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Anomalias dentárias associadas: o ortodontista decodificando a genética que rege os distúrbios de desenvolvimento dentário

Resumos

O presente trabalho versa sobre o diagnóstico e a abordagem ortodôntica das anomalias dentárias, enfatizando os aspectos etiológicos que definem tais irregularidades de desenvolvimento. Parece existir uma inter-relação genética na determinação de algumas dessas anomalias, considerando-se a alta frequência de associações. Um mesmo defeito genético pode originar diferentes manifestações fenotípicas, incluindo agenesias, microdontias, ectopias e atraso no desenvolvimento dentário. As implicações clínicas das anomalias dentárias associadas são muito relevantes, uma vez que o diagnóstico precoce de uma determinada anomalia dentária pode alertar o clínico sobre a possibilidade de desenvolvimento de outras anomalias associadas no mesmo paciente ou em outros membros da família, permitindo a intervenção ortodôntica em época oportuna.

Genética; Anomalias dentárias; Agenesia; Etiologia; Ortodontia


This article aims to approach the diagnosis and orthodontic intervention of the dental anomalies, emphasizing the etiological aspects which define these developmental irregularities. It seems to exist a genetic inter-relationship determining some dental anomalies, considering the high frequency of associations. The same genetic defect may give rise to different phenotypes, including tooth agenesis, microdontia, ectopias and delayed dental development. The clinical implications of the associated dental anomalies are relevant, since early detection of a single dental anomaly may call the attention of professionals to the possible development of other associated anomalies in the same patient or in the family, allowing timely orthodontic intervention.

Genetics; Dental anomalies; Tooth agenesis; Etiology; Orthodontics


TÓPICO ESPECIAL

Anomalias dentárias associadas: o ortodontista decodificando a genética que rege os distúrbios de desenvolvimento dentário

Daniela Gamba GaribI; Bárbara Maria AlencarII; Flávio Vellini FerreiraIII; Terumi Okada OzawaIV

IProfessora doutora em Ortodontia. Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais e Faculdade de Odontologia de Bauru - Universidade de São Paulo, Bauru/SP

IIMestre em Ortodontia pela Universidade Cidade de São Paulo (Unicid), São Paulo/SP

IIICoordenador do curso de mestrado em Ortodontia da Unicid

IVProfessora do programa de pós-graduação em Ciência da Reabilitação. Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais - Universidade de São Paulo, Bauru-SP

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Daniela Gamba Garib Faculdade de Odontologia de Bauru Al. Octávio Pinheiro de Brisola 9-75 CEP: 17.012-901 - Bauru/SP E-mail: dgarib@uol.com.br

RESUMO

O presente trabalho versa sobre o diagnóstico e a abordagem ortodôntica das anomalias dentárias, enfatizando os aspectos etiológicos que definem tais irregularidades de desenvolvimento. Parece existir uma inter-relação genética na determinação de algumas dessas anomalias, considerando-se a alta frequência de associações. Um mesmo defeito genético pode originar diferentes manifestações fenotípicas, incluindo agenesias, microdontias, ectopias e atraso no desenvolvimento dentário. As implicações clínicas das anomalias dentárias associadas são muito relevantes, uma vez que o diagnóstico precoce de uma determinada anomalia dentária pode alertar o clínico sobre a possibilidade de desenvolvimento de outras anomalias associadas no mesmo paciente ou em outros membros da família, permitindo a intervenção ortodôntica em época oportuna.

Palavras-chave: Genética. Anomalias dentárias. Agenesia. Etiologia. Ortodontia.

INTRODUÇÃO

Caracterizada por complexos e precisos processos biológicos de substituição de dentes decíduos por dentes permanentes, a dentadura mista representa uma das manifestações de perfeição da natureza. Mas, como todo curso natural, o desenvolvimento da dentição pode mostrar algumas imperfeições e, no transcorrer da dentadura mista - com certa frequência -, o profissional depara-se com irregularidades odontogênicas: as anomalias dentárias. As anomalias expressam-se com distintos graus de severidade. Da manifestação mais branda para a mais severa - representadas, respectivamente, desde o atraso cronológico na odontogênese até a ausência completa do germe dentário ou agenesia -, existe uma miríade de expressões, compreendendo as microdontias, os desvios na morfologia dentária e as ectopias. Este artigo volta-se aos erros da natureza aplicados ao desenvolvimento da dentição, discutindo a etiologia das anomalias dentárias, os detalhes para um acurado diagnóstico, assim como algumas condutas terapêuticas no intento de interceptá-las em época conveniente.

A influência de fatores genéticos e ambientais na etiologia das más oclusões representa tema de grande importância na Ortodontia. Quanto maior a contribuição genética na origem de uma irregularidade dentofacial, menor a possibilidade de preveni-la e, como regra, pior o prognóstico de tratamento ortodôntico/ortopédico22. E os novos rumos da pesquisa em Odontologia caminham para o conhecimento do genótipo humano30. Diversos estudos sugeriram uma tendência genética e hereditária na etiologia das anomalias dentárias de número, tamanho, posição, assim como nos distúrbios de erupção2,4,13,14,15,17,18,20,23,24,25,30 . Tais evidências provêm de investigações em famílias17,18,30, em gêmeos monozigóticos20, e da observação de associações na ocorrência de determinadas anomalias2,4,13,14,15,23,24,25.

Quando uma determinada irregularidade mostra uma prevalência aumentada em famílias de pacientes afetados, comparado às prevalências esperadas para a população em geral, credita-se à genética uma influência predominante na etiologia do problema. O prognatismo mandibular da família imperial austro-húngara Hapsburg representa o mais clássico exemplo de característica genética de interesse ortodôntico, em humanos, transmitida por sucessivas gerações22. Muitas das anomalias dentárias discutidas durante esse estudo mostraram prevalências aumentadas em famílias de pacientes afetados17,18,30, como ilustrado nas figuras 1 a 7. Atualmente, a leitura do código genético pode isolar genes mutantes em famílias, desde que diversos membros expressem a mesma irregularidade30.


Gêmeos monozigóticos compartilham códigos genéticos idênticos. Portanto, as características geneticamente definidas expressam-se em ambos os gêmeos monozigóticos de maneira semelhante. Quando se constata uma alta concordância para uma determinada irregularidade, em pares de gêmeos homozigóticos, conclui-se que a genética consiste na etiologia primordial de tal anormalidade. Diferentemente, gêmeos heterozigóticos, por apresentarem genótipos distintos, manifestam baixo índice de concordância para a mesma irregularidade. Estudos prévios com gêmeos constituem importantes evidências sobre o caráter genético de determinadas anomalias dentárias20,22.

Certas anomalias dentárias aparecem frequentemente associadas em um mesmo paciente, mais do que se esperaria ao acaso. Isso se explica porque um mesmo defeito genético pode originar diferentes manifestações ou fenótipos, incluindo agenesias, microdontias, ectopias e atraso no desenvolvimento2,4,13,14,15,23,24,25. De uma maneira simplista, poderíamos dizer que um gene "defeituoso" ou mutante pode se expressar diversamente em diferentes dentes permanentes. A associação entre a agenesia unilateral do incisivo lateral superior e a microdontia do incisivo contralateral, frequentemente observada na rotina clínica, ilustra bem essa condição. Nesse caso, o mesmo defeito genético que determinou a agenesia se expressou de forma incompleta do lado oposto da arcada, ocasionando a microdontia. No entanto, as associações entre as anomalias dentárias não se restringem a esse clássico exemplo. Existem muitas outras interações entre distintas anomalias dentárias, que serão expostas ao longo do desenvolvimento deste artigo. As implicações clínicas são importantes, pois o diagnóstico precoce de uma determinada anomalia dentária pode alertar o profissional para o possível desenvolvimento de outras anomalias associadas, no mesmo paciente ou em familiares, possibilitando o diagnóstico e interceptação ortodôntica oportunos.

Esse artigo objetiva auxiliar o clínico a reconhecer as principais anomalias dentárias de origem essencialmente genética, discutindo nuances importantes do diagnóstico e tratamento ortodôntico precoce. Adicionalmente, visa promover o entendimento do padrão de anomalias dentárias associadas.

Agenesias dentárias

A agenesia dentária constitui a anomalia de desenvolvimento mais comum da dentição humana, ocorrendo em aproximadamente 25% da população13. O terceiro molar representa o dente mais afetado por essa anomalia, exibindo uma prevalência de 20,7%13. Excluindo-se os terceiros molares, a prevalência de agenesia é de aproximadamente 4,3 a 7,8%. Os segundos pré-molares inferiores representam os dentes mais comumente ausentes, seguidos pelo incisivo lateral superior e pelos segundos pré-molares superiores26. Em pacientes leucodermas, a ocorrência da agenesia dentária poderia ser classificada como: comum, quando afeta os segundos pré-molares inferiores, os incisivos laterais superiores e os segundos pré-molares superiores; menos comum, que inclui, em ordem decrescente de ocorrência, os incisivos centrais inferiores, os incisivos laterais inferiores e primeiros pré-molares superiores, caninos superiores e segundos molares inferiores; e raras, compreendendo, em ordem decrescente de frequência, a agenesia de primeiros e segundos molares superiores, caninos inferiores, primeiros molares inferiores e incisivos centrais superiores26. É importante lembrar que existe uma diferença étnica na prevalência de agenesias. Estudos epidemiológicos mostram uma menor prevalência de agenesias em pacientes negros - se comparados aos leucodermas -, enquanto os asiáticos tendem a mostrar uma frequência aumentada de agenesia26. Mesmo dentre indivíduos leucodermas de diferentes continentes, as prevalências de agenesias oscilam suavemente26. Por exemplo, caucasianos europeus e australianos apresentam uma prevalência maior de agenesia se comparados aos caucasianos norte-americanos26. Existem também diferenças sexuais na prevalência de agenesias. De um modo geral, as mulheres são mais afetadas que os homens26. A grande maioria dos pacientes com agenesia (76 a 83%) exibe a ausência de um ou dois dentes permanentes26. A ocorrência unilateral predomina, com exceção da agenesia dos incisivos laterais superiores, em que a ocorrência bilateral supera a unilateral26.

A genética provavelmente representa o fator etiológico primordial das agenesias dentárias. A prevalência da agenesia mostra-se elevada na família de pacientes afetados22. As figuras 1 a 7 apresentam membros de uma família brasileira, com casamentos consanguíneos, demonstrando agenesia de múltiplos dentes permanentes. Recentemente, identificou-se uma mutação no gene MSX1 do cromossomo 4 numa ampla família com agenesia de todos os segundos pré-molares e terceiros molares30.

Um interessante estudo com gêmeos mostrou um alto percentual de concordância para as agenesias entre gêmeos homozigóticos, enquanto todos os pares de gêmeos heterozigóticos mostraram discordância para a referida anomalia dentária20.

Na década de 60, Garn e Lewis14 observaram que pacientes com agenesia de terceiros molares apresentaram prevalência aumentada de agenesias de outros dentes permanentes. A prevalência de agenesia de dentes permanentes em pacientes com agenesia de terceiros molares mostrou-se 13 vezes maior do que a prevalência de agenesia em pacientes que apresentavam todos os terceiros molares presentes. Mesmo dentes mais estáveis - como incisivos centrais, caninos e primeiros pré-molares - estavam ausentes no grupo com agenesia de terceiros molares. A explicação é que um mesmo defeito genético pode dar origem a diversas anomalias, em outras palavras, duas ou mais agenesias no mesmo paciente podem apresentar origem genética comum.

Resultados semelhantes foram observados em pacientes com agenesia de segundos pré-molares13 (Gráf. 1). Nesses pacientes, a probabilidade de ocorrência de agenesia de outros dentes permanentes, excluindo os terceiros molares, mostrou-se aproximadamente cinco vezes maior (21%). A chance de ocorrência de agenesia de terceiros molares apresentou-se mais de três vezes maior (48%). De modo interessante, quanto maior o número de segundos pré-molares ausentes, maior a prevalência de agenesia de outros dentes permanentes. Pacientes com um ou dois segundos pré-molares ausentes apresentaram uma prevalência de agenesia de outros dentes permanentes de aproximadamente 15%. Por outro lado, quase 50% dos pacientes com ausência de três ou quatro segundos pré-molares mostraram agenesia de outros dentes permanentes.


As agenesias frequentemente associam-se com outros tipos de anomalias dentárias, incluindo microdontias15, ectopias (erupção ectópica dos caninos superiores para palatino, transposições dentárias, distoangulação dos segundos pré-molares inferiores e erupção ectópica dos primeiros molares superiores)2,4,13,14,15,23,24,25, infraoclusão dos molares decíduos2,13, atrasos no desenvolvimento dentário1 e hipoplasia generalizada do esmalte2. Essas constatações ressaltam o papel dos genes na etiologia dessas anomalias dentárias, assim como embasam o clínico para uma maior compreensão de seus pacientes. Em termos práticos, quando se diagnostica uma anomalia dentária, fique atento e procure por outras.

Microdontia

As agenesias, frequentemente, associam-se a microdontias2,13,15. A redução no tamanho dentário representa uma expressão parcial do mesmo defeito genético que define a agenesia. Isso explica a clássica associação entre a agenesia unilateral do incisivo lateral superior e a microdontia do dente contralateral (Fig. 8). Aproximadamente 20% dos pacientes com agenesia de segundos pré-molares também apresentam microdontia dos incisivos laterais superiores2,13 (Fig. 9).



Como regra, pacientes com agenesia mostram uma redução generalizada e significativa no tamanho dentário, e essa redução não se mostra uniforme, pois os dentes anteriores (incisivos e caninos) aparecem mais reduzidos do que os dentes posteriores (pré-molares e molares)15. E diante de agenesias múltiplas, a redução do tamanho dentário é ainda mais marcante15 (Fig. 10).


Estas informações apresentam implicações clínicas importantes. Raramente o ortodontista observará apinhamento em casos com agenesias, enquanto a discrepância dente-osso positiva ou o espaçamento representam um achado comum nesses pacientes. Dessa maneira, o tratamento ortodôntico corretivo dificilmente envolverá extrações dentárias. O desafio maior nesses pacientes será o fechamento dos espaços generalizados, principalmente quando o contorno do perfil facial dita que a mesialização dos dentes posteriores deve prevalecer sobre a retração dos dentes anteriores.

Erupção ectópica dos primeiros molares superiores

Durante o início da dentadura mista, os primeiros molares permanentes irrompem na arcada dentária, guiando-se pela face distal dos segundos molares decíduos. A erupção dos primeiros molares superiores desenha uma trajetória direcionada para oclusal e mesial. Dessa forma, a natureza corrige a distoangulação dos germes no interior do tuber da maxila, e os primeiros molares superiores irrompem com seu longo eixo mais verticalizado em relação ao plano oclusal. Porém, em 4% das crianças, o primeiro molar superior "erra" a sua trajetória eruptiva, desvia-se demasiadamente para mesial e acaba por estimular a reabsorção parcial da raiz dos segundos molares decíduos5 (Fig. 11). Esse distúrbio foi batizado de erupção ectópica dos primeiros molares permanentes5. Aproximadamente metade dos casos apresenta um caráter reversível, e o primeiro molar superior acaba por irromper espontaneamente na arcada dentária. Nos casos irreversíveis, os primeiros molares, inaptos a reabsorver o esmalte dentário, permanecem retidos por cervical da coroa dos segundos molares decíduos5.


E qual a etiologia desse distúrbio eruptivo? Na década de 80, relacionava-se a erupção ectópica dos primeiros molares à deficiência de espaço na região posterior da maxila. No entanto, Kurol e Bjerklin17 mostraram que a prevalência dessa anomalia nas famílias de pacientes afetados correspondia a aproximadamente 20%, muito aumentada em relação à população em geral (4%), denunciando uma tendência genética na etiologia da erupção ectópica. Quase 10 anos depois, Bjerklin, Kurol e Valentin4 reforçaram essa evidência ao constatar que a erupção ectópica dos primeiros molares superiores frequentemente associa-se com outras anomalias dentárias de caráter genético, como a infraoclusão dos molares decíduos, a erupção ectópica dos caninos superiores e a agenesia de segundos pré-molares. A prevalência dessas anomalias em pacientes com erupção ectópica dos primeiros molares correspondeu a 20,7%; 5,4% e 6,5%, respectivamente - frequências maiores do que as esperadas para a população em geral. Invertendo o foco de observação, Baccetti2 mostrou que pacientes com infraoclusão de molares decíduos, agenesia de segundos pré-molares ou microdontia do incisivo lateral superior tinham duas a três vezes mais chances de apresentar ectopia dos primeiros molares superiores. Com todas essas evidências, a erupção ectópica dos primeiros molares superiores entrou para a lista das anomalias dentárias geneticamente determinadas.

A frequência de ocorrência da erupção ectópica dos primeiros molares permanentes justifica que o ortodontista atente ao padrão eruptivo destes dentes sempre que examinar um paciente durante o primeiro período transitório da dentadura mista. Nessa fase, o sinal clínico representado pela erupção parcial do primeiro molar superior (Fig. 11A), somado ao aspecto radiográfico apontando a rizólise prematura do segundo molar decíduo e a mesioangulação dos primeiros molares permanentes (Fig. 11B), inferem o trajeto ectópico de erupção do primeiro molar. Essa anomalia deve ser interceptada precocemente, no intento de evitar a perda prematura do segundo molar decíduo e a consequente redução do perímetro da arcada dentária. A interceptação é simples e resume-se na aplicação de uma força suave, direcionada para distal, na coroa semi-irrompida do primeiro molar ectópico (Fig. 11C).

A finalidade é obter um suave movimento de inclinação distal do primeiro molar ectópico e retido. Com esse intento, uma diversidade de aparelhos pode ser utilizada. Após o tratamento, o prognóstico de permanência do segundo molar decíduo na arcada dentária até a sua fase normal de esfoliação mostra-se muito bom, mesmo diante de uma rizólise atípica de magnitude variável e precoce.

Transposição entre incisivo lateral e canino permanentes inferiores

Conceitua-se como transposição dentária, a ectopia de dentes permanentes que redunda na inversão de suas posições naturais na arcada dentária, no mesmo quadrante6. Dois tipos de transposições dentárias são apontados na literatura como apresentando etiologia essencialmente genética e, portanto, comumente associadas a outras anomalias dentárias: a transposição entre canino e primeiro pré-molar na arcada superior, e a transposição entre canino e incisivo lateral permanentes na arcada inferior25.

Uma transposição quase sempre incompleta entre o incisivo lateral e o canino inferiores resulta da erupção ectópica do incisivo lateral para distal, durante o primeiro período transitório da dentadura mista. Nessa circunstância, o dente ectópico é o incisivo lateral. O canino permanente mantém-se em seu trajeto eruptivo normal. O incisivo lateral inferior permanente, quando "erra" o seu trajeto eruptivo, desloca-se para distal, com uma marcante angulação de seu longo eixo de modo que a coroa desloca-se para distal (geralmente com rotação mesiolingual), chocando-se contra e reabsorvendo a raiz do primeiro molar decíduo, enquanto o ápice radicular localiza-se próximo à sua posição normal (Fig. 12). No final do segundo período transitório da dentadura mista - quando o problema não é interceptado -, o canino inferior, geralmente em sua posição normal na arcada dentária, ao irromper define a transposição dentária.


Essa anomalia apresenta uma prevalência rara, aparecendo em aproximadamente 0,03% da população, e afeta predominantemente o gênero feminino (75% dos casos). Expressa-se bilateralmente em, aproximadamente, 17% dos casos e, quando ocorre unilateralmente, o lado direito aparece mais afetado (68%) do que o esquerdo (32%)23.

Existem algumas evidências de que a etiologia da transposição entre o incisivo lateral e o canino inferior apresenta um caráter genético23,25. Peck, Peck e Kataja23, numa notável amostra de 60 pacientes com esse tipo de transposição, acharam uma prevalência aumentada de agenesias e de incisivos laterais conoides associada a essa anomalia de posição (Tab. 1). Mais especificamente, essa modalidade de transposição associa-se com alta prevalência de agenesias de segundos pré-molares e terceiros molares, enquanto a prevalência de agenesia de incisivos laterais superiores não difere da população em geral23.

Na dentadura permanente, o tratamento da transposição entre o incisivo lateral e o canino inferior resume-se no alinhamento, mantendo a posição permutada desses dentes na arcada dentária23. Duas razões justificam essa abordagem terapêutica. A primeira delas é o paralelismo radicular dos dentes envolvidos na transposição, observado após o estágio de dentadura mista23. Outra característica morfológica local que invalida a tentativa de reverter a ordem dentária diz respeito à quantidade de osso disponível na mandíbula, no sentido vestibulolingual. Diferentemente, quando a transposição é diagnosticada mais precocemente, ainda na dentadura mista, o tratamento interceptor bem conduzido pode prevenir a determinação efetiva da transposição. No estágio que precede a erupção do canino inferior, somente a coroa do incisivo lateral mostra-se em posição ectópica, enquanto o ápice mantém sua posição normal23,29. Nessa fase, a verticalização do incisivo lateral inferior, mediante mecânica com aparelho fixo parcial, ou nivelamento 4x2, evita a ocorrência da transposição com a erupção dos caninos inferiores29 (Fig. 13).


Erupção ectópica dos caninos permanentes superiores

Os caninos superiores representam os dentes que se formam mais distantes da arcada dentária, ladeando a cavidade piriforme e, portanto, desenham o trajeto mais longo de erupção dentre todos os dentes permanentes. Por isso também apresentam a raiz mais longa, comparativamente a toda a dentição permanente. Enquanto se movimentam em direção à cavidade bucal, sua coroa volumosa atravessando o estreito rebordo alveolar superior pode ser palpada sob a mucosa vestibular, acima dos caninos decíduos10. Quando essa palpação é positiva, significa que esses dentes apresentam um excelente prognóstico de erupção espontânea10. No entanto, em aproximadamente 1,5% da população, os caninos assumem uma trajetória ectópica de erupção, desviando-se para palatino em relação aos incisivos laterais13. Ao encontrar uma cortical óssea densa, recoberta por uma mucosa palatina espessa e fibrosa, acabam ficando retidos.

A erupção ectópica dos caninos superiores para palatino (EECP) representa uma anomalia dentária que preocupa o ortodontista sob dois aspectos biologicamente relevantes. Além de impedir a erupção espontânea dos caninos, em uma expressiva porcentagem dos casos, a erupção ectópica dos caninos superiores redunda em algum grau de reabsorção radicular dos dentes vizinhos11.

Mas qual a etiologia da erupção ectópica dos caninos permanentes superiores? O que leva esses dentes a assumirem um trajeto eruptivo completamente não usual?

A retenção dos caninos superiores por vestibular relaciona-se à falta de espaço na arcada dentária e, geralmente, representa uma manifestação clínica do apinhamento dentário16. Por outro lado, na maioria dos casos de caninos retidos por palatino, existe espaço suficiente para acomodar todos os dentes no perímetro da arcada dentária16. Na década de 90, Peck, Peck e Kataja24 compilaram algumas evidências - provenientes da literatura pregressa - de que a erupção ectópica dos caninos superiores por palatino apresenta uma etiologia predominantemente genética. Listaram fortes indícios para sustentar tal hipótese, como a ocorrência concomitante com outras anomalias dentárias, os relatos de história familiar dessa anomalia, a frequente ocorrência bilateral e as diferenças nas prevalências entre os gêneros e entre diferentes populações. Tais assertivas renderam indignação por parte de alguns ortodontistas, que relutavam em acreditar que os caninos erram seu trajeto de erupção por algum motivo além de fatores meramente locais, tais como a morfologia da raiz dos incisivos laterais, a ausência dos incisivos laterais ou a "resistência" dos caninos decíduos à rizólise3.

Poucos anos mais tarde, os mesmos autores constataram que pacientes com erupção ectópica dos caninos permanentes por palatino apresentam uma prevalência significativamente aumentada de agenesias de dentes permanentes (17%, desconsiderando-se os terceiros molares), sobretudo dos segundos pré-molares inferiores, ausentes em 14% dos casos25. Ainda observaram que essa ectopia envolvendo os caninos superiores associa-se constantemente com a microdontia dos incisivos laterais permanentes, observada em 17% dos casos, não necessariamente no mesmo quadrante do distúrbio eruptivo dos caninos. Esses pesquisadores concluíram que a erupção ectópica dos caninos por palatino, as agenesias e a microdontia seriam covariáveis biológicas que compartilham uma origem genética comum.

Somando-se a essas contundentes evidências sobre a influência dos genes na etiologia da EECP, observou-se que pacientes com essa ectopia tendem a apresentar atraso na odontogênese e uma redução generalizada no tamanho dentário. Essa última informação explica porque a grande maioria dos casos de EECP não apresentam apinhamento dentário e podem ser solucionados ortodonticamente sem extrações.

Sob o ângulo de observação inversa, verificou-se que pacientes com agenesias dentárias, microdontia de incisivos laterais, infraoclusão de molares decíduos ou hipoplasia generalizada de esmalte apresentam chances mais elevadas de desenvolver erupção ectópica do canino para palatino no transcorrer da dentadura mista2,13. Esses dados apresentam importância clínica extrema quando consideramos a possibilidade de diagnóstico precoce da EECP. O clínico deve estar consciente de que, de um modo genérico, uma criança apresenta aproximadamente 1,5% de chances de apresentar erupção ectópica dos caninos superiores para palatino, enquanto uma criança com agenesia de pelo menos um segundo pré-molar, por exemplo, apresenta uma chance cinco vezes maior de desenvolver o mesmo distúrbio de erupção13 (Fig. 14). A associação fica ainda mais estreita com a microdontia, uma vez que um estudo na população italiana mostrou que 34% dos pacientes com incisivo lateral superior conoide desenvolvem erupção ectópica dos caninos superiores para palatino2. A infraoclusão de molares decíduos (Fig. 15), assim como a hipoplasia generalizada do esmalte (Fig. 16), também representam irregularidades que anunciam precocemente um risco mais elevado para o desenvolvimento da EECP2. Essas informações, sem dúvida nenhuma, refinam a capacidade de diagnóstico precoce da EECP. Levando em conta que a erupção ectópica dos caninos pode ser interceptada precocemente9 - prevenindo a reabsorção radicular dos incisivos adjacentes, assim como a retenção dos caninos -, torna-se imperativo que o clínico centre sua atenção no desenvolvimento eruptivo dos caninos superiores em todos as crianças, e especialmente naquelas que apresentam alguma das anomalias dentárias inter-relacionadas com a EECP. Essas anomalias dentárias funcionam como indicadores de risco para o desenvolvimento da EECP.




Transposição entre canino e primeiro pré-molar superiores

Excluindo os terceiros molares, os caninos superiores constituem os dentes permanentes que mais frequentemente demonstram distúrbios eruptivos. Além da erupção ectópica por palatino, outra importante, porém bem menos frequente, ectopia que envolve os caninos superiores consiste na transposição entre esse dente e o primeiro pré-molar superior. O quadro clínico típico mostra o canino superior permanente irrompido por vestibular entre os dois pré-molares superiores. Frequentemente, o canino apresenta-se girado para distal e o primeiro pré-molar apresenta-se girado para mesial e com uma angulação da coroa para distal. Esse é o tipo de transposição mais comum na espécie humana e acomete aproximadamente de 0,03 a 0,25% da população. Aproximadamente em ¼ dos casos expressa-se bilateralmente, com uma ocorrência predominante no gênero feminino (proporção entre os gêneros = 1,5:1)25.

A etiologia da transposição entre o canino e o primeiro pré-molar superior correlaciona-se com fatores genéticos25. Na literatura, muitos relatos de casos clínicos reportaram um ou mais membros da família mostrando a mesma característica, sem, contudo, identificar histórico de trauma na região dentofacial. Além disso, pacientes com transposição entre canino e primeiro pré-molar superiores apresentam uma expressiva prevalência de agenesia de dentes permanentes, excluindo os terceiros molares, equivalente a aproximadamente 37% a 40%25 (Fig. 17). Especificamente essa modalidade de transposição associa-se com uma alta prevalência de agenesias de segundos pré-molares (12%) e incisivos laterais superiores (26%), enquanto a prevalência de agenesia de terceiros molares não difere da população em geral25. A microdontia do incisivo lateral representa outra anomalia dentária frequentemente associada à transposição entre o canino e o primeiro pré-molar superior, como se observa em aproximadamente 16% dos casos25.


Na dentadura permanente completa, o tratamento desse tipo de transposição é desafiador quando se almeja corrigir a posição invertida dos dentes envolvidos6. Esse planejamento demanda mecânicas mais complexas e um período mais prolongado de tratamento. Por essa razão, esses casos geralmente são tratados mantendo-se a posição invertida dos dentes envolvidos, movimentando os primeiros pré-molares para mesial e nivelando os caninos entre os dois pré-molares6. A presença frequente de agenesias e microdontias associadas geralmente dificulta ainda mais o planejamento.

A transposição entre caninos e primeiros pré-molares superiores é passível de interceptação ortodôntica. A época mais oportuna para tanto mostra-se muito específica: logo após a erupção do primeiro pré-molar, porém antes da erupção dos caninos superiores. Nesses casos, o primeiro passo consiste na correção do longo eixo dos primeiro pré-molar com aparelho fixo, procedimento possível devido à posição vestibular ocupada pelo canino permanente ainda não-irrompido. Esse procedimento é seguido pela extração do canino decíduo no mesmo quadrante e, finalmente, pela exposição cirúrgica, colagem e tracionamento do canino permanente para sua posição usual na arcada dentária.

Distoangulação do segundo pré-molar inferior

A ectopia mais comumente observada nos segundos pré-molares inferiores refere-se à distoangulação do germe19. Tal ectopia relaciona-se com a agenesia do segundo pré-molar inferior homólogo28 (Fig. 18). Shalish et al.28, numa amostra de pacientes com agenesia unilateral dos segundos pré-molares inferiores, observaram que o germe do dente contralateral apresentava-se em média 10º mais angulado para distal, em comparação a um grupo controle sem agenesias. Concluíram, assim, que a distoangulação dos segundos pré-molares inferiores representa um diferente fenótipo ou uma expressão mais branda do mesmo defeito genético que ocasionou a agenesia. Esse tipo de associação assemelha-se muito ao clássico quadro clínico composto pela observação da microdontia do incisivo lateral superior em pacientes com agenesia unilateral do referido dente.


A ocorrência da distoangulação na população em geral é bastante rara, considerando-se sua prevalência de 0,19%19. Diferentemente, em pacientes com agenesia de pelo menos um segundo pré-molar, essa prevalência cresce para 7,8%13. Portanto, o risco relativo de um paciente com agenesia de segundo pré-molar apresentar também essa anomalia mostra-se 45 vezes maior. Uma informação interessante, proveniente de um estudo em brasileiros, é que a distoangulação dos segundos pré-molares inferiores não é observada somente em indivíduos com agenesia unilateral dos segundos pré-molares inferiores, mas também em pacientes com agenesia dos segundos pré-molares superiores13. Aproximadamente 25% dos casos de distoangulação foram observados em pacientes com agenesia de pré-molares superiores, enquanto os outros 75% dos pacientes com essa ectopia apresentavam agenesia unilateral dos segundos pré-molares na arcada inferior13. Portanto, o clínico não deve surpreender-se ao observar essa anomalia de posição em pacientes com agenesias.

A distoangulação do segundo pré-molar inferior geralmente se autocorrige e não exige intervenção12. Essa ectopia define-se em estágios precoces da odontogênese. À medida que a rizogênese se processa, o germe vai assumindo uma posição cada vez mais vertical, até irromper espontaneamente na arcada dentária (Fig. 19). Acompanhar o desenvolvimento dentário longitudinalmente constitui o único procedimento necessário. No entanto, quando a distoangulação apresentar um caráter severo, morfologicamente traduzido por uma posição mais horizontal do germe, a erupção espontânea torna-se imprevisível (Fig. 20). Nesses casos, a ectopia associa-se frequentemente com o atraso no desenvolvimento dentário e pode exigir tracionamento ortodôntico12.



Infraoclusão dos molares decíduos

A infraoclusão dos molares decíduos acomete aproximadamente 8,9% das crianças e caracteriza-se pela localização da face oclusal dos molares em questão aquém do plano oclusal18. Sugere-se que a infraoclusão dos molares represente uma consequência da anquilose dentária. Em algum ponto da raiz, uma ponte de tecido mineralizado substitui o espaço do ligamento periodontal, unindo osso alveolar e cemento. A partir desse momento, o dente inapto a desenvolver-se no sentido vertical vai ficando progressivamente em infraoclusão, à medida que a face cresce.

Uma sequência de evidências apontou que a genética apresenta influência na determinação da infraoclusão dos molares decíduos. Kurol18 verificou que a prevalência da infraoclusão mostra-se bastante aumentada em irmãos de pacientes afetados, de modo que a prevalência dessa irregularidade alcança aproximadamente 20%, ou seja, o dobro do esperado para a população em geral. Bjerklin, Kurol e Valentin4 constataram associação entre a ocorrência da infraoclusão dos molares decíduos e a erupção ectópica dos primeiros molares permanentes superiores, erupção ectópica dos caninos superiores e a agenesia de segundos pré-molares.

Baccetti2 constatou que pacientes com infraoclusão de molares decíduos apresentam uma prevalência significativamente aumentada de agenesia de segundos pré-molares (14%), incisivo lateral conoide (13%), erupção ectópica dos primeiros molares (18%) e dos caninos superiores para palatino (14%). Além disso, o autor verificou que pacientes selecionados por uma dessas anomalias dentárias também apresentam prevalência aumentada de infraoclusão de molares decíduos. Garib, Peck, Gomes13 verificaram que 25% dos pacientes com agenesia de segundos pré-molares apresentaram infraoclusão dos molares decíduos, o equivalente a ¼ dos pacientes. Essa prevalência mostrou-se significativamente aumentada em relação ao esperado para a população em geral (8,9%). Isso quer dizer que pacientes com agenesia de segundos pré-molares apresentam três vezes mais riscos de desenvolver a infraoclusão do que o restante da população em geral.

A infraoclusão de um molar decíduo não influencia o ritmo da odontogênese do sucessor permanente que, geralmente, irrompe na época esperada, com no máximo 6 meses de atraso. Portanto, a infraoclusão suave ou moderada requer apenas acompanhamento longitudinal. Contrariamente, a infraoclusão severa, assim classificada quando o plano oclusal do molar decíduo afetado já se encontra abaixo do ponto de contato com os dentes vizinhos, necessita de intervenção (Fig. 15A). Nessas condições, o molar decíduo não pode mais funcionar como mantenedor de espaço, existe o risco de redução no perímetro da arcada além da probabilidade do dente decíduo ficar totalmente subgengival com a progressão da infraoclusão. Baseado nessas justificativas, a conduta terapêutica mais coerente consiste na extração do dente decíduo afetado e na instalação de um aparelho mantenedor de espaço (Fig. 15B).

Atraso no desenvolvimento dentário

Pacientes com agenesia tendem a apresentar um desenvolvimento odontogênico mais lento e a idade dentária atrasada em relação à idade cronológica1. Explicada pela inter-relação genética na causalidade dessas anomalias, essa informação merece atenção do clínico. Os jovens com agenesias dentárias geralmente alcançam a maturidade oclusal mais tardiamente. A dentadura permanente pode se completar alguns anos mais tarde do que a idade usual (Fig. 14). Por isso, o ortodontista não deve se apressar em iniciar a fase 2 do tratamento ortodôntico em tais pacientes. O diagnóstico precoce aliado ao tratamento ortodôntico corretivo tardio representaria a combinação perfeita nos casos com padrão de anomalias dentárias associadas.

Somado ao generalizado atraso no desenvolvimento dentário comumente observado em pacientes com anomalias, um tipo dentário específico pode exibir uma odontogênese marcantemente atrasada em relação ao restante da dentição: os segundos pré-molares. Os segundos pré-molares apresentam uma grande instabilidade de desenvolvimento. Além da alta prevalência de agenesia, esses dentes comumente exibem atrasos de desenvolvimento, especialmente quando existe a agenesia de outros dentes permanentes (Fig. 21, 22).



Tudo indica que o atraso odontogênico do segundo pré-molar representa uma expressão incompleta do mesmo genótipo que define a agenesia. A mineralização inicial dos segundos pré-molares inferiores ocorre em média aos 3 anos de idade (variando de 2 anos e 3 meses a 3 anos e 7 meses)21, porém esse dente pode aparecer mais tardiamente27. Geralmente, seu aparecimento tardio ocorre até por volta dos 6 anos de idade27, e alguns raros relatos da literatura mostraram o aparecimento radiográfico dos segundos pré-molares em idades ainda mais avançadas: após os 9 anos e mesmo aos 13 anos de idade8. Quando mineralizam tardiamente, irrompem tardiamente, geralmente sucedendo os segundos molares permanentes, teoricamente os últimos dentes permanentes a alcançar o plano oclusal, desconsiderando-se os terceiros molares.

Sob a luz desses conhecimentos, a constatação de segundos pré-molares não-irrompidos em pacientes na pós-adolescência não deve ocasionar preocupação (Fig. 21, 22). Se os germes estiverem bem posicionados e não existir nenhuma patologia local, significa que os segundos pré-molares apresentam um atraso desenvolvimental. O acompanhamento permitirá ao clínico assistir o seu surgimento espontâneo, ainda que tardio, na cavidade bucal.

Hipoplasia de esmalte

Apesar de ainda constituir um tema não muito explorado pela literatura, existem algumas evidências de que a hipoplasia generalizada do esmalte integra a lista de anomalias dentárias associadas, reguladas geneticamente (Fig. 16, 18). Isso porque a hipoplasia de esmalte é diagnosticada, nos casos com anomalias dentárias, mais comumente do que se esperaria ao acaso2. Além disso, em uma amostra de jovens selecionados pela presença de hipoplasia, constatou-se uma prevalência elevada de agenesias, microdontia e ectopias, incluindo a erupção ectópica dos caninos para palatino2. Dessa maneira, manchas brancas presentes generalizadamente no esmalte dos dentes permanentes, dissociadas de causas ambientais - como ingestão acentuada de flúor ou antibioticoterapia -, podem funcionar de alerta clínico para o desenvolvimento de outras anomalias dentárias no decorrer do desenvolvimento da dentição.

CONCLUSÃO

A implicação clínica do padrão de anomalias dentárias associadas é muito relevante, uma vez que o diagnóstico precoce de uma determinada anomalia dentária (como a agenesia de um segundo pré-molar ou a presença de um incisivo lateral superior cônico) pode alertar o clínico da possibilidade de desenvolvimento de outras anomalias associadas no mesmo paciente ou em outros membros da família, permitindo o diagnóstico precoce e a intervenção ortodôntica em tempo oportuno.

Enviado em: novembro de 2009

Revisado e aceito: dezembro de 2009

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  • Endereço para correspondência:
    Daniela Gamba Garib
    Faculdade de Odontologia de Bauru
    Al. Octávio Pinheiro de Brisola 9-75
    CEP: 17.012-901 - Bauru/SP
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      06 Maio 2010
    • Data do Fascículo
      Abr 2010

    Histórico

    • Aceito
      Dez 2009
    • Recebido
      Nov 2009
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