Acessibilidade / Reportar erro

DESFAZENDO OS DESESPERANÇOSOS MAPAS HETERONORMATIVOS DO PRESENTE COM MATTILDA BERNSTEIN SYCAMORE

UNDOING HOPELESS HETERONORMATIVE MAPS OF THE PRESENT WITH MATTILDA BERNSTEIN SYCAMORE

Resumo

Considerando a prática política dos estudos queer, o presente trabalho investiga como dois livros de memórias de Mattilda Bernstein Sycamore permitem compreender uma “temporalidade de retidão” e suas formas de morte para pessoas LGBTQIAPN+. Centrando-se principalmente nos apontamentos de José Esteban Muñoz (2019), Sara Ahmed (2006) e Jack Halberstam (2005), uma leitura crítica das obras é realizada para sublinhar a reprodução de formas paradigmáticas de vida que produzem algumas orientações de vida como possíveis e corretas e outras como problemas a evitar. Ao final, argumenta-se que os escritos de Sycamore contestam e interrogam a estrutura presente e oferecem questionamentos para novos movimentos políticos para dissidentes de gênero e sexualidade.

Palavras-chave
Mattilda Bernstein Sycamore; Estudos queer; Temporalidade

Abstract

Taking into consideration the political practice of queer studies, this work investigates how two memoirs by Mattilda Bernstein Sycamore allows us to understand straight temporality and its types of death for LGBTQIA+ people. Centering mainly on theoretical stances by José Esteban Muñoz (2019), Sara Ahmed (2006), and Jack Halberstam (2005), a critical reading of the memoirs highlights how the reproduction of paradigmatic life markers produce some life orientations as possible and correct while others are problems to avoid. At the end of the paper, it is argued that Sycamore’s writings contest and interrogate the structure in place while offering questions for new political movements for sexual and gender dissidents.

Keywords
Mattilda Bernstein Sycamore; Queer studies; Temporality

Clare Hemmings (2011)HEMMINGS, Clare. Why Stories Matters: The political grammar of feminist theory. Durham and London: Duke University Press, 2011., pesquisadora de feminismos e teoria queer, argumenta em Why Stories Matter que uma das coisas que ela sempre apreciou na teoria feminista é o senso de utopia que nela reside. Para Hemmings, há uma tradição na crítica feminista de manter um otimismo determinado (e, até mesmo, resiliente) que permite que todas as pessoas ali envolvidas possam pensar e experienciar uma vida diferente. Assim, seguindo as pistas de Hemmings, práticas investigativas feministas podem ser descritas como profundamente marcadas pelo desejo de novas formas de ser e estar mundo, ou seja, ações que envolvem o pensar utópico como um horizonte de mudança.

Dialogando sobre o mesmo senso de utopia que marca a escrita de autoria feminina, as pesquisadoras Ildney Cavalcanti e Luciana Deplagne (2019, p. 9)CAVALCANTI, Ildney; DEPLAGNE, Luciana Calado. Apresentação: Sobre as utopias sonhadas e as distopias anunciadas na literatura. In: CAVALCANTI, Ildney; DEPLAGNE, Luciana Calado (org.). Utopias Sonhadas / Distopias Anunciadas: Feminismo, gênero e cultura queer na literatura. João Pessoa: Editora UFPB, 2019. p. 9-21. afirmam que “[p]ara mulheres de todos os tempos e lugares, o mundo tem sido predominantemente distópico, uma vez que tem se configurado (de modo transcultural, hegemônico e histórico) como patriarcal.” Segundo as autoras, o feminismo se constitui como uma força de mudança dessas realidades quando a ausência e a supressão de vozes de autorias femininas são visibilizadas e, por isso, as denúncias e as contestações permitem repensar formas de praticar novos futuros.

O que os escritos de Hemmings e Cavalcanti e Deplagne têm em comum é o interesse de reafirmar os feminismos, em suas pluralidades, como teorizações que desafiam as estruturas vigentes com o intuito de não apenas sonhar, mas efetivamente construir um futuro melhor. Reside aí o sentido utópico que permeia a crítica feminista. Compreendendo que os feminismos são, portanto, ferramentas teóricas e práticas que permitem enxergar outras possibilidades de vida, quero desenvolver a presente reflexão para os campos dos estudos queer e sublinhar territórios comuns entre ambos os campos (feminismos e estudos queer) em lugar de definir fronteiras estanques e sólidas em tempos de trans/antidisciplinaridade.

Resumidamente, interesso-me aqui pela forma como a literatura, em perspectivas feministas e queer, elabora uma crítica do presente enquanto mantém um horizonte utópico no qual o porvir pode ser diferente. Duas obras contemporâneas que tematizam essas possibilidades futuras ao repensarem o presente são os livros de memórias The End of San Francisco e The Freezer Door ambos da ativista e escritora genderqueer estadunidense Mattilda Bernstein Sycamore1 1 Ressalto que Sycamore utiliza os pronomes ela/dela (she/her) e se identifica como genderqueer, o que, em português, tem sido utilizado como parte da comunidade não-binária. . Publicadas respectivamente em 2013 e 2020, essas obras revelam que os interesses de Sycamore vão além de uma discussão sobre como gênero é performativo ou sobre como pessoas LGBTQIAPN+ lutam por inclusão no sistema. Ao partir de suas experiências e deslocamentos geográficos, ela explora as nuances dos processos de violência contra pessoas LGBTQIAPN+ sem perder de vista o desejo por um futuro queer: “If queer is a dream that we don’t have to die in order to go on living, what would it mean to create a community, and have I ever really witnessed this?” (SYCAMORE, 2020SYCAMORE, Mattilda Bernstein. The Freezer Door. South Pasadena: Semiotext(e), 2020., p. 75)2 2 “Se queer é um sonho no qual não temos que morrer para seguir vivendo, o que significaria criar uma comunidade, e será que eu já testemunhei isso?” (minha tradução) .

Com um sugestivo e polêmico título, The End of San Francisco desconstrói as versões dominantes de que São Francisco seria a grande cidade para pessoas LGBTQIAPN+ nos Estados Unidos. Sycamore está interessada em investigar como, a partir de suas memórias, São Francisco produziu sentidos nos seus deslocamentos anteriores entre Nova York e Seattle. Dessa forma, Sycamore enxerga a realidade material da cidade californiana por um viés que sublinha os mecanismos de opressão que são constantemente invisibilizados nas grandes narrativas LGBTQIAPN+, nas quais a cidade de São Francisco é produzida como um grande destino seguro e inclusivo. Na mesma linha, The Freezer Door reflete sobre os processos de assimilação em grandes centros urbanos e como as culturas LGBTQIAPN+ estão lentamente sendo engolfadas por processos de assimilação. The Freezer Door recusa a organização prévia de capítulos de The End of San Francisco e avança para uma construção memorialística na qual vinhetas sem títulos discutem, em formas longas e curtas, os desejos de uma cultura verdadeiramente interessada na expansão de territórios feministas e queer. Como uma forma de reler seu passado, Sycamore explora seus traumas pessoais e familiares em The Freezer Door.

Discutir a escrita de Mattilda Bernstein Sycamore é recuperar o senso político de comunidade que algumas escritas contemporâneas LGBTQIAPN+ tem perdido para serem aceitas dentro das “temporalidades de retidão” – termo que será discutido mais à frente. Ao abrirem mão de suas políticas ativistas, as obras que se inserem em tal temporalidade não criticam o presente e abrem mão de um futuro possível para vidas de pessoas dissidentes de gênero e sexualidade. O que significa, portanto, apostar na crítica do presente como um exercício de futuridades distintas? O que uma utopia queer pode, efetivamente, nos oferecer de horizontes? É necessário renunciar aos feminismos nesse momento ou será possível uma tentativa de habitar na tensão entre os campos?

Judith Butler, um dos nomes contemporâneos da teoria crítica que descarta apresentações, se situa nessa zona cinza intersticial entre os feminismos e os estudos queer. Tendo iniciando seus estudos no campo da crítica feminista, Butler tem produzido e recusado em seu trabalho definições simplistas e categóricas. Esse posicionamento é delineado em seu ensaio “Against proper objects” no qual descreve como a tendência acadêmica de dividir os “objetos próprios/adequados” de cada campo teórico é uma violência metodológica. Butler (1997)BUTLER, Judith. Against proper objects. In: WEED, Elizabeth; SCHOR, Naomi (ed.). Feminism Meets Queer Theory. Bloomington and Indianapolis: Indiana University Press, 1997. argumenta que é perigoso afirmar que gênero seria a pauta dos feminismos enquanto a sexualidade seria o objeto dos estudos queer porque isso promove uma leitura reducionista das contribuições de cada campo na formação de pesquisas e estudos. Um exemplo citado é o trabalho de Gayle Rubin que, embora apareça em coletâneas queer ou sobre sexualidade, é um material produzido como crítica feminista ou dos estudos gays e lésbicos.

O que me interessa no argumento de Butler em “Against proper objects” é menos se há um campo metodológico ou temático para os feminismos ou os estudos queer do que as zonas e territórios em comum. Compreendo que ambas as posições alimentam epistemologias que devem não só desafiar as estruturas de opressão, mas promover uma crítica dos processos de normalização, assimilação e inclusão de pessoas. Nesse sentido, sugiro pensar que os estudos queer são tão utópicos quanto as práticas feministas: o desejo de materializar novos horizontes é uma pauta que não pode ser deixada de lado.

Cabe aqui, contudo, delinear brevemente o que estou chamando de estudos queer. Para além de uma redução epistemológica ou mesmo uma teoria pronta com T maiúsculo (LEOPOLDO, 2020LEOPOLDO, Rafael. Cartografia do pensamento queer. Salvador: Devires, 2020.), utilizo o termo queer no sentido descrito por Eve Sedgwick em “Thinking through queer theory”:

“Queer”, to me, refers to a politics that values the ways in which meanings and institutions can be at loose ends with each other, crossing all kinds of boundaries rather than reinforcing them. What if the most productive junctures weren’t the ones where everything means the same things? (SEDGWICK, 2011SEDGWICK, Eve Kosofsky. The Weather in Proust. Durham and London: Duke University Press, 2011., p. 200, ênfase no original)3 3 “‘Queer’, para mim, se refere à política que valoriza as maneiras pelas quais significados e instituições podem estar despreocupados uns com os outros, atravessando todos os tipos de limites em vez de reforçá-los. E se as junções mais produtivas não fossem aquelas nas quais tudo significa a mesma coisa?” (minha tradução)

Dessa forma, recuso uma estabilidade do próprio termo queer por compreender, como Sedgwick, que ele se refere às políticas de produções de novos sentidos. Isso significa compreender que críticas de orientação queer possuem – e devem possuir – vieses variados e contestações distintas como a própria multiplicidade semântica de “at loose ends” indica: estar à toa, com as pontas soltas, sem definições amarradas, permitindo novos sentidos. Reconheço aqui a possibilidade de colocar em prática a noção de que as junções mais produtivas podem ser justamente aquelas nas quais nem tudo precisa significar a mesma coisa. Isso me permite, por exemplo, reconhecer que queer pode ser uma crítica tanto de gênero quanto de sexualidade sem perder de vista as formas econômicas e assimilacionistas – como as tentativas de criar ideais regulatórios de como ser LGBTQIAPN+ – por trás dos discursos de inclusão. Queer pode, nas palavras de Jack Halberstam (2005)HALBERSTAM, Jack (Judith). In a Queer Time and Place: Transgender bodies, subcultural lives. New York: New York University Press, 2005., servir como uma parte de uma discussão da lógica de nossos sensos de comunidade, identidade, tempo e espaço, interrompendo, assim, a reprodução de normatividades.

Fazer uma crítica queer sem possuir algum compromisso com justiça social é, nas palavras de Elizabeth Freeman (2010)FREEMAN, Elizabeth. Time Binds: Queer temporalities, queer histories. Durham and London: Duke University Press, 2010., quase impossível. Levar a sério esse compromisso com materiais queer é compreender o fluxo de movimentos, continuidades e interrupções de histórias. Dessa forma, coloco em prática a sugestão de Judith Butler (2019, p. 37)BUTLER, Judith. Corpos em Aliança e a Política das Ruas. Tradução de Fernanda Siqueira Miguens. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2019. de que podemos contestar as normas que nos produzem, afinal, elas “[...] informam os modos vividos de corporificação que adquirimos com o tempo, e esses modos de corporificação podem ser provar formas de contestar essas normas, até mesmo rompê-las.”

Pensando na escrita de Sycamore, noto que esse é um exercício constante. Ela critica os resíduos de uma cultura dominante em termos gays (e não necessariamente LGBTQIAPN+) ao questionar como a representatividade tem se tornado uma forma de alimentar um mito sobre a construção de sujeitos:

Sometimes you think you’ve solved the problem of representation, but really you’re just representing the problem. The same gay men who worship at the throne of straight masculinity, who denigrate femininity and anything associated with it, who write Straight-acting or Sorry no femmes in hookup profiles, these same gay men are now expressing shock and outrage that their neighborhoods, including the one where I now live, have become hot destinations for hordes of drunk straight homophobes.

(SYCAMORE, 2020SYCAMORE, Mattilda Bernstein. The Freezer Door. South Pasadena: Semiotext(e), 2020., p. 157)4 4 “Às vezes você pensa que resolveu o problema da representação/representatividade, mas você realmente está apenas representando o problema. Os mesmos homens gays que veneram o trono da masculinidade heterossexual, que desprezam a feminilidade e qualquer coisa associada a ela, que escrevem 'Comportamento de homem' ou 'Desculpa, nada de afeminados' nos perfis de aplicativos, esses mesmos homens gays agora estão expressando sua surpresa e fúria que seus bairros, incluindo aquele onde moro agora, se tornaram destinos para hordas de homofóbicos heteros e bêbados.” (minha tradução)

Ao singularizar o fato de como a representação de homens gays heteronormativos está “mordendo de volta” os próprios beneficiados, Sycamore chama atenção para o processo de manutenção da estrutura vigente e suas fobias. Os mesmos homens que agora criticam a presença da homofobia em seu “território” são aqueles que previamente não se preocuparam com os processos de gentrificação dos bairros nos quais vivem, ou seja, não houve uma busca pelo senso de comunidade para criar pontes. Esse processo normativo retratado no trecho anterior – a recusa e a repulsa pela feminilidade, a criação de homens gays como representações de um grupo muito maior e complexo – está no centro da crítica queer que Sycamore realiza porque ela deseja desfazer essas assimilações.

Romper com heteronormas é um exercício constante de elaborar futuridades porque pessoas dissidentes visibilizam como há uma “falha na máquina” da heteronormatividade. Essa nova orientação pode ser lida como faz Sara Ahmed (2006)AHMED, Sara. Queer Phenomenology: Orientations, objects, others. Durham and London: Duke University Press, 2006. ao criticar a forma como as pessoas são orientadas para certos objetos. Ao romper com as normas, uma nova orientação – ou melhor, desorientação – configura um novo caminho: buscar o lar que foi perdido (o lar da heteronormatividade já conhecido) ou um lugar que ainda não é o lar (o horizonte vindouro). Essa proposta de Ahmed ressalta como falar sobre estudos queer é também refletir sobre um desejo utópico determinado, especialmente em termos de pessoas cujo lar original não é mais um território possível para existir justamente por carregarem em seus corpos as marcas de suas estranhezas (queerness).

José Esteban Muñoz (2019)MUÑOZ, José Esteban. Cruising Utopia: The then and there of queer futurity (10th Anniversary edition). New York: New York University Press, 2019. argumenta que é justamente a sensação da estranheza (queerness) que nos faz pensar que algo está faltando. Pelas formas como nossas estranhezas nos permeiam, é possível ter breves relances de como mundos futuros podem ser e é nesse interstício que se encontra a promessa de um futuro queer. Isso significa, portanto, considerar quais dimensões estão em jogo e quais futuros são deveras materializados a partir das utopias sonhadas no presente.

Em relação ao presente, Muñoz nos alerta sobre a sua toxicidade porque ele não seria suficiente, afinal, o presente seria um retrato do empobrecimento das narrativas que se pautam por uma linearidade de orientação heteronormativa. O teórico chamará essa compreensão de “straight time” que, em inglês, possui a potência crítica de straight como reto e como heterossexual. O lapso entre os dois sentidos é o que fabrica a sensação de que pessoas LGBTQIAPN+ estão sempre fora de sincronia: fora de compasso e das “regras do jogo”.

O presente é um retrato empobrecido porque acumula as formas massificadas de existência heteronormativa. Em outras palavras, pessoas que não estão alinhadas com tais narrativas são deixadas de lado e consideradas um problema a ser “endireitado” (AHMED, 2006AHMED, Sara. Queer Phenomenology: Orientations, objects, others. Durham and London: Duke University Press, 2006.). O presente é, assim, um somatório de experiências que relembram constantemente a pessoas dissidentes de gênero e sexualidade que elas não pertencem. Sycamore descreve, por exemplo, suas lembranças de ser chamada de “sissy” e “faggot”, que podem ser traduzidos como “maricas” e “viadinho”, no jardim de infância. Contudo, a lembrança reforça o sentimento daquele momento: “I remember the playground, where they called me sissy and faggot before I knew what those words meant, but I knew they meant I would never belong.” (SYCAMORE, 2020SYCAMORE, Mattilda Bernstein. The Freezer Door. South Pasadena: Semiotext(e), 2020., p. 49)5 5 “Eu lembro do playground onde eles me chamaram de maricas e viadinho antes que eu soubesse o que essas palavras significavam, mas eu sabia que eles queriam dizer que eu nunca pertenceria.” (minha tradução) . Embora um acontecimento do passado, as palavras ainda “assombram” o presente de Sycamore.

A repetição constante desse presente é um empreendimento que se naturaliza em formas que Jack Halberstam chama de “marcas paradigmáticas de vida” como nascimento, casamento, reprodução e morte. Tais marcas materializam as vidas dentro desse espaço cronológico e também as obriga a aderir ao monopólio de percepção de como as vidas devem ser. Para Halberstam, é vital que as tecnologias de normalização de determinadas vidas sejam questionadas a partir de seu cerne, ou seja, é necessário considerar como a compreensão de “normalidade” e “respeitabilidade” são produzidas e reproduzidas por uma temporalidade marcada por uma lógica dominante de classe média.

Eu leio essa temporalidade sobre a qual Halberstam nos fala também em um viés de mosaico, como sugere Jasbir K. Puar (2020)PUAR, Jasbir K. Homonacionalismo como mosaico: viagens virais, sexualidades afetivas. In: HOLLANDA, Heloisa Buarque de (org.). Pensamento feminista hoje: sexualidades no sul global. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, 2020. pp. 145-167.. Recusando uma forma simplista de um queer “bom” e outro “mau”, Puar emprega a noção do mosaico como uma que “não se associ[a] a um tempo linear ou se produ[z] dentro de histórias, campos ou discursos discretos” (PUAR, 2020PUAR, Jasbir K. Homonacionalismo como mosaico: viagens virais, sexualidades afetivas. In: HOLLANDA, Heloisa Buarque de (org.). Pensamento feminista hoje: sexualidades no sul global. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, 2020. pp. 145-167., p. 147), ou seja, uma proposta que recusa uma linearidade cumulativa e estruturante. Dessa forma, sugerir que uma utopia seria um mosaico de “forças, afetos, energias e movimentos de desterritorialização e de re-territorialização” (PUAR, 2020PUAR, Jasbir K. Homonacionalismo como mosaico: viagens virais, sexualidades afetivas. In: HOLLANDA, Heloisa Buarque de (org.). Pensamento feminista hoje: sexualidades no sul global. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, 2020. pp. 145-167., p. 147) é um exercício de reavaliar como temos nos apoiado em propostas futuras de que apenas direitos liberais em viés queer seriam a nossa panaceia.

Não estou sugerindo que a luta por direitos – ou como Butler (2019)BUTLER, Judith. Corpos em Aliança e a Política das Ruas. Tradução de Fernanda Siqueira Miguens. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2019. sugere, o direito a ter direitos – seja um movimento a ser descartado. Pelo contrário, é nosso dever repensar a nossa estrutura social e interrogar quais os limites que ainda permanecem sólidos. Uma utopia queer não seria, portanto, uma forma de des/reterritorializar no futuro o que vivemos no presente nos moldes liberais, mas sim a própria crítica do presente como um acesso a um futuro diferente no qual os problemas do presente sejam desfeitos no vindouro tempo. Por esse caminho, Sycamore critica a preocupação excessiva com casamentos gays e lésbicos ou mesmo a integração de pessoas trans nas forças armadas enquanto muitas pessoas LGBTQIAPN+ não possuem acesso aos mais simples direitos como moradia e alimentação. É vital pensar que a escrita (e o ativismo) de Sycamore evidencia o comprometimento com justiça social e não apenas o queer de classe média normalizado em instituições.

O próprio uso do termo queer a serviço do neoliberalismo e homonacionalismo (PUAR, 2020PUAR, Jasbir K. Homonacionalismo como mosaico: viagens virais, sexualidades afetivas. In: HOLLANDA, Heloisa Buarque de (org.). Pensamento feminista hoje: sexualidades no sul global. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, 2020. pp. 145-167.; DUGGAN, 2004DUGGAN, Lisa. The Twilight of Equality? Neoliberalism, cultural politics and the attack on democracy. Boston: Beacon Press, 2004.) precisa ser contestado e sinto que um mosaico permite novas formas de desfazer sentidos estabelecidos. No presente observo – e concordo com Sycamore – como queer se tornou um sinônimo de uma vida heteronormativa masculina branca de classe média, o que tem deixado de lado o papel fundacional da própria crítica queer de desfazer binarismos e criticar o capital. Tal crítica já foi tecida por nomes como Ferguson (2003)FERGUSON, Roderick. Aberrations in Black: Toward a queer of color critique. Minneapolis: University of Minnesota Press, 2003. e Johnson (2001)JOHNSON, E. Patrick. “Quare” studies, or (almost) everything I know about queer studies I learned from my grandmother. Text and Performance Quarterly, v. 21, n. 1, p. 1-25, 2001. no início do século XXI, porém seguem deixadas de lado em prol de uma construção queer que, embora se queira crítica, universaliza nomes de autorias gays, brancas e de classe média. Queer é, como sugere o coletivo Mary Nardini Gang/ Gang of Criminal Queers (2020, p. 28)QUEERS, Mary Nardini Gang & Gang of Criminal. Rumo à mais queer das insurreições. In: BASH BACK. Bash Back: Ultraviolência queer. Tradução de Pontea Outras. São Paulo: crocodilo; n-1 edições, 2020. p. 23-33., “uma posição a partir da qual se ataca o normativo – e mais, é uma posição a partir da qual se entende e ataca as maneiras com que o normal é produzido e reiterado.”

Pensar o tempo por um viés queer é, como sublinha Halberstam (2005)HALBERSTAM, Jack (Judith). In a Queer Time and Place: Transgender bodies, subcultural lives. New York: New York University Press, 2005., se referir aos modos de produção de vidas fora do eixo normativo, fora do eixo da linearidade esperada, sendo então uma tentativa de descrever os modelos temporais que fogem do escopo do presente. Dito em outras palavras, essas produções de vida não seguem um modelo linear, recusam as estruturas vigentes de reprodução das marcas paradigmáticas e desafiam a lógica reinante em termos econômicos, afetivos e sociais. Reside aí a possibilidade da utopia queer: não como uma estrutura etérea de sonhos inatingíveis, mas sim como um exercício do constante sentir de que futuros diferentes são possíveis.

Como um exemplo crítico da utopia queer, quero fazer uma ponte entre o que temos chamado de afetos (sentimentos, emoções, sensações) e crítica cultural. Isso não só se deve ao interesse que os estudos queer têm demonstrado desde os trabalhos de Eve Sedgwick (2003)SEDGWICK, Eve Kosofsky. Touching Feeling: Affect, pedagogy, performativity. Durham and London: Duke University Press, 2003., mas também pela posição crítica que os afetos têm assumido na contemporaneidade como uma possibilidade investigativa que recusa a pretensa irracionalidade de sua matéria. As formas que os afetos assumem na crítica cultural – emoções, sentimentos, sensações – revelam como o sistema heteronormativo opera por meios considerados quase invisíveis. Sara Ahmed (2014 [2004])AHMED, Sara. The Cultural Politics of Emotion. 2. ed. Edinburgh: Edinburgh University Press, 2014 [2004]. aponta como as emoções podem ajudar a compreender que as ações são reações que diferentes corpos assumem em relação aos outros. Elas não existem, então, em um tempo-espaço vazio descontextualizado. Como sugere Halberstam, muitas pessoas LGBTQIAPN+ compreendem que tempo e espaço são elementos cruciais em suas vidas porque neles se materializam os riscos que vivem e experienciam diariamente – e esses riscos são sentidos e vividos materialmente. As emoções assumem aqui uma forma de assegurar que aquilo que parece profundamente privado, pessoal e abstrato é, na realidade, político, público e material.

Retomo o mosaico aqui: se recuso a estrutura linear temporal de construção e reprodução de vidas, o mosaico se torna uma possibilidade de compreender como essas pessoas LGBTQIAPN+ experienciam e visibilizam as “falhas” da máquina reprodutora normativa. Isso significa que estou interessado nos momentos em que essa máquina emperra a partir da ação – ou por vezes mera presença e existência – de pessoas que “não” pertencem ao território investido. É por esse “travar” que sigo a pista da sugestão de Muñoz de que a estranheza é essencialmente uma rejeição do “aqui e agora” (here and now) por ser uma busca pela potência de diferentes mundos.

A forma como esses mundos são experienciados é um mosaico de ações, forças e afetos. As memoirs de Mattilda Bernstein Sycamore exemplificam como obras de autorias LGBTQIAPN+ discutem o presente como crítica do futuro para oferecer um mosaico dessas mesmas vidas. Nessa linha, quero sugerir que os mosaicos me permitem refletir sobre como há uma tendência homogeneizante de compreender o termo “orientação” como uma via de mão única. Se os mosaicos indicam uma ausência de estrutura hierárquica porque há um jogo de forças, afetos e movimentos, acredito que eles possam promover novas desorientações. Assim, à luz de Sara Ahmed, me desfaço do sentido de mão única da orientação presa à temporalidade straight (ÁVILA, 2014ÁVILA, Eliana de Souza. Decolonizing Straight Temporality through Genre Trouble in Edwidge Danticat's The Farming of Bones. Ilha do Desterro, Florianópolis, v. 67, n. 1, p. 21-36, 2014. Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/desterro/article/view/2175-8026.2014n67p21. Acesso em: 05 dez. 2022.
https://periodicos.ufsc.br/index.php/des...
) e me apego aos futuros possíveis de novas desorientações. Se orientar-se era seguir as linhas corretas e viver de acordo com aquelas oferecidas (AHMED, 2006AHMED, Sara. Queer Phenomenology: Orientations, objects, others. Durham and London: Duke University Press, 2006.), desorientar-se é uma possibilidade de renunciar à segurança dessas linhas e recusar o senso de estabilidade de uma temporalidade straight.

Cabe aqui também indicar como essa temporalidade straight pode ser compreendida em português a partir da imagem de uma reta. Uma vida linear e correta seria aquela que segue a reta estabelecida das marcas paradigmáticas, normalizando uma orientação tal qual a heterossexualidade. Já uma vida desorientada seria aquela que recusa essas retas e orientações, buscando, portanto, novas pontes afetivas com experiências distintas. Essas vidas seriam, assim, vidas que fogem da reta original, de uma vida de retidão: elas fogem de uma temporalidade de retidão.

Em uma temporalidade de retidão, as vidas precisam se alinhar aos ideais normativos e seguir as linhas preestabelecidas. Sentir-se mal por não atender às expectativas se torna uma parte crucial do controle sobre os corpos, afinal, o controle material também tem seus efeitos e origens no controle afetivo. As emoções são instrumentalizadas para gerenciar também as vidas e, como aponta Ann Cvetkovich (2012)CVETKOVICH, Ann. Depression: A public feeling. Durham & London: Duke University Press, 2012., há um crescimento notório de estratégias para manutenção da estrutura vigente a partir desse gerenciamento afetivo. Os afetos são, portanto, parte de uma elaboração interpretativa de como o que nós sentimos é também político.

Embora as narrativas de Sycamore possam ser contestadas pelo valor pessoal que elas possuem, concordo com Filipe Campello (2022)CAMPELLO, Filipe. Crítica dos Afetos. Belo Horizonte: Autêntica, 2022. sobre o potencial afetivo dos relatos em primeira pessoa. Para o pesquisador, é comum associar a carga afetiva com uma experiência isolada, porém essa é uma percepção errônea que se apoia no senso de uma impessoalidade epistêmica. Diferente dessa posição, Campello destaca que:

Experiências, relatos e narrativas possuem [...] relevância crítica não somente porque contam outras histórias, mas também porque essas histórias nos oferecem novos conceitos e imagens, permitindo retificar nosso vocabulário, fazendo ver o que antes não tinha razão para se visto.

(2022, p. 91)

Assim, discutir a construção afetiva presente nos livros de Sycamore permite compreender a posição singular que ela ocupa socialmente ao mesmo tempo que recupera a importância da comunidade pela qual ela fala. Esse sentido de presença é profundamente afetivo, pois ele revela como determinadas narrativas são contadas enquanto outras não: “A dominant narrative is always a form of erasure. How many people hide their scars, literal and figurative, in order to conform to what’s supposed to be?” (SYCAMORE, 2020SYCAMORE, Mattilda Bernstein. The Freezer Door. South Pasadena: Semiotext(e), 2020., p. 99)6 6 “Uma narrativa dominante é sempre uma forma de apagamento. Quantas pessoas escondem suas cicatrizes, literais e figuradas, para se conformarem ao que se espera delas?” (minha tradução) . O uso de perguntas visibiliza a retórica e reafirma que a resposta para tal pergunta já é de conhecimento comum, afinal, a discussão não é nova. Contudo, por que algumas narrativas permanecem dominantes e outras desaparecem? Noto isso com mais contundência, por exemplo, em The End of San Francisco.

Ao falar sobre sua chegada em São Francisco, Sycamore celebra a possibilidade que enxerga no novo território:

So I danced to house but lived in a different world, a world of dykes and a few fags who held each other and talked about rape and feminism and thrift stores and veganism and surviving childhood abuse. We made zines and chapbooks and dyed our hair and painted our nails and wrote manifestos and stuck nails through our ears and organized protests and competed with one another for shoplifting excess, share recipes and tips on sexual health and got angry and depressed together, but we were in San Francisco so we looked down on Riot Grrrl […] – we thought we were tougher and smarter and more original.

(SYCAMORE, 2013SYCAMORE, Mattilda Bernstein. The End of San Francisco. San Francisco: City Lights Books, 2013., p. 48-49)7 7 “Então eu dancei ao som de house, mas vivia num mundo differente, um mundo de sapatões e uns viados que se abraçavam e falavam sobre estupro e feminismo e brechós e veganismo e sobreviver abuso infantil. Nós criávamos zines e chapbooks e tingíamos nosso cabelo e pintávamos nossas unhas e escrevíamos manifestos e furávamos nossas orelhas com pregos e organizávamos protestos e competíamos uns com os outros com excessos de roubos de lojinhas, compartilhávamos receitas e dicas de saúde sexual e ficávamos com raiva e deprimidos juntos, mas nós estávamos em São Francisco, então desprezávamos Riot Grrrl [...

A passagem é marcada por uma construção sintática longa de ações que Sycamore enxergava como potências criativas no início dos anos 1990. Diferente de Washington D.C. e Maryland, espaços no qual crescera, São Francisco representa um mundo de possibilidades alternativas que eram subjugadas ou invisibilizadas. A distância entre os dois territórios se faz não apenas geográfica, mas também artisticamente, afinal, Sycamore destaca as formas de comunidade criadas em São Francisco e que lhe foram negadas na costa leste.

Gostaria de destacar também que esse devir-artista/ativista não sobrepõe ou hierarquiza ações. A forma como elemento político se destaca aqui no uso de conjunção “e” repetidas vezes para somar ações. Sycamore inicia o parágrafo pensando que ela dançava ao som de música house e que vivia em um mundo diferente, agora com sapatões e bichas que buscavam outras expressões afetivas. Esse mundo que inicia com um “eu” se transforma em “nós” no parágrafo, novamente reforçando a importância de um senso de coletividade que Sycamore buscava antes. Enquanto para algumas pessoas criar zines, compartilhar receitas e organizar protestos sejam coisas pequenas, leio-as aqui como exercícios críticos de resistência de sonhar com futuros possíveis. Isso é especialmente caro em The End of San Francisco porque sabemos que Sycamore no passado não se enxergava como um corpo potente, ou, corpotente (MATOS; COLLADO, 2021MATOS, Andityas Soares de Moura Costa; COLLADO, Francis García. Para Além da Biopolítica. São Paulo: sobinfluência edições, 2021). Pelo contrário, ela se compreendida como algo maléfico:

I grew up believing that I was evil, that if anyone saw my true self they would know I was a monster that deserved to die. And I didn’t want to die, except when I wanted to die, but I didn’t want to know that and so I knew that I always had to hide everything. I had to hide everything so they wouldn’t know.

(SYCAMORE, 2013SYCAMORE, Mattilda Bernstein. The End of San Francisco. San Francisco: City Lights Books, 2013., p. 78)8 8 “Eu cresci acreditando que eu era mau, que se alguém visse meu verdadeiro eu, eles saberiam que eu era um monstro que merecia morrer. E eu não queria morrer, exceto quando eu queria mesmo morrer, mas eu não queria saber disso e eu sabia que eu precisava esconder tudo. Eu tive que esconder tudo para que eles não soubessem.” (minha tradução)

Noto aqui a repetição quase exaustiva da morte, uma temática onipresente em materiais LGBTQIAPN+. A morte é, na temporalidade de retidão, considerada uma marca paradigmática, ou seja, um momento no qual cruzar a linha final é lida como um olhar para todas as construções grandiosas de uma vida. Olhar para trás seria um exemplo de como o acúmulo de capital, em suas distintas expressões, é importante no desenvolvimento linear esperado. É por essa razão que, por exemplo, a morte de pessoas jovens é lida como uma vida ceifada antes do momento certo, mas também que pessoas que morrem idosas e possuem pouco acúmulo de capital são muitas vezes execráveis por não terem sido “mais responsáveis”. Contudo, uma morte LGBTQIAPN+ é sempre lida como má: seja antes do tempo (“mas também, né? Procurou coisa errada!”), seja já com mais idade (“Viveu até demais para a vida que levou!”).

Essas frases carregam em si saturações afetivas que me permitem visibilizar o aspecto material de suas enunciações. Sem dúvidas, Sycamore expressa essa mesma leitura de como a morte é um tecido repleto de afetos que circulam e produzem sentidos. Ela reflete que era lida como um monstro e, como tinha medo de que as outras pessoas percebessem isso, buscava adequar-se à temporalidade oferecida como a tábua de salvação. Halberstam nos lembra que o tempo da família é, antes de tudo, uma construção heteronormativa de tempo e espaço.

Sobre sua família, Sycamore destaca a temporalidade nem tão invisível:

This was childhood: I needed to do better, better than my father – he went to Oberlin, medical school, became a psychiatrist, a psychotherapist – I had to go to a more prestigious school, become more successful, buy a bigger house, make more money; this was the only chance I had, the only chance not to die. Except then I started to realize that was death too. That’s when I knew I was trapped.

(SYCAMORE, 2013SYCAMORE, Mattilda Bernstein. The End of San Francisco. San Francisco: City Lights Books, 2013., p. 78)9 9 "Isso era a infância: eu precisava ser melhor, melhor que meu pai - ele foi para Oberlin, faculdade de medicina, se tornou um psiquiatra, um psicoterapeuta - eu tinha que ir para uma escola mais prestigiosa, me tornar mais bem-sucedido, comprar uma casa maior, fazer mais dinheiro; essa era a única chance que eu tinha, a única chance de não morrer. Exceto que depois eu percebi que isso também era a morte." (minha tradução)

Há novamente a repetição da morte, porém aqui, em lugar de ser uma forma de esconder a si mesma, Sycamore destaca que existe uma morte quando pessoas se adaptam acriticamente às temporalidades em vigor. Sycamore reconhece que precisaria trabalhar o dobro para provar seu valor para a sua família, em especial seu pai. Cabe retomar aqui que Sycamore é uma dissidente de gênero que se situa além do espectro de binarismo de gênero e que seus anos formativos foram voltados para uma socialização com pronomes e expectativas masculinas de gênero. Assim, a traição da temporalidade de retidão é dupla: Sycamore não só desfaz as expectativas da família em termos de acúmulo de capital, mas ela também refaz a sua temporalidade como sujeita para além da orientação previamente estabelecida.

Ao recusar a temporalidade de retidão, Sycamore reposiciona sua própria agência e indaga sobre como há outras mortes além daquelas estabelecidas na linearidade familiar. Para muitas pessoas LGBTQIANP+, integrar-se e ajustar-se às expectativas sociais têm sido uma experiência de morte (ora social, ora física), especialmente quando consideramos que o desejo é que elas se assimilem enquanto não há mecanismos de inclusão. Esse paradoxo da existência de pessoas LGBTQIAPN+ é um produto da temporalidade de retidão que é visibilizado em análises da crononormatividade e da cronobiopolítica.

Elizabeth Freeman (2010)FREEMAN, Elizabeth. Time Binds: Queer temporalities, queer histories. Durham and London: Duke University Press, 2010. descreve a crononormatividade como um modo de lidar com o tempo a partir do qual diversas forças institucionais passam a se materializar como fatos. Ela utiliza como exemplo os meios utilizados socialmente para que agendas, calendários e até mesmo relógios guiem sujeitos para o máximo de produtividade. Para Freeman, dissidentes de gênero e sexualidade são pessoas que carregam em si as marcas explícitas das interrupções das temporalidades esperadas pela crononormatividade, o que significa que elas são facilmente os alvos preferenciais de tecnologias de normalização que buscam colocá-las “na linha”.

Freeman argumenta ter se inspirado no conceito de cronobiopolítica cunhado por Dana Luciano, também pesquisadora dos estudos queer. Freeman descreve a cronobiopolítica como um processo que

extends beyond individual anatomies to encompass the management of entire populations: people whose individual bodies are synchronized not only with one another but also with larger temporal schemae experience belonging itself as natural. In a chronobiological society, the state and other institutions, including representational apparatuses, link properly temporalized bodies to narratives of movement and change. (2010, p. 4)10 10 “estende para além de anatomias individuais para abranger o controle de populações inteiras: pessoas cujos corpos individuais são sincronizados não apenas uns com os outros, mas com experiências esquemáticas temporais mais amplas que fazem a si mesmas como naturais. Em uma sociedade cronobiológica, o estado e as outras instituições, incluindo os aparatos representacionais, conectam corpos apropriadamente temporalizados às narrativas de movimento e mudança.” (minha tradução)

O que interessa, portanto, às narrativas cronobiopolíticas não é apenas como pensar como corpos estão interligados entre sim, mas principalmente como transformar esses mesmos corpos dentro de esquemas maiores de produtividade social. É nessa mesma linha que Freeman sugere que os (ab)usos de eventos como casamento, acumulação de riquezas e ter filhos são tecnologias que servem aos interesses econômicos de nações. Assim, os corpos que desafiam as narrativas cronobiopolíticas e crononormativas são imediatamente lidos como fora de sincronia com a grande sinfonia heteronormativa.

Leio, contudo, esses lapsos e quebras temporais de pessoas LGBTQIAPN+ como formas de uma utopia queer. Recusando uma redução das narrativas para um sofrimento de não-adequação, acredito que The End of San Francisco e The Freezer Door sejam exemplos de uma temporalidade esquisita [queer] no sentido que Freeman sugere:

Queer temporalities, visible in the forms of interruption [...], are points of resistance to this temporal order that, in turn, propose other possibilities for living in relation to indeterminately past, present, and future others: that is, of living historically. (2010, p. xxii)11 11 “As temporalidades queer, visíveis nas formas de interrupção [...], são pontos de resistência à essa ordem temporal que, por sua vez, propõe outras possibilidades para se viver em relação às outras do passado, presente e futuro indeterminadamente: ou seja, de viver historicamente.” (minha tradução)

Ao sugerir que “mais dinheiro”, “uma casa maior” e “uma carreira com mais sucesso” são partes de uma morte, Sycamore reterritorializa seu desejo: não aceitar essa linearidade. Após estudar um ano na Brown University, uma das mais prestigiosas instituições dos Estados Unidos, Sycamore decide se mudar para São Francisco. Inicialmente, a impressão é de um mundo deveras diferente e mais inclusivo. Todavia, a imagem que assombra The End of San Francisco é a do fim de um sonho: como São Francisco não é aquilo com o qual Sycamore sonhara anteriormente.

We believed it was us against them: they were straight people, they were abusers, they were rapists and landlord and cops, they were parents and politicians and anyone with designer clothes. They were the gay people who congregated in the Castro – apathetic, straight-acting gay men who went to the gym and dressed like clones in white t-shirts and baseball caps, gay men who hated women and fat people and people of color and sissies and anyone who was different, really, and we were different – we were absolutely certain of that.

(SYCAMORE, 2013SYCAMORE, Mattilda Bernstein. The End of San Francisco. San Francisco: City Lights Books, 2013., p. 83)12 12 “Nós acreditávamos que era ‘nós’ contra ‘eles’: eles eram heterossexuais, eles eram abusadores, eles eram estupradores e proprietários e policiais, eles eram pais e políticos e qualquer um com roupas caras. Eles eram os gays que se reuniam no Castro - homens apáticos agindo como homens heteros, que iam para a academia e se vestiam como clones em camisas brancas e bonés de beisebol, homens gays que odiavam mulheres e pessoas gordas e pessoas de cor e viadinhos e qualquer um que fosse diferente realmente, e nós éramos diferentes - nós tínhamos absoluta certeza disso.” (minha tradução)

A chegada com sonhos em São Francisco se torna lentamente um momento de descontentamento com a política vigente. Ao perceber que existe um “nós” e um “eles” até mesmo dentro do guarda-chuva LGBTQIAPN+, Sycamore desfaz a sua temporalidade anterior que reduzia o mundo aos sujeitos heterossexuais e os não-heterossexuais. Essa virada é essencial para que, em The Freezer Door, Sycamore desfaça sua preocupação com um ativismo que recusa o presente: “Part of the dream of queer is that it potentially has no opposite. Straight is the opposite of gay. Queer is a rejection of both.” (SYCAMORE, 2020SYCAMORE, Mattilda Bernstein. The Freezer Door. South Pasadena: Semiotext(e), 2020., p. 71)13 13 "Parte do sonho queer é que ele potencialmente não tem oposto. Hetero é o oposto de homo. Queer é uma rejeição de ambos." (minha tradução) .

O desejo de recusar os binarismos é o que move o território do presente para o horizonte de desorientações futuras. Sycamore reconhece como a cultura gay masculina tem abraçado voluntariamente diversas formas de violência e que por tal razão escolhera um mundo queer, especialmente por reconhecer que “I’ve always been a part of feminism, and I’ve always been apart” (SYCAMORE, 2020SYCAMORE, Mattilda Bernstein. The Freezer Door. South Pasadena: Semiotext(e), 2020., p. 53)14 14 "Eu sempre fui parte do feminismo e eu sempre estive à parte." (minha tradução) . Esse orgulho de fazer parte e o receio de estar à parte é uma produção afetiva que demonstra a instabilidade do presente ao mesmo tempo que força Sycamore a buscar uma reterritorialização. De certa forma, esse posicionamento retoma a impossibilidade de limites para os feminismos e os estudos queer, uma vez que há territórios em comum quando ambos interrogam as opressões.

O desejo por outra forma de vida é também um desejo que recusa a morte cronobiopolítica:

We were the first generation of queers to grow up knowing that desire meant AIDS meant death, and so it made sense when we got away from the other death, the one that meant marriage and a house in the suburbs, a lifetime of brutality both interior and exterior and call this success or keep trying, keep trying for more brutality, but when we got away it made sense that everywhere people were dying of AIDS and drug addiction and suicide because we had always imagined death.

(SYCAMORE, 2013SYCAMORE, Mattilda Bernstein. The End of San Francisco. San Francisco: City Lights Books, 2013., p. 82)15 15 "Nós fomos a primeira geração de queers que cresceu sabendo que desejo significava AIDS que significava morte, então fazia sentido que nós nos afastássemos da outra morte, aquela que significava casamento e uma casa no subúrbio, uma vida inteira de brutalidade inteiro e exterior e chamar isso de sucesso ou continuar tentando, continuar tentando por mais brutalidade, mas quando nós nos afastamos, fez sentido que as pessoas em todos os lugares estavam morrendo de AIDS e de drogas e suicídio porque nós sempre tínhamos imaginado a morte." (minha tradução)

Sem dúvidas, o caminho da morte deveria ser a linha a ser evitada, porém Sycamore descreve como pessoas LGBTQIAPN+ redesenham os próprios mapas para além da heteronormatividade em sua temporalidade de retidão. A própria ironia de “chamar de sucesso” aquilo que seria a morte heteronormativa é reforçada pela repetição de “keep trying”, ou seja, “continuar tentando” até se encaixar nos moldes estabelecidos. A morte pelo próprio desejo é nesse trecho um reforço do movimento por uma agência que recusa trilhar caminhos preestabelecidos.

De certa forma, a reterritorialização do desejo desfaz a orientação de morte que ser queer representava anteriormente. O corpo físico de Sycamore escrevendo essas memórias é testemunha e um contra-arquivo dessa reterritorialização, afinal, ela não morreu enquanto corpo físico. Ao contar a sua história e as de outras pessoas, Sycamore recusa a morte da temporalidade de retidão. Assim como outras pessoas dissidentes, ela opta por um devir-artístico/ativista para representar o sentimento de esperança que leio à luz de Muñoz. A esperança não é apenas uma ação de esperar o melhor pelas mãos de outras pessoas. Pelo contrário, a esperança é uma possibilidade ativa queer de enfrentar os “desesperançosos mapas heteronormativos do presente” (MUÑOZ, 2019MUÑOZ, José Esteban. Cruising Utopia: The then and there of queer futurity (10th Anniversary edition). New York: New York University Press, 2019., p. 28) nos quais qualquer futuridade é um território de reprodução da temporalidade de retidão.

Considerar como a cronobiopolítica opera é uma estratégia importante para futuridades queer. Nesse sentido, acredito que, a partir dessa crítica, Sycamore esteja elaborando o que Hil Malatino (2020)MALATINO, Hil. Trans Care. Minneapolis: University of Minnesota Press, 2020. chama de “artes trans de sobrevivência”. Para Malatino, quando o foco deixa de ser o fato da morte e se torna as injustiças que a produzem, surgem as artes trans de sobrevivência que permitem enxergar como pessoas trans cultivam artes de viver em culturas que são pouco receptivas ou profundamente hostis às transgeneridades. Dessa forma, ao oferecer uma crítica do presente, The End of San Francisco e The Freezer Door são materializações dessas artes: não só contestam políticas em vigor, mas também mapeiam novos territórios para futuros queer.

Caminhando para as considerações finais, é importante sublinhar, como afirma o já citado coletivo Mary Nardini Gang/ Gang of Criminal Queers, que é vital construir um espaço no qual o desejo possa existir. Sem o desejo, não é possível sonhar: “Desejar, em um mundo estruturado para confinar o desejo, é uma tensão que vivemos diariamente.” (QUEERS, 2020QUEERS, Mary Nardini Gang & Gang of Criminal. Rumo à mais queer das insurreições. In: BASH BACK. Bash Back: Ultraviolência queer. Tradução de Pontea Outras. São Paulo: crocodilo; n-1 edições, 2020. p. 23-33., p. 30) Sem a oportunidade crítica de reavaliar o presente, os estudos queer, assim como as práticas feministas, podem perder de vista o seu potencial de mudar horizontes. Torna-se vital avaliar as maneiras que o passado nos legou vitórias, mas também como elas não podem reduzir as ações por um futuro, afinal, “Sometimes we create desire when it’s not there, just to see if it could be there. Is this what it means to dream, or to stop dreaming?” (SYCAMORE, 2020SYCAMORE, Mattilda Bernstein. The Freezer Door. South Pasadena: Semiotext(e), 2020., p. 229)16 16 “Às vezes criamos desejo quando ele não está ali, apenas para ver se ele pode estar ali. É isso que significa sonhar, ou parar de sonhar?” (minha tradução) . O desejo de futuros diferentes está no horizonte do presente-futuro.

Notas

  • 1
    Ressalto que Sycamore utiliza os pronomes ela/dela (she/her) e se identifica como genderqueer, o que, em português, tem sido utilizado como parte da comunidade não-binária.
  • 2
    “Se queer é um sonho no qual não temos que morrer para seguir vivendo, o que significaria criar uma comunidade, e será que eu já testemunhei isso?” (minha tradução)
  • 3
    “‘Queer’, para mim, se refere à política que valoriza as maneiras pelas quais significados e instituições podem estar despreocupados uns com os outros, atravessando todos os tipos de limites em vez de reforçá-los. E se as junções mais produtivas não fossem aquelas nas quais tudo significa a mesma coisa?” (minha tradução)
  • 4
    “Às vezes você pensa que resolveu o problema da representação/representatividade, mas você realmente está apenas representando o problema. Os mesmos homens gays que veneram o trono da masculinidade heterossexual, que desprezam a feminilidade e qualquer coisa associada a ela, que escrevem 'Comportamento de homem' ou 'Desculpa, nada de afeminados' nos perfis de aplicativos, esses mesmos homens gays agora estão expressando sua surpresa e fúria que seus bairros, incluindo aquele onde moro agora, se tornaram destinos para hordas de homofóbicos heteros e bêbados.” (minha tradução)
  • 5
    “Eu lembro do playground onde eles me chamaram de maricas e viadinho antes que eu soubesse o que essas palavras significavam, mas eu sabia que eles queriam dizer que eu nunca pertenceria.” (minha tradução)
  • 6
    “Uma narrativa dominante é sempre uma forma de apagamento. Quantas pessoas escondem suas cicatrizes, literais e figuradas, para se conformarem ao que se espera delas?” (minha tradução)
  • 7
    “Então eu dancei ao som de house, mas vivia num mundo differente, um mundo de sapatões e uns viados que se abraçavam e falavam sobre estupro e feminismo e brechós e veganismo e sobreviver abuso infantil. Nós criávamos zines e chapbooks e tingíamos nosso cabelo e pintávamos nossas unhas e escrevíamos manifestos e furávamos nossas orelhas com pregos e organizávamos protestos e competíamos uns com os outros com excessos de roubos de lojinhas, compartilhávamos receitas e dicas de saúde sexual e ficávamos com raiva e deprimidos juntos, mas nós estávamos em São Francisco, então desprezávamos Riot Grrrl [...
  • 8
    “Eu cresci acreditando que eu era mau, que se alguém visse meu verdadeiro eu, eles saberiam que eu era um monstro que merecia morrer. E eu não queria morrer, exceto quando eu queria mesmo morrer, mas eu não queria saber disso e eu sabia que eu precisava esconder tudo. Eu tive que esconder tudo para que eles não soubessem.” (minha tradução)
  • 9
    "Isso era a infância: eu precisava ser melhor, melhor que meu pai - ele foi para Oberlin, faculdade de medicina, se tornou um psiquiatra, um psicoterapeuta - eu tinha que ir para uma escola mais prestigiosa, me tornar mais bem-sucedido, comprar uma casa maior, fazer mais dinheiro; essa era a única chance que eu tinha, a única chance de não morrer. Exceto que depois eu percebi que isso também era a morte." (minha tradução)
  • 10
    “estende para além de anatomias individuais para abranger o controle de populações inteiras: pessoas cujos corpos individuais são sincronizados não apenas uns com os outros, mas com experiências esquemáticas temporais mais amplas que fazem a si mesmas como naturais. Em uma sociedade cronobiológica, o estado e as outras instituições, incluindo os aparatos representacionais, conectam corpos apropriadamente temporalizados às narrativas de movimento e mudança.” (minha tradução)
  • 11
    “As temporalidades queer, visíveis nas formas de interrupção [...], são pontos de resistência à essa ordem temporal que, por sua vez, propõe outras possibilidades para se viver em relação às outras do passado, presente e futuro indeterminadamente: ou seja, de viver historicamente.” (minha tradução)
  • 12
    “Nós acreditávamos que era ‘nós’ contra ‘eles’: eles eram heterossexuais, eles eram abusadores, eles eram estupradores e proprietários e policiais, eles eram pais e políticos e qualquer um com roupas caras. Eles eram os gays que se reuniam no Castro - homens apáticos agindo como homens heteros, que iam para a academia e se vestiam como clones em camisas brancas e bonés de beisebol, homens gays que odiavam mulheres e pessoas gordas e pessoas de cor e viadinhos e qualquer um que fosse diferente realmente, e nós éramos diferentes - nós tínhamos absoluta certeza disso.” (minha tradução)
  • 13
    "Parte do sonho queer é que ele potencialmente não tem oposto. Hetero é o oposto de homo. Queer é uma rejeição de ambos." (minha tradução)
  • 14
    "Eu sempre fui parte do feminismo e eu sempre estive à parte." (minha tradução)
  • 15
    "Nós fomos a primeira geração de queers que cresceu sabendo que desejo significava AIDS que significava morte, então fazia sentido que nós nos afastássemos da outra morte, aquela que significava casamento e uma casa no subúrbio, uma vida inteira de brutalidade inteiro e exterior e chamar isso de sucesso ou continuar tentando, continuar tentando por mais brutalidade, mas quando nós nos afastamos, fez sentido que as pessoas em todos os lugares estavam morrendo de AIDS e de drogas e suicídio porque nós sempre tínhamos imaginado a morte." (minha tradução)
  • 16
    “Às vezes criamos desejo quando ele não está ali, apenas para ver se ele pode estar ali. É isso que significa sonhar, ou parar de sonhar?” (minha tradução)

References

  • AHMED, Sara. Queer Phenomenology: Orientations, objects, others. Durham and London: Duke University Press, 2006.
  • AHMED, Sara. The Cultural Politics of Emotion 2. ed. Edinburgh: Edinburgh University Press, 2014 [2004].
  • ÁVILA, Eliana de Souza. Decolonizing Straight Temporality through Genre Trouble in Edwidge Danticat's The Farming of Bones. Ilha do Desterro, Florianópolis, v. 67, n. 1, p. 21-36, 2014. Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/desterro/article/view/2175-8026.2014n67p21 Acesso em: 05 dez. 2022.
    » https://periodicos.ufsc.br/index.php/desterro/article/view/2175-8026.2014n67p21
  • BUTLER, Judith. Against proper objects. In: WEED, Elizabeth; SCHOR, Naomi (ed.). Feminism Meets Queer Theory Bloomington and Indianapolis: Indiana University Press, 1997.
  • BUTLER, Judith. Corpos em Aliança e a Política das Ruas Tradução de Fernanda Siqueira Miguens. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2019.
  • CAMPELLO, Filipe. Crítica dos Afetos Belo Horizonte: Autêntica, 2022.
  • CAVALCANTI, Ildney; DEPLAGNE, Luciana Calado. Apresentação: Sobre as utopias sonhadas e as distopias anunciadas na literatura. In: CAVALCANTI, Ildney; DEPLAGNE, Luciana Calado (org.). Utopias Sonhadas / Distopias Anunciadas: Feminismo, gênero e cultura queer na literatura. João Pessoa: Editora UFPB, 2019. p. 9-21.
  • CVETKOVICH, Ann. Depression: A public feeling. Durham & London: Duke University Press, 2012.
  • DUGGAN, Lisa. The Twilight of Equality? Neoliberalism, cultural politics and the attack on democracy. Boston: Beacon Press, 2004.
  • FERGUSON, Roderick. Aberrations in Black: Toward a queer of color critique. Minneapolis: University of Minnesota Press, 2003.
  • FREEMAN, Elizabeth. Time Binds: Queer temporalities, queer histories. Durham and London: Duke University Press, 2010.
  • HALBERSTAM, Jack (Judith). In a Queer Time and Place: Transgender bodies, subcultural lives. New York: New York University Press, 2005.
  • HEMMINGS, Clare. Why Stories Matters: The political grammar of feminist theory. Durham and London: Duke University Press, 2011.
  • JOHNSON, E. Patrick. “Quare” studies, or (almost) everything I know about queer studies I learned from my grandmother. Text and Performance Quarterly, v. 21, n. 1, p. 1-25, 2001.
  • LEOPOLDO, Rafael. Cartografia do pensamento queer Salvador: Devires, 2020.
  • MALATINO, Hil. Trans Care Minneapolis: University of Minnesota Press, 2020.
  • MATOS, Andityas Soares de Moura Costa; COLLADO, Francis García. Para Além da Biopolítica. São Paulo: sobinfluência edições, 2021
  • MUÑOZ, José Esteban. Cruising Utopia: The then and there of queer futurity (10th Anniversary edition). New York: New York University Press, 2019.
  • PUAR, Jasbir K. Homonacionalismo como mosaico: viagens virais, sexualidades afetivas. In: HOLLANDA, Heloisa Buarque de (org.). Pensamento feminista hoje: sexualidades no sul global. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, 2020. pp. 145-167.
  • QUEERS, Mary Nardini Gang & Gang of Criminal. Rumo à mais queer das insurreições. In: BASH BACK. Bash Back: Ultraviolência queer. Tradução de Pontea Outras. São Paulo: crocodilo; n-1 edições, 2020. p. 23-33.
  • SEDGWICK, Eve Kosofsky. The Weather in Proust Durham and London: Duke University Press, 2011.
  • SEDGWICK, Eve Kosofsky. Touching Feeling: Affect, pedagogy, performativity. Durham and London: Duke University Press, 2003.
  • SYCAMORE, Mattilda Bernstein. The End of San Francisco San Francisco: City Lights Books, 2013.
  • SYCAMORE, Mattilda Bernstein. The Freezer Door South Pasadena: Semiotext(e), 2020.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Set 2023
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2023

Histórico

  • Recebido
    15 Jan 2023
  • Aceito
    07 Jun 2023
Universidade Federal de Santa Catarina Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Comunicação e Expressão, Bloco B- 405, CEP: 88040-900, Florianópolis, SC, Brasil, Tel.: (48) 37219455 / (48) 3721-9819 - Florianópolis - SC - Brazil
E-mail: ilha@cce.ufsc.br