Acessibilidade / Reportar erro

Flora do Rio de Janeiro: Hydroleaceae

Flora of Rio de Janeiro: Hydroleaceae

Resumo

O presente estudo tem como objetivo contribuir para o conhecimento das espécies de Hydroleaceae ocorrentes no estado do Rio de Janeiro. O trabalho tem por base a análise morfológica de materiais depositados em herbários e coletas de campo, além de dados de literatura. Foi registrada a ocorrência de um gênero e duas espécies: Hydrolea elatior e H. spinosa. São apresentadas chave de identificação, descrições, ilustrações e dados sobre habitat, fenologia e distribuição geográfica das espécies.

Palavras-chave:
florística; Hydrolea; plantas aquáticas; taxonomia

Abstract

This study focuses on the Hydroleaceae species from the state of Rio de Janeiro. It is based on morphological analysis of herbaria specimens, as well as on a review of the relevant literature and field collections. One genus and two species were recorded: Hydrolea elatior and H. spinosa. Identification key, descriptions, illustrations, habitat data, phenology, and species distribution are also provided.

Key words:
floristic; Hydrolea; aquatic plant; taxonomy

Hydroleaceae R. Br. ex Edwards

Ervas, subarbustos ou arbustos, perenes ou anuais; ramos eretos, raramente decumbentes ou prostrados. Folhas alternas, por vezes rosuladas, simples, glabras ou com tricomas glandulares, lâmina elíptica, lanceolada, linear ou ovada. Inflorescência axilar e terminal em cimeira, panícula, corimbo ou glomérulo, raramente flor solitária. Flores hermafroditas, actinomorfas ou ligeiramente zigomorfas; sépalas 5, lanceoladas a cordadas, unidas na base, glabras ou híspido-hirsutas, pétalas 5, campanuladas ou campanulo-rotáceas, glabras ou com tricomas; estames 5, adnatos à base do tubo da corola, anteras dorsifixas, deiscência longitudinal; ovário súpero, 2-carpelar, 2-locular, raramente 3-4, pluriovulado, placentação axial, disco nectarífero presente ou ausente. Fruto cápsula loculicida, septicida ou irregular, glabro ou pubescente.

Hydroleaceae possui um único gênero com cerca de 11 espécies de distribuição pantropical, incluindo regiões subtropicais. Ocorrem em ambientes aquáticos ou paludosos (Davenport 1988Davenport, L.J. 1988. A monograph of Hydrolea (Hydrophyllaceae). Rhodora 90: 169-208.; Pansarin & Amaral 2003Pansarin, E.R. & Amaral, M.C.E. 2003. Hydrophyllaceae. In: Wanderley, M.G.L.; Shepherd, G.J.; Giulietti, A.M. & Melhem, T.A. Flora Fanerogâmica do estado de São Paulo. Instituto de Botânica, São Paulo. Vol. 3, pp. 123-125.).

1. Hydrolea L.

Plantas geralmente anfíbias; caules suculentos ou lenhosos, verdes, castanhos, roxos ou quase pretos, com ou sem tricomas glandulares, com ou sem espinhos, ocasionalmente ramificados. Folhas sésseis ou pecioladas, base aguda, atenuada, cuneada ou obtusa, margem inteira, serrilhada ou levemente ondulada, ápice agudo, acuminado ou cuspidado. Flores vistosas; sépalas verdes ou arroxeadas, persistentes no fruto, pétalas azuis, roxas, ocasionalmente brancas; estames introrsos, filetes filiformes, dilatados na base, anteras brancas ou de cor creme, grãos de pólen 3-colporados; ovário verde ou azul, glabro ou pubescente, estilete 2, raro 3-4, livre, persistente, estigma papiloso. Fruto cápsula globosa ou ovoide; sementes numerosas, ovoides a cilíndricas com estrias longitudinais.

No Brasil o gênero encontra-se representado por três espécies. Apesar de BFG (2015)BFG. 2015. Growing knowledge: an overview of seed plant diversity in Brazil. Rodriguésia 66: 1085-1113. citar Hydrolea palustris (Aubl.) Raeusch. para o estado do Rio de Janeiro, não foi encontrada nenhuma exsicata desta espécie nos herbários visitados, na plataforma speciesLink ou em trabalho de campo. Apenas H. elatior Schott e H. spinosa L. ocorrem no estado do Rio de Janeiro.

    Chave para identificação das espécies
  • 1. Caule glabro e sem espinhos; folha com base obtusa; inflorescência axilar em cimeira ou panícula e terminal em panícula; cápsula globosa......................................................................1. Hydrolea elatior

  • 1'. Caule com tricomas glandulares e espinhos (raro espinhos ausentes); folha com base cuneada; inflorescência axilar em panícula ou corimbo e terminal em corimbo; cápsula ovoide............................................................................................................................................................2. Hydrolea spinosa

1.1. Hydrolea elatior Schott in Sprengel, Syst. Veg. 4: 404. 1827. Fig.1a-c

Figura 1
a-c. Hydrolea elatior - a. caule glabro; b. detalhe da base obtusa da folha glabra; c. cápsula globosa (Moreira 72). d-f. Hydrolea spinosa - d. caule com tricomas glandulares; e. detalhe da folha de base cuneada com tricomas glandulares (Donza 171); f. cápsula ovoide (Bove 270). Escalas = 1 mm.
Figure 1
a-c. Hydrolea elatior - a. glabrous stem; b. detail of the glabrous obtuse leaf base; c. globose capsule (Moreira 72). d-f. Hydrolea spinosa - d. stem with glandular trichomes; e. detail of the cuneate leaf base with glandular trichomes (Donza 171); f. ovoid capsule (Bove 270). Scales = 1 mm.

Ervas 0,5-1,5 m alt.; caule ereto, castanho ou vináceo, espinhos e tricomas glandulares ausentes. Folhas curto-pecioladas, pecíolo 1-5 mm compr.; lâmina lanceolada a elíptica 33-80 × 6-14 mm, base obtusa, margem inteira a ondulada, ápice agudo, glabra. Inflorescência axilar em cimeira ou panícula e terminal em panícula; pedúnculos 6-85 mm compr., pedicelos 1-16 mm compr., bráctéolas 4-13 × 2-2,5 mm, glabras; sépalas lanceoladas, arroxeadas, 3,5-5,6 × 1,3-2,4 mm, tricomas glandulares na face adaxial; pétalas campanuladas, roxas, 3,3-5,3 × 2-3,2 mm, glabras; filetes 3-4,5 mm compr., anteras 1,2-1,6 mm compr.; ovário verde, globoso, 2-locular, esparsamente pubescente no ápice, disco nectarífero presente, estilete 2, 1,5-4,8 mm compr. Cápsula globosa, 3,5-5 mm compr., deiscência loculicida; sementes 0,3-0,6 × 0,1-0,2 mm.

Material examinado: Araruama, Engenho Grande, rua transversal à estrada do Engenho Grande, 21.X.2000, fl. e fr., C.B. Moreira 72 (R); Saquarema, Bonsucesso, a 5 km de Bacaxá, 10.II.2000, fr., B.M.B. Leite et al. 11 (R).

No Brasil a espécie ocorre em Roraima, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Rio Grande do Sul (Davenport 1988Davenport, L.J. 1988. A monograph of Hydrolea (Hydrophyllaceae). Rhodora 90: 169-208.; BFG 2015BFG. 2015. Growing knowledge: an overview of seed plant diversity in Brazil. Rodriguésia 66: 1085-1113.). No Rio de Janeiro é encontrada em ambiente de restinga (quadrícula T24 e T23). Coletada com flores em outubro e frutos em outubro e fevereiro.

1.2. Hydrolea spinosa L., Sp. pl. ed. 2, 1: 328. 1762. Fig. 1d-f

Ervas 0,5-2 m alt.; caule ereto, verde ou castanho, espinhos 1-2 por nó, raro ausentes; tricomas glandulares presentes em todas as estruturas exceto corola e androceu. Folhas curto-pecioladas, pecíolo 2-8 mm compr.; lâmina elíptica a lanceolada 30-63 × 12-14 mm, base cuneada, margem inteira, ápice agudo. Inflorescência axilar em panícula ou corimbo e terminal em corimbo; pedúnculos 11-93 mm compr., pedicelos 1-20 mm compr., bractéolas 5-20 × 3-5 mm; cálice sépalas lanceoladas, verdes, 2,5-6 × 1,5-3 mm, tricomas glandulares mais conspícuos na face adaxial do que na adaxial; pétalas campanuladas, azuis, 4,2-9,5 × 3,1-5,3 mm; filetes 4,1-8,5 mm compr., anteras 1-2 mm compr.; ovário verde ou azul, ovoide, 2-locular, densamente pubescente no ápice, disco nectarífero presente, estilete 2, 4,5-6 mm compr. Cápsula ovoide, 3-6 mm compr., deiscência loculicida; sementes 0,4-0,7 × 0,2-0,3 mm.

Material examinado: Rio de Janeiro, Restinga da Tijuca, 23.III.1943, fl., O. Machado 75454 (RB); Barra da Tijuca, 1.IX.1945, fr., O. Machado 75279 (RB).

Material adicional examinado: Bahia, Jussiape, Rio de Contas, 29.VI.2012, fl., A. Donza et al. 171 (R); Mato Grosso, Água Boa - Cocalinho, 12.X.1997, fr., C. Bove et al. 270 (R); Santa Catarina, Chapecó, Fazenda Campo São Vicente 24 km, 20-21.II.1957, fr., L.B. Smith & R. Klein 11629 (R).

No Brasil é amplamente distribuída ocorrendo em todos os estados (BFG 2015BFG. 2015. Growing knowledge: an overview of seed plant diversity in Brazil. Rodriguésia 66: 1085-1113.). No Rio de Janeiro sua ocorrência é rara, somente restinga da Barra da Tijuca (quadrícula T16) e possivelmente extinta, pois a região onde foi coletada há quase 70 anos, atualmente é área urbana. Coletada com flores em março e frutos em setembro. Davenport (1988)Davenport, L.J. 1988. A monograph of Hydrolea (Hydrophyllaceae). Rhodora 90: 169-208. considera três variedades, sendo H. spinosa L. var. spinosa a única registrada no Rio de Janeiro. Conhecida popularmente como carqueja-do-pântano (Flaster & Peixoto 1972Flaster, B. & Peixoto, A.L. 1972. Hidrofiláceas. In: Reitz, P.R. (ed.). Flora Ilustrada Catarinense, parte 1, fascículo Hidrof. Herbário Barbosa Rodrigues, Itajaí. Pp. 1-12.) tem potencial apícola e ornamental, forrageira pouco procurada (Pott & Pott 2000Pott, V.J. & Pott, A. 2000. Plantas aquáticas do Pantanal. Embrapa, Brasília. 404p.). Se comporta ocasionalmente como invasora de culturas (Souza & Lorenzi 2005Souza, V.C. & Lorenzi, H. 2005. Botânica sistemática: um guia ilustrado para identificação das famílias de Angiospermas da flora brasileira, baseado em APGII. Instituto Plantarum, Nova Odessa. 640p.).

Lista de exsicatas

  • Bove, C. (1,2); Donza, A. 171 (1.2); Leite, B.M.B. 11 (1.1); Machado, O. 75279 (1.2), 75454 (1.2); Moreira, C.B. 72 (1.1); Smith, L.B. 11629 (1.2).

Agradecimentos

Aos curadores e equipe dos herbários HB, R, RB. Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (Edital PROTAX, Processo 562251/2010-3), a bolsa de Produtividade de C.P.B., e a bolsa de Iniciação Científica CNPq/PIBIC de I.G.C.M.C.

Referências

  • Bennett, A.W. 1879. Hydroleaceae. In: Martius, C.F.P. & Eichler, A.G. (eds.). Flora brasiliensis Typographia Regia, Munchen, Wien. Vol. 7, pars 0, pp. 391-398.
  • BFG. 2015. Growing knowledge: an overview of seed plant diversity in Brazil. Rodriguésia 66: 1085-1113.
  • Davenport, L.J. 1988. A monograph of Hydrolea (Hydrophyllaceae). Rhodora 90: 169-208.
  • Flaster, B. & Peixoto, A.L. 1972. Hidrofiláceas. In: Reitz, P.R. (ed.). Flora Ilustrada Catarinense, parte 1, fascículo Hidrof. Herbário Barbosa Rodrigues, Itajaí. Pp. 1-12.
  • Mendonça, R.M. & Bove, C.P. 2007. Hydroleaceae. Flora dos estados de Goiás e Tocantins. Coleção Rizzo. Vol. 34. Universidade Federal de Goiás, Goiânia. 19p.
  • Pansarin, E.R. & Amaral, M.C.E. 2003. Hydrophyllaceae. In: Wanderley, M.G.L.; Shepherd, G.J.; Giulietti, A.M. & Melhem, T.A. Flora Fanerogâmica do estado de São Paulo. Instituto de Botânica, São Paulo. Vol. 3, pp. 123-125.
  • Pott, V.J. & Pott, A. 2000. Plantas aquáticas do Pantanal. Embrapa, Brasília. 404p.
  • Souza, V.C. & Lorenzi, H. 2005. Botânica sistemática: um guia ilustrado para identificação das famílias de Angiospermas da flora brasileira, baseado em APGII. Instituto Plantarum, Nova Odessa. 640p.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2017

Histórico

  • Recebido
    24 Set 2015
  • Aceito
    04 Dez 2015
Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro Rua Pacheco Leão, 915 - Jardim Botânico, 22460-030 Rio de Janeiro, RJ, Brasil, Tel.: (55 21)3204-2148, Fax: (55 21) 3204-2071 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: rodriguesia@jbrj.gov.br