PERFIL DOS PACIENTES ATENDIDOS EM UMA UNIDADE DE TRATAMENTO INTEGRAL DE FERIDA

RESUMO

Objetivo:

analisar os perfis demográfico, clínico e terapêutico dos pacientes atendidos em uma Unidade de Tratamento Integral de Ferida.

Método:

estudo quantitativo, retrospectivo, que analisou relatórios gerenciais e prontuários de pacientes com feridas crônicas atendidos em uma Unidade de Tratamento Integral de Ferida, em Vitória da Conquista-Bahia, Brasil. Os dados, coletados em fevereiro de 2020, foram submetidos a análises descritiva e inferencial e, para a associação entre variáveis, foi utilizado o teste Qui-quadrado com valor de p<0,05.

Resultados:

dentre os 176 pacientes, média de idade de 71,4 anos (DP±16,5). Houve associação estatística entre incontinência fecal e Lesão por pressão estágio dois (p=0,018); Diabetes Mellitus e Lesão por pressão estágio três (p<0,001); Alzheimer e lesão por dispositivo médico (p=0,028); Diabetes Mellitus e Úlcera Diabética (p<0.001); insuficiência vascular e Úlcera Venosa (p<0.001).

Conclusão:

o conhecimento dos perfis propicia a fundamentação da assistência integral prestada por uma unidade especializada, não hospitalar, em feridas.

DESCRITORES
Lesão por Pressão; Úlcera; Assistência Hospitalar; Assistência Ambulatorial; Assistência Domiciliar

ABSTRACT

Objective:

to analyze the demographic, clinical and therapeutic profiles of the patients treated in a Comprehensive Wound Care Unit.

Method:

a quantitative and retrospective study that analyzed management reports and medical records of patients with chronic wounds treated at a Comprehensive Wound Care Unit in Vitória da Conquista-Bahia, Brazil. The data, collected in February 2020, were submitted to descriptive and inferential analysis, and the Chi-square test with p-value<0.05 was used for the association between variables.

Results:

the mean age among the 176 patients was 71.4 years old (SD±16.5). There was a statistical association between fecal incontinence and stage two Pressure Injury (p=0.018); Diabetes Mellitus and stage three Pressure Injury (p<0.001); Alzheimer’s disease and medical device-related injury (p=0.028); Diabetes Mellitus and Diabetic Ulcer (p<0.001); and between vascular insufficiency and Venous Ulcer (p<0.001).

Conclusion:

knowledge about the profiles provides the basis for the comprehensive assistance provided by a non-hospital unit specialized in wounds.

DESCRIPTORS:
Pressure Injury; Ulcer; In-hospital Care; Outpatient Care; Home Care.

RESUMEN

Objetivo:

analizar los perfiles demográfico, clínico y terapéutico de los pacientes atendidos en una Unidad de Tratamiento Integral de Heridas.

Método:

estudio cuantitativo y retrospectivo, que analizó informes gerenciales e historias clínicas de pacientes con heridas crónicas atendidos en una Unidad de Tratamiento Integral de Heridas de Vitória da Conquista-Bahía, Brasil. Los datos, recolectados en febrero de 2020, fueron sometidos a análisis descriptivo e inferencial, y la prueba de chi-cuadrado con valor p<0,05 se utilizó para la asociación entre variables.

Resultados:

entre los 176 pacientes, la media de edad fue de 71,4 años (DE±16,5). Se registraron asociaciones estadísticas entre incontinencia fecal y Lesión por Presión en etapa dos (p=0,018); Diabetes Mellitus y Lesión por Presión en etapa tres (p<0.001); Mal de Alzheimer y lesiones a raíz dispositivos médicos (p=0,028); Diabetes Mellitus y Úlcera Diabética (p<0,001); y entre insuficiencia vascular y úlcera venosa (p<0,001).

Conclusión:

conocer los perfiles favorece la fundamentación de la atención integral provista por una unidad no hospitalaria especializada en heridas.

DESCRIPTORES
Lesión por Presión; Úlcera; Atención Hospitalaria; Atención Ambulatoria; Atención Domiciliaria

INTRODUÇÃO

A pele é o maior órgão humano e, por isso, está mais exposta a danos como a ocorrência de feridas. Define-se como ferida qualquer ruptura ou lesão da estrutura e função anatômicas, podendo ser classificada como aguda (epitelizada nas fases normais de cicatrização, com sinais bem definidos de cicatrização em quatro semanas) ou crônica (não progride normalmente nos estágios de cicatrização, o qual não ocorre em quatro semanas)¹.

A lesão por pressão (LPP) é uma ferida crônica que consiste em anormalidade na pele ou tecido, que pode desenvolver uma úlcera. Ocorre por diversos fatores, geralmente associados, como fricção, cisalhamento, pressão em proeminência óssea, umidade, nutrição, perfusão comprometida e presença de dispositivos médicos². O número de pacientes com LPP vem aumentando e tem sido relacionado ao envelhecimento populacional e ao advento das novas tecnologias que favorecem a sobrevida de pacientes com doenças graves, mas torna-os cronicamente dependentes³. Neste sentido, estudo finlandês demonstrou relação estatística significante entre o aparecimento de LPP em idosos submetidos a tratamentos e internações prolongadas⁴.

Estima-se, para 2030, que o número de indivíduos acima de 65 anos com diabetes mellitus (DM) será em torno de 195,2 milhões, podendo atingir 276,2 milhões em 2045. Entre as complicações causadas pela DM, destacam-se a retinopatia, doenças renais, doenças arteriais e venosas periféricas, neuropatia periférica (resultando em ulceração do pé, que pode evoluir para infecção/osteomelite e, por vezes, resultar em amputação)⁵.

As úlceras venosas (UVen) são as lesões crônicas mais presentes nos membros inferiores e também estão associadas ao envelhecimento populacional, ao aumento da taxa de obesidade, DM e hipertensão arterial (HA). O National Health Service (NHS) declarou que as UVen afetam cerca de uma em 500 pessoas no Reino Unido, sendo mais prevalentes em idosos⁶.

As feridas crônicas podem ser resultantes de doenças vasculares, DM, HA, dificuldade ou imobilidade física, entre outros fatores⁷. Geram altos custos para as instituições de saúde por requererem diferentes modalidades assistenciais (domiciliar, ambulatorial ou hospitalar) e a utilização de terapias complexas⁸. Causam prejuízos à autoimagem, comprometem a realização de atividades diárias e a qualidade de vida dos portadores⁹.

Frente às repercussões das feridas crônicas, entende-se que analisar os perfis dos pacientes auxilia no processo de organização, planejamento e tomada de decisão terapêutica dos profissionais de saúde. A partir deles, realiza-se o diagnóstico situacional que possibilitará aos gestores construir e fundamentar modelos assistenciais apropriados, visando melhorar a qualidade assistencial e de vida dos pacientes e diminuir o ônus financeiro às instituições de saúde¹⁰. Nesta perspectiva, o presente estudo objetivou analisar os perfis demográfico, clínico e terapêutico dos pacientes atendidos em uma Unidade de Tratamento Integral de Ferida (UTIF).

MÉTODO

Estudo quantitativo, exploratório-descritivo, retrospectivo, conduzido em uma UTIF localizada em Vitória da Conquista-BA, Brasil, que presta assistência multidisciplinar, nas modalidades ambulatorial (em sede própria), hospitalar (em três hospitais conveniados: A - filantrópico, B e C - privados) e domiciliar.

A equipe multidisciplinar de saúde é composta por quatro enfermeiros (uma coordenadora; um assistencial para atendimento ambulatorial e no hospital B, e dois para os atendimentos nos hospitais A e C); técnico de enfermagem - TE (exclusivo para os atendimentos domiciliares sob supervisão da coordenadora de enfermagem); quatro médicos (dermatologista, intensivista, ortopedista e psiquiatra), para os atendimentos ambulatoriais, e nutricionista (atendimento ambulatorial).

A assistência interdisciplinar ambulatorial e hospitalar ocorre de segunda a sexta-feira (08-18h); os enfermeiros realizam atendimentos hospitalares complementares aos finais de semana (07-12h); e a assistência domiciliar de segunda a sexta-feira (07-19h) e aos finais de semana (07h-13h). Em 2019, a UTIF realizou 13.247 procedimentos, resultantes de 5.241 atendimentos, financiados por cinco operadoras de planos de saúde (OPS), por pacientes particulares e pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

Quanto ao procedimento de coleta de dados, inicialmente, foram definidas as variáveis independentes (sexo, idade, etiologia da ferida e modalidade assistencial - ambulatório, hospital ou domicílio) e dependente (quantitativo de procedimentos realizados na assistência integral da UTIF).

Foram incluídos no estudo 176 prontuários de pacientes com mais de 18 anos com LPP, úlcera diabética (UD) e/ou úlcera vasculogênica (UV), assistidos pela UTIF em 2019. Excluíram-se os prontuários de pacientes com feridas agudas e/ou com preenchimento incompleto. Em fevereiro de 2020, procedeu-se a coleta de dados constantes de relatórios gerenciais (emitidos pelo sistema de informação da UTIF, que contempla a documentação da Sistematização da Assistência de Enfermagem - SAE; prescrição e evolução médica e orientações de alta e de encaminhamento); e dos prontuários.

A coleta de dados foi conduzida por um dos autores com a colaboração de sete estagiários de enfermagem e um de medicina previamente treinados e devidamente supervisionados. Devido à grande quantidade de documentos a serem analisados, as informações quanto aos perfis clínico e terapêutico foram limitadas ao primeiro dia de atendimento do paciente na UTIF.

Para o perfil demográfico, considerou-se as variáveis sexo, idade, modalidade assistencial, cidade de origem e forma de pagamento; para o perfil clínico, comorbidades, hábitos (etilismo, tabagismo), tipo (LPP, UD e/ou UV) e tamanhos das feridas e dos curativos (padronizados na UTIF como pequeno [5x5cm], médio [entre 5,1x5,1cm e 10x10cm] e grande [superior a 10,1x10,1cm]); e para o perfil terapêutico: tipos de coberturas primárias e secundárias utilizadas.

Os dados obtidos foram transportados para planilhas eletrônicas, por meio de digitação dupla independente, e submetidos a análises descritiva e inferencial. Para a associação entre variáveis, utilizou-se o teste Qui-quadrado com valor de p<0,05 (estatisticamente significante).

Após anuência da Diretoria da UTIF, o estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Instituição proponente sob o parecer nº 3.781.012.

RESULTADOS

Em 2019, ano típico de funcionamento da UTIF, verificou-se que as modalidades assistenciais mais representativas foram a hospitalar 93 (52,8%) e ambulatorial 57 (32,4%). Dentre os 176 pacientes atendidos, 89 (50,6%) eram do sexo feminino, com média de idade de 71,4 anos (DP±16,5). Na faixa etária 71-90 anos predominaram as LPP em 54 pacientes (30,7%) e UV em 14 pacientes (7,9%); na faixa etária 51-70 anos prevaleceram as UD em 24 pacientes (13,6%).

A maioria dos pacientes 142 pacientes (80,7%) era proveniente de Vitória da Conquista, e as formas de pagamento à assistência prestada pela UTIF corresponderam aos convênios particulares 142 (80,7%) e ao financiamento com recursos próprios (29-16,4%).

As doenças de base mais representativas foram HA 118 (67%), DM 102 (58%), cardiopatia 24 (13,6%) e insuficiência vascular - IV 18 (10,2%); 96,5% apresentaram alguma doença de base, destes, 77 (66,3%) possuíam duas ou mais doenças e 170 (65,9%) tinham HA e DM. Houve associação estatística significante entre incontinência fecal e LPP estágio dois (p=0,018); DM e LPP estágio três (p<0,001); Alzheimer e lesão por dispositivo médico (p=0,028); DM e UD (p<0.001) e IV com úlcera venosa - UVen (p<0.001).

Conforme a Tabela 1, as LPP predominaram nas três modalidades 146 (66,4%); a LPP estágio dois (LPP_2) apresentou o maior quantitativo 58 (39,7%), seguida da LPP_3 32 (21,9%); dentre as UV, as UVen prevaleceram 21 (70,0%). As LPP_2 (p=0,002), Úlceras Diabéticas - UD (p=0,043), UVen (p=0,013) e Úlceras Mistas - UM (p=0,005) apresentaram associação estatisticamente significante com o local de atendimento.

Tabela 1
Distribuição dos tipos de feridas crônicas levantadas na UTIF, por local de atendimento, no período de janeiro a dezembro de 2019. Vitória da Conquista, BA, Brasil, 2020

Local de atendimento	A		D		H		Total		p value
Tipo de ferida crônica	n	%	n	%	n	%	n	%
LPP_1	3	13,6	5	22,7	14	63,6	22	15,1	0,113
LPP_2	7	12,1	11	19	40	69	58	39,7	0,002
LPP_3	7	21,9	5	15,6	20	62,5	32	21,9	0,479
LPP_4	2	14,3	2	14,3	10	71,4	14	9,6	0,363
LPP_NC	4	23,5	1	5,9	12	70,6	17	11,6	0,393
LPP_TP	2	100	0	0	0	0	2	1,4	0,352
LPP_ DM	0	0	0	0	1	100	1	0,7	0,638
Total LPP	25	17,1	24	16,4	97	66,4	146	66,4	≤0,001
Total UD	20	45,5	3	6,8	21	47,7	44	20	0,043
UA	2	66,7	0	0	1	33,3	3	10	0,411
UVen	12	57,1	3	14,3	6	28,6	21	70	0,013
UM	6	100	0	0	0	0	6	20	0,005
Total UV	20	66,7	3	10	7	23,3	30	13,6	0,082
Total de Lesões	65	29,5	30	13,6	125	56,8	220	100	≤0,001

A= Ambulatório; D= Domicílios; H= Hospitais; LPP= Lesão por Pressão; LPP_NC= Lesão por Pressão Não Classificável; LPP_TP= Lesão por Pressão Tissular Profunda; UD= Úlcera Diabética; UA= Úlcera Arterial; UVen= Úlcera Venosa; UM= Úlcera Mista.Fonte: Autores (2020).

Foram documentadas 220 feridas crônicas, variando de uma a cinco, com média de 1,25(DP±0,7) feridas/paciente; 29 (16,5%) pacientes apresentaram mais de uma ferida. As LPP foram mais presentes na região sacral 59 (40,4%) e trocantérica 36 (24,7%) e as UD nos pés 32 (72,7%) e pernas 12 (27,3%).

Conforme a Tabela 2, as feridas e curativos de tamanho pequeno prevaleceram nas três modalidades assistenciais; 70 corresponderam às LPP, 27 às UD e 10 às UV; dentre as 76 (34,5%) de tamanho médio (curativos médios), houve maior representação das LPP 49 (64,5%), seguidas das UD 14 (18,4%) e UV 13 (17,1%). O menor quantitativo correspondeu às feridas e curativos de tamanho grande 37 (16,8%), sendo 27 LPP, sete UV e três UD.

Tabela 2
Distribuição dos tipos de feridas crônicas levantadas na UTIF, segundo o tamanho do curativo, no período de janeiro a dezembro de 2019. Vitoria da Conquista, BA, Brasil, 2020

Curativo	Pequeno						Médio						Grande						Total
Locais Ferida crônica	A		H		D		A		H		D		A		H		D		A		H		D
	n	%	n	%	n	%	n	%	n	%	n	%	n	%	n		n	%	n	%	n	%	n	%
LPP_1	3	27,3	12	25	3	27,3	0	0	1	3,1	2	25	0	0	1	5,9	0	0	3	12	14	14,4	5	20,8
LPP_2	4	26,7	16	33,3	5	45,5	3	33,3	19	59,4	5	1	0	0	6	35,3	0	0	7	28	41	42,3	10	41,7
LPP_3	3	27,3	9	18,8	1	9,1	2	22,2	9	28,1	0	0	2	40	2	11,8	5	100	7	28	20	20,6	6	25
LPP_4	0	0	1	2,1	2	18,2	2	22,2	2	6,3	0	0	0	0	7	41,2	0	0	2	8	10	10,3	2	8,3
LPP_NC	1	9,1	9	18,8	0	0	0	0	1	3,1	1	12,5	3	60	1	5,9	0	0	4	16	11	11,3	1	4,2
LPP_TP	0	0	0	0	0	0	2	22,2	0	0	0	0	0	0	0	0	0	0	2	8	0	0	0	0
LPP_DM	0	0	1	2,1	0	0	0	0	0	0	0	0	0	0	0	0	0	0	0	0	1	1	0	0
Total LPP	11	34,4	48	77,4	11	84,6	9	39,1	32	74,4	8	80	5	50	17	85	5	71,4	25	17	97	66	24	16
Total UD	15	46,9	11	17,7	1	7,7	5	21,7	7	16,3	2	20	0	0	3	15	0	0	20	45	21	48	3	7
UA	2	33,3	0	0	0	0	0	0	1	25	0	0	0	0	0	0	0	0	2	10	1	14,3	0	0
UVen	3	50	3	100	1	100	5	55,6	3	75	0	0	4	80	0	0	2	100	12	60	6	85,7	3	100
UM	1	16,7	0	0	0	0	4	44,4	0	0	0	0	1	20	0	0	0	0	6	30	0	0	0	0
Total UV	6	18,8	3	4,8	1	7,7	9	39,1	4	9,3	0	0	5	50	0	0	2	28,6	20	66,7	7	23,3	3	10
Total de feridas	32	29,9	62	57,9	13	12,1	23	30,3	43	56,6	10	13,2	10	27	20	54,1	7	18,9

A= Ambulatório; H= Hospitais; D= Domicílios; LPP= Lesão por Pressão; LPP_NC= Lesão por Pressão Não Classificável; LPP_TP= Lesão por Pressão Tissular Profunda; UD= Úlcera Diabética; UA= Úlcera Arterial; UVen= Úlcera Venosa; UM= Úlcera Mista.Fonte: Autores (2020)

Dentre as 220 (100,0%) feridas crônicas, 146 (66,4%) corresponderam às LPP (25 no ambulatório, 97 nos hospitais e 24 nos domicílios); 44 (20,0%) às UD (20 no ambulatório, 21 nos hospitais e três nos domicílios); e 30 (13,6%) às UV (20 no ambulatório, sete nos hospitais e três nos domicílios). Houve associação estatística entre todos os tamanhos dos curativos e as LPP_3 (p=0,020).

Quanto ao perfil terapêutico, foi utilizada grande variedade de coberturas, com destaque às espumas 76 unidades (34,5%), sendo 39 unidades de espuma com poli-hexametileno biguanida (phmb), 14 unidades de espuma com poliuretano, 12 unidades de espumas com borda de silicone, nove unidades de espumas com prata, dentre outros componentes. Na sequência, houve predomínio do Alginato de Cálcio 63 unidades (28,6%), antimicrobianos 49 unidades (22,3%), sendo 27 unidades de gaze impregnada com phmb, 10 de alginato de cálcio Ag, oito de hidroalginato com prata, entre outros.

A espuma foi o produto mais utilizado no tratamento de LPP_1 113 unidades (59,1%), LPP_4 seis (42,9%), LPP não classificáveis seis (35,3%) e UD (34,1%); o alginato de cálcio para LPP_2 23 (39,7%) e para LPP_3 12 (37,5%). Nas UV houve variação dos produtos; para as úlceras arteriais utilizou-se alginato de cálcio três (100%), para as Uven os antimicrobianos 11 (52,4%) e para as úlceras mistas o hidrogel três (50%) e os antimicrobianos três (50%). Com exceção das UV, houve relação estatística significante entre os produtos aplicados e todas as demais feridas crônicas.

DISCUSSÃO

Verificou-se que o perfil relativo ao sexo (50,6%) feminino e média de idade (71,4 anos DP±16,5) corrobora achados de estudos recentes. Análise documental de 67 prontuários de pessoas com feridas crônicas atendidas pelo Programa de Atenção à Saúde de uma OPS da Bahia apresentou resultados semelhantes, indicando o predomínio do sexo feminino e da faixa etária entre 60-79 anos¹¹. Alguns estudos constataram que as feridas crônicas foram mais presentes em mulheres⁵,¹⁰-12, mas outros demonstraram a sua prevalência em pacientes do sexo masculino⁵,¹³. Ressalta-se que ainda não há evidências estatisticamente significantes em relação à associação entre o sexo e a ocorrência de feridas crônicas, sinalizando não existir diferenças entre os sexos e fortalecendo a hipótese de que as feridas crônicas podem acometer, indiscriminadamente, homens e mulheres¹⁴.

A ocorrência de feridas crônicas em pessoas com idade avançada pode ser justificada pelas complicações decorrentes do envelhecimento, caracterizado por fragilidade fisiológica, associado às doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), proporcionando condições de maior vulnerabilidade⁷-⁸,¹¹.

Nesta pesquisa, 66,3% dos pacientes apresentaram HA e DM, sendo a HA (67,0%) a comorbidade dominante, seguida pela DM (58%). Em estudo realizado num ambulatório de curativo de um hospital no interior de São Paulo, de porte especial, constatou-se que 25,1% dos pacientes apresentaram prevalência e associação de doenças de base semelhantes¹³.

Demonstraram-se, no presente estudo, relações entre o aparecimento de ferida crônica e DCNT, e entre a presença LPP e a incontinência fecal. Estudo realizado com 5.342 pacientes adultos em unidades de terapia intensiva (UTI) de 36 Estados dos Estados Unidos da América, encontrou a mesma relação de prevalência de LPP em 17,1% dos pacientes com incontinências¹⁵. A ocorrência de LPP foi relacionada ao aumento da umidade na superfície da pele e ao fato de enzimas digestivas como lipases e proteases, responsáveis pela degradação dos lipídios e proteínas da pele, serem encontradas nas fezes¹⁶.

Foi apresentada na pesquisa a associação ente DM e UD. A incidência anual e mundial de UD está entre 9,1 e 26,1 milhões e, com o aumento dos casos anuais de pacientes com DM recém-diagnosticados, há a tendência no aumento na incidência de UD. Apesar das UD ocorrem em qualquer idade, são mais prevalentes em pacientes acima de 45 anos e constam entre as complicações mais relacionadas aos indivíduos que não controlam bem a sua doença¹⁷.

Mostrou-se, neste estudo, que as LPP foram os tipos de feridas crônicas mais prevalentes, destacando-se as LPP_2. Estudo conduzido em instituição hospitalar de Manaus-AM, analisou o perfil de 24 pacientes com LPP, sendo as de maior predomínio as LPP_3 53,1% e LPP_4 20,4%. Quanto à modalidade assistencial, 53,1% dos pacientes foram atendidos em hospitais e 46,9% no domicílio¹⁸, corroborando com os achados desta pesquisa.

Para as UD e UV, as modalidades assistenciais mais expressivas foram a ambulatorial e a hospitalar. Estudo que analisou 60 prontuários de pacientes com feridas crônicas, atendidos em ambulatório especializado e privado no Distrito Federal, enfatizou o predomínio das UD (42%), seguidas das UVEn (34%)¹⁴. Pesquisa realizada em um hospital de referência da Universidade de Gondar, Etiópia, que atende pacientes nas modalidades hospitalar e ambulatorial, apresentou prevalência de UD de 18,5%¹⁹.

Nesta pesquisa, as localizações mais expressivas das LPP foram as regiões sacrais, trocantéricas e calcâneas. Em um levantamento realizado numa instituição acreditada com 21 leitos de UTI, foi mais expressiva a ocorrência de LPP em região sacral (46,4%), seguida da região dos calcâneos (29,7%) e dos trocânteres (9,5%)²⁰. Dados semelhantes foram apresentados em estudo realizado em um Serviço de Atendimento Domiciliar de Porto Alegre-RS, que verificou, dentre 38 pacientes, que 52,9% tinham LPP na região sacral, 10,3% na glútea e 9,2% na calcânea²¹. As localizações das LPP podem resultar do apoio em proeminências ósseas, sendo imprescindível a avaliação constante da pele e tecidos com a finalidade de aliviar a pressão nessas localizações²².

Em se tratando de localização das UD, verificou-se que as regiões dos pés foram as mais acometidas (72,7%), corroborando com estudo conduzido com 56 pacientes atendidos em ambulatório especializado no interior da Paraíba, no qual a localização das UD também prevaleceu nos pés (89,7%)²³. O surgimento dessas lesões é potencializado por anormalidades neurológicas e complicações causadas por doenças arterial e venosa periféricas, diminuindo o fluxo e afluxo sanguíneo²⁴.

Ao se analisar os pacientes da UTIF com UV, constatou-se que 83,3% apresentaram essas feridas nas pernas. Estudo indica que a localização de UV é mais comum nos membros inferiores, afetando de 1% a 3% da população dos Estados Unidos da América (EUA)²⁵. A hipertensão venosa, além de outros fatores de risco (por exemplo, idade acima de 55 anos, histórico familiar de insuficiência venosa crônica, índice de massa corporal elevado), são responsáveis pelo aparecimento das UV²⁶.

Quanto aos produtos específicos utilizados para os curativos, as coberturas mais presentes nesta pesquisa foram as espumas, seguidas de alginato de cálcio e antimicrobianos, diferentemente de estudo realizado em um ambulatório de feridas referência no interior de São Paulo, no qual, para 347 pacientes, foram utilizados hidrogéis (21,3%) associados ao PHMB e acompanhado de alginato de cálcio; seguidos por papaína (19,2%) e sulfadiazina de prata a 1% em associação com nitrato de cério 0,4% (14%)¹³.

Destaca-se que o conhecimento do profissional de saúde é imprescindível para a assistência ao paciente com feridas crônicas, a fim de subsidiar o tratamento da infecção, realizar o desbridamento, compressão adequada nos casos de UVEn, restauração do influxo arterial na úlceras arteriais, avaliação e atividades preventivas e terapêuticas para LPP, diminuição da sobrecarga e avaliação rigorosa nos pés em UD e gestão de outros fatores ou doenças sistêmicas subjacentes²⁷. Neste sentido, as diretrizes publicadas pela Wound Healing Society apoiam a utilização de terapias avançadas para o tratamento de feridas crônicas, como exemplo, a substituição de pele, o uso de pressão negativa e de produtos tópicos de alta tecnologia²⁸.

Reitera-se a relevância dos serviços de saúde analisarem os perfis da população assistida com ferida crônica, evidenciando as necessidades individuais e coletivas e, a partir delas, planejar as condutas a serem preconizadas abrangendo a promoção, prevenção e reestabelecimento da saúde.

Considerando o escopo do presente estudo, indica-se como limitação a necessidade de restringir a análise dos prontuários dos pacientes ao primeiro dia de atendimento prestado pela UTIF, devido ao elevado quantitativo de atendimentos realizados em 2019 (5.241), os quais originaram grande volume de documentos.

CONCLUSÃO

A análise dos perfis demográfico, clínico e terapêutico dos pacientes com feridas crônicas subsidiará a melhoria contínua da qualidade da assistência integral prestada pela UTIF, em diferentes modalidades.

Como contribuições do estudo, destaca-se que a metodologia descrita poderá ser reproduzida em outras unidades especializadas extra hospitalares, visando evidenciar os perfis dos pacientes atendidos. Os resultados obtidos verticalizam o conhecimento sobre as terapias tópicas utilizadas de acordo com o tipo de feridas crônicas e, ao conferir visibilidade ao contexto específico de uma unidade de atendimento multidisciplinar, pode consistir em referência para subsidiar o processo decisório de enfermeiros, médicos e gestores quanto aos insumos requeridos.

REFERÊNCIAS

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Editado por

Editora associada: Luciana de Alcântara Nogueira

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  29 Ago 2022
• Data do Fascículo
  2022

Histórico

• Recebido
  21 Set 2021
• Aceito
  14 Fev 2022