Acessibilidade / Reportar erro

A justiça (penal) juvenil entre a teoria e a prática: Um estudo comparado das práticas judiciais fluminense e gaúcha

The Juvenile (Penal) Justice between Theory and Practice: A Comparative Study of Judicial Practices in Rio Grande do Sul and Rio de Janeiro

RESUMO

Por meio de um estudo empírico comparativo, a presente pesquisa propõe-se a comparar as práticas judiciais para apuração de autoria de ato infracional e os discursos legitimadores em Porto Alegre (RS) e no Rio de Janeiro (RJ). Verificou-se, em ambos os locais, um abismo entre teoria e prática. Percebeu-se que o sistema de justiça juvenil fluminense não confere maiores garantias aos adolescentes, em comparação com o gaúcho. Observou-se a permanência de resquícios da lógica tutelar nas decisões judiciais e nas manifestações dos atores processuais em sentido contrário às conquistas do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

Palavras-chave:
direito penal juvenil; ato infracional; Estatuto da Criança e do Adolescente; criminologia; sociologia da administração da justiça

ABSTRACT

Through a comparative empirical study, The Juvenile (Penal) Justice between Theory and Practice: A Comparative Study of Judicial Practices in Rio Grande do Sul and Rio de Janeiro aims to compare the judicial practices for the accountability of court-involved youth and their legitimating discourses in Porto Alegre (RS) and Rio de Janeiro (RJ). It was verified, in both places, a gap between theory and practice. It was noticed that the juvenile justice system in Rio de Janeiro does not confer more guarantees to the youth in comparison to Rio Grande do Sul. It was observed, in both states, remnants of the tutelary logic in the judicial decisions and the manifestations of the juvenile justice’s operators in opposition to the conquers of the law no 8.069/90.

Keywords:
juvenile penal law; juvenile infraction; Estatuto da Criança e do Adolescente; criminology; sociology of administration of criminal justice

Introdução

A compreensão sobre a infância e a adolescência sofreu diversas mutações ao longo da história recente. Com a publicação do Código de Menores, em 1927, a juventude recebeu uma normatização própria. Até então, sua regulamentação encontrava-se diluída no ordenamento jurídico brasileiro - a chamada “etapa penal indiferenciada” (MENDEZ, 2011MENDEZ, Emílio García. “Adolescentes e responsabilidade penal: Um debate latino-americano”. Observatório do Governo Eletrônico, 2011. Disponível em: http://www.egov.ufsc.br/portal/conteudo/adolescentes-e-responsabilidade-penal-um-debate-latino-americano
http://www.egov.ufsc.br/portal/conteudo/...
). A partir daí, a evolução de conceitos e de percepções sobre esse segmento da população, dentro e fora do país, resultou no reconhecimento constitucional da prioridade absoluta dos direitos das crianças e dos adolescentes, em 1988, e na promulgação da lei no 8.069, em 1990.

No Brasil, na transição do século XIX para o XX, o temor relativo à ideia de “perigo potencial do crescimento da criminalidade precoce” (ALVAREZ, 2014ALVAREZ, Marcos César. “A questão dos adolescentes no cenário punitivo da sociedade brasileira contemporânea”. Revista Brasileira Adolescência e Conflitualidade, vol. 10, pp. 110-126, 2014., p. 118) ensejou a criação de leis e mecanismos institucionais voltados para a juventude em “situação de risco”. Alvarez (Ibid.) destaca que, nesse período, “vão se constituindo discursos e práticas que equacionam a situação de vida das crianças e adolescentes pobres das grandes cidades do país, sobretudo como um problema referente à ‘defesa social’” (p. 118).

Em 1927, o Código de Menores vem cristalizar os postulados da Escola Positiva: traz em seu bojo a previsão de tratamento jurídico-penal especial para crianças e adolescentes considerados potencialmente perigosos, sendo a eles reservadas medidas disciplinares e moralizadoras. Tem início a institucionalização formal1 1 Diz-se “formal”, tendo em vista que, ainda no início do século XX, antes da edição do Código de Menores, em 1927, em alguns estados da República, já havia iniciativas que permitiam formas de institucionalização da infância e da adolescência “em situação de risco” (CIFALI, CHIES-SANTOS e ALVAREZ, 2020, p. 200). da infância e da adolescência pelo Estado, por meio de um modelo jurídico de “assistência e proteção aos menores” (Ibid., pp. 119-120) voltado àqueles em situação de abandono moral ou material2 2 Em sua dissertação de mestrado A emergência do Código de Menores de 1927: Uma análise do discurso jurídico e institucional da assistência e proteção aos menores, Marcos César Alvarez (1990) examina, por meio da perspectiva foucaultiana da “história do presente”, o contexto histórico que culminou na promulgação da legislação voltada especialmente para a juventude pobre brasileira. Suas constatações revelam, entre outros elementos, um discurso permeado pelos postulados da Escola Positiva, sendo essa interconexão o foco do tópico a ser desenvolvido. .

A ideia de tutela do adolescente presente na nova legislação, que substitui a finalidade de punição verificada durante o regime penal indiferenciado, permite, portanto, que a intervenção do Estado englobe não só as situações de criminalidade, mas também as de vulnerabilidade, consideradas produtoras da delinquência precoce. Assim, sob o argumento da proteção, aumenta-se o controle social e a vigilância estatal sobre a juventude, possibilitando a segregação daqueles jovens que não se enquadravam no padrão de “normalidade” da época.

Portanto, ao retirar a responsabilidade individual dos adolescentes e atribuir o comportamento delituoso ao determinismo biológico ou social, rejeitando-se a noção de livre arbítrio, autoriza-se a intervenção estatal antes mesmo da ocorrência de crime (tratamento preventivo), com base na periculosidade da criança ou do adolescente e sob o argumento da defesa social.

Por todos esses motivos, é possível concluir que a justiça juvenil, a partir do momento em que passou a ser uma disciplina diferenciada do direito penal, foi o ramo do direito que melhor incorporou os ideais positivistas (ALMEIDA e ALVAREZ, 2017ALMEIDA, Bruna Gisi Martins; ALVAREZ, Marcos César. Por uma genealogia da Justiça Juvenil no Brasil: Revisitando o Código de Menores de 1927. Trabalho apresentado no 18º Congresso Brasileiro de Sociologia, Brasília, 2017. Disponível em: http://www.adaltech.com.br/anais/sociologia2017/resumos/PDF-eposter-trab-aceito-1555-1.pdf
http://www.adaltech.com.br/anais/sociolo...
, p. 14). Por conseguinte, é possível afirmar que o Código de Menores de 1927 se constituiu “muito mais como um novo instrumento de defesa social do que como um instrumento de ampliação efetiva da cidadania” (ALVAREZ, 2014, p. 121). Isso porque “os aspectos relativos ao abandono e à delinquência (...) não retiravam os menores do campo penal, mas implicavam sobretudo a estigmatização da infância e juventude pobre, institucionalmente condenada, desde então, à possibilidade da delinquência” (Idem).

O Código de Menores não altera o sistema tutelar inaugurado no início do século. Por meio da doutrina da situação irregular, a legislação de 1979 mantém em vigor os postulados positivistas presentes no Código de 19273 3 Quanto a este ponto, é importante anotar a conclusão de Cifali (2019, p. 94): “Com a reforma de 1979, ocorre uma readequação dos conceitos utilizados de acordo com a racionalidade e os saberes dominantes no momento. Diante da pressão internacional e nacional por reformas na legislação, o Estado brasileiro responde a esse apelo, mas sem qualquer modificação do conteúdo e das diretrizes do modelo anterior. Os juízes seguiram imbuídos de amplos poderes na tomada de decisões sobre a vida de crianças e adolescentes, especialmente a partir da perspectiva de que o magistrado não deveria se ocupar apenas das questões tipicamente jurídicas, mas também deveria ser capaz de suprir as deficiências impostas pela ausência de políticas públicas adequadas”. , estabelecendo que seus dispositivos legais seriam aplicáveis aos menores de até 18 anos de idade que se encontravam em situação irregular. Segundo Carvalho, Fernandes e Mayer (2012CARVALHO, Salo de; FERNANDES, Eduardo Georjão; MAYER, Denise Both. “Direitos da criança e do adolescente no Brasil: Da doutrina da situação irregular à doutrina da proteção integral”. In: CRAIDY, Carmem Maria; LAZZAROTTO, Gislei Domingas Romanzini; OLIVEIRA, Magda Martins de (orgs). Processos educativos com adolescentes em conflito com a lei. Porto Alegre: Mediação, 2012, pp. 17-30., pp. 19-20), a referida doutrina tomou por base a incapacidade de crianças e adolescentes em dificuldade social, vendo-os como objeto de “intervenção protetiva” pelo Estado, e não como sujeitos de direito. Em resumo, consoante Alvarez (2014ALVAREZ, Marcos César. “A questão dos adolescentes no cenário punitivo da sociedade brasileira contemporânea”. Revista Brasileira Adolescência e Conflitualidade, vol. 10, pp. 110-126, 2014.), a legislação sobre a menoridade, vigente durante grande parte do século XX - aí incluído o Código de Menores de 1979 -, “configurou-se como um verdadeiro instrumento de controle social, ao estigmatizar crianças e adolescentes pobres e ao condená-los ao círculo vicioso que levava do abandono familiar à delinquência precoce” (p. 121).

Somente a partir do processo de redemocratização do país tornou-se possível a formulação de uma crítica mais aprofundada do modelo proposto pelos códigos de menores anteriores, de caráter assistencial e repressivo (Ibid.). Assim, com a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB), em 1988 e, subsequentemente, do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em 1990, depõe-se a figura do “menor”. A categoria, criada para designar a criança objeto da Justiça e da assistência (RIZZINI e RIZZINI, 2004RIZZINI, Irene; RIZZINI, Irma. A institucionalização de crianças no Brasil: Percurso histórico e desafios do presente. Rio de Janeiro: PUC-Rio; São Paulo: Loyola, 2004., p. 68), é então substituída pela designação “crianças e adolescentes”, seres humanos em formação e sujeitos de direitos (ALVAREZ, 2014ALVAREZ, Marcos César. “A questão dos adolescentes no cenário punitivo da sociedade brasileira contemporânea”. Revista Brasileira Adolescência e Conflitualidade, vol. 10, pp. 110-126, 2014., p. 114).

É a compreensão do adolescente como sujeito de direitos a principal modificação trazida pela doutrina da proteção integral presente no ECA de 1990 (MENDEZ e COSTA, 1994MENDEZ, Emílio Garcia; COSTA, Antônio Carlos Gomes da. Das necessidades aos direitos. São Paulo: Malheiros Editores, 1994.). Essa mudança de paradigma foi, portanto, o resultado de um salto qualitativo fundamental na consideração social da infância, consolidado por um conjunto de instrumentos jurídicos de caráter internacional, sendo representada, segundo Mendez e Costa (1994MENDEZ, Emílio Garcia; COSTA, Antônio Carlos Gomes da. Das necessidades aos direitos. São Paulo: Malheiros Editores, 1994.), por quatro normativas básicas, além da Declaração Universal dos Direitos da Criança (que as antecede): 1) a Convenção Internacional dos Direitos da Criança; 2) as Regras Mínimas das Nações Unidas para a Administração da Justiça Juvenil (Regras de Beijing); 3) as Regras Mínimas das Nações Unidas para os Jovens Privados de Liberdade; e 4) as Diretrizes das Nações Unidas para a Administração da Justiça Juvenil (Diretrizes de Riad).

Assim, a partir de 1990 os adolescentes - pessoas entre 12 e 18 anos de idade - passaram a ser responsabilizados pela prática de ato infracional, isto é, de ato análogo a um crime previsto pela legislação penal para adultos, e não meramente por sua “situação irregular”. Abandona-se, em teoria, a possibilidade de intervenção estatal sobre os jovens em razão de suas condições pessoais, para limitar o poder sancionador do Estado àquelas situações em que houve infração à lei penal.

As construções desenvolvidas pela criminologia crítica na segunda metade do século XX encontram eco, portanto, no sistema de justiça juvenil construído a partir das mencionadas normativas internacionais e do ordenamento jurídico nacional pós-CRFB de 1988, na medida em que se desenvolveram mecanismos e se estabeleceram critérios efetivos de responsabilização dos adolescentes transgressores da lei penal e de intervenção proporcional do Estado nos casos estritamente necessários e legalmente previstos. Foram previstas, ainda, garantias materiais e processuais aos adolescentes representados, a fim de limitar o poder estatal e dar efetividade à condição de sujeitos de direitos conquistada pelos jovens no início da década de 1990, estabelecendo-se, dessa forma, as bases para a mudança de paradigma (AZEVEDO, 2015AZEVEDO, Rodrigo Ghiringhelli de. “Adolescentes em conflito com a lei: Atos infracionais e medidas socioeducativas”. Anuário Brasileiro de Segurança Pública, pp. 124-127, 2015.).

Ainda que o ECA não esteja livre de críticas e da necessidade de aprimoramentos, “a percepção da infância como sujeito pleno de direitos constitui um processo de caráter irreversível no seio da comunidade internacional” (MENDEZ e COSTA, 1994MENDEZ, Emílio Garcia; COSTA, Antônio Carlos Gomes da. Das necessidades aos direitos. São Paulo: Malheiros Editores, 1994., p. 77). Essa condição, por si só, representa um avanço imprescindível para que se construa um sistema de justiça adequado à Constituição democrática para além da teoria.

Atualmente, encontramo-nos diante de uma legislação de vanguarda, cujas previsões legais se aproximam das orientações internacionais sobre os direitos das crianças e dos adolescentes. Todavia, a confrontação com a realidade do sistema judiciário voltado à juventude em situação de criminalidade e a sua inevitável comparação com o sistema de justiça penal destinado aos maiores de 18 anos acarretam uma série de dúvidas sobre o que, de fato, significam a prioridade absoluta e o melhor interesse do adolescente, princípios consagrados pela Convenção Internacional dos Direitos da Criança, em 1989, e, posteriormente, pela lei no 8.069, em 1990.

O direito penal juvenil

Antes da apresentação dos resultados da pesquisa de campo, dedicamos algumas linhas neste artigo para delinear pontualmente o entendimento a partir do qual a análise crítica foi realizada, e que passa necessariamente pelo debate sobre a natureza jurídica das medidas socioeducativas. Esse debate polariza-se, especialmente, entre aqueles que concebem tais medidas como pena e aqueles que enfatizam o seu caráter pedagógico em detrimento do punitivo.

As razões para o reconhecimento de um direito penal juvenil4 4 O presente tópico visa pontuar a premissa da qual partem os autores. Para maior aprofundamento da questão, sugere-se a leitura da íntegra da dissertação de mestrado (MALACARNE, 2018) que deu origem ao presente artigo. decorrem precisamente da compreensão da medida socioeducativa como sanção e da percepção de que, apesar de sua inquestionável finalidade pedagógica, tais medidas representam uma punição ao adolescente condenado pela prática de ato infracional, tendo em vista seu caráter inegavelmente aflitivo (VOLPI, 2001VOLPI, Mário. Sem liberdade, sem direitos: A privação de liberdade na percepção do adolescente. São Paulo: Cortez, 2001.; VILLAS-BÔAS, 2012VILLAS-BÔAS, Eduardo da Silva. Direito Penal e o paradigma da responsabilidade juvenil: Ato infracional, medida socioeducativa e direitos fundamentais. Salvador: EDUFBA, 2012.). A resistência em assumir tais premissas como verdadeiras contribui apenas para a manutenção do modelo tutelar do Código de Menores, quando adolescentes não eram reconhecidos como sujeitos de direitos e, portanto, a eles não eram reconhecidas as garantias previstas na Constituição democrática e na legislação infraconstitucional.

Amaral e Silva (2006AMARAL E SILVA, Antonio Fernando do. “O Estatuto da Criança e do Adolescente e sistema de responsabilidade penal juvenil ou o mito da inimputabilidade penal”. In: ILANUD; ABMP; SEDH; UNFPA (orgs). Justiça, adolescentes e ato infracional: Socioeducação e responsabilização. São Paulo: Ilanud, 2006, pp. 49-59.) relembra que o discurso da inimputabilidade dos “menores” sempre foi utilizado como legitimação do controle social da pobreza, uma vez que o Estado, convenientemente, a pretexto de proteger, “pôde segregar jovens ‘indesejáveis’, sem que tivesse de se submeter aos ‘difíceis’ caminhos da estrita legalidade, das garantias constitucionais e dos limites do Direito Penal” (p. 55). Entretanto, a partir da publicação do ECA, criou-se um sistema de responsabilidade dos adolescentes que, segundo Saraiva,

estabelece um mecanismo de sancionamento, de caráter pedagógico em sua concepção e conteúdo, mas evidentemente retributivo em sua forma, articulado sob o fundamento do garantismo penal e de todos os princípios norteadores do sistema penal enquanto instrumento de cidadania, fundado nos princípios do Direito Penal Mínimo (SARAIVA, 2006SARAIVA, João Batista Costa. Compêndio de Direito Penal juvenil: Adolescente e ato infracional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006., p. 88).

O autor ressalta que os defensores do reconhecimento do caráter penal do sistema de responsabilização dos adolescentes não estão a “inventar um Direito Penal juvenil” (Idem). Em realidade, o direito penal juvenil “está ínsito ao sistema do Estatuto da Criança e do Adolescente, e seu aclaramento decorre de uma efetiva operação hermenêutica, incorporando as conquistas do garantismo penal e a condição de cidadania que se reconhece no adolescente em conflito com a lei” (Idem).

Por tudo isso, compartilha-se da compreensão de Mendez (2011MENDEZ, Emílio García. “Adolescentes e responsabilidade penal: Um debate latino-americano”. Observatório do Governo Eletrônico, 2011. Disponível em: http://www.egov.ufsc.br/portal/conteudo/adolescentes-e-responsabilidade-penal-um-debate-latino-americano
http://www.egov.ufsc.br/portal/conteudo/...
), que afirma que não se mostra conveniente “inventar eufemismos difusos tais como uma suposta responsabilidade social, somente aparentemente alternativa à responsabilidade penal” (p. 6). Dessa forma, a presente pesquisa parte do pressuposto de existência (e necessário reconhecimento) de um direito penal juvenil, haja vista que “contribuir com a criação de qualquer tipo de imagem que associe a adolescência com impunidade (de fato ou de direito) é um desserviço que se faz aos adolescentes” (Idem), além de se revelar como “uma contribuição irresponsável às múltiplas formas de justiça com as próprias mãos, com as quais o Brasil possui uma ampla experiência” (Idem).

O sistema de justiça (penal) juvenil na prática

No presente tópico serão apresentados os resultados da pesquisa de campo desenvolvida ao longo de 2017 nas comarcas de Porto Alegre (Rio Grande do Sul) e do Rio de Janeiro (Rio de Janeiro) e da pesquisa de jurisprudência realizada nos tribunais de justiça dos respectivos estados, a partir de uma abordagem teórica comparativa5 5 O presente artigo apresenta parte dos resultados da pesquisa desenvolvida no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Ciências Criminais - Mestrado da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), integralmente exposta na dissertação A Justiça (Penal) juvenil entre a teoria e a prática: Um estudo comparado das práticas judiciais carioca e gaúcha (MALACARNE, 2018), aprovada, com louvor, em janeiro de 2018. . O objetivo da pesquisa foi fazer um diagnóstico do sistema de justiça (penal) juvenil a partir da observação das práticas judiciais dos órgãos de controle de duas comarcas e de duas instâncias distintas.

Pretendeu-se, com uma pesquisa de caráter microssociológico, realizar uma abordagem interpretativa e explicativa macrossociológica, de modo a compreender a realidade por detrás dos dispositivos legais do ECA voltados à apuração de autoria de ato infracional. Seguiu-se, portanto, a abordagem recomendada por Baratta (2002BARATTA, Alessandro. Criminologia crítica e crítica do Direito Penal: Introdução à sociologia do Direito Penal. Rio de Janeiro: Revan, 2002.), para quem a determinação de uma relação explicativa entre os fenômenos e a estrutura global a que pertencem é um meio para a realização da função de teoria crítica da realidade social do direito, típica da sociologia jurídica e, também, da criminologia crítica (MOLINA e GOMES, 2010MOLINA, Antonio García-Pablos de; GOMES, Luiz Flávio. Criminologia: Introdução a seus fundamentos teóricos - Introdução às bases criminológicas da Lei 9.099/95 - Lei dos Juizados Especiais Criminais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.).

O cerne da pesquisa de campo consiste, fundamentalmente, em procurar responder se há diferenças entre as dinâmicas processuais das duas comarcas escolhidas, especialmente no que tange à (in)observância das garantias processuais aos adolescentes. Consiste, igualmente, em mostrar os discursos legitimadores de tais práticas. Para esse estudo comparado, elegeu-se como primeiro ponto de observação o 4º Juizado da Infância e Juventude de Porto Alegre, por ser essa capital o lócus originário da pesquisa e esse juizado, a fonte de todas as inquietações que culminaram na formulação do problema de pesquisa. A segunda comarca foi escolhida a partir de um critério de diferenciação: optou-se pela observação da Vara da Infância e Juventude do Rio de Janeiro, essencialmente pelo fato de, no estado do Rio de Janeiro, os recursos interpostos no âmbito infracional serem julgados por câmaras criminais. Já o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), de modo distinto, conferiu às câmaras cíveis, com competências para julgar matéria de direito de família, a competência para o julgamento de recursos dessa natureza.

O fato de o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) atribuir às câmaras criminais a competência para julgar os recursos interpostos no âmbito infracional teve influência direta na formulação da hipótese de que, no Rio de Janeiro, as garantias materiais e processuais dos adolescentes seriam observadas com maior frequência, e que os discursos dos órgãos de controle, portanto, estariam mais afastados da lógica tutelar típica das legislações anteriores ao ECA, quando em comparação com o sistema de justiça (penal) juvenil gaúcho. Isso porque, presumiu-se, a aproximação da justiça juvenil com a justiça criminal traria também a lógica garantista que atravessa o sistema acusatório destinado a adultos para perto do sistema de justiça juvenil. Tal hipótese é formulada na esteira da pesquisa realizada por Barros (2015BARROS, Betina Warmiling. “Contrapondo os discursos das câmaras cíveis e criminais enquanto julgadoras de ato infracional: Há diferença?”. In: COSTA, Ana Paula Motta; EILBERG, Daniela Dora (orgs). Justiça juvenil na contemporaneidade. Porto Alegre: DM, 2015, pp. 139-158.), que analisou os discursos dos julgados do TJRS e do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC), onde os recursos, assim como no Rio de Janeiro, são julgados por câmaras criminais.

Os resultados a seguir apresentados são originários de uma pesquisa eminentemente qualitativa, dividida em três etapas6 6 Para a realização da pesquisa de campo, submeteu-se um pedido de autorização para o(a) magistrado(a) de cada vara e juizado a ser observado, detalhando-se as etapas da pesquisa, a sua extensão, o período em que as observações seriam realizadas, além do compromisso em assegurar o sigilo quanto aos dados de identificação dos adolescentes envolvidos nos processos. Anexado a esse pedido, enviou-se o projeto de pesquisa, previamente aprovado em banca de qualificação. A pesquisadora, ainda, agendou uma reunião com os(as) magistrados(as), a fim de prestar esclarecimentos adicionais e, assim, confirmar a possibilidade de realização da pesquisa. Em todos os casos, a autorização foi verbal, concedida nas citadas reuniões. . A primeira delas consiste na observação direta de audiências de apresentação (interrogatório do adolescente) e de continuação (audiências de instrução e julgamento), ao longo de 2017, a partir de um roteiro previamente estabelecido. Foram observadas 25 audiências da primeira modalidade no Núcleo de Audiência de Apresentação (Naap), vinculado à Vara da Infância e Juventude do Rio de Janeiro, e 20 audiências no Projeto Justiça Instantânea (JIN), vinculado ao 4º Juizado da Infância e Juventude de Porto Alegre, além de 50 audiências de continuação realizadas na Vara da Infância e Juventude da comarca do Rio de Janeiro (VIJ/RJ)7 7 A VIJ do Rio de Janeiro conta com uma juíza titular e outros três juízes auxiliares: à titular compete a condução da instrução e o julgamento dos casos de maior gravidade (roubo, homicídio, latrocínio, estupro etc.); aos demais são atribuídos os casos mais comuns e de gravidade mais baixa, como tráfico de drogas, furto, lesão corporal leve e receptação. A observação de audiências foi realizada com todos os juízes, a fim de evitar que os resultados obtidos fossem o desenho do perfil de um magistrado, e não do órgão julgador. e outras 50 conduzidas pelo 4º Juizado da Infância e Juventude de Porto Alegre (4º JIJ/POA).

A segunda etapa, também realizada ao longo de 2017, consubstancia-se na análise de autos de processos de apuração de ato infracional já arquivados, totalizando cem processos em cada comarca. Para tanto, foram escolhidos aleatoriamente processos arquivados entre 2015 e 2016 que ainda se encontravam em cartório - isto é, que ainda não haviam sido remetidos ao arquivo judicial. Não foram adotados critérios para a escolha dos processos a serem examinados, como o tipo de delito ou de medida socioeducativa (MSE) aplicada8 8 O período de realização da pesquisa de campo na VIJ do Rio de Janeiro coincidiu com a realocação do cartório em prédio sediado no bairro Santo Cristo, localizado na Zona Portuária da cidade. Em razão disso, a organização dos processos no cartório restou um tanto prejudicada. Justamente em razão da mudança, muitos dos processos arquivados que eram mantidos no cartório haviam sido recentemente encaminhados ao arquivo central. Portanto, a alternativa encontrada foi a de selecionar aleatoriamente cem processos para pesquisa. Do mesmo modo, o cartório do 4º JIJ/POA havia sido realocado para a ala reformada do Fórum Central, e, durante a mudança, a maioria dos processos arquivados fora remetida ao arquivo judicial. Por esse motivo, a seleção dos processos para exame, também nesse caso, foi aleatória. .

Por fim, a terceira etapa da pesquisa foi destinada à pesquisa de jurisprudência do TJRS e do TJRJ, a partir do filtro “ato infracional e nulidade”9 9 As pesquisas de jurisprudência foram realizadas na ferramenta de busca disponibilizada nas plataformas de pesquisa dos sites dos respectivos tribunais, na aba “pesquisa de jurisprudência”. , cingindo-se a julgados de 2016. A escolha do filtro decorreu do objetivo da pesquisa de avaliar a relativização de direitos e garantias dos adolescentes representados pela prática de ato infracional. Destarte, ao incluir o termo “nulidade” na pesquisa, almejou-se obter como resultado acórdãos que enfrentassem o tema, tendo sido ele suscitado pela defesa, pela acusação, ou reconhecido de ofício. Foram encontradas e analisadas 529 ementas no TJRS e 201 ementas no TJRJ, número considerado razoável para a formulação de conclusões. Verificou-se, ainda, a repetição de argumentos utilizados na fundamentação das decisões, motivo pelo qual não se mostrou necessário estender o período de análise para além de um ano.

Feitos os devidos esclarecimentos metodológicos, passa-se à apresentação e à análise crítica dos resultados obtidos.

Perfil dos adolescentes e dos atos infracionais observados

O perfil dos adolescentes foi montado a partir das respostas fornecidas pelos próprios adolescentes aos quesitos10 10 Nas audiências de apresentação, o adolescente é submetido a interrogatório no qual o juiz, o representante do MP e a defesa do adolescente formulam perguntas sobre as suas condições pessoais, bem como sobre os fatos imputados a ele. formulados pelo juízo, pelo Ministério Público (MP) ou pela defesa, em audiência. Desse modo, o número de respostas teve alguma variação, tendo em vista que a obtenção das informações dependeu da formulação das perguntas pelos atores do processo.

Ao longo da pesquisa, verificou-se que o público das varas e juizados da infância e juventude observados permanecem sendo aqueles jovens em “situação irregular” dos códigos de menores, apesar do advento da doutrina da proteção integral no ECA em 1990. Constatou-se que a incidência da seleção pelo sistema de justiça juvenil recai sobre aquele mesmo perfil indicado por Adorno (1991ADORNO, Sérgio. “A experiência precoce da punição”. In: MARTINS, José de Souza (coord). O massacre dos inocentes: A criança sem infância no Brasil. São Paulo: Hucitec, 1991, pp. 181-208., pp. 204-205) no seu estudo “A experiência precoce da punição”: jovens, em sua grande maioria do sexo masculino, de baixa renda, assistidos, em geral, somente pela mãe, evadidos dos bancos escolares ou em níveis escolares incompatíveis com a sua idade, apresentando, em mais da metade dos casos, passagens anteriores pelo sistema penal juvenil. Além disso, uma parcela significativa desses adolescentes faz uso de substância entorpecente e se encontra na faixa de 15 a 17 anos.

Quanto aos tipos penais praticados com maior frequência nos casos analisados, de início, chama a atenção o alto índice de atos infracionais análogos ao crime de roubo (nas formas simples e qualificada) nas duas capitais: em ambos os casos, próximo de 40% do total. Além disso, sublinha-se que na capital gaúcha houve uma maior variedade de tipos de delitos representados, sendo surpreendente a maior incidência de representações por atos cometidos mediante violência ou grave ameaça à pessoa. Ganhou destaque o índice de 11,8% de representações pelo ato infracional análogo ao crime de homicídio ou de tentativa de homicídio. Observa-se que no Rio de Janeiro, em contrapartida, além do ato infracional análogo ao crime de roubo, destacam-se também os casos de furto, tráfico de drogas e associação para o tráfico (crimes praticados sem violência contra pessoa), todos com índice superior a 15% do total.

Os dados obtidos quanto às espécies de atos infracionais praticados com maior frequência encontram-se em harmonia com aqueles revelados no 9º Anuário Brasileiro de Segurança Pública (AZEVEDO, 2015AZEVEDO, Rodrigo Ghiringhelli de. “Adolescentes em conflito com a lei: Atos infracionais e medidas socioeducativas”. Anuário Brasileiro de Segurança Pública, pp. 124-127, 2015.). Esses dados, também similares ao perfil de crimes praticados por adultos, “dão conta muito mais do padrão de funcionamento das agências de controle, que atuam com baixo grau de integração e inteligência, dependendo da prisão em flagrante para o encaminhamento do caso à justiça” (Ibid., p. 125). Portanto, muito mais do que para refletir o perfil de crimes praticados com maior frequência - não se pode esquecer a cifra oculta de atos infracionais que não chegam às instâncias de controle -, a importância desses dados está na demonstração do padrão da atuação das polícias e sua concentração nos crimes contra o patrimônio e no mercado de drogas (Idem).

Esse desenho inicial do perfil dos adolescentes11 11 Não foi realizada uma análise sobre o perfil racial dos adolescentes, pois eles não foram questionados a respeito de tal enquadramento. Desse modo, o critério para a coleta de tais dados dependeria exclusivamente da observação da pesquisadora em audiência e da sua compreensão sobre como enquadrar o adolescente. Por esse motivo, optou-se por não incluir o critério racial no perfil delineado pela pesquisa. que figuraram no polo passivo dos processos examinados e das audiências observadas, bem como dos tipos de delitos de maior incidência em cada capital, vem demonstrar a efetiva seletividade dos processos de criminalização constatada pelos pensadores do labeling approach12 12 Labeling approach, também conhecido como teoria do etiquetamento, pressupõe que, para que uma conduta seja considerada criminosa, ela deve provocar uma reação social negativa. Há, todavia, a partir da definição das condutas desviantes e da aplicação do rótulo de outsider ao seu autor, um processo de estigmatização (ou rotulação), que tem início no que as teorias do conflito irão chamar de criminalização primária (momento em que se estabelecem os tipos penais e as normas aplicáveis). A seletividade marca tanto o processo de criminalização primária como o de criminalização secundária (momento de aplicação das normas). Enquanto no primeiro há uma seletividade qualitativa, decorrente da escolha dos bens jurídicos que serão penalmente tutelados, bem como das condutas que serão consideradas ofensivas a esses bens jurídicas, no segundo, a seletividade é, além de qualitativa — a partir da aplicação da norma com maior frequência a determinados perfis em detrimento de outros —, também quantitativa, haja vista que não há aparato estatal para a vigilância e repressão de todas as condutas transgressoras. Para maior aprofundamento, ver Becker (2008). .

A partir dessa observação, passa-se à análise dos resultados referentes à condução dos processos de apuração de ato infracional na VIJ/RJ e no 4º JIJ/POA e à observância dos direitos e garantias dos adolescentes no curso dos processos.

O procedimento policial de apuração de ato infracional

Todos os casos examinados na presente pesquisa tiveram trâmite anterior nas delegacias especializadas no atendimento de crianças e adolescentes. Todavia, a maior parte dos casos não demanda efetivo trabalho de investigação prévia, haja vista o alto índice de apreensões em flagrante.

Gráfico 1:
Houve flagrante?

Dos processos observados13 13 Foram analisados cem processos arquivados em cada comarca. , verificou-se que os adolescentes foram interrogados pela autoridade policial em 82,8% dos casos em Porto Alegre e em 85,6% dos casos no Rio de Janeiro, sendo que na capital gaúcha a cientificação dos adolescentes quanto aos seus direitos foi registrada em 88,4% dos procedimentos, contra 84,4% na capital fluminense. A principal diferença entre as cidades observadas reside no acompanhamento do adolescente por advogado particular ou defensor público durante o interrogatório.

Gráfico 2:
O adolescente foi ouvido na presença de defensor?

Na capital gaúcha, onde o acompanhamento por advogado particular ou defensor público é mais frequente, o adolescente exerceu o direito ao silêncio em 69,8% das situações; em 18,6% dos casos, houve negativa de autoria; 5,8% dos adolescentes confessaram integralmente a prática do ato, e 5,8% confessaram parcialmente. No Rio de Janeiro, o índice de silêncio perante a autoridade policial foi de 52,1%; 17,7% dos adolescentes negaram a autoria do fato; a taxa de confissão integral atingiu 27,1% dos casos, e 3,1% confessaram parcialmente.

Depreendeu-se dos dados obtidos que, seja no Rio de Janeiro, seja em Porto Alegre, os índices de violações às garantias dos adolescentes na fase policial são, ainda, significativos. A realização de interrogatórios sem a presença dos pais14 14 Quanto à presença dos pais ou de responsável pelo adolescente durante o interrogatório, nos casos analisados, foi registrada em 37,2% dos casos em Porto Alegre e em 45,9% dos casos no Rio de Janeiro. Em 29,1% dos interrogatórios conduzidos pela polícia gaúcha, o adolescente estava desacompanhado; no Rio de Janeiro, essa situação se repetiu em 34,4% dos casos. No restante das situações, não houve registro de acompanhamento, de modo que não foi possível depreender se o adolescente estava ou não acompanhado pelos pais ou por responsável (33,7% em Porto Alegre; 18,8% no Rio de Janeiro). ou de defensor15 15 Para verificar a frequência com que os adolescentes foram ouvidos sem a presença de defensor, vide Gráfico 2. ocorre com certa frequência, sendo visível o impacto que a presença de defensor provoca na postura que o adolescente assumirá perante a autoridade policial. Quanto mais frequente o acompanhamento por advogado, menor é a taxa de confissão, o que, considerando a garantia à não autoincriminação, demonstra que a assistência por profissional é recomendável.

A oitiva informal pelo Ministério Público e o oferecimento de representação

Após o encerramento do procedimento policial, o caso é encaminhado ao MP para a oitiva informal do adolescente. Na imensa maioria dos casos, não há defensor presente durante essa etapa. Na capital fluminense, 93,7% das oitivas informais foram realizadas sem a presença de advogado e, em 6,3% dos casos, não foi possível verificar se houve ou não acompanhamento. Já em Porto Alegre, em 87% dos casos, os adolescentes foram ouvidos sem assistência de defensor, tendo sido acompanhados em 8,7% dos casos. Não foi possível verificar o acompanhamento em 4,3% das situações. Um membro da Defensoria Pública gaúcha afirmou, informalmente, que a Defensoria não acompanha as oitivas informais, por não reconhecer a constitucionalidade desse procedimento.

Foram registrados, ainda, 45,6% de confissões integrais no Rio de Janeiro e índices de 20,3% de confissões parciais e 30,4% de negativas de autoria; em apenas 3,8% dos casos, o adolescente exerceu o direito ao silêncio. Em Porto Alegre, por outro lado, o exercício do direito ao silêncio foi contabilizado em 40,6% dos procedimentos; em 26,1% dos casos o adolescente negou a autoria, contra 18,8% confissões integrais e 14,5% confissões parciais.

Ainda que se possa entender que os depoimentos prestados pelos adolescentes perante a autoridade policial e o MP não tenham valor probatório, haja vista que decorrem de procedimento administrativo, o que se pôde verificar, na prática, é que, por vezes, as declarações dos adolescentes nessa fase podem vir a prejudicar sua defesa. Em casos pontuais, tanto no Rio de Janeiro como em Porto Alegre, alguns adolescentes foram confrontados pelo representante do MP em razão de suas declarações durante a oitiva informal não coincidirem com as declarações feitas posteriormente em audiência de apresentação perante o juízo.

Não se constatou, todavia, que as declarações dos adolescentes na oitiva informal tenham direta interferência no oferecimento ou não da representação pelo MP. A oitiva informal do adolescente parece, portanto, dispensável, na medida em que, em grande parte dos casos, é oferecida a representação pelo MP, independentemente da alegação do adolescente. Suas declarações, ao que se verifica, não tiveram o efeito de evitar o início de um processo (com exceção de 6,3% dos casos no Rio de Janeiro). Por outro lado, sua fala foi utilizada em seu desfavor em algumas oportunidades, e a sua confissão foi sopesada para confirmação da autoria delitiva.

As audiências de apresentação

Em ambas as comarcas, em praticamente todas as solenidades, os adolescentes estavam acompanhados de defensor16 16 Na capital gaúcha, em 2,44% dos casos, os adolescentes não receberam assistência de advogado — particular ou defensor público —, enquanto no Rio de Janeiro essa situação ocorreu em apenas um caso analisado, o que representa 0,89% do total de processos e audiências observadas. Em Porto Alegre, apenas 4,8% dos adolescentes possuíam procurador constituído antes da audiência, contra 3,7% na capital fluminense. . Em Porto Alegre, 38,52% dos adolescentes interrogados em audiência de apresentação negaram a autoria do ato infracional imputado, 29,51% exerceram o direito ao silêncio, enquanto 27,86% confessaram a prática do fato delitivo - 13,11% de confissões integrais e 14,75% de confissões parciais. Em 4,1% dos casos, o adolescente não foi questionado sobre a veracidade das imputações. No Rio de Janeiro, a atitude dos adolescentes foi bastante diversa. Apenas 1,78% dos adolescentes exerceram o direito ao silêncio; quase 60% dos adolescentes confessaram a prática do ato infracional: 42,86% confessaram integralmente, e 16,96% confessaram parcialmente; e 38,39% dos adolescentes negaram a autoria do fato.

Dos pontos observados nessa etapa processual, chamou atenção a inércia da Defensoria Pública carioca, cuja atuação foi praticamente insignificante. Observou-se aquilo para o que apontou Costa (2005COSTA, Ana Paula Motta. As garantias processuais e o Direito Penal juvenil como limite na aplicação da medida socioeducativa de internação. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005.): a ausência de defesa efetiva dos adolescentes e a aparente permanência de uma cultura herdada pela doutrina da situação irregular. O defensor, por vezes, comporta-se como se estivesse em comum acordo com as demais partes do processo, em busca do que todos, em conjunto, consideram melhor para o adolescente (Ibid.). A atuação dos defensores públicos cariocas parece adequar-se, também, às observações feitas por Figueiredo Dias e Costa Andrade (1992DIAS, Jorge de Figueiredo; ANDRADE, Manuel da Costa. Criminologia: O homem delinquente e a sociedade criminógena. Coimbra: Coimbra Editora, 1992.), que alertaram sobre a interiorização dos valores e normas da subcultura própria das instâncias de controle pelos advogados, de modo a se converterem em seus membros ativos. Assim, o papel do advogado - e, no caso concreto, dos defensores públicos - torna-se meramente o de conferir legitimidade ao sistema, uma vez que sua presença tem o condão de “valer como a garantia de que nada deixou de ser feito e aduzido para melhorar a posição do arguido” (Ibid., pp. 526-527).

A ‘concessão’ de remissão

Em 30,4% dos casos analisados em Porto Alegre foi oferecida remissão ao adolescente17 17 O instituto da remissão assemelha-se à transação penal e está previsto nos artigos 126 e 127 do ECA (lei no 8.069/1990), que assim dispõem: “Art. 126. Antes de iniciado o procedimento judicial para apuração de ato infracional, o representante do MP poderá conceder a remissão, como forma de exclusão do processo, atendendo às circunstâncias e consequências do fato, ao contexto social, bem como à personalidade do adolescente e sua maior ou menor participação no ato infracional. Parágrafo único. Iniciado o procedimento, a concessão da remissão pela autoridade judiciária importará na suspensão ou extinção do processo”. “Art. 127. A remissão não implica necessariamente o reconhecimento ou comprovação da responsabilidade, nem prevalece para efeito de antecedentes, podendo incluir eventualmente a aplicação de qualquer das medidas previstas em lei, exceto a colocação em regime de semiliberdade e a internação”. Quanto à designação desse instituto, mostra-se oportuno o esclarecimento feito por Saraiva, que, por sua importância, vai reproduzido a seguir: “O instituto da remissão, tal e qual o concebe o Estatuto, encontra sua origem no Art. 11 do texto das Regras Mínimas Uniformes das Nações Unidas para Administração da Justiça de Menores, Regras de Beijing. O conceito “remissão” constante da tradução para o Português foi extraído da versão oficial em espanhol daquele documento, que define o instituto como remisión. Como se sabe, os documentos oficiais da ONU são editados em “língua de trabalho”, onde não se inclui o Português. No documento em inglês, o instituto chama-se diversion, que poderia ser traduzido para o Português como “encaminhamento diferente do original”. Cumpre observar que a palavra em inglês remission, ato de remitting (que significa perdoar, ou deixar de infligir uma pena) não foi utilizada na versão em inglês. A versão em espanhol poderia ter utilizado o termo derivasión, mais próximo do Inglês diversion, mas optou por remisión, dando a esta expressão um sentido mais amplo do que de simples perdão, pois, em verdade, poderá implicar inclusive a aplicação de medida (não privativa de liberdade), resultando na supressão do processo judicial ou sua suspensão” (SARAIVA, 2006, pp. 135-136). Sublinha-se que será utilizada a expressão “concessão de remissão” apenas para manter a designação contida no ECA, sem a finalidade de lhe atribuir conotação de “perdão”. . No Rio de Janeiro, por outro lado, a remissão só foi oferecida em 14,17% das oportunidades. Na capital gaúcha, foi possível perceber que o juízo da JIN oferece remissão exclusivamente nos casos em que o adolescente confessa a prática do ato infracional, por entender que a natureza jurídica do instituto da remissão identifica-se com o “perdão”. Percebeu-se, ainda, uma variação dos critérios para oferecimento de remissão entre o juízo da JIN, onde são realizadas as audiências de apresentação, e o do 4º JIJ/POA, que conduz o processo até o julgamento, sendo este último mais flexível quanto às hipóteses de cabimento do instituto.

A incerteza provocada pelo legislador ao adotar a expressão “remissão” - que remete, justamente, à noção de perdão - para nomear o instituto que, segundo a doutrina majoritária, tem caráter transacional, acaba por conferir margem de discricionariedade do juízo na interpretação de sua natureza e dos critérios para seu oferecimento. Foi verificado que, inclusive na mesma comarca, não há consenso sobre essas questões.

Em todos os casos analisados em Porto Alegre, a remissão foi suspensiva, ou seja, condicionada ao cumprimento de medida socioeducativa (MSE) e/ou medida protetiva previamente estipulada. No Rio de Janeiro, 58,82% das remissões concedidas foram extintivas, ou seja, não foi aplicada qualquer MSE como condicionante da extinção do processo. A aplicação da remissão cumulada com MSE, ainda que tenha como efeito a extinção do processo e a impossibilidade de ser considerada como antecedente, produz um estigma sobre o adolescente. Embora a legislação vede tal possibilidade, observou-se que a remissão é, na prática, considerada como antecedente pelos promotores de justiça, ao avaliarem as medidas cabíveis em episódios posteriores18 18 Na íntegra da pesquisa (MALACARNE, 2018), os dados são apresentados com maior detalhamento, tornando possível narrar algumas situações observadas durante a pesquisa de campo que auxiliam a exemplificar e demonstrar, de modo mais aprofundado, as conclusões expostas no presente artigo. Assim, para maior aprofundamento, recomenda-se a leitura da pesquisa completa. .

A internação provisória

Outro ponto de observação refere-se às decisões que decretaram a internação provisória dos adolescentes, especialmente no tocante aos fundamentos utilizados. Percebeu-se um maior número de imposição da medida cautelar no Rio de Janeiro do que em Porto Alegre, conforme se verifica nos gráficos seguintes19 19 Para a análise deste ponto, é importante apontar os tipos penais praticados com maior frequência nos casos analisados (entre audiências e processos arquivados), relembrando que os casos foram escolhidos aleatoriamente ao longo do ano de 2017. Foram selecionados seis atos infracionais de maior incidência em Porto Alegre e no Rio de Janeiro. Em Porto Alegre: roubo (37,64%), homicídio e tentativa de homicídio (11,8%), tráfico de drogas (11.23%), porte de arma (8,99%), ameaça (6,74%) e lesão corporal (6,74%). No Rio de Janeiro: roubo (40,7%), tráfico de drogas (18,59%), furto (15,07%), associação para o tráfico (15,07%), porte de arma (6,53%) e resistência (5,53%). Chama atenção o alto índice de atos infracionais análogos ao crime de roubo (nas formas simples e qualificada) nas duas capitais: em ambos os casos, próximo de 40% do total. Além disso, sublinha-se que na capital gaúcha houve uma maior variedade de tipos de delitos representados, sendo surpreendente a maior incidência de representações por atos cometidos mediante violência ou grave ameaça à pessoa. :

Gráfico 3:
Foi decretada a internação provisória do adolescente?

Os fundamentos para a decretação da internação provisória suscitados com maior frequência em Porto Alegre foram a garantia da ordem pública (73,2%), a existência de indícios de autoria e materialidade (66,1%), a gravidade do ato infracional (64,3%), a existência de antecedentes infracionais (42,9%) e a inaptidão do adolescente para o convívio social (17,9%). Merecem destaque outras motivações, ainda que menos frequentes: caráter educativo da medida (10,7%), proteção do adolescente (8,9%), sentimento de impunidade (8,9%), desestruturação familiar (5,4%) e para a conveniência da instrução (5,4%). As decisões analisadas revelaram a lógica tutelar ainda presente no raciocínio dos juízes da infância e da juventude, que utilizaram certos fundamentos da doutrina da situação irregular como metarregra para justificar a intervenção estatal.

No Rio de Janeiro, surpreendeu que, em 42,7% dos casos, a decisão que determinou a decretação da internação provisória dos adolescentes não foi devidamente motivada. Isso viola não só os artigos 106 e 108 do ECA, mas a própria Constituição, que estabelece, no artigo 5º, inciso LXI, que “ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente”. Por outro lado, a existência de indícios de autoria e materialidade foi invocada em 52% das decisões, seguida por: garantia da ordem pública (21,3%), condições pessoais do adolescente (21,3%), conveniência da instrução (20%), gravidade do ato (20%), proteção do adolescente (18,7%) e a conduta social do representado (18,7%).

Contra a coação ilegal a que os adolescentes eventualmente são submetidos, raramente se impetra a ação autônoma de impugnação cabível. A impetração de habeas corpus em favor do adolescente foi verificada em apenas 3,4% dos casos na capital gaúcha, sendo que a ordem foi denegada em todos os casos observados. No Rio de Janeiro, a taxa foi de 4,1%, e, da mesma forma, não se constatou nenhuma concessão de ordem pelo Tribunal de Justiça nos casos analisados.

A defesa prévia, a audiência de continuação e as alegações finais

Apenas 6,5% das defesas prévias apresentadas ao juízo porto-alegrense mostraram-se fundamentadas, sendo arroladas testemunhas em somente 35,1% dos casos analisados. Quanto às defesas prévias apresentadas à VIJ/RJ, somente 2,91% revelaram-se fundamentadas, arrolando testemunhas em apenas 3,96% dos casos.

Em todos os casos, percebeu-se que as defesas prévias são meramente protocolares, seguindo, geralmente, um texto-padrão, em que se nega a autoria do ato infracional e se requer a produção de provas. Em algumas situações, inclusive, a negativa de autoria presente na manifestação defensiva destoa das declarações do adolescente em audiência de apresentação.

Após a apresentação da defesa prévia, é agendada audiência para oitiva das testemunhas arroladas pelo MP e, eventualmente, pela defesa. Em 71,32% das audiências de continuação analisadas em Porto Alegre, foram ouvidas somente testemunhas de acusação. No Rio de Janeiro, esse índice foi de 96,27% dos casos.

Merece ênfase o frequente uso de algemas para conter os adolescentes durante as audiências de continuação do 4º JIJ/POA. Os adolescentes que se encontravam internados provisoriamente ao tempo da solenidade permaneceram algemados durante toda a audiência, o que ocorreu em 62,7% das situações. Não se verificou qualquer fundamentação por parte do juízo quanto à necessidade da contenção, em flagrante violação ao mandamento da súmula vinculante no 11 do STF20 20 A referida súmula assim dispõe: “Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado” (súmula vinculante no 11 do Supremo Tribunal Federal). . Sequer se observou qualquer pedido das partes para que as algemas fossem retiradas no curso da solenidade. No Rio de Janeiro, por outro lado, o uso de algemas foi constatado em apenas uma oportunidade, o que representa 1,6% dos casos. Na quase totalidade das audiências, os adolescentes foram mantidos de pé durante a solenidade, com os braços voltados para trás e a cabeça baixa, sendo escoltados pelos agentes do Departamento Geral de Ações Socioeducativas (Degase).

Em ambas as situações verificou-se uma subjugação do adolescente em julgamento: seja pelo uso de contenção física, na capital gaúcha, seja através da intimidação provocada pelos agentes da unidade de internação, na capital fluminense. Conclui-se, pois, que as cerimônias degradantes têm início ainda antes de eventual condenação, contribuindo para o processo de estigmatização daquele jovem que, constitucionalmente, tem assegurada para si a presunção de inocência.

Outra diferença marcante entre o 4º JIJ/POA e a VIJ/RJ é a prevalência da oralidade dos procedimentos nesta última. Constatou-se, na capital fluminense, que em 70,9% dos casos foram realizados debates orais entre as partes. Nos casos restantes, os debates somente não foram realizados porque não foi possível o encerramento da instrução na solenidade.

Quanto aos pedidos formulados em alegações finais, constatou-se que o MP gaúcho requereu a condenação dos adolescentes em 81,58% das oportunidades e o MP carioca, em 86,17% dos casos. Importante anotar que no Rio de Janeiro foi perceptível a relevância atribuída pelo MP às recomendações feitas pela equipe multidisciplinar no estudo social: em 20,9% dos casos, houve referência ao teor do estudo para fundamentar a indicação da MSE aplicável. Em Porto Alegre, por outro lado, observou-se que tal estudo não é realizado, mesmo quando solicitado pela defesa. Tal circunstância é trazida neste momento porque contribui para a compreensão das diferentes posturas adotadas pelo MP nas duas comarcas observadas. Ainda que a proporção dos pedidos de condenação e absolvição seja coincidente, é visível a discrepância no tocante às medidas socioeducativas indicadas em alegações finais pelo MP21 21 Internação sem possibilidade de atividade externa (ISPAE) e internação com possibilidade de atividade externa (ICPAE) referem-se a duas modalidades da medida socioeducativa de internação aplicadas no Rio Grande do Sul. .

Gráfico 4:
Indicação da MSE aplicável pelo MP

As alegações finais da defesa, na capital fluminense, seguiram o mesmo padrão do MP, sendo realizadas integralmente em forma de debates orais nas audiências de continuação. Destaca-se, com surpresa, a inação da Defensoria Pública carioca durante as audiências e o baixo grau de combatividade dos defensores - conforme já apontado em relação às audiências de apresentação. Raramente se verificou manifestação defensiva - seja para solicitar a liberação de adolescente internado provisoriamente, para inquirir testemunhas ou para proferir alegações finais. O exame dos autos e a fundamentação aprofundada dos pedidos da defesa ocorreram em apenas 10,94% dos casos. Em muitos casos, a presença do defensor pareceu apenas atender a formalidades, quando, de fato, o adolescente estava desassistido.

Em Porto Alegre, por outro lado, a Defensoria Pública, ainda que passível de algumas críticas, mostrou-se bastante atuante. Em geral, os defensores conversaram com os familiares do adolescente e com o próprio adolescente em momento anterior à audiência. Frequentemente, dirigiram questionamentos às testemunhas e, em algumas oportunidades, adotaram postura de enfrentamento ao MP. Além disso, no 4º JIJ/POA, o número de testemunhas de defesa foi significativamente maior do que nos processos do Rio de Janeiro (28,68% dos casos em Porto Alegre, contra 3,73% dos casos no Rio de Janeiro). Os pedidos da defesa perante o 4º JIJ/POA revelaram-se mais fundamentados do que os formulados ao juízo da VIJ/RJ: verificou-se o efetivo exame das provas e a fundamentação do pedido em 90,67% dos casos.

A sentença

A oralidade dos processos de apuração de ato infracional no Rio de Janeiro vem reafirmada pelo fato de que 95% das sentenças analisadas foram prolatadas oralmente em audiência. Todavia, há de se fazer uma ressalva: apesar de, em geral, o procedimento ser formalmente oral - incluindo defesa prévia, alegações finais e sentença -, muito pouco é de fato produzido em audiência. Em sua maioria, são repetições de textos-padrão, previamente elaborados, incluídos em ata, ainda que não tenha havido referência oral a eles na solenidade. Nas audiências observadas, as sentenças, em geral, pareceram uma deliberação entre juízes e promotores, com pouca participação da defesa. Em Porto Alegre, por outro lado, as sentenças foram proferidas oralmente em apenas 42,86% das situações.

Dos processos analisados, foram detectados os seguintes resultados22 22 Para fins de facilitar a compreensão sobre os resultados obtidos, optou-se por utilizar os termos condenação e absolvição como equivalentes de representação julgada procedente e representação julgada improcedente, respectivamente. :

Gráfico 5:
Sentenças

Na capital gaúcha, em 91,04% das sentenças, o juízo realizou exame aprofundado da prova e fundamentou suficientemente sua decisão23 23 Para avaliar se uma sentença foi suficientemente fundamentada, foram analisados: se a decisão abordou as teses trazidas pela acusação e pela defesa; se fez o exame da prova produzida durante o processo; e se apresentou os motivos de fato e de direito em que se fundaram a decisão, ou se tão somente apresentou uma argumentação genérica e/ou padronizada. . No Rio de Janeiro, por outro lado, o que se verificou foi que apenas 61,83% das sentenças foram devidamente fundamentadas, evidenciando uma análise detida dos elementos probatórios produzidos ao longo da instrução.

Na capital fluminense, em muitos casos, foi possível observar que os termos gerais da sentença foram elaborados antes mesmo das audiências. Isso significa dizer que, em diversas oportunidades, a sentença fora redigida ou estruturada previamente à produção da prova, o que pode indicar pré-julgamento. Assim, a oitiva das testemunhas pareceu servir apenas para corroborar a tese já formada a partir, exclusivamente, das declarações do adolescente em audiência de apresentação e dos indícios colhidos na etapa policial.

Essa situação remete à controvérsia acerca do momento do interrogatório do adolescente e dos efeitos que sua realização como ato inaugural da instrução causa. Esse procedimento indica a permanência de uma lógica inquisitorial nos processos de apuração de ato infracional, pois as declarações do adolescente, em vez de consistirem em meio de defesa, carregam valor de prova e orientam a interpretação dos demais elementos colhidos ao longo da instrução.

Ainda que não tenha sido utilizada como fundamento único para decretação da condenação do adolescente nos casos examinados, a confissão foi um dos elementos apreciados para a confirmação da autoria do ato infracional. No Rio de Janeiro, a confissão do adolescente em audiência foi considerada como um elemento probatório em 30,63% das sentenças condenatórias; em Porto Alegre, o índice foi de 20% das sentenças condenatórias.

Quando requerido pela defesa que a confissão fosse considerada para atenuação da MSE aplicável - em analogia à atenuante prevista no artigo 65, inciso III, alínea d, do Código Penal -, o pedido foi negado em primeira instância. Em segunda instância, o TJRS se manifestou em mais de uma ocasião sobre o descabimento desse pedido, afirmando que “ao acolher tal tese, correr-se-ia o sério risco de estimular o jovem a ingressar definitivamente na senda infracional, escudado pelo argumento de que bastaria confessar posteriormente a prática, para ter a medida atenuada”. Segundo o entendimento manifestado pelo tribunal nas decisões analisadas, “tal postura robusteceria o sentimento de impunidade, o que não deve ser incentivado”24 24 Trechos ilustrativos extraídos do julgado: Rio Grande do Sul. Tribunal de Justiça. Apelação Cível 70071403893. Câmara julgadora: Oitava Câmara Cível. Relator: Luiz Felipe Brasil Santos. Julgado em 15/12/2016) . Afirmou-se, ainda, o seguinte:

De outra banda, realço que as regras e os institutos do Direito Penal não podem e não devem ser aplicados indiscriminadamente nos procedimentos à apuração de atos infracionais, não só ante os objetivos pedagógicos e ressocializadores das medidas socioeducativas, mas especialmente porque crianças e adolescentes são pessoas em desenvolvimento (devendo, em razão disso, serem tratados em face de sua peculiar condição, Art. 6º do ECA). Não é por outra razão, aliás, que o Superior Tribunal de Justiça já reconheceu que a confissão não traduz justificativa para abrandar a medida socioeducativa questionada, tendo em vista que a circunstância atenuante do Art. 65, III, “d”, do CP não se aplica aos procedimentos relativos a ato infracional, que se submete ao ECA, porque medida socioeducativa não se confunde com pena, em face de seu conteúdo eminentemente educativo e protetivo (v. g., HC 101.739/DF, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Quinta Turma, 04/02/2010) (grifo nosso)25 25 Trecho ilustrativo extraído do julgado: Rio Grande do Sul. Tribunal de Justiça. Apelação Cível 70071848451. Câmara julgadora: Oitava Câmara Cível. Relator: Ricardo Moreira Lins Pastl. Julgado em 15/12/2016. .

Observa-se que o caráter educativo e protetivo das medidas socioeducativas e seu afastamento das penas criminais são trazidos para justificar a imposição de medida mais gravosa ao adolescente. Constatou-se, por fim, que a confissão, quando não há oferecimento de remissão, é utilizada apenas em desfavor do adolescente, corroborando provas frágeis e servindo de elemento de convicção para a condenação.

A partir do exame das sentenças, observou-se que o juízo não utiliza as condições pessoais do adolescente para fundamentar a sua condenação. Todavia, utilizou-as como motivação para a escolha da MSE a ser aplicada no caso concreto26 26 Prestação de serviços à comunidade (PSC); liberdade assistida (LA). Para demais siglas, ver nota 21. . Das sentenças condenatórias examinadas, observou-se que a medidas socioeducativas obedeceram a seguinte proporção:

Gráfico 6:
Medidas socioeducativas aplicadas em sentença

Entre os fatores mencionados para a decretação da medida de internação, destacam-se, em Porto Alegre: a gravidade do ato (82,2%), a existência de maus antecedentes ou reincidência do adolescente (53,6%) e as circunstâncias pessoais do adolescente (3,6%). No Rio de Janeiro, foram mencionados os seguintes argumentos: caráter educativo da MSE (84,2%), gravidade da conduta infracional (84,2%), proteção do adolescente (73,7%), família desestruturada (68,4%), garantia da ordem pública (36,8%), existência de maus antecedentes ou reincidência (31,6%), repercussão social negativa do fato (15,8%), necessidades e anseios da sociedade (15,8%) e ressocialização (5,3%).

Percebe-se, portanto, que o juízo da Vara da Infância do Rio de Janeiro utilizou, de forma expressa, diversos argumentos para a determinação da privação de liberdade do adolescente que remetem àquelas previstas pelos códigos de menores anteriores a 1990. Justificar a internação com base na proteção do adolescente ou na sua situação familiar revela a lógica tutelar ainda existente no sistema de justiça juvenil. Além disso, o destaque conferido ao caráter educativo da medida vem reafirmar o raciocínio menorista.

Nas decisões dos tribunais de justiça examinadas, verificaram-se, da mesma forma, inúmeros fatores considerados para a aplicação da MSE que não possuem vinculação objetiva com o ato infracional em si. Ambos os tribunais de Justiça analisados fazem um exame sobre as condições pessoais do adolescente, sobre a sua personalidade e comportamento, muitas vezes, inclusive, sem o suporte do estudo social realizado por equipe multidisciplinar.

Apesar de os critérios para a fixação das medidas socioeducativas pela autoridade judicial, dispostos no parágrafo 1º do artigo 112 do ECA, serem a capacidade do adolescente de cumprir a MSE, as circunstâncias e a gravidade da infração, não foi vedado pelo estatuto juvenil que sejam consideradas as condições pessoais do adolescente na ponderação sobre a MSE aplicável. Todavia, para tanto, é indispensável que essa avaliação seja realizada por uma equipe multidisciplinar, com competência para analisar os diferentes aspectos da vida privada do adolescente, conforme recomendação do item 16.1 das Regras de Beijing27 27 “16.1 Para facilitar a adoção de uma decisão justa por parte da autoridade competente, a menos que se trate de infrações leves, antes da decisão definitiva será efetuada uma investigação completa sobre o meio social e as circunstâncias de vida do jovem e as condições em que se deu a prática da infração” (Regras mínimas das Nações Unidas para administração da Justiça da Infância e da Juventude - Regras de Beijing, item 16.1). .

Observou-se, ainda, que os tribunais utilizaram o caráter educativo da medida como argumento para diversas finalidades: para agravar a MSE imposta, para abrandá-la ou, ainda, para negar aplicação de princípios de direito penal aos atos infracionais praticados por adolescentes - entre eles, o princípio da insignificância.

Contrariando a hipótese da pesquisa de que as decisões do TJRJ apresentariam caráter menos tutelar do adolescente, haja vista serem os recursos julgados por câmaras criminais e não câmaras cíveis, como no Rio Grande do Sul, verificou-se que uma parcela significativa de julgados trouxe como fundamento para a internação ou para a aplicação de MSE mais gravosa a necessidade de “proteção do adolescente”, revelando a permanência, ainda hoje, do caráter tutelar presente nos códigos de menores de 1927 e 1979. A lógica menorista anterior ao ECA é tão arraigada no sistema de justiça juvenil que os argumentos originários da doutrina da situação irregular são utilizados para flexibilizar as condicionantes das medidas privativas de liberdade, decretando-se a internação do adolescente em desacordo com as hipóteses autorizadas pelo artigo 122 do ECA.

Esses argumentos, todavia, não foram observados somente nas decisões do TJRJ. Também o TJRS demostrou que seu processo de tomada de decisão permeia a lógica que, em tese, deveria ter sido extirpada a partir da publicação do ECA. Expressões como “profilaxia social”, que revelam a lógica higienista típica dos criminólogos positivistas, foram encontradas em diversas decisões28 28 Cita-se, como exemplo: “Apelação cível. ECA. Ato infracional equiparado ao roubo majorado. Nulidades afastadas. Autoria e materialidade comprovadas. Mantida a medida socioeducativa aplicada. [...] Segundo o Art. 1º do Estatuto da Criança e do Adolescente, a medida socioeducativa possui como desiderato principal fazer despertar no menor infrator a consciência do desvalor de sua conduta, bem como afastá-lo do meio social, como medida profilática e retributiva, possibilitando-lhe a reflexão e reavaliação de seus atos. Recurso desprovido”. (Rio Grande do Sul. Tribunal de Justiça. Apelação Cível 70071400279. Câmara julgadora: Sétima Câmara Cível. Relator: Liselena Schifino Robles Ribeiro. Julgado em 09/11/2016). .

Os recursos

No tocante aos recursos, verificou-se que, enquanto em Porto Alegre a defesa interpôs apelação contra sentenças do 4º JIJ/POA em 42,7% dos casos, na capital fluminense a defesa recorreu de apenas 10,8% das sentenças da VIJ/RJ. Essa situação revela-se ainda mais desigual quando se observa que o índice de condenações pela VIJ/RJ (81,75% dos casos) foi muito superior ao número de condenações observados no 4º JIJ/POA (50,53%).

Nos casos observados, verificou-se que os recursos, em geral, são recebidos somente no efeito devolutivo29 29 Segundo Badaró (2019, p. 848), “o efeito devolutivo dos recursos diz respeito à matéria que será levada à apreciação do Tribunal”. Quando um recurso é recebido apenas no seu efeito devolutivo, a sentença proferida em primeira instância mantém os seus efeitos até que o recurso seja definitivamente julgado pelo tribunal. Quando se confere efeito suspensivo à apelação, o adolescente somente cumprirá a medida estabelecida na sentença, caso esta seja confirmada posteriormente pelo tribunal. : foi conferido efeito suspensivo a 18,2% dos recursos interpostos pelo MP e a apenas 7,7% dos recursos defensivos interpostos em Porto Alegre. No Rio de Janeiro, não foi conferido efeito suspensivo a nenhum dos recursos interpostos. Além dos fundamentos técnicos para a ordem de cumprimento imediato da sentença de primeira instância, o TJRJ trouxe a necessidade de “proteção do adolescente” reiteradas vezes como argumento para amparar a negativa de atribuição de efeito suspensivo ao recurso. Em alguns casos, inclusive, refere que “a demora na execução da MSE causará dano irreparável ao adolescente, perdendo o seu caráter preventivo e pedagógico”30 30 Trecho ilustrativo extraído do julgado: Rio de Janeiro. Tribunal de Justiça. Apelação Criminal 0173519-52.2016.8.19.0001. Câmara julgadora: Quarta Câmara Criminal. Relator: José Roberto Lagranha Távora. Julgado em 06/12/2016. . Ou seja, o prejuízo do adolescente não será permanecer privado de liberdade sem uma sentença condenatória transitada em julgado, mas, sim, a demora na execução da medida.

O TJRS reverteu integralmente apenas 12,2% das sentenças, tendo julgado parcialmente procedentes 2% dos recursos. Foram mantidas 85,7% das sentenças proferidas pelo 4º JIJ/POA. O TJRJ julgou improcedentes 71,4% dos recursos interpostos, dando integral provimento a 14,3% das apelações e parcial provimento aos 14,3% dos recursos restantes.

A partir do quadro exposto, conclui-se que a garantia ao duplo grau de jurisdição não encontra aplicabilidade prática em parcela significativa dos casos, especialmente na capital fluminense, onde se constatou maior inércia da defesa. Ainda que se tenha verificado considerável rapidez no julgamento dos recursos, o seu recebimento apenas no efeito devolutivo implica que grande parte dos adolescentes já tenha cumprido, senão integralmente, ao menos uma fração significativa da medida imposta em primeira instância quando do julgamento da apelação.

Conclusão

O presente estudo permite concluir que a ideologia da Escola Positiva está incrustada na origem da justiça juvenil e motivou desde o direcionamento do controle estatal a um público-alvo específico até as formas de intervenção estatal sobre a infância e a adolescência. Isso auxilia a compreender as razões de certas práticas e discursos que hoje, mesmo após a promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), ainda se verificam no sistema de justiça. O próprio estatuto de 1990 manteve em seu corpo normativo previsões que remetem às ideias de tratamento, controle e prevenção, típicas dos ideais positivistas.

Diferentemente da hipótese formulada previamente à pesquisa, a partir da observação das práticas judiciais dos órgãos de primeira e segunda instância do Rio de Janeiro e do Rio Grande do Sul, não se percebeu que o sistema de justiça carioca esteja mais próximo do sistema de garantias penais e, por consequência, mais afastado da lógica tutelar dos códigos de menores anteriores ao ECA, em comparação com o sistema porto-alegrense. Avaliou-se que ambas as comarcas apresentam significativos pontos de desequilíbrio em direção ao regime que antecedeu a doutrina da proteção integral, ainda que, paralelamente, apresentem pontos de avanço.

Todas essas constatações evidenciam que, mesmo com uma legislação de vanguarda no que diz respeito aos direitos das crianças e dos adolescentes, ainda há espaços de discricionariedade em que impera a lógica tutelar, de origem positivista, presente nos códigos de menores de 1927 e 1979. Conclui-se, por fim, na linha do que já alertou Emílio García Mendez (2011MENDEZ, Emílio García. “Adolescentes e responsabilidade penal: Um debate latino-americano”. Observatório do Governo Eletrônico, 2011. Disponível em: http://www.egov.ufsc.br/portal/conteudo/adolescentes-e-responsabilidade-penal-um-debate-latino-americano
http://www.egov.ufsc.br/portal/conteudo/...
): negar o caráter punitivo das medidas socioeducativas, no intuito de afastar o sistema de justiça juvenil da justiça criminal, constitui um desserviço aos adolescentes e permite que se violem direitos, se relativizem garantias e se flexibilizem procedimentos, tudo em seu benefício - quando, na realidade, o braço punitivo do Estado está a exercer a sua força, quase sem freios ou contrapesos.

Entre a teoria e a prática há, portanto, um abismo. Para que esta se aproxime daquela, será preciso muito mais do que criação de novos estatutos, modificações de nomenclaturas e alteração de competências. Será necessário extirpar-se a cultura menorista, tutelar e patriarcal do sistema de justiça juvenil e das interpretações que se dão aos dispositivos do ECA.

Referências

  • ADORNO, Sérgio. “A experiência precoce da punição”. In: MARTINS, José de Souza (coord). O massacre dos inocentes: A criança sem infância no Brasil. São Paulo: Hucitec, 1991, pp. 181-208.
  • ALMEIDA, Bruna Gisi Martins; ALVAREZ, Marcos César. Por uma genealogia da Justiça Juvenil no Brasil: Revisitando o Código de Menores de 1927. Trabalho apresentado no 18º Congresso Brasileiro de Sociologia, Brasília, 2017. Disponível em: http://www.adaltech.com.br/anais/sociologia2017/resumos/PDF-eposter-trab-aceito-1555-1.pdf
    » http://www.adaltech.com.br/anais/sociologia2017/resumos/PDF-eposter-trab-aceito-1555-1.pdf
  • ALVAREZ, Marcos César. A emergência do Código de Menores de 1927: Uma análise do discurso jurídico e institucional da assistência e proteção aos menores. Dissertação (Mestrado em Sociologia) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 1990.
  • ALVAREZ, Marcos César. “A questão dos adolescentes no cenário punitivo da sociedade brasileira contemporânea”. Revista Brasileira Adolescência e Conflitualidade, vol. 10, pp. 110-126, 2014.
  • AMARAL E SILVA, Antonio Fernando do. “O Estatuto da Criança e do Adolescente e sistema de responsabilidade penal juvenil ou o mito da inimputabilidade penal”. In: ILANUD; ABMP; SEDH; UNFPA (orgs). Justiça, adolescentes e ato infracional: Socioeducação e responsabilização. São Paulo: Ilanud, 2006, pp. 49-59.
  • AZEVEDO, Rodrigo Ghiringhelli de. “Adolescentes em conflito com a lei: Atos infracionais e medidas socioeducativas”. Anuário Brasileiro de Segurança Pública, pp. 124-127, 2015.
  • BADARÓ, Gustavo. Processo penal. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2019.
  • BARATTA, Alessandro. Criminologia crítica e crítica do Direito Penal: Introdução à sociologia do Direito Penal. Rio de Janeiro: Revan, 2002.
  • BARROS, Betina Warmiling. “Contrapondo os discursos das câmaras cíveis e criminais enquanto julgadoras de ato infracional: Há diferença?”. In: COSTA, Ana Paula Motta; EILBERG, Daniela Dora (orgs). Justiça juvenil na contemporaneidade. Porto Alegre: DM, 2015, pp. 139-158.
  • BECKER, Howard. Outsiders: Estudos sobre a sociologia do desvio. Rio de Janeiro: Zahar, 2008.
  • CARVALHO, Salo de; FERNANDES, Eduardo Georjão; MAYER, Denise Both. “Direitos da criança e do adolescente no Brasil: Da doutrina da situação irregular à doutrina da proteção integral”. In: CRAIDY, Carmem Maria; LAZZAROTTO, Gislei Domingas Romanzini; OLIVEIRA, Magda Martins de (orgs). Processos educativos com adolescentes em conflito com a lei. Porto Alegre: Mediação, 2012, pp. 17-30.
  • CIFALI, Ana Cláudia. As disputas pela definição da justiça juvenil no Brasil: Atores, racionalidades e representações sociais. Tese (Doutorado em Ciências Criminais) - Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2019.
  • CIFALI, Ana Cláudia; CHIES-SANTOS, Mariana; ALVAREZ, Marcos César. “Justiça juvenil no Brasil: Continuidades e rupturas”. Tempo Social, vol. 32, n. 3, pp. 197-228, 2020.
  • COSTA, Ana Paula Motta. As garantias processuais e o Direito Penal juvenil como limite na aplicação da medida socioeducativa de internação. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005.
  • DIAS, Jorge de Figueiredo; ANDRADE, Manuel da Costa. Criminologia: O homem delinquente e a sociedade criminógena. Coimbra: Coimbra Editora, 1992.
  • MALACARNE, Emilia Klein. A Justiça (Penal) juvenil entre a teoria e a prática: Um estudo comparado das práticas judiciais carioca e gaúcha. Dissertação (Mestrado em Ciências Criminais) - Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2018.
  • MENDEZ, Emílio Garcia; COSTA, Antônio Carlos Gomes da. Das necessidades aos direitos. São Paulo: Malheiros Editores, 1994.
  • MENDEZ, Emílio García. “Adolescentes e responsabilidade penal: Um debate latino-americano”. Observatório do Governo Eletrônico, 2011. Disponível em: http://www.egov.ufsc.br/portal/conteudo/adolescentes-e-responsabilidade-penal-um-debate-latino-americano
    » http://www.egov.ufsc.br/portal/conteudo/adolescentes-e-responsabilidade-penal-um-debate-latino-americano
  • MOLINA, Antonio García-Pablos de; GOMES, Luiz Flávio. Criminologia: Introdução a seus fundamentos teóricos - Introdução às bases criminológicas da Lei 9.099/95 - Lei dos Juizados Especiais Criminais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.
  • RIZZINI, Irene; RIZZINI, Irma. A institucionalização de crianças no Brasil: Percurso histórico e desafios do presente. Rio de Janeiro: PUC-Rio; São Paulo: Loyola, 2004.
  • SARAIVA, João Batista Costa. Compêndio de Direito Penal juvenil: Adolescente e ato infracional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006.
  • SPOSATO, Karyna Batista. O Direito Penal juvenil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.
  • VILLAS-BÔAS, Eduardo da Silva. Direito Penal e o paradigma da responsabilidade juvenil: Ato infracional, medida socioeducativa e direitos fundamentais. Salvador: EDUFBA, 2012.
  • VOLPI, Mário. Sem liberdade, sem direitos: A privação de liberdade na percepção do adolescente. São Paulo: Cortez, 2001.
  • 1
    Diz-se “formal”, tendo em vista que, ainda no início do século XX, antes da edição do Código de Menores, em 1927, em alguns estados da República, já havia iniciativas que permitiam formas de institucionalização da infância e da adolescência “em situação de risco” (CIFALI, CHIES-SANTOS e ALVAREZ, 2020CIFALI, Ana Cláudia; CHIES-SANTOS, Mariana; ALVAREZ, Marcos César. “Justiça juvenil no Brasil: Continuidades e rupturas”. Tempo Social, vol. 32, n. 3, pp. 197-228, 2020., p. 200).
  • 2
    Em sua dissertação de mestrado A emergência do Código de Menores de 1927: Uma análise do discurso jurídico e institucional da assistência e proteção aos menores, Marcos César Alvarez (1990ALVAREZ, Marcos César. A emergência do Código de Menores de 1927: Uma análise do discurso jurídico e institucional da assistência e proteção aos menores. Dissertação (Mestrado em Sociologia) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 1990.) examina, por meio da perspectiva foucaultiana da “história do presente”, o contexto histórico que culminou na promulgação da legislação voltada especialmente para a juventude pobre brasileira. Suas constatações revelam, entre outros elementos, um discurso permeado pelos postulados da Escola Positiva, sendo essa interconexão o foco do tópico a ser desenvolvido.
  • 3
    Quanto a este ponto, é importante anotar a conclusão de Cifali (2019CIFALI, Ana Cláudia. As disputas pela definição da justiça juvenil no Brasil: Atores, racionalidades e representações sociais. Tese (Doutorado em Ciências Criminais) - Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2019., p. 94): “Com a reforma de 1979, ocorre uma readequação dos conceitos utilizados de acordo com a racionalidade e os saberes dominantes no momento. Diante da pressão internacional e nacional por reformas na legislação, o Estado brasileiro responde a esse apelo, mas sem qualquer modificação do conteúdo e das diretrizes do modelo anterior. Os juízes seguiram imbuídos de amplos poderes na tomada de decisões sobre a vida de crianças e adolescentes, especialmente a partir da perspectiva de que o magistrado não deveria se ocupar apenas das questões tipicamente jurídicas, mas também deveria ser capaz de suprir as deficiências impostas pela ausência de políticas públicas adequadas”.
  • 4
    O presente tópico visa pontuar a premissa da qual partem os autores. Para maior aprofundamento da questão, sugere-se a leitura da íntegra da dissertação de mestrado (MALACARNE, 2018MALACARNE, Emilia Klein. A Justiça (Penal) juvenil entre a teoria e a prática: Um estudo comparado das práticas judiciais carioca e gaúcha. Dissertação (Mestrado em Ciências Criminais) - Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2018.) que deu origem ao presente artigo.
  • 5
    O presente artigo apresenta parte dos resultados da pesquisa desenvolvida no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Ciências Criminais - Mestrado da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), integralmente exposta na dissertação A Justiça (Penal) juvenil entre a teoria e a prática: Um estudo comparado das práticas judiciais carioca e gaúcha (MALACARNE, 2018MALACARNE, Emilia Klein. A Justiça (Penal) juvenil entre a teoria e a prática: Um estudo comparado das práticas judiciais carioca e gaúcha. Dissertação (Mestrado em Ciências Criminais) - Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2018.), aprovada, com louvor, em janeiro de 2018.
  • 6
    Para a realização da pesquisa de campo, submeteu-se um pedido de autorização para o(a) magistrado(a) de cada vara e juizado a ser observado, detalhando-se as etapas da pesquisa, a sua extensão, o período em que as observações seriam realizadas, além do compromisso em assegurar o sigilo quanto aos dados de identificação dos adolescentes envolvidos nos processos. Anexado a esse pedido, enviou-se o projeto de pesquisa, previamente aprovado em banca de qualificação. A pesquisadora, ainda, agendou uma reunião com os(as) magistrados(as), a fim de prestar esclarecimentos adicionais e, assim, confirmar a possibilidade de realização da pesquisa. Em todos os casos, a autorização foi verbal, concedida nas citadas reuniões.
  • 7
    A VIJ do Rio de Janeiro conta com uma juíza titular e outros três juízes auxiliares: à titular compete a condução da instrução e o julgamento dos casos de maior gravidade (roubo, homicídio, latrocínio, estupro etc.); aos demais são atribuídos os casos mais comuns e de gravidade mais baixa, como tráfico de drogas, furto, lesão corporal leve e receptação. A observação de audiências foi realizada com todos os juízes, a fim de evitar que os resultados obtidos fossem o desenho do perfil de um magistrado, e não do órgão julgador.
  • 8
    O período de realização da pesquisa de campo na VIJ do Rio de Janeiro coincidiu com a realocação do cartório em prédio sediado no bairro Santo Cristo, localizado na Zona Portuária da cidade. Em razão disso, a organização dos processos no cartório restou um tanto prejudicada. Justamente em razão da mudança, muitos dos processos arquivados que eram mantidos no cartório haviam sido recentemente encaminhados ao arquivo central. Portanto, a alternativa encontrada foi a de selecionar aleatoriamente cem processos para pesquisa. Do mesmo modo, o cartório do 4º JIJ/POA havia sido realocado para a ala reformada do Fórum Central, e, durante a mudança, a maioria dos processos arquivados fora remetida ao arquivo judicial. Por esse motivo, a seleção dos processos para exame, também nesse caso, foi aleatória.
  • 9
    As pesquisas de jurisprudência foram realizadas na ferramenta de busca disponibilizada nas plataformas de pesquisa dos sites dos respectivos tribunais, na aba “pesquisa de jurisprudência”.
  • 10
    Nas audiências de apresentação, o adolescente é submetido a interrogatório no qual o juiz, o representante do MP e a defesa do adolescente formulam perguntas sobre as suas condições pessoais, bem como sobre os fatos imputados a ele.
  • 11
    Não foi realizada uma análise sobre o perfil racial dos adolescentes, pois eles não foram questionados a respeito de tal enquadramento. Desse modo, o critério para a coleta de tais dados dependeria exclusivamente da observação da pesquisadora em audiência e da sua compreensão sobre como enquadrar o adolescente. Por esse motivo, optou-se por não incluir o critério racial no perfil delineado pela pesquisa.
  • 12
    Labeling approach, também conhecido como teoria do etiquetamento, pressupõe que, para que uma conduta seja considerada criminosa, ela deve provocar uma reação social negativa. Há, todavia, a partir da definição das condutas desviantes e da aplicação do rótulo de outsider ao seu autor, um processo de estigmatização (ou rotulação), que tem início no que as teorias do conflito irão chamar de criminalização primária (momento em que se estabelecem os tipos penais e as normas aplicáveis). A seletividade marca tanto o processo de criminalização primária como o de criminalização secundária (momento de aplicação das normas). Enquanto no primeiro há uma seletividade qualitativa, decorrente da escolha dos bens jurídicos que serão penalmente tutelados, bem como das condutas que serão consideradas ofensivas a esses bens jurídicas, no segundo, a seletividade é, além de qualitativa — a partir da aplicação da norma com maior frequência a determinados perfis em detrimento de outros —, também quantitativa, haja vista que não há aparato estatal para a vigilância e repressão de todas as condutas transgressoras. Para maior aprofundamento, ver Becker (2008BECKER, Howard. Outsiders: Estudos sobre a sociologia do desvio. Rio de Janeiro: Zahar, 2008.).
  • 13
    Foram analisados cem processos arquivados em cada comarca.
  • 14
    Quanto à presença dos pais ou de responsável pelo adolescente durante o interrogatório, nos casos analisados, foi registrada em 37,2% dos casos em Porto Alegre e em 45,9% dos casos no Rio de Janeiro. Em 29,1% dos interrogatórios conduzidos pela polícia gaúcha, o adolescente estava desacompanhado; no Rio de Janeiro, essa situação se repetiu em 34,4% dos casos. No restante das situações, não houve registro de acompanhamento, de modo que não foi possível depreender se o adolescente estava ou não acompanhado pelos pais ou por responsável (33,7% em Porto Alegre; 18,8% no Rio de Janeiro).
  • 15
    Para verificar a frequência com que os adolescentes foram ouvidos sem a presença de defensor, vide Gráfico 2.
  • 16
    Na capital gaúcha, em 2,44% dos casos, os adolescentes não receberam assistência de advogado — particular ou defensor público —, enquanto no Rio de Janeiro essa situação ocorreu em apenas um caso analisado, o que representa 0,89% do total de processos e audiências observadas. Em Porto Alegre, apenas 4,8% dos adolescentes possuíam procurador constituído antes da audiência, contra 3,7% na capital fluminense.
  • 17
    O instituto da remissão assemelha-se à transação penal e está previsto nos artigos 126 e 127 do ECA (lei no 8.069/1990), que assim dispõem: “Art. 126. Antes de iniciado o procedimento judicial para apuração de ato infracional, o representante do MP poderá conceder a remissão, como forma de exclusão do processo, atendendo às circunstâncias e consequências do fato, ao contexto social, bem como à personalidade do adolescente e sua maior ou menor participação no ato infracional. Parágrafo único. Iniciado o procedimento, a concessão da remissão pela autoridade judiciária importará na suspensão ou extinção do processo”. “Art. 127. A remissão não implica necessariamente o reconhecimento ou comprovação da responsabilidade, nem prevalece para efeito de antecedentes, podendo incluir eventualmente a aplicação de qualquer das medidas previstas em lei, exceto a colocação em regime de semiliberdade e a internação”.
    Quanto à designação desse instituto, mostra-se oportuno o esclarecimento feito por Saraiva, que, por sua importância, vai reproduzido a seguir: “O instituto da remissão, tal e qual o concebe o Estatuto, encontra sua origem no Art. 11 do texto das Regras Mínimas Uniformes das Nações Unidas para Administração da Justiça de Menores, Regras de Beijing. O conceito “remissão” constante da tradução para o Português foi extraído da versão oficial em espanhol daquele documento, que define o instituto como remisión. Como se sabe, os documentos oficiais da ONU são editados em “língua de trabalho”, onde não se inclui o Português. No documento em inglês, o instituto chama-se diversion, que poderia ser traduzido para o Português como “encaminhamento diferente do original”. Cumpre observar que a palavra em inglês remission, ato de remitting (que significa perdoar, ou deixar de infligir uma pena) não foi utilizada na versão em inglês.
    A versão em espanhol poderia ter utilizado o termo derivasión, mais próximo do Inglês diversion, mas optou por remisión, dando a esta expressão um sentido mais amplo do que de simples perdão, pois, em verdade, poderá implicar inclusive a aplicação de medida (não privativa de liberdade), resultando na supressão do processo judicial ou sua suspensão” (SARAIVA, 2006, pp. 135-136). Sublinha-se que será utilizada a expressão “concessão de remissão” apenas para manter a designação contida no ECA, sem a finalidade de lhe atribuir conotação de “perdão”.
  • 18
    Na íntegra da pesquisa (MALACARNE, 2018), os dados são apresentados com maior detalhamento, tornando possível narrar algumas situações observadas durante a pesquisa de campo que auxiliam a exemplificar e demonstrar, de modo mais aprofundado, as conclusões expostas no presente artigo. Assim, para maior aprofundamento, recomenda-se a leitura da pesquisa completa.
  • 19
    Para a análise deste ponto, é importante apontar os tipos penais praticados com maior frequência nos casos analisados (entre audiências e processos arquivados), relembrando que os casos foram escolhidos aleatoriamente ao longo do ano de 2017. Foram selecionados seis atos infracionais de maior incidência em Porto Alegre e no Rio de Janeiro. Em Porto Alegre: roubo (37,64%), homicídio e tentativa de homicídio (11,8%), tráfico de drogas (11.23%), porte de arma (8,99%), ameaça (6,74%) e lesão corporal (6,74%). No Rio de Janeiro: roubo (40,7%), tráfico de drogas (18,59%), furto (15,07%), associação para o tráfico (15,07%), porte de arma (6,53%) e resistência (5,53%). Chama atenção o alto índice de atos infracionais análogos ao crime de roubo (nas formas simples e qualificada) nas duas capitais: em ambos os casos, próximo de 40% do total. Além disso, sublinha-se que na capital gaúcha houve uma maior variedade de tipos de delitos representados, sendo surpreendente a maior incidência de representações por atos cometidos mediante violência ou grave ameaça à pessoa.
  • 20
    A referida súmula assim dispõe: “Só é lícito o uso de algemas em casos de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado” (súmula vinculante no 11 do Supremo Tribunal Federal).
  • 21
    Internação sem possibilidade de atividade externa (ISPAE) e internação com possibilidade de atividade externa (ICPAE) referem-se a duas modalidades da medida socioeducativa de internação aplicadas no Rio Grande do Sul.
  • 22
    Para fins de facilitar a compreensão sobre os resultados obtidos, optou-se por utilizar os termos condenação e absolvição como equivalentes de representação julgada procedente e representação julgada improcedente, respectivamente.
  • 23
    Para avaliar se uma sentença foi suficientemente fundamentada, foram analisados: se a decisão abordou as teses trazidas pela acusação e pela defesa; se fez o exame da prova produzida durante o processo; e se apresentou os motivos de fato e de direito em que se fundaram a decisão, ou se tão somente apresentou uma argumentação genérica e/ou padronizada.
  • 24
    Trechos ilustrativos extraídos do julgado: Rio Grande do Sul. Tribunal de Justiça. Apelação Cível 70071403893. Câmara julgadora: Oitava Câmara Cível. Relator: Luiz Felipe Brasil Santos. Julgado em 15/12/2016)
  • 25
    Trecho ilustrativo extraído do julgado: Rio Grande do Sul. Tribunal de Justiça. Apelação Cível 70071848451. Câmara julgadora: Oitava Câmara Cível. Relator: Ricardo Moreira Lins Pastl. Julgado em 15/12/2016.
  • 26
    Prestação de serviços à comunidade (PSC); liberdade assistida (LA). Para demais siglas, ver nota 21.
  • 27
    “16.1 Para facilitar a adoção de uma decisão justa por parte da autoridade competente, a menos que se trate de infrações leves, antes da decisão definitiva será efetuada uma investigação completa sobre o meio social e as circunstâncias de vida do jovem e as condições em que se deu a prática da infração” (Regras mínimas das Nações Unidas para administração da Justiça da Infância e da Juventude - Regras de Beijing, item 16.1).
  • 28
    Cita-se, como exemplo: “Apelação cível. ECA. Ato infracional equiparado ao roubo majorado. Nulidades afastadas. Autoria e materialidade comprovadas. Mantida a medida socioeducativa aplicada. [...] Segundo o Art. 1º do Estatuto da Criança e do Adolescente, a medida socioeducativa possui como desiderato principal fazer despertar no menor infrator a consciência do desvalor de sua conduta, bem como afastá-lo do meio social, como medida profilática e retributiva, possibilitando-lhe a reflexão e reavaliação de seus atos. Recurso desprovido”. (Rio Grande do Sul. Tribunal de Justiça. Apelação Cível 70071400279. Câmara julgadora: Sétima Câmara Cível. Relator: Liselena Schifino Robles Ribeiro. Julgado em 09/11/2016).
  • 29
    Segundo Badaró (2019, p. 848), “o efeito devolutivo dos recursos diz respeito à matéria que será levada à apreciação do Tribunal”. Quando um recurso é recebido apenas no seu efeito devolutivo, a sentença proferida em primeira instância mantém os seus efeitos até que o recurso seja definitivamente julgado pelo tribunal. Quando se confere efeito suspensivo à apelação, o adolescente somente cumprirá a medida estabelecida na sentença, caso esta seja confirmada posteriormente pelo tribunal.
  • 30
    Trecho ilustrativo extraído do julgado: Rio de Janeiro. Tribunal de Justiça. Apelação Criminal 0173519-52.2016.8.19.0001. Câmara julgadora: Quarta Câmara Criminal. Relator: José Roberto Lagranha Távora. Julgado em 06/12/2016.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Fev 2022
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2022

Histórico

  • Recebido
    07 Out 2020
  • Aceito
    21 Jul 2021
Universidade Federal do Rio de Janeiro Largo de São Francisco de Paula, 1, Sala 109, Cep: 20051-070, Rio de Janeiro - RJ / Brasil , (+55) (21) 3559.1926 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: coordenacao.dilemas@gmail.com