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Flora das cangas da Serra dos Carajás, Pará, Brasil: Thymelaeaceae

Flora of the cangas of the Serra dos Carajás, Pará, Brazil: Thymelaeaceae

Resumo

Este estudo engloba a única espécie de Thymelaeaceae registrada para as cangas da Serra dos Carajás, no estado do Pará, trazendo descrição detalhada, ilustração e comentários morfológicos. Daphnopsis filipedunculata é descrita para a Serra dos Carajás, sendo considerada restrita as formações de cangas da região, ocorrendo até o presente apenas em três áreas da Serra Norte: platôs N1, N2 e N5.

Palavras-chave:
canga; endemismo; FLONA Carajás

Abstract

This study presents the only species of Thymelaeaceae recorded for the cangas of the Serra dos Carajás, in Pará state: detailed description, illustration and morphologic comments on the species are given. Daphnopsis filipedunculata is described to the Serra dos Carajás and this species is considered restricted to the canga formations in the region, recorded in only three areas of Serra Norte so far: N1, N2 and N5 plateaus.

Key words:
canga; endemism; FLONA Carajás

Thymelaeaceae

Thymelaeaceae A. Juss. compreende cerca de 53 gêneros com mais de 500 espécies, sendo considerada uma família subcosmopolita (Rossi 1997Rossi, L. 1997. Revisão taxonômica das espécies da família Thymelaeaceae do Brasil. Tese de Doutorado. Instituto de Biociências - Universidade de São Paulo, São Paulo. 246p.). Podem ser árvores, arvoretas, arbustos, ervas ou lianas com folhas simples, alternas, opostas ou pseudoverticiladas, sem estípulas, tendo como característica marcante uma rede de fortes fibras associadas ao floema (Nevling 1959Nevling, L.I. 1959. A revision of the genus Daphnopsis. Annals of the Missouri Botanical Garden 46: 257-358.). As flores são monoclamídeas ou diclamídeas, com 2 a vários estames, e, sendo nesse último caso dispostos em dois verticilos e gineceu com 2 a 12 carpelos, predominantemente 2-carpelar e unilocular (Nevling 1959Nevling, L.I. 1959. A revision of the genus Daphnopsis. Annals of the Missouri Botanical Garden 46: 257-358., 1963Nevling, L.I. 1963. Notes on Daphnopsis. Journal of the Arnold Arboretum 44: 402-410.).

No Brasil são registradas 26 espécies, distribuídas em sete gêneros (BFG 2015BFG. 2015. Growing knowledge: an overview of seed plant diversity in Brazil. Rodriguésia 66: 1085-1113.). Seis espécies são registradas no estado do Pará, sendo três pertencentes a Lophostoma (Meisn.) Meisn., uma a Daphnopsis Mart., uma a Funifera (Raddi) Mansf. e uma a Schoenobiblus Mart. (BFG 2015BFG. 2015. Growing knowledge: an overview of seed plant diversity in Brazil. Rodriguésia 66: 1085-1113.).

1. Daphnopsis Mart. Nov. Gen. Sp. Pl. 1(3): 65. 1824.

Daphnopsis é o maior dos gêneros neotropicais de Thymelaeaceae com cerca de 60 espécies (Barringer & Nevling 1994Barringer, K. & Nevling, L.I. 1994. New species of Daphnopsis (Thymelaeaceae) from Panama. Novon 4: 9-15.). As espécies são geralmente arbustos ou arvoretas, raramente árvores, dióicas, com flores pediceladas ou sésseis, monoclamídeas, tetrâmeras, campanuladas e unissexuadas - exceto D. americana (Mill.) J.R. Johnst. (Nevling 1959Nevling, L.I. 1959. A revision of the genus Daphnopsis. Annals of the Missouri Botanical Garden 46: 257-358.). As flores estaminadas possuem oito estames e um pistilódio geralmente bem desenvolvido. As flores pistiladas possuem pistilo pseudo-monômero formado por ovário bicarpelar, sendo um carpelo fértil e o outro estéril, podendo ter ou não oito estaminódios (Nevling 1959Nevling, L.I. 1959. A revision of the genus Daphnopsis. Annals of the Missouri Botanical Garden 46: 257-358., 1963Nevling, L.I. 1963. Notes on Daphnopsis. Journal of the Arnold Arboretum 44: 402-410.).

São registradas 12 espécies de Daphnopsis para o país, sendo 10 delas endêmicas (BFG 2015BFG. 2015. Growing knowledge: an overview of seed plant diversity in Brazil. Rodriguésia 66: 1085-1113.). Na Serra dos Carajás ocorre apenas Daphnopsis filipedunculata, considerada endêmica das cangas na região (Nevling & Barringer 1993Nevling, L.I. & Barringer, K. 1993. A new Thymelaeaceae from Brazil. Brittonia 45: 335-336., este trabalho).

1.1 Daphnopsis filipedunculata Nevling & Barringer, Brittonia 45(4): 335. 1993. Figs. 1a-d; 2a-f

Figura 1
Daphnopsis filipedunculata - a. ramo florífero estaminado; b. base da lâmina foliar; c. detalhe da inflorescência com as flores estaminadas; d. flor estaminada dissecada com dois verticilos de estames e um pistilódio. Desenhado por João Silveira (R.M. Harley et al. 57246)
Figure 1
Daphnopsis filipedunculata - a. staminate flowering branch; b. base of leaf blade; c. detail of inflorescence with staminate flowers; d. dissected staminate flower with two whorls of stamens and one pistilode. Drawn by João Silveira (R.M. Harley et al. 57246)
Figura 2
Daphnopsis filipedunculata - a-c. ramos floríferos estaminados; d. vista adaxial da folha com detalhe de uma inflorescência; e. vista abaxial da folha com detalhe de uma inflorescência; f. flor estaminada dissecada com detalhe dos estames e do pistilódio (Fotos: N.F.O. Mota).
Figure 2
Daphnopsis filipedunculata - a-c. staminate flowering branches; d. adaxial view of the leaf and detail of an inflorescence; e. abaxial view of the leaf and detail of an inflorescence; f. dissected staminate flower, showing in detail the stamens and pistilode (Photos: N.F.O. Mota).

Arvoreta 1-8 m alt.; ramos castanhos, cilíndricos, glabros, ramos jovens seríceos a glabrescentes. Folhas concentradas no ápice dos ramos, decurrentes; pecíolo canaliculado, castanho-avermelhado, pubescente; lâmina 8,5-15 × 3,5-6,5 cm, elíptica a levemente oboval, ápice agudo a acuminado, margem plana, base cuneada, membranáceas, discolores, verde-claras, levemente glaucas, velutinas na face adaxial, serícea em ambas as faces, tricomas alvos; 8-10 nervuras secundarias. Plantas masculinas com inflorescências em racemos subumbeliformes, capitados, axilares, pêndulas, pedúnculos filiformes, 8-13 cm compr., raque ausente a 1-2 mm compr., 3-12 flores. Flores estaminadas, curto-pediceladas (< 2 mm); cálice 6-9 mm compr., membranáceo, obcônico, urceolado, levemente constrito na fauce, externamente densamente seríceo, tricomas simples, não glandulares; lobos do cálice oval-lanceolados; pétalas rudimentares fundidas em ânulo; estames sésseis, os opostos às sépalas inseridos na fauce, parcialmente exsertos, os alternos mais abaixo, sempre inclusos, anteras oval-oblongas; pistilódio fusiforme, oblongo, densamente piloso. Plantas femininas desconhecidas.

Material selecionado: Parauapebas, N2, 6°3'38"S, 50°14'46"W, 707 m, 24.VIII.2012, fl. estam., A.J. Arruda et al. 1269 (BHCB); N1, 6°3'S, 50°16'W, 650 m, 19.V.1982, fl. estam., C.R. Sperling et al. 5734 (NY, MG); Trilha para Lagoa N5, 6°2'28,5"S, 50°5'15"W, 667 m, 21.VI.2015, fl. estam., R.M. Harley et al. 57246 (MG).

Daphnopsis filipedunculata é uma espécie bem distinta dentro do gênero por apresentar inflorescências axilares pendentes no ápice de longos pedúnculos, pelas folhas, discolores com superfície abaxial serícea, velutina, além da constrição incomum do cálice. Trata-se de uma espécie rara, sendo conhecida apenas três coletas (todos indivíduos masculinos). Um dos indivíduos (platô N5) foi monitorado entre junho de 2015 a abril de 2016, tendo o pico de floração nos meses de junho e julho de 2015. Em setembro de 2015, observou-se que em cada ponto de coleta de D. filipedunculata se concentrava um elevado número de novos ramos com alturas variáveis entre 30 e 60 cm que emergiam de um robusto sistema caulinar subterrâneo, de um único indivíduo.

Endêmica da Serra dos Carajás: Serra Norte: N1, N2 e N5. Encontrada em mata baixa (floresta decídua de dossel baixo) sobre solo ferruginoso, adjacente aos campos rupestres de canga.

Lista de exsicatas

  • Arruda, A.J. 1269 (1.1); Sperling, C.R. 5734 (1.1 tipo); Silva, L.V.C. 1263 (1.1); Harley, R.M. 57246 (1.1).

Agradecimentos

Agradecemos ao Museu Paraense Emílio Goeldi e ao Instituto Tecnológico Vale, a estrutura e o apoio fundamentais ao desenvolvimento desse trabalho. Aos curadores dos herbários consultados, o acesso ao materiais examinados. Ao ICMBio, especialmente ao senhor Frederico Drumond Martins, a licença de coleta concedida e suporte nos trabalhos de campo. Ao Programa de Capacitação Institucional (MPEG/MCTI), a bolsa concedida à primeira autora. Ao CNPq, a bolsa Sênior concedida à segunda autora. Ao projeto objeto do convênio MPEG/ITV/FADESP (01205.000250/2014-10) e ao projeto aprovado pelo CNPq (processo 455505/2014-4), o financiamento.

Referências

  • BFG. 2015. Growing knowledge: an overview of seed plant diversity in Brazil. Rodriguésia 66: 1085-1113.
  • Nevling, L.I. 1959. A revision of the genus Daphnopsis Annals of the Missouri Botanical Garden 46: 257-358.
  • Nevling, L.I. 1963. Notes on Daphnopsis Journal of the Arnold Arboretum 44: 402-410.
  • Nevling, L.I. & Barringer, K. 1993. A new Thymelaeaceae from Brazil. Brittonia 45: 335-336.
  • Barringer, K. & Nevling, L.I. 1994. New species of Daphnopsis (Thymelaeaceae) from Panama. Novon 4: 9-15.
  • Barringer, K. & Pruski, J.F. 2005. Two new cauliflorous species of Daphnopsis (Thymelaeaceae) from French Guiana and Surinam. Novon 15: 50-54.
  • Rossi, L. 1997. Revisão taxonômica das espécies da família Thymelaeaceae do Brasil. Tese de Doutorado. Instituto de Biociências - Universidade de São Paulo, São Paulo. 246p.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2016

Histórico

  • Recebido
    01 Maio 2016
  • Aceito
    23 Ago 2016
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