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Divulgação científica sobre práticas de laboratório: análise da inserção ciência, tecnologia e sociedade (CTS) em textos produzidos por estudantes de Ciências Biológicas* * Agradecemos à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) pela concessão de bolsa de mestrado e principalmente às turmas de 2006 a 2013 do curso de Ciências Biológicas. Nossos agradecimentos também a todas as pessoas que contribuíram direta ou indiretamente para a realização deste trabalho.

Scientific divulgation about laboratory practices: analysis of the infusion of Science, Technology and Society (STS) in texts produced by students of Biological Sciences

Resumo:

Tem como objetivo analisar as relações entre ciência, tecnologia e sociedade (CTS) em textos de divulgação científica (TDC) produzidos por alunos do curso de Ciências Biológicas com base em aulas práticas de laboratórios. Para tanto, foram selecionados TDC do acervo pessoal de um professor formador, escritos ao longo de sete anos por discentes de uma universidade pública. Esses documentos foram examinados conforme a análise de conteúdo e revelaram uma discussão tímida de questões sociais, históricas e éticas sobre o conhecimento científico-tecnológico, apesar de apresentarem características diversificadas, sobressaindo-se as descrições dos procedimentos internos da ciência, a aplicação da ciência no cotidiano das pessoas e a articulação entre campos da ciência.

Palavras-chave:
divulgação científica; ciência e tecnologia; aulas práticas

Abstract:

This paper aims to analyze the relationships among Science, Technology and Society (STS) in texts of scientific divulgation (TSD) produced by students of Biological Sciences, based on practical classes at laboratories. For that purpose, TSD were selected from a professor's personal collection, written by students from a public university over seven years. These documents were examined according to the content analysis and revealed a timid discussion in relation to social, historical and ethical questions regarding the scientific and technological knowledge, despite presenting diversified characteristics, the descriptions of internal procedures of science, the application of science in daily life and the connection between fields of science have stood out.

Keywords:
scientific divulgation; Science and Technology; practical classes

Introdução

Em um mundo envolto por artefatos científico-tecnológicos e impactos decorrentes da ciência e tecnologia (C&T), são necessários esforços múltiplos para a compreensão do universo científico e o exercício da cidadania pelo indivíduo. Entre esses esforços que buscam alfabetizar cientificamente as pessoas, isto é, inseri-las em uma cultura científica, destaca-se a divulgação científica (DC). Divulgar a ciência, apesar de inúmeras perspectivas, pode ser entendido como o processo que busca evidenciar conceitos, procedimentos e impactos da C&T, mostrar a construção e o contexto histórico-cultural do conhecimento científico-tecnológico. Assim, a DC não se restringe a transmitir informações, mas busca também esclarecer a ciência como construção humana (Krasilchik; Marandino, 2004KRASILCHIK, M.; MARANDINO, M. Ensino de ciências e cidadania. 2. ed. São Paulo: Moderna, 2004. ).

Para Zamboni (1997ZAMBONI, L. M. S. Heterogeneidade e subjetividade no discurso da divulgação científica. 1997. 168 f. Tese (Doutorado em Linguística) - Instituto de Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1997. Disponível em: <http://www.cciencia.ufrj.br/Publicacoes/Dissertacoes/lilian_resumo_tese.PDF>
http://www.cciencia.ufrj.br/Publicacoes/...
), a DC é a formulação de um novo discurso e não uma mera simplificação do discurso científico, enquanto Candotti (2002CANDOTTI, E. Ciência na educação popular. In: MASSARANI, L.; MOREIRA, I. C.; BRITO, F. (Org.). Ciência e público: caminhos da divulgação científica no Brasil. Rio de Janeiro: UFRJ, 2002. p. 15-23. (Terra incógnita)., p. 17) enfatiza que a "[...] divulgação não é apenas página de literatura, na qual as imagens encontram as palavras (quando as encontram), mas exercício de reflexão sobre os impactos sociais e culturais [...]" das descobertas científicas. Esse aspecto confere mais uma responsabilidade social aos cientistas, a de fazer a divulgação do conhecimento científico. Somos, desse modo, cientistas-divulgadores e cidadãos com o compromisso ético de educar.

Diante de diversos espaços e meios (televisão, jornais, revistas, museus etc.) onde a DC está presente, destaca-se o uso de textos de divulgação científica (TDC) no espaço escolar, pois estes podem ser usados como mais um recurso pedagógico com o intuito de promover a inserção dos alunos em uma cultura científica, por meio da formação de leitores entusiasmados e críticos quanto ao universo da ciência. Apesar dessa possibilidade, segundo as revisões de Nascimento e Rezende Junior (2010aNASCIMENTO, T. G.; REZENDE JUNIOR, M. F. A produção sobre divulgação científica na área de educação em ciências: referenciais teóricos e principais temáticas. Investigações em Ensino de Ciências, Porto Alegre, v. 15, n.1, p. 97-120, 2010a.) e Ferreira e Queiroz (2012), existem poucos trabalhos que envolvam produção de TDC na formação de professores. Entre estes está o estudo de Nascimento e Rezende Junior (2010bNASCIMENTO, T. G.; REZENDE JUNIOR, M. F. A produção de texto de divulgação científica na formação inicial de licenciados em ciências naturais. Revista Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências, São Paulo, v. 10, n. 1. 2010b.) que analisa as características textuais de TDC produzidos por alunos dos cursos de licenciatura em física e em biologia e constataram uma diversidade de recursos e elementos específicos na produção desses estudantes.

No que se refere à educação em ciências e, em especial, à área de Ciências Biológicas, essas atividades com DC não devem se restringir às licenciaturas, mas sim ser ampliadas aos bacharelados, pois os bacharéis também possuem responsabilidade como educadores, portanto as práticas de escrita e leitura de textos de DC são essenciais à sua formação.

Segundo o parecer que trata das Diretrizes Curriculares Nacionais para os Cursos de Ciências Biológicas (Brasil, 2001BRASIL. Conselho Nacional de Educação (CNE). Parecer nº 1.301/2001, aprovado em 6 de novembro de 2001. Diretrizes Curriculares Nacionais para os Cursos de Ciências Biológicas. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 7 dez. 2001. Seção 1, p. 25.), esses profissionais devem ser conscientes do seu compromisso como educadores e compreender as relações entre ciência, tecnologia e sociedade (CTS).

Uma das principais referências na DC e na percepção pública da C&T foi a bióloga Rachel Carson, que colocou em debate os impactos da indústria química de agrotóxicos sobre o meio ambiente, sendo ela, também, pioneira nos movimentos de conservação ambiental nos anos 60 (Auler; Bazzo, 2001AULER, D.; BAZZO, W. A. Reflexões para implementação do movimento CTS no contexto educacional brasileiro. Ciência & Educação, Bauru, v. 7, n. 1, p. 1-13, 2001.; Cachapuz et al., 2011CACHAPUZ, A.; PEREZ, D. G.; CARVALHO, A. M. P.; PRAIA, J.; VICHES, A.(Org.). A necessária renovação do ensino das ciências. São Paulo: Cortez, 2011.).

Assim, desde os anos 60, surge o que foi denominado de movimento CTS, que busca construir uma compreensão que supere a perspectiva tecnocrática da C&T (Auler; Bazzo, 2001AULER, D.; BAZZO, W. A. Reflexões para implementação do movimento CTS no contexto educacional brasileiro. Ciência & Educação, Bauru, v. 7, n. 1, p. 1-13, 2001.), isto é, que desmitifique a visão linear de progresso e atividade científico-tecnológica segundo a qual mais tecnologia e ciência conferem necessariamente mudança social, e que evidencie o papel da C&T na vida das pessoas por meio de discussões sobre seus aspectos éticos e suas implicações sociais (Angotti; Auth, 2001ANGOTTI, J. A. P.; AUTH, M. A. Ciência e tecnologia: implicações sociais e o papel da educação. Ciência & Educação, Bauru, v. 7, p. 15- 27, 2001.; Auler; Bazzo, 2001). De modo simultâneo, o movimento CTS nutre-se de perspectivas que trabalham a natureza e a história da ciência, que se empenham em superar visões deformadas da C&T (Cachapuz et al., 2011CACHAPUZ, A.; PEREZ, D. G.; CARVALHO, A. M. P.; PRAIA, J.; VICHES, A.(Org.). A necessária renovação do ensino das ciências. São Paulo: Cortez, 2011.).

Sobre o estado da arte, quanto ao enfoque CTS e os materiais didáticos, a pesquisa de Strieder (2012STRIEDER, R. B. Abordagens CTS na educação científica no Brasil: sentidos e perspectivas. 2012. 283 f. Tese (Doutorado em Ensino de Física) - Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2012.) aponta que geralmente são feitas análises acerca de livros didáticos e paradidáticos e materiais de DC, como programas de televisão, softwares e TDC publicados em revistas, evidenciando a importância e a potencialidade destes últimos, a serem inseridos no espaço escolar em consonância com os livros didáticos. Entre essas pesquisas relacionadas a TDC e ao enfoque CTS, destaca-se o trabalho de Silva e Neto (2006SILVA, H. S. C.; MEGID NETO, J. Artigos de divulgação científica e o ensino de Ciências: concepções de ciência/tecnologia/sociedade. In: TEIXEIRA, P. M. M. Ensino de ciências: pesquisas e reflexões. Ribeirão Preto: Holos, 2006. p. 32-52.), que analisou artigos de revistas de DC brasileiras e evidenciou a presença nos textos de uma construção social da ciência e tecnologia, da relação entre áreas do conhecimento científico e da procura por identificar os atores envolvidos na produção da ciência.

Quanto à linha de pesquisa na qual se insere este estudo - que busca novas abordagens pedagógicas na formação inicial dos professores e divulgadores da ciência -, o trabalho de Nascimento e Rezende Junior (2010NASCIMENTO, T. G.; REZENDE JUNIOR, M. F. A produção de texto de divulgação científica na formação inicial de licenciados em ciências naturais. Revista Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências, São Paulo, v. 10, n. 1. 2010b.) mostra a pouca discussão sobre a tríade CTS nos TDC produzidos por licenciandos em ciências naturais e destaca a importância da produção textual em sua formação, como meio de os alunos elaborarem seus próprios materiais para uso no espaço escolar, com poucos recursos, e como estímulo ao desenvolvimento da escrita por esses estudantes.

Em síntese, existe uma carência de pesquisas que investiguem a produção de TDC no ensino básico e superior, bem como de reflexões baseadas em um aprofundamento teórico da abordagem CTS e da DC na formação inicial de professores e divulgadores da ciência. Tendo em vista a importância desses aspectos, o objetivo desta pesquisa é analisar as relações entre ciência, tecnologia e sociedade (CTS) em TDC produzidos por alunos do curso de Ciências Biológicas a partir de aulas práticas de laboratório.

Percurso metodológico

Esta pesquisa possui natureza metodológica qualitativa com enfoque exploratório e interpretativo. Os documentos usados foram coletados no período de 2006 a 2013, na disciplina de Biologia Celular. Para Lüdke e André (2013LÜDKE, M.; ANDRÉ, M. E. D. A. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo: Epu, 2013., p. 45), os documentos "não são apenas uma fonte de informação contextualizada, mas surgem num determinado contexto e fornecem informações sobre esse mesmo contexto". Desse modo, os textos também nos oferecem subsídios para a compressão da produção escrita baseada em aulas práticas.

Ao todo, foram disponibilizados pela professora da disciplina 150 documentos, entre os quais identificamos relatórios de práticas e TDC produzidos por alunos de diversos cursos, em especial do curso de Ciências Biológicas. Esses registros escritos descreviam e divulgavam três práticas experimentais realizadas no laboratório didático de Biologia Celular do Departamento de Biologia de uma universidade pública brasileira.

Centramos nossa análise sobre os TDC, deixando os relatórios de práticas para futuras pesquisas. Os TDC foram produzidos em equipes por alunos do primeiro semestre, como parte da avaliação da disciplina de Biologia Celular, e se basearam nas características das revistas Ciência hoje das crianças e Superinteressante. No entanto, as características da DC, presentes nos textos, foram construídas intuitivamente, semelhantemente ao trabalho de Nascimento e Rezende Junior (2010bNASCIMENTO, T. G.; REZENDE JUNIOR, M. F. A produção de texto de divulgação científica na formação inicial de licenciados em ciências naturais. Revista Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências, São Paulo, v. 10, n. 1. 2010b.).

Nosso estudo foi fundamentado na análise de conteúdo proposta por Bardin (1997BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1997.), com o intuito de compreender os sentidos dos textos produzidos por alunos do curso de Ciências Biológicas. Apoia-se também na perspectiva de Moraes (1999MORAES, R. Análise de conteúdo. Revista Educação, Porto Alegre, v. 22, n. 37, p. 7-32, 1999.), o qual pontua que a análise de conteúdo envolve uma interpretação pessoal do pesquisador e que, portanto, uma leitura neutra é inverossímil, pois essa leitura se constrói de forma interpretativa, ainda que a compreensão tenha uma profundidade diferente de uma leitura comum.

Seguimos as três etapas sugeridas por Bardin (1997BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1997.): a) pré-análise; b) exploração do material; e c) tratamento dos dados e inferências dos resultados. Na etapa de pré-análise, realizamos uma leitura flutuante do material e separamos 35 textos de DC produzidos por alunos do curso de Ciências Biológicas.

Após essa seleção, os textos foram agrupados e identificados de acordo com sua temática, título, ano e número de páginas, recebendo uma codificação pertinente a essas características. Busca-se, nessa seleção, seguir as regras de representatividade, pertinência e homogeneidade. Assim, usamos como critério de seleção final: presença de título; formatação e ilustração pertinentes a TDC das revistas indicadas como modelos pela professora; identificação do curso superior de Ciências Biológicas; nome dos autores; extensão de pelo menos duas páginas.

Foram reservados dois textos sobre prática de extração de DNA, 17 sobre a prática de metabolismo celular e 16 sobre a prática de atividade da catalase. Optamos por selecionar e analisar neste trabalho apenas os textos sobre a prática de metabolismo, pois eram em maior número que os demais tipos. A análise desse corpus é descrita no Quadro 1

Quadro 1:
Identificação dos TDC Produzidos por Alunos do Curso de Ciências Biológicas sobre a Prática de Metabolismo - 2006 a 2013

Escolhidos os artigos, realizamos a exploração do material, sua codificação, decomposição e categorização, tendo como referência os trabalhos de Amaral et al. (1999AMARAL, I. A. et al. Algumas tendências de concepções fundamentais presentes em coleções didáticas de Ciências de 5ª. a 8ª. séries. In: ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISADORES EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS, 2., 1999, Valinhos. Atas... Valinhos: ABRAPEC, 1999. 1 CD-ROM.), Ribeiro e Kawamura (2005RIBEIRO, R. A; KAWAMURA, M. R. D. A ciência em diferentes vozes: uma análise de textos de divulgação científica. In: ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS, 5., 2005, Bauru. Atas... Bauru, 2005.), Silva e Neto (2006SILVA, H. S. C.; MEGID NETO, J. Artigos de divulgação científica e o ensino de Ciências: concepções de ciência/tecnologia/sociedade. In: TEIXEIRA, P. M. M. Ensino de ciências: pesquisas e reflexões. Ribeirão Preto: Holos, 2006. p. 32-52.), Amaral, Xavier e Maciel (2009), Cachapuz et al. (2011CACHAPUZ, A.; PEREZ, D. G.; CARVALHO, A. M. P.; PRAIA, J.; VICHES, A.(Org.). A necessária renovação do ensino das ciências. São Paulo: Cortez, 2011.), Angotti e Auth (2001ANGOTTI, J. A. P.; AUTH, M. A. Ciência e tecnologia: implicações sociais e o papel da educação. Ciência & Educação, Bauru, v. 7, p. 15- 27, 2001.) e Auler e Bazzo (2001AULER, D.; BAZZO, W. A. Reflexões para implementação do movimento CTS no contexto educacional brasileiro. Ciência & Educação, Bauru, v. 7, n. 1, p. 1-13, 2001.) sobre o enfoque CTS, os quais foram significativos para a construção de indicadores, a realização das descrições, a produção de inferências e a interpretação dos resultados.

Elaboramos as unidades temáticas a partir de recortes dos textos com fundamento no referencial anteriormente apresentado - o que consiste em compreender os sentidos sobre o conteúdo manifesto e latente, cuja presença ou ausência caracterizam os textos produzidos pelos alunos -, depois categorizamos e interpretamos os dados por meio de uma leitura e de procedimentos flexíveis, não lineares, retomando os documentos sempre que necessário.

Resultados e discussão

O exame dos 17 TDC referentes à prática de metabolismo celular evidenciou seis categorias quanto ao enfoque CTS: 1. Identificação do Cientista; 2. Procedimentos Internos da Ciência; 3. Integração de Áreas do Conhecimento Científico; 4. Relações entre Ciência e Sociedade; 5. Relações entre Ciência e Tecnologia; e, por fim, 6. Discussão de Impactos Sociais.

Os TDC foram analisados e representados por categorias e subcategorias que nos serviram para a construção de indicadores das interações entre ciência, tecnologia e sociedade. Com o intuito de melhor exibir e interpretar os nossos dados, destacamos as categorias e os indicadores relacionados. Desse modo, apresentamos as marcas distintivas do enfoque CTS nos TDC produzidos pelos graduandos. Essa representação, descrita no Quadro 2, permite que outros estudos possam utilizar esses indicadores na compreensão de materiais educativos produzidos por professores ou cientistas em formação.

Quadro 2:
Categorias e Indicadores da Relação CTS

Na sequência, discutem-se a distribuição dos indicadores das relações CTS, as aparentes tendências identificadas nos textos de DC e, por fim, as categorias desenvolvidas indutivamente que permitiram a criação dos indicadores.

Conforme o Quadro 3, fica perceptível que o conteúdo sobre CTS é abordado de forma diversificada. Os indicadores Ind. 3, Ind. 4, Ind.7 e Ind. 9 foram mais distribuídos ao longo dos textos, ou seja, a maioria dos textos evidenciou características das atividades científicas e suas aplicações no cotidiano. Também fizeram conexões do conhecimento de Biologia Celular com outras áreas da ciência.

Quadro 3:
Presença de Indicadores das Relações CTS nos TDC Produzidos por Estudantes do Curso de Ciências Biológicas

Nota-se também que discussões mais aprofundadas (representadas pelos outros indicadores, que foram pouco contemplados) sobre a natureza da ciência, a relação entre ciência e tecnologia e o impacto do conhecimento científico foram pontuais e insuficientes, corroborando os resultados do trabalho de Nascimento e Rezende Junior (2010bNASCIMENTO, T. G.; REZENDE JUNIOR, M. F. A produção de texto de divulgação científica na formação inicial de licenciados em ciências naturais. Revista Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências, São Paulo, v. 10, n. 1. 2010b.) com TDC produzidos por estudantes de Ciências Naturais. No entanto, nossa pesquisa mostra de forma mais detalhada que os alunos inserem outros elementos do enfoque CTS em suas produções escritas.

Nascimento e Rezende Junior (2010bNASCIMENTO, T. G.; REZENDE JUNIOR, M. F. A produção de texto de divulgação científica na formação inicial de licenciados em ciências naturais. Revista Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências, São Paulo, v. 10, n. 1. 2010b.) consideram que a problematização de questões científicas e tecnológicas requer do estudante tanto compreensão dos impactos sociais quanto consciência política, o que pode explicar por que essas categorias representadas pelos indicadores Ind. 10, Ind. 11, Ind. 12 e Ind.13 estão menos presentes nos textos.

Nenhum dos textos apresentou todos os indicadores, o que não significa má qualidade do material analisado. A maioria evidenciou o conhecimento científico-tecnológico em uma tendência aplicacionista (o conhecimento científico no cotidiano das pessoas) e em outra tendência, chamada de simplista, na qual os indicadores foram escassos.

Observa-se, no Quadro 3, que apenas seis textos (M1, M3, M6, M11, M13 e M16) apresentaram pelo menos metade dos indicadores. Esses textos exibem uma tendência a evidenciar o conhecimento científico de forma contextualizada, aproximando-se do enfoque CTS das principais revistas de DC no Brasil que fazem referências e discussões sobre o contexto histórico, econômico e cultural, articulando a ciência com campos não científicos, segundo pesquisa de Silva e Neto (2006SILVA, H. S. C.; MEGID NETO, J. Artigos de divulgação científica e o ensino de Ciências: concepções de ciência/tecnologia/sociedade. In: TEIXEIRA, P. M. M. Ensino de ciências: pesquisas e reflexões. Ribeirão Preto: Holos, 2006. p. 32-52.).

Constata-se que a produção de TDC por futuros professores e cientistas é uma alternativa a relatórios de aulas práticas, ou, mais que isso, sua implementação é uma necessidade em face da responsabilidade social que esses profissionais têm com a sociedade. Talvez, conforme Silva e Marcondes (2015SILVA, E. L; MARCONDES, M. E. R. Materiais didáticos elaborados por professores de química na perspectiva CTS: uma análise das unidades produzidas e das reflexões dos autores. Ciência & Educação, Bauru, v. 21, n. 1, p. 65-83, 2015.) e Rodrigues (2014RODRIGUES, D. A. M. Experiências formativas com divulgação científica: novos saberes ao estudar e ensinar ciências. Textos FCC, São Paulo, v. 42, p. 1-48. nov. 2014.), a autoria na produção escrita possa incitar a autoestima e a autonomia desses alunos.

Após essa apresentação da avaliação ampla dos documentos analisados, discutiremos, de forma mais detalhada, as categorias e subcategorias que deram origem aos indicadores.

Quanto à primeira categoria, referente à Identificação do Cientista, de modo geral, os estudantes fizeram poucas referências nos documentos à produção do conhecimento científico por cientistas. Dessa forma, não fica clara a apresentação do conhecimento científico como uma atividade humana. Essa limitada identificação dos cientistas supervaloriza o conhecimento científico como produto, não como processo, eliminando do texto a presença dos sujeitos históricos envolvidos e dos contextos que influenciaram sua construção. Portanto, dá ênfase a uma imagem de C&T neutra, livre de interesses, pois, conforme Auler e Bazzo (2001AULER, D.; BAZZO, W. A. Reflexões para implementação do movimento CTS no contexto educacional brasileiro. Ciência & Educação, Bauru, v. 7, n. 1, p. 1-13, 2001.), tal concepção defende a C&T como autônoma das influências sociais, isto é, distante de uma perspectiva crítica do conhecimento tecnológico.

Assim, nota-se nos TDC a ausência de descrições que singularizem a atividade do cientista, que possibilitem a compreensão do trabalho científico como atividade coletiva, feita por homens e mulheres. No entendimento de Cachapuz et al. (2011CACHAPUZ, A.; PEREZ, D. G.; CARVALHO, A. M. P.; PRAIA, J.; VICHES, A.(Org.). A necessária renovação do ensino das ciências. São Paulo: Cortez, 2011.), a visão operativista sobre o trabalho científico é uma das concepções mais comuns, a qual promove a visão errônea de que cientistas são gênios isolados. Entre as poucas referências nos TDC, destacam-se as descritas no início dos textos como introdução a pesquisas feitas sobre metabolismo dos seres vivos. Nas duas subcategorias de identificação, os estudantes usaram o próprio experimento para construir argumentos de autoridade, citando suas falas para explicar a origem e os resultados do experimento ou referindo-se a eles próprios de forma genérica, como nos exemplos do Quadro 4.

Quadro 4:
Identificação dos Cientistas nos TDC

Sobre a segunda categoria, Procedimentos Internos da Ciência, construímos quatro subcategorias (descrições de métodos usados, interpretação dos resultados, papel da experimentação na ciência e elaboração de modelos). Os textos apresentaram uma diversidade de descrições, menções e referências sobre o funcionamento da ciência, em especial sobre os procedimentos laboratoriais e a interpretação de resultados, conforme os exemplos:

[...] O experimento consistiu em duas partes: na primeira, foram colocadas as soluções de lêvedos, vivos e mortos, em tubos de ensaio separados. Já na segunda, todos os materiais biológicos foram inseridos [...]. (M6: Descrições de métodos - Ind. 3).

O mais interessante neste trabalho é mostrar o metabolismo agindo através da mudança de coloração das soluções presentes nos tubos de ensaio [...]. Podemos notar semelhanças no metabolismo dos organismos que julgávamos tão diferentes [...]. (M20: Interpretação de resultados - Ind. 4).

Apesar de os TDC evidenciarem as atividades laboratoriais realizadas nas práticas, as discussões de aspectos inerentes à própria ciência foram escassas, isto é, discussões sobre o significado da experimentação e sua importância para a ciência apareceram pontualmente. Os trechos descritos abaixo são ilustrativos:

[...] Experimentos conduzidos em animais vivos ou em exemplares de seres humanos passaram a buscar a compreensão dos mecanismos dos processos metabólicos. ( M1: Papel da experimentação na ciência - Ind. 5).

Este é o nosso grupo controle. Ele é usado como parâmetro para os nossos resultados experimentais, fundamentais para o método científico. (M4: Papel da experimentação na ciência - Ind. 5).

[...] A levedura é considerada um modelo de células eucariontes. (M1: Elaboração e adequação de modelos - Ind. 6).

A ausência dessas discussões caracteriza o processo de investigação científica como atividade sem um corpo teórico que sustente as formulações dos problemas, hipóteses, observações e experimentações realizadas, reduz a produção do conhecimento científico-tecnológico a uma visão empírico-indutivista - uma visão de que os cientistas extraem leis e teorias dos fenômenos naturais (Cachapuz et al., 2011CACHAPUZ, A.; PEREZ, D. G.; CARVALHO, A. M. P.; PRAIA, J.; VICHES, A.(Org.). A necessária renovação do ensino das ciências. São Paulo: Cortez, 2011.).

Em relação à integração de áreas do conhecimento científico (Ind. 7), tanto na introdução quanto nas explicações dos textos, evidenciamos a construção de interações do conhecimento de Biologia Celular (temática da disciplina) e Bioquímica (temática da prática) com o conhecimento de Ecologia, Evolução, Fisiologia, Química e Biotecnologia. A seguir, estão representados quatro trechos que exemplificam esse resultado:

Alguns tipos de fungos e uns poucos moluscos e anelídeos e muitas bactérias utilizam da fermentação como principal via para produção de ATP. (M1: Interação de Biologia Celular e Ecologia).

[...] mas a fermentação não deve ser vista como um processo biológico menos evoluído ou coisa do tipo. (M13: Interação de Biologia Celular e Evolução).

Quando ingerimos algum alimento, em geral, sabemos que ele percorre um sistema de órgão em que ocorrem vários processos biológicos para transformar esse material em energia. Porém, o sistema digestório é somente parte disso. (M14: Interação de Biologia Celular e Fisiologia).

[...] liberação de gás carbônico (gás também presente em bebidas gaseificadas, mas que, neste caso, não é resultante de processos biológicos!). (M6: Interação de Biologia Celular, Química e Biotecnologia).

Essas informações sugerem que a escrita de TDC sobre o conhecimento científico é mais livre e abrangente, capaz de possibilitar uma compreensão interdisciplinar da temática abordada. Portanto, dialoga com os objetivos do movimento CTS, que são criar uma visão mais complexa da C&T e buscar superar a fragmentação do conhecimento (Angotti; Auth, 2001ANGOTTI, J. A. P.; AUTH, M. A. Ciência e tecnologia: implicações sociais e o papel da educação. Ciência & Educação, Bauru, v. 7, p. 15- 27, 2001.).

No que diz respeito a Relações entre Ciência e Sociedade, elaboramos três subcategorias com a finalidade de caracterizar melhor esse conhecimento científico: contextualização histórica do conhecimento científico; aplicação do conhecimento científico no cotidiano; discussão sobre melhorias de vida para a população.

A contextualização histórica do conhecimento científico (Ind. 8) foi demonstrada em poucos textos produzidos pelos alunos. Sem o aporte histórico, o conhecimento científico é evidenciado como um produto acabado, ignorando as problemáticas e dificuldades que estimularam a produção desse saber. Essa é umas das visões deformadas das Ciências, conforme Amaral (apud Cachapuz et al. 2011CACHAPUZ, A.; PEREZ, D. G.; CARVALHO, A. M. P.; PRAIA, J.; VICHES, A.(Org.). A necessária renovação do ensino das ciências. São Paulo: Cortez, 2011.), são habituais também em livros didáticos. Os aspectos históricos e epistemológicos são essenciais dentro do movimento CTS, visto que designam uma compreensão mais ampla da natureza do trabalho científico e a construção do conhecimento (Angotti; Auth, 2001ANGOTTI, J. A. P.; AUTH, M. A. Ciência e tecnologia: implicações sociais e o papel da educação. Ciência & Educação, Bauru, v. 7, p. 15- 27, 2001.).

Diferentemente da contextualização histórica, notamos que a Aplicação do Conhecimento Científico-Tecnológico no Cotidiano (Ind. 9) foi abundante ao longo dos TDC, mostrando que os discentes constroem relações entre o que aprenderam na aula prática e o seu dia a dia, ao mesmo tempo que introduzem em seus TDC esse elemento como forma de contextualizar o assunto abordado, conforme destacam os textos M3 e M4:

Quando se fala em fermentação, normalmente, lembra-se logo em fabricação de pães e cervejas [...] fermento é um ingrediente muito utilizado na cozinha. Graças a ele, podemos provar alimentos macios, de digestão fácil e sabor agradável. (M3).

Quando passamos em frente a uma padaria e sentimos aquele cheiro delicioso, geralmente não fazemos ideia de todos os processos que levaram aquela mistura de farinha, água e fermento a se transformar no pão nosso de cada dia. (M4).

Essas descrições buscam criar a imagem de uma "sociedade tecnológica", no entanto restringir-se a esse elemento na produção dos TDC reforça uma compreensão neutra da ciência e da tecnologia, já que não se discutem as motivações científicas e industriais relacionadas à produção tecnológica. Essa é, conforme Auler e Bazzo (2001AULER, D.; BAZZO, W. A. Reflexões para implementação do movimento CTS no contexto educacional brasileiro. Ciência & Educação, Bauru, v. 7, n. 1, p. 1-13, 2001.), a estratégia comum em meios de comunicação, que estabelecem de forma implícita que o desenvolvimento científico-tecnológico é irreversível e independe da participação dos cidadãos que não são cientistas.

Reflexões sobre as Melhorias de Vida para a População (Ind. 10) foram escassas. Entre os poucos exemplos, podemos citar o texto M3 que, já em seu título, questiona sobre a presença de substâncias químicas na alimentação - Fermento químico ou biológico? Alternativa saudável ou método diferente?. O artigo busca desmistificar as concepções erradas relacionadas aos produtos de origem química/industrial e conclui que:

Quando se comparam substâncias químicas com biológicas, as biológicas sempre parecem mais saudáveis. De fato, com muitas substâncias sim, mas, nesse caso, trata-se apenas de diferentes tipos de fermento, que levam a diferentes métodos de fermentação. (M3).

No que se refere às Relações entre Ciência e Tecnologia, notamos a presença de duas vertentes, as quais se situam como subcategorias: o conhecimento científico como base para o desenvolvimento tecnológico e o conhecimento tecnológico como fornecedor de técnicas para o desenvolvimento científico. A maioria dos textos tentou evidenciar como a descoberta de processos fermentativos foi importante para o desenvolvimento industrial, considerando que a elaboração de produtos alimentícios como iogurtes, laticínios e bebidas implica tecnologias, o que pode ser inserido na subcategoria do conhecimento científico como base para o desenvolvimento tecnológico (Ind. 11):

A fermentação lática e alcoólica é de grande importância para a indústria com a produção de bebidas, pães, combustíveis, laticínios e muitos outros. (M1).

Na produção de bebidas alcoólicas como o vinho, por exemplo, os organismos fermentadores mais utilizados são as chamadas de leveduras [...] que fermentam o suco de uva, produzindo, inclusive, o álcool. (M6).

Ambas as fermentações são usadas pelo homem na produção de alimentos, como pães, iogurte e vinagre. (M7).

Foram registradas apenas três ocorrências sobre o conhecimento tecnológico enquanto fornecedor de técnicas para o desenvolvimento científico (Ind. 12). Esse indicador parece ser raro até em livros didáticos, pois, segundo pesquisa de Amaral, Xavier e Maciel (2009AMARAL, C. L.; XAVIER, E. S.; MACIEL, M. D. Abordagens das relações Ciência/Tecnologia/Sociedade nos conteúdos de funções orgânicas em livros didáticos de química do ensino médio. Investigações em Ensino de Ciências, Porto Alegre, v. 14, n. 1, p. 101-114, 2009.), em nenhum dos livros analisados foram encontrados esses elementos. Para Cachapuz et al. (2011CACHAPUZ, A.; PEREZ, D. G.; CARVALHO, A. M. P.; PRAIA, J.; VICHES, A.(Org.). A necessária renovação do ensino das ciências. São Paulo: Cortez, 2011.), a presença dessa visão permite desconstruir a ideia de tecnologia como subproduto da ciência, ou seja, enfatiza que a atividade técnica precedeu e influenciou o desenvolvimento da ciência, o que se repete nos dias atuais, pelo fornecimento de técnicas para a realização do trabalho científico. Assim, nos textos M11 e M1, os alunos evidenciaram relações entre o conhecimento tecnológico e o científico que, apesar de serem diferentes, também se relacionam.

Utilizando o microscópio, conseguiu identificar a levedura [...]. (M1).

A medida do pH de substâncias químicas que forneçam indicação visual é de extrema utilidade, as substâncias com essa função são chamadas indicadores [...]. (M1).

[...] Foi no século 20 que o homem alcançou a ordem dos micrômetros [...] Contribuições notáveis, como a descoberta do ciclo do ácido cítrico e o ciclo de ureia; ambos [...] deram suporte às teorias da respiração celular e da fermentação [...]. (M11).

[...] Diversas técnicas e a ajuda de instrumentos, tais como cromatografia, a difração de raios-x, a espectrofotometria NMR, a microscopia de elétrons e as simulações de dinâmica molecular são comumente utilizadas nos laboratórios por identificação e quantificação de energia química [...]. (M11).

Por fim, na categoria Discussão de Impactos Sociais (CTS) - Ind. 13 -, notamos que as reflexões sobre questões sociocientíficas nos textos foram insuficientes. Os poucos registros propuseram a discussão sobre o conhecimento científico, a criação de produtos tecnológicos e sua relação com a saúde ou natureza biológica dos seres vivos, representados pelos exemplos que seguem:

[...] Assim, são de extrema importância para a produção de álcool [...] e produtos de grande interesse industrial até saúde e alimentação animal. (M1).

[...] As primeiras descobertas sobre os processos metabólicos ajudaram os estudiosos da época a entenderem que existe algo em comum em todos os organismos. (M16).

Em uma experiência de produção de materiais didáticos com professores de química, também foram evidenciadas poucas discussões sobre o impacto do conhecimento científico e tecnológico no material didático produzido (Akahoshi, 2012AKAHOSHI, L.H. Uma análise de materiais instrucionais com enfoque CTSA produzidos por professores em curso de formação continuada. 2012. 163 f. Dissertação (Mestrado) - Instituto de Biociências, Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2012.). Ou seja, existem dificuldades na construção de um pensamento mais crítico sobre a Ciência por parte dos professores. Assim, apontamos a necessidade de mais estudos que investiguem as compreensões epistemológicas e as dificuldades de estudantes de Ciências Biológicas sobre as relações entre CTS, em especial em sua produção escrita no contexto de formação inicial.

Considerações finais

Neste trabalho, foram evidenciadas três tendências sobre o enfoque CTS: uma tendência com enfoque contextualizado, outra com enfoque aplicacionista do conhecimento científico-tecnológico e uma última em que não está totalmente contemplado o enfoque CTS, a qual denominamos de tendência simplista.

A investigação sobre os TDC produzidos a partir das aulas práticas de biologia celular sugere que os alunos contextualizaram o conhecimento científico com o cotidiano e demonstraram a produção de tecnologias baseadas no conhecimento científico. Os alunos também descreveram procedimentos internos da ciência que geralmente envolvem conceitos e métodos usados nas aulas práticas experimentais, o que expõe as potencialidades da produção de textos na formação inicial de estudantes de Ciências Biológicas.

Os TDC produzidos a partir de aulas práticas de laboratório são mais um incentivo à habilidade de escrita de cientistas e professores de biologia em formação, além de propiciarem a integração de conhecimentos de diferentes áreas, como a relação entre Química, Evolução, Ecologia e Biologia Celular descrita em alguns textos, que serviram a esses estudantes como aprendizado interdisciplinar dos conteúdos biológicos.

A maioria dos textos apresentou um enfoque simplista e aplicacionista das interações de ciência, tecnologia e sociedade, sem promover discussões sobre o impacto do conhecimento científico, e pouca menção aos cientistas ao longo dos textos, o que implica a construção de uma visão acrítica das relações entre CTS e impessoal quanto ao conhecimento científico-tecnológico.

Não obstante, identificar essas concepções por meio da produção de TDC em um curso de formação serve de subsídio para a intervenção e construção de novas propostas didáticas por parte dos professores formadores que sejam concomitantes às experiências de produção textual, pois os alunos tendem a realizar uma descrição criativa da prática, que enriquece o discurso sobre DC, mas sem aprofundamentos críticos quanto às interações entre CTS.

Talvez a pequena quantidade de laudas produzidas nos textos também tenha influenciado para que os alunos discutissem pouco sobre os impactos do conhecimento científico, visto que concentraram sua escrita sobre procedimentos internos da Ciência. Além disso, as pesquisas sobre livros didáticos evidenciam uma descrição insuficiente à luz das relações entre CTS, o que direciona para que novas pesquisas e experiências em cursos superiores norteiem a formação dos professores e divulgadores visando a uma compreensão crítica da ciência

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    Agradecemos à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) pela concessão de bolsa de mestrado e principalmente às turmas de 2006 a 2013 do curso de Ciências Biológicas. Nossos agradecimentos também a todas as pessoas que contribuíram direta ou indiretamente para a realização deste trabalho.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    May-Aug 2016

Histórico

  • Recebido
    14 Set 2015
  • Revisado
    11 Fev 2016
  • Aceito
    28 Mar 2016
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