Acessibilidade / Reportar erro

Qualidade polínica, anormalidades meióticas e poliploidia emSisyrinchium commutatum (Iridaceae)

Pollen quality, meiotic abnormalities and poliploidy inSisyrinchium commutatum (Iridaceae)

Resumo

O comportamento meiótico de Sisyrinchium commutatum (Iridaceae) foi avaliado e associado com a qualidade polínica observada em uma população do sudeste do Brasil. Além disso, pela primeira vez, descreve-se o número cromossômico desta espécie (2n = 36), contribuindo assim para a sistemática do grupo. Alguns aspectos da biologia floral são relatados e confirmam a ocorrência de apresentação secundária de pólen e a ausência de autofertilização e apomixia, comuns para o gênero. Os resultados do presente trabalho confirmam a ação das anormalidades meióticas (multivalentes e pontes cromossômicas) como possível mecanismo disruptivo na formação de grãos de pólen com consequências ao sucesso reprodutivo na população estudada.

Palavras-chave:
pólen; número cromossômico; meiose; poliploidia.

Abstract

The meiotic behaviour of Sisyrinchium commutatum (Iridaceae) was studied and associated to the pollen quality observed in a southeastern population in Brazil. For the first time, the chromosome number is reported for this species (2n = 36). Some traits of floral biology were recorded and secondary pollen presentation as well as the absence of autonomous self-fertilization and apomixy were observed. The results of this study confirm the abnormalities in the meiosis process breaking the pollen grain formation with consequences to reproductive success in the studied population.

Key words:
pollen; chromosome number; meiosis; poliploidy

O sucesso reprodutivo de indivíduos vegetais está relacionado diretamente a uma série de fatores bióticos e abióticos (Barret & Eckert 1990Barrett, S. & Eckert, C.G. 1990. Current issues in plant reproductive ecology. Israel Journal of Botany 39: 5-12.). Eficiência e disponibilidade de polinizadores e dispersores, estrutura populacional e as características do ambiente podem contribuir neste sentido. Além destes, os diferentes mecanismos e sistemas reprodutivos encontrados em angiospermas atuam nas condições e na potencial capacidade de germinação dos grãos de pólen em estigmas coespecíficos e posterior fertilização dos óvulos (Barrett 2002Barrett, S. 2002. The evolution of plant sexual diversity. Nature 3: 274-284.). Componente fundamental neste sentido é a qualidade do pólen que chega aos estigmas, ou em outros termos, a viabilidade polínica. Os fatores acima descritos são extensivamente avaliados nos estudos de biologia reprodutiva, porém, aqueles associados às diferentes taxas de viabilidade polínica observadas em distintas espécies vegetais são ainda pouco explorados. Como exemplos de potenciais fatores incidentes na qualidade do pólen (viabilidade polínica), podem ser citados àqueles relacionados às características ambientais locais (umidade e temperatura), morfológicos (local de exposição nas flores) ou endógenos (características da microsporogênese) (Dafni & Firmage 2000Dafni, A. & Firmage, D. 2000. Pollen viability and longevity: practical, ecological and evolutionary implications. Plant Systematics and Evolution 222: 113-132.).

Além disso, alguns estudos associam taxas diferenciais de crescimento de tubos polínicos ao nível de ploidia de determinadas espécies e apontam que a poliploidia pode contribuir negativamente neste parâmetro (Green 1946Green, J.M. 1946. Comparative rates of pollen tube establishment. Journal of Heredity 37: 117.; Sarkar & Paria 1980Sarkar, K.R. & Paria, P. 1980. Pollen tube growth and fertilization in diploid and tetraploid maize. Indian Journal of Experimental Biology 18: 985-989.). Por outro lado, a poliploidia pode acarretar em vantagens adaptativas reprodutivas em espécies invasoras colonizando novos ambientes, aumentando a distribuição geográfica (te Beest et al. 2012te Beest , M.; Le Roux, J. J.; Richardson, D.M.; Brysting, A.K.; Suda, J.; Kubesˇova´, M. & Pysˇek, P. 2012. The more the better? The role of polyploidy in facilitating plant invasions. Annals of Botany109: 19-45.).

O gênero Sisyrinchium L. (Iridaceae Juss.: Iridoideae Eaton:Sisyrinchieae J. S. Presl) apresenta aproximadamente 130-140 espécies aceitas distribuídas nas Américas, ocorrendo em locais abertos como campos graminosos, pradarias e paramos. Sisyrinchium é o maior gênero de Iridaceae do Novo Mundo, contudo ainda apresenta lacunas no seu entendimento tanto infragenérico, quanto interespecífico (Goldblatt & Manning 2008Goldblatt, P. & Manning, J.C. 2008. The Iris family: natural history & classification. Timber Press, Portland, Oregon. 290p.; Chauveau et al.2011Chauveau, O.; Eggers, L.; Raquin, C.; Silvério, A.; Brown, S.; Couloux, A.; Cruaud, C.; Kaltchuk-Santos, E.; Yockteng, R.; Souza-Chies, T.T. & Nadot, S. 2011. Evolution of oil-producing trichomes in Sisyrinchium (Iridaceae): Insights from the first comprehensive phylogenetic analysis of the genus. Annals of Botany 107: 1287-1312.; Karst & Wilson 2012Karst, L. & Wilson, C.A. 2012. Phylogeny of the new world genusSisyrinchium (Iridaceae) based on analyses of plastid and nuclear DNA sequence data. Systematic Botany37: 87-95.).

Sisyrinchium caracteriza-se por apresentar ervas perenes (raramente anuais), de folhas unifaciais planas (por vezes, cilíndricas) com nervura central inconspícua; ramos floríferos achatados e tipicamente alados; inflorescências ramificadas (por vezes, reduzidas a flor solitária); flores actinomorfas, amarelas, azuis ou roxas, com seis tépalas livres e três estames simétricos, com filetes fusionados, no mínimo na região basal; coluna estaminal, algumas vezes, inflada e muitas vezes, glandular-pubescentes e estiletes parcialmente fusionados terminados em três estigmas (Goldblatt & Manning 2008Goldblatt, P. & Manning, J.C. 2008. The Iris family: natural history & classification. Timber Press, Portland, Oregon. 290p.; Karst & Wilson 2012Karst, L. & Wilson, C.A. 2012. Phylogeny of the new world genusSisyrinchium (Iridaceae) based on analyses of plastid and nuclear DNA sequence data. Systematic Botany37: 87-95.). A diferenciação específica no gênero baseia-se no trato foliar e nas características florais, em particular na organização do androceu (SouzaChieset al. 2012 Souza-Chies, T.T.; Santos, E.K.; Eggers, L.; Flores, A.M.,; Alves, E.M.S.; Fachinetto, J.; Lustosa, J.; Corrêa, L.B.; Tacuatiá, L.O.; Piccoli, P. & Miz, R.B. 2012. Studies on diversity and evolution of Iridaceae species in southern Brazil. Genetics ad Molecular Biology 35: 1027-1035.).

Informações citológicas no gênero Sisyrinchium revelam uma importante variação infragenérica quanto ao número e tamanho cromossômico, destacando uma importante correlação entre o tamanho do genoma com fatores ambientais e o nível de ploidia (Goldblatt 1982Goldblatt, P. 1982. Chromosome cytology in relation to suprageneric systematics of neotropical Iridaceae. Systematic Botany 7: 186-198. ; Kenton et al. 1984Kenton, A. & Heywood, C. A. 1984. Cytological studies in south American Iridaceae. Plant Systematics and Evolution 146: 87-104., 1986). Para o gêneroSisyrinchium foram reconhecidos vários números cromossômicos (n = 8, 9, 11, 16, 17 e 32) em diferentes níveis de ploidia (Goldblatt & Takei 1997Goldblatt, P. & Takei, M. 1997. Chromosome cytology of Iridaceae patterns of variation, determination of ancestral base numbers, and modes of karyotipes change. Annals of the Missouri Botanical Garden 84: 285-304.), inclusive a presença de diferentes citótipos poliplóides em S. micranthum (Tacuatiáet al. 2012Tacuatiá, L.O.;; Souza-Chies, T.T. Flores, A.M.; Eggers L.; Siljak-Yakovlev S. & KaltchukSantos E. 2012. Cytogenetic and molecular characterization of morphologically variable Sisyrinchiummicranthum (Iridaceae) in southern Brazil. Botanical Journal of the Linnean Society 69: 350-364.). Os números básicos × = 8 e 9 são os mais frequentes, mas × = 9 foi proposto como o número básico ancestral para o gênero (Goldblatt 1982Goldblatt, P. 1982. Chromosome cytology in relation to suprageneric systematics of neotropical Iridaceae. Systematic Botany 7: 186-198. ; Kenton et al. 1986;Goldblatt & Takei 1997Goldblatt, P. & Takei, M. 1997. Chromosome cytology of Iridaceae patterns of variation, determination of ancestral base numbers, and modes of karyotipes change. Annals of the Missouri Botanical Garden 84: 285-304.). A diversidade genética entre populações da mesma espécie foi descrita e observada pelo comportamento cromossômico na meiose de híbridos artificiais, reconhecendo assim barreiras reprodutivas intraespecíficas em Sisyrinchium bermudianum L. (Ingram 1968Ingram R, 1968. Breeding barriers in some species ofSisyrinchium. New Phitologist 67: 197-204.). Poucos estudos cromossômicos foram desenvolvidos para esclarecer a biologia reprodutiva destas espécies, sendo esta completamente desconhecida em Sisyrinchium commutatum Klatt.

Sisyrinchium commutatum é uma espécie herbácea, de pequeno porte, facilmente reconhecida pela presença de folhas e pedúnculos dos ramos floríferos planos, com uma conspícua e contínua bráctea terminal ao pedúnculo, e filetes totalmente soldados, com presença de elevado número de tricomas glandulares (elaióforos), mais densamente agrupados na base da coluna estaminal (adaptado de Chukr & Capellari Jr. 2003Chukr, N.S. & Capellari Jr., L. 2003. Iridaceae.Flora Fanerogâmica do Estado de São Paulo. Wanderley, M.G.L. (coords.). RiMa, São Paulo. Pp. 127-147.) (Fig.1). A espécie ocorre no Cerrado e na Mata Atlântica, em campos abertos, brejos, gramados e beira de matas, nos estados brasileiros de Goiás, Bahia, Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo e Paraná, alcançando o norte do Paraguai (Chukr & Capellari Jr. 2003; Eggers 2013Eggers, L. 2013. SisyrinchiumLista de Espécies da Flora do Brasil, Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Disponível em <Disponível em http://reflora.jbrj.gov.br/jabot/ floradobrasil/FB8067 >. Acesso em 26 novembro 2013.
http://reflora.jbrj.gov.br/jabot/ florad...
).

Este trabalho teve como objetivo caracterizar o número cromossômico de S. commutatum, verificar os eventos meióticos com relação a aspectos da biologia reprodutiva, formação dos grãos-de-pólen e qualidade polínica desta espécie.

Indivíduos de S. commutatum foram coletados no campus da Universidade Estadual de Campinas (22° 49' 12, 47" S e 47° 04' 13,37"O), município de Campinas, São Paulo, entre novembro e dezembro de 2005 e mantidos em casa de vegetação. Vinte e um indivíduos foram utilizados no estudo, dos quais 25 flores de diferentes indivíduos foram marcadas para acompanhamento da taxa de produção de frutos através de polinização natural (mantidos abertos para visitação da fauna de potenciais polinizadores), enquanto 31 flores foram isoladas para verificação de autopolinização espontânea ou ainda emasculadas para possível formação de frutos apomíticos. Além disso, 16 flores de distintos indivíduos foram aleatoriamente escolhidas para verificação da qualidade do pólen através da atividade enzimática pela coloração dos grãos de pólen com vermelho neutro (Dafni 1992Dafni, A. 1992. Pollination Ecology: a practical aproach. Oxford University Press, Oxford. 250p.). As lâminas foram então visualizadas e as cargas polínicas foram contabilizadas através de microscópio óptico. As proporções de pólen viável e inviável por flor foram comparadas através de Teste não-paramétrico de Wilcoxon (Zar 2010Zar, J.H. 2010. Biostatistical Analysis. 5° ed. Prentice Hall, New Jersey. 663p.).

O estudo dos cromossomos em mitose foi desenvolvido utilizando-se raízes de dez indivíduos pré-tratadas com 8-Hidroxiquinoleína 2 mM durante 5h a 15ºC e fixadas em solução de etanol e ácido acético glacial (3:1). A coloração foi realizada mediante a técnica HCl/Giemsa (Guerra 1983Guerra, M.S. 1983. O uso do Giemsa em Citogenética Vegetal: comparação entre a coloração simples e o bandeamento. Ciência e Cultura 35: 190-193.), a qual constitui-se de hidrólise da raiz primeiramente em HCl 1N durante 10 min a 60ºC. A lâmina foi então montada em ácido acético 45% e a lamínula descolada em nitrogênio líquido, posteriormente, deixando secar o material ao ar livre. Após estes procedimentos, o material foi corado com Giemsa 2% durante 2-5 min.

Figura 1
Detalhes da estrutura reprodutiva de S. commutatum. a-b. detalhes da inflorescência. c-d. tricomas glandulares em dois níveis distintos. e. anteras fusionadas. f. êmbolo na porção mediana do estilete.
Figure 1
Reproductive structure details in S. commutatum. a-b. inflorescences details. c-d. glandular trichomes in two distinctive levels. e. fusioned anthers. f. style with embolus in the middle portion.

Para a análise meiótica foram utilizados botões florais de vários indivíduos corados mediante a técnica de Feulgen. Os botões florais foram fixados em fixador 3:1 (etanol: ácido acético glacial), hidrolisados em HCl 1N durante 10 min a 60ºC e corados em reativo de Schiff durante 2h. Posteriormente a lâmina foi montada em ácido acético 45% e a lamínula removida por congelamento com nitrogênio líquido para a montagem de lâmina permanente.

Sisyrinchium commutatum apresentou taxa de produção de frutos por polinização natural de 52 % (n= 25 flores, 17 indivíduos). Autopolinização espontânea (n = 16 flores, 4 indivíduos) e apomixia não foram observadas (n= 15 flores, 5 indivíduos). A deiscência das anteras ocorre antes mesmo da abertura da flor. O pólen disponível e liberado das anteras é empurrado pelo prolongamento do estilete ao longo da antese promovendo a apresentação secundária do pólen com auxílio de um espessamento (êmbolo) na porção mediana do estilete. Desta forma, a massa de pólen entra obrigatoriamente em contato com o estigma sem a participação de polinizadores. Tal característica foi observada também para S. bermudianum (Ingram 1967Ingram R, 1968. Breeding barriers in some species ofSisyrinchium. New Phitologist 67: 197-204.). Assim, A autopolinização espontânea poderia ocorrer, porém sem a ocorrência de autofertilização. A ausência de frutos formados a partir de autopolinização espontânea pode ser indício da possível separação temporal do período de atividade estigmática (protandria), característica observada para outras espécies do gênero (Henderson 1976Henderson, D.M. 1976. A biosystematic study of Pacific North-western blue-eyed grasses (Sisyrinchium, Iridaceae). Brittonia 28: 149-176.), ou ainda de outro mecanismo que atue no impedimento da autofertilização.

Elevada taxa de inviabilidade polínica foi observada na população estudada (88 % ± 45 %, n = 16 flores). Não foi observada diferença na proporção de pólen inviável/ pólen viável para cada flor avaliada na população amostral, com predomínio de flores com pólen inviável (Teste de Wilcoxon, Z = 1,21, p = 0,22). Ainda assim, 37,5% da amostra foi composta por flores com quase a totalidade de pólen inviável. Vale salientar que embora os métodos colorimétricos sejam aproximações da verdadeira eficiência polínica em seu potencial na fertilização de óvulos, estudos têm apontado que tais técnicas superestimam a viabilidade polínica (Munhoz et al. 2008Munhoz, M.; Luz, C.F.P.; Meissner Filho, P.E.; Barth, O.M. & Reinert, F. 2008. Viabilidade polínica de Carica papaya L.: uma comaração metodológica. Revista Brasileira de Botânica 31: 209-214.; Soares et al. 2011Soares, T.L.; Souza, E.H.; Rossi, M.L. & Souza, F.V.D. 2011. Morfologia e viabilidade de grãos de pólen de acessos silvestres de abacaxi. Ciência Rural 41: 1744-1749.). Tal fato ainda corrobora o padrão encontrado de alta taxa de inviabilidade polínica em S. commutatum.

Não há registro do número cromossômico de S. commutatum na literatura e a contagem cromossômica nesta espécie resultou em 2n = 36, apresentando cromossomos de tamanho médio a pequeno que variam de 1 a 2,25 mm (Fig. 2a). O gênero Sisyrinchium é relativamente bem conhecido quanto ao número cromossômico (Goldblatt 1982Goldblatt, P. 1982. Chromosome cytology in relation to suprageneric systematics of neotropical Iridaceae. Systematic Botany 7: 186-198. ;Kenton et al. 1984Kenton, A. & Heywood, C. A. 1984. Cytological studies in south American Iridaceae. Plant Systematics and Evolution 146: 87-104., 1986;Goldblatt & Takei 1997Goldblatt, P. & Takei, M. 1997. Chromosome cytology of Iridaceae patterns of variation, determination of ancestral base numbers, and modes of karyotipes change. Annals of the Missouri Botanical Garden 84: 285-304.; Tacuatiá et al. 2012Tacuatiá, L.O.;; Souza-Chies, T.T. Flores, A.M.; Eggers L.; Siljak-Yakovlev S. & KaltchukSantos E. 2012. Cytogenetic and molecular characterization of morphologically variable Sisyrinchiummicranthum (Iridaceae) in southern Brazil. Botanical Journal of the Linnean Society 69: 350-364.), apresentando uma importante variação no nível de ploidia. O gênero apresenta dois números básicos com maior frequência, × = 8 e 9, representando um caráter relacionado com a classificação infragenérica de Sisyrinchium (Goldblatt 1990Goldblatt, P.; Rudall, P. & Henrich, J.E. 1990. The genera of the Sisyrinchium (Iridaceae: Iridoideaea): Phylogeny and relationships. Systematic Botany15: 497-510.). O subgêneroEchthronema apresenta × = 8 e 9 (Kenton et al. 1986Kenton A. Y.; Rudall, P. J. & Johnson, A. R. 1986. Genome size variation in Sisyrinchium L. (Iridaceae) and its relationship to phenotype and habitat. Botanical Gazette 147: 342-354.; Goldblatt et al. 1997Goldblatt, P. & Takei, M. 1997. Chromosome cytology of Iridaceae patterns of variation, determination of ancestral base numbers, and modes of karyotipes change. Annals of the Missouri Botanical Garden 84: 285-304.) e a maioria das espécies do subgênero Sisyrinchium apresenta × = 8. Assim, a contagem cromossômica em S. commutatum confirma sua posição dentro do subgêneroEchthronema, destacando esta espécie como um elemento tetraploide deste grupo.

A análise meiótica demonstra que maioria das células mães-de-pólen apresenta comportamento normal com a formação de 18 bivalentes na meiose I (Fig. 2b). Mas, algumas células apresentaram diferentes anormalidades meióticas que ocorrem principalmente na primeira divisão. Uma das irregularidades observadas é a presença de multivalentes observados em metáfase I, envolvendo dois ou mais pares de cromossomos não homólogos (Fig 2c). A presença de pontes cromossômicas da anáfase I e telófase I que permanecem logo após a segregação reducional dos cromossomos (Fig. 2d e 2e) poderia ser consequência da formação de multivalentes.

Um segundo tipo de alteração na meiose é observado pela ocorrência de uma migração precoce de cromossomos a um dos pólos observada na metáfase I (Fig. 2f) e a separação antecipada de cromossomos homólogos na metáfase I (Fig. 2g). Estes eventos poderiam estar relacionados à falta de homologia entre alguns cromossomos, evento também observado em linhagens de Capsicum (Solanaceae) (Pozzobon et al. 2011Pozzobon, M.T. 2011. Meiose e viabilidade polínica em linhagens avançadas de pimenta. Horticultura brasileira 29: 212-216.). Este tipo de alteração é frequentemente associado com rearranjos cromossômicos (Stebbins 1971Stebbins, G.L. 1971. Chromosomal evolution in higher plants. Addison-Wesley, London. 216p.), mas sua baixa frequência supõe que não tem um efeito significativo indivíduo. O número cromossômico e o comportamento meiótico sugere que esta espécie é um tetraploide com um avançado processo de diploidização (Santos et al. 2003Santos J.L.; Alfaro D.; Sanchez-Moran E.; Armstrong S.J.; Franklin F.C.H. & Jones G.H. 2003. Partial diploidization of meiosis in autotetraploid Arabidopsis thaliana. Genetics 165: 1533-1540.) e que a formação de multivalentes e pontes na segregação sejam uma expressão de homologia persistente entre cromossomos não homólogos e a causa da menor viabilidade polínica em alguns indivíduos da população.

Figura 2
Análise da Mitose e Meiose em S. commutatum - a. cromossomos mitóticos; b. comportamento meiótico normal em MI deS. commutatum; c. associações multivalentes em MI; d. ponte em anáfase tardia; e. ponte em telófase; f. separação precoce em MI; g. segregação precoce em MI. Todas as microfotografias tem a mesma ampliação. Escala: 10 mm.
Figure 2
Mitosis and meiosis process in S. commutatum; a. mitotic chromosomes; b. meiosis normal behavior in S. commutatum MI; c. multivalent associations in MI; d. late anaphase links; e. telophase links; f. premature division in MI; g. premature segregation in MI. All images have the same extension. Bar: 10 mm.

Assim, o presente estudo incorpora importantes informações a respeito de mecanismos de polinização, tal como a ocorrência de apresentação secundária de pólen na espécie, não ocorrência de autofertilização e relação com a tetraploidia observada. Além disso, o inédito número cromossômico deve auxiliar no entendimento da evolução deste grupo. A ocorrência de altas taxas de inviabilidade polínica e dos fenômenos anormais observados na meiose contribui ainda para o entendimento da influência de fatores geradores de tais anormalidades na estabilidade reprodutiva de espécies vegetais.

Agradecimentos

Os autores agradecem a CAPES (A.B. Gil) e a Fapesp (R.S. Avila Jr, J. Urdampilleta), a concessão de bolsas na época do estudo e ao professor G.J. Shepherd, os valiosos comentários.

Referências

  • Barrett, S. & Eckert, C.G. 1990. Current issues in plant reproductive ecology. Israel Journal of Botany 39: 5-12.
  • Barrett, S. 2002. The evolution of plant sexual diversity. Nature 3: 274-284.
  • Chauveau, O.; Eggers, L.; Raquin, C.; Silvério, A.; Brown, S.; Couloux, A.; Cruaud, C.; Kaltchuk-Santos, E.; Yockteng, R.; Souza-Chies, T.T. & Nadot, S. 2011. Evolution of oil-producing trichomes in Sisyrinchium (Iridaceae): Insights from the first comprehensive phylogenetic analysis of the genus. Annals of Botany 107: 1287-1312.
  • Chukr, N.S. & Capellari Jr., L. 2003. Iridaceae.Flora Fanerogâmica do Estado de São Paulo. Wanderley, M.G.L. (coords.). RiMa, São Paulo. Pp. 127-147.
  • Dafni, A. 1992. Pollination Ecology: a practical aproach. Oxford University Press, Oxford. 250p.
  • Dafni, A. & Firmage, D. 2000. Pollen viability and longevity: practical, ecological and evolutionary implications. Plant Systematics and Evolution 222: 113-132.
  • Eggers, L. 2013. SisyrinchiumLista de Espécies da Flora do Brasil, Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Disponível em <Disponível em http://reflora.jbrj.gov.br/jabot/ floradobrasil/FB8067 >. Acesso em 26 novembro 2013.
    » http://reflora.jbrj.gov.br/jabot/ floradobrasil/FB8067
  • Guerra, M.S. 1983. O uso do Giemsa em Citogenética Vegetal: comparação entre a coloração simples e o bandeamento. Ciência e Cultura 35: 190-193.
  • Goldblatt, P. 1982. Chromosome cytology in relation to suprageneric systematics of neotropical Iridaceae. Systematic Botany 7: 186-198.
  • Goldblatt, P. & Manning, J.C. 2008. The Iris family: natural history & classification. Timber Press, Portland, Oregon. 290p.
  • Goldblatt, P.; Rudall, P. & Henrich, J.E. 1990. The genera of the Sisyrinchium (Iridaceae: Iridoideaea): Phylogeny and relationships. Systematic Botany15: 497-510.
  • Goldblatt, P. & Takei, M. 1997. Chromosome cytology of Iridaceae patterns of variation, determination of ancestral base numbers, and modes of karyotipes change. Annals of the Missouri Botanical Garden 84: 285-304.
  • Green, J.M. 1946. Comparative rates of pollen tube establishment. Journal of Heredity 37: 117.
  • Henderson, D.M. 1976. A biosystematic study of Pacific North-western blue-eyed grasses (Sisyrinchium, Iridaceae). Brittonia 28: 149-176.
  • Ingram R, 1968. Breeding barriers in some species ofSisyrinchium New Phitologist 67: 197-204.
  • Karst, L. & Wilson, C.A. 2012. Phylogeny of the new world genusSisyrinchium (Iridaceae) based on analyses of plastid and nuclear DNA sequence data. Systematic Botany37: 87-95.
  • Kenton, A. & Heywood, C. A. 1984. Cytological studies in south American Iridaceae. Plant Systematics and Evolution 146: 87-104.
  • Kenton A. Y.; Rudall, P. J. & Johnson, A. R. 1986. Genome size variation in Sisyrinchium L. (Iridaceae) and its relationship to phenotype and habitat. Botanical Gazette 147: 342-354.
  • Munhoz, M.; Luz, C.F.P.; Meissner Filho, P.E.; Barth, O.M. & Reinert, F. 2008. Viabilidade polínica de Carica papaya L.: uma comaração metodológica. Revista Brasileira de Botânica 31: 209-214.
  • Pagliarini, M.S. 2000. Meiotic behavior of economically important plant-species: the relationship between fertility and male sterility. Genetics and Molecular Biology 23: 997-1002.
  • Pozzobon, M.T. 2011. Meiose e viabilidade polínica em linhagens avançadas de pimenta. Horticultura brasileira 29: 212-216.
  • Santos J.L.; Alfaro D.; Sanchez-Moran E.; Armstrong S.J.; Franklin F.C.H. & Jones G.H. 2003. Partial diploidization of meiosis in autotetraploid Arabidopsis thaliana Genetics 165: 1533-1540.
  • Sarkar, K.R. & Paria, P. 1980. Pollen tube growth and fertilization in diploid and tetraploid maize. Indian Journal of Experimental Biology 18: 985-989.
  • Soares, T.L.; Souza, E.H.; Rossi, M.L. & Souza, F.V.D. 2011. Morfologia e viabilidade de grãos de pólen de acessos silvestres de abacaxi. Ciência Rural 41: 1744-1749.
  • Souza-Chies, T.T.; Santos, E.K.; Eggers, L.; Flores, A.M.,; Alves, E.M.S.; Fachinetto, J.; Lustosa, J.; Corrêa, L.B.; Tacuatiá, L.O.; Piccoli, P. & Miz, R.B. 2012. Studies on diversity and evolution of Iridaceae species in southern Brazil. Genetics ad Molecular Biology 35: 1027-1035.
  • Stebbins, G.L. 1971. Chromosomal evolution in higher plants. Addison-Wesley, London. 216p.
  • Tacuatiá, L.O.;; Souza-Chies, T.T. Flores, A.M.; Eggers L.; Siljak-Yakovlev S. & KaltchukSantos E. 2012. Cytogenetic and molecular characterization of morphologically variable Sisyrinchiummicranthum (Iridaceae) in southern Brazil. Botanical Journal of the Linnean Society 69: 350-364.
  • Taschetto, O.M.; Pintro, J.C. & Pagliarini, M.S. 2003. Chromossome stickness during microsporogenesis in Pfaffia glomerataand P. tuberosa (Amaranthaceae). The Nucleus 46: 128-137.
  • te Beest , M.; Le Roux, J. J.; Richardson, D.M.; Brysting, A.K.; Suda, J.; Kubesˇova´, M. & Pysˇek, P. 2012. The more the better? The role of polyploidy in facilitating plant invasions. Annals of Botany109: 19-45.
  • Zar, J.H. 2010. Biostatistical Analysis. 5° ed. Prentice Hall, New Jersey. 663p.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    July-Sep 2015

Histórico

  • Recebido
    22 Jan 2015
  • Aceito
    06 Maio 2015
Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro Rua Pacheco Leão, 915 - Jardim Botânico, 22460-030 Rio de Janeiro, RJ, Brasil, Tel.: (55 21)3204-2148, Fax: (55 21) 3204-2071 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: rodriguesia@jbrj.gov.br