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ANÁLISE DAS INTERNAÇÕES PSIQUIÁTRICAS PELO SUS NO PIAUÍ, BRASIL, DE 2008 A 2020

RESUMO

Objetivo

analisar o comportamento de dados de internações psiquiátricas, no Piauí, no período de 2008 a 2020.

Método

estudo ecológico com dados secundários de internações psiquiátricas, de 2008 a 2020, no Piauí - Brasil, do Sistema de Informações Hospitalares/DATASUS. Análise descritiva e regressão linear foram realizadas.

Resultados

foram encontradas 40.608 internações psiquiátricas. As principais causas foram esquizofrenia (17.877) e transtornos de humor (8.239). Retardo mental e esquizofrenia tiveram maior custo e média de permanência. De 2009 a 2012, houve decréscimo de internações e, entre 2016 e 2019, houve aumento, independente da idade e do sexo. As internações foram mais frequentes entre adultos (94,4%) e homens (62,4%).

Conclusão

a diminuição de internações psiquiátricas no Piauí, de 2009 a 2012, coincide com o fechamento do hospital psiquiátrico do estado e o fortalecimento da Rede de Atenção Psicossocial. Os dados refletem políticas de saúde mental anteriores e permitem planejamento de estratégias de saúde.

DESCRITORES:
Assistência à; saúde mental; Transtornos mentais; Estudos de séries temporais; Hospitalização; Sistemas de informação em saúde

ABSTRACT

Objective:

to analyze the behavior of data referring to psychiatric hospitalizations in Piauí between 2008 and 2020.

Method

an ecological study conducted with secondary data referring to psychiatric hospitalizations between 2008 and 2020 in Piauí, obtained from the Hospital Information System/DATASUS. Descriptive and linear regression analyses were performed.

Results

a total of 40,608 psychiatric hospitalizations were found. The main causes were schizophrenia (17,877) and mood disorders (8,239). Mental retardation and schizophrenia presented higher costs and mean hospitalization times. A reduction in the number of hospitalization was recorded from 2009 to 2012 and there was increase between 2016 and 2019, regardless of age and gender. Hospitalizations were more frequent among adults (94.4%) and men (62.4%).

Conclusion

the reduction in the number of psychiatric hospitalizations in Piauí from 2009 to 2012 coincides with the closing of the state’s psychiatric hospital and with the strengthening of the Psychosocial Care Network. The data reflect previous mental health policies and allow planning health strategies.

DESCRIPTORS:
Mental Health Care; Mental Disorders; Time Series Studies; Hospitalization; Health Information Systems.

RESUMEN

Objetivo

analizar el comportamiento de datos referentes a internaciones psiquiátricas en Piauí, entre 2008 y 2020.

Método

estudio ecológico realizado con datos secundarios referentes a internaciones psiquiátricas entre 2008 y 2020 en Piauí, Brasil, obtenidos del Sistema de Información Hospitalaria/DATASUS. Se realizó un análisis descriptivo y otro de regresión lineal.

Resultados

se encontró un total de 40.608 internaciones psiquiátricas. Las causas principales fueron esquizofrenia (17.877) y trastornos del estado de ánimo (8.239). Retraso mental y esquizofrenia presentaron mayores costos y tiempo medio de internación. De 2009 a 2012 se registró una caída en la cantidad de internaciones y entre 2016 y 2019 hubo un aumento, independientemente del sexo. Las internaciones fueron más frecuentes en adultos (94,4%) y en hombres (62,4%).

Conclusión

la reducción en la cantidad de internaciones psiquiátricas en Piauí registrada entre 2009 y 2012 coincide con el cierre del hospital psiquiátrico en el estado y con el fortalecimiento de la Red de Atención Psicosocial. Los datos reflejan políticas de salud mental anteriores en el tiempo y permiten planificar estrategias de salud.

DESCRIPTORES:
Asistencia en Salud Mental; Trastornos Mentales; Estudios de Series de Tiempo; Internación; Sistemas de Información Sanitaria.

INTRODUÇÃO

O início do processo da Reforma Psiquiátrica Brasileira ocorreu sob um contexto de luta pela mudança dos modelos de atenção e gestão nas práticas de saúde, pela defesa da saúde coletiva, da equidade na oferta dos serviços e do protagonismo dos trabalhadores e usuários dos serviços de saúde, nos processos de gestão e produção de tecnologias de cuidado. Esses ideais foram espelhados no modelo italiano, que defendia, principalmente, a desinstitucionalização dos usuários, com vistas a superar a violência asilar e, com isso, conseguir o resgate da cidadania através da reinserção no convívio social, rompendo com o modelo hospitalar vigente11 Ministério da Saúde (BR). Reforma psiquiátrica e política de saúde mental no Brasil. Documento apresentado à Conferência Regional de Reforma dos Serviços de Saúde Mental: 15 anos depois de Caracas. [Internet] Brasília: OPAS; 2005 [acesso em 12 jun 2021]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/Relatorio15_anos_Caracas.pdf.
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-22 Clementino FS, Miranda FAN, Pessoa Júnior JM, Marcolino EC, Silva Júnior JA, Brandão GCG. Atendimento integral e comunitário em saúde mental: avanços e desafios da Reforma Psiquiátrica. Trab. Educ. Saúde. [Internet]. 2019 [acesso em 25 maio 2022]; 17(1). Disponível em: https://doi.org/10.1590/1981-7746-sol00177.
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As mudanças no campo da saúde mental se relacionam com normativas estratégicas, como a Declaração de Caracas, publicada em 1990, a qual orienta reformas na atenção à saúde mental nas Américas, e a Lei Federal Nº 10.216/2001, que dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental no Brasil. A Portaria N° 3.088/2011 instituiu a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) para pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Integra uma rede territorializada, que abrange cuidados desde a atenção básica até a atenção hospitalar, alinhados com a Lei Nº 10.216/2001, abrangendo a promoção da contratualidade de seus usuários, valorizando, assim, a reinserção social realizada por equipe multiprofissional33 Ministério da Saúde (BR). Portaria Nº 3.088, de 23 de dezembro de 2011. Institui a Rede de Atenção Psicossocial para pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). [Internet] Brasília: Ministério da Saúde; 2011 [acesso em 12 jun 2021]. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2011/prt3088_23_12_2011_rep.html.
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Dentro da RAPS estão situados diversos dispositivos de atenção à saúde e aos direitos sociais, sendo eles: atenção básica como porta de entrada, atenção psicossocial com especialidades, Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) nos seus mais variados subtipos, de acordo com a necessidade de atenção à saúde do usuário e, por fim, atenção hospitalar para suporte às situações de crise33 Ministério da Saúde (BR). Portaria Nº 3.088, de 23 de dezembro de 2011. Institui a Rede de Atenção Psicossocial para pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). [Internet] Brasília: Ministério da Saúde; 2011 [acesso em 12 jun 2021]. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2011/prt3088_23_12_2011_rep.html.
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-44 Campos RTO. Saúde mental no Brasil: avanços, retrocessos e desafios. Cad. Saúde Pública. [Internet]. 2019 [acesso em 25 maio 2022]; 35(11). Disponível em: https://doi.org/10.1590/0102-311X00156119.
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. Reitera-se a urgente necessidade de inserção do portador de transtorno mental na rede de atenção à saúde (Unidades Básicas de Saúde - UBS, Estratégia Saúde da Família - ESF, CAPS e outros serviços), para garantir o tratamento adecuado55 Presidência da República (BR). Lei Nº 10.216, de 6 de abril de 2001. Dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental. [Internet] Brasília; 2001 [acesso em 30 mar 2021]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/leis_2001/l10216.htm.
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A atenção em saúde mental deve ser essencialmente comunitária, mas os hospitais têm papel de retaguarda. Ou seja, os serviços de saúde mental são oferecidos nos contextos comunitários habituais próximos à população atendida, sendo disponibilizadas internações hospitalares como último recurso, apenas quando necessário e respeitando a brevidade66 Silva MAP da, Giacon-Arruda BCC, Marcheti PM, Teston EF, Veivenberg CG, Lima H de P. Bordando saúde: percepção de mulheres em sofrimento psíquico sobre a vivência em uma oficina terapêutica. Cogitare Enferm. [Internet]. 2022 [acesso em 25 maio 2022]; 27. Disponível em: https://revistas.ufpr.br/cogitare/article/view/81933.
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-77 Almeida JMC de. Política de saúde mental no Brasil: o que está em jogo nas mudanças em curso. Cad. Saúde Pública. [Internet]. 2019 [acesso em 25 maio 2022]; 35(11). Disponível em: https://doi.org/10.1590/0102-311X00129519.
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. Somente quando esgotados os recursos extra-hospitalares e preenchidos os requisitos legais para a internação, o gestor de saúde deve atuar de forma a garantir a hospitalização de todos aqueles que dela necessitarem55 Presidência da República (BR). Lei Nº 10.216, de 6 de abril de 2001. Dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental. [Internet] Brasília; 2001 [acesso em 30 mar 2021]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/leis_2001/l10216.htm.
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No Brasil, embora escassos, os estudos que analisam dados das internações psiquiátricas abordam estados das regiões Sudeste e Sul. Assim, é de interesse investigar e caracterizar como vem acontecendo essas entradas no componente hospitalar psiquiátrico/geral nos leitos psiquiátricos. A relevância do estudo consiste em conhecer o cenário atual da RAPS no Piauí, em particular do componente hospitalar, através da análise dos dados de internação psiquiátrica. Este estudo teve como objetivo analisar o comportamento de dados de internações psiquiátricas, no Piauí, no período de 2008 a 2020.

MÉTODO

Estudo ecológico, retrospectivo, de análise temporal de dados em saúde. O levantamento das informações foi realizado em maio de 2021, considerando todas as internações com o objeto mencionado, registradas no sítio virtual do Departamento de Informática do SUS (DATASUS).

Acessou-se as informações de saúde por meio do TABNET, escolhendo-se a opção referente às informações epidemiológicas e de morbidade. Entre o grupo de opções referentes aos sistemas de informação do SUS, levantaram-se os dados de morbidade hospitalar, disponibilizados por meio do Sistema de Informações Hospitalares (SIH/SUS), a partir da morbidade hospitalar geral por local de residência (escolhendo-se o Piauí como abrangência geográfica). Essa opção fornece dados mais recentes, a partir de 2008, motivo da escolha da série histórica de 13 anos completos.

O conteúdo das tabelas geradas para esta pesquisa, no sítio virtual, correspondeu às internações; foram escolhidos todos os períodos disponíveis de anos já finalizados, na época em que os dados foram coletados (janeiro de 2008 a dezembro de 2020). No conjunto de seleções disponíveis, escolheu-se trabalhar com o capítulo V da CID-10 (transtornos mentais e comportamentais) e lista de morbidades da CID-10 assim constantes: demência, transtornos mentais e comportamentais devido ao uso de álcool, transtornos mentais e comportamentais devido ao uso de outras substâncias psicoativas, esquizofrenia e transtornos esquizotípicos e delirantes, transtornos de humor (afetivos), transtornos neuróticos e relacionados com stress e somatoformes, retardo mental, outros transtornos mentais e comportamentais. O agrupamento dessas morbidades foi realizado a fim de se tornar variável principal do estudo.

Outras variáveis consideradas foram: municípios do Piauí, média de permanência, valor médio da internação, faixa etária (10 a 19 anos, 20 a 59 anos, 60 anos ou mais) e sexo. Foram realizadas análises tabulares, com dados absolutos agrupados no SPSS Statistics 24, procedendo-se à análise descritiva e inferencial. Na análise da quantidade de internações por ano e por causa, utilizou-se a regressão linear, com cálculo de coeficiente de determinação (R2).

Esta pesquisa foi realizada com dados epidemiológicos secundários de domínio público, disponíveis online, para análise e avaliação de saúde da população de uma Unidade Federativa no Nordeste do Brasil. Dessa forma, é dispensado de avaliação por Comitê de Ética em Pesquisa, conforme descrito na Resolução do Conselho Nacional de Saúde Nº 510/2016.

RESULTADOS

Foi verificado um total de 40.608 internações relacionadas a transtornos mentais/comportamentais. Dessas, 12.285 (30,2%) correspondem àquelas registradas no município de Teresina, seguidas de 8.595 (21,1%) em Parnaíba e 1.401 (3,4%) em Picos.

Maior alocação de recursos financeiros por internação ocorreu nos casos de usuários provenientes de Picos e Teresina (R$ 1.380,45 e R$ 1.408,89 respectivamente), seguidos de Parnaíba (R$ 804,97). O mesmo padrão ocorre em relação à média de permanência: para os residentes em Picos, o tempo foi de 40,4 dias, na capital foi de 28,0 dias e em Parnaíba foi de 25,6 dias.

De 2009 a 2012, houve acentuado decréscimo de internações psiquiátricas no Piauí. A maior causa de internações psiquiátricas, em toda a série temporal, foi a esquizofrenia (17.877 internações), seguida de 8.239 internações por transtornos de humor (Tabela 1).

Tabela 1
Quantidade de internações por transtornos mentais/comportamentais por ano da série histórica. Piauí, PI, Brasil, 2008 - 2020

Foi encontrada forte relação entre a frequência total de internações psiquiátricas de cada ano e as frequências de internações por uso do álcool (rho=+0,929; p=0,000), esquizofrenia (rho=+0,868; p=0,001), transtornos de humor (rho=+0,831; p=0,000) e retardo mental (rho=+0,885; p=0,000). Em particular, 94,0%, 96,2%, 80,9% e 92,5% da variabilidade entre os valores observados de frequências de internações desses quatro transtornos, respectivamente, são explicados pela relação entre eles e a frequência total de internações psiquiátricas em todos os períodos registrados.

O retardo mental (R$ 2.831,72) e a esquizofrenia (R$ 1.738,06) tiveram maior custo de internação. Os mesmos transtornos foram responsáveis por internações mais longas: 58,9 e 38,8 dias respectivamente (Tabela 2).

Tabela 2
Quantidade de internações, valor médio por internação e permanência relacionado a transtornos mentais/comportamentais. Piauí, PI, Brasil, 2008 - 2020

No período de 2008 a 2020, ocorreu queda no número de internações em todas as faixas etárias, mais expressiva entre os adultos (20-59 anos), com diminuição de cerca de 60% do número de casos, quando comparados os extremos da série temporal (Gráfico 1). As internações psiquiátricas de adultos correspondem a 38.370 (94,4%) do total de internações no período. Em 2020, corresponderam a 39,5% da quantidade de 2008.

Gráfico 1
Quantidade de internações relacionadas a transtornos mentais/comportamentais de acordo com a faixa etária. Piauí, PI, Brasil, 2008 - 2020

Gráfico 2
Quantidade de internações relacionadas a transtornos mentais/comportamentais de acordo com o sexo. Piauí, PI, Brasil, 2008 - 2020

O número de internações também decaiu, com o passar dos anos, independente do sexo. As internações entre homens foram superiores em toda a série histórica: 25.354 (62,4%) corresponderam ao sexo masculino. Essa diferença foi maior em 2010 (diferença de 33,6%) e menor em 2014 (diferença de 12,3%) (Gráfico 2). Na Tabela 1 e nos Gráficos 1 e 2, percebe-se aumento do quantitativo de internações de 2016 a 2019, comportamento divergente à queda ocorrida a partir de 2009.

DISCUSSÃO

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), em 2011, a prevalência dos transtornos mentais na população mundial encontrava-se em torno de 10%, excedendo 25% ao considerar episódios durante todo o curso da vida88 World Health Organization (WHO). Mental health and older adults. [Internet]. Geneva: WHO; 2016 [acesso em 10 jun 2021]. Disponível em: http://www.who.int/mediacentre/factsheets/fs381/en/.
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. Internações mais frequentes na capital ou em cidades de referência da macrorregião são dados esperados e corroboram os achados de estudo99 Melo MCA, Albuquerque SGC, Luz JHS, Quental PT de LF, Sampaio AM, Lima AB. Perfil clínico e psicossocial dos moradores em hospitais psiquiátricos no estado do Ceará, Brasil. Ciência & Saúde Coletiva. [Internet]. 2015 [acesso em 07 jun 2021]; 20(2). Disponível em: https://doi.org/10.1590/1413-81232015202.2062013.
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realizado no Ceará: a maioria das internações ocorre na capital (87,2%) e 12,8% são distribuídas nas demais regiões do estado.

É suposição razoável que o aumento de oferta e cobertura da atenção básica permitiria maior número de usuários em sofrimento psíquico ter acesso aos serviços de saúde e tratamento e, com menor frequência, ser referenciado para internação1010 Miliauskas CR, Faus DP, Junkes L, Rodrigues RB, Junger W. Associação entre internações psiquiátricas, cobertura de CAPS e atenção básica em regiões metropolitanas do RJ e SP, Brasil. Ciência & Saúde Coletiva. [Internet]. 2019 [acesso em 12 jun 2021]; 24(5). Disponível em: https://doi.org/10.1590/1413-81232018245.18862017.
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. A internação, em algumas condições clínicas, também pode ser considerada necessária para a remissão de sintomas e melhoria da saúde, sendo o hospital visto como um local que proporciona cuidado integral, semelhante àquele ofertado nos serviços de base comunitária, porém de modo intensivo, devido à necessidade do usuário1111 Pereira AR, Joazeiro G. Percepção da internação em hospital psiquiátrico por pacientes com diagnóstico de esquizofrenia. O Mundo da Saúde. [Internet]. 2015 [acesso em 06 jun 2021]; 39(4). Disponível em: https://doi.org/10.15343/0104-7809.20153904476483.
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A elevação do número de internações pode estar relacionada a um fenômeno chamado revolving door1212 Giovanni P Di, Martino G Di, Zecca IAL, Porfilio I, Romano F, Staniscia T. The revolving door phenomenon: psychiatric hospitalization and risk of readmission among drug-addicted patients. Clin. Ter. [Internet]. 2020 [acesso em 25 maio 2022]; 171(5). Disponível em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/32901786/.
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, que ocorre em virtude das frequentes reinternações, relacionadas à falta ou insuficiência de serviços substitutivos e comunitários e à dificuldade de adesão ao tratamento medicamentoso e/ou ambulatorial, sobretudo após internação que, por vezes, é a via de acesso ao cuidado em saúde mental. Isso reflete a fragilidade dos sistemas de saúde em coordenar a assistência e oferecer apoio na transição entre hospitais e outros serviços1313 Zanardo GL de P, Silveira LH de C, Rocha CMF, Rocha KB. Internações e reinternações psiquiátricas em um hospital geral de Porto Alegre: características sociodemográficas, clínicas e do uso da Rede de Atenção Psicossocial. Rev. bras. epidemiol. [Internet]. 2017 [acesso em 12 jun 2021]; 20(3). Disponível em: https://doi.org/10.1590/1980-5497201700030009.
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Mesmo em outras regiões do país, o custo médio da internação e o tempo médio de permanência são similares aos praticados no Piauí. Em Florianópolis, o custo para manter um paciente internado é de R$1.227,061414 Lindner LM, Marasciulo AC, Farias MR, Grohs GEM. Avaliação econômica do tratamento da esquizofrenia com antipsicóticos no Sistema Único de Saúde. Rev. Saúde Pública. [Internet]. 2009 [acesso em 01 jun 2021]; 43(Supl. 1). Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0034-89102009000800010.
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e, no Rio Grande do Sul, o tempo médio de internação, em 2001, foi de 28,1 dias1515 Horta RL, Costa JSD da, Balbinot AD, Watte G, Teixeira VA, Poletto S. Hospitalizações psiquiátricas no Rio Grande do Sul de 2000 a 2011. Rev. bras. epidemiol. [Internet]. 2015 [acesso em 07 jun 2021]; 18(4). Disponível em: https://doi.org/10.1590/1980-5497201500040019.
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. Nas capitais, a rede de atenção extra-hospitalar é abrangente e isso favorece o processo de alta hospitalar, conferindo mais segurança à transição do paciente para os serviços externos1616 Lara APM, Volpe FM. Evolução do perfil das internações psiquiátricas pelo Sistema Único de Saúde em Minas Gerais, Brasil, 2001-2013. Ciênc. saúde colet. [Internet]. 2019 [acesso em 06 jun 2021]; 24(2). Disponível em: https://doi.org/10.1590/1413-81232018242.14652017.
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. As RAPS de Teresina e Parnaíba possuem mais equipamentos de cuidado do que Picos, o que pode explicar o período de internamento menor. Constata-se que rede de atenção extra-hospitalar pouco abrangente implica em maior tempo de internação psiquiátrica.

O fato de a internação ser utilizada como porta de entrada para o cuidado pode estar relacionado com a cultura que se instituiu acerca da internação como tratamento tradicional e resolutivo para os transtornos mentais, prevalecendo a lógica hospitalocêntrica, baseada no modelo explicativo do processo saúde-doença biomédico. É frequente, entre usuários e familiares, discurso em que a internação aparece como melhor forma de tratamento, além de relatos de desconhecimento sobre outros serviços da RAPS1313 Zanardo GL de P, Silveira LH de C, Rocha CMF, Rocha KB. Internações e reinternações psiquiátricas em um hospital geral de Porto Alegre: características sociodemográficas, clínicas e do uso da Rede de Atenção Psicossocial. Rev. bras. epidemiol. [Internet]. 2017 [acesso em 12 jun 2021]; 20(3). Disponível em: https://doi.org/10.1590/1980-5497201700030009.
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Os resultados apontam para a necessidade de valorização e intensificação do cuidado baseado no modelo biopsicossocial. Apesar de o custo absoluto do cuidado hospitalar e comunitário, algumas vezes, ser semelhante, o leque de intervenções possíveis na atenção básica, realizadas na comunidade, é efetivo, tanto na manutenção dessas pessoas na sociedade, quanto na reinserção social, o que sugere que essas intervenções apresentam ótimo custo-efetividade se comparadas à segregação em âmbito hospitalar1717 Gonçalves RW, Vieira FS, Delgado PGG. Política de Saúde Mental no Brasil: evolução do gasto federal entre 2001 e 2009. Rev. Saúde Pública. [Internet]. 2012 [acesso em 01 jun 2021]; 46(1). Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0034-89102011005000085.
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O decréscimo de internações, no estado, de 2009 a 2012 é reflexo do fechamento, em 2009, de importante hospital psiquiátrico do estado, o Sanatório Meduna, localizado na capital. Anterior à comunicação oficial do fechamento ao Ministério Público, houve redução de leitos da instituição, o que gerou colapso de seu funcionamento. Mesmo com a redução dos leitos, a RAPS da capital não tinha condições de dar suporte necessário aos pacientes que permaneceram internos1818 Macedo JP, Dimenstein M. A reforma psiquiátrica em contextos periféricos: o Piauí em análise. Memorandum: Memória e História em Psicologia. [Internet]. 2012 [acesso em 30 mai 2021]; 22. Disponível em: https://periodicos.ufmg.br/index.php/memorandum/article/view/6595.
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Em 2010, foram firmados compromissos para manutenção dos subsídios estudais e municipais ao Sanatório Meduna, implantação de três tipos de CAPS e de dois Serviços de Residência Terapêutica, criação de uma gerência municipal de saúde mental, abertura de serviço de referência de álcool e outras drogas no Hospital do Mocambinho (capital), abertura de leitos em hospitais gerais para pacientes com dependência química, criação de enfermaria para atenção à crise no Hospital Areolino de Abreu e abertura de CAPSad em Floriano (interior do estado). Assim, o fechamento do Sanatório Meduna, com anterior redução de leitos, e a implementação dessas ações estratégicas contribuíram com posterior fortalecimento da RAPS da capital, que responde pela quase totalidade das internações psiquiátricas, e redução drástica da quantidade de internações no período de 2009 a 20121818 Macedo JP, Dimenstein M. A reforma psiquiátrica em contextos periféricos: o Piauí em análise. Memorandum: Memória e História em Psicologia. [Internet]. 2012 [acesso em 30 mai 2021]; 22. Disponível em: https://periodicos.ufmg.br/index.php/memorandum/article/view/6595.
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Em relação ao número de internações, a literatura aponta a maior frequência entre usuários com esquizofrenia em decorrência do sofrimento gerado pelos sintomas1919 Moniz ASB, MRS da, Devos ELB, Lourenção LG. Perfil de usuários e familiares de serviço psiquiátrico de Cabo Verde - África. Cogitare enferm. [Internet]. 2019 [acesso em 25 maio 2022]; 24. Disponível em: https://dx.doi.org/10.5380/ce.v24i0.59756.
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. Tal sofrimento faz com que alguns usuários optem pela internação psiquiátrica, procurando alguma forma de amenizá-lo. Outros, encontram na internação uma forma de se distanciarem de alguns vícios e de conter a agressividade1111 Pereira AR, Joazeiro G. Percepção da internação em hospital psiquiátrico por pacientes com diagnóstico de esquizofrenia. O Mundo da Saúde. [Internet]. 2015 [acesso em 06 jun 2021]; 39(4). Disponível em: https://doi.org/10.15343/0104-7809.20153904476483.
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,1313 Zanardo GL de P, Silveira LH de C, Rocha CMF, Rocha KB. Internações e reinternações psiquiátricas em um hospital geral de Porto Alegre: características sociodemográficas, clínicas e do uso da Rede de Atenção Psicossocial. Rev. bras. epidemiol. [Internet]. 2017 [acesso em 12 jun 2021]; 20(3). Disponível em: https://doi.org/10.1590/1980-5497201700030009.
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,2020 Hiany N, Vieira MA, Gusmão ROM, Barbosa SF. Perfil epidemiológico dos transtornos mentais na população adulta no Brasil: uma revisão integrativa. Rev. Enferm. Atual In Derme [Internet]. 2020 [acesso em 25 maio 2022]; 86(24). Disponível em: https://www.revistaenfermagematual.com.br/index.php/revista/article/view/676.
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.

As síndromes demenciais se apresentam com alto custo para acompanhamento, pois envolvem gastos com medicamentos e internações, sendo o transtorno com maior taxa de mortalidade psiquiátrica e quinta causa de hospitalização2121 Santos VC, Anjos KF dos, Boery RNS de O, Moreira RM, Cruz DP, Boery EN. Internação e mortalidade hospitalar de idosos por transtornos mentais e comportamentais no Brasil, 2008-2014. Epidemiol. Serv. Saude. [Internet]. 2017 [acesso em 14 jun 2021]; 26(1). Disponível em: https://doi.org/10.5123/S1679-49742017000100005.
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. O valor da internação em hospital psiquiátrico é 41% maior que o custo real para o mesmo procedimento nos demais hospitais1414 Lindner LM, Marasciulo AC, Farias MR, Grohs GEM. Avaliação econômica do tratamento da esquizofrenia com antipsicóticos no Sistema Único de Saúde. Rev. Saúde Pública. [Internet]. 2009 [acesso em 01 jun 2021]; 43(Supl. 1). Disponível em: https://doi.org/10.1590/S0034-89102009000800010.
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. Há, ainda, permanência prolongada na instituição hospitalar, como é o caso dos pacientes com CID-10 indicativo de retardo mental.

Observa-se que, a partir de 2012 (publicação da Portaria que instituiu a RAPS), a frequência de internações sofre poucas alterações, entre os adultos, até o último ano da série histórica. Um dos motivos para descontinuidade de queda (com exceção de 2016-2019) é a dificuldade da inserção da saúde mental na atenção básica. As equipes de Saúde da Família, em determinadas ocasiões, estão despreparadas para atender demandas de saúde mental e se vêem com dificuldade de colaborar com a redução de internações decorrentes de transtornos mentais2121 Santos VC, Anjos KF dos, Boery RNS de O, Moreira RM, Cruz DP, Boery EN. Internação e mortalidade hospitalar de idosos por transtornos mentais e comportamentais no Brasil, 2008-2014. Epidemiol. Serv. Saude. [Internet]. 2017 [acesso em 14 jun 2021]; 26(1). Disponível em: https://doi.org/10.5123/S1679-49742017000100005.
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Não somente no Piauí, as internações por transtornos mentais/comportamentais, no Brasil, são mais frequentes entre homens1313 Zanardo GL de P, Silveira LH de C, Rocha CMF, Rocha KB. Internações e reinternações psiquiátricas em um hospital geral de Porto Alegre: características sociodemográficas, clínicas e do uso da Rede de Atenção Psicossocial. Rev. bras. epidemiol. [Internet]. 2017 [acesso em 12 jun 2021]; 20(3). Disponível em: https://doi.org/10.1590/1980-5497201700030009.
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,2222 Bibiano AMB, Moreira RS, Oliveira MMG de, Silva VL. Fatores associados à utilização dos serviços de saúde por homens idosos: uma revisão sistemática da literatura. Ciência & Saúde Coletiva. [Internet]. 2019 [acesso em 25 maio 2022]; 24(6). Disponível em: https://doi.org/10.1590/1413-81232018246.19552017.
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. O mesmo resultado é apontado pela literatura internacional2323 Rezaian MK, Rahmani A, Mohaneri F, Moghadam HK. Epidemiology of psychiatric disorders: the situation of Mashhad city during 2010-2016. Journal of Fundamentals of Mental Health. [Internet]. 2017 [acesso em 14 jun 2021]; 19(6). Disponível em: https://doi.org/10.22038/JFMH.2017.9557.
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. Este cenário é fortemente sugestivo da inclusão de maior número de indivíduos no elenco de usuários do sistema público, que demandou atenção hospitalar, paralelo aos avanços dos movimentos de emancipação das mulheres, que passaram a ser inseridas na cena pública, sobretudo nos círculos de atenção à saúde mental1515 Horta RL, Costa JSD da, Balbinot AD, Watte G, Teixeira VA, Poletto S. Hospitalizações psiquiátricas no Rio Grande do Sul de 2000 a 2011. Rev. bras. epidemiol. [Internet]. 2015 [acesso em 07 jun 2021]; 18(4). Disponível em: https://doi.org/10.1590/1980-5497201500040019.
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O aumento das internações, independente da faixa etária e do sexo, a partir de 2016, ocorreu mesmo após criação, em 2014, do Programa de Desinstitucionalização, estratégia essa da RAPS2424 Ministério da Saúde (BR). Portaria Nº 2.840, de 29 de dezembro de 2014. Cria o Programa de Desinstitucionalização integrante do componente Estratégias de Desinstitucionalização da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), e institui o respectivo incentivo financeiro de custeio mensal. [Internet] Brasília: Ministério da Saúde; 2014 [acesso em 14 de jun 2021]. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2014/prt2840_29_12_2014.html.
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. Parece ser reflexo dos retrocessos na Política Nacional de Saúde Mental no período de 2016-2019. Durante esse período, normativas emanadas pelo governo federal incentivaram a internação psiquiátrica, o que permite observar tendência de estagnação do ritmo de implantação de serviços de base comunitária2525 Cruz NF de O, Gonçalves RW, Delgado PGG. Retrocesso da reforma psiquiátrica: o desmonte da política nacional de saúde mental brasileira de 2016 a 2019. Trab. educ. saúde. [Internet]. 2020 [acesso em 14 jun 2021]; 18(3). Disponível em: https://doi.org/10.1590/1981-7746-sol00285.
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.

Em 2017, a Resolução Nº 32 da Comissão Intergestores Tripartite (CIT) estabeleceu as (novas) diretrizes para o funcionamento da RAPS2626 Ministério da Saúde (BR). Resolução Nº 32, de 14 de dezembro de 2017. Estabelece as Diretrizes para o Fortalecimento da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS). [Internet] Brasília: Diário Oficial da União; 2017 [acesso em 14 jun 2021]. Disponível em: https://portalarquivos2.saude.gov.br/images/pdf/2018/janeiro/05/Resolu----o-CIT-n---32.pdf.
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: hospital psiquiátrico como parte integrante do cuidado na rede, além de apontar para um maior financiamento deste. No mesmo ano, foi publicada a Portaria do Ministério da Saúde Nº 3.588, que instituiu o Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Outras Drogas IV (CAPSad IV)2727 Brasil. Ministério da Saúde. Portaria Nº 3.588, de 21 de dezembro de 2017. Altera as portarias de consolidação Nº 3 e Nº 6, de 28 de setembro de 2017, para dispor sobre a Rede de Atenção Psicossocial, e dá outras providências. [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2017 [acesso em 14 jun 2021]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2017/prt3588_22_12_2017.html.
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, que desvirtua a lógica de cuidado dos CAPS, pois se trata de serviço de assistência a urgências e emergências, em detrimento da atenção à crise pautada no vínculo terapêutico2525 Cruz NF de O, Gonçalves RW, Delgado PGG. Retrocesso da reforma psiquiátrica: o desmonte da política nacional de saúde mental brasileira de 2016 a 2019. Trab. educ. saúde. [Internet]. 2020 [acesso em 14 jun 2021]; 18(3). Disponível em: https://doi.org/10.1590/1981-7746-sol00285.
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. Em 2019, a Nota Técnica Nº 11/2019-CGMAD/DAPES/SAS/MS foi publicada como “Nova Política Nacional de Saúde Mental”2828 Ministério da Saúde (BR). Nota técnica Nº 11/2019-CGMAD/DAPES/SAS/MS. Esclarecimentos sobre as mudanças na Política Nacional de Saúde Mental e nas Diretrizes da Política Nacional sobre Drogas. [Internet] Brasília: Ministério da Saúde; 2019 [acesso em 14 jun 2021]. Disponível em: https://pbpd.org.br/wp-content/uploads/2019/02/0656ad6e.pdf.
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, questionando a efetividade do modelo vigente até 2017 e a direção de uma política pautada no cuidado comunitário, além de afirmar a necessidade de aumento da quantidade de leitos psiquiátricos.

Como limitação deste estudo, aponta-se a utilização de dados secundários oriundos do SIH/SUS, o que pode representar, em caso de ausência de envio de dados, em algum dos períodos selecionados, análise subestimada. Embora os dados de bases governamentais sejam utilizados com frequência para planejamento, avaliação de gestão e em pesquisas, sabe-se que o preenchimento de documentos que geram essas informações demanda conhecimento. Além disso, tais documentos que, aqui, traduzem-se na Autorização de Internação Hospitalar (AIH), a qual gera esses dados, têm validade de 30 dias2929 Dias BM, Badagnan HF, Marchetti SP, Zanetti ACB. Gastos com internações psiquiátricas no estado de São Paulo: estudo ecológico descritivo, 2014 e 2019. Epidemiol. Serv. Saude. [Internet]. 2021 [acesso em 25 maio 2022]; 30(2). Disponível em: https://doi.org/10.1590/S1679-49742021000200024.
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, o que pode influenciar na contagem de internações3030 Yano KM, Prado SI, Couto W, Zucchi P, Novaes MAP de. Limitações no uso do DATASUS como fonte de dados de pesquisas científicas. Revista Multidisciplinar Em Saúde. [Internet]. 2021 [acesso em 25 maio 2022]; 2(4). Disponível em: https://doi.org/10.51161/rems/2780.
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, sobretudo daquelas em que as causas analisadas demandaram tempo superior a esse, como esquizofrenia e retardo mental.

CONCLUSÃO

As internações psiquiátricas, no Piauí, diminuíram acentuadamente de 2009 a 2012 e discretamente entre 2013 e 2015, período pós-publicação da Portaria Nº 3.088/2011. A exceção ocorreu de 2016 a 2019, quando houve publicação de normativas de incentivo à internação psiquiátrica. O sexo masculino e a faixa etária de 20 a 59 anos tiveram maior frequência de internações. As internações foram, principalmente, em pessoas com esquizofrenia e transtornos de humor (afetivos), diagnósticos que demandaram maior custo, juntamente com demência. O retardo mental ensejou maior tempo de permanência em internação.

Este estudo contribui com a análise de dados que refletem a implementação de políticas públicas anteriores voltadas à saúde mental e permitem planejamento de estratégias de saúde para o Piauí, relacionadas às demandas de saúde mental e, especificamente, de fortalecimento da RAPS. Evidencia-se necessidade de investimentos em serviços de base comunitária e de uma maior articulação dos equipamentos de saúde mental com os da atenção básica. Tais ações podem contribuir com a diminuição das taxas de internação hospitalar psiquiátrica. Os resultados mostraram a importância de intensificar investimentos na rede extra-hospitalar, para acompanhamento de usuários com transtornos mentais graves e persistentes, como aqueles com esquizofrenia, retardo mental e transtornos de humor.

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Editora associada: Luciana Nogueira

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Nov 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    19 Jun 2021
  • Aceito
    07 Abr 2022
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