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Análise eletromiográfica do músculo orbicular da boca em jovens com Classe II, 1ª divisão, e jovens com oclusão normal

Resumos

OBJETIVO: comparar, eletromiograficamente, os potenciais de ação do músculo orbicular da boca, segmentos superior e inferior, bilateralmente, em jovens com Classe II, 1ª divisão, e em jovens com oclusão normal, verificando a ocorrência ou não de diferenças na atividade eletromiográfica entre os grupos. MÉTODOS: a amostra consistiu-se de 50 jovens do sexo feminino, com idades entre 8 e 10 anos, com ausência de tratamento ortodôntico prévio, distribuídas em dois grupos: 25 com Classe II, 1ª divisão; e 25 com oclusão normal. Para a captação dos sinais eletromiográficos, utilizaram-se eletrodos de superfície passivos de Ag/AgCl. Registrou-se a atividade muscular na situação de repouso, na contração isométrica e na contração isotônica, determinando-se o valor da RMS de cada movimento. Submeteu-se os dados coletados à análise estatística de variância e ao teste de Tukey (α=0,05). RESULTADOS: os resultados revelaram que ocorreram diferenças nas atividades eletromiográficas entre as jovens com Classe II, 1ª divisão, e as com oclusão normal. As atividades musculares mostraram-se maiores nas jovens com Classe II, 1ª divisão. CONCLUSÃO: observou-se uma menor competência do músculo orbicular da boca nas jovens do sexo feminino com Classe II, 1ª divisão.

Eletromiografia; Ortodontia; Classe II, 1ª divisão; Oclusão normal; Músculo orbicular da boca


OBJECTIVE: The purpose of this study was to compare, electromyographically, the action potential of the orbicularis oris muscle, upper and lower segment, bilaterally, in youngsters with Class II division 1 malocclusion and youngsters with normal occlusion, in order to verify the occurrence or not of the different electromyographic activity for both groups. METHODS: The sample consisted of 50 females, ranging from 8 to 10 years old, with no previous orthodontic treatment, divided into two groups: 25 with Class II division 1 malocclusion and 25 with normal occlusion. The electromyographic signals of the orbicularis oris muscle were acquired by Ag/AgCl surface electrodes. Muscle activity was recorded in resting position, in isometric contraction and in isotonic contraction, determining the RMS values of each movement. The data collected was submitted to the statistical analyses of variance and Tukey test (α=0.05). RESULTS: The results showed that there was electromyographic activity difference between the young females with Class II division 1 malocclusion and the ones with normal occlusion. That muscle activity was higher in young females with malocclusion than in young females with normal occlusion. CONCLUSION: This suggest the smaller competence of the orbicularis oris muscle in the females with Class II, division 1 malocclusion.

Electromyography; Orthodontics; Class II, division 1; Normal occlusion; Orbicularis oris muscle


ARTIGO INÉDITO

Análise eletromiográfica do músculo orbicular da boca em jovens com Classe II, 1ª divisão, e jovens com oclusão normal

Vania Célia Vieira de SiqueiraI; Meire Alves de SousaII; Fausto BérzinIII; Cézar Augusto Souza CasariniIV

IProfessora Doutora da disciplina de Ortodontia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba UNICAMP

IIAluna de doutorado em Ortodontia na Faculdade de Odontologia de Piracicaba/UNICAMP

IIIProfessor Titular na disciplina de Anatomia do departamento de Fisiologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba/UNICAMP

IVAluno de doutorado em Anatomia do departamento de Fisiologia da Faculdade de Odontologia de Piracicaba/UNICAMP

Endereço para correspondência Endereço para correspondência Vania C. V. Siqueira Rua José Corder, 87 - Jardim Modelo CEP: 13.419-325 - Piracicaba / SP E-mail: siqueira@fop.unicamp.br

RESUMO

OBJETIVO: comparar, eletromiograficamente, os potenciais de ação do músculo orbicular da boca, segmentos superior e inferior, bilateralmente, em jovens com Classe II, 1ª divisão, e em jovens com oclusão normal, verificando a ocorrência ou não de diferenças na atividade eletromiográfica entre os grupos.

MÉTODOS: a amostra consistiu-se de 50 jovens do sexo feminino, com idades entre 8 e 10 anos, com ausência de tratamento ortodôntico prévio, distribuídas em dois grupos: 25 com Classe II, 1ª divisão; e 25 com oclusão normal. Para a captação dos sinais eletromiográficos, utilizaram-se eletrodos de superfície passivos de Ag/AgCl. Registrou-se a atividade muscular na situação de repouso, na contração isométrica e na contração isotônica, determinando-se o valor da RMS de cada movimento. Submeteu-se os dados coletados à análise estatística de variância e ao teste de Tukey (α=0,05).

RESULTADOS: os resultados revelaram que ocorreram diferenças nas atividades eletromiográficas entre as jovens com Classe II, 1ª divisão, e as com oclusão normal. As atividades musculares mostraram-se maiores nas jovens com Classe II, 1ª divisão.

CONCLUSÃO: observou-se uma menor competência do músculo orbicular da boca nas jovens do sexo feminino com Classe II, 1ª divisão.

Palavras-chave: Eletromiografia. Ortodontia. Classe II, 1ª divisão. Oclusão normal. Músculo orbicular da boca.

INTRODUÇÃO

A análise eletromiográfica dos músculos da mastigação constitui-se em um importante instrumento complementar no diagnóstico ortodôntico, pois uma cuidadosa avaliação da atividade muscular antes e durante o tratamento orienta o profissional na eleição da terapia adequada, assim como na escolha mais individualizada da contenção, minimizando recidivas22.

A musculatura peribucal e o posicionamento labial constituem-se em fatores determinantes na posição dos dentes e na forma da arcada dentária, em razão de suas atividades moderadas, porém contínuas. As forças resultantes da posição de repouso dos lábios auxiliam na definição e na manutenção da oclusão. Pacientes com lábios incompetentes não conseguem o selamento labial habitual sem esforço, condição que favorece uma protrusão dentária pela redução da pressão labial que atua sobre eles, gerando um desequilíbrio facial. A ausência de contato dos lábios causa um desequilíbrio muscular que poderá afetar várias funções, como a respiração, a deglutição, a fonação e o crescimento e desenvolvimento harmonioso da face4,6,7,9,10,11,29.

Existem três padrões de deglutição: o normal, com acentuada contração do músculo masseter e atividade limitada da musculatura labial e mentoniana; o tipo visceral, com pequena ou nenhuma atividade do masseter, contração considerável do músculo mentoniano e uma atividade suave do orbicular da boca segmento inferior; e o terceiro, com atividade marcante do segmento inferior do orbicular da boca e do mentoniano, contração considerável do segmento superior do orbicular da boca e mínima atividade do masseter. Ambos os segmentos do músculo orbicular da boca funcionam como entidades separadas e independentes14.

O padrão de comportamento dos segmentos superior e inferior do músculo orbicular da boca, avaliado em jovens apresentando oclusão normal, mostra ausência de atividade eletromiográfica significativa nesse músculo durante a mastigação e deglutição, bem como no estado de repouso. As regiões laterais e mediais, segmentos superior e inferior, podem funcionar como órgãos independentes entre si, apesar de constituírem um mesmo músculo5,18,30.

Os padrões sinérgicos do comportamento muscular diferem-se com relação às anomalias da oclusão e correlacionam-se com a existência ou não de eficiência do mecanismo mastigatório12,16,17.

Estudos eletromiográficos dos músculos masseter, orbicular da boca, mentoniano e porção anterior do temporal - avaliados durante a deglutição normal e na deglutição atípica - revelaram que os pacientes com deglutição normal apresentavam acentuada contração do músculo masseter, pouca atividade dos músculos peribucais e ausência de atividade do temporal, enquanto os pacientes com deglutição atípica apresentavam maior atividade dos músculos peribucais22,26.

A análise eletromiográfica dos músculos orbicular da boca, temporal, masseter, pterigóideos, mentoniano e supra-hióideos - durante os movimentos de mastigação, deglutição, repouso, selamento labial, deglutição, elevação, abaixamento e lateralidade da mandíbula, em jovens com Classe II, 1ª divisão, comparados com um grupo similar de jovens com oclusão normal - mostrou que todos os jovens com Classe II, 1ª divisão, apresentaram alterações na musculatura intimamente ligada à articulação temporomandibular e que o tratamento ortodôntico poderia alterar o potencial de ação de alguns desses músculos13,18. Na mastigação e na deglutição, os jovens com má oclusão apresentaram tendência a menor atividade eletromiográfica em todos os músculos1. Os lábios considerados incompetentes antes do tratamento tornaram-se competentes em, aproximadamente, 25% dos casos avaliados19. Os jovens com oclusão clinicamente normal apresentaram lábios mais competentes do que aqueles com Classe II, 1ª divisão24,25,27.

A relação entre a atividade eletromiográfica dos segmentos superior e inferior do músculo orbicular da boca e a respiração predominantemente nasal e a predominantemente bucal indica que ocorreu maior atividade do músculo em jovens com respiração predominantemente bucal, comparados a jovens com respiração predominantemente nasal23.

A atividade eletromiográfica dos músculos bucinador, mentoniano, orbicular da boca, temporal, masseter e depressores da mandíbula - durante os movimentos de deglutição, leve contato dos dentes, oclusão forçada, sucção, deglutição, repouso e vários movimentos mandibulares - não difere entre crianças com dentadura decídua e adultos com oclusão normal28. Em pacientes apresentando hábitos de sucção digital, ocorre predominância de atividade do músculo orbicular da boca ou do mentoniano; e durante a sucção, uma mínima contração do temporal. Na presença de hábitos de sucção, os padrões anormais de atividade muscular estabelecem-se, e não basta a correção do hábito se persistir o padrão muscular2.

Uma vez que a forma das arcadas dentárias e a atividade da musculatura bucofacial agem reciprocamente, o presente estudo avaliou eletromiograficamente os potenciais de ação do músculo orbicular da boca, em seus segmentos superior e inferior, em jovens com Classe II, 1ª divisão, e em jovens com oclusão clinicamente normal, verificando a existência ou não de diferenças na atividade elétrica desse músculo entre esses grupos.

MATERIAL E MÉTODOS

Esse trabalho de pesquisa foi previamente submetido à avaliação e aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa, sob o número 147/2002, encontrando-se o mesmo de acordo com as Diretrizes e Normas Regulamentadoras do Conselho Nacional de Saúde, resolução nº 196-1996.

A amostra consistiu-se de 50 jovens do sexo feminino, leucodermas, com idades entre 8 e 10 anos, que nunca se submeteram a tratamento ortodôntico prévio, distribuídas em dois grupos: 25 com Classe II, 1ª divisão dentária; e 25 com oclusão normal. As jovens realizaram um exame clínico onde observou-se a relação dos primeiros molares superiores e inferiores permanentes, o relacionamento incisal nos planos vertical e horizontal, e o relacionamento dos caninos permanentes e/ou decíduos. Solicitou-se, ainda, de cada jovem exames complementares, que consistiram de telerradiografias obtidas em norma lateral, radiografias panorâmicas, modelos de estudo e fotografias intra e extrabucais.

Em ficha especialmente elaborada para a presente pesquisa, anotou-se os dados pessoais, bem como as características oclusais relativas a cada jovem selecionada. Durante o exame clínico, observou-se nas jovens com Classe II, 1ª divisão:

1) Primeiros molares permanentes e caninos decíduos superiores posicionados mesialmente em relação aos primeiros molares permanentes e caninos decíduos inferiores, respectivamente.

2) Trespasse horizontal entre os incisivos superiores e inferiores maior que 3mm.

Cefalometricamente, as jovens apresentavam padrão de crescimento vertical, com valores médios de SN.GoGn em 35º e de FMA em 27º, SNA médio em 80º, SNB médio em 75º e ANB médio em 5º.

Consideraram-se as seguintes características para classificar as jovens com oclusão normal:

1) Primeiros molares permanentes em chave de oclusão, ou seja, a cúspide mesiovestibular do primeiro molar permanente superior ocluindo no sulco vestibular do primeiro molar permanente inferior; caninos permanentes e/ou decíduos em Classe I, ou seja, a ponta da cúspide vestibular do canino superior ocluindo na ameia vestibular entre o canino inferior e o primeiro molar decíduo inferior e/ou primeiro pré-molar inferior.

2) Trespasses horizontal e vertical entre os incisivos superiores e inferiores em, aproximadamente, 2,5mm; ausência de malposições dentárias e ausência de apinhamentos dentários.

Cefalometricamente, as jovens apresentavam padrão de crescimento vertical, com valores médios de SN.GoGn em 35º e de FMA em 27º, SNA médio em 81º, SNB médio em 79° e ANB médio em 3°.

Análise eletromiográfica

Define-se eletromiografia como a coleta de informações sobre a atividade elétrica muscular, por meio de eletrodos conectados a equipamentos para amplificação e registro dos sinais8,15,20,21. Uma das formas de manipulação do sinal ocorre com a determinação da raiz quadrada da média (Root Mean Square, RMS) - representando o melhor método, pois contempla as alterações fisiológicas do sinal eletromiográfico, refletindo o número, a frequência de disparo e a forma dos potenciais de ação das unidades motoras ativas, permitindo, ainda, uma análise da amplitude do sinal eletromiográfico3.

Para o registro eletromiográfico, utilizou-se o sistema de aquisição de sinais Condicionador de Sinais Myosystem-I® (DataHominis Tecnologia Ltda., Brasil), de 12 canais, com 12 bits de resolução de faixa dinâmica, filtro do tipo Butterworth, de passa-baixa de 500Hz e passa-alta de 20Hz e ganho de 100 vezes, placa conversora analógico-digital (A/D), com capacidade de 2000Hz a 4000Hz, de 12 bits, software Myosystem-I, versão 2.12, para apresentação simultânea dos sinais de 12 canais e tratamento do sinal (valor de RMS, média, mínimo, máximo e desvio-padrão), com frequência de amostragem de 2000Hz.

Para a captação dos potenciais de ação do músculo orbicular da boca, utilizaram-se eletrodos de superfície passivos de Ag/AgCl, da DataHominis Tecnologia Ltda. Utilizou-se, também, um eletrodo de referência (terra), constituído de uma placa metálica de aço inoxidável, com o objetivo de reduzir o ruído durante a aquisição do sinal eletromiográfico.

Os voluntários permaneceram sentados, da maneira mais confortável possível, em uma cadeira, com as costas apoiadas no encosto, a cabeça posicionada com o plano de Frankfürt paralelo ao solo, olhos abertos, pés apoiados no solo e braços apoiados sobre os membros inferiores. Fixou-se, por meio de esparadrapo, um par de eletrodos de superfície, previamente untados com gel eletrocondutor, na porção média do lábio superior, a 2mm acima de sua borda livre, distantes 1cm um do outro, adotando-se o mesmo procedimento para o lábio inferior, com os eletrodos fixados a 2mm abaixo de sua borda livre. Fixou-se também o eletrodo de referência (terra) - conectado ao eletrodo de superfície e previamente untado com gel eletrocondutor - no punho direito de cada um dos voluntários, com o auxílio de uma fita de velcro. Antes do início da coleta dos sinais eletromiográficos, todos os voluntários receberam informações quanto às características do equipamento e orientações sobre os movimentos que deveriam ser executados, com um treinamento prévio.

Os registros eletromiográficos iniciaram-se com a avaliação em situação de repouso e, em seguida, durante a contração isométrica e durante a contração isotônica. Para cada uma dessas situações, utilizou-se um tempo de coleta de 10 segundos. No registro da situação de repouso, cada voluntário permaneceu com a musculatura facial e mastigatória relaxada e os lábios em sua postura habitual, utilizando-se o seguinte comando: relaxa, relaxa, relaxa...

A seguir, para o registro da contração isométrica, realizada em máxima intercuspidação, o voluntário colocou entre os dentes posteriores inferiores e superiores, bilateralmente, o material Parafilm® (Pechiney Plastic Packaging Company, EUA). Estabeleceu-se o seguinte comando verbal: força, força, força... mantido por 10 segundos. Para o registro da contração isotônica, atividade mastigatória não habitual, utilizou-se o Parafilm® da mesma forma que no movimento anterior; e determinou-se o ciclo mastigatório através de um metrônomo, com frequência de batimento de 60bpm. Orientou-se o voluntário a morder o Parafilm® sempre que ouvisse o som do metrônomo, por 10 segundos.

Ao final da coleta, avaliaram-se os traçados eletromiográficos, selecionando-se as janelas para análise, com cada janela correspondendo a um segundo de coleta. Na situação de repouso e na atividade isométrica, selecionaram-se três janelas centrais do traçado eletromiográfico, evitando-se as janelas iniciais e finais, pois esses intervalos poderiam sofrer influência da hesitação inicial do voluntário ou da diminuição da atividade muscular ao final do movimento. Na atividade isotônica, selecionou-se uma janela do traçado eletromiográfico coletado, evitando-se também as janelas iniciais e finais.

Os dados coletados foram processados pela RMS (Root Mean Square), utilizando-se o software Myosystem-I®, e submetidos à análise estatística por meio da análise de variância (ANOVA) para medidas repetidas e teste de Tukey (α=0,05).

RESULTADOS

Os dados referentes à análise eletromiográfica encontram-se nas Tabelas 1 e 2 e Figuras 1 e 2.



Os resultados revelaram que ocorreu diferença estatisticamente significativa entre os dois grupos estudados: os jovens com Classe II, 1ª divisão, apresentaram um valor médio maior de atividade elétrica do músculo orbicular da boca, em comparação com os jovens com oclusão normal, em todas as situações avaliadas. Ocorreu uma maior atividade elétrica durante a contração isométrica do que na contração isotônica, no entanto, essa diferença não foi estatisticamente significativa para o segmento inferior do músculo orbicular da boca. Observou-se discreta atividade muscular durante a situação de repouso, tanto no grupo com Classe II, 1ª divisão, quanto no grupo com oclusão normal.

DISCUSSÃO

Optou-se, nesse estudo, por avaliar um grupo de jovens na faixa etária de 8 a 10 anos, do sexo feminino, com Classe II, 1ª divisão dentária, comparando-as com um grupo similar com oclusão normal, pois observa-se uma grande demanda para tratamento dessa má oclusão na clínica diária. Acredita-se que, nessa faixa etária, em virtude da maior viscoelasticidade tecidual, a intervenção ortodôntica torne-se mais eficiente, contribuindo com a estabilidade pós-tratamento. A escolha do sexo feminino ocorreu com o intuito de se evitarem variáveis que poderiam interferir nos resultados, devido às diferenças de desenvolvimento inerentes entre os sexos.

A eletromiografia representa uma ferramenta extremamente útil no estudo dos aspectos neuromusculares do sistema mastigatório; entretanto, para a obtenção de um registro eletromiográfico fiel, torna-se imprescindível o uso de uma técnica adequada, visando a minimizar as interferências do meio.

Na aquisição do sinal eletromiográfico, utilizaram-se eletrodos de superfície. A escolha dos eletrodos depende da informação desejada e da localização dos músculos estudados. Empregam-se eletrodos de superfície no estudo de músculos localizados imediatamente sob a pele, pois permitem estimar a atividade elétrica integrada desses músculos, enquanto os eletrodos agulhados possibilitam o acesso a músculos mais profundos, tornando-se importantes no estudo de unidades motoras15,16,20,21. Além disso, os eletrodos de superfície mostram-se de fácil utilização e não causam desconforto ao paciente3,20.

No processamento do sinal coletado, optou-se pela determinação da RMS. Essa forma de análise apresenta vantagens destacadas, uma vez que exprime de forma quantitativa a atividade elétrica muscular, com a realização desse cálculo de maneira simplificada, por meio de softwares específicos3,21.

O presente estudo evidenciou uma diferença de atividade eletromiográfica entre os jovens com Classe II, 1ª divisão, e com oclusão normal, com uma maior atividade elétrica dos músculos no grupo com má oclusão. Esse fato, provavelmente, encontra-se relacionado com a caracterização dessa má oclusão, ou seja, vestibuloversão dos incisivos superiores e discrepância anteroposterior, que dificulta o desempenho das funções básicas dessa musculatura, gerando a necessidade de adaptações. Os resultados obtidos encontraram-se de acordo com os de trabalhos prévios, onde os autores observaram que pacientes com Classe II, 1ª divisão, despendem maior esforço da musculatura peribucal para efetuar vários movimentos11,19,24,25,27, bem como apresentaram menores potenciais de ação do músculo orbicular da boca comparados àqueles com oclusão normal; e que a redução dos contatos dentários adequados na região anterior ocasionou a hipotonicidade do lábio superior1,12.

Alguns estudos também verificaram adaptações da musculatura peribucal, com aumento da sua atividade, na presença de alterações como hábitos de sucção, respiração predominantemente bucal e deglutição atípica2,6,14,22,23,26,29.

Na literatura existem muitos relatos sobre a importância da musculatura peribucal como fator etiológico de más oclusões9,13,18,29,30. No entanto, observa-se que existe uma grande dificuldade em avaliar a participação real dessa musculatura na determinação das posições dos dentes. O comprimento do lábio não apresenta correlação com o grau de protrusão dos incisivos superiores14. Não existe uma correlação direta entre a forma da arcada superior e a atividade da musculatura peribucal19 e, sim, um possível impacto da atividade do músculo orbicular da boca na posição final dos dentes nas arcadas dentárias, especialmente na Classe II, 1ª e 2ª divisões10. Uma maior espessura do lábio, possivelmente, provocará uma maior atividade muscular, mas não necessariamente influenciando na posição dos dentes ou na inclinação dos incisivos17. A persistência do padrão de disfunção dos músculos peribucais após o tratamento ortodôntico pode ocasionar recidivas22. O desequilíbrio da musculatura peribucal representa um poderoso fator de deformação das arcadas e da posição dos dentes4. O músculo orbicular da boca influencia na angulação dos incisivos superiores, entretanto não sofre influência do grau de protrusão maxilar7. Entretanto, parece não existir dúvidas de que os segmentos superior e inferior do músculo orbicular da boca funcionam de forma independente5,14,18,30.

Diante dos resultados obtidos nesse estudo, acredita-se que pacientes com Classe II, 1ª divisão, apresentam um padrão de atividade dos músculos peribucais que difere daqueles com oclusão normal, com uma necessidade de um maior recrutamento das fibras musculares para a realização de diversas funções.

CONCLUSÕES

Apoiando-se na literatura consultada, nas características da amostra, na metodologia empregada e nos resultados obtidos, concluiu-se que:

1) Ocorreu atividade eletromiográfica diferente entre as jovens com Classe II, 1ª divisão, e as com oclusão normal.

2) Essa atividade apresentou-se maior nas jovens com Classe II, 1ª divisão, sugerindo, assim, uma menor competência labial nesse grupo.

Enviado em: 16 de agosto de 2007

Revisado e aceito: 6 de agosto de 2009

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  • Endereço para correspondência
    Vania C. V. Siqueira
    Rua José Corder, 87 - Jardim Modelo
    CEP: 13.419-325 - Piracicaba / SP
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      03 Jan 2012
    • Data do Fascículo
      Out 2011

    Histórico

    • Recebido
      16 Ago 2007
    • Aceito
      06 Ago 2009
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