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James Leonard Vaden

ENTREVISTA

James Leonard Vaden

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: James L. Vaden D.D.S., M.S., P.C. 308 East 1st Street, Coolville, TN 38501.USA

Foi com grande honra e satisfação que aceitei o convite para coordenar esta entrevista com o Dr. Vaden, por quem tenho profunda admiração, principalmente, pelo trabalho que desenvolve como clínico e educador. A sua vida clínica começou em 1972 em seu consultório em Cookeville, TN, onde, até hoje, atende crianças e adultos. Ao longo dos anos, tem procurado passar a sua experiência ortodôntica em mais de 120 artigos publicados, como autor ou co-autor de 10 capítulos de livros didáticos, mais de 200 palestras proferidas em vários países, inclusive no Brasil, onde já esteve por cinco vezes. É casado com a Dra. Beverly Hedgepeth e tem uma filha, Meg, advogada em Nova York. Ele e Beverly residem em uma fazenda na área de Buck Mountain, Vanderbilt TN, onde cria gado da espécie Angus. Nas horas vagas, trabalha a terra com um trator John Deere que ele próprio restaurou.

Junto com renomados professores conseguimos conduzir, com perguntas, as brilhantes colocações do nosso entrevistado sobre temas diversos da Ortodontia contemporânea. Boa leitura!

Estelio Zen

Temos visto, em suas apresentações, o belo resultado estético da face dos pacientes com planos de tratamento envolvendo extrações dentárias. No entanto, muitos ortodontistas parecem ignorar a possibilidade de melhorar a estética facial por meio de extrações. Quais razões o senhor aponta para a resistência desses profissionais em realizar mais extrações? Nelson Mucha

Gostaria de saber a resposta à sua pergunta. Já me perguntei a mesma coisa muitas e muitas vezes. Eu não sei por que muitos que praticam a Ortodontia não têm uma compreensão melhor da relação da estética facial com o plano de tratamento. Cada paciente deve ter um plano de tratamento de modo que uma ótima estética facial seja conseguida. Alguns dizem que a estética facial é "uma coisa individual" e eu constantemente ouço a frase: "a beleza está no olho do observador". Isso não é verdade, existe, padrões e modelos para a estética facial. Talvez, o mais simples padrão que existe nos foi legado pelos artistas do Renascimento, Michelangelo e DaVinci. Esses artistas usaram a linha do perfil para determinar o equilíbrio e a simetria do terço inferior da face (Fig. 1, 2). O perfil é avaliado com uma linha que toca os tecidos moles do mento, passa pelo ponto mais proeminente dos lábios e se prolonga passando pelo nariz. Numa face equilibrada esta linha toca os lábios e secciona o 1/3 anterior do nariz. Se a linha do perfil passar à frente do nariz, o paciente é portador de uma biprotrusão (Fig. 3). Reduzindo as protrusões, a linha do perfil se movimenta para trás. Se a linha do perfil passar muito próxima da base nasal, a face é denominada "côncava" (Fig. 4). O tratamento não deve mover a linha do perfil demasiadamente para a base do nariz. Utilizo a linha do perfil em todos os meus planos de tratamento. Se o paciente apresentar uma face equilibrada e proporcional antes do tratamento ortodôntico, mantenho esse equilíbrio e proporção. Se o paciente tiver uma protrusão, isto é, se os lábios estão demasiadamente para frente, eu sem dúvida vou reduzir essa protrusão. Na maioria dos casos, para reduzir uma protrusão são necessárias extrações. A paciente apresentada na figura 5 tinha uma face razoavelmente equilibrada, e começou o tratamento sem a extração de dentes, mesmo tendo um grande apinhamento. Projetando os dentes para conseguir o alinhamento, criou-se uma protrusão desagradável. O plano de tratamento foi alterado, extrações foram realizadas, e o tratamento finalizado com recuperação da estética facial (Fig. 5).






Quanto à sua pergunta - sobre por que a maioria dos ortodontistas não se dá conta do quanto as extrações de fato podem melhorar o equilíbrio, a harmonia e a proporção facial para muitos pacientes -, meu sentimento é de que muitos que praticam a Ortodontia como uma especialidade começaram a colocar tantos "aparelhos inteligentes" que chegam ao ponto de esquecer da estética facial. Alguns "ortodontistas", em muitos exemplos, estão colocando aparelhos e usando a mesma série de arcos pré-formados simplesmente para alinhar os dentes. A especialidade está transformando-se em uma especialidade de alinhamento dentário. Se nós, como especialistas, não voltarmos o nosso treinamento rumo às nossas raízes, e não começarmos a usar menos "aparelhos dirigidos", vamos enfrentar alguns problemas sérios. A discussão não é sobre extrair ou não extrair dentes, é sobre fazer o que é certo para a face do paciente. Se o paciente não requer extrações para obter equilíbrio, harmonia e beleza facial pós-tratamento, nenhuma extração deve ser feita (Fig. 6). Se as extrações melhorarem o equilíbrio e a harmonia da face do paciente (Fig. 7), o especialista deve usar essa solução, porque ela é muito valiosa.



Com a grande oferta de "tratamentos mágicos, arcos inteligentes, alinhadores e braquetes autoligáveis", entre outros, que argumentos o senhor utiliza com os seus alunos para que esses mantenham padrões elevados de diagnóstico e planejamento, e realizem tratamentos ortodônticos adequados com a necessidade de dobras individualizadas nos arcos? Nelson Mucha

É de responsabilidade do educador dos cursos de Ortodontia ensinar os fundamentos que envolvem um cuidadoso e metódico sistema de planejamento e aplicação das forças no tratamento ortodôntico. Uma vez definido o plano de tratamento, os aparelhos devem ser colocados apropriadamente e o tratamento conduzido como planejado. É imperativo que os estudantes compreendam que não há nenhum aparelho ou fio mágico. O paciente deve ser tratado por um ortodontista com formação e conhecimento, e não por um aparelho inteligente. Muitos programas de pós-graduação em Ortodontia dão ênfase à parte básica. Esses centros têm a liderança de quem compreende e dá valor aos fundamentos. Entretanto, existem alguns cursos em faculdades que ensinam o uso de aparelhos mágicos que não têm necessidade dos fundamentos da Ortodontia. Os estudantes que treinam neste tipo de programa não têm, consequentemente, nenhum conhecimento do planejamento e do tratamento. Não é culpa do estudante. Nossa especialidade deve tomar providências com relação a esse problema. Isto não quer dizer, entretanto, que aqueles programas que forçam os fundamentos têm os graduados sempre praticando o que aprenderam durante o curso. Alguns graduados em Ortodontia, mesmo bem treinados, atraídos pela promessa de que possam ganhar muito mais dinheiro atendendo um número "x" de pacientes por dia, podem fazer, em algum momento, dois ou mais desses cursos comerciais de "aparelhos mágicos" e assim passam a utilizar esses aparelhos em suas clínicas. Esses estudantes comprados pela propaganda comercial passam a fazer parte dos "especialistas alinhadores de dentes". Isso é desanimador para quem os ensinou, mas nós sempre pensamos que eles retornarão àquilo que aprenderam quando virem que o "rápido e o fácil" não funcionam. O primeiro argumento que usamos em nossa universidade é: "olhe a face - faça o que é certo para a face e para a estabilidade a longo prazo como resultado de seu tratamento". Nós repetimos exaustivamente essa orientação. É encorajador saber que a maioria dos estudantes escuta e põe em prática nossos ensinamentos. Outros, que não seguem nossos ensinamentos, cometem erros, depois reavaliam suas práticas e voltam a tratar seus pacientes mais apropriadamente. Eu posso assegurar que é um problema difícil nos tempos atuais, onde "tudo pode ser feito porque não faz mal". Nós, que ensinamos Ortodontia, temos que manter a esperança que nossos estudantes estão escutando e aprendendo e que, mesmo desencaminhados por um tempo, voltarão aos fundamentos e oferecerão um tratamento apropriado aos seus pacientes.

Em um de seus artigos publicados no World Journal of Orthodontics (v. 6, no. 2, p. 115-124, 2005), o senhor afirma que o paciente que apresenta altura facial anterior diminuída e altura facial posterior excessiva deve ser tratado com diagnóstico e plano de tratamento diferente. Quais critérios de diagnóstico e plano de tratamento devem ser considerados nesses casos específicos? Adilson Tomazinho

O paciente com "ângulo facial baixo" tem a altura facial anterior curta e a altura facial posterior excessiva. Como regra geral, esse paciente tem uma linha do perfil correta com relação ao nariz, ou a linha do perfil pode mesmo estar muito próxima à base nasal. Assim, é necessário tomar muito cuidado com o plano de tratamento desses pacientes, para preservar o equilíbrio facial (Fig. 6), com o objetivo de obter um resultado estético e de oclusão estável de longa duração (Fig. 8). Na maioria dos casos, o plano de tratamento deve manter a posição dos incisivos inferiores. O paciente com ângulo mandibular baixo não tem qualquer benefício se os incisivos inferiores forem verticalizados; de fato, pode até ser muito prejudicial à estética facial se isso for feito. Assim, a maioria desses pacientes precisa ter um plano de tratamento adequado para que os incisivos inferiores permaneçam em suas posições do pré-tratamento (Fig. 9). Isso não significa, entretanto, que para melhorar o apinhamento e a curva de Spee os incisivos inferiores possam ser mais inclinados para vestibular. Se o paciente apresentar um grande apinhamento, alguns dentes devem ser extraídos e, nesses casos, a escolha ocorre normalmente sobre os segundos pré-molares inferiores. Para esses pacientes, o apinhamento é eliminado e o espaço remanescente deve ser fechado pelo movimento mesial dos dentes posteriores e a posição do incisivo inferior fica protegida. A documentação do paciente apresentado na figura 10 ilustra este conceito. Algumas vezes, se não houver um apinhamento muito grande, a curva de Spee pode ser nivelada utilizando-se do aparelho extrabucal ("headgear") na arcada inferior, após extrações dos terceiros molares inferiores. Isso permite que se nivele a arcada inferior sem projetar os incisivos inferiores. Honestamente, o tratamento desses pacientes só pode ser revolvido por quem tem capacidade de controlar a arcada inferior com curva de Spee acentuada e grande apinhamento dentário. Os incisivos inferiores não podem ser projetados para corrigir esses dois problemas. O caso clínico apresentado na figura 11 ilustra esse conceito. O paciente foi tratado nivelando a curva de Spee e eliminando o apinhamento com a extração do terceiro molar e uso de um headgear J-hook no arco inferior.





O tratamento ortodôntico de pacientes com altura facial anterior excessiva e mordida aberta é extremamente difícil, havendo necessidade de adotar um tratamento ortodôntico-cirúrgico, na maioria dos casos. Quais as opções de tratamento ortodôntico não-cirúrgico que o senhor sugere para promover equilíbrio facial aceitável e boa função oclusal? Adilson Tomazinho

O paciente portador de Classe II de Angle com altura facial anterior excessiva e mordida aberta é extremamente difícil de tratar sem intervenção cirúrgica. Entretanto, existe algum plano de tratamento alternativo, que o ortodontista pode usar para tratar esses pacientes. Eu digo que a maioria dos pacientes pode obter um resultado estético facial melhor se a cirúrgica ortodôntica for feita. Isso não significa que sem cirurgia os dentes não serão corretamente alinhados e que o paciente não terá uma oclusão funcional que permaneça estável - com o equilíbrio e a harmonia razoável do terço inferior da face. Certos padrões devem ser seguidos para esses pacientes serem tratados com sucesso somente com a Ortodontia:

• Padrão #1: os incisivos inferiores devem ter osso basal suficiente para que os mesmos possam ser verticalizados. Quanto maior o plano mandibular, mais os incisivos devem ser verticalizados.

• Padrão #2: a dimensão vertical deve ser controlada. O clínico tem que controlar com eficiência a extrusão dos molares inferiores e superiores. Nos pacientes em crescimento, deve-se respeitar o crescimento e desenvolvimento normal desses dentes. Entretanto, nenhuma extrusão excessiva nas áreas posteriores pode ocorrer, pois a estética facial do paciente ficará severamente comprometida (Fig. 12).

• Padrão #3 (Fig. 13): não deve haver nenhuma expansão da arcada dentária. Em casos de pacientes com alto plano mandibular, quando o plano de tratamento é feito deve-se considerar que mais dentes do que o normal podem ser extraídos. Ou seja, é necessário conseguir espaço: (a) para eliminar o apinhamento, (b) para verticalizar o incisivo sobre o osso basal, (c) para nivelar a curva de Spee, e (d) para corrigir a Classe II dentária. Para conseguir todos esses objetivos, muito espaço é necessário, em especial para o paciente com ângulo mandibular alto (Fig. 13).



Esses padrões são críticos. O caso clínico da figura 14 ilustra muito desses conceitos. Ao examinar a má oclusão, tinha-se a impressão de que, para eliminar o apinhamento e a protrusão, os primeiros pré-molares superiores e inferiores deveriam ser extraídos. Devido ao alto ângulo mandibular, os incisivos inferiores deveriam ser verticalizados e os dentes anterossuperiores devem ser retraídos e intruídos. Se isso fosse feito, não haveria espaço para corrigir a oclusão posterior. Para conseguir uma oclusão satisfatória de Classe I, mais espaço é necessário. O plano de tratamento requeria, consequentemente, que o paciente fosse reavaliado depois que todo o espaço da extração dos pré-molares fosse fechado. Nesse momento, os primeiros molares superiores e os terceiros molares inferiores foram extraídos. A extração dos terceiros molares inferiores facilitou a preparação da ancoragem e o controle vertical da arcada dentária inferior. A extração dos primeiros molares superiores forneceu o espaço para uma retração adicional dos dentes anteriores e o movimento mesial dos segundos molares superiores para uma interdigitação de chave de oclusão com os primeiros molares inferiores. Os terceiros molares superiores foram usados como substitutos para os segundos molares superiores (Fig. 14).


Esse tipo de tratamento aumenta de oito a dez meses o tempo de tratamento, e deve-se reiterar que a estética facial está relacionada ao tanto que poderia ser conseguido com uma cirurgia ortodôntica. Se o plano de tratamento for correto, o paciente terá resultado estético aceitável e uma dentição funcional, estável e saudável. Esse plano de tratamento, ainda que pouco comum, é necessário para pacientes Classe II com plano mandibular alto que não aceitam o tratamento cirúrgico. Os mesmos princípios se aplicam para os casos de mordida aberta, quando pode-se utilizar, por exemplo, mini-implantes como recurso de ancoragem esquelética para intruir os segmentos posterossuperiores. Adicionalmente, os problemas da postura da língua devem ser eliminados. O objetivo é que o clínico possa usar de todos os meios que possua para corrigir um caso cirúrgico sem cirurgia.

Qual sua opinião sobre a utilização de mini-implantes e miniplacas como ancoragem na Ortodontia? Adilson Tomazinho

Muitos casos clínicos apresentados na literatura mostram o uso bem sucedido dos mini-implantes e miniplacas como unidades de ancoragem. Penso que a Ortodontia aceitou o fato de que esses dispositivos são bons auxiliares mecânicos para o tratamento de pacientes selecionados. Entretando, tenho visto os mini-implantes serem usados na tentativa de alterar planos de tratamentos com extrações para sem extrações, pela distalização em massa da arcada dentária superior. Acredito que o uso desses tipos de auxiliares mecânicos na tentativa de alterar de forma drástica o plano de tratamento é um erro. Melhor dizendo: Sim, use-os quando puderem melhorar o resultado do tratamento ou tornar o tratamento possível, mas não os use indiscriminadamente, para fazer coisas que não devem ser feitas.

Até uns 15 ou 20 anos atrás, tanto a Técnica de Tweed-Merrifield quanto seus seguidores eram muito criticados por: utilizarem forças pesadas, serem muito extracionistas e achatarem demais o perfil. Atualmente, nota-se que sua aceitação geral é muito maior, inclusive nos Congressos da Associação Americana de Ortodontistas (AAO). Sabemos que você e o Dr. Jack Dale tiveram um papel importante nessa transição. A filosofia de Tweed-Merrifield mudou ou o pensamento geral mudou? Hiroshi Maruo

Aqueles que, como nós, usam o aparelho "Standart Edgewise" e continuam usando-o são uma minoria nos dias de hoje. Nós seremos sempre uma minoria na Ortodontia por causa da: (1) natureza das pessoas que praticam a especialidade e (2) influência que as companhias exercem sobre os especialistas. É muito mais rentável para uma companhia vender acessórios pré-ajustados e autoligáveis do que vender acessórios sem uma prescrição orientada. Pense sobre a quantidade de dinheiro que está envolvido! Aí está o porquê de todas as companhias terem um "aparelho mágico". É um sistema dirigido pelo dinheiro. Eu não sei se a maneira que eu, o Jack Dale ou o Herb Klontz tratamos pacientes, é mais aceita agora do que era. Acredito que sempre foi aceita e que nós sempre apresentamos um plano de tratamento com fundamentos para a Ortodontia como especialidade. Sem fundamentos nada é bem sucedido. Você pode tratar um paciente com qualquer aparelho, contanto que você conheça os fundamentos do plano de tratamento e dos sistemas de forças. Ninguém deve usar o aparelho "Standart Edgewise" com o sistema da força do "Tweed-Merrifield" para conseguir um resultado estético, saudável, funcional e estável. Esse resultado deve ser conseguido por quem conhece os fundamentos do plano de tratamento e o conceito de dentição, e usa sistemas e controle de força com cuidado. A Ortodontia gradualmente foi se afastando dos fundamentos e muitos não se deram conta do quanto eles são importantes. Daí, o "renascimento" a pedidos de informação de Jack Dale, Herb Klontz, etc. Nós descobrimos que o Tweed Study Course está agora mais popular do que nunca. De fato, em 2009, foram organizados três cursos, por causa da demanda. Mais de 30 das 60 universidades americanas, agora, enviam todos os seus alunos para Tucson para estudar no Tweed Study Course. A razão disto é que as pessoas responsáveis por esses programas perceberam que os fundamentos são importantes. Eles entendem que, em duas semanas de curso, o aluno é exaustivamente orientado sobre os fundamentos do diagnóstico, plano de tratamento e orientação do uso do alicate nas dobras dos fios ortodônticos (torque, etc.). Um ortodontista de sucesso deve saber essas coisas. Sentimos que o aluno que aprende a manipular o fio, não importa o aparelho que ele usa, será um melhor profissional.

Entre as críticas à mecânica de Tweed-Merrifield, uma das mais citadas é o uso do aparelho extrabucal (AEB) de tração alta com ganchos em "J". Com o aparecimento dos dispositivos de ancoragem temporária (mini-implantes), é possível aplicar integralmente a mecânica de Tweed-Merrifield sem o apoio do AEB? Hiroshi Maruo

A aplicação de forças com mini-implantes em vez de um headgear (AEB) pode funcionar em determinados casos - em especial no tratamento de adultos, pois os mesmos não apresentam mais crescimento. Mini-implantes podem ser usados com muito sucesso no tratamento em adultos para preservar a ancoragem, intruir molares e incisivos, etc. No paciente em crescimento, entretanto, não há nenhum substituto para o benefício da preparação da ancoragem e dos elásticos com direção de Classe II. Aqueles que, como nós, usam esse sistema, acreditam firmemente que ele permite ao paciente desenvolver todo o seu potencial genético para a mudança espacial favorável no relacionamento entre a maxila e a mandíbula. Os implantes não propiciam que esse relacionamento se expresse porque não têm nenhuma força atuando como mecânica de elástico com direção de Classe II. Portanto, o uso de elásticos com direção da Classe II, de elásticos verticais anteriores e do headgear é fundamental. Seria muito difícil usar mini-implantes em vez do aparelho extrabucal de tração alta no sistema de força direcional Tweed-Merrifield. O headgear pode ser usado nos arcos dentários superior e inferior, e os ganchos (ponto de aplicação da força) podem ser colocados variando entre incisivos laterais e caninos ou entre incisivos centrais e laterais na arcada dentária superior. Forças aplicadas a partir de mini-implantes não podem ser usadas com essa variação. Seria necessário instalar seis ou oito mini-implantes para conseguir o mesmo efeito que se pode conseguir com um headgear do tipo tração alta com ganchos em "J". Isso não parece ser prático. O paciente sofreria traumas desnecessários com a colocação de tantos mini-implantes. O headgear é muito mais seguro e muito mais confiável. Assim, no meu entendimento, o headgear com gancho em "J" vai continuar a ser usado; os mini-implantes também poderão serão usados, mas somente quando indicados. A versatilidade dos dois não é comparável. O headgear com gancho em "J" ganha a competição da headgear.

A mecânica de Tweed-Merrifield é muito apropriada para o tratamento de más oclusões de Classe II em pacientes com "face longa" (FMA extremamente alto). Entre os vários casos apresentados pelo Dr. Vaden, nos impressiona o tratamento de Classes II em pacientes de "face curta" (FMA extremamente baixo). Quais as diferenças da mecânica de Tweed-Merrifield para o tratamento das Classes II com "face curta" e com "face longa"? Hiroshi Maruo

Os pacientes com "face curta" devem ser tratados deixando-se os incisivos inferiores em suas posições de pré-tratamento. Não podem ser movidos para a frente para melhorar o apinhamento ou para nivelar a curva de Spee. Os pacientes com face longa devem ter os incisivos inferiores muito verticais e a retração subsequente dos incisivos superiores. O controle vertical dos molares superiores e inferiores é muito mais crítico em pacientes de face longa do que em pacientes com face curta. Se os molares não forem controlados no paciente com face longa, o queixo sofre uma rotação para baixo e para trás e a face é prejudicada para sempre (Fig. 15). Embora a extrusão vertical do molar no paciente com face curta pareça ser benéfica, é extremamente difícil manter depois qualquer grau de estabilidade. Não é justo que o paciente no qual você não quer nenhuma extrusão tenha danos irreparáveis provocados pela mesma, enquanto o paciente com face curta não pode sofrer nenhum tipo da extrusão molar vertical por causa da musculatura. As forças de contração e intrusão devem ser usadas em pacientes com face longa, mas não devem, entretanto, ser usadas em pacientes com face curta.


Em sua opinião, algum conceito fundamental da Ortodontia foi modificado devido às novas tecnologias? Ana Maria Bolognese

Sua pergunta é muito interessante. NÃO, OS FUNDAMENTOS NÃO MUDAM. Os aparelhos podem mudar, o enfoque do tratamento pode mudar, mas os fundamentos não mudam. Os fundamentos do tratamento ortodôntico para obter a estética, a saúde, a função e a estabilidade em harmonia com o crescimento foram estabelecidos desde o tempo de Kingsley e Angle. Essas coisas foram debatidas e as pessoas tentaram mudá-las para servir a seus planos de tratamento, sistemas da força ou caprichos individuais, mas estas mudanças não duraram. Os fundamentos permanecerão para sempre. É importante saber apreciar e compreender os fundamentos, a fim de poder usar qualquer tipo de aparelho ortodôntico ou sistema de forças. Afastando-se dos fundamentos, você irá comprometer a estética, a saúde, a função, a estabilidade e a harmonia entre o tratamento e o crescimento.

É incontestável a eficiência da filosofia de Tweed-Merrifield na mecânica de preparo de ancoragem e controle do crescimento facial. Existe, nos casos sem crescimento, a indicação para associá-la à ancoragem esquelética? Ana Maria Bolognese

Existe a ancoragem esquelética rígida com o uso dos mini-implantes. Os coreanos e os japoneses aperfeiçoaram essa sintonia. Um excelente caso clínico, que eu uso como "padrão" para esse tipo de tratamento, foi relatado no American Journal of Orthodontics and Dentofacial Orthopedics, por J. M. Chae2. Minha observação é que a ancoragem com mini-implantes será a ferramenta que o ortodontista sério vai usar como auxiliar para corrigir severas más oclusões em pacientes adultos. Penso também que a maioria de ortodontistas não usará esses mini-implantes nos pacientes em crescimento porque existem muitas outras opções de ancoragem que oferecem mais versatilidade de aplicação. Para o paciente que não tem nenhum potencial de crescimento, entretanto, o sistema de ancoragem esquelética com mini-implantes tem muitas vantagens, porque permite o controle vertical e horizontal da dentição de uma forma mais fácil.

Como você vê o futuro da Ortodontia? Estelio Zen

Minha resposta é simples: eu estou muito preocupado com o futuro da Ortodontia. Parece que a influência das fabricantes de aparelhos e o desejo de muitos especialistas em saber quantos pacientes podem atender em um dia no consultório e quanto dinheiro podem ganhar com isso está destruindo a qualidade do tratamento ortodôntico. Se essa tendência não se reverter, teremos então uma especialidade que não fará mais tratamento ortodôntico, mas simplesmente alinhará dentes. Há uma diferença entre um ortodontista e um especialista em alinhamento dos dentes. Se nós, como especialistas, não fizermos nada, mas simplesmente alinharmos os dentes; se nós não criarmos e mantivermos boas faces; se nós não dermos aos nossos pacientes um resultado de tratamento que seja estável a longo prazo, sem contenção permanente; se nosso resultado não for saudável e funcional, a Ortodontia como especialidade simplesmente não existirá mais. O dentista clínico geral, em qualquer país do mundo, pode colar acessórios sobre os dentes e usar algum "fio mágico" para alinhar os dentes. Nós, enquanto especialistas em Ortodontia, devemos ter sempre em mente que é nossa obrigação informar ao paciente que ele tem direito ao melhor que a especialidade pode oferecer. Aproveito agora para me referir ao editorial de Lysle Johnston1, publicado no World Journal of Orthodontics, intitulado "Quando tudo funciona e nada importa": a menos que comecemos a tomar alguma atitude, nossa sobrevivência a longo prazo estará em perigo.

Começam a aparecer sinais de esperança. Muitos clínicos estão se desencantando com os "aparelhos mágicos". Parece haver um ressurgimento dos fundamentos dos planos de tratamento e da manipulação do arco (fio de aço). O curso de Tweed (Tweed Study Course) nunca foi tão procurado como é hoje. Eu tenho encontrado com muitos ortodontistas novos que estão fazendo um trabalho muito bom em seus consultórios. Eles estão interessados na qualidade, e não na quantidade. Assim, mesmo que o pêndulo ainda balance demasiadamente em direção ao tratamento com "aparelhos inteligentes", já começa a aparecer o retorno à busca pelo plano de tratamento com um interesse pela estética facial e estabilidade em longo prazo. Muitos dos novos ortodontistas que vemos estão limitando o número de pacientes em seus consultórios, de forma que possam atendê-los confortavelmente, e estão limitando o tamanho da equipe de funcionários de forma compatível com sua renda. O débito adquirido é um dos grandes problemas que todos os estudantes agora têm que resolver. Ele tem forçado muitos jovens ortodontistas a fazer coisas que sabem que não deveriam estar fazendo. Se pudéssemos fazer algo para minimizar o débito do estudante, penso que o pêndulo balançaria para trás, em direção ao centro, de uma forma mais rápida. Assim, não é só maldição e trevas, mas há muitas boas indicações de que os pacientes da próxima geração de ortodontistas serão melhor atendidos do que os de agora.

Qual o recado que o senhor daria para os ortodontistas brasileiros em relação a receberem a certificação do Board Brasileiro de Ortodontia e Ortopedia Facial (BBO)? Estelio Zen

A certificação do Board é uma extraordinária experiência de aprendizagem. O ortodontista que tem o certificado do Board tem uma autocrítica muito grande do trabalho que ele presta a seus pacientes. O autoexame é uma coisa muito boa. Ser avaliado é muito bom. Se seu trabalho for avaliado e aceito por seus pares é porque você está fazendo um tratamento de padrão excelente para seus pacientes. Fica comprovado que você é um ortodontista melhor se você se autoexaminou e permitiu que seus pares o examinassem. Esse fato o torna melhor. A certificação do Board é algo que o ortodontista tem obrigação de fazer, não é algo que se faça para autopromoção. Ela é um caminho para salvar a especialidade. Eu incentivo todos os ortodontistas brasileiros a se examinarem e deixarem seus pares examinarem seus trabalhos. Esse é um passo gigantesco em busca do padrão de excelência. O Board vai ajudar cada ortodontista a se tornar melhor do que já é desde o momento que se inicia no processo de certificação. A Ortodontia fica melhor e os pacientes são melhor atendidos. Não há como fugir da certificação do Board, quer você viva na França, Japão, Austrália, Estados Unidos da América ou Brasil!

Adilson Thomazinho

- Professor doutor da Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto/USP (FORP-USP).

- Coordenador do Curso de Especialização em Ortodontia da FORP-USP.

Ana Maria Bolognese

- Pós-doutorado em Ortodontia pela Northwestern University.

- Doutorado em Odontologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

- Mestrado em Ortodontia pela UFRJ.

- Especialista em Radiologia pela UFRJ.

- Ex-diretora presidente do Board Brasileiro de Ortodontia e Ortopedia Facial.

- Detentora da Comenda Prof. José Édimo Soares Martins.

Estelio Zen

- Pós-graduado em Ortodontia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

- Mestre em Ortodontia pela UFRJ.

- Ex-diretor presidente do Board Brasileiro de Ortodontia e Ortopedia Facial.

- Detentor da Comenda Prof. José Édimo Soares Martins.

- Membro diretor do BBO.

Hiroshi Maruo

- Doutorado em Ortodontia pela Unicamp/Piracicaba.

- Mestrado em Ortodontia pela Unicamp/Piracicaba.

- Especialista em Prótese Dental pela Unicamp/Piracicaba.

- Diplomado pelo Board Brasileiro de Ortodontia e Ortopedia Facial.

José Nelson Mucha

- Doutor em Odontologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

- Mestre em Odontologia pela UFRJ.

- Especialista em Radiologia pela UFRJ.

- Ex-diretor presidente do Board Brasileiro de Ortodontia e Ortopedia Facial.

- Detentor da Comenda Prof. José Édimo Soares Martins.

  • 1. Johnston Jr. LE. When everything works and nothing matters. World J Orthod. 2002 Summer;2:92-3.
  • 2. Chae JM. A new protocol of Tweed Merrifield directional force technology with microimplant anchorage. Am J Orthod Dentofacial Orthop. 2006 Jul;130(1):100-9.
  • Endereço para correspondência:
    James L. Vaden
    D.D.S., M.S., P.C.
    308 East 1st Street, Coolville, TN 38501.USA
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      06 Maio 2010
    • Data do Fascículo
      Fev 2010
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