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Brincadeiras no Ensino Fundamental: pistas para a formação de professoras

Children’s Play in Primary School: clues for teachers’ training

RESUMO

Apresenta-se parte dos resultados de pesquisa feita em 2008, em duas escolas públicas municipais de uma cidade do interior do estado de São Paulo, com objetivo de identificar se e como as brincadeiras têm sido incluídas nos currículos dos primeiros anos do novo Ensino Fundamental (EF). Aqui, recortam-se as observações de duas reuniões de Pais e Mestres, analisando-se as concepções das professoras quanto à atividade lúdica e sua inclusão no cotidiano escolar. Com o trabalho analítico qualitativo, evidencia-se a não homogeneidade da construção do EF (mesmo entre escolas de igual filiação administrativa e de mesma região) e problematizam-se os modos de abordagem da atividade lúdica pelas professoras, localizando aspectos importantes para fundamentar a sua formação.

Palavras-chave
Ensino Fundamental de 9 Anos; Atividade Lúdica; Professor; Formação

ABSTRACT

We present part of the results of a research developed in 2008, in two municipal public schools in a town in the state of São Paulo, with the aim of identifying whether and how play activities have been included in the curricula of the first years of the new Brazilian Primary Education. Here, we present the results of the observations of two parent-teacher meetings, analyzing the teachers’ conceptions about play and its inclusion in school everyday life. With the analytical quantitative study, we evidence the non-homogeneity of the construction of Primary Education (even in schools from the same region and with the same administrative structure) and problematize the ways teachers approach play activities, focusing on important aspects to support their training.

Keywords
Nine Years of Primary Schooling; Play Activity; Teacher; Training

Introdução

Neste trabalho apresentamos parte dos resultados de uma pesquisa desenvolvida com o objetivo de compreender os modos pelos quais vem ocorrendo a implementação do Ensino Fundamental de 9 anos (EF), com especial interesse em identificar se e como as atividades lúdicas têm sido incluídas nos currículos dos novos primeiros anos. O novo EF foi determinado pela lei federal 11.274, de 06 de fevereiro de 2006 e tem como alteração mais visível a ampliação de sua duração - de 8 para 9 anos - materializada pelo ingresso antecipado dos alunos nas escolas (a ocorrer, a partir de então, com 6 anos de idade). Análises sobre os documentos que apresentam a nova forma de conceber o EF (Brasil, 2004aBRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Secretaria de Educação Básica. Ampliação do Ensino Fundamental para Nove Anos: relatório do Programa. Brasília, MEC, 2004a.; 2004bBRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Secretaria de Educação Básica. Ensino Fundamental de Nove Anos. Orientações gerais. Brasília, MEC , 2004b. ; 2006aBRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Secretaria de Educação Básica. Ampliação do Ensino Fundamental para Nove Anos: terceiro relatório do programa. Brasília, MEC, 2006a.; 2006bBRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Secretaria de Educação Básica. Ensino Fundamental de Nove Anos: orientações para a Inclusão da Criança de Seis Anos de Idade. Brasília, MEC , 2006b.), permitem-nos compreender que, oficialmente, as alterações do sistema de ensino não devem se limitar a atos burocráticos de matrículas de crianças mais novas nas escolas e que a vida escolar deve contribuir para desenvolver um

[...] olhar aguçado pela sensibilidade, pela emoção, pela afetividade, pela imaginação, pela reflexão, pela crítica. Olhar que indaga, rompe, quebra a linearidade, ousa, inverte a ordem, desafia a lógica, brinca, encontra incoerências e divergências, estranha, admira e se surpreende, para então estabelecer novas formas de ver o mundo (Brasil, 2006bBRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Secretaria de Educação Básica. Ensino Fundamental de Nove Anos: orientações para a Inclusão da Criança de Seis Anos de Idade. Brasília, MEC , 2006b., p. 53).

Sublinha-se nos documentos a importância de não se perder de vista especificidades do desenvolvimento das crianças menores e as necessidades peculiares, na nossa cultura, de sua faixa etária. Defende-se que a escolarização se comprometa com garantias de bom desenvolvimento físico, cognitivo, afetivo e social de seus alunos. Orienta-se, enfaticamente, que o planejamento pedagógico deve incluir atividades que rompam com a forma mais clássica de trabalho escolar. Dentre estas, a atividade lúdica ocupa espaço bastante privilegiado nas prescrições documentadas. São várias as citações que poderiam evidenciar este destaque. Consideramos o excerto a seguir suficientemente ilustrativo:

Partindo do princípio de que o brincar é da natureza de ser criança, não poderíamos deixar de assegurar um espaço privilegiado para o diálogo sobre tal temática [procurando entender] o brincar como um modo de ser e estar no mundo; o brincar como uma das prioridades de estudo nos espaços de debates pedagógicos, nos programas de formação continuada, nos tempos de planejamento; o brincar como uma expressão legítima e única da infância; o lúdico como um dos princípios para a prática pedagógica; a brincadeira nos tempos e espaços da escola e das salas de aula; a brincadeira como possibilidade para conhecer mais as crianças e as infâncias que constituem os anos/séries iniciais do ensino fundamental de nove anos (Brasil, 2006bBRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Secretaria de Educação Básica. Ensino Fundamental de Nove Anos: orientações para a Inclusão da Criança de Seis Anos de Idade. Brasília, MEC , 2006b., p. 11-12).

Estas recomendações encontram substancial fundamentação no que tem sido estudado e pesquisado sobre a atividade lúdica nas produções acadêmicas e científicas, considerada como uma das atividades mais importantes para o desenvolvimento infantil por teóricos de inegável importância para a Psicologia. Dentre estes, nos concentraremos nas formulações feitas na abordagem Histórico-cultural, especialmente a partir das elaborações de L.S.Vigotski1 1 Ao longo deste artigo, adotamos a grafia Vigotski, por ser, atualmente, a mais frequente em trabalhos brasileiros. Entretanto, em casos de citações de obras específicas, respeitamos o modo como o sobrenome deste autor foi grafado na publicação. . Esta escolha se justifica por ser a matriz teórica que fundamenta nosso trabalho, mas, também, por ser indicada, sistematicamente, como importante referência dos documentos produzidos para orientarem as práticas pedagógicas no sistema educacional brasileiro2 2 É necessário, neste ponto, fazer uma ressalva: embora a teoria Histórico-cultural e obras de Vigotski sejam frequentemente mencionadas nos documentos como uma de suas referências teóricas, não é incomum que neles existam concepções sobre a atividade lúdica que sejam contraditórias em relação a este modelo teórico. Por exemplo, no excerto citado na página anterior, a afirmação de que o brincar é da natureza de ser criança contradiz uma das teses de Vigotski, em que afirma a não existência de uma natureza genérica das crianças e/ou de características infantis definidas a priori, in abstrato e imanentes à sua natureza (presente em toda a sua obra e explicitada, por exemplo, em Vygotsky, 1995). Especificamente em relação à não naturalidade da capacidade de brincar e à sua constituição e desenvolvimento dependentes das relações sociais de que a criança toma parte, a obra de Elkonin (1998) é uma excelente referência. Essa e outras contradições foram discutidas de modo mais detalhado em outro artigo de nossa autoria (Rocha, 2007). .

Na teoria Histórico-cultural, aponta-se que a apropriação, por parte das crianças, de modos de brincar transforma radicalmente as possibilidades de desenvolvimento psicológico. Dentre diferentes modalidades de brincadeiras, Vigotski considera as que envolvem o processo da imaginação - destacadamente os jogos de faz de conta - como atividades promissoras para a constituição, o desenvolvimento e a transformação de processos psicológicos extremamente importantes na humanização do homem. Enfatiza este autor a progressiva independência do campo perceptual imediato, a capacidade de operar no plano simbólico, a apropriação de formas culturais de relações e ações no/sobre o mundo, a linguagem e a imaginação (Vygotsky, 1994VYGOTSKY, Lev Semenovich. A Formação Social da Mente. São Paulo: Martins Fontes , 1994.). Constrói, ainda, os argumentos necessários para evidenciar os vínculos entre imaginação e cognição, sustentando que a imaginação é a base para qualquer atividade criadora, presente em todas as produções da vida cultural, da criação artística, técnica e científica (Vygotsky, 2009VYGOTSKY, Lev Semenovich. Imaginação e Criação na Infância: ensaios comentados. Apresentação e comentários de SMOLKA, Ana Luiza Bustamante. São Paulo: Ática , 2009. ).

A abordagem de Vigotski sobre a imaginação e sobre o faz de conta é inovadora no campo da Psicologia e tem sido apresentada, discutida e expandida em importantes trabalhos contemporâneos. Destacamos os de GóesGÓES, Maria Cecília Rafael de. O Jogo Imaginário na Infância: linguagem e criação de personagens. In: REUNIÃO ANUAL DA ANPED. 23., Caxambu, 2000. Anais... Disponível em: Disponível em: <http://www.anped.org.br/reunioes/23/textos/0713t.PDF> . Acesso em: 20 ago. 2009.
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(2000), aprofundando as análises sobre o papel da linguagem nas brincadeiras e a progressiva constituição de competências narrativas, e o ensaio de Cruz (2002CRUZ, Maria Nazaré. Desenvolvimento Cognitivo em Vygotsky: entre os ideais da matemática e a harmonia da imaginação. In: REUNIÃO ANUAL DA ANPED, 28., Caxambu, 2005. Anais... Disponível em: Disponível em: <http://www.anped.org.br/reunioes/28/ textos/0713t.PDF> . Acesso em: 23 maio 2010.
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), em que as relações entre a imaginação e o processo de formação do pensamento conceitual são objeto de importante trabalho analítico. Outros processos psicológicos tais como atenção e memória, capacidade de previsão e planejamento, reflexões analíticas sobre a realidade e de possibilidades para transformá-la são também potencialmente desenvolvidos através das brincadeiras de faz de conta, conforme argumentam Liublinskaia (1979LIUBLINSKAIA, Aleksandra A. O Desenvolvimento Psíquico da Criança: dos 3 aos 7 anos. Lisboa: Estampa, 1979.)3 3 Convém informar que Liublinskaia não faz referências explícitas aos trabalhos de L. S. Vigotski na obra acima mencionada. Entretanto, estuda o jogo do faz de conta a partir dos mesmos pressupostos vigotskianos (da não-naturalidade de sua constituição e desenvolvimento, de suas relações intrínsecas com o real, das contribuições revolucionárias desta atividade para o desenvolvimento psicológico e de sua fertilidade pedagógica). e Mukhina (1996MUKHINA, Valéria. Psicologia da Idade Pré-escolar. São Paulo: Martins Fontes, 1996.).

As preocupações expressas nos documentos, quanto ao lugar a ser reservado para a atividade lúdica na composição curricular como um dos objetivos das alterações a serem implantadas, mostram-se, portanto, bastante pertinentes quando consideramos os trabalhos realizados na abordagem Histórico-cultural.

Entretanto, tal objetivo, sem dúvida insólito na cultura escolar tradicional, representa grandes desafios e demanda investimentos significativos para que possam ser enfrentados pelas escolas e por suas professoras. Sabemos que, tradicionalmente, as práticas pedagógicas privilegiam o desenvolvimento de processos cognitivos através da aprendizagem de determinados conteúdos, a serem obtidos por meio de procedimentos planejados, de que devem resultar determinados produtos concretos. Nos contextos educacionais há, costumeiramente, grande relutância para lidar com o imprevisível, o inaudito, aquilo que não pode ser completamente planejado. Há, também, refletindo uma tendência geral de nossa cultura, o entendimento de que a cognição e a imaginação são processos psicológicos independentes, opostos e/ou inconciliáveis, e que cabe à escola cuidar de desenvolver, sobretudo, o primeiro. Sendo as brincadeiras de faz de conta atividades essencialmente relacionadas com a imaginação e o seu desenrolar marcado pelos qualificativos de imprevisibilidade e improdutividade (pois não é previamente definida e não gera produtos concretos), é compreensível que, para os profissionais que trabalham nas escolas, a inclusão de atividades lúdicas - sobretudo dos jogos imaginativos - no cotidiano escolar seja um problema para o qual dificilmente poderemos vislumbrar soluções simples.

A Importância de ir a Campo

Os elementos até este ponto indicados nos permitiram indagar sobre os modos pelos quais a vida escolar de crianças de 6 anos vem sendo concretamente construída. Desenvolvida a partir do ano em que a Secretaria Municipal de Educação de uma cidade do interior de São Paulo optou por implantar o novo modelo de EF - exatamente o ano da promulgação da lei que o oficializa, 2006 - nossa pesquisa permitiu acompanhar este processo em algumas unidades escolares. Em 2006-2007, desenvolvemos o trabalho em 5 escolas municipais, focalizando, mais especificamente, 8 turmas de primeiros anos. Em 2008-2009, prosseguimos o trabalho acompanhando a construção do novo EF em 4 escolas, elegendo 1 turma de primeiros anos de cada uma delas; duas destas escolas eram municipais - que já integravam nossos estudos desde 2006; além destas, uma escola estadual e uma escola privada foram incluídas.

A definição do locus da pesquisa foi norteada por uma característica pedagógico-administrativa da área da educação do município em que o trabalho se desenvolveu. Trata-se de um município de grande porte do interior do estado de São Paulo, subdividido em cinco regiões geográficas pelo poder público municipal. A Secretaria Municipal de Educação deste município busca atuar de forma descentralizada e, para tal, seguindo a divisão geográfica mencionada, organizou cinco núcleos dirigidos por supervisores educacionais e coordenadores pedagógicos, que tem função de acompanhar, assessorar e garantir a implantação e implementação das políticas públicas e a qualidade das práticas educacionais nas unidades escolares abrangidas por cada região. Tendo isto em mente, optamos por escolher as cinco escolas responsáveis pelo ensino fundamental municipal de uma das cinco regiões. De nossa perspectiva, este recorte nos permitiria compreender de modo mais aprofundado o contexto em que as escolas se encontram e a população a que atendem (em termos de características de urbanização, aspectos sócio-demográficos, econômicos e de escolarização, principalmente); além disso, consideramos particularmente interessante a possibilidade de acompanhar o processo de implantação e implementação do novo EF assessorado por uma mesma equipe atuando junto a escolas diferentes.

No período de 2008-2009, permanecemos pesquisando em duas turmas de primeiros anos de duas destas escolas municipais e incluímos uma turma de uma escola estadual e outra de uma escola particular. A inclusão destas duas últimas deveu-se ao interesse em identificar e compreender peculiaridades na implantação do EF de 9 anos em escolas públicas estaduais e privadas. A escola estadual pertence à mesma região administrativa das escolas municipais. Já a escola particular está localizada num bairro bastante distante desta região, nos aspectos sócio-demográfico, urbanístico, econômico e de nível de escolarização da sua população.

O trabalho de campo foi realizado através de procedimentos metodológicos inspirados na etnografia, buscando “[...] descrever não estados mas processos, descrever ações tomadas em interações, descrever o desenrolar e o desencadear das situações do ponto de vista de cada um dos parceiros” (Beaud; Weber, 2007BEAUD, Stéphane; WEBER, Florence. Guia Para Pesquisa de Campo: produzir e analisar dados etnográficos. Petrópolis: Vozes, 2007., p. 199, itálicos dos autores). Para tal, realizamos observações participantes do cotidiano escolar (incluindo reuniões de Pais e Mestres), entrevistas semi-estruturadas com as professoras, alunos e algum adulto responsável pelas crianças - na grande maioria das vezes, mães -, aplicamos questionários a serem respondidos por orientadoras pedagógicas da Educação Infantil. Além destes procedimentos, desenvolvemos análises documentais das publicações do MEC sobre o EF de 9 anos.

Trata-se, portanto, de um trabalho investigativo desenvolvido dentro de uma abordagem qualitativa. Através da escolha e utilização deste conjunto de procedimentos assumimos a complexidade dos fenômenos educacionais e buscamos a “[...] interpretação dos factos humanos tomando como base o sentido que os sujeitos conferem às circunstâncias e aos actos que de algum modo vivenciam, ou seja, tomando como base a subjectividade testemunhada” (Amado, 2009AMADO, João. Ensinar e Aprender a Investigar: reflexões a pretexto de um programa de iniciação à pesquisa qualitativa. Revista Portuguesa de Pedagogia, Coimbra, v. 44, n. 1, p. 119-142, 2010., p. 129, itálico no original).

O trabalho analítico sobre o material empírico permitiu evidenciar que, na prática, as origens das dificuldades para garantir a presença e enriquecimento do brincar no cotidiano escolar não podiam ser localizadas em uma causa isolada, já que relacionavam-se com um conjunto de fatores de naturezas diversas. Dentre estes fatores, interessa-nos, aqui, destacar as avaliações feitas pelas famílias dos alunos de primeiro ano sobre o trabalho pedagógico.

Especialmente a partir de 78 entrevistas com professoras, pais, mães, avós ou algum representante das famílias dos alunos de primeiros anos que acompanhamos, pudemos concluir que as avaliações feitas pelos familiares foram, predominantemente, negativas quanto à incorporação de atividades lúdicas no currículo escolar4 4 Referimo-nos às entrevistas realizadas na primeira etapa da pesquisa (2006-2007) com 58 familiares (52 mães, 4 pais e 2 avós) e com as 8 professoras participantes - estas em dois momentos, no início do segundo semestre e ao final do ano letivo de 2006. Da segunda etapa (2008-2009), estamos considerando as entrevistas feitas com as 4 professoras participantes. O prosseguimento desta etapa incluiu a realização de outras entrevistas com familiares (mais 38, no total), mas o conteúdo destas não está sendo objeto de análise neste artigo. Análises mais aprofundadas sobre as avaliações dos familiares sobre o novo EF foram abordadas em outro artigo (Rocha, 2010). . Sendo assim, as professoras e as escolas foram (e ainda são) regularmente desafiadas a enfrentar diretrizes e exigências antagônicas. Por um lado, os documentos oficiais (especialmente os do âmbito federal) exigindo mudanças na cultura escolar, ao definir que o primeiro ano não se construa como uma mera antecipação da antiga 1ª série, e que “as estratégias pedagógicas” evitem “a monotonia, o exagero de atividades ‘acadêmicas’ ou de disciplinamento estéril” (Brasil, 2004bBRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Secretaria de Educação Básica. Ensino Fundamental de Nove Anos. Orientações gerais. Brasília, MEC , 2004b. , p. 16). Por outro lado, a maior parte das famílias exigindo exatamente o contrário: que o primeiro ano corresponda à antiga primeira série, com todas as representações sobre o trabalho pedagógico classicamente ligadas a ela (priorização de atividades de leitura, escrita e cálculo, investimentos sistemáticos em produções nos cadernos escolares, envio regular de tarefas para casa, avaliações da aprendizagem formalizadas em boletins etc.). Thin (2006THIN, Daniel. Para uma Análise das Relações Entre Famílias Populares e Escola: confrontação entre lógicas socializadoras. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, v. 11 n. 32, p. 211-225, maio/ago. 2006. Disponível em: Disponível em: <http://www.scielo.br> . Acesso em: 01 jul. 2010.
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) nomeia esse fenômeno como lógica da eficácia, segundo a qual as famílias de classes populares veem quaisquer outras atividades, que não sejam as específicas de trabalho escolar, como desnecessárias e inadequadas e, por isso, exercem pressões sobre as professoras para que se ajustem às suas expectativas e demandas5 5 Embora a lógica da eficácia seja um conceito construído a partir de análises sobre as relações entre escola e famílias de classes populares, oposições a inovações curriculares (sobretudo nos casos de inclusão de práticas menos explicitamente vinculadas a conhecimentos escolares) não são exclusivas destes grupos; estas oposições são também, frequentemente, encontradas nas relações entre escola e famílias pertencentes a extratos melhor providos economicamente. . Consequentemente, as inovações curriculares almejadas para o novo projeto de Ensino Fundamental não foram e nem serão implantadas sem gerar estranhamentos e oposições, especialmente quando as famílias dos alunos interpretam estas inovações como possibilidades de intensificação da tão divulgada baixa qualidade do ensino público brasileiro.

Um fator agravante desta oposição das famílias ao currículo inovador do Ensino Fundamental de 9 anos foi o fato de as professoras não estarem suficientemente preparadas e seguras para argumentar sobre a nova proposta, para indicarem com maior clareza razões pelas quais é importante garantir a presença destas atividades no contexto escolar. As dúvidas sobre o que deveriam fazer com as crianças acompanharam as professoras ao longo de 2006, sendo descritas pelas que foram entrevistadas como um fato que lhes gerou intensa e persistente angústia. Este quadro não foi um fato isolado nesta rede municipal, uma vez que outros trabalhos também identificaram o despreparo de professoras e gestoras em relação ao currículo dos anos iniciais do novo EF (como encontramos em Gorni, 2007GORNI, Doralice Aparecida Paranzini. Ensino Fundamental de 9 anos: estamos preparados para implantá-lo? Ensaio: avaliação de políticas públicas educacionais, v. 54, n. 15, 2007. Disponível em: Disponível em: <http://www.scielo.br> . Acesso em: 10 abr. 2010.
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, Brunetti, 2007BRUNETTI, Gisele Camilo. O Trabalho Docente Face ao Atendimento da Faixa Etária de 6 Anos no Ensino Fundamental: um estudo a partir das manifestações de um grupo de professoras alfabetizadoras do município de Araraquara. 2007. Dissertação (Mestrado em Educação) - Programa de Pós-Graduação/Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Paulista Julio de Mesquita Filho, Araraquara, 2007. Disponível em: Disponível em: <http://dominiopublico.qprocura.com.br/dp/62284/O-trabalho-docente-face-ao-atendimento-da-faixa-etaria-de-6-anos-no-ensi no-fundamental:-um-estudo-a-partir-das-manifestacoes-de-um-grupo-de-professora.html> . Acesso em: 20 jun. 2010.
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e Moro, 2009MORO, Catarina de Sousa. Ensino Fundamental de 9 anos: o que dizem as professoras do 1º ano. Curitiba. 2009. Tese (Doutorado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Faculdade de Educação, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2009. Disponível em: Disponível em: <http://scholar.google.com.br/scholar?q=catarina+moro&hl=pt-BR&btnG= Pesquisar&lr=> . Acesso em: 01 jul. 2010.
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, por exemplo).

Entretanto, tratava-se de resultados referentes aos primeiros esforços de implantação do novo sistema escolar e consideramos necessário dar prosseguimento ao estudo, com intenção de identificar se estas dificuldades foram superadas ou, pelo contrário, permaneceram como problemas e desafios. Uma das perguntas que nos colocávamos era: a experiência maior permitiria às professoras e às escolas encontrarem argumentos para explicar a importância de incluir atividades lúdicas no cotidiano educacional? O prosseguimento do estudo em campo nos permitiu aprofundar as reflexões e análises sobre estas questões.

As Reuniões de Pais e Mestres como Contexto para a Pesquisa

Focalizaremos neste artigo as primeiras reuniões de Pais e Mestres realizadas no ano de 2008, nas duas escolas municipais. Escolhemos estas unidades escolares porque, conforme já dissemos, vimos desenvolvendo a pesquisa em turmas de primeiros anos de ambas desde 2006. Dispúnhamos, assim, de importantes informações sobre estas duas escolas (referentes a projetos político-pedagógicos, formas de gestão, corpo docente, espaço e recursos materiais, organização e funcionamento das horas de trabalho pedagógico), sobre boa parte dos alunos e de suas famílias; poderíamos, desta forma, compreender melhor os desafios da implementação do novo EF frente aos recursos disponíveis (ou não) para enfrentá-los.

Trata-se de escolas municipais, localizadas em uma mesma região de periferia de uma cidade do interior do estado de São Paulo. Estas escolas atendem, predominantemente, a crianças de classes populares de bairros desta região. Em termos descritivos, dados censitários (IBGE, 2000IBGE . Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão Censo Demográfico 2000: Características da População e dos Domicílios: resultados do universo. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Disponível em: Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2000/default.shtm> . Acesso em: 29 dez. 2010.
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) registram que 30 a 47,6% dos responsáveis pelos domicílios têm menos de 8 anos de instrução e de 8 a 16% não têm quaisquer rendimentos. Em termos dos índices de exclusão social, esta região ocupa a 2ª posição na escala que identifica as parcelas da população mais expropriadas de seus direitos sociais no município.

De modo sintético, a partir dos resultados de 2006-2007, podemos informar que as duas escolas tiveram que enfrentar os desafios postos pela construção das primeiras experiências no novo EF, incluindo importantes limites nas condições físicas e nas orientações pedagógicas disponibilizadas para o desenvolvimento de seu trabalho; em ambas, os modos como as brincadeiras de faz de conta ocorreram configuraram um panorama preocupante (cf. Rocha, 2009ROCHA, Maria Silvia Pinto de Moura Librandi da. A Atividade Lúdica, a Criança de 6 anos e o Ensino Fundamental. Psicologia Escolar e Educacional, Campinas, v. 13, n. 2, p. 203-212, jul./dez. 2009. ; 2010ROCHA, Maria Silvia Pinto de Moura Librandi da. “Parece um Prezinho”: famílias de classes populares e o novo ensino fundamental. Psicologia em Estudo, Maringá, v. 15, n. 3, p. 487-496, jul./set. 2010.); e, por último, em ambas, os pais, mães ou responsáveis mostraram-se adeptos às atividades de alfabetização e reagiram a atividades diferentes destas - como às lúdicas - com críticas e/ou desconfiança, como ilustra a seguinte fala de uma das mães entrevistadas:

Lígia: Aí teve o problema da lição também. Eu perguntava: “Paula, cadê a lição?” “Nós fez lição, mãe”. “Paula, mas cadê a lição? A gente abre este caderno, não tem nada!!” Eu falei pra ela assim: “Ai, sua professora não está ensinando ninguém”. Eu xinguei: “Sua professora é burra!!” Mandei um bilhetão enorme para a professora. Eu queria saber. Aí a professora mandou outro bilhete, explicando o negócio da escola de 9 anos. Ai, meu deus. Ela falou que as crianças entravam agora com 6 anos, que era a escola de 9 anos, que tinha agora um projeto, que era mais devagar mesmo. Eu falei: “Então, peraí, é como se fosse uma creche?!? Porque, pra mim, isto aqui está igual a uma creche!! Parece um prezinho. Está aprendendo o que aprende numa creche, num prezinho. Era para aprender a escrever, a ler, todo aquele processo”. [...] Aí, ela [a professora] ficou conversando comigo, tentando enfiar isso na minha cabeça.

De nossa perspectiva, o material das primeiras reuniões de Pais e Mestres é especialmente produtivo para o objetivo que temos, já que: (i) trata-se de um momento privilegiado para que as professoras apresentem para os pais, pela primeira vez, o trabalho pedagógico que estão desenvolvendo/pretendem desenvolver ao longo do ano letivo; (ii) por decorrência, podemos acompanhar o que as professoras enfatizam em relação a este trabalho e identificar se e como apresentam argumentos que esclareçam a importância da inclusão no currículo de práticas menos tipicamente escolares, tais como a atividade lúdica; (iii) trata-se, também, de uma oportunidade para que mães/pais/avós ou os representantes das famílias se posicionem e apresentem suas expectativas/apreensões em relação à nova vida escolar das crianças, podendo dar visibilidade às avaliações que fazem sobre este processo6 6 Com relação ao último argumento, convém lembrar que, embora estejamos considerando que as reuniões de Pais e Mestres constituam momentos em que as famílias ou seus representantes podem se posicionar quanto a questões escolares (trabalho pedagógico, normas disciplinares, questões estruturais das escolas, entre outros aspectos), há diversos trabalhos evidenciando que nestes encontros os pais/mães ou responsáveis nem sempre se sentem à vontade, com condições ou recursos para fazê-lo, dada a assimetria das relações - nas quais as professoras tendem a ocupar posição dominante e os pais tendem a ocupar posição de subordinados (como, por exemplo, em Cunha, 2007; Marcondes; Sigolo, 2006; Silva, 2006; Paro, 1997; Carvalho; Vianna, 1994). Ainda assim, é necessário admitir que as reuniões deste tipo não deixam de ser o ponto de encontro mais tradicional entre estas duas instâncias de socialização e um dos mais importantes momentos em que os representantes das famílias podem ter voz nas escolas. .

Com o consentimento de todos os participantes das reuniões7 7 Antes do início do trabalho de campo, o projeto foi analisado e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos e, seguindo as normas da Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, todos os participantes assinaram Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. , acompanhamos os trabalhos desenvolvidos. Na Escola 1, a reunião ocorreu em 16 de abril de 2008 e o registro foi feito no diário de campo, em função de a professora solicitar que não utilizássemos o gravador.

A professora deste primeiro ano desta escola, aqui nomeada como Zélia, tem 38 anos, fez magistério, é formada em Pedagogia e leciona nesta escola há treze anos. No ano de 2008, triplicava a jornada de trabalho, lecionando todas as tardes numa pré-escola de outro município, junto a uma turma de Infantil II (5 anos), e em duas noites por semana dando aulas de Matemática para turmas do Ensino Médio.

Na Escola 2, a reunião ocorreu em 18 de abril de 20088 8 É interessante notar que as primeiras reuniões com os familiares dos alunos, em ambas as escolas, aconteceram quando o ano letivo já estava em pleno andamento, já que as aulas haviam começado em fevereiro. e foi gravada em áudio, mediante a autorização de todos; desta reunião, foram feitos também registros no diário de campo. Os excertos da reunião que focalizaremos foram protagonizados pela professora aqui nomeada como Vanda. Vanda tem 30 anos, fez curso de magistério, tem graduação em Pedagogia e pós-graduação lato sensu em Psicopedagogia. Trabalha nesta escola há 8 anos. A maior experiência desta professora é com séries de Ensino Fundamental, embora a partir do ano de 2008 tenha trabalhado também com crianças menores, da Educação Infantil. As duas professoras têm larga experiência com a docência, já que começaram a lecionar logo após o final de seus cursos de Magistério, há 20 anos no caso de Zélia e há 10 anos no caso de Vanda.

O material empírico produzido pelo acompanhamento das duas reuniões foi digitado na íntegra e lido intensivamente. Ao longo das leituras, fomos recortando as enunciações referentes a (i) estrutura geral da reunião, (ii) abordagem da atividade lúdica pelas professoras e (iii) manifestações dos familiares e/ou de seus representantes. Em seguida, retrabalhamos o material, construindo as categorias que nos pareceram mais produtivas para responder aos nossos objetivos, de modo a evidenciar (i) estrutura geral das reuniões e a abordagem da atividade lúdica pelas professoras, (ii) singularidades nas enunciações de cada uma delas e (iii) similaridades nas enunciações das duas professoras. Esta segunda categorização orientará a apresentação das análises feitas sobre o material empírico.

A seguir, abordaremos os modos específicos de condução destes encontros em cada escola. Após a apresentação dos resultados por escola, serão feitas análises comparativas entre as reuniões realizadas em cada uma delas, de modo a extrair sínteses possíveis que atendam a nosso objetivo. Os trechos em que apresentamos transcrições literais das enunciações das professoras foram recortados da digitação total do material, procurando manter a máxima fidelidade ao texto original; realizamos, porém, duas operações que, de nosso ponto de vista, permitirão que sejam lidos de modo mais fluido: suprimimos marcadores conversacionais como , então, etc. e optamos por não fazer uma transcrição fonética, isto é, grafamos as palavras conforme sua ortografia, independentemente da maneira como foram pronunciadas. Além disso, alguns trechos das enunciações não foram transcritos, seja por dificuldades de registrar tudo no diário de campo (no caso da reunião na Escola 1) seja por pequenos problemas na áudio-gravação; nestes casos, indicamos as supressões com reticências entre colchetes.

Não brinco, gosto de ensinar: a reunião na Escola 1

A reunião da Escola 1 foi coordenada pela professora Zélia e realizada na própria sala de aula. A ela, compareceram 8 mães e uma avó9 9 Esta turma de primeiro ano tem 28 crianças matriculadas. Uma mãe foi à reunião levando seu filho menor, justificando que não tinha com quem deixá-lo. Entretanto, a professora não permitiu que a criança participasse do encontro e a mãe foi embora. O pai de outra aluna foi até a escola apenas para justificar que não poderia ficar na reunião, porque precisava ir trabalhar. . A estrutura geral deste encontro foi bastante formal. Aos familiares foram designadas as carteiras usadas no dia-a-dia pelos alunos e a professora ocupou o lugar principal neste cenário, ficando em pé, à frente dos familiares. Zélia iniciou a reunião escrevendo a pauta na lousa, colocando, em lista, as palavras: Administrativa, Uniforme, Horário, Entrada dos pais na escola, Higiene, Festa da família.

Embora a atividade lúdica não aparecesse nestes tópicos, nem houvesse qualquer evidência de que se incluísse neles, ao longo da reunião a professora destaca-a, começando por dizer:

Professora Zélia: Escola de nove anos... O que é isso? São crianças de 6 anos que estariam nas escolas de Educação Infantil e vieram para a escola de Ensino Fundamental. Eu não vi ninguém da Secretaria da Educação [vir aqui] para ver se a escola tinha estrutura. Na creche tem brinquedo, parque... Aqui não temos. Simplesmente, a partir de 6 anos: no Ensino Fundamental. [...] Os professores devem brincar... Onde? Aqui, se eu for brincar, atrapalho oito salas. O dia da Educação Física e Artística eles brincam. Deixo para essas professoras brincarem. Na sala de aula, eu faço lição. Tem brinquedo, mas eu não coloco as crianças lá [refere-se a uma área externa, ao fundo da escola, onde se encontram brinquedos de parque]. Tem pregos saindo para fora, tudo quebrado. Se acontecer algo a culpa é minha, vocês não vão reclamar para a Prefeitura... É para mim. Brincar aonde? Aqui na sala? Só com os brinquedos. De vez em quando! Olhem o espaço! Só quando afasto as carteiras. Olha o pátio! Aqui nessa escola o que mais tem são anjos guardando as crianças, porque: olha as colunas! As crianças brincam aí! Quando eu vejo, me dá até um frio na barriga.

Depois de abordar outros temas, a professora volta à atividade lúdica:

Professora Zélia: Quando iniciou: [me perguntei] vou brincar onde? Então, vou ensinar a ler e escrever. Eles conheciam o alfabeto, então eu pensei: estou no lugar certo. Comecei com as famílias silábicas. [...] Eu tenho que aproveitar. Eu tenho criança lendo para quê? Eu vou parar e brincar? Vou para onde? Vou brincar onde? Não brinco, gosto de ensinar. Brincar é na Arte e Educação Física. Se vocês ouvirem: “crianças de 6 anos tem que brincar” e eu não estou [brincando]... Porque não tem lugar para isso. Vocês devem cobrar do sistema. Quando vocês vieram aqui conhecer a escola, conheceram o espaço físico? Ou foram direto para a secretaria? Então, agora temos que lutar, não podemos só reclamar. Se alguém está contra meu trabalho, vai cobrar da direção por que eu não brinco. E se vocês querem, lutem. Eu não vou ficar brava. Vocês têm que lutar para conseguir. Se ouvem do governo, vão cobrar: cadê o parque, os brinquedos?

O destaque para a atividade lúdica ocupa, aproximadamente, 6 minutos, numa reunião com duração de 1 hora. Nenhum dos familiares manifestou oposição ao que disse a professora ou fez perguntas sobre o tema.

Nós temos as brincadeiras dirigidas aqui na escola: a reunião na Escola 2

A reunião na Escola 2 foi coordenada pelas professoras Vanda e Cássia - que agruparam suas turmas. A estrutura geral da reunião da Escola 2, no que se refere ao lugar ocupado pelas mães10 10 Compareceram à reunião 41 mães, do total de 57 alunos. , foi bastante semelhante à da Escola 1. A reunião também ocorreu numa sala de aula, as professoras mantiveram-se de pé durante todo o tempo e as mães sentaram-se nas carteiras, que estavam dispostas em semi-círculo. Da mesma forma que na Escola 1 havia na lousa uma lista dos tópicos que seriam abordados durante o encontro, em que se podia ler: Projetos, Brincadeiras, Apostila, Níveis de escrita, Biblioteca de Classe, Lição de casa, Caderno de Recados, Material Escolar, Uniforme e, por último, Faltas. Entretanto, um recurso pouco usual foi incluído como suporte para a reunião: um equipamento de multimídia, com o qual as professoras apresentaram fotografias das crianças em atividades na escola, ilustrando de modo rico e interessante alguns pontos de suas falas. Além disso, as crianças foram convidadas a participar: as mães foram instruídas (por aviso no caderno de recados) a trazerem-nas para o encontro. As professoras organizaram seus alunos sentando-os em roda, no chão e ao centro da sala e do semicírculo formado pelas cadeiras ocupadas pelas mães, de modo que todas podiam vê-los. Durante a parte inicial da reunião, os alunos foram reproduzindo atividades rotineiras em sua turma, feitas na roda de conversa. A professora Vanda leu uma história, comentou-a com os alunos, pediu que fizessem relações entre o conteúdo da história e suas próprias vivências, convidou alguns deles para escreverem na lousa palavras da rotina do dia. Ao longo da reunião, as professoras Vanda e Cássia se revezaram na apresentação dos tópicos listados na pauta. O tema das brincadeiras coube à professora Vanda. Ela o introduz dizendo que iria apresentar “como funciona esta coisa das brincadeiras. A seguir, explica melhor.

Professora Vanda: Nós temos as brincadeiras dirigidas aqui na escola. Quais são estes momentos? As brincadeiras tradicionais, pular corda. Muitas crianças chegam na escola, têm medo da corda, não sabem pular. Então, na hora do intervalo, eu acompanho o intervalo das crianças, tem a corda para eles pularem. Tem outros momentos durante o dia que a gente sai com a criançada para brincar, brincar com estas brincadeiras tradicionais. Tem os brinquedos de sala, material de encaixe. Lego, quebra-cabeça, tem dominó, tem damas... São jogos que eles usam quando terminam a atividade e ficam livres para estarem escolhendo qual jogo querem estar fazendo na sala. O parque é outro momento de atividade de brincadeira livre. Nós vamos duas vezes por semana, às 10h, até o horário da saída. E a brincadeira do faz de conta, que são brinquedos que a escola tem, que foram comprados desde o final do ano passado e que as crianças brincam de casinha, de carrinho, de outras brincadeiras que surgem aí na brincadeira. Nós, professoras, acompanhamos estes momentos. Como as crianças estão brincando, o que que elas falam nas brincadeiras, o que que surge de brincadeiras com estes brinquedos. Só para ilustrar... [a professora apresenta algumas fotos das crianças no telão]. São algumas brincadeiras do parque. Escorregador, gira-gira, a tiroleza que é a sensação aqui da escola...

A seguir, a professora aborda o tema Apostila. Mostra alguns exercícios de Matemática feitos com este material e volta aos jogos e brincadeiras:

Professora Vanda: E brincadeiras com número. A gente faz também sessões de jogos, jogos que envolvem contagem, soma de dados, soma de pontos, para a gente estar trabalhando situações concretas para a criança. Porque a situação de jogo, para a criança, é muito concreta, muito real. Então, a gente trabalha com estes conceitos matemáticos nos jogos.

O tema atividade lúdica ocupou 10 minutos, numa reunião mais longa, com 2 horas de duração. Durante toda a apresentação não ocorreram manifestações das mães. Terminada a parte coletiva, foram entregues os relatórios individuais de avaliação das crianças. A temática das brincadeiras e jogos não foi retomada pelos participantes.

Certamente, existem múltiplas possibilidades de análises a partir destas enunciações das professoras. A seguir, apresentamos alguns destaques. Nossa intenção com este trabalho analítico é buscar identificar pontos sobre os quais nos parece necessário refletirmos, num esforço de colaboração para a construção de um EF com qualidade educacional.

Singularidades das Enunciações: ausência/presença das brincadeiras nas escolas

As enunciações da professora Zélia explicitam tensões e ambiguidades experimentadas em relação ao novo EF. Nelas, há pistas de que - de sua perspectiva - o lugar mais adequado para as crianças de 6 anos seriam as unidades de Educação Infantil, destacando a existência de brinquedos e parque neste segmento educacional, contraposta à ausência destes recursos nas escolas de EF. Este aspecto é importante porque, embora de modo indireto (e apesar da contundência do discurso e de outros argumentos que apresenta para justificar a escassez de brincadeiras e os investimentos na alfabetização), sugere que a professora não considera a atividade lúdica como irrelevante. Além disso, a frase “Simplesmente, a partir de 6 anos: no Ensino Fundamental [...]” sintetiza a forma como vê a implantação do novo sistema de ensino: uma ordem, uma decisão vertical, sem preparação e/ou participação dos envolvidos, sem a construção das condições básicas necessárias para a sua efetivação. Assumir que não há brincadeiras no cotidiano escolar de seus alunos não parece ser feito a partir de posição confortável por parte de Zélia. Nossa presença em campo nos permite dizer que os argumentos que apresenta são todos verdadeiros: “[...] o sistema e/ou o governo não foi ver se a escola tinha estrutura”, os pais quando foram conhecer a escola “foram direto para a Secretaria” (ao menos não manifestaram insatisfação com as condições físicas da escola), os brinquedos de parque que a escola recebeu estão com “[...] pregos saindo para fora, tudo quebrado [...]”, a área livre que existe à frente das salas de aula é um longo corredor acimentado, com 4 metros de largura entre o alambrado que cerca a escola e todas as salas de aula, com colunas em toda a sua extensão. Este é o pátio em que as crianças ficam brincando, no período de recreio. Portanto, é também verdadeiro que se as crianças brincarem nesta área durante o período de aula, o barulho “atrapalh[ará] oito salas”. Estes argumentos encaminham a professora para duas conclusões/soluções: “Brincar é na Arte e Educação Física” e “Então, vou ensinar a ler e escrever”. Mas, é importante destacar que estas conclusões/soluções não parecem plenamente satisfatórias para Zélia, já que os enunciados “[...] cobrar do sistema, temos que lutar, não podemos só reclamar, cobrar da direção, Vocês têm que lutar para conseguir. Se ouvem do governo, vão cobrar: cadê o parque, os brinquedos?” intercalam-se na apresentação das justificativas para não brincar.

Estes verbos lutar, reclamar, cobrar não aparecem no que diz a professora Vanda. Mas, é importante informar que a aquisição dos brinquedos foi consequência “[...] de tanto a gente atormentar o diretor. Conseguimos uma gangorra, um escorregador e um balanço, que devem estar chegando agora” (entrevista com a professora em 2006). Esta estratégia e a parceria com os pais no Conselho de Escola foram referidos (nas entrevistas de que participou a professora em 2006-2007) como cruciais na luta para a aquisição do material listado por Vanda na reunião.

As diferenças em termos de estratégias, de recursos e condições materiais para as brincadeiras e das formas de inserção destas práticas (“[...] nas aulas de Arte e Educação Física, no intervalo, quando terminam a atividade, no parque duas vezes por semana, às 10h, até o horário da saída, nas sessões de jogos matemáticos”) nos permitem destacar que a implantação/implementação do EF de 9 anos na rede pública deste município não deve ser entendida como um processo homogêneo, mesmo quando se trata de duas escolas muito próximas, sob supervisão de um mesmo núcleo pedagógico-administrativo regional e da mesma Secretaria Municipal de Educação.

Mas, apesar destas diferenças, há proximidades entre estas duas realidades e estes dois discursos: a timidez de argumentos sobre a importância de que as crianças brinquem. Esta semelhança será tratada no próximo tópico.

Similaridade nas Enunciações: por que é importante que as crianças brinquem?

O trabalho analítico nos permite dizer que Vanda e Zélia - cada uma a seu modo - incluem nas suas enunciações os temas (i) crianças precisam brincar e (ii) há orientações para que as professoras e as escolas de EF assumam compromissos em relação a esta assertiva. Mas, consideramos relevante apresentar algumas problematizações em relação aos modos como o fazem.

A professora Zélia apresenta estes temas através de prescrições genéricas “Os professores devem brincar..., Se vocês ouvirem: crianças de 6 anos têm que brincar [...]” e desenvolve sua argumentação acentuadamente na direção de explicar as razões pelas quais estas prescrições não se materializam no cotidiano de sua turma, enfatizando questões relativas ao espaço e aos recursos materiais disponíveis.

A professora Vanda destaca a presença das brincadeiras no cotidiano de sua turma, mas focaliza tipos de brincadeiras (“pular corda, brincar de casinha, brincadeiras de faz de conta”), materiais disponíveis (“[...] tem os brinquedos de sala, material de encaixe, Lego, quebra-cabeça, dominó, damas, carrinho, escorregador, gira-gira, tiroleza”), lugares e tempos ocupados com esta prática na agenda escolar. Com exceção dos jogos matemáticos, no uso dos quais aponta as oportunidades criadas para as crianças aprenderem e utilizarem habilidades de “contagem, soma de dados, soma de pontos”, no mais das vezes Vanda apenas enumera de que, com o que, onde e quando as crianças podem brincar.

Sobre a importância das brincadeiras, sobre suas contribuições para diversos processos psicológicos no desenvolvimento infantil - mencionados na introdução deste artigo -, sobre suas possíveis relações com as aprendizagens tipicamente escolares, sobre evoluções/complexificações que pudessem ser notadas nas formas de brincar das crianças, nada é dito nas reuniões. Ou seja, elementos relacionados ao como as crianças brincam, e possíveis transformações neste âmbito, não são considerados dignos de nota pelas professoras participantes do estudo, no contexto das reuniões. Ressaltemos, por fim, que os jogos de faz de conta não são destacados no que diz Zélia e são referidos pela professora Vanda como “[...] os brinquedos que a escola tem, que foram comprados desde o final do ano passado e que as crianças brincam de casinha, de carrinho, de outras brincadeiras que surgem aí na brincadeira”.

Se, por um lado, consideramos necessário valorizar o fato de ambas as professoras terem reservado uma parte do tempo das reuniões para falarem sobre a atividade lúdica - o que, seguramente, representa uma novidade em encontros deste tipo no EF -, por outro, o encaminhamento dado por elas na abordagem deste tema revela concepções pouco elaboradas, aderidas a espaço físico e materiais, que entendemos ser importante problematizar.

É certo que a problemática da inclusão das brincadeiras no currículo foi posta recentemente para os profissionais do EF, o que, por si só, ajudaria a compreender limites nos argumentos apresentados. Mas, também precisamos lembrar que (i) não é a primeira experiência que as duas professoras têm com os primeiros anos do novo EF; (ii) ambas compartilham larga experiência com famílias de classes populares e, portanto, muito provavelmente conhecem a forte tendência de familiares destes grupos operarem segundo a lógica da eficácia; (iii) as duas professoras têm experiência profissional na Educação Infantil e dobravam suas jornadas de trabalho, no ano da pesquisa, como docentes em pré-escolas, contexto educacional em que, tradicionalmente, é reconhecida a importância da atividade lúdica na sua composição curricular. Estas três particularidades, em tese, deveriam contribuir para a explicitação de concepções mais aprofundadas sobre a atividade lúdica. Mas isso não parece ocorrer. Sendo assim, o que poderia explicar a baixa densidade de seus argumentos?

Entre outras explicações, consideramos plausível a seguinte: apesar da extensa literatura acadêmica sobre os importantes significados que as brincadeiras têm no desenvolvimento infantil, estas produções e/ou estes significados podem ainda não ter sido apropriados por professores, mesmo pelos que trabalham na Educação Infantil. De nossa perspectiva, esta possível explicação precisa ser avaliada de modo cuidadoso, o que requererá fazer novos recortes no material empírico (colocando o que aqui foi analisado em relação ao que observamos no cotidiano escolar e ao que foi registrado nas entrevistas com as professoras), mas, também, ir à busca de interlocução com estudos feitos com outras professoras, em outros contextos educativos, a fim de identificar sua pertinência e amplitude.

Considerações Finais

O acompanhamento das duas reuniões de Pais e Mestres permitiu-nos encontrar elementos importantes para responder à pergunta que nos instigou a continuar o nosso trabalho. Embora se trate de apenas duas professoras, consideramos significativo apontar que, nestes dois casos, os argumentos sobre a pertinência de inclusão da atividade lúdica no cotidiano escolar mostraram-se tênues. Em síntese, podemos dizer que estas professoras estabelecem forte relação entre os termos brincar, criança, brinquedos e espaço o que, claro, faz sentido. Entretanto, identificamos também o silêncio das professoras sobre as possibilidades de fortes relações entre os termos atividade lúdica, faz de conta e a constituição/desenvolvimento de processos psicológicos. As formas como esta atividade foi abordada nos encontros dão pistas sobre as concepções que as professoras participantes de nosso estudo têm sobre ela.

Pelas argumentações apresentadas podemos deduzir formas de compreensão sobre a capacidade de brincar que tendem para a sua naturalização, na medida em que as professoras não mencionam - de modo mais preciso - qual papel deveriam assumir em relação a sua constituição e desenvolvimento. As professoras falam sobre a importância das brincadeiras, reconhecem que a sua ocorrência no contexto escolar depende delas oportunizarem-na, mas não reconhecem que suas participações nas brincadeiras poderiam/deveriam torná-las mais complexas, fazê-las avançar. No caso da professora Vanda, esta posição parece incidir mais fortemente sobre o faz de conta, na medida em que, se em relação a outras modalidades de atividade lúdica ela informa assumir papel mais ativo, quando se trata das brincadeiras deste tipo, ela informa assumir papel de espectadora, acompanha[ndo] estes momentos.

Importa notar que, em relação às duas formas de construção dos textos das reuniões que destacamos acima - ênfases sobre determinadas relações e silenciamento sobre outras -, os familiares presentes não se manifestam, nem com oposições, nem com questionamentos. Todos os elementos empíricos de que dispomos nos induzem a concluir que as reuniões acompanhadas tiveram pouco, ou possivelmente nenhum, impacto sobre os modos como, corriqueiramente, os pais analisam a inclusão de atividades lúdicas no cotidiano escolar.

Certamente o terreno das argumentações sobre a importância das brincadeiras para o desenvolvimento infantil - em especial as de faz de conta -, é delicado e apresenta grandes desafios. A possibilidade de se derivar para concepções utilitaristas e pedagogizantes destas práticas é um risco constante. Entretanto, parece-nos que, para o enfrentamento às oposições dos pais, para o seu convencimento sobre a relevância das garantias assumidas no projeto do EF, é necessário darmos alguns passos a mais e, além da luta pela construção de condições materiais indispensáveis para que isto ocorra, temos que aprofundar nossas explicações sobre por que é importante que o currículo seja construído incluindo possibilidades de as crianças brincarem.

Enfatizar as inter-relações entre imaginação e cognição, o imbricamento entre os processos psicológicos colocados em ação no faz de conta e os exigidos nas práticas de produção de narrativas, no processo de elaboração de conceitos científicos, pode se configurar uma estratégia promissora para aproximar os familiares de uma posição mais consciente sobre a importância destas inovações na cultura escolar.

Certamente, também, não cabe às professoras elaborarem estes argumentos num trabalho solitário. Entendemos que todos nós, comprometidos com a construção de uma infância e escola de qualidade, devemos estar implicados neste processo, sobretudo no que se refere à proposição do tema nos espaços de formação docente. É indispensável dizer que tal implicação é extensiva aos gestores que ocupam os cargos em que se definem e decidem as condições concretas dadas para esta formação. Sem isso, a proposição oficial do “[...] brincar como uma das prioridades de estudo nos espaços de debates pedagógicos, nos programas de formação continuada, nos tempos de planejamento [...]” (Brasil, 2006bBRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Secretaria de Educação Básica. Ensino Fundamental de Nove Anos: orientações para a Inclusão da Criança de Seis Anos de Idade. Brasília, MEC , 2006b., p. 11) corre sérios riscos de ficar reduzida à mera retórica e a atividade lúdica de permanecer (na melhor das hipóteses) nas brechas da agenda escolar, nas sobras de tempo.

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Notas

  • 1
    Ao longo deste artigo, adotamos a grafia Vigotski, por ser, atualmente, a mais frequente em trabalhos brasileiros. Entretanto, em casos de citações de obras específicas, respeitamos o modo como o sobrenome deste autor foi grafado na publicação.
  • 2
    É necessário, neste ponto, fazer uma ressalva: embora a teoria Histórico-cultural e obras de Vigotski sejam frequentemente mencionadas nos documentos como uma de suas referências teóricas, não é incomum que neles existam concepções sobre a atividade lúdica que sejam contraditórias em relação a este modelo teórico. Por exemplo, no excerto citado na página anterior, a afirmação de que o brincar é da natureza de ser criança contradiz uma das teses de Vigotski, em que afirma a não existência de uma natureza genérica das crianças e/ou de características infantis definidas a priori, in abstrato e imanentes à sua natureza (presente em toda a sua obra e explicitada, por exemplo, em Vygotsky, 1995VYGOTSKI, Lev Semenovich. Obras Escogidas. Madrid: Visor, v. 3, 1995.). Especificamente em relação à não naturalidade da capacidade de brincar e à sua constituição e desenvolvimento dependentes das relações sociais de que a criança toma parte, a obra de Elkonin (1998ELKONIN, Donald B. Psicologia do Jogo. Martins Fontes: São Paulo, 1998.) é uma excelente referência. Essa e outras contradições foram discutidas de modo mais detalhado em outro artigo de nossa autoria (Rocha, 2007ROCHA, Maria Silvia Pinto de Moura Librandi da. O Ensino de Psicologia e a Educação Infantil: a nova política pública para a Educação Infantil e o Ensino Fundamental e suas possíveis repercussões para o desenvolvimento psicológico infantil. Educação Temática Digital, Campinas, v. 8, p. 266-277, jun. 2007. ).
  • 3
    Convém informar que Liublinskaia não faz referências explícitas aos trabalhos de L. S. Vigotski na obra acima mencionada. Entretanto, estuda o jogo do faz de conta a partir dos mesmos pressupostos vigotskianos (da não-naturalidade de sua constituição e desenvolvimento, de suas relações intrínsecas com o real, das contribuições revolucionárias desta atividade para o desenvolvimento psicológico e de sua fertilidade pedagógica).
  • 4
    Referimo-nos às entrevistas realizadas na primeira etapa da pesquisa (2006-2007) com 58 familiares (52 mães, 4 pais e 2 avós) e com as 8 professoras participantes - estas em dois momentos, no início do segundo semestre e ao final do ano letivo de 2006. Da segunda etapa (2008-2009), estamos considerando as entrevistas feitas com as 4 professoras participantes. O prosseguimento desta etapa incluiu a realização de outras entrevistas com familiares (mais 38, no total), mas o conteúdo destas não está sendo objeto de análise neste artigo. Análises mais aprofundadas sobre as avaliações dos familiares sobre o novo EF foram abordadas em outro artigo (Rocha, 2010ROCHA, Maria Silvia Pinto de Moura Librandi da. “Parece um Prezinho”: famílias de classes populares e o novo ensino fundamental. Psicologia em Estudo, Maringá, v. 15, n. 3, p. 487-496, jul./set. 2010.).
  • 5
    Embora a lógica da eficácia seja um conceito construído a partir de análises sobre as relações entre escola e famílias de classes populares, oposições a inovações curriculares (sobretudo nos casos de inclusão de práticas menos explicitamente vinculadas a conhecimentos escolares) não são exclusivas destes grupos; estas oposições são também, frequentemente, encontradas nas relações entre escola e famílias pertencentes a extratos melhor providos economicamente.
  • 6
    Com relação ao último argumento, convém lembrar que, embora estejamos considerando que as reuniões de Pais e Mestres constituam momentos em que as famílias ou seus representantes podem se posicionar quanto a questões escolares (trabalho pedagógico, normas disciplinares, questões estruturais das escolas, entre outros aspectos), há diversos trabalhos evidenciando que nestes encontros os pais/mães ou responsáveis nem sempre se sentem à vontade, com condições ou recursos para fazê-lo, dada a assimetria das relações - nas quais as professoras tendem a ocupar posição dominante e os pais tendem a ocupar posição de subordinados (como, por exemplo, em Cunha, 2007CUNHA, Marcus Vinicius da. A Escola Contra a Família. In: 500 Anos de Educação no Brasil. Belo Horizonte: Autêntica. 2007. p. 447-468.; Marcondes; Sigolo, 2006MARCONDES, Keila Hellen Barbato Marcondes; SIGOLO, Silvia Regina Ricco Lucato. A Relação entre a Família e a Escola no Contexto de Progressão Continuada. In: REUNIÃO ANUAL DA ANPED, 29., Caxambu, 2006. Anais... Disponível em: Disponível em: <http://www.anped.org.br/reunioes/29ra/trabalhos/trabalho/GT20-2173--Int.pdf> . Acesso em: 02 mar. 2010.
    <http://www.anped.org.br/reunioes/29ra/t...
    ; Silva, 2006SILVA, Graziela Lucchesi Rosa da. Psicologia Educacional e Arte Literária: interlocuções para a compreensão dos laços familiares e escolares na atualidade. In: REUNIÃO ANUAL DA ANPED, 29. Caxambu, 2006. Anais... Disponível em: Disponível em: <http://www.anped.org.br/reunioes/29ra/trabalhos/trabalho/GT20-2437--Int.pdf> . Acesso em: 02 mar. 2009.
    <http://www.anped.org.br/reunioes/29ra/t...
    ; Paro, 1997PARO, Vitor Henrique. Gestão Democrática da Escola Pública. São Paulo: Ática, 1997.; Carvalho; Vianna, 1994CARVALHO, Marília P.; VIANNA, Cláudia P. Educadoras e Mães de Alunos: um (Des)Encontro. In: BRUSCHINI, Cristina; SORJ, Bila (Org.). Novos Olhares: mulheres e relações de gênero no Brasil. São Paulo: Marco Zero; Fundação Carlos Chagas, 1994. P. 133-158.). Ainda assim, é necessário admitir que as reuniões deste tipo não deixam de ser o ponto de encontro mais tradicional entre estas duas instâncias de socialização e um dos mais importantes momentos em que os representantes das famílias podem ter voz nas escolas.
  • 7
    Antes do início do trabalho de campo, o projeto foi analisado e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos e, seguindo as normas da Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, todos os participantes assinaram Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
  • 8
    É interessante notar que as primeiras reuniões com os familiares dos alunos, em ambas as escolas, aconteceram quando o ano letivo já estava em pleno andamento, já que as aulas haviam começado em fevereiro.
  • 9
    Esta turma de primeiro ano tem 28 crianças matriculadas. Uma mãe foi à reunião levando seu filho menor, justificando que não tinha com quem deixá-lo. Entretanto, a professora não permitiu que a criança participasse do encontro e a mãe foi embora. O pai de outra aluna foi até a escola apenas para justificar que não poderia ficar na reunião, porque precisava ir trabalhar.
  • 10
    Compareceram à reunião 41 mães, do total de 57 alunos.

Notas

  • *
    Maria Silvia Pinto de Moura Librandi da Rocha é doutora em Educação pela Unicamp. Pesquisadora do Grupo de Pesquisa Formação e Trabalho Docente, na linha de pesquisa Formação de Professores e Práticas Pedagógicas. Professora permanente do Programa de Pós-Graduação em Educação da Pontifícia Universidade Católica de Campinas.
  • **
    Marina Leme Pasqual é graduada em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas. Desenvolveu pesquisa de iniciação científica sob orientação da primeira autora.
  • ***
    Mayara Carrijo Ferreira é graduada em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas. Desenvolveu pesquisa de iniciação científica sob orientação da primeira autora.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Abr 2012

Histórico

  • Recebido
    01 Jul 2010
  • Aceito
    01 Nov 2010
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