está muito focada na produção de conjuntos de habitação de interesse social (há exceções importantes como o MDF - Movimento de Defesa da Favela, surgido na Zona Leste paulistana no final da década de 1970), e nela pouco tem sido levantada a bandeira do cuidado com os bairros com precariedades onde vivem as comunidades de baixa renda, sejam favelas ou áreas regularizadas sem uma urbanização efetiva. Para esses bairros, ações são empreendidas de acordo com teorias, regras, modelos embasados em um conhecimento técnico-científico hegemônico, algo distante da experiência vivida pelos habitantes. Utiliza-se como prerrogativa uma hierarquia que, no processo, busca afirmar a si mesma, quando o razoável seria descobrir a lógica existente no entrelaçamento entre o lugar e a vivência cotidiana, nas relações de identidade e pertencimento. O que podemos reconhecer como um conhecimento sensível é, nesse sentido, muito mais central do que o caráter prescritivo e regulador de um urbanismo interessado em separar, controlar e padronizar formas de ocupação, alheio às experiências específicas.

É nesse sentido que cartografias afetivas e sociais têm surgido como ferramentas de resistência, apropriação e coprodução do espaço urbano. Não se trata de afirmar uma postura anticientífica, mas de propor uma atitude propensa à observação e leitura das contradições da cidade, disposta a rever os pressupostos e procedimentos tradicionais que desconhecem possibilidades e potencialidades para além do que está dado. A cartografia social, tal qual ensaiada pela equipe nos anos 1980, agencia processos coletivos essenciais para a tomada de decisão tanto na esfera do plano quanto do projeto.

A cartografia social e afetiva como método de (re)existência local

É perceptível, no trabalho sobre o Brongo do Pau Miúdo e nas inquietações que os membros da equipe por ele responsável perceberam e vivenciaram, que a cartografia habitualmente utilizada apresentava limitações quanto à explicitação do cotidiano que lá se percebia. Os mapas e desenhos resultantes do levantamento realizado nos anos 1980 demonstram essa inquietação, que está presente na revisão da utilização da ferramenta da cartografia que já estava em curso. Nossa oficina proposta em 2018 girava ao redor de três pontos principais: o reconhecimento do lugar; a comparação da situação atual com aquela documentada nos levantamentos dos anos 1980; o contato com lideranças da UMP e com moradores locais. Embora tenhamos nos deparado, no momento de sua realização, com dois empecilhos incontornáveis: o primeiro ligado à impossibilidade de adentrar o bairro, de percorrer suas ruas e espaços, que supúnhamos públicos, e de ter contato com a população; o segundo relacionado a não confirmação da presença dos representantes da UMP – procuramos discutir sobre a situação encontrada e sobre os impasses que dificultaram a sua realização. Em 2018, realizamos uma oficina de cartografia social e afetiva que se debruçou sobre o bairro soteropolitano Pau Miúdo.

Os resultados podem ser expostos nos termos de uma observação do lugar, cujas interdições nos dizem muito sobre sua situação no momento atual. A experiência nos permitiu notar uma condição de segregação “voluntária”, determinada por alguns grupos que controlam o território; a acomodação das forças locais, com base numa cidadania precária, imposta por grupos que exercem a liderança pela intimidação e violência. De um lado, notamos a reprodução dos padrões de controle e reclusão de trechos urbanos, como ocorre nos condomínios fechados das classes média e alta, transformando essas áreas periféricas em enclaves fortificados. Conjugam a segurança privada ao mito do isolamento autossuficiente por meio da criação de um microcosmo com “leis” próprias, minando a sobrevivência da esfera pública e o exercício do direito, e, assim, intensificando a discriminação e as práticas de violência (CALDEIRA, 2000Caldeira, T. P. R. (2000). Cidade de Muros: Crime, Segregação e Cidadania em São Paulo. São Paulo: Editora 34/Edusp.).

A presença de igrejas pentecostais nas relações cotidianas sugeriu a existência de pactos de convivência entre pelo menos três grupos distintos: os grupos ligados ao tráfico de drogas, os líderes religiosos e os agentes das forças policiais, sinalizando uma dinâmica ambígua entre esses vários segmentos, o que, aliás, não configura exceção em relação a outras áreas periféricas das mais diferentes cidades brasileiras. Diante desse arranjo de forças, a população, submetida a uma realidade de conflitos tanto externos quanto internos, fica sujeita à coerção dos grupos que se alternam no exercício do poder. Some-se a esse quadro complexo condições socioculturais adversas, marcadas pela ausência de equipamentos de lazer e cultural. O que se observa é a presença marcante (e paradoxal) das igrejas e dos bares a constituir a trama das redes de sociabilidade.

Depreende-se do processo observado a necessidade de refletir sobre a dimensão participativa no planejamento e no projeto de intervenção urbana em territórios populares, algo que exige pensar a partir de dinâmicas já estabelecidas e em andamento. Diversos autores já apontaram que os limites para os Processos Participativos no Brasil passam, sobretudo, pela distância entre os Planos e sua aplicação, ressaltando não só o baixo grau de efetivação, como também a falta de vinculação entre Planos e gestões; entre a prática e o discurso; entre propostas setoriais e alocação de recurso, e a dimensão social (MARICATO, 2011Maricato, E. (2011). O impasse da política urbana no Brasil. Petrópolis, RJ: Vozes.; SOUZA, 2003Souza, M. L. (2003). Mudar a Cidade – Uma Introdução Crítica ao Planejamento e à Gestão Urbanos. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil.; VILLAÇA, 1999Villaça, F. (1999). Uma contribuição para a história do planejamento urbano no Brasil. In: Deák, C., & Schiffer, S. (Organizadores). O processo de urbanização no Brasil. (pp. 169-244.). São Paulo: Edusp.). Nesse processo, mecanismos de ação direta, não previstos no aparato estatal, inauguram novas técnicas e procedimentos que podem expandir o processo de elaboração e implementação de planos e políticas públicas a partir de uma abordagem mais humanista e mais aderente ao local, fomentando a participação popular na gestão do território e a introdução de elementos de democracia direta.

É enriquecedor compreender a produção da cidade, sobretudo em espaços periféricos, pelo olhar das diversas formas de apropriação do espaço estabelecidas como táticas subversivas ao modelo urbano vigente, que as exclui. As ações periféricas possuem caráter de denúncia social, tentando melhorar os espaços por meio de ideias comunitárias e processos colaborativos instaurados. A lógica do comum como princípio ético-político (DARDOT; LAVAL, 2016Dardot, P., & Laval, C. (2016). Comum. Ensaio para a Revolução no Século XXI. São Paulo: Editora Boitempo.) já está presente há muito tempo nos territórios populares, em especial nas estratégias de sobrevivência, nas relações informais de compartilhamento e engenhosidade coletiva. Um campo aberto em que está posta a preexistência de situações de improvisação, que subvertem a forma e a função sugerida; como se percebe no caso das escadarias. No território da ausência, cria-se; a partir da recombinação e da reconfiguração dos códigos vigentes, escapando às territorialidades e aproximando-se da ideia de resíduo, tal qual desenvolvida por Lefebvre, como aquele elemento que escapa aos sistemas homogeneizantes e contém o poder criador inesgotável (LEFEBVRE, 2006).

Como seria possível compreender e representar as vicissitudes de uma área complexa, que se pode entender como espacialização de relações humanas, de interação comunitária, como o Brongo do Pau Miúdo? Esse paradoxo pode ser percebido na busca pelo aprofundamento da leitura da área construída de maneira relacional e afetiva, como aquela desenvolvida pela equipe do arquiteto Sylvio Sawaya. Apesar das linhas retas que conformam a área, no interior de suas quadras percebe-se a vida assentada em formas orgânicas, que acompanham as curvas de níveis, e seus espaços decorrentes. Com muita sutileza, a cartografia denomina-as de configurações abertas e fechadas, em referência a intensa ocupação perimetral das quadras, com uso comum nos seus miolos (Figura 10).

Figura 10
Mapa com indicação da morfologia no Brongo do Pau Miúdo. Fonte: acervo do arquiteto Sylvio Sawaya.

Em muitos aspectos, as táticas encontradas em territórios populares são respostas para o lento processo de construção da cidade convencional, pois as adaptações e a prototipagem de soluções ocorrem a partir da urgência do real com abordagens ágeis e baratas. As ladeiras do Brongo do Pau Miúdo, nesse sentido, mostram uma acomodação à geomorfologia, que explicita ajustes com mínimos recursos, algo recorrente em contextos de intensa precarização, exclusão e conflitos relacionados ao meio urbano. Percebe-se, na Figura 11, a preocupação da equipe em avançar no levantamento de modo a construir a noção de espacialidade e de totalidade, apreendendo os significados vividos através da materialidade das construções, os cheios e os vazios, o edificado e as brechas.

Figura 11
Elevação da Ladeira Osvaldo Gordilho, realizada no levantamento do Brongo do Pau Miúdo. Fonte: acervo do arquiteto Sylvio Sawaya.

Nessas áreas, as práticas e modalidades de associação são fortalecidas e colocam em pauta, através de suas adaptações no território, a apropriação democrática do espaço na cidade (Figura 12, Figura13).

Figura 12 -13
Fotos da Ladeira Osvaldo Gordilho - vista de cima e de baixo. Fonte: acervo do arquiteto Sylvio Sawaya.

A produção de cartografias corresponde à elaboração coletiva de mapas, considerando a dimensão cotidiana e singular dos sujeitos que estão diretamente envolvidos com os territórios representados. Os mapas gerados são produtos de múltipla autoria e explicitam o espaço da vida cotidiana (Crampton & Krygier, 2008Crampton, J. W., & Krygier, J. (2008). Uma introdução à cartografia crítica. In: Acselrad, H. (Editores). Cartografias sociais e território (pp. 85-111.). Rio de Janeiro: Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional.). Ao trabalharem na elaboração dos mapas, os cidadãos envolvidos produzem seu próprio território, cocriando a realidade (GOUVÊA, 2010Gouvêa, J. P. N. (2010). Cidade do mapa. A produção do espaço de São Paulo através de suas representações cartográficas. (Dissertação de mestrado). FAU USP, São Paulo.). Como indica Acselrad e Coli (2008)Acselrad, H., & Coli, L. R. (2008). Disputas territoriais e disputas cartográficas. In: Acselrad, H. (Editores). Cartografias sociais e território (pp. 13-43). Rio de Janeiro: Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional., a cartografia social está integrada a um processo de planejamento territorial e tem como proposta construir o território com os sujeitos diretamente envolvidos. O engajamento alcançado por essa dimensão não hierarquizada e horizontal, promove e fortalece novos lugares de participação no âmbito do planejamento da cidade, construindo um sentido de pertencimento fundamental para viabilizar instrumentos de gestão participativa e controle social em territórios populares.

Muita coisa mudou nas comunidades brasileiras em geral e soteropolitanas em particular desde o trabalho realizado no Brongo do Pau Miúdo nos anos 1980. Se o Pau Miúdo foi percebido como uma comunidade há 30 anos, hoje foi possível perceber ali um território cindido, no qual se insinua uma interdição de acesso em diversas áreas. Por um lado, a circulação das pessoas que não pertencem à comunidade é vetada pela presença de agentes locais vinculados ao crime organizado. Por outro lado, também ali se consolidam os enclaves residenciais fortificados de média e baixa renda, com fronteiras vigiadas, como se a população local reproduzisse lógicas típicas dos enclaves destinados à grupos de alta renda (Figura 14, Figura15).

Figura 14 - 15
Fotos de trecho da Ladeira Osvaldo Gordilho, do levantamento do Brongo do Pau Miúdo. Na imagem, mostra-se o limite de onde se pode acessar sem salvo-conduto das facções que hoje dominam o bairro. Fonte: imagem à esquerda - acervo do arquiteto Sylvio Sawaya; imagem à direita – fotografia tirada pelos autores em 2018.

Até o fim dos anos 1980, a cartografia no Brasil era uma prerrogativa estatal, sendo realizada pelos militares, pelo IBGE ou por superintendências regionais e estaduais. Na década de 90, há uma “virada cartográfica”, com a população se “automapeando” para se reconhecer. A cartografia passa a ser entendida como uma linguagem, logo um campo em disputa, para a construção de visibilidade e direitos, assim ela se torna social. Um exemplo importante é a nova cartografia social da Amazônia, combatendo a ideia que há um “vazio demográfico” na área, ignorando as múltiplas populações indígenas que ali habitam (BARCELOS, 2012).

A elaboração de representações gráficas pode exercer diferentes funções-dispositivo (Kastrup & Barros, 2015Kastrup, V., & Barros, R. B. (2015). Movimentos-Funções do dispositivo na prática da cartografia. In: Passos, E., Kastrup, V., & Escóssia, L. (Organização). Pistas do método da cartografia: pesquisa-intervenção e produção de subjetividade (pp. 76-92). Porto Alegre: Sulina.) e abordar os conflitos, tensões e contradições que compõem o território. Emergem diversos elementos e temáticas a serem incluídos em mapas, tal como a dimensão afetiva, nos quais a experiência de cada morador com o espaço é explicitada. Kastrup e Barros (2009)Kastrup, V., & Barros, L. P. (2009). Cartografar e acompanhar processos. In: Passos, E., Kastrup, V., & Escossia, L. (Organizadores). Pistas do método da cartografia: Pesquisa-intervencao e producao da subjetividade (pp. 52-75). Porto Alegre: Sulina. indicam que é possível encontrar nos mapeamentos alguns elementos importantes das construções das subjetividades, pois os mapas são construídos caso a caso, ou seja, o método vai se fazendo no acompanhamento da convergência dinâmica do sistema de objetos e do sistema de ações (Santos, 2006Santos, M. (2006). A Natureza do Espaço: Técnica e Tempo, Razão e Emoção. São Paulo: Edusp.).

Pensando no planejamento urbano como um processo contínuo que pressupõe atividades preparatórias à deliberação política, com destaque para as etapas prévias de levantamento de dados, o mapeamento colaborativo e a cartografia social tornam-se ferramentas que ampliam o escopo do planejamento urbano tradicional e inserem novos condicionantes concretos que são comumente negligenciados nas propostas participativas tradicionais. A forma participativa comparece com características de colaboração, solidariedade e reunião de saberes interdisciplinares em uma base que, tradicionalmente, é institucionalizada pelo saber técnico oficial.

Sugere-se aqui, portanto, pensar o mapeamento colaborativo e a construção de cartografia social como parte de algumas etapas significativas no processo de planejamento, da escala do plano ao projeto, a saber: i) como parte fundamental para elaboração de um diagnóstico da realidade; ii) como forma de ampliar e melhorar a qualidade da participação popular no processo de tomada de decisão; iii) como ferramenta para legitimar e viabilizar a participação cidadã na implementação dos projetos de intervenção urbana, garantindo maior aderência se construído como projeto coletivo; e iv) como escopo da etapa de monitoramento e avaliação do impacto do plano de ação, estabelecendo uma espécie de controle social.

Ao compreender o território de maneira ampliada, na escala do projeto e do plano, os mapas construídos pelos cidadãos são ferramentas capazes de evidenciar as dinâmicas existentes e, a partir da ação coletiva, fomentar o que de fato são reivindicações relevantes para os grupos envolvidos. Corresponde, assim, a um estilo singular de produção de conhecimento, a análise da realidade de um território, e a uma ferramenta bastante eficaz para apropriação do espaço. Utilizar essa ferramenta a priori como atividade preparatória, aliando o saber popular desde o espaço vivido ao arcabouço técnico, parece imprescindível para requalificar tanto os instrumentos delineados nos Planos Diretores quanto nos planos setoriais.

O desafio que está colocado ao planejamento e ao projeto urbano, assim, é incorporar a espacialização do tempo, não o cronológico, mas o tempo vivido, tal qual explicitado por Bollnow (1967)Bollnow, O. F. (1967). Lived Space. In: Lawrence, N., & O’Connor, D. (Eds.). Readings in Existential Phenomenology (pp. 178-186.). Englewood Cliffs: Prentice-Hall., para quem os acontecimentos se especializam na relação espaço/tempo. Faz-se então necessário reconhecer essas espacializações, compreender suas formas, arranjos e significados para depois formular conceitos e parâmetros. Essa estratégia é fundamental, quer seja antes (na etapa de levantamento) ou depois do plano de ação (como etapa de monitoramento) para a efetivação de um processo participativo de fato, que extrapole a fase de consulta pública em momentos pontuais. Assim sendo, este método torna possível a participação direta dos cidadãos na concretização dos planos e na formulação de propostas de solução com maior chance de serem implementadas, na medida em que a equipe técnica é conduzida por arranjos espaciais com os quais a população já tem alguma vivência.

A leitura antropológica como processo: a escuta e a experiência vivida dos habitantes

Em seu livro Contro l’urbanistica, o antropólogo italiano Franco La Cecla (2014)La Cecla, F. (2014). Contro l’urbanistica. Turim: Einaudi, ao examinar o fenômeno da resistência urbana, como uma espécie de exercício cívico de contraposição ao poder do Estado, assinala que uma das maneiras mais eficazes de resistir às formas de exclusão dos cidadãos e à invisibilidade de suas reivindicações perante o poder público dá-se nas formas de habitar os lugares. Nesses termos, sustenta que conferir um caráter de permanência ao uso dos espaços públicos já configura uma transgressão, pelo simples fato de se contrapor ao habitual trânsito febril, ou o corriqueiro deslocamento funcional.

O habitar que extrapola a vida cotidiana no espaço privado, ao se apropriar do espaço público, passa, portanto, a se caracterizar, por si só, uma forma de resistência política. E apenas essa condição de exceção, por menor que possa parecer, pode ser considerada suficiente para operar uma importante transformação política, no entender de La Cecla. Nessa perspectiva, o estudo das múltiplas formas de participação dos modos participativos horizontais e multifacetados – movidos seja por ação direta e espontânea de moradores, seja por ações de movimentos sociais –, ao se opor (ou complementar) iniciativas de instituições estatais, desafiando os limites do planejamento tradicional, adquire papel fundamental.

Segundo La Cecla, é necessário reformular a disciplina do urbanismo, naquilo que persiste num modus operandi que se ocupa predominantemente de separar, controlar, fechar. Ao mesmo tempo que seus procedimentos priorizam a captação da realidade social por meio de cálculos, porcentagens, tabelas e mapas, tendem a privilegiar medidas de caráter prescritivo, permanecendo limitados por parâmetros numéricos e diretrizes genéricas, distanciando-se das reflexões e experiências das ciências humanas. Escapam-lhe, assim, os movimentos reais, as motivações que os envolvem, aquilo que as pessoas vivem, pensam e sentem acerca da cidade. Se não entendem as lógicas de pertencimento aos lugares, se não compreendem os componentes vividos de cidadania a cada nível, dos mais pobres às classes médias, aos ricos urbanos, suas estratégias continuam anacronicamente prisioneiras de uma visão obsoleta, pois não aferram o que acontece no tecido vivo do território e, portanto, não se mostram aptas a oferecer respostas às reivindicações locais, aderentes ao espírito da cidade comum.

O autor reconhece, contudo, um perfil de urbanistas, sociólogos e antropólogos capaz de vislumbrar nas “grandes cidades” e até mesmo nos “não-lugares”, locais absolutos do anonimato, como as melhores condições para se manifestar um modo político. Nesse sentido, intercede por um urbanismo que supere os procedimentos tradicionais vinculados a um tecnicismo míope, indiferente ou inabilitado à compreensão daquilo que acontece nos meandros das cidades. A Avenida Marquês de Maricá, um corredor de intensa circulação de tráfego, tem na apropriação do espaço das calçadas por quiosques de comércio e serviços - há desde a venda de frutas, lanches e bebidas, a cabeleireiros –, uma evidência de alteração de usos previsíveis e prescritos pelas dinâmicas cotidianas, (Figura 16, Figura17).

Figura 16 e 17
A imagem da Avenida Marquês de Maricá mostra como a ocupação da calçada com quiosques de comércio informal transforma o espaço destinado à circulação em espaço de troca e permanência. Fonte: fotografia tirada pelos autores em 2018

Entre os habitantes da cidade, sejam os da periferia, sejam os da pequena burguesia ou das classes médias, todos invariavelmente têm noção de que a cidade é um recurso irrenunciável, tendo no desfrute cotidiano dos seus espaços, privados ou públicos, a possibilidade concreta de melhorar as próprias condições de vida.

Diante desse quadro, afirma La Cecla, que a antropologia pode representar um instrumento essencial para a compreensão da experiência vivida do urbano, definida por ele como “mente local”, em recíproca construção cotidiana de identidade.

Quando se refere à experiência do vivido em uma cidade, um antropólogo, para La Cecla, não tece um juízo moral. Ao contrário, deve despir-se de preconceitos, para efetivamente experimentar o compartilhamento do cotidiano; deve abandonar a “extraordinariedade” própria do olhar estrangeiro, buscando incorporar os hábitos, os tempos do dia e da noite, os ritmos e os movimentos do corpo. Para La Cecla, há nesse retorno do corpo ao espaço público, na tentativa de se integrar em um ambiente cultural, uma retomada de algo que parecia em via de extinção, ou mesmo extinto para sempre, à medida que se experimenta uma oscilação entre admiração e temor pelo espaço virtual e pelas formas de comunicação digital.

O autor aponta o quanto se mostra oportuno recuperar o sentido da cultura urbana como proposto por Lewis Mumford, enquanto experimento humano de compartilhamento que produziu arte, comércio e artesanato, indivíduos reunidos em associações constituídas por interesses comuns. Uma cultura das cidades que se refletiu numa relação primária entre espaços e pessoas, casas e armazéns, esquinas e perspectivas, comerciantes e lavadeiras, igrejas, arcadas e campanários. Explica que, mesmo com a aceleração da revolução industrial, esse território cuja existência deveu-se à reunião de pessoas com interesses comuns foi sempre essencial às relações sociais.

Uma crise das cidades se esboçou com a destruição provocada pelas guerras, acentuando-se com a revolução conservadora do automóvel individual. Nos dias atuais, as cidades tornaram-se o lugar onde se multiplica a riqueza, ao mesmo tempo em que prolifera a pobreza, traduzindo uma bipolaridade entre as lógicas da condição global, impostas do exterior, e uma identidade própria que lhes é peculiar.

Embora essas contradições mais do que nunca estejam presentes no dia a dia do espaço urbano, há também novas potências criativas mobilizadas pelas ações de resistência, por experiências autênticas de luta, pela sobrevivência dos cidadãos num território inóspito. A comunhão entre os significados de existência e resistência, segundo La Cecla, produz o retorno do corpo ao palco urbano, com seus movimentos, ritmos, com suas exigências, rotinas, recusas e desejos, suas capacidades de construir relações. E com o corpo presente na cidade, concretiza-se uma forma de produção de sociedade constituída pela vida cotidiana dos centros urbanos. É nesse contexto que a antropologia pode dar uma genuína contribuição ao urbanismo. A produção de “formas de vida”, de relações entre pessoas, produz cidades muito mais vigorosas do que qualquer pretensão regulatória. Por fim, conclui, se não se aprende a compreender esse tipo de produção (consciente e inconsciente), o urbanismo tende a perder significado e importância.

Conclusões

Ao retomar o trabalho elaborado nos anos 1980 para o bairro do Pau Miúdo – um território periférico da cidade de Salvador –, a uma distância de quase trinta anos, foi possível reconhecer o desafio enfrentado pela equipe coordenada por Sylvio Sawaya naquele momento para incorporar a compreensão da realidade da área, transferindo-a ao ato de projetar.

A expectativa frustrada de realização da oficina, como proposta em 2018, nos colocou diante dos impasses da realidade local, que, aliás, não diferem das condições mais gerais dos territórios periféricos das mais diferentes cidades brasileiras. Situações que acomodam a ilegalidade da ocupação do espaço com práticas coercitivas, e que não apenas invalidam o exercício do direito de cidadania, como, ao contrário, contribuem para o aumento da violência. Para superar esses empecilhos, mais uma vez se confirma que a conexão com as lideranças comunitárias do lugar é condição essencial para romper com o círculo vicioso, impulsionando a administração pública a adotar práticas mais aderentes à dinâmicas cotidianas.

Nesse processo de revisitação foram recuperados conceitos e procedimentos que orientaram aquele estudo, aproximando-os, por um lado, à compreensão de autores que refletem sobre processo de periferização, aliada à postura de profissionais que trabalharam com reurbanização de favelas no Rio de Janeiro, como Carlos Nelson nos anos 1970, seguido por Sérgio Magalhães. Soma-se a isso a reflexão de autores que se dedicam à reflexão sobre a cidade contemporânea e a manutenção de pré-existências.

A proposição do antropólogo italiano, Franco La Cecla, confirma a posição de superação dos procedimentos prescritivos do urbanismo para dar lugar a uma compreensão antropológica da experiência vivida do urbano, em ressonância com a dimensão cotidiana. Só vivendo os lugares, compartilhando espaços e hábitos, aprendendo os ritmos dos passos, os gestos, será possível ampliar os limites do campo disciplinar do urbanismo.

Nossa análise estabelece conexões com a discussão acerca das práticas participativas diretas e de um ferramental que parece se afirmar diante dos impasses representados pelos tradicionais mecanismos de elaboração e implementação de planos, projetos e políticas públicas. Ações periféricas nascidas do embate com uma realidade de urgências, voltadas à apropriação e produção do espaço urbano, representam uma alternativa possível ao modelo de desenvolvimento excludente. Situar as pessoas como protagonistas da produção do espaço em que vivem é fundamental para avançarmos em direção a práticas de intervenção urbana que coloquem a vida no centro e que sejam, de fato, adequadas e eficientes para mitigar as fragilidades em contextos de alta complexidade.

Neste sentido, os territórios populares mostram-se como um campo aberto à experimentação e à prototipagem de soluções em conexão com as formas de habitar existentes. É fundamental, como demonstramos, reconhecer os ritmos, as práticas, as dinâmicas, como também as disputas, conflitos e contradições. É lidar com o território na dupla chave do instituído – com suas normas e padrões que regulam as atividades sociais, e instituinte – enquanto força que tende a transformar ou refundar as práticas que ali incidem (incluindo o ato de planejar e projetar). Esses são, ao mesmo tempo, as expectativas e os pressupostos para as próximas incursões em territórios análogos ao Pau Miúdo. A experiência da oficina, em parte frustrada, não foi empecilho para que o relato da experiência trace importantes contribuições para a proposição de procedimentos metodológicos a serem adotados em futuros estudos.

  • Como citar: Maziviero, M. C., Almeida, E., & Silva, L. O. P. L. F. (2022). A vida no centro: a experiência metodológica do Brongo do Pau Miúdo. urbe. Revista Brasileira de Gestão Urbana, v. 14, e20210335. https://doi.org/10.1590/2175-3369.014.e20210335

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Editado por

Editor responsável: Rodrigo Firmino

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Out 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    04 Out 2021
  • Aceito
    08 Jun 2022
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