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O artigo científico na perspectiva do clínico

"Todo artista tem de ir aonde o povo está." Milton Nascimento (compositor brasileiro)

Muitas vezes me questiono por que a apresentação de uma conferência em um congresso desperta interesse tão maior no clínico do que a leitura de um artigo científico, mesmo que o tema da publicação esteja relacionado à questão clínica. Existem muitos motivos. A conferência é interativa e as dúvidas podem ser prontamente respondidas. Imagens e vídeos podem ser inseridos, estimulando percepções não disponíveis na maioria das publicações científicas. Ademais, nas apresentações, os resultados de quaisquer pesquisas podem ser apresentados com suporte de casos clínicos, tornando a informação visualmente mais rica. É um deslumbre. Há muitas outras vantagens sobre os ombros das apresentações em conferências. Há desvantagens também.

Conferências não são auditáveis, embora possam ser questionadas imediatamente. A informação propalada pode ter sido manipulada e não representar a verdade. Ademais, as apresentações baseadas tão somente em casos clínicos podem representar informações com nível menor de evidência (provas), levando um maior risco aos pacientes submetidos ao procedimento clínico apresentado. Também, há grande chance de informações enviesadas por interesses dos palestrantes. A ciência publicada também possui percalços nesse terreno, mas foi previamente auditada, questionada e revisada, antes de chegar aos olhos do clínico e à boca dos seus pacientes.

As conferências em eventos não mudarão. São sucesso nas vitrines dos congressos mundo afora. Porquanto observamos mudanças contundentes no formato das apresentações audiovisuais, os artigos científicos repetem, há décadas, o mesmo modus operandi.

Eles não poderiam usar um formato diferente? Mais palatável, com maior interatividade e uma linguagem mais objetiva, mantendo o seu aspecto judicioso? Penso que nós, editores e autores, deveríamos nos unir nesse intento e envelopar as nossas publicações em um formato mais dinâmico e atraente, sem perder de vista o rigor inerente à ciência. Muitas revistas científicas de grande impacto já estão reestruturando o formato das suas publicações. Nessas, os manuscritos estão mais concisos e bem mais atraentes, compondo-se com uma divulgação por imagens e vídeos. Porém, a Odontologia e a Ortodontia mantêm-se atreladas ao formato tradicional.

Imaginemos um clínico lendo um artigo científico. Creio que a maioria inicie a leitura pelo título, para, em seguida, saltar direto para a conclusão. Ponto final. O motivo principal é a dificuldade em compreender o conteúdo que está enovelado no artigo, em especial a Metodologia. Ademais, aquela minoria que tenta seguir após a Introdução irá tropeçar na seção "Material e Métodos". Em minha opinião, essa seção, "ensanduichada" entre a Introdução e os Resultados do estudo - informação que o clínico realmente necessita -, atravanca a leitura do artigo e ameaça o interesse de lê-lo em sua totalidade.

Um dos papéis do editor é facilitar o interesse pelo seu periódico, tornando-o mais atrativo para os leitores. A ciência não pode ser edificada apenas para quem a produz, mas sim, e principalmente, para os clínicos que utilizam o conhecimento apresentado para tratar os seus pacientes de forma mais primorosa. Particularmente, penso que a descrição da metodologia poderia ser deslocada para o fim do artigo, e essa será apenas uma das mudanças que o Dental Press Journal of Orthodontics implantará a partir de 2017. Ela vem encordoada a um maior estímulo para que os pesquisadores publiquem vídeos sobre a sua pesquisa e casos clínicos atrelados ao motivo da investigação. O objetivo é o mesmo que Milton Nascimento poetizou na letra de "Nos Bailes da Vida": aproximar a ciência do clínico e trazer mais gente para o baile.

David Normando

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Oct 2016
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