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UMA IGREJA QUE “CAMINHA JUNTO”. SINODALIDADE NA ERA DO PAPA FRANCISCO

A Church which “Journeys Together” — Synodality in the Era of Pope Francis

RESUMO

O artigo delineia o modo como o Papa Francisco enxerga a sinodalidade, como processo de escuta e de discernimento que implica a participação e o envolvimento de todo o Povo de Deus. Procura-se destacar a natureza essencialmente “relacional” (antes que “instrumental”) da sinodalidade, a qual deve ser compreendida não como uma tática com o intuito de conter os excessos do clericalismo, mas como retorno às origens autênticas da Igreja e de seu modo de proceder. De fato, enquanto comunhão, a Igreja brota da iniciativa de Deus Pai e, por meio do dom do Espírito Santo de Cristo, “reconduz à unidade os filhos de Deus dispersos” (Jo 11,52). Nisto, ela responde a seu ato fundante de ser “constituída como uma assembleia” com o desejo de caminhar junto como um Povo. A sinodalidade expressa a identidade mesma do Deus da comunhão e da misericórdia que a Igreja proclama ao mundo. A um só tempo, a sinodalidade suscita e mostra a correspondência entre o que a Igreja é em si mesma e o que ela faz no mundo.

PALAVRAS-CHAVE
Igreja; Vaticano II; Sinodalidade; Bispos; Povo de Deus; Laicato; Fiéis

ABSTRACT

The article lays out how Pope Francis looks at synodality, as a process of listening and discernment that implies the participation and involvement of the whole People of God. It seeks to highlight the essentially “relational” (rather than “instrumental”) nature of synodality, which should be understood, not as a tactic aimed at containing the excesses of clericalism, but as a return to the Church’s authentic origins and way of proceeding. In fact, as communion, the Church springs from the initiative of God the Father and, through Christ’s gift of the Holy Spirit, “brings the scattered children of God together and makes them one” (Jn 11:52). It thus responds to its founding, “constituted as an assembly” with the will to walk together as a People. Synodality expresses the very identity of the God of communion and misericordia whom the Church proclaims to the world. Synodality both brings about and shows the correspondence between what the Church is in herself and what she does in the world.

KEYWORDS
Church; Vatican II; Synodality; People of God; Laity; Faithful

Introdução: a sinodalidade vem à tona

Em 1965, o Papa Paulo VI instituía o Sínodo dos Bispos com o intuito de fazer da deliberação conciliar uma característica regular na vida da Igreja. Agora, o Papa Francisco convoca a XVI Assembleia Geral Ordinária com o tema “Por uma Igreja sinodal: comunhão, participação e missão”, incluindo uma fase diocesana (outubro de 2021 — abril de 2022), uma fase continental (setembro de 2022 — março de 2023) e uma fase universal (outubro de 2023). Em toda a Igreja, a “sinodalidade” passou a ser a palavra do momento.

A palavra “sínodo” procede de uma expressão grega, que significa “estrada que se percorre com outros; caminho ou jornada compartilhada”. Como uma característica da vida da Igreja, suas origens remontam ao primeiro concílio de Jerusalém, descrito no capítulo 15 dos Atos dos Apóstolos, e possivelmente no capítulo 2 da Carta de Paulo aos Gálatas. Em outras palavras, ela é

um caminho percorrido pela Igreja à luz da ação do Espírito em sua história, a serviço do povo de Deus. Mais especificamente, é o resultado das intuições e sementes que surgiram como diretrizes para toda a Igreja no Concílio Vaticano II, especialmente nas Constituições Lumen Gentium e Gaudium et Spes e no decreto Ad Gentes

(LÓPEZ OROPEZA; SPADARO, 2019SPADARO, A.; LÓPEZ OROPEZA, M. Quattro criteri per vivere bene il tempo del Sinodo per l’Amazzonia. La Civiltà Cattolica, Roma, n. 4063, p. 69–77, 5 out. 2019., p. 74-75).

Um sínodo é uma assembleia consultiva convocada pelo Papa ou por um bispo para aconselhamento sobre um tema de interesse particular para a Igreja local, regional ou universal. É um processo que requer envolvimento, escuta mútua, diálogo, consenso e comunhão, oração e discernimento espiritual. A sinodalidade nasce da própria essência da Igreja; é sua realidade constitutiva e, por isso, como a própria Igreja, ela se orienta fundamentalmente para a evangelização. É um modo eclesial de estar no mundo, um modo profético de servir o mundo de hoje.

No entanto, ainda que a palavra “sínodo” seja tão usada nos dias de hoje, ela permanece uma noção complexa, em constante evolução nos vocabulários de teólogos e canonistas. Por se tratar de uma palavra que agora é usada de modo tão regular e difundido nos contextos mais variados da Igreja, há o risco de que seja mal interpretada ou se dilua (LEGRAND, 2005LEGRAND, H. La sinodalità, dimensione inerente la vita ecclesiale: fondamenti e attualità. Vivens homo, Bologna, n. 16, p. 7–43, 2005.). Dentro da palavra grega, esconde-se aquele significado etimológico de “caminhar juntos”: uma imagem tão linda e promissora, à qual desejamos dar a maior proeminência.

Como disse o Papa Francisco há seis anos, no 50º aniversário dos sínodos modernos:

O caminho da sinodalidade é precisamente o caminho que Deus espera da Igreja do terceiro milênio. Aquilo que o Senhor nos pede, de certo modo, está já tudo contido na palavra “Sínodo”. Caminhar juntos – leigos, pastores, Bispo de Roma – é um conceito fácil de exprimir em palavras, mas não é assim fácil pô-lo em prática

(2015).

Sem subestimar desafios e dificuldades, o Santo Padre fez da sinodalidade uma das pedras angulares de seu magistério.

Nas sete seções que se seguem, o presente artigo compreenderá a sinodalidade católica contemporânea enraizada no Vaticano II e expressa nas palavras, ensinamentos e ações do Papa Francisco – mais especificamente, nas cinco exortações apostólicas e nas três encíclicas que ele escreveu até agora1 1 A este respeito, confira-se a obra conjunta de Michael Czerny e Christian Barone (2021). Ela oferece uma síntese do magistério do Papa Francisco em continuidade com os pronunciamentos do Concílio Vaticano II e reivindica a fraternidade e a sororidade universais como um “sinal dos tempos” para os dias de hoje, ao modo de uma visão renovada para a humanidade atual, incluindo as várias tradições religiosas que caminham juntas e unem forças para a construção de um mundo mais justo e unido. Com prazer reconheço que a valiosa pesquisa e os escritos do Rev. Prof. Christian Barone formam a base deste artigo. . Depois de vermos na próxima seção “1. A graça das diferenças”, exploraremos, por vez, os temas: “2. O serviço da autoridade”; “3. A Igreja é sinodal”; “4. A eclesiologia de comunhão, um pressuposto da sinodalidade”; “5. O Povo e os Bispos”; “6. Encontro, escuta, diálogo”; e, concluindo, “A sinodalidade ao alcance”. Compartilharemos da convicção do Santo Padre endereçada na abertura do Sínodo, em 9 de outubro de 2021: “o Espírito nos guiará e concederá a graça de avançarmos em conjunto, de nos ouvirmos mutuamente e iniciarmos um discernimento no nosso tempo, tornando-nos solidários com as fadigas e os anseios da humanidade” (FRANCISCO, 2021FRANCISCO, Papa. Discurso para o início do percurso sinodal, 9 de outubro de 2021. Disponível em: https://www.vatican.va/content/francesco/pt/speeches/2021/october/documents/20211009-apertura-camminosinodale.html. Acesso em: 21 jan. 2022 [2021a]
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a).

1 A graça das diferenças

A perspectiva pela qual Francisco enxerga a sinodalidade não é instrumental, mas relacional. Não se trata de usar a sinodalidade para alcançar um objetivo diferente, como a criação de consenso, mas de transformar a consciência eclesial à luz da identidade sinodal da Igreja, para que o encontro sereno, o confronto transparente e o diálogo fecundo se tornem o seu modo natural de ser. As palavras do Papa na abertura do Sínodo sobre a juventude, em 2018, podem ser aplicadas a todos os sínodos:

Esforcemo-nos, pois, por procurar “frequentar o futuro” e por fazer sair deste Sínodo não só um documento [...], mas sobretudo propósitos pastorais concretos, capazes de realizar a tarefa do próprio Sínodo, que é fazer germinar sonhos, suscitar profecias e visões, fazer florescer a esperança, estimular confiança, enfaixar feridas, entrançar relações, ressuscitar uma aurora de esperança, aprender um do outro, e criar um imaginário positivo que ilumine as mentes, aqueça os corações, restitua força às mãos e inspire aos jovens [ao povo] [...] a visão dum futuro repleto da alegria do Evangelho

(FRANCISCO, 2018aFRANCISCO, Papa. Discurso de abertura do Sínodo dos Bispos sobre os jovens, 3 de outubro de 2018. Disponível em: https://www.vatican.va/content/francesco/pt/speeches/2018/october/documents/papa-francesco_20181003_apertura-sinodo.html. Acesso em: 21 jan. 2022. [2018a]
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).

A sinodalidade é um catalisador. Onde o corpo eclesial se tornou inerte, ela novamente o ajuda a pôr-se em movimento. Ao mesmo tempo, a sinodalidade resiste à tentação de se deixar que o mero costume, as formas ou os hábitos se tornem um álibi para nos escondermos, como evitando o esforço de anunciar o Evangelho aos homens e mulheres de nosso tempo.

Do ensinamento do Papa, podemos derivar duas características fundamentais e complementares da sinodalidade.

  1. A primeira é seu dinamismo. A sinodalidade é um processo que visa a mudança. Aqueles que querem que as coisas permaneçam como estão se verão desafiados e esgotados quando começarem essa jornada.

  2. segunda característica se expressa com a palavra “juntos”: o processo sinodal tende a construir um “nós” cada vez mais inclusivo. A sinodalidade acaba, assim, por definir a identidade dos crentes e da Igreja que queremos ser (COSTA, 2021COSTA, G. Fare sinodo: il coraggio della fecondità. Aggiornamenti Sociali, Milan, v. 72, n. 10, p. 507–512, out. 2021.).

Se a sinodalidade é um dinamismo que visa ampliar a participação, de modo que desse encontro recíproco possa emergir uma identidade eclesial mais rica, então ela é performativa por sua própria natureza: ao partirmos juntos no caminho, já estamos, por isso mesmo, alcançando o objetivo a que nos propusemos chegar. Na perspectiva de Francisco, a sinodalidade “[constrói] um povo capaz de recolher as diferenças” (FT 217). Ela constitui um instrumento de participação que busca envolver a todos. Quer seja em nome da uniformidade ou autoridade, quer seja em nome da reconciliação, a sinodalidade não deveria excluir nem impor, mas dar espaço a identidades e perspectivas diversas.

A imaginação cristã se deleita na diferença porque somos criados e amados pelo Criador precisamente por – e não a despeito de – sermos corpóreos, únicos e diversos. Dizer que o diálogo deve maximizar o que une e minimizar o que divide pode expressar uma visão curta e reduzida. Reconhecer e valorizar as diferenças, mais do que estar apenas atento ao que é comum ou uniforme, indiscutivelmente parece ser a mais enriquecedora das experiências.

Este Papa afirmou, mais vigorosamente do que nenhum outro, que o cristianismo vive e floresce nas diferenças e na diversidade. E assim o faz ao enfatizar que o mistério da Encarnação é o que impulsiona a ação cristã: o mistério de Cristo nos fala do valor grandioso da natureza humana em todas as suas particularidades. O Verbo se fez carne, não em alguma forma genérica de humanidade, mas na própria pessoa de Jesus Cristo, concreta e particular, com um lugar de nascimento todo seu, com uma família, uma língua, um trabalho. Em sua insistência sobre a humanidade verdadeira de Cristo, o Concílio de Calcedônia não deixa de ser uma afirmação de que a diversidade e a singularidade particular do ser humano não é um defeito, mas um dom.

Somente é possível desenvolver a sinodalidade, se partirmos da premissa de que a diversidade é um valor constitutivo da Igreja, porque a Igreja é edificada pelo Espírito a partir da infinita variedade de carismas e funções de seus membros, que procedem “de todas as nações que há debaixo do céu” (At 2, 5). Reunindo tantas origens e línguas, o primeiro Pentecostes é um esplêndido exemplo. A sinodalidade efetiva brota da realidade afetiva da fraternidade, feita de amizade e respeito, aceitação e acolhimento das identidades humanas em toda a sua variedade. Este espírito de amizade leva à descoberta da fecundidade das diferenças. Em um contexto de amizade e respeito, mesmo os desentendimentos e visões opostas podem contribuir para a construção de uma unidade mais vital e articulada, mais robusta, criativa e resiliente do que uma uniformidade superficial.

2 O serviço da autoridade

Celebrar as diferenças e a diversidade nos leva à espinhosa questão de como entender o exercício da autoridade e do poder dentro da Igreja e em sua relação com o mundo.

Algumas formas de evitar esse problema são bem familiares a nós.

É o caso de uma retórica altamente espiritualizante que resolveria todas as tensões repetindo sempre que o poder é para o serviço, postergando desse modo qualquer exame sério dos limites e abusos das formas atuais de exercício da autoridade na Igreja.

O risco é que essa insistência de que o poder é para o serviço – à exceção de que ele seja garantido por princípios de clara prestação de contas, de transparência e de respeito mútuo – se converta facilmente numa clara separação entre uma hierarquia que ensina/ordena e um laicato que aprende/obedece. Já não há mais relação fraterna, longe disso. Mesmo se aquilo que se busca em tal visão da Igreja raramente se expresse de modo tão grosseiro, implicitamente nada impede que seu ideal ou propósito seja um laicato devotamente submisso à hierarquia, ao passo que a principal virtude desejada para os ministros ordenados é que sejam submissos ao seu bispo ordinário ou ao seu superior religioso. Em um ethos assim, não há senão uma desconfiança fundamental para com a capacidade dos leigos (e do baixo clero) de refletir, discernir e agir no mundo ao qual a Igreja é enviada.

Essa mesma desconfiança pode se manifestar em atitudes de suspeita e de autossuficiência em relação ao mundo em geral: pensemos o quão facilmente alguns padres e bispos retratam nossos vizinhos, amigos, familiares e concidadãos como se não se passassem de pessoas secularizadas, materialistas, relativistas e hedonistas. Essa resistência em apreciar o bem verdadeiro que existe em cada ser humano e comunidade é algo completamente alheio não apenas à rica antropologia cristã da Gaudium et Spes, mas também ao legado de vida e positividade que ela nos deixou (Vademecum 2.3).

É lamentável que uma cultura clericalista continue sendo reforçada e perpetuada cada vez que se buscam vantagens, status e segurança para o clero, o que nada tem a ver com serviço, mas com poder e privilégio. Essa mentalidade pode estar presente seja entre os próprios membros do clero seja entre os fiéis que aplaudem e promovem esse tipo de comportamento, que toleram ou até mesmo exigem esse estilo de relação, ao passo que difamam e menosprezam outras formas mais fraternas de encarnar o sacerdócio ministerial.

O clericalismo nasce duma visão elitista e excludente da vocação, que interpreta o ministério recebido mais como um poder a ser exercido do que como um serviço gratuito e generoso a oferecer; e isto leva a julgar que se pertence a um grupo que possui todas as respostas e já não precisa de escutar e aprender mais nada, ou então finge escutar

(FRANCISCO, 2018FRANCISCO, Papa. Episcopalis communio. Constituição Apostólica sobre o Sínodo dos Bispos, 15 de setembro de 2018. Disponível em: https://www.vatican.va/content/francesco/pt/apost_constitutions/documents/papa-francesco_costituzione-ap_20180915_episcopalis-communio.html. Acesso em: 21 jan. 2022.
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a).

Quando uma parte do clero assume esse estilo, com a aceitação e anuência do laicato, surge aquele tipo de mentalidade clerical que, por seu turno, molda e influencia de modo contundente as novas gerações de presbíteros. Tal mentalidade parece captar os anseios desses grupos pelo fato de ela corresponder a certo desejo que alimentam de que se deve fazer tudo corretamente, mantendo-se o controle e a disciplina sobre o que se pensa, se diz e se faz. Ao final, o que se revela é uma estrita regulação do ser católico em seus aspectos práticos. Um modelo de ministério presbiteral que obedeça a uma descrição como essa já não mais resplandece a luz e a alegria do Evangelho sobre as lutas cotidianas das pessoas e os problemas reais da sociedade.

Na constituição Lumen Gentium, o Vaticano II logrou compreender a Igreja a partir de categorias bíblicas, como a de “Povo de Deus”. No entanto, numa visão clerical da Igreja como a que acabamos de descrever, não se é defendida nem plenamente reconhecida a própria dignidade batismal dos leigos e sua participação no sacerdócio único de Cristo. Como resultado, alguns, especialmente as gerações mais velhas, estão desiludidos depois de terem vivido as entusiásticas tentativas do pós-Concílio de recuperar um lugar significativo para os leigos na Igreja. Outros muitos se sentem marginalizados e não se animam mais (ou não são permitidos) em assumir suas verdadeiras responsabilidades dentro da Igreja. Quanto às gerações mais jovens, é comum, e talvez compreensível, que tantos desconfiem espontaneamente de uma instituição que pode lhes parecer, na melhor das hipóteses, esclerosada e inflexível, ou mesmo corrupta.

Nem sempre foi assim.

No primeiro milênio, “caminhar juntos”, ou seja, praticar a sinodalidade, era a maneira habitual de proceder da Igreja, entendida como “Povo reunido pela unidade do Pai, do Filho e do Espírito Santo” [...]. Esse modo de proceder não esmoreceu nem sequer no segundo milênio, quando a Igreja evidenciou em maior medida a função hierárquica

(DP, n. 11).

No que diz respeito à definição de dogmas, além dos sínodos diocesanos e provinciais e dos concílios ecumênicos, “os Papas queriam consultar os Bispos, para conhecer a fé de toda a Igreja, recorrendo à autoridade do sensus fidei [sentido da fé] de todo o Povo de Deus, que é ‘infalível in credendo’ [quando crê]” (DP, n. 11). Em contrapartida, no século XIX, surgiu um modelo mais clericalizado de Igreja, que foi se cristalizando em torno de algumas dinâmicas do Concílio Vaticano I e de suas repercussões.

Uma teologia neoescolástica passou então a florescer na Igreja do início do século XX, enfrentando-se contra a revolução quase copernicana que, na era moderna, deslocou o centro de sua atenção para a subjetividade, e que, pouco mais tarde, celebrou a liberdade absoluta do indivíduo. Enquanto princípio, essa teologia coloca em primeiro plano a autoridade do Deus da revelação, à qual o homem responde com um ato de fé, enquanto obediência da razão às verdades eternas, que de outro modo seriam inacessíveis ao conhecimento sensível e racional. Em um ambiente assim, no qual o cumprimento e a conformidade com as proposições reveladas eram comumente vistos como o valor principal da vida cristã, talvez fosse inevitável que o poder e o status terminassem concentrados nas mãos da hierarquia eclesiástica, cuja missão era compreendida como a de guardiã do depósito da fé.

O Papa Francisco deixou claro que o clericalismo não pode mais reinar: “O clericalismo é uma perversão e é raiz de muitos males na Igreja: destes devemos pedir humildemente perdão e sobretudo criar as condições para que não se repitam” (FRANCISCO, 2018FRANCISCO, Papa. Episcopalis communio. Constituição Apostólica sobre o Sínodo dos Bispos, 15 de setembro de 2018. Disponível em: https://www.vatican.va/content/francesco/pt/apost_constitutions/documents/papa-francesco_costituzione-ap_20180915_episcopalis-communio.html. Acesso em: 21 jan. 2022.
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a)2 2 Original em itálico. . O clericalismo deve ser combatido por pessoas (sejam leigas, consagradas ou ordenadas) conscientes de sua corresponsabilidade, enquanto fiéis batizados, para com a vida e o futuro da Igreja.

3 A Igreja é sinodal

O Papa Francisco deseja que a Igreja encontre um estilo sinodal de ser que a liberte das formas autorreferenciais e autoperpetuantes de exercer a autoridade por si mesma (LEGRAND; CAMDESSUS, 2021LEGRAND, H.; CAMDESSUS, M. Una Chiesa trasformata dal popolo. Cinisello Balsamo (MI): Paoline, 2021., p. 23). Essa contestação ao apego do clero (por certo, muito humano) por um status especial não deve ser caricaturada como um modo de se introduzir um “parlamentarismo leigo” sob o pretexto da sinodalidade.

A Constituição Apostólica Episcopalis Communio sobre o Sínodo dos Bispos, de 15 de setembro de 2018, expressou a importância de se celebrar um sínodo sobre a sinodalidade. “A sinodalidade, como dimensão constitutiva da Igreja, oferece-nos o quadro interpretativo mais apropriado para compreender o próprio ministério hierárquico” (FRANCISCO, 2015FRANCISCO, Papa. Discurso na comemoração do cinquentenário da instituição do Sínodo dos Bispos, 17 de outubro de 2015. Disponível em: https://www.vatican.va/content/francesco/pt/speeches/2015/october/documents/papa-francesco_20151017_50-anniversario-sinodo.html. Acesso em: 21 jan. 2022. [2015]
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), pois é disso que se trata quando falamos de participação compartilhada na autoridade da Igreja. O Sínodo 2021-2023 sobre a sinodalidade nos chama todos ao diálogo; suas fases e processos visam nos fazer colaborar em um modelo de participação mútua, que é propriamente eclesial.

A sinodalidade é um retorno às verdadeiras fontes e origens da Igreja. Ela não se confunde com uma mera estratégia eclesiástica para se deter a deriva clericalista dos últimos dois séculos. Pelo contrário, como o Evangelho de João esclarece, a Igreja nasce por iniciativa de Deus Pai, que derrama sobre ela o Espírito Santo, e a «reúne na unidade» (Jo 11,52) pelo dom da vida do Filho feito homem (Jo 10,17). O verbo “reunir” (synágein) contém aquele precioso prefixo sýn, que encontramos no termo sínodo: “o ato fundante de Deus reúne e funda aquela que se chama assembleia (ekklesia), o resto dos fiéis, os discípulos que “caminham juntos” (syn-odéuein).

A Comissão Teológica Internacional acentua esse vínculo ao afirmar que “a sinodalidade designa, antes de tudo, o estilo peculiar que qualifica a vida e a missão da Igreja, exprimindo a sua natureza como o caminhar juntos e o reunir-se em assembleia do povo de Deus convocado pelo Senhor Jesus na força do Espírito Santo para anunciar o Evangelho” (2018, 70a). Logo, o princípio da sinodalidade remonta à ação do Espírito, de modo que podemos ressaltar que a Igreja é o povo reunido pela Trindade (plebs adunata de Trinitate), isto é, a Igreja participa da vida de comunhão trinitária, tornando-se instrumento pelo qual toda a humanidade é chamada a participar da Trindade.

No entanto, não se trata somente de apreender o dom da comunhão trinitária, “fonte, forma e escopo da sinodalidade” (COMISSÃO TEOLÓGICA INTERNACIONAL, 2018COMISSÃO TEOLÓGICA INTERNACIONAL. A sinodalidade na vida e na missão da Igreja, 2 de março de 2018. Disponível em: https://www.vatican.va/roman_curia/congregations/cfaith/cti_documents/rc_cti_20180302_sinodalita_po.html. Acesso em: 24 jan. 2022.
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, 43). É também necessário assinalar que a sinodalidade é a resposta lógica e livre do ser humano – expressa na forma da Igreja (forma ecclesiae) – à graça do Deus trino que convoca seu Povo (MARTIN, 2019MARTIN, A. Appunti per un’ecclesiologia biblica a carattere sinodale. L’utilizzo della Sacra Scrittura ne La sinodalità nella vita e nella missione della Chiesa. In: CODA, P.; REPOLE, R. (Org.). La sinodalità nella vita e nella missione della Chiesa. Commento a più voci al Documento della Commissione teologica internazionale. Bologna: EDB, 2019. p. 19–28., p. 21). A sinodalidade expressa, portanto, na vida da Igreja, algo da própria natureza do Deus que ela anuncia ao mundo, testemunhando assim a correspondência entre o que ela é e o que ela faz a partir da revelação de Deus em Cristo. Dessa forma, como comunidade de fé, ela encarna o modo de viver Daquele que veio “não para ser servido, mas para servir” (Mt 10,45), isto é, aquele para quem ela retorna (REPOLE, 2019REPOLE, R. Verso una teologia della sinodalità. Alcune considerazioni di fondo in relazione al secondo capitolo del documento. In: CODA, P.; REPOLE, R. (Org.). La sinodalità nella vita e nella missione della Chiesa. Commento a più voci al Documento della Commissione teologica internazionale. Bologna: EDB, 2019. p. 49–60., p. 56).

O objetivo de iniciar caminhos de sinodalidade também se traduz: no confronto contra alguns desafios prementes do presente, tal como a recuperação da igualdade fundamental da dignidade de homens e mulheres (NOCETI, 2008NOCETI, S. Donne e ministero: una questione scomoda. Orientamenti e prospettive interpretative nella riflessione teologica delle donne. In: BURLINI, A. M. C. (Org.). Liturgia e ministeri ecclesiali. Atti della XXXV Settimana di Studio dell’Associazione Professori di Liturgia Vallombrosa, 26-31 agosto 2007. Roma: CLV, 2008. p. 67–99.); na contenção dos excessos de uma economia orientada pelo lucro; no tornar a democracia mais inclusiva; na promoção de uma liderança que some forças na consecução de causas globais; na salvaguarda do planeta Terra, nossa casa comum; na gestão dos fluxos migratórios; e na busca da paz e da unidade entre as nações.

Assim compreendida, a sinodalidade não diz somente respeito a assuntos internos da Igreja, mas à relação entre a Igreja e o mundo que procede do vínculo entre sinodalidade e fraternidade, uma vez que o Povo de Deus, em seu caminho histórico, deseja compartilhar a luz do Evangelho com todos, inclusive com pessoas de outras religiões, convicções e culturas. Assim como “é impossível imaginar uma conversão do agir eclesial sem a participação ativa de todos os membros do Povo de Deus” (FRANCISCO, 2018FRANCISCO, Papa. Episcopalis communio. Constituição Apostólica sobre o Sínodo dos Bispos, 15 de setembro de 2018. Disponível em: https://www.vatican.va/content/francesco/pt/apost_constitutions/documents/papa-francesco_costituzione-ap_20180915_episcopalis-communio.html. Acesso em: 21 jan. 2022.
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c), do mesmo modo, “caminhar juntos” como Povo de Deus, implica a resolução de caminhar como Igreja junto a toda a família humana (Vademecum 5.3).

4 A eclesiologia de comunhão, um pressuposto da sinodalidade

O termo “sinodalidade” não se encontra nos documentos do Vaticano II. Embora essa palavra pareça enquanto tal um neologismo, fruto de uma reflexão teológica posterior, ainda assim ela traduz e sintetiza a eclesiologia de comunhão formulada pelo Concílio. Podemos ver seus pressupostos teológicos na Lumen Gentium, mais particularmente, na compreensão da Igreja como “sacramento” (LG, n. 1) e como “Povo de Deus” (LG, n. 4), categorias bíblica e patrística que nos permitem superar o modelo eclesiológico da Igreja como sociedade perfeita (societas perfecta), que se tornou predominante desde a Reforma até o Vaticano II.

Um dos aspectos mais inovadores da Lumen Gentium foi a recuperação da doutrina do “sacerdócio comum dos fiéis” (LG, n. 10), que ressaltou a centralidade dos leigos na vida da Igreja. Em virtude do batismo, todos os fiéis são investidos da “dignidade e da liberdade dos filhos de Deus” (LG, n. 9). Sua participação ativa na missão da Igreja passou a ser considerada indispensável e necessária. Por essa razão, o Concílio exigiu decididamente o fim daquela prática centenária que contrapunha uma hierarquia que ensina a um laicato que deve escutar e aprender.3 3 Esta intenção dos Padres conciliares pode também ser deduzida da própria ordem em que o documento foi subdividido: o capítulo dedicado ao “Povo de Deus” (capítulo 2) precede o capítulo sobre “A Constituição Hierárquica da Igreja” (capítulo 3), dando assim a ideia de que a hierarquia eclesiástica desempenha um papel de serviço à totalidade da Igreja, não sendo outro seu propósito ou finalidade. “O todo é superior à parte.” (EG, n. 234-37).

Pelo batismo, leigos e leigas são chamados à responsabilidade de anunciar o Evangelho a todos e de participar do governo da Igreja de acordo com suas capacidades e papéis específicos. É o Espírito quem lhes concede carismas e graças especiais, e “os tornam aptos e dispostos a assumir diversas obras e encargos em benefício da renovação e da edificação cada vez mais ampla da Igreja” (LG, n. 12).

Se o Espírito Santo é o princípio de unidade que transforma todos os membros da Igreja em um único sujeito vivo – diverso em ministérios, vocações e missões –, a Eucaristia é a “fonte e o ápice” da comunidade de fé (LG, n. 11; SC, n. 10). Por ela, os muitos grãos formam um só pão. O Vaticano II assinala assim a ação do Espírito que vivifica a Igreja pela graça sacramental, especialmente no momento celebrativo da assembleia eucarística, qual realidade originária donde brota o “nós” eclesial. A história da Igreja mostra que se estabeleceu desde os tempos antigos uma analogia entre os eventos sinodais e a celebração eucarística. De fato, em ambos os casos, é a ação do Espírito que torna Cristo presente, favorecendo o consenso que nos permite discernir o que deve ser feito. Quer pela linguagem da “celebração” de eventos sinodais, quer por suas diretrizes cerimoniais (Ordo ad Synodum) – que situam a celebração da Eucaristia e a entronização do Evangelho no início, no meio e no fim de cada assembleia sinodal –, somos levados a compreender como cada assembleia sinodal é “eucarística” na medida em que ela se orienta para a realização visível da unidade em Cristo. A expressão “representação de Cristo” (representatio Christi), introduzida por Tertuliano, constitui o núcleo essencial de todo evento sinodal: tornar Cristo presente por meio de seu Espírito. Esse gerar a presença de Cristo na Igreja mostra a profunda conexão analógica entre Eucaristia e sinodalidade (RUGGIERI, 2017RUGGIERI, G. Chiesa sinodale. Roma; Bari: Laterza, 2017., p. 71-91).

5 O povo e os bispos

Atentemos, ainda, a mais dois pontos que nos ajudarão a perceber a importância transformadora da Lumen Gentium na compreensão da sinodalidade como um jeito de ser Igreja.

O primeiro ponto diz respeito ao sentido da fé (sensus fidei) do Povo de Deus (LG, n. 12), chamado de “instinto sobrenatural” por não resultar primeiramente de uma deliberação racional, mas de um conhecimento espontâneo e natural, uma espécie de percepção (aisthêsis). A expressão em questão tem uma longa história, particularmente relacionada à proclamação dos dogmas marianos pelo magistério pontifício4 4 Por exemplo, em Ineffabilis Deus, Pio XII empenhou sua autoridade ao definir o dogma da Imaculada Conceição apelando ao sentimento comum dos fiéis (singularis conspiratio antistitum et fidelium), como voz autêntica da tradição (SARTORI, 1979). . Esse instinto sobrenatural da verdade é expresso pelos fiéis como um todo, permitindo-lhes espontaneamente julgar a autenticidade de uma doutrina de fé e pôr-se de acordo para aderir a ela ou a outro elemento da práxis cristã.

A totalidade dos fiéis que receberam a unção do Santo (cf. 1 Jo 2, 20.27) não pode enganar-se na fé; e essa sua propriedade peculiar manifesta-se por meio do sentir sobrenatural da fé do povo todo, quando este, “desde os Bispos até o último dos leigos fiéis”, manifesta consenso universal em matéria de fé e costumes

(LG, n. 12).

O segundo ponto diz respeito à sacramentalidade do episcopado (LG, n. 21). O Concílio ensina que, na ordenação episcopal, é conferida a plenitude do sacramento da Ordem. Em virtude da unidade do poder sagrado (potestas sacra) da Ordem, são igualmente conferidos os ofícios de santificar, ensinar e governar. No entanto, por sua natureza, tais ofícios não podem ser exercidos senão em comunhão hierárquica com o Bispo de Roma e com os demais membros do colégio episcopal. Devido ao caráter propriamente colegial da ordem episcopal, a unidade dos bispos constitui uma realidade universal que precede o serviço episcopal (diakonia) a cada uma das Igrejas particulares.

A suprema potestade colegial sobre toda a Igreja pode ser exercida pelos bispos, juntamente com o Papa, seja na forma solene de um concílio ecumênico, seja em diversas atividades realizadas em contextos diferentes e dispersos por todo o mundo. O Concílio especifica que o colégio dos bispos só tem autoridade se se compreende unido ao bispo de Roma, aquele que exerce a autoridade suprema na Igreja (LG, n. 22). A afirmação de que a ordenação episcopal implica antes de tudo uma referência à Igreja universal encontra-se consagrada no Código de Direito Canônico de 1983 (can. 330-341).5 5 Segundo alguns estudiosos, o Concílio não esclareceu o suficiente como se deve articular a relação entre o collegium episcoporum e a communio ecclesiarum. O resultado disso é uma concepção da colegialidade cada vez mais rígida e difícil de ser colocada em prática, terminando por reintroduzir o modelo centralizado adotado pela Igreja Católica após o Vaticano I (LEGRAND, 2001, p. 210-211).

Paulo VI instituiu o Sínodo dos Bispos para ressaltar o vínculo entre a Igreja universal e as Igrejas locais. Com efeito, o ministério episcopal é aquele que une o particular — a porção do Povo reunido numa Igreja local – ao universal – o exercício desse ministério em comunhão com os outros bispos e com o Papa. O apêndice acrescentado à Lumen Gentium a propósito do capítulo terceiro6 6 A Nota Explicativa Prévia fornece a chave para explicar e compreender o capítulo terceiro da Lumen Gentium. Ela pretende dissipar qualquer suspeita de deriva conciliarista na renovada doutrina da sacramentalidade do episcopado. O exercício da colegialidade encontra-se inteiramente subordinado ao chefe do colégio. Possuindo todo o poder, ele colabora com a colegialidade “segundo a sua própria discrição”. Como observa o Papa Francisco: “O fato de o Sínodo agir sempre cum Petro et sub Petro – por conseguinte, não só cum Petro, mas também sub Petro – não é uma restrição da liberdade, mas uma garantia da unidade” (2015). constituiu uma robusta e prudente resposta no sentido de se evitar qualquer possível mal-entendido: toda manifestação autêntica da sinodalidade requer o exercício do ministério colegial dos Bispos em comunhão com o Papa, e nunca independentemente dele. Mas agora, mais de meio século depois, parece claro que a Igreja se moveu na direção oposta à temida por Paulo VI, posto que a sinodalidade passou a ser eclipsada pela colegialidade e reduzida à assembleia de bispos reunida sob o Papa.

Essa mesma observação é feita no Vademecum para o Sínodo sobre a sinodalidade:

Um dos frutos do Concílio Vaticano II foi a instituição do Sínodo dos Bispos. Embora o Sínodo dos Bispos se tenha realizado até agora como uma reunião de bispos com e sob a autoridade do Papa, a Igreja apercebe-se cada vez mais de que a sinodalidade é o caminho para todo o Povo de Deus. Assim, o Processo Sinodal já não é apenas uma assembleia de bispos, mas um caminho para todos os fiéis, no qual cada Igreja local tem um papel integral a desempenhar. O Concílio Vaticano II revigorou a sensação de que todos os batizados, tanto a hierarquia como os leigos, são chamados a ser participantes ativos na missão salvífica da Igreja

(LG, n. 32-33) (Vademecum 1.3).

Frente a esse desafio, a história recente da Igreja mostra certa tendência ao minimalismo. Supunha-se que a colegialidade manifestar-se-ia à medida que as Conferências Episcopais nacionais e regionais fossem se implementando, o que possibilitaria às Igrejas locais maior expressão de suas identidades culturais, livrando-as de uma condição subordinada a Roma, que comprometeria sua particularidade. Mas, como afirma o Papa Francisco, isso “não se realizou plenamente [...]. Uma centralização excessiva, em vez de ajudar, complica a vida da Igreja e a sua dinâmica missionária” (EG, n. 32). Além disso, o ensinamento da LG n. 23 esclarece de forma inequívoca como deve ser a relação entre as Igrejas locais e a Igreja Universal, não permitindo que a catolicidade, entendida como unidade na diferença, seja confundida com uniformidade universal.

Ao passo que a sinodalidade pressupõe a participação e o envolvimento de todo o Povo de Deus na vida e missão da Igreja, a colegialidade se refere à forma específica de como essa mesma Igreja se articula através do exercício do ministério dos bispos cum et sub Petro. Daí, a insistência de Francisco em se voltar ao tema da sinodalidade. Do seu ponto de vista, a renovada consciência eclesial do Vaticano II permite-nos estabelecer que o conceito de sinodalidade é mais amplo do que o de colegialidade.

Em consonância com o ensinamento da Constituição Dogmática Lumen Gentium, o Papa Francisco afirma que “o caminho da sinodalidade é precisamente o caminho que Deus espera da Igreja do terceiro milênio” (2015). Ele nos apresenta a imagem de uma Igreja – como “uma pirâmide invertida”, em que o ápice permanece sob a base (SIMONELLI, 2019SIMONELLI, C. Memoriale del Futuro. Il ricorso alle fonti come principio dinamico. In: CODA, P.; REPOLE, R. (Org.). La sinodalità nella vita e nella missione della Chiesa. Commento a più voci al Documento della Commissione teologica internazionale. Bologna: EDB, 2019. p. 29–37., p. 35) – capaz de harmonizar todos os temas que ela compreende: Povo de Deus, Colégio Episcopal, Sucessor de Pedro. Como escreveu Cipriano de Cartago a seus presbíteros: “Nada sem o bispo, nada sem o vosso parecer, e sem o consenso do povo.”7 7 “Nihil sine episcopo, nihil sine consilio vestro et sine consensu plebis” (Epistola, 14, 4 apud COMISSÃO TEOLÓGICA INTERNACIONAL, 2018, n. 25). A ordem seguida por Cipriano reflete a ordem social romana que distinguia o povo em geral de quem pertencia a alguma ordem (ordines et plebs), mas ela não pretende introduzir um ordenamento (taxis) que diminua a atuação do laicato em relação à hierarquia eclesiástica. Ao contrário, o que se quer exprimir é a complementaridade dos atores envolvidos, de modo que ninguém pode ser Igreja sem os outros, nem jamais pode prescindir da contribuição dos demais. A imagem da pirâmide invertida não pretende abolir, portanto, a estrutura ministerial da Igreja, colocando os leigos acima dos sacerdotes numa espécie de clericalismo invertido. Antes, o que ela de fato pretende é reiterar a ideia de uma reciprocidade inalienável que necessita ser novamente apreciada (SIMONELLI, 2019SIMONELLI, C. Memoriale del Futuro. Il ricorso alle fonti come principio dinamico. In: CODA, P.; REPOLE, R. (Org.). La sinodalità nella vita e nella missione della Chiesa. Commento a più voci al Documento della Commissione teologica internazionale. Bologna: EDB, 2019. p. 29–37., p. 35).

Em Evangelii Gaudium, Francisco deu novo impulso à doutrina sobre o sentido da fé dos fiéis (sensus fidei fidelium) (EG, n. 119). Pelo fato de todos os membros da Igreja serem sujeitos ativos da evangelização e “discípulos missionários” (EG, n. 120), o caminho da sinodalidade é um pré-requisito indispensável para se infundir na Igreja um renovado impulso missionário. O Documento Preparatório faz uso da expressão “sujeitos ativos de evangelização” (DP, n. 12): o Povo de Deus, como portador dessa missão, não se limita a transmitir o Evangelho de modo deliberado, através de uma evangelização explícita em sentido estrito. Em um nível mais profundo, e não menos ativamente, ele evangeliza a partir da vivência de sua fé no mundo, naquela “ação comum a todos os fiéis, em favor da edificação do corpo de Cristo” (LG, n. 32). Leigas e leigos são a grande maioria do Povo de Deus. Há muito que aprender de sua participação nas várias expressões da comunidade eclesial: na piedade popular, em seu envolvimento na pastoral ordinária, em sua competência nos âmbitos da cultura, da vida comunitária e do tecido social (EG, n. 126).

Faz-se, portanto, necessário superar os obstáculos da falta de formação dos fiéis leigos e os efeitos deletérios de uma mentalidade clericalista que os relega a um papel subordinado. Desse modo, ampliariam-se os espaços nos quais eles poderiam partilhar a riqueza de sua experiência como discípulos e se afirmarem como evangelizadores. Como o papa Francisco insiste, antes de serem objetos de cuidado pastoral, leigas e leigos são sujeitos de evangelização. Precisamente por conta desse papel ativo, seu lugar institucional deve ser repensado frente a “um clericalismo excessivo que os mantêm à margem das decisões” (EG, n. 102).

A sinodalidade é o principal caminho para a Igreja de hoje, chamada a renovar-se mediante a escuta da Palavra de Deus e sob o impulso do Espírito Santo. A sinodalidade nos convida a levantar os olhos para o alto, desafiando nossa imaginação cristã a entrever um futuro diferente para a Igreja e suas instituições. Um futuro no qual seremos capazes de viver mais plenamente a missão que recebemos de Cristo. Em grande parte, tudo isso dependerá “da escolha de encetar processos de escuta, diálogo e discernimento comunitário, em que todos e cada um possam participar e contribuir” (DP, n. 9).

6 Encontro, escuta, diálogo

A responsabilidade compartilhada de todo o Povo de Deus na missão da Igreja requer que se iniciem processos de consulta que deem voz e facilitem a presença e a participação de leigos e leigas. Não se trata de “democratizar” a Igreja, pois a autoridade do Colégio Episcopal não depende de que os fiéis lhe deleguem autoridade. Trata-se antes de compreender o corpo eclesial como uma realidade diversificada pelos dons do Espírito em meio à pluralidade de sujeitos que nele se incorporam. Trata-se igualmente de aproveitar ao máximo os recursos de que a Igreja já dispõe para implementar estruturas de participação.

À luz de tudo isso, em Episcopalis Communio, o Papa expressa em forma de normas concretas cada um dos passos que delineiam o caminho de uma “Igreja constitutivamente sinodal”. Essa Constituição Apostólica constitui um progresso em relação ao Vaticano II: ao passo que se atribui ao Concílio uma tomada de consciência de todos aqueles que compõem a Igreja, e da diversidade de identidades ministeriais de cada um, o mais recente documento busca traduzir essas noções teóricas em ação. A pedra angular é a escuta: toda e qualquer iniciativa sinodal “começa ouvindo o Povo de Deus”, “continua escutando os pastores” e culmina na escuta do Bispo de Roma, incumbido de servir como “Pastor e Mestre de todos os cristãos” (FRANCISCO, 2015FRANCISCO, Papa. Discurso na comemoração do cinquentenário da instituição do Sínodo dos Bispos, 17 de outubro de 2015. Disponível em: https://www.vatican.va/content/francesco/pt/speeches/2015/october/documents/papa-francesco_20151017_50-anniversario-sinodo.html. Acesso em: 21 jan. 2022. [2015]
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).

Pressupondo que a colegialidade está a serviço da sinodalidade, o Papa afirma que “o Sínodo dos Bispos deve tornar-se cada vez mais um instrumento privilegiado de escuta do Povo de Deus” (EC, n. 6). E “embora na sua composição se configure como um organismo essencialmente episcopal” (EC, n. 6), ele não existe “separado do resto dos fiéis” (EC, n. 6). Muito pelo contrário, ele “é um instrumento adequado para dar voz a todo o Povo de Deus” (EC, n. 6). Por esta razão, é vital que, na preparação dos Sínodos, “receba especial atenção a consulta de todas as Igrejas particulares (EC, n. 7)”.

A essa consulta feita aos fiéis deve se seguir um “discernimento por parte dos pastores”. Atentos ao sensus fidei do Povo de Deus, os bispos devem saber distinguir os impulsos do Espírito “dos fluxos frequentemente mutáveis da opinião pública (EC, n. 7)”. O magistério pontifício que então emerge, normalmente sob a forma de Exortações Apostólicas pós-sinodais, deve ser expressão da escuta do que foi proposto e do discernimento do espírito que impeliu essas propostas, sem se deixar influenciar pela pressão da mídia ou opinião da maioria. No exercício do seu magistério, o Papa deve também avaliar se o processo foi realmente um discernimento ou apenas uma disputa. Se faltarem as condições necessárias para uma decisão, o Papa tem a responsabilidade de não prosseguir. Em vez disso, sem negar a validade potencial do que foi proposto, ele deve deixar a discussão aberta e encorajar a continuação das deliberações por parte de todos, prosseguindo-se o discernimento com ânimo constante (SPADARO, 2020SPADARO, A. “Querida Amazonia”: Commentary on Pope Francis’ Apostolic Exhortation. In: La Civiltà Cattolica, Rome, 12 Feb. 2020. Disponível em: https://www.laciviltacattolica.com/querida-amazonia-commentary-on-pope-francis-apostolic-exhortation/. Acesso em: 20 jan. 2022.
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).

O processo sinodal como um todo é uma experiência de discernimento pessoal e comunitário que visa peneirar tudo o que lhe é oferecido para apreender a revelação de Deus que se dá pela mediação da história (Vadmecum 1.3). Não é “um exercício estratégico corporativo” (Vademecum 2.4), próprio de qualquer tomada de decisão em comum. “Antes de tudo, [é] um processo espiritual” (Vademecum 2.2), cujo fundamento repousa na convicção de que Deus age no mundo e de que somos chamados a apreender as pistas do porvir que se manifestam no presente, “os sinais dos tempos”. O momento presente é o lugar (locus) teológico-chave, no qual podemos nos engajar como comunidade que se empenha em ler a história à luz da Palavra de Deus, buscando compreender, a partir das intuições que emergem de toda a humanidade, aquilo que o Espírito está pedindo à Igreja de hoje. Por tudo isso, somos movidos a discernir as expressões e as ideias, os caminhos e as escolhas, que nos permitirão testemunhar com maior eficácia a alegria do Evangelho (CODA, 2019CODA, P. Il cammino della Chiesa del Terzo Millennio. In: CODA, P.; REPOLE, R. (Org.). La sinodalità nella vita e nella missione della Chiesa. Commento a più voci al Documento della Commissione teologica internazionale. Bologna: EDB, 2019. p. 9–18., p. 10).

O discernimento pretende nos ajudar a “construir comunidades florescentes e resilientes para a missão da Igreja de hoje” (Vademecum 2.2). Tanto a escuta quanto a participação são ferramentas necessárias para a realização dessa tarefa. Um tal clima de escuta e de diálogo permitirá aos fiéis exprimir a sua percepção comum (consensus fidelium). Com efeito, o consensus fidelium é uma condição para o exercício do sensus fidei, que traduz, no sentido vivo da Igreja (sensus ecclesiae), o que o Povo de Deus percebe do testemunho autêntico da Tradição.

De acordo com o Cardeal Newman (1859)NEWMAN, J. H. On Consulting the Faithful in Matters of Doctrine. The Rambler. New Series, London, v. 1, p. 198–230, jul. 1859., esse instinto eclesial para a comunhão foi o que tornou a contribuição dos leigos tão decisiva na controvérsia ariana e em várias disputas medievais. Trata-se de uma experiência de ser guiado por Deus como comunidade, que não pode ser resumida a um processo deliberativo possibilitado pela convergência de várias vontades, ou a um juízo resultante da soma de opiniões e da vontade de estar de acordo. Em outras palavras, ele “não se fundamenta numa simples unanimidade, ao contrário, é a unanimidade que torna manifesta a ação do Espírito, que garante a infalibilidade” (PIÉ-NINOT, 2002PIÉ-NINOT, S. La teologia fondamentale: “rendere ragione della speranza” (1Pt 3,15). Brescia: Queriniana, 2002. (Biblioteca di teologia contemporanea, 121)., p. 602).

Em seu discurso no 50º aniversário do Sínodo dos Bispos, o Papa Francisco citou aquela famosa afirmação de João Crisóstomo: “Igreja e Sínodo são sinônimos” (Explicatio in Psalmos, 149). O contexto litúrgico a que se refere o Arcebispo de Constantinopla põe em evidência como a convergência num sentimento comum dos fiéis (omonoía) é orientada para a caridade operante e o testemunho. A antiga prática sinodal não deve limitar-se à resolução de conflitos doutrinários, nem ser entendida como algo excepcional. Ela deve ser antes apreciada em sua forma mais original, como uma participação que surge tanto da expressão da liturgia como da prática disciplinar e deliberativa (RUGGIERI, 2007RUGGIERI, G. I sinodi fra storia e teologia. In: BATOCCHIO, R.; NOCETI, S. (Org.). Chiesa e sinodalità. Coscienza, forme, processi. Milano: Glossa, 2007. p. 129–161.). É um critério indispensável de discernimento para toda a vida da Igreja.

Para que floresça uma verdadeira discussão, deve nos mover uma ânsia de levantarmos questões que vão além da apatia e da indiferença de uma razão que se rendeu, o que é ainda pior do que uma razão excessivamente cautelosa e, por isso mesmo, ineficaz. Devemos adotar uma postura de diálogo que nos leve a buscar juntos a verdade, sem pretensão alguma de dominá-la, sem nos separarmos em categorias de opinião, sem nos escondermos com ressentimento atrás das muralhas de identidades pré-estabelecidas.

O coração da experiência sinodal reside em escutar a Deus mediante a escuta de uns aos outros. Nós lutamos para nos ouvir uns aos outros, abrindo nossas mentes e corações e os libertando dos preconceitos e pré-julgamentos que surgem da ignorância e de hábitos que com frequência geram divisão. Somos chamados a deixar de lado atitudes complacentes e de conveniência que nos levam a tomar decisões tão somente porque as coisas sempre foram feitas assim. A fase diocesana do Sínodo deve começar identificando aquelas formas eficazes que nos possibilitem a maior participação possível, sem excluir novos pontos de vista, escutando “a voz de outras pessoas do seu contexto local, incluindo pessoas que abandonam a prática da fé, pessoas de outras tradições de fé, pessoas sem crença religiosa etc.” (Vademecum 2.1). Devemos pessoalmente chegar às periferias – aos pobres, aos refugiados, aos excluídos, aos que não têm voz, garantindo-se “a inclusão das pessoas marginalizadas ou que se sentem excluídas” (Vademecum 1.4). Devemos ter a coragem de dialogar com a ciência, a arte, a economia, a mídia e o mundo secular em geral, ultrapassando as fronteiras visíveis da comunidade católica e aprofundando nosso conhecimento nos tesouros da sabedoria de outras tradições cristãs e religiões (Vademecum 2.4). Só assim estaremos prontos para “servir o diálogo de Deus com a humanidade (cf. DV, n. 2) e caminhar juntos pelo Reino de Deus (cf. LG, n. 9; RM, n. 20)” (Vademecum 1.3).

Não se faz discernimento sobre o ideal, nem mesmo sobre ideais de reforma, mas sempre sobre algo real – histórias reais, problemas reais, a história real e concreta da Igreja – porque a realidade é sempre maior e mais importante do que as ideias (EG, n. 231-233).

Concluindo. A sinodalidade ao alcance

Como comunhão (communio) que se origina do mistério da Trindade, a Igreja se manifesta e se realiza quando se reúne como “Povo de Deus” que caminha junto. Poderíamos assim afirmar que a sinodalidade é a forma através da qual a vocação original e a missão intrínseca da Igreja se desdobram ao longo da história. A Igreja tem como tarefa reunir todos os povos da Terra, de todos os tempos e épocas, para que participem da salvação de Cristo e de sua alegria. A Igreja se encontra num caminho de transformação cultural e institucional. Como São João XXIII disse pouco antes de morrer, em 24 de maio de 1963: “Não é que o Evangelho tenha mudado, nós é que começamos a compreendê-lo melhor”8 8 Dito na presença dos Cardeais Amleto Cigognani e Angelo Dell’Acqua (apud HEBBLETHWAITE, 1985, p. 499). .

Essa progressão de nossa compreensão da Revelação delineia com precisão a ideia de Tradição que nos foi legada pela Dei Verbum 8. Não mais reduzida a um magistério doutrinal imutável, transmitido de geração em geração, a tradição da Igreja (traditio ecclesiae) compreende suas instituições, sua liturgia e toda a vida cristã num contínuo desenvolvimento. A Igreja como um todo, e não apenas a hierarquia, é tida como protagonista nesse crescimento da compreensão do Evangelho. Na variedade e irredutibilidade de seus respectivos carismas, todos os batizados são sujeitos ativos da Tradição.

Como sujeito ativo da Tradição, o Povo de Deus pode descobrir, em seu encontro com a Palavra de Deus, que certas coisas que pareciam antigas são na verdade bem novas; enquanto outras, consideradas novidades perigosas, são ao contrário formas tradicionais de sabedoria milenar. Aqueles que presumem que o Sínodo sobre a sinodalidade é um recipiente vazio no qual tudo pode ser versado talvez devam essa concepção equivocada por pensarem que a comunhão é mais bem compreendida como subordinação. É necessária uma renovação desse modo de pensar. A comunhão, entendida como subordinação de facto, elimina a diversidade e a dignidade daqueles que fazem a Igreja, embora possa ser bem mais simples resolver os problemas do dia a dia com aquele dizer autorreferencial: “quem discorda pode ir para outro lugar!”. Esse modo de pensar é tão inútil quanto a afirmação de que não é necessário nada mais para a reforma da Igreja senão um forte apelo a mais santidade, maior rigor e mais estrita disciplina canônica. As conversões pessoais, no entanto, jamais bastarão para a resolução de uma crise que é de estrutura. A Igreja é bem mais do que a soma de seus indivíduos. É preciso avançarmos juntos.

Somente em permanente reverência diante da Palavra de Deus, em escuta renovada, em escuta mútua, em escuta inclusiva, o exercício da autoridade se tornará outra vez espaço aberto ao mistério de Deus feito homem. Não se trata de subestimar o quão exigente é viver a sinodalidade como um modo de exercer a autoridade, como uma cultura de se tomar decisões mediadas pelo consenso, permitindo que todas as vozes sejam ouvidas; tudo isso é muito mais árduo do que impor decisões de cima para baixo.

Estar à escuta do consensus fidei é, portanto, uma atitude, um ethos, que não se improvisa de repente, pois é algo que só pode ser aperfeiçoado com o tempo, por meio de relações concretas. Podemos afirmar, com a encíclica Fratelli tutti, que a fraternidade é o fundamento e a meta daquela transformação da Igreja tão desejada por Francisco. Desde o início, a “fraternidade” se tornou para a Igreja um nome próprio; sempre com a consciência de que não se trata de um igualitarismo abstrato, mas de uma igual dignidade enriquecida por aquela diversidade de dons espirituais e de ministérios (1Cor 12, 4-6) (RATZINGER, 1966RATZINGER, J. The Meaning Of Christian Brotherhood. San Francisco: Ignatius Press, 1966.) 9 9 Publicado originalmente em 1960: Die christliche Brüderlichkeit. .

Estamos ainda num tempo de aprendizagem do que significa viver a sinodalidade. Em tempos assim, os caminhos e as formas de comunhão não nos são de imediato evidentes. Teremos de aprender a conviver com a complexidade e as incertezas do presente, e a nos aventurar com boa dose de ousadia e criatividade, o que pressupõe uma atualização da estrutura jurídica da Igreja. Apesar da atualização do Código de Direito Canônico para a Igreja Latina, de 1983, a atual estrutura hierárquica e centralizada da Igreja não se alinha inteiramente com os princípios do último Concílio, de uma teologia da comunhão. Não raramente essa estrutura é confundida com a própria essência do catolicismo. Há, portanto, uma lacuna entre as reflexões teológicas sobre a sinodalidade e a atual configuração das normas canônicas a respeito dos organismos sinodais.

Sem uma reforma adequada do atual Código, ainda marcado por uma eclesiologia pré-conciliar, a sinodalidade corre o risco de ser reduzida a uma expressão não essencial de esperanças e desejos que, em última análise, não afetam em nada a realidade da vida eclesial (DIANICH, 2018DIANICH, S. Riforma della Chiesa e ordinamento canonico. Bologna: EDB, 2018.). Bastam-nos dois exemplos de tal inadequação: exatamente como no Código de 1917, o atual Código consagra apenas um cânone genérico e positivo sobre os leigos e continua a estipular que o bispo exerce sua autoridade sem ter de prestar contas a ninguém, a não ser ao Papa. Não se trata simplesmente de tentar integrar os leigos nos organismos eclesiais existentes, criando para eles mais espaços e formas mais abrangentes de atuação. Trata-se de transformar as relações e as estruturas de governo, de modo a reconhecer a contribuição indispensável dos leigos e assim permitir uma participação real de todos.

O Documento Preparatório indica-nos três objetivos para o Sínodo sobre a sinodalidade: viver a comunhão, aumentar a participação e relançar a missão (DP, n. 1). Sem a contribuição dos leigos e leigas, a comunhão não se orientará de modo adequado para a missão, pois não terá sido moldada pelas realidades concretas da vida no mundo, de maneira que a tarefa confiada aos bispos de salvaguardar a fé se assemelhará mais a uma espécie de conservação museológica de relíquias da tradição. Sem a comunhão com os bispos, a missão dos leigos corre o risco de ser influenciada por alguma ideologia, restando-lhe pouco para se assemelhar com qualquer outra iniciativa filantrópica com fins caritativos. Por fim, sem a participação de todo o Povo de Deus em comunhão hierárquica com o Bispo de Roma, a missão derivará numa aplicação de princípios abstratos com o intuito de uniformizar o processo de evangelização, evitando-se, com isso, o imperativo de traduzir o Evangelho para cada contexto.

A sinodalidade começa assim, com a conversão. Esta conversão é, de fato, um ato radical de governo, única garantia real de que a estrutura institucional da Igreja será capaz de autenticamente empreender o caminho sinodal da comunhão.

“Se cada um permanece[r] fechado nas próprias convicções, na própria experiência, na carapaça apenas do seu sentir e pensar” (FRANCISCO, 2021FRANCISCO, Papa. À Cúria Romana, por ocasião da apresentação das felicitações de Natal, 23 de dezembro de 2021. Disponível em: https://www.vatican.va/content/francesco/pt/speeches/2021/december/documents/20211223-curiaromana.html. Acesso em: 22 jan. 2022. [2021b]
https://www.vatican.va/content/francesco...
b), disse o Santo Padre à Cúria Romana pouco antes do Natal de 2021, será

difícil dar espaço àquela experiência do Espírito que – como diz o Apóstolo – está ligada à convicção de sermos filhos de “um só Deus e Pai de todos, que reina sobre todos, age por todos e permanece em todos” (Ef 4,6) [...]. O Sínodo procura ser a experiência de nos sentirmos, todos, membros de um conjunto maior – o Santo Povo fiel de Deus – e, por conseguinte, discípulos que escutam e, precisamente em virtude desta escuta, podem também compreender a vontade de Deus, que sempre se manifesta de maneira imprevisível [...]. A sinodalidade é um estilo, ao qual, os primeiros a converter-se, devemos ser nós

(FRANCISCO, 2021FRANCISCO, Papa. Discurso para o início do percurso sinodal, 9 de outubro de 2021. Disponível em: https://www.vatican.va/content/francesco/pt/speeches/2021/october/documents/20211009-apertura-camminosinodale.html. Acesso em: 21 jan. 2022 [2021a]
https://www.vatican.va/content/francesco...
b).

Siglas

  • can.  cânon(es)
  • DP  Documento Preparatório do Sínodo sobre a Sinodalidade
  • DV  Constituição dogmática Dei Verbum
  • EC  Constituição apostólica Episcopalis Communio
  • EG  Exortação Apostólica Evangelii Gaudium
  • FT  Encíclica Fratelli Tutti
  • LG  Constituição dogmática Lumen Gentium
  • SC  Constituição dogmática Sacrosanctum Concilium
  • Vademecum  Vademecum para o Sínodo sobre a Sinodalidade
  • 1
    A este respeito, confira-se a obra conjunta de Michael Czerny e Christian Barone (2021)CZERNY, M.; BARONE, C. Fraternità — segno dei tempi: Il magistero sociale di Papa Francesco. Città del Vaticano: Libreria Editrice Vaticana, 2021.. Ela oferece uma síntese do magistério do Papa Francisco em continuidade com os pronunciamentos do Concílio Vaticano II e reivindica a fraternidade e a sororidade universais como um “sinal dos tempos” para os dias de hoje, ao modo de uma visão renovada para a humanidade atual, incluindo as várias tradições religiosas que caminham juntas e unem forças para a construção de um mundo mais justo e unido. Com prazer reconheço que a valiosa pesquisa e os escritos do Rev. Prof. Christian Barone formam a base deste artigo.
  • 2
    Original em itálico.
  • 3
    Esta intenção dos Padres conciliares pode também ser deduzida da própria ordem em que o documento foi subdividido: o capítulo dedicado ao “Povo de Deus” (capítulo 2) precede o capítulo sobre “A Constituição Hierárquica da Igreja” (capítulo 3), dando assim a ideia de que a hierarquia eclesiástica desempenha um papel de serviço à totalidade da Igreja, não sendo outro seu propósito ou finalidade. “O todo é superior à parte.” (EG, n. 234-37).
  • 4
    Por exemplo, em Ineffabilis Deus, Pio XII empenhou sua autoridade ao definir o dogma da Imaculada Conceição apelando ao sentimento comum dos fiéis (singularis conspiratio antistitum et fidelium), como voz autêntica da tradição (SARTORI, 1979SARTORI, L. Religiosità popolare e teologia. Indicazioni per una fondazione teologica. In: ISTITUTO DI LITURGIA PASTORALE S. GIUSTINA (Org.). Ricerche sulla religiosità popolare. Nella Bibbia, nella liturgia, nella pastorale. Bologna: EDB, 1979. p. 21–54.).
  • 5
    Segundo alguns estudiosos, o Concílio não esclareceu o suficiente como se deve articular a relação entre o collegium episcoporum e a communio ecclesiarum. O resultado disso é uma concepção da colegialidade cada vez mais rígida e difícil de ser colocada em prática, terminando por reintroduzir o modelo centralizado adotado pela Igreja Católica após o Vaticano I (LEGRAND, 2001LEGRAND, H. Les évêques, les Églises locales et l’Église entière. Évolutions institutionnelles depuis Vatican II et chantiers actuels de recherche. Revue des sciences philosophiques et théologiques, Paris, v. 85, n. 3, p. 461–509, 2001. Disponível em: https://doi.org/10.3917/rspt.853.0461. Acesso em: 20 jan. 2022.
    https://doi.org/10.3917/rspt.853.0461...
    , p. 210-211).
  • 6
    A Nota Explicativa Prévia fornece a chave para explicar e compreender o capítulo terceiro da Lumen Gentium. Ela pretende dissipar qualquer suspeita de deriva conciliarista na renovada doutrina da sacramentalidade do episcopado. O exercício da colegialidade encontra-se inteiramente subordinado ao chefe do colégio. Possuindo todo o poder, ele colabora com a colegialidade “segundo a sua própria discrição”. Como observa o Papa Francisco: “O fato de o Sínodo agir sempre cum Petro et sub Petro – por conseguinte, não só cum Petro, mas também sub Petro – não é uma restrição da liberdade, mas uma garantia da unidade” (2015).
  • 7
    Nihil sine episcopo, nihil sine consilio vestro et sine consensu plebis” (Epistola, 14, 4 apud COMISSÃO TEOLÓGICA INTERNACIONAL, 2018COMISSÃO TEOLÓGICA INTERNACIONAL. A sinodalidade na vida e na missão da Igreja, 2 de março de 2018. Disponível em: https://www.vatican.va/roman_curia/congregations/cfaith/cti_documents/rc_cti_20180302_sinodalita_po.html. Acesso em: 24 jan. 2022.
    https://www.vatican.va/roman_curia/congr...
    , n. 25).
  • 8
    Dito na presença dos Cardeais Amleto Cigognani e Angelo Dell’Acqua (apud HEBBLETHWAITE, 1985HEBBLETHWAITE, P. Pope John XXIII: Shepherd of the Modern World. Garden City, N.Y: Doubleday, 1985., p. 499).
  • 9
    Publicado originalmente em 1960: Die christliche Brüderlichkeit.
  • Tradução do original (inglês): Moisés Nonato Quintela Ponte SJ.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Jun 2022
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2022

Histórico

  • Recebido
    17 Fev 2022
  • Aceito
    10 Abr 2022
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