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As Singularidades das Crianças Pequenas Expressas nas suas Brincadeiras

The Singularities of Young Children Manifested in their Play Time

RESUMO

Ao contextualizar no sistema educacional a homogeneização das vivências de seus sujeitos, que desvaloriza suas particularidades, este artigo problematiza as manifestações das singularidades das crianças pequenas em momentos de brincadeira. Objetivou-se compreender como tais manifestações ocorrem, considerando a singularidade das crianças pequenas em suas brincadeiras, compreendendo a diversidade do seu repertório cultural, identificando seus aspectos particulares e suas significações nesses momentos. Realizaram-se observações participantes com um grupo de dezenove crianças com quatro anos de idade, durante oito encontros. Os registros de diário de campo permitiram a análise das vivências das crianças, assim como a manifestação de diversos elementos singulares durante as brincadeiras, as quais são intimamente associadas ao contexto social em que os sujeitos estão inseridos.

Palavras-chave
Singularidade; Crianças Pequenas; Brincadeiras

ABSTRACT

By contextualizing the homogenization of the subject’s experiences in the educational system, which devalues their particularities, this article examines the manifestations of the peculiarities of small children during play time. The aim of the study is to how such manifestations happen, considering the diversity of their cultural repertoire, identifying their particular aspects and their meanings in these moments. Participant observations were held with a group of nineteen children aged four years old during eight meetings. The field diary records allowed the analysis of the children’s experiences, as well as the expression of several singular elements during the games, which are closely tied to the social context in which individuals are embedded.

Keywords
Singularity; Small Children; Games

Propõe-se investigar, neste artigo, a manifestação das singularidades infantis nos momentos de brincadeiras das crianças pequenas, visto que suas características particulares, em geral, não são reconhecidas nem valorizadas. Há uma tendência em camuflar os diferentes processos de singularização e, assim, de subjetivação, homogeneizando e uniformizando os indivíduos de acordo com um padrão imposto pela sociedade. Nas instituições de educação infantil, as crianças estão cada vez mais sendo instruídas por suas professoras a silenciar e a não se movimentar (Finco, 2003FINCO, Daniela. Relações de Gênero nas Brincadeiras de Meninos e Meninas na Educação Infantil. Pró-Posições. Dossiê educação infantil e gênero, Campinas, Universidade Estadual de Campinas, v. 14, n. 3, p. 89-101, set./dez. 2003. ; 2007). Rosa Batista (2004BATISTA, Rosa. Cotidiano da Educação Infantil: espaço acolhedor de emancipação das crianças. In: III SEMINÁRIO DE EDUCAÇÃO INFANTIL - Refletindo as Questões Atuais da Educação Infantil, 2004, Criciúma. Anais... Criciúma: AFASC, 2004.) aponta que as professoras da educação infantil entendem que o planejamento das propostas são atividades pedagógicas direcionadas ao mesmo tempo para todo grupo de crianças, o que impossibilita a sua manifestação espontânea, desvalorizando seus processos de singularização e de subjetivação.

De acordo com a Psicologia Sócio-Histórica, perspectiva aqui adotada, as interações sociais configuram significativa importância no desenvolvimento do ser humano. Conforme afirma Rego (1995REGO, Teresa Cristina. Vygotsky: uma perspectiva histórico-cultural da educação. Petrópolis: Vozes, 1995., p. 57-58), o homem não pode ser compreendido somente por seu aparato biológico, pois esse aspecto inato “[...] não é suficiente para produzir o indivíduo humano, na ausência do ambiente social”. Desta forma, as características pessoais, singulares de cada sujeito, são dependentes da interação do homem com seu meio, tanto físico quanto social e cultural. Vale ressaltar que esta relação sujeito-ambiente não se dá de maneira unidirecional, pelo contrário, há uma reciprocidade nessas interações.

A concepção Sócio-Histórica, segundo Aguiar (2005AGUIAR, Maira Pêgo de. Adolescentes e Autoconceito: um estudo sobre a constituição social e histórica da subjetividade no contexto escolar. 2005. Disponível em: Disponível em: http://www.anped.org.br/reunioes/28/textos/gt20/gt20464int.rtf . Acesso em: 01 abr. 2009.
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, p. 4), define a singularidade/subjetividade “[...] como sendo um campo construído socialmente que se expressa, porém, no plano individual, no plano das crenças, valores e comportamentos individuais”. O processo de constituição do sujeito, nessa perspectiva, ocorre por meio de uma configuração social subjetiva, isto é, o sujeito como um ser particular recebe pronta a base cultural no processo de socialização em que está inserido, mas também é considerado ativo nesta cultura, agindo como um sujeito de transformação social mesmo não tendo consciência disso. Então, conforme a mesma autora, a singularidade é designada pela vida social e também designa o próprio desenvolvimento do sujeito. Subjetividade é um termo utilizado na contemporaneidade para designar o que se denominava ser humano ou psiquismo (Grinspun; Azevedo, 2000GRINSPUN, Mírian P. Sabrosa Zippin; AZEVEDO, Nyrma. Subjetividade, Contemporaneidade e Educação: a contribuição da psicologia da educação. 2000. Disponível em: Disponível em: http://www.anped.org.br/reunioes/23/textos/2036t.PDF . Acesso em: 11 abr. 2009.
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). A concepção de homem dá-se por meio da relação sujeito-objeto, ou seja, através de suas interações com o mundo. Assim, o ser humano é constituído em sua relação com outro sujeito a qual se constrói por um sujeito psíquico, que possui sua própria história e características individuais, e por um sujeito social, produto e produtor de história social e cultural. Peruzzo (2000PERUZZO, Rosária Sperotto. Novos Modos de Subjetivação na Infância: multiplicidades de percursos, de trajetos e devires? 2000. Disponível em: Disponível em: http://www.anped.org.br/reunioes/23/textos/2005t.PDF . Acesso em: 15 abr. 2009.
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, p. 3) considera o processo de constituição da subjetividade como sendo inúmeros devires que “[...] se encadeiam, misturam-se uns aos outros compondo linhas de reflexão, de invenção, bem como facilitam novos acoplamentos, aprendizagens e subjetivações”. Assim, a singularidade de cada ser humano está em constante transformação e reconstrução.

Diante do exposto, considera-se aqui a singularidade/subjetividade como “[...] experiência de si e como expressão de um conteúdo social que está à disposição dos sujeitos e que é construído historicamente (dependente de suas determinações)” (Furtado, 2007FURTADO, Odair. O Psiquismo e a Subjetividade social. In: BOCK, Ana Mercês Bahia; GONÇALVES, Maria da Graça Marchina; FURTADO, Odair (Org.). Psicologia Sócio-histórica: uma perspectiva crítica em psicologia. 3. ed. São Paulo: Cortez , 2007. p. 75-93., p. 87). A singularidade/subjetividade se organiza em uma unidade dialética entre o indivíduo e o meio no qual está inserido, através do estabelecimento de relações recíprocas, expressando-se das mais variadas formas. A brincadeira é uma das maneiras de manifestação das singularidades expressas na contemporaneidade, especialmente das crianças.

Perante essas considerações, norteou-se o foco desta pesquisa suscitando sua questão central: como se dá a manifestação da singularidade das crianças pequenas nas suas brincadeiras? Para tanto, objetivou-se compreender como ocorre essa manifestação, verificando a diversidade do repertório cultural nas brincadeiras e identificando os aspectos particulares e as significações de cada criança. Há que se levar em consideração a concepção de infância não como um período comum a todas as crianças, como afirmam Coutinho (2002COUTINHO, Ângela Scalabrin. As Crianças no Interior da Creche: a educação e o cuidado nos momentos de sono, higiene e alimentação. 2002. Dissertação (Mestrado em Educação) - Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2002. ), Batista, Cerisara, Oliveira e Rivero (2004BATISTA, Rosa; CERISARA, Ana Beatriz; OLIVEIRA, Alessandra Mara Rotta de; RIVERO, Andréa Simões. Partilhando Olhares sobre as Crianças Pequenas: reflexões sobre o estágio na educação infantil. In: 12º ENCONTRO DE PRÁTICA DE ENSINO (ENDIPE): Conhecimento Local e Conhecimento Universal, 2004, Curitiba. Anais... Curitiba: 2004. 1 CD- Room. ), Batista (2004BATISTA, Rosa. Cotidiano da Educação Infantil: espaço acolhedor de emancipação das crianças. In: III SEMINÁRIO DE EDUCAÇÃO INFANTIL - Refletindo as Questões Atuais da Educação Infantil, 2004, Criciúma. Anais... Criciúma: AFASC, 2004.) e Finco (2007), mas sim como uma diversificação de infâncias. Porém, percebe-se uma desconsideração da heterogeneidade no contexto da educação infantil, que preza pela ordem e disciplina, atuando como um instrumento normatizador, vigiando e controlando as crianças, especialmente seus corpos.

Faz-se necessário considerar a pluralidade das crianças e rever a posição do adulto no âmbito da educação infantil, retirando sua centralidade e permitindo que os pequenos vivenciem esse espaço como protagonistas de suas experiências. Um dos Fundamentos Norteadores das Diretrizes para a Educação Infantil destaca os “Princípios Estéticos da Sensibilidade, da Criatividade, da Ludicidade e da Diversidade de Manifestações Artísticas e Culturais” (Rocha, 2008ROCHA, Eloisa Acires Candal. Diretrizes Educativas para a Educação Infantil. Palestra proferida no Simpósio sobre Formação de Professores: infância e linguagens em debate - I SIMFOP-UNISUL, Campus Regional Sul/Tubarão, jul. 2008., p. 2, grifo da autora). Nestes princípios, identifica-se a valorização das múltiplas linguagens infantis, consideradas como uma função simbólica representativa das relações culturais compartilhadas pelas crianças, e as próprias relações culturais e sociais, concebendo a criança como um sujeito sociocultural, respeitando suas diversidades e sua pluralidade de produções e manifestações culturais.

Atualmente, a infância é concebida como uma construção social e, desta forma, percebe-se a criança como um ator social, participante ativo da sua sociedade e cultura. Assim, os pequenos possuem suas próprias culturas que são aprendidas, reproduzidas e, ao mesmo tempo, produzidas, atribuindo-lhes características peculiares à infância, como afirmam Sarmento (2004SARMENTO, Manuel Jacinto. As Culturas da Infância nas Encruzilhadas da Segunda Modernidade. In: CERISARA, Ana Beatriz; SARMENTO, Manuel Jacinto (Org.). Crianças e Miúdos: perspectivas sociopedagógicas da infância e educação . Portugal: ASA Editores , 2004. p. 9-34.) e Martins Filho (2005MARTINS FILHO, Altino José. Culturas da Infância: traços e retratos que as diferenciam. In: MARTINS FILHO, Altino José (Org.). Criança pede Respeito: temas em educação infantil. Porto Alegre: Mediação, 2005. p. 13-27.). O reconhecimento da existência de uma cultura infantil foi afirmado por Florestan Fernandes, em 1947. Segundo esse sociólogo, a cultura infantil é “[...] construída de elementos culturais quase exclusivos das crianças e caracterizados por sua natureza lúdica” (Delgado, 2006DELGADO, Ana Cristina Coll. Culturas Infantis, Tensões e Negociações entre Adultos e Crianças numa Creche Domiciliar. Currículo sem Fronteiras, v. 6, n. 1, p. 82-102, jan./jun. 2006. Disponível em: Disponível em: http://www.curriculosemfronteiras.org/vol6iss1articles/delgado.pdf . Acesso em: 10 nov. 2010.
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, p. 91). Dentre alguns elementos observados por Fernandes como constitutivos da cultura folclórica infantil encontram-se as brincadeiras, os jogos, as cantigas de roda, entre outros. No entanto, autores como James, Prout e Jenks criticam a temática da autonomia das culturas infantis, questionando: “[...] é possível falar separadamente de um mundo cultural da infância? Se houver concordância com essa afirmação, como compreender as culturas infantis?” (Borba, 2006BORBA, Angela Meyer. As Culturas da Infância nos Espaços-tempos do Brincar: estratégias de participação e construção da ordem social em um grupo de crianças de 4-6 anos. 2006. Disponível em: Disponível em: http://www.anped.org.br/reunioes/29ra/trabalhos/trabalho/GT07-2229--Int.pdf . Acesso em: 10 dez. 2010.
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, p. 3). Estes autores apresentam duas vertentes acerca dessas questões: a cultura infantil se manifesta de maneiras culturais diferenciadas, denominadas brincadeiras; e a cultura da infância é considerada de forma mais ampla, contemplando todos os contextos sociais cotidianos vivenciados pelos pequeninos.

James, Prout e Jenks reconhecem, nos mais diversos estudos realizados com crianças, que as vivências da infância apresentam especificidades distintas da cultura do adulto. Ou seja, a cultura infantil se mostra diferente da cultura adultocêntrica. Esses autores sugerem que “[...] talvez o que vimos chamando de culturas infantis exista apenas nos espaços e tempos nos quais as crianças têm algum grau de poder e controle”, como afirma Borba (2006BORBA, Angela Meyer. As Culturas da Infância nos Espaços-tempos do Brincar: estratégias de participação e construção da ordem social em um grupo de crianças de 4-6 anos. 2006. Disponível em: Disponível em: http://www.anped.org.br/reunioes/29ra/trabalhos/trabalho/GT07-2229--Int.pdf . Acesso em: 10 dez. 2010.
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, p. 4). As situações e momentos de poder e controle referidos seriam os pátios e parques das instituições de educação infantil e os tempos considerados livres para as crianças dentro da rotina criada pelo adulto. As culturas infantis, na perspectiva de Corsaro (Borba, 2006BORBA, Angela Meyer. As Culturas da Infância nos Espaços-tempos do Brincar: estratégias de participação e construção da ordem social em um grupo de crianças de 4-6 anos. 2006. Disponível em: Disponível em: http://www.anped.org.br/reunioes/29ra/trabalhos/trabalho/GT07-2229--Int.pdf . Acesso em: 10 dez. 2010.
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), surgem na interação das crianças com seus pares e com os adultos, na tentativa de atribuir sentido ao seu mundo social. Dessa maneira, elas se constituem processualmente de forma produzida e partilhada, na qual os pequenos participam, em conjunto com outros atores sociais, de uma experiência social e cultural.

Diante disso, não se podem conceber as culturas infantis como sendo apenas reprodução da cultura em vigência. Na realidade, ocorre um processo de reprodução interpretativa, termo cunhado por Willian Corsaro para dar ênfase à participação ativa das crianças no mundo social e cultural (Borba, 2006BORBA, Angela Meyer. As Culturas da Infância nos Espaços-tempos do Brincar: estratégias de participação e construção da ordem social em um grupo de crianças de 4-6 anos. 2006. Disponível em: Disponível em: http://www.anped.org.br/reunioes/29ra/trabalhos/trabalho/GT07-2229--Int.pdf . Acesso em: 10 dez. 2010.
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). De acordo com essa concepção, as crianças não apenas reproduzem o mundo social adulto, mas lhe conferem seus próprios significados e características peculiares da infância, como explicita Ferreira (2004FERREIRA, Maria Manuela M. Do “avesso” do brincar ou... as relações entre pares, as rotinas da cultura infantil e a construção da(s) ordem(ens) social(ais) instituinte(s) das crianças no jardim-de-infância. In: CERISARA, Ana Beatriz; SARMENTO, Manuel Jacinto (Org.). Crianças e Miúdos: perspectivas sociopedagógicas da infância e educação. Portugal: ASA Editores, 2004. p. 55-104., p. 60-61, grifo da autora):

O termo reprodução, ao enfatizar a ideia de que as crianças são constrangidas e afetadas pelas estruturas sociais e pelas culturas existentes, isto é, pela reprodução social das sociedades das quais são membros, procura salientar que, pela sua participação efectiva, também elas contribuem recíproca e activamente para a produção e mudança social e cultural do mundo adulto. O termo interpretativo, ao sublinhar os aspectos inovadores, transformadores e criativos dos pontos de vista e das participações das crianças nas interacções sociais, salienta a apropriação selectiva, reflexiva e crítica que elas efectuam do mundo adulto, quando, ao interpretá-lo de acordo com os seus interesses e preocupações como crianças, desenvolvem uma troca e negociações intensivas de significados e intencionalidades que vêm, ao longo do tempo, a ser partilhadas subjectiva e colectivamente.

A brincadeira, como uma cultura infantil, é também considerada uma produção cultural na medida em que se estabelece como uma ação social (Ferreira, 2004FERREIRA, Maria Manuela M. Do “avesso” do brincar ou... as relações entre pares, as rotinas da cultura infantil e a construção da(s) ordem(ens) social(ais) instituinte(s) das crianças no jardim-de-infância. In: CERISARA, Ana Beatriz; SARMENTO, Manuel Jacinto (Org.). Crianças e Miúdos: perspectivas sociopedagógicas da infância e educação. Portugal: ASA Editores, 2004. p. 55-104.). Através do brincar, as crianças agem no mundo não apenas como preparação para ele, mas como um meio de comunicação de sua participação nessa realidade, interagindo socialmente e conferindo significados às ações. Diante disso, percebe-se a relação entre a singularidade/subjetividade e o contexto social e cultural, no qual os sujeitos estão inseridos. É através das interações sociais que se constitui o processo de singularização ou, como discorre Sirgado (2000SIRGADO, Angel Pino. O Social e o Cultural na Obra de Vigotski. Educação & Sociedade, Campinas, Universidade Estadual de Campinas , n. 71, jul. 2000. Disponível em: Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/es/v21n71/a03v2171.pdf . Acesso em: 22 maio 2009.
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, p. 22, grifo do autor), “[...] é pelo outro que o eu se constitui em um ser social com sua subjetividade”. Do mesmo modo, corrobora Rego (1995REGO, Teresa Cristina. Vygotsky: uma perspectiva histórico-cultural da educação. Petrópolis: Vozes, 1995., p. 60-61),

[...] podemos concluir que, para Vygotsky, o desenvolvimento do sujeito humano se dá a partir das constantes interações com o meio social em que vive, já que as formas psicológicas mais sofisticadas emergem da vida social. Assim, o desenvolvimento do psiquismo humano é sempre mediado pelo outro (outras pessoas do grupo cultural), que indica, delimita e atribui significados à realidade. Por intermédio dessas mediações, os membros imaturos da espécie humana vão pouco a pouco se apropriando dos modos de funcionamento psicológico, do comportamento e da cultura, enfim, do patrimônio da história da humanidade de seu grupo cultural. Quando internalizados, estes processos começam a ocorrer sem a intermediação de outras pessoas.

Assim sendo, a subjetividade/singularidade se organiza em uma unidade dialética entre o indivíduo e o meio no qual está inserido através do estabelecimento de relações recíprocas, como defendem Aguiar (2005AGUIAR, Maira Pêgo de. Adolescentes e Autoconceito: um estudo sobre a constituição social e histórica da subjetividade no contexto escolar. 2005. Disponível em: Disponível em: http://www.anped.org.br/reunioes/28/textos/gt20/gt20464int.rtf . Acesso em: 01 abr. 2009.
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) e Furtado (2007FURTADO, Odair. O Psiquismo e a Subjetividade social. In: BOCK, Ana Mercês Bahia; GONÇALVES, Maria da Graça Marchina; FURTADO, Odair (Org.). Psicologia Sócio-histórica: uma perspectiva crítica em psicologia. 3. ed. São Paulo: Cortez , 2007. p. 75-93.). Essas interações possibilitam a expressão das significações de cada criança de diferentes formas: “[...] ela pode contar, imaginar, brincar, imitar, repetir [...]” (Solon; Costa; Rossetti-Ferreira, 2008SOLON, Lílian de Almeida Guimarães; COSTA, Nina Rosa do Amaral; ROSSETTI-FERREIRA, Maria Clotilde. Conversando com Crianças. In: CRUZ, Silvia Helena Vieira (Org.). A Criança Fala: a escuta de crianças em pesquisas. São Paulo: Cortez , 2008. p. 204-224., p. 218).

A brincadeira é a maneira mais espontânea da manifestação da singularidade das crianças, na qual elas expressam sua compreensão de mundo e suas ressignificações acerca de sua realidade. No brinquedo, a criança elabora uma situação imaginária e atua em uma esfera cognitiva ampliada. Na idade pré-escolar, o pensamento começa a ser regulado pelas ideias e a criança é capaz de fazer uso de objetos diversos para representar uma realidade que não está presente, podendo, por exemplo, utilizar um cabo de vassoura como um cavalo. “Nesses casos, ela será capaz de imaginar, abstrair as características dos objetos reais [...] e se deter no significado definido pela brincadeira” (Rego, 1995REGO, Teresa Cristina. Vygotsky: uma perspectiva histórico-cultural da educação. Petrópolis: Vozes, 1995., p. 81-82).

Na imaginação, não é relevante a similaridade do objeto denotado com o objeto com o qual se brinca. “O mais importante é a utilização de alguns objetos como brinquedos e a possibilidade de executar, com eles, um gesto representativo. Essa é a chave para toda a função simbólica do brinquedo das crianças” (Vygotsky, 1991VYGOTSKY, Lev Semenovich. A Formação Social da Mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1991., p. 122). Além dos objetos em si, o próprio comportamento, as ações e os gestos das crianças na brincadeira caracterizam a função de símbolo e de signo ao objeto ausente, atribuindo-lhe seu significado.

O brincar, segundo Brougère (1998BROUGÈRE, Gilles. A Criança e a Cultura Lúdica. Revista da Faculdade de Educação, São Paulo, v. 24, n. 2, jul./dez. 1998. Disponível em: Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-25551998000200007 . Acesso em: 12 nov. 2010.
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), é dotado de significação social e se configura como uma aprendizagem. De acordo com esse autor, a cultura lúdica se constitui como “[...] um conjunto de procedimentos que permitem tornar o jogo possível” (p. 3). Assim, é composta de esquemas que possibilitam à criança dar início à brincadeira, uma vez que esta é a produção de uma realidade distinta da sua realidade cotidiana. A cultura lúdica contempla não apenas os jogos regrados, mas também as brincadeiras com regras implícitas. Brincadeiras de faz-de-conta, nas quais a criança faz uma combinação da observação de sua realidade com sua própria imaginação, por meio do jogo e de seu suporte material, também estão incluídas nessa forma de cultura. Brougère (1998) faz uma ressalva: a cultura lúdica não é única; ela diferencia-se, principalmente, segundo o contexto social e cultural em que se encontra. O autor afirma que,

[...] na realidade, como qualquer cultura, ela não existe pairando acima de nossas cabeças, mas é produzida pelos indivíduos que dela participam. Existe na medida em que é ativada por operações concretas que são as próprias atividades lúdicas. Pode-se dizer que é produzida por um duplo movimento interno e externo. A criança adquire, constrói sua cultura lúdica brincando. É o conjunto de sua experiência lúdica acumulada, começando pelas primeiras brincadeiras de bebê, evocadas anteriormente, que constitui sua cultura lúdica (Brougère, 1998BROUGÈRE, Gilles. A Criança e a Cultura Lúdica. Revista da Faculdade de Educação, São Paulo, v. 24, n. 2, jul./dez. 1998. Disponível em: Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-25551998000200007 . Acesso em: 12 nov. 2010.
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, p. 4).

Dessa maneira, a brincadeira enquanto cultura lúdica e, por assim dizer, produção cultural, possibilita a manifestação das singularidades das crianças, as quais precisam ser consideradas e valorizadas, principalmente no âmbito educacional. Deve-se considerar a construção da subjetividade e auxiliá-la através do desenvolvimento da criticidade e da conscientização de seus sujeitos, valorizando-a e proporcionando a expressão e a manifestação das singularidades, em especial das crianças pequenas.

Desenvolveu-se uma pesquisa de observação participante que “[...] consiste em uma interação direta e contínua de quem pesquisa com quem é pesquisado” (Cohn, 2005COHN, Clarice. Antropologia da Criança. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2005., p. 45). Participaram dessa pesquisa dezenove crianças, com quatro anos de idade, sendo sete meninas e doze meninos, as quais fazem parte de um grupo de pequeninos de uma instituição de educação infantil filantrópica, localizada no município de São José, na Grande Florianópolis, Santa Catarina.

Foi realizado um total de oito encontros, observando-se elementos singulares manifestados pelas crianças em situações de brincadeira, em que se fez uso de um diário de campo para registrar as informações pertinentes. O diário de campo é um instrumento de registro no qual são feitas anotações acerca das experiências observadas e vivenciadas (Cohn, 2005COHN, Clarice. Antropologia da Criança. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2005.). Conforme Gandini e Goldhaber (2002GANDINI, Lella; GOLDHABER, Jeanne. Duas Reflexões sobre a Documentação. In: EDWARDS, Carolyn; GANDINI, Lella (Org.). Bambini: a abordagem italiana à educação infantil. Porto Alegre: Artmed, 2002. p. 150-169., p. 152), “[...] através da observação e da escuta atenta e cuidadosa às crianças, podemos encontrar uma forma de realmente enxergá-las e conhecê-las. Ao fazê-lo, tornamo-nos capazes de respeitá-las pelo que elas são e pelo que elas querem dizer”.

Durante as observações, buscou-se a identificação das narrativas das crianças e das situações pertinentes, as quais foram sistematizadas por meio de categorias para melhor visualizar os elementos expressos pelos pequenos. Esses elementos foram relacionados a um referencial teórico para serem analisados, construindo-se, assim, reflexões e discussões a partir dos registros e à luz da respectiva teoria.

Na análise e discussão dos dados foram utilizados nomes fictícios para a identificação das crianças, pois, como afirma Kramer (2002KRAMER, Sônia. Autoria e Autorização: questões éticas na pesquisa com crianças. Cadernos de Pesquisa, n. 116, p. 41-59, jul. 2002. Disponível em: Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0100-15742002000200003&script=sci_arttext&tlng=es . Acesso em: 11 dez. 2009.
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), há que se resguardar a integridade dos pequenos sujeitos. Além disso, a mesma autora aponta a necessidade de se adotar uma postura ética, em especial nas pesquisas com crianças, no que tange à utilização de imagens e às implicações dos resultados publicados. Nesse sentido, fez-se uso de uma câmera fotográfica apenas como recurso secundário para obtenção de dados e auxílio na sua análise. Para tanto, enviou-se um Termo de Consentimento aos responsáveis pelas crianças com o intuito de esclarecê-los acerca da pesquisa, seus objetivos e para solicitar a autorização de sua participação. As imagens, no entanto, não serão aqui apresentadas para preservar a identidade dos pequenos participantes.

Outra questão levantada por Kramer diz respeito ao impacto dos dados obtidos e publicados na pesquisa: “[...] é possível contribuir e devolver os achados, evitando que as crianças ou jovens sofram com as repercussões desse retorno no interior das instituições educacionais que frequentam e que foram estudadas na pesquisa?” (2002KRAMER, Sônia. Autoria e Autorização: questões éticas na pesquisa com crianças. Cadernos de Pesquisa, n. 116, p. 41-59, jul. 2002. Disponível em: Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0100-15742002000200003&script=sci_arttext&tlng=es . Acesso em: 11 dez. 2009.
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, p. 2). Nesse sentido, teve-se cuidado na abordagem dos nomes e das fontes de obtenção dos dados, para não expor as crianças a situações que afetassem sua integridade. Os pequeninos, durante toda a pesquisa, foram considerados enquanto sujeitos, com seus interesses e desejos respeitados.

Ressignificação do Contexto Social

Apresentam-se aqui alguns aspectos sociais que se manifestam nas situações de brincadeira das crianças. Os pequenos, imersos em sua sociedade e cultura, interiorizam as características desta e reproduzem papéis e comportamentos, atribuindo-lhes seus próprios significados.

Dentre os elementos que compõem o repertório das brincadeiras deste grupo de crianças identificaram-se alguns relacionados à família e ao ambiente doméstico. Estes aspectos se manifestam em situações como as que se seguem:

Sento-me em uma cadeira ao lado de Larissa, e Pedro para em minha frente com dois recipientes contendo areia e me fala: “Come!”. Pergunto-lhe o que tem naqueles recipientes e ele responde: “Sorvete e iogurte”. Eu “como” suas comidas e ele sai sorrindo. Em seguida, Fábio me traz um balde com areia dizendo que é um “bolinho de morango”. Isabela, com uma bandeja de plástico cheia de areia, me fala: “Oh! Um bolão pra ti! Pro teu aniversário”. Fábio, ao ouvi-la, traz outra bandeja contendo areia e diz: “Docinho. Eu vou esquentar”, colocando-a em cima da grade da casinha de madeira (Registro Diário de Campo, 26/08/09).

Aproximo-me de Ricardo e Fernando e lhes questiono: “Do que estão brincando?”. Ricardo me diz: “De panda”. Então, pergunto como é a brincadeira e ele fala: “Eu durmo aqui e ele dorme aqui”, apontando para as camas no interior da casinha de brinquedo. Em seguida, me mostra os bonecos: “Olha! Dois panda igual”. Fernando chega na casinha com seu panda falando com o brinquedo de Ricardo: “Papai, olha o que eu aprendi na escola”. Ricardo pega seu panda e, se afastando da casinha, diz a Fernando: “Eu vou trabalhar, tá filho”, e sai. Quando volta fala: “Eu vim de prancha filho”, arrastando seu panda no chão. Depois, Ricardo pega a casinha de brinquedo e sai com ela: “Agora a nossa casa é lá”. Fernando traz um pássaro de brinquedo: “Esse aqui é o nosso pássaro pra nós passear”. Ricardo põe seu panda em cima do pássaro e sai “voando” (Registro Diário de Campo, 04/09/09).

Observou-se em praticamente todas as idas ao parque de areia que a maioria das crianças brincava sentada ao chão com seus baldes e pás, fazendo alusão a uma cozinha. Dessa forma, quase todas faziam suas comidinhas, identificando-as como tal e interagindo com seus pares e também com os demais adultos presentes no ambiente.

Nas brincadeiras, as crianças utilizavam o que Vygotsky chama de pivô, ou seja, objetos que podem representar outros que não estão presentes ou com os quais não se pode brincar. “A criança poderá utilizar materiais que servirão para representar uma realidade ausente, por exemplo, uma vareta de madeira como uma espada” (Rego, 1995REGO, Teresa Cristina. Vygotsky: uma perspectiva histórico-cultural da educação. Petrópolis: Vozes, 1995., p. 81).

Identificou-se muito isso nas situações em que as crianças brincavam de comidinha, faziam uso de bandejas de plástico e areia como panelas e comida, imaginando e abstraindo as características do objeto representado, com o foco na brincadeira em si. Assim, no primeiro relato, Pedro utilizou os recipientes de plástico contendo areia como se fossem sorvete e iogurte e Isabela fez uso de uma bandeja como seu bolão de aniversário. Estes objetos configuraram-se como os denominados pivôs, adquirindo significados diferentes de acordo com a brincadeira e a imaginação das crianças.

Outra questão percebida nesses momentos foi a representação de alguns papéis vivenciados em seu contexto social. Os pequenos colocaram-se no lugar de determinadas pessoas ou objetos e agiram de acordo com os comportamentos observados e experienciados por eles.

As crianças, ao brincar, procuram representar seus papéis de maneira a serem coerentes com a sua realidade. Como assinala Rego (1995REGO, Teresa Cristina. Vygotsky: uma perspectiva histórico-cultural da educação. Petrópolis: Vozes, 1995.), mesmo nas situações que envolvem imaginação há algumas formas de se comportar que condizem com o que se representa. Assim, os meninos brincando com a casinha, no segundo relato, comportam-se de acordo com a postura que observam: Ricardo, representando o papel de pai, sai de casa para ir trabalhar e Fernando, representando o filho, vai para a escola. Além disso, percebe-se a presença de elementos midiáticos, como o panda com que brincavam, representante de um personagem de um filme infantil.

Todas essas situações apresentam elementos singulares das crianças, caracterizando sua subjetividade. Percebe-se que eles estão atrelados ao social, visto que os pequenos estão inseridos em uma sociedade e dela participam ativamente. Dessa forma, recebem alguns aspectos partilhados socialmente e, por sua vez, conferem-lhe sentidos próprios, configurando sua particularidade. Isso se reflete, principalmente, no primeiro relato em que as crianças fazem uso de objetos sociais, como as bandejas, os baldes e outros recipientes de plástico, e lhes atribuem seus significados singulares, utilizando esses elementos como sendo suas panelas, fôrmas, copos, entre outros.

Diante disso, observa-se nas brincadeiras infantis a representação de alguns papéis de autoridade relacionados à internalização de regras e comportamentos, sendo estes ressignificados pelas crianças. Isso se percebe em alguns momentos como os descritos abaixo:

Andressa [...] com uma boneca no colo, fala: “A minha bebê não pode ir no chão porque ela tá sem calçado. Porque ela machucou o pé. Tá sangrando aqui, oh! Mas é de mentirinha. Porque ela correu. Ela é teimosa. Eu disse pra ela: 'não corre!', mas ela desobedeceu” (Registro Diário de Campo, 27/08/09).

Franciele coloca seu urso de pelúcia sentado em uma cesta de plástico. Pergunto por que havia feito isso e ela me diz: “Pra fazer xixi”. Então, apontando para a cesta, questiono: “O que é isso?”. Ela responde: “É um penico”. [...] Franciele, ainda com o urso de pelúcia, passa na cabeça deste uma escova pequena de plástico e diz para seu brinquedo: “Ah! Tem piolho, é? Eu vou te bater”. Pergunto-lhe o que está fazendo e ela responde: “Tô tirando piolho dele” (Registro Diário de Campo, 04/09/09).

Os pequenos representam situações que vivenciam na relação com seus pares e com os adultos, imaginando-se em papéis diversos. Esses papéis pressupõem alguns comportamentos e regras que são internalizados pelas crianças, como no relato em que Andressa age como uma mãe cuidando de sua filha. Esta relação de cuidado com os bebês provavelmente é experienciada por essa criança de forma que ela a reinterpreta em sua brincadeira, conferindo suas próprias características e significados.

O regramento internalizado pelos pequenos também é vivenciado nas instituições de educação infantil que, em geral, prezam pela ordem e pela disciplina. Conforme Finco (2007FINCO, Daniela. A Educação dos Corpos Femininos e Masculinos na Educação Infantil. In: FARIA, Ana Lúcia Goulart de (Org.). O Coletivo Infantil em Creches e Pré-escolas: falares e saberes. São Paulo: Cortez , 2007. p. 94-119., p. 94), “[...] todos os processos de escolarização sempre estiveram preocupados em vigiar, controlar, modelar, corrigir e constituir os corpos”. Desta forma, as instituições educacionais acabam por ditar normas e comportamentos a serem seguidos, vigiando e mesmo punindo quando não há essa obediência. Isso se reflete também nas brincadeiras das crianças, em que elas reproduzem as regras a seu modo, ressignificando-as e reinterpretando os papéis de autoridade. Esta reinterpretação aparece na fala de Andressa e de Franciele nos dois relatos acima, que exercem os papéis de autoridade sobre suas filhas, dando suas ordens e castigando as bonecas quando elas não as obedecem.

Reinterpretação de Manifestações e Arranjos Sociais

Observaram-se alguns aspectos manifestados nas brincadeiras das crianças pequenas relacionados a arranjos e manifestações sociais. Os pequenos vivenciam diversas situações em que entram em contato com elementos que lhes são transmitidos de forma pronta, como as histórias infantis e as programações da mídia. Esses elementos são constantemente expressados nos momentos de brincadeira, porém, de maneira ressignificada, de acordo com as reinterpretações singulares de cada criança.

Esse processo de reinterpretação pode ser observado nos momentos em que as crianças expressam suas ressignificações de histórias, como nos relatos a seguir:

Taise, Isabela, Andressa, Pedro, Rodrigo e José vão para baixo da tenda no cenário montado para a contação da história da Arca de Noé e juntos cantam a música e contam a história a sua maneira. Tomas pega seu cavalo de plástico e canta: “Tinha cavalinho? Tinha!”, repetindo a canção ouvida na história (Registro Diário de Campo, 28/08/09).

Andando pelo parque, encontro Pedro, que me diz: “Olha o que eu achei?”, mostrando-me um galho. Pergunto o que era e ele responde: “Uma espada pra matar o lobo”. Questiono: “Onde está o lobo?” e ele responde: “O lobo que pegou os três porquinhos e a Chapeuzinho Vermelho”. Neste momento, Gustavo passa ao lado de Pedro e este lhe aponta: “Tá aqui, oh, o lobo”. [...] Tomas, com um galho na mão, me fala: “Eu tô com essa espada porque eu sou o Peter Pan”. Pergunto-lhe o que ele faz e Tomas balança sua “espada” gritando: “Iá, iá, iá!”. Questiono: “Pra quê ele faz isso?” E ele responde: “Pra matar o capitão” (Registro Diário de Campo, 31/08/09).

As crianças, no primeiro relato, haviam escutado a narração cantada da história da Arca de Noé, para a qual as professoras trouxeram alguns animais em fantoches de vara. Após esse momento, com a saída das docentes, os pequeninos foram até o local onde aconteceu a contação e, à sua maneira, recontaram a história com os elementos expostos na música e trazendo outros próprios. Isto é, além dos animais apresentados na música pelas professoras, as crianças, narrando a sua versão, incluíram outras espécies que não eram contempladas na canção. Com o auxílio de seu brinquedo de plástico, Tomas representou um trecho da canção, reelaborando a situação que acabara de presenciar, dando origem à sua própria produção infantil, como afirma Coutinho (2002COUTINHO, Ângela Scalabrin. As Crianças no Interior da Creche: a educação e o cuidado nos momentos de sono, higiene e alimentação. 2002. Dissertação (Mestrado em Educação) - Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2002. ).

A partir das histórias que lhes são contadas, com seus elementos padrões e, de certa forma, fechados em si, as crianças constroem as suas próprias narrativas, trazendo novos elementos e interpretações. Como exposto acima, no segundo relato, a cena em que Pedro faz uso de um galho como representante de uma espada para matar o lobo ilustra esta introdução de diferentes elementos e a reconstrução de sua própria significação das histórias. Sendo assim, não se pode considerar como uma mera imitação, mas sim, como afirma Ferreira (2004FERREIRA, Maria Manuela M. Do “avesso” do brincar ou... as relações entre pares, as rotinas da cultura infantil e a construção da(s) ordem(ens) social(ais) instituinte(s) das crianças no jardim-de-infância. In: CERISARA, Ana Beatriz; SARMENTO, Manuel Jacinto (Org.). Crianças e Miúdos: perspectivas sociopedagógicas da infância e educação. Portugal: ASA Editores, 2004. p. 55-104.), utilizando o termo de William Corsaro, como uma reprodução interpretativa, na qual se apresentam as ressignificações infantis.

Ainda nesse segundo relato, percebe-se a presença de personagens das histórias de literatura infantil, como o Lobo-Mau, a Chapeuzinho Vermelho, os Três Porquinhos e o Peter Pan. Estes também se apresentam, além dos livros, em outros veículos midiáticos, como a televisão, em forma de filmes e desenhos. Dessa maneira, tem-se presente nas brincadeiras das crianças a manifestação de elementos da mídia, como é possível visualizar nas situações abaixo:

Fernando, ao perceber uma mosca voando por entre eles, fala: “Ui! Tem uma mosca querendo comer o nosso lanche”. Ricardo complementa: “E também quer chupar o nosso sangue. Mas nós ‘somo’ Power Ranger daí ela foge”. [...] Pedro se aproxima com um carrinho: “Bip-bip. Chegou os Power Ranger”. Franciele, sentada à mesa, pega um telefone de brinquedo e chama: “Polícia! Vem pegar os Power Ranger!”. Pedro retruca: “Mas nós ‘temo’ arma”. E Franciele fala ao telefone: Traz uma arma bem grande pra matar eles”. Pedro sai da sala com o carrinho e Franciele, então, fala: “Ele já fugiu” (Registro Diário de Campo, 03/09/09).

As crianças estão inseridas em sua sociedade e cultura e os elementos nelas presentes apresentam-se em suas vivências. Conforme Oliveira (2008OLIVEIRA, Alessandra Mara Rotta de. Escultura & Imaginação Infantil: um mar de histórias sem fim.2008. Tese (Doutorado em Educação) - Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2008. , p. 179), “[...] é preciso não perder de vista que as condições de apropriação cultural oferecidas às crianças incidem diretamente sobre seus processos imaginativos e simultaneamente de criação”.

Assim, percebem-se muitos indícios midiáticos nas brincadeiras infantis em que se evidenciam, principalmente, personagens de desenhos e outras programações televisivas. Em diálogos entre os pequenos é possível observar elementos de narrativas da mídia, especialmente no que concerne aos heróis dos filmes e desenhos animados, como o Hulk, o Ben 10, o Max Stell, e, sobretudo, os Power Rangers, que aparecem durante as brincadeiras e falas das crianças com uma frequência elevada.

Um dos aspectos percebidos diz respeito às brincadeiras de luta em que as crianças diferenciam-se entre as personagens boas e as más, como ocorre quando brincam de serem os Power Rangers. Segundo Brougère (2004BROUGÈRE, Gilles. Brinquedos e Companhia. São Paulo: Cortez, 2004., p. 279), “[...] as crianças se encontram e participam de um universo lúdico em que a televisão faz parte do ambiente, dá as condições de construção das brincadeiras”, agindo de acordo com o que visualizam nas telas.

A manifestação de comportamentos exibidos pelos programas de televisão é fortalecida pela maneira como estes são transmitidos. Ou seja, a mídia, em geral, apresenta cenas que se repetem e são facilmente memorizadas; os nomes e as características dos personagens são ressaltados a todo instante e os enredos das histórias são sempre semelhantes, como a vitória dos heróis sobre os malvados, como descreve Brougère (2004BROUGÈRE, Gilles. Brinquedos e Companhia. São Paulo: Cortez, 2004.). De acordo com o mesmo autor (p. 208),

[...] as referências mais fortes à televisão ou, pelo menos, as mais visíveis, estão ligadas às cenas acompanhadas das músicas, as cenas de transformação e de lutas com as fórmulas fixas “Power Rangers, força animal”. Com a televisão exercendo uma forte atração visual e sonora, trata-se de elementos repetitivos, portanto fáceis de memorizar e que constituem uma espécie de assinatura da série.

A circulação livre da mídia, principalmente através da televisão, é um fato preocupante uma vez que esta é mediadora. A lógica de mercado faz com que ela se interesse somente pelo lucro, não se preocupando com o que está sendo transmitido, tão pouco com seu reflexo e a repercussão de seus possíveis efeitos. Conforme afirma Ferrés (1996FERRÉS, Joan. Televisão e Educação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996., p. 113) “[...] a maior parte dos anúncios não pretende convencer racionalmente, mas, sim, fascinar emocionalmente”. A publicidade não tem como pretensão passar informações, e sim seduzir e fascinar seu público alvo.

Pesquisas realizadas na Austrália e na Colúmbia Britânica, em 1970, mencionadas por Njaine e Minayo (2003), mostram que crianças que convivem em presença da televisão podem apresentar comportamentos mais agressivos e menos criativos nas brincadeiras do que crianças que não têm contato com esta mídia. De acordo com as mesmas autoras (p. 13), a televisão, além de ser um meio de comunicação, é também “um produtor de sentidos e construtor de valores”.

Outro fato muito interessante são as informações veiculadas nos filmes e desenhos animados. Em uma análise dos filmes da Disney, perceberam-se nitidamente discursos de gênero por meio da repetição de enunciados que regulam e normalizam “[...] não apenas as identidades sexuais como também as identidades de gênero, estabelecendo maneiras usuais de ser, modos de comportamento, procedimentos determinados, atitudes” (Sabat, 2002SABAT, Ruth. Filmes Infantis como Máquinas de Ensinar. In: 25ª REUNIÃO DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA EM EDUCAÇÃO - ANPED - Grupo de Trabalho Educação e Comunicação, 2002, Caxambu. Anais... Caxambu: 2002. , p. 1). Não se trata, entretanto, de ignorar a existência da mídia, mas sim de problematizá-la, visto que ela é uma realidade presente e influente em todas as esferas da vida. Um novo campo que se desenvolve desde a década de 1970 chama a atenção para isso. Trata-se da mídia-educação, também conhecida como educação para as mídias (Belloni, 2001BELLONI, Maria Luiza. O que é Mídia-educação. Polêmicas do nosso tempo. Campinas: Autores Associados, 2001., p. 46), cujo objetivo é a “[...] formação do usuário ativo, crítico e criativo de todas as tecnologias de informação e comunicação [...]”, promovendo a “[...] percepção consciente e a discussão crítica das mensagens televisuais” (p. 69).

Cabe ressaltar, ainda, que as crianças não são meramente passivas no processo de reprodução de comportamentos midiáticos. Elas, ao reproduzir, ressignificam o que está sendo imitado, incluindo elementos característicos de sua singularidade. Acontece, nas palavras de Brougère (2004BROUGÈRE, Gilles. Brinquedos e Companhia. São Paulo: Cortez, 2004.), uma criação da situação de brincadeira, em que os pequenos combinam as referências televisivas e a sua realidade concreta.

Outros aspectos relacionados a arranjos sociais expressados durante os momentos de brincadeira das crianças são os elementos referentes a gênero, como registrados nas observações a seguir:

Em uma das paredes laterais há um cartaz com diversos bonecos coloridos. Fábio aponta para um deles e diz: “Eu sou o rosa”. Andressa, então, lhe fala: “Menino não pode ser rosa” (Registro Diário de Campo, 26/08/09).

Ao nos encaminharmos para este local [um gramado], Tomas pede para dar a mão para Franciele, que estava de mãos dadas com Daiana que, por sua vez, estava de mãos dadas com Andressa. Andressa diz a Tomas: “Não pode dar a mão. Não pode menino com menina” (Registro Diário de Campo, 28/08/09).

Desde pequenos é possível perceber a compreensão que as crianças têm acerca de questões relacionadas a gênero, em que os papéis são definidos muito cedo, como alega Sayão (2003SAYÃO, Deborah Thomé. Pequenos Homens, Pequenas Mulheres? Meninos, Meninas? Algumas questões para pensar as relações entre gênero e infância. Pró-Posições . Dossiê educação infantil e gênero, Campinas, Universidade Estadual de Campinas , v. 14, n. 3, p. 67-87, set./dez. 2003.). De acordo com esta autora, delimitam-se nos mediadores sociais os “[...] lugares, comportamentos e formas de ser específicas para meninos e meninas, homens e mulheres” (p. 78-79).

Diante disso, nota-se nos relatos acima a distinção entre o feminino e o masculino na fala de uma das meninas do grupo, alegando que os meninos não podem selecionar a cor rosa, tendo em vista que esta é uma cor relacionada às meninas. Essa é uma questão que apareceu em diversos momentos durante as observações, em especial nas situações de brincadeira.

Outra questão está relacionada à distribuição de papéis. Em geral, eram as meninas que brincavam com as bonecas e os meninos com os carrinhos. Quando as meninas faziam uso dos carrinhos, ainda com as bonecas em mãos, representavam o papel da mãe com sua filha. Por outro lado, os meninos quando brincavam com algum boneco exerciam o papel de pai ou outro personagem ao qual o boneco representava. Entretanto, no parque, meninos e meninas brincavam de fazer comidinha com os materiais de plástico e a areia. Observa-se, ainda, a segregação entre as crianças, como no segundo relato descrito acima, em que as meninas não permitiram a Tomas dar a mão a elas, afirmando que não era possível a união dos meninos com as meninas.

Vale salientar que os brinquedos são “[...] elementos culturais, portadores de significados e de um enredo social e as crianças estão a todo o momento recriando novos significados” (Finco, 2003FINCO, Daniela. Relações de Gênero nas Brincadeiras de Meninos e Meninas na Educação Infantil. Pró-Posições. Dossiê educação infantil e gênero, Campinas, Universidade Estadual de Campinas, v. 14, n. 3, p. 89-101, set./dez. 2003. , p. 96). Sendo assim, apesar de estarem imersas em seu contexto cultural e interiorizar algumas questões relacionadas a gênero, as crianças conferem seus próprios sentidos, caracterizando seus aspectos singulares. Isso se reflete no registro de Sayão (2003SAYÃO, Deborah Thomé. Pequenos Homens, Pequenas Mulheres? Meninos, Meninas? Algumas questões para pensar as relações entre gênero e infância. Pró-Posições . Dossiê educação infantil e gênero, Campinas, Universidade Estadual de Campinas , v. 14, n. 3, p. 67-87, set./dez. 2003., p. 80), em que as crianças, mesmo seguindo certo padrão, atribuem elementos particulares às suas brincadeiras, ao que a autora discute:

Apesar de todas as crianças cumprirem papéis determinados socialmente para homens e mulheres: Fábio é o pai, Maria Eduarda é a mãe, Milena é cozinheira e Thiago é o médico, quem toma a iniciativa para chamar esse profissional é um menino, reproduzindo a “atividade, iniciativa e domínio público” tão caros à representação do masculino em nossa sociedade. Quem se preocupa ou está sensível e mostra isso corporalmente é a mãe, tanto que a amiga lhe oferece conforto. A mãe e a cozinheira reproduzem as alianças femininas historicamente compostas contra o predomínio do poder masculino e são demonstradas no gesto de acalento quando Milena traquiliza Maria Eduarda quanto à doença do menino. O pai solicita ajuda ao médico que, não por acaso, é homem, na brincadeira, e eles aparentemente se mantêm frios ou insensíveis diante da situação. Imaginaríamos o pai chorando com a doença do filho e o médico consolando-o?

A partir desta análise do registro de Sayão (2003SAYÃO, Deborah Thomé. Pequenos Homens, Pequenas Mulheres? Meninos, Meninas? Algumas questões para pensar as relações entre gênero e infância. Pró-Posições . Dossiê educação infantil e gênero, Campinas, Universidade Estadual de Campinas , v. 14, n. 3, p. 67-87, set./dez. 2003.), é possível visualizar a determinação de papéis sociais, que se expressam no momento de brincadeira das crianças pequenas. Contudo, há que se considerar os elementos diferenciados que aparecem, como o caso do pai tomando a iniciativa para solucionar o problema do filho. Outra forma de “transgressão dos papéis de gênero”, expressão utilizada pela autora, encontra-se na sequência do relato do registro, em que Fábio, o pai, levanta a sua camiseta para amamentar o filho, configurando características singulares dessas crianças.

Diante desses relatos, percebe-se que as crianças pequenas internalizam os modelos que a sociedade apresenta-lhes e os reproduzem em suas vivências, especialmente nas brincadeiras. Entretanto, essa reprodução não ocorre como uma simples imitação dos personagens apresentados nas mídias e nas histórias infantis, ou nos papéis masculinos e femininos representados enquanto brincam. As crianças reinterpretam os modelos, atribuindo-lhes suas próprias significações, caracterizando suas singularidades.

A Brincadeira como Propulsora da Criatividade e das Linguagens nas Crianças

Durante as observações, percebeu-se a brincadeira como um elemento propiciador do desenvolvimento da criação e da imaginação das crianças, abordando, também, a manifestação das linguagens infantis através da ludicidade. Os pequenos, por meio de brinquedos e objetos que são significados como tal, criam e recriam brincadeiras, imaginando uma diversidade de possibilidades. Ainda nesse contexto lúdico, eles se expressam por múltiplas linguagens, dentre as quais se enfatizam aqui a oral, a escrita e a artística.

Observam-se claramente os processos de criação e imaginação nas brincadeiras infantis, visíveis nas descrições abaixo:

Tomas pega uma das folhas de bananeira que estava no cenário, balança-a no ar e diz: “Bandeira de Avaí!”. [...] Pedro, com um galho na mão, me fala: “Isso é de árvore, mas é uma espada” (Registro Diário de Campo, 28/08/09 e 31/08/09).

Fernando, ao ver Ricardo pegando a flor no canto do cercado onde havia outras plantas, fala para ele: “Ricardo, ‘vamo’ brincar de plantação?”, ao que este consente. Fernando passa a mão nestas plantas, como se estivesse acariciando-as, e diz: “Quem arranca, ela briga”. Pergunto: “Com quem ela briga?”. Ele responde: “Com os ‘bicho’ que arranca ela. Com gente não”. Fernando pega uma das plantas que estava caída no chão, junta um montinho de areia e a coloca em cima, na posição vertical: “Eu vou plantar ela”. Depois, ele se levanta, pega um punhado de areia e joga em cima das plantas: “Ela vai tomar água”. Quando Ricardo se aproxima, Fernando lhe fala: “Eu tô cuidando da plantação”, e Ricardo complementa: “Tu tá cuidando da natureza”. Fernando pega um pedaço de tijolo que encontra no chão do parque: “É um sabonete. Eu vou dar banho nelas porque elas brincaram”. Após passar o “sabonete” nas plantas, fala: “Pronto! Já tão cheirosas” (Registro Diário de Campo, 02/09/09).

Ao brincar, a criança cria uma situação imaginária que a caracteriza como uma brincadeira, como afirma Cerisara (2002CERISARA, Ana Beatriz. De como o Papai do Céu, o Coelhinho da Páscoa, os Anjos e o Papai Noel foram Viver Juntos no Céu! In: KISHIMOTO, Tizuko Morchida. O Brincar e suas Teorias. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2002. p. 123-138.). Quando o pequenino representa um papel, a princípio ele apenas imita o comportamento observado em seu contexto. Contudo, esta imitação “[...] não pode ser considerada uma atividade mecânica ou de simples cópia de um modelo, uma vez que a criança, ao realizá-la, está construindo em nível individual o que observou nos outros” (Cerisara, 2002CERISARA, Ana Beatriz. De como o Papai do Céu, o Coelhinho da Páscoa, os Anjos e o Papai Noel foram Viver Juntos no Céu! In: KISHIMOTO, Tizuko Morchida. O Brincar e suas Teorias. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2002. p. 123-138., p. 130).

Durante as brincadeiras das crianças, é possível perceber muitos elementos do cotidiano adulto, caracterizando a sua reprodução. Os pequenos produzem/reproduzem certos comportamentos e atitudes observados em seu meio social, especialmente na família e na instituição de educação. Isso se torna perceptível na situação relatada em que Fernando brinca de plantação, representando o papel de agricultor que planta e rega, cuidando das folhas com as quais brincava.

Conforme explicitado anteriormente, essa reprodução não é completamente passiva, pois a criança ressignifica esses atos observados e introduz seus próprios elementos, reconstruindo o mundo adulto com as características da infância, como observado no momento em que Fernando dá banho nas plantas, alegando que elas estariam sujas por terem brincado. Novamente, percebe-se a ressignificação dos objetos utilizados nas brincadeiras em que a areia se torna a água para a plantação e o pedaço de tijolo transforma-se em um sabonete para a higiene. Nesses casos, há uma distinção entre os materiais/objetos utilizados na brincadeira e os significados a eles atribuídos. Vygotsky especifica esta relação:

Na idade pré-escolar ocorre, pela primeira vez, uma divergência entre os campos do significado e da visão. No brinquedo, o pensamento está separado dos objetos e a ação surge das ideias e não das coisas: um pedaço de madeira torna-se um boneco e um cabo de vassoura torna-se um cavalo. A ação regida por regras começa a ser determinada pelas ideias e não pelos objetos. [...] O brinquedo fornece um estágio de transição nessa direção sempre que um objeto (um cabo de vassoura, por exemplo) torna-se um pivô dessa separação (no caso, a separação entre o significado ‘cavalo’ de um cavalo real) [...] Para a criança, o objeto é dominante na razão objeto/significado e o significado subordina-se a ele. No momento crucial em que, por exemplo, um cabo de vassoura torna-se o pivô da separação do significado ‘cavalo’ do cavalo real, essa razão se inverte e o significado passa a predominar, resultando na razão significado/objeto (1991VYGOTSKY, Lev Semenovich. A Formação Social da Mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1991., p. 111-112).

Sendo assim, há momentos em que o significado se sobrepõe aos objetos em si, como se observou em diversas situações em que as crianças, no parque de areia, brincavam com vassouras, montadas em seus cavalos. Uma situação que ilustra a diferenciação que as crianças são capazes de realizar é a de Tomas balançando uma folha de bananeira, fazendo alusão a uma bandeira de um time de futebol. É possível perceber a separação entre objeto e significado, sobretudo quando Pedro faz essa distinção em sua fala ao dizer que o galho é de árvore, porém, é também a sua espada de brinquedo. Ele atribui seu sentido próprio ao objeto sem, no entanto, deixar de reconhecê-lo como tal, manifestando essa compreensão.

Em alguns momentos, durante o período de observação, perceberam-se nas crianças suas linguagens e expressões, das mais variadas formas, entre elas a oral e a escrita, como descrito nos registros abaixo:

Algumas crianças me pedem para desenhar em minha caderneta de anotações. Isabela desenha seu pai e sua mãe. Taise faz um chapéu. Flávio também faz um desenho de seu pai e sua mãe. Andressa desenha seu bebê (Registro Diário de Campo, 27/08/09).

Ricardo me pede: “Posso escrever a letra?” Entrego-lhe o bloco e ele vai escrevendo e falando: “Um, dois, três, sete, oito, ‘D’ de Daniel”. [...] Ricardo continua a escrever em meu bloco: “Esse é o ‘A’ de Andressa e o ‘R’ de Ricardo e Rodrigo” (Registro Diário de Campo, 31/08/09).

As crianças manifestam desejo de se expressarem em sua espontaneidade, sem que essas expressões sejam-lhes direcionadas. No âmbito educacional, em geral, são proporcionadas atividades para que as crianças desenhem, pintem, amassem e colem, porém, esses momentos, em sua maioria, são orientados pelas docentes para que sejam feitos de determinada maneira, homogeneizando as produções.

São poucas as situações em que as crianças podem estar livres para se expressar em sua singularidade, seja desenhando, escrevendo, cantando, dançando, contando uma história, entre outras manifestações das diversas linguagens infantis. Durante todo o desenvolvimento da pesquisa, as crianças desejavam escrever no diário de campo, como no relato acima em que Isabela, Taise, Flávio e Andressa pedem para fazer um desenho, e Ricardo escreve letras e números, manifestando seu desejo de expressão espontânea, sem que fossem orientados a fazê-los. Ressalta-se que essas situações ocorreram nos momentos em que as crianças brincavam e, dessa maneira, suas expressões orais e escritas estão intimamente relacionadas à ludicidade.

Os relatos acima se configuram como manifestações de linguagem escrita, em que as crianças, em especial Ricardo, expressam-se fazendo uso do código linguístico, demonstrando sua apropriação desta representação, como afirma Rocha (2008ROCHA, Eloisa Acires Candal. Diretrizes Educativas para a Educação Infantil. Palestra proferida no Simpósio sobre Formação de Professores: infância e linguagens em debate - I SIMFOP-UNISUL, Campus Regional Sul/Tubarão, jul. 2008.). No entanto, a linguagem não se limita ao domínio da escrita; ao contrário, ela representa uma função simbólica de expressão acerca das compreensões de mundo, contemplando outras formas de manifestação, entre elas a linguagem artística, mais especificamente os desenhos, como pode ser observado nas situações descritas:

Fernando me chama: “Olha aqui o vento”, arrastando o giz de cera na folha na qual estava desenhando. Em seguida, ele diz: “Eu vou fazer o número um. É assim, oh! Um risco grande e um risco pequeno”. Depois ele vira a folha e, utilizando o outro lado, ele fala: “Agora eu vou fazer eu”, e desenhando ele me vai descrevendo: “Minha cabeça, minha barriga, a minha perninha, meu bracinho, o meu olho, a minha boca e acabou”. Flávio me diz: “Eu fiz uma bandeira”. Fernando passa o giz de cera por cima de seu desenho: “Olha aqui o vento. Quase que ele consegue me levar”. E continuando a usar o giz de cera: “Tá vindo mais vento!”. Flávio me mostra o outro desenho que fez no outro lado de sua folha: “Olha a casa monstro”, fazendo referência a um filme infantil. Fernando me diz: “Quer ver eu fazer a noite?”. Ele pega um giz de cera de cor escura e o passa no seu desenho (Registro Diário de Campo, 31/08/09).

[...] Fernando sai da casinha, pega um pedaço de galho, senta-se na areia e me fala: “Quer ver eu fazer um tesouro?”. Digo-lhe que sim e ele me mostra: “Um risco grande e um risco grande”, desenhando no chão uma espécie de cruz. Entrega-me seu galho e pergunta: “Quer fazer?”. Seguindo seu exemplo, eu desenho um “tesouro” na areia. Questiono: “O que tem dentro do tesouro?”. Fernando me responde: “Um baú do tesouro” (Registro Diário de Campo, 02/09/09).

O desenho configura-se como uma produção cultural na qual se encontram elementos sociais e singulares de seu autor. Através dos desenhos, as crianças expressam suas compreensões de mundo e as ressignificações que fazem da realidade que as cerca. “O desenho infantil tem, não pelos seus resultados, mas por seu processo constitutivo, papel fundamental na compreensão e na análise crítica da sociedade por parte das crianças” (Leite, 1998LEITE, Maria Isabel Ferraz Pereira. Desenho Infantil: questões e práticas polêmicas. In: KRAMER, Sônia; LEITE, Maria Isabel Ferraz Pereira (Org.). Infância e Produção Cultural. Campinas: Papirus, 1998. p. 131-150., p. 140).

Diante disso, quando Fernando passa seu giz de cera por cima de seu desenho dizendo ser o vento e utiliza o giz de cor escura para representar a noite, observa-se seu entendimento acerca destes fenômenos, em que o vento passa por cima das coisas e a noite deixa tudo escuro, dificultando a possibilidade de visualização, como ficou explícito em seu desenho. De acordo com Oliveira (2001OLIVEIRA, Alessandra Mara Rotta de. Do Outro Lado: a infância sob o olhar de crianças no interior da creche. 2001. Dissertação (Mestrado em Educação) - Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2001.), o desenho é constituído de sentimentos e sentidos que os pequeninos constroem acerca do que vivenciam, tanto socialmente quanto singularmente.

Conforme a mesma autora (2001OLIVEIRA, Alessandra Mara Rotta de. Do Outro Lado: a infância sob o olhar de crianças no interior da creche. 2001. Dissertação (Mestrado em Educação) - Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2001., p. 77), o desenho “[...] é um mecanismo de criação artística, de expressão, de comunicação e estética, que nos fornece um conjunto de significados cognitivos por meio do qual as pessoas organizam diferentes culturas, expressam as suas percepções de mundo e de si mesmos [...]”. Sendo assim, a manifestação da singularidade das crianças é perceptível através de traços característicos da cultura em que estão inseridas e de seus elementos singulares, como se nota no segundo relato em que Fernando faz seu tesouro, representando-o com duas linhas cruzadas, alegando que ali estivesse escondido um baú do tesouro.

Considerações Finais

Com a observação dos momentos de brincadeira dessas crianças, percebeu-se uma diversidade de elementos, dentre os quais se apresentaram aqui apenas alguns, os principais, manifestados pelos pequeninos em seus momentos de brincadeiras. Possibilitou-se a percepção do repertório cultural desses sujeitos e suas múltiplas expressões, observando-se suas diversidades e particularidades. Os aspectos percebidos nas crianças, em geral, são semelhantes, porém, é possível fazer uma diferenciação na medida em que os pequenos são sujeitos ativos que produzem/reproduzem, conferindo seus sentidos e significados próprios, que os caracterizam como seres particulares.

Observaram-se nas crianças, em suas brincadeiras, elementos diversos relacionados a muitas esferas de sua vida cotidiana. Dentre as características particulares manifestadas nestas situações, destacam-se algumas referentes ao ambiente familiar e doméstico, quando as crianças representam modelos e papéis presenciados em seu cotidiano. Elas brincam de ser mãe e pai de bebês, representados por bonecas e ursos de pelúcia, e de fazer comidinha, principalmente enquanto estão no parque de areia. Nesses momentos, os pequenos agem de acordo com o que estão representando, seguindo as regras inerentes a estas brincadeiras.

Perceberam-se, também, elementos relacionados a gênero, o que possibilitou uma compreensão acerca das ressignificações elaboradas pelos pequeninos. Eles interagem com modelos postulados pela sociedade e apropriam-se deles, reproduzindo-os em suas vivências através de definições de papéis e funções sociais. Observou-se muito presente a questão da cor rosa estar relacionada apenas ao sexo feminino, restringindo qualquer possibilidade de escolha dos meninos para com esta. Isso é bastante visualizado em momentos nos quais as meninas repreenderam alguns meninos que selecionaram o cor de rosa, alegando que “menino não pode ser rosa”.

Ainda nas brincadeiras, notou-se uma internalização de algumas regras e comportamentos definidos socialmente. As crianças vivenciam ações e atitudes e as reproduzem enquanto brincam, reinterpretando-as a seu modo. Elas representam as normas sociais de seu contexto de acordo com seus papéis na brincadeira. Dessa forma, ao representar o papel de mãe, a menina age conforme este, tomando para si suas funções, como as de cuidado para com o filho.

Manifestaram-se alguns elementos singulares relacionados à mídia, evidenciado nas representações de personagens de desenhos e filmes infantis, especialmente. Os pequeninos, em diversos momentos de brincadeira, representaram os heróis das programações televisivas, agindo conforme o exposto na tela. Sendo assim, percebe-se que a cultura midiática está muito presente no cotidiano dos pequenos que experienciam-na conforme seus aspectos particulares.

O contexto de ludicidade também proporciona o desenvolvimento da criatividade e das linguagens das crianças. Nas brincadeiras, os pequeninos, a todo instante, utilizavam sua imaginação para criar novos elementos e recriar os já existentes. Enquanto brincavam, muitos mostravam o desejo de se expressar através de suas múltiplas linguagens, dentre elas a oral, a escrita e a artística. Algumas crianças solicitavam folhas para desenhar e escrever, manifestando-se de diversas maneiras em suas peculiaridades.

Por meio da verificação do repertório das brincadeiras das crianças, observa-se que este é muito amplo e diversificado, culturalmente e particularmente. Cada uma delas, mesmo que representando um papel ou uma função social, apresenta suas características singulares atribuindo aspectos individuais às brincadeiras.

Diante do exposto, constatou-se que o processo de singularização está atrelado ao contexto em que os sujeitos estão inseridos, relacionando-se intimamente com o social e o cultural. No entanto, não se estabelece apenas uma relação de reprodução passiva; ao contrário, as crianças promovem uma reinterpretação de seu meio, representando-o conforme suas ressignificações. Observa-se, portanto, que a singularidade dos pequenos está constantemente relacionada ao seu contexto social, sendo constituída em conjunto com ele.

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  • *
    Bruna Prange é graduanda em Psicologia pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Possui graduação em Pedagogia pelo Centro Universitário Municipal de São José (USJ). Atualmente faz estágio no Núcleo de Desenvolvimento Infantil (NDI) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), com um projeto de Inclusão Escolar, supervisionado pelo professor Adriano Nuernberg (UFSC).
  • **
    Regina Ingrid Bragagnolo é doutoranda em Psicologia pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Possui mestrado em Educação pela UFSC (2006), graduação em Psicologia pela Universidade do Sul de Santa Catarina (2004), graduação em Pedagogia pela Universidade do Estado de Santa Catarina (2004). Atualmente é professora titular do Núcleo de Desenvolvimento Infantil NDI-UFSC.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Abr 2012

Histórico

  • Recebido
    01 Ago 2010
  • Aceito
    01 Jan 2011
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