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A aplicação da remição de pena pela leitura: Discursos e práticas

The application of remission of penalty by reading: discourses and practices

Resumos

Este trabalho procura apresentar a experiência prática da política de remição de pena pela leitura em Santa Catarina, por meio de entrevistas com coordenadores responsáveis por essas iniciativas em duas unidades prisionais. Eles decidem sobre os procedimentos tomados e a dinâmica operacional e selecionam os livros e critérios de avaliação. Além de aproximar e comparar os dois projetos de remição pela leitura, o trabalho se propõe a investigar as intenções morais e os fins visados e alcançados nos discursos dos coordenadores. Como resultado, foi identificado que ainda não há dados sistematizados sobre a reincidência dos participantes dos projetos de remição de pena.

Palavras-chave:
ressocialização; políticas prisionais; subjetividade; reincidência; sistema prisional


The application of remission of penalty by reading: discourses and practices seek to present the policy of remission of penalty by reading in the state of Santa Catarina, through interviews with coordinators responsible for these initiatives in two prison units. They decide on the procedures taken, the operational dynamic, and select the books and evaluation criteria. In addition to bringing together and comparing the two projects of reference through reading, the work proposes to investigate the moral intentions and the ends envisaged and achieved in the coordinators' speeches. As a result, it was identified that there are still no systematized data on the recidivism of participants in penalty remission projects.

Keywords:
resocialization; prison policies; subjectivity; recidivism; prison system


Introdução

Aremição de pena pela leitura é um projeto de participação voluntária recomendada àqueles que apresentam bom comportamento interno, em que o preso/a leitor/a tem o

(...) prazo de 21 a 30 dias para a leitura de uma obra, apresentando ao final do período uma resenha a respeito do assunto, possibilitando, segundo critério legal de avaliação, a remição de quatro dias da pena e ao final de até 12 obras efetivamente lidas e avaliadas (CNJ, 2013CNJ. Recomendação no 44 de 26/1 1/2013. Dispõe sobre atividades educacionais complementares para fins de remição da pena pelo estudo e estabelece critérios para a admissão pela leitura. Brasília, DF: CNJ, 2013.).

A política de remição de pena ganhou maior visibilidade midiática quando alguns políticos, presos a partir de 2015, pela Operação Lava Jato, passaram a desfrutar desse benefício. Sua legitimidade legal se deu, porém, alguns anos antes, por meio da aprovação, no Congresso Nacional, do Projeto de Lei (PL) no 265/2006. Esse projeto deu origem à lei no 12.433/2011, que versa sobre a garantia de direito à educação em espaços de privação de liberdade e incluiu, na Lei de Execução Penal (LEP), a possibilidade da remição de pena pelo estudo, antes apenas garantida por trabalho.

Com isso, em 20 de junho de 2012, quase um ano depois da aprovação lei, foi lançada pelo Conselho da Justiça Federal (CJF) e pela diretoria-geral do Departamento Penitenciário Nacional (Depen) do Ministério da Justiça a portaria conjunta no 276, que disciplina o Projeto de Remição pela Leitura no Sistema Penitenciário Federal para os presos custodiados em penitenciárias federais, resolvendo em suas atribuições legais que o projeto deverá ser aplicado a presos em regime fechado, com participação voluntária, e poderá ser integrado a outros projetos educacionais e de remição.

Nesse mesmo caminho, em 26 de novembro de 2013, foi lançada a recomendação no 44, que dispõe sobre atividades educacionais complementares para fins de remição da pena pelo estudo e estabelece critérios para a remição pela leitura, considerando o disposto nos artigos 126 a 130, da lei no 7.210/84. A redação dada pela lei no 12.433, de 29 de junho de 2011, e todos os ofícios legais que a legitimam, possibilitam que a remição de pena pela leitura possa ser executada por analogia à remição de pena pelo estudo.

Até a edição dessas normativas, a remição por leitura ainda não havia sido regulamentada em suas minúcias, havendo uma descentralização na execução, de modo que os estados possuíam certo grau de autonomia na condução dessa política, que podia variar de região para região, de estado para estado e até mesmo de uma unidade prisional para outra (AGUIAR, 2009AGUIAR, Alexandre. Educação de jovens e adultos privados de liberdade: perspectivas e desafios. Paideia. Belo Horizonte, v. 6, n. 7, p. 101-121, 2009.). Com isso, os critérios para a implementação da remição eram decididos pelas varas de execuções penais (VEP) de cada estado ou pela diretoria das próprias unidades prisionais, fazendo uso da discricionariedade. É nessa brecha que residia a possibilidade de critérios próprios quanto à prática em cada unidade prisional.

Devido aos apontamentos desses problemas, a partir da pressão feita por pesquisadores, agentes e órgãos engajados na promoção de direitos e políticas para o cárcere, foram lançadas a resolução no 391, de 10 de maio de 2021 e a nota técnica no 72, de 13 de novembro do 2020, pelo Depen/CNJ, duas recentes normativas oferecendo diretrizes para a execução da remição pela leitura considerando todas as lançadas anteriormente.

Enquanto a nota técnica tem a finalidade de apresentar os procedimentos que dizem respeito às ações de leitura, cultura e esporte integradas à educação na prisão, a resolução se destina ao Poder Judiciário, a respeito da observância e do reconhecimento do direito à remição de pena por meio de práticas socioeducativas.

Ambos os documentos são posteriores ao recolhimento de dados empíricos que serão apresentados na sequência. Também por isso, servem como exemplo da necessidade de normativas claras e acompanhamento sistemático de políticas que atuem na prisão, espaços em que a fiscalização e o acompanhamento das comunidades são, na maioria das vezes, dificultosos.

Problema e procedimentos de pesquisa

O presente trabalho é uma pesquisa qualitativa e contou com a aplicação de entrevistas semiestruturadas e em profundidade com os responsáveis por dois projetos de remição pela leitura na capital e na região Norte de Santa Catarina (SC). Os agentes foram escolhidos por suas posições hierárquicas e estratégicas, o que concede validade analítica para as informações apresentadas, já que são representantes do objeto a ser estudado, mergulhados nos códigos e familiarizados com os temas que envolvem as questões que serão levantadas. Como tal projeto é anterior à nota técnica no 72/2021, os coordenadores responsáveis pela remição eram os mesmos que decidiam quais serão os procedimentos tomados, a dinâmica operacional, quais seriam os livros e critérios de avaliação, visando ou não à recomendação no 44, único parâmetro legal disponível até aquele momento.

Com isso, a questão que passa a se colocar é justamente a das motivações morais na condução de tais projetos e a mobilização de uma possível arbitrariedade possibilitada pela discricionariedade, entendendo que a questão da punição no país não pode ser entendida tão somente a partir de seus fins. Com isso, a pesquisa busca captar as proximidades e os distanciamentos entre os dois projetos de remição de pena pela leitura que serão apresentados a seguir. Destarte, tem-se o esforço analítico de demonstrar como as políticas para o sistema carcerário brasileiro e a atuação de seus agentes estão inseridas em um processo complexo desde sua proposição, aprovação legal até sua execução, estando referendadas por diversas ideias, motivações morais e concepções distintas em um campo conflituoso. Como Mello (31/03/2020)MELLO, Kátia Sento Sé. O sistema prisional brasileiro no contexto da pandemia de Covid-19: Artigo da professora Kátia Sento Sé Mello, da Escola de Serviço Social (ESS) da UFRJ, sobre a situação da população carcerária do país. 2020. Conexão UFRJ, Memória, 31 mar. 2020. Disponível em: https://conexao.ufrj.br/2020/03/o-sistema-prisional-brasileiro-no-contexto-da-pandemia-de-covid-19/. Acesso em: 31 mar. 2020.
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bem aponta, não há homogeneidade no que se denomina sistema prisional brasileiro. O que, de certa forma, existe, são maneiras distintas de lidar com a gestão das unidades prisionais.

Outro ponto central neste trabalho será compreender o processo de ressocialização por meio da educação formal e literária em espaços de punição e privação de liberdade e tencioná-lo sociologicamente como fenômeno analisável, por meio das seguintes questões: a que se destina e o que se busca com a ressocialização? Destacando as diferenças entre as formas de execução dessa política e suas justificativas será possível chegar às diferentes intenções morais que estão por trás da política de remição de pena no país.

Cada entrevista teve duração de uma a duas horas e foi gravada com gravador ou aparelho celular quando permitido pela direção das respectivas penitenciárias. Além dos aparelhos eletrônicos, estive munida de lápis e do roteiro de entrevistas impresso, em que pude fazer algumas anotações ou readequar a ordem das perguntas conforme o desenrolar das conversas.

A remição de pena pela leitura em Santa Catarina

A Gerência de Desenvolvimento Educacional (Geduc) do Departamento de Administração Prisional (Deap) e setores ligados à Secretaria de Estado da Administração Prisional e Socioeducativa (Seaps) são os órgãos estaduais de SC responsáveis pela oferta de educação nas unidades prisionais, pelo monitoramento dos projetos de remição por meio do estudo e da leitura e pela adequação das atividades educacionais conforme os parâmetros legais do Ministério da Educação (MEC) e do Depen. Segundo a Geduc, até 2021, quase todas as 49 unidades prisionais de SC tinham projetos para a remição de pena, seja pelo trabalho, pelo estudo formal ou pela leitura, ainda que não consigam atender todos/as os/as presos/as, devido à alta demanda.

Em 2016, a pedido da Geduc, foi desenvolvido e redigido um projeto oficial, chamado programa Despertar pela Leitura, organizado por Janete Elenice Jorge, professora da rede pública estadual e doutora em educação; coordenado pedagogicamente por Heloisa Helena Reis Cardenuto, funcionária pública da Secretaria de Estado da Educação (SED); desenvolvido em parceria com a Secretaria de Justiça e Cidadania (SJC); e apresentado para a Gerência de Modalidades, Programas e Projetos Educacionais de Santa Catarina da Secretaria de Estado da Educação, com o objetivo de padronizar a execução da remição pela leitura no estado, estabelecer diretrizes e servir:

(...) como um guia para orientar pedagogicamente a aplicação de projetos de leitura com fins de remição da pena, pelos professores, gestores, tutores, técnicos e demais profissionais nas instituições que adotem a Educação Carcerária em Santa Catarina. Faz-se necessário que os profissionais envolvidos com a aplicação de projetos de leitura em espaços de privação de liberdade compreendam o que é a remição da pena pela leitura, conheçam qual a base que a regulamenta, o que é a leitura, como planejar atividades didático-pedagógicas para trabalhar com os apenados em diferentes contextos e como avaliar as atividades de aprendizagem propostas (CARDENUTO, 2016CARDENUTO, Heloisa H. Projeto Despertar Pela Leitura. Secretaria de Estado de Justiça e Cidadania, 2016., p. 1).

Para além da recomendação no 44, foi notada a falta de parâmetros unificados, de mecanismos de implementação e continuidade em nível nacional, bem como de critérios de avaliação e compilação de dados e informações gerais. A SJC/SC propôs assim homogeneizar a aplicação no âmbito estadual por meio do Despertar pela Leitura, esperando com isso explicitar tais parâmetros formais que permitissem que a aplicação nas diferentes instituições do estado possa ter certa homogeneidade.

Embora a iniciativa tenha surgido visando padronizar e barrar possíveis arbitrariedades, as intenções das secretarias - responsáveis por elaborar um documento que guiasse e oferecesse um modelo padronizado, suprindo, assim, a ausência desses na LEP - não são uma necessidade para o desenvolvimento da remição de pena pela leitura, porém, ainda assim, o fazem. Essa proposta por si só indica certo grau de discricionariedade reivindicada e posta em prática por tais secretarias. Tal discricionariedade é justificada por uma não arbitrariedade, uma vez que homogeneizar significa que as secretarias reivindicam para si o poder de ditar os parâmetros que, por sua vez, serão oferecidos para a execução e possíveis análises dos índices de eficácia do programa.

A remição de pena pela leitura apresenta como justificativa a oferta de “educação e cidadania para os apenados, promovendo também o direito ao conhecimento, desenvolvimento das capacidades cognitivas, resgate da autonomia e reintegração social” (CARDENUTO, 2016CARDENUTO, Heloisa H. Projeto Despertar Pela Leitura. Secretaria de Estado de Justiça e Cidadania, 2016., p. 3). Segundo o próprio documento desse programa, a concepção de educação seguida carrega dois sentidos: amplo e restrito. O primeiro se refere às relações sociais de ordem cultural que são ressignificadas de acordo com aspectos contextuais. Já o sentido restrito está ligado à educação em termos de escolarização formal. A incorporação desses dois sentidos de educação comporta a concepção de educação assumida pela Geduc, além de ser uma tentativa de referência formal a ser seguida com intenções de homogeneizar a aplicação da remição de pena nas unidades prisionais do estado.

É seguindo esse programa, respaldado na recomendação no 44 e na portaria conjunta no 276, que os diversos projetos de remição de pena do estado de Santa Catarina vinham desenvolvendo sua atuação no projeto ressocializador, mesmo que alguns deles sejam iniciativas anteriores ao documento. As atuações após as duas normativas mais recentes - nota técnica no 72/2021 - deverão ainda ser investigadas, em um futuro próximo, para assim serem identificadas as possíveis mudanças e readequações.

Joinville

O projeto de remição de pena pela leitura na Penitenciária Industrial Jucemar Cesconetto, de Joinville, que mantém em média 700 presos sob custódia, foi um dos primeiros a serem desenvolvidos no estado e inspirou muitos outros projetos de remição de pena em SC. Ele começou em 2013, pela iniciativa do então juiz da VEP e corregedor do sistema prisional da Comarca de Joinville, João Marcos Buch, figura bastante presente na mídia local (CATRACA LIVRE, 19/12/2019CATRACA LIVRE. Carta comovente de juiz para detentos de Joiville viraliza na web. Catraca Livre, Cidadania, 19 dez. 2019. Disponível em: https://catracalivre.com.br/cidadania/carta-comovente-de-juiz-para-detentos-de-joinville-viraliza-na-web/. Acesso em: 6 fev. 2023.
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) pela atuação com a remição de pena, pela autodivulgação de seu trabalho como juiz e pelo engajamento nas pautas de direitos humanos.

Para participar do projeto de remição de pena pela leitura nessa unidade, o preso deve escolher uma obra da lista dos livros selecionados, ter um prazo de 20 dias para realizar a leitura e mais dez dias para escrever a resenha. Quando finalizada, é encaminhada ao Departamento de Letras da Universidade da Região de Joinville (Univille), onde uma das professoras, com alunos bolsistas do curso, faz a leitura das resenhas e apresenta um parecer técnico, posteriormente encaminhado ao juiz idealizador para, quando aprovado, ser feito o abatimento da pena.

Além disso, a unidade conta com uma oficina literária idealizada pelo dramaturgo e escritor Alex Giostri, chamada A Formação do Eu, com atividades de escrita literária que “privilegiam um resgate de identidade, com o objetivo de incutir no apenado a ideia de valores éticos morais, a fim de que cada um tenha a possibilidade de reescrever sua própria história” (GIOSTRI, 2016GIOSTRI, Alex. Contos tirados de mim: A literatura no cárcere, vol. 2. São Paulo: Giostri, 2016., p. 13). A oficina resultou na publicação do segundo volume do livro intitulado Contos tirados de mim: A literatura no cárcere e no documentário Licença poética, dirigido pela cineasta paulista Ilaine Melo e pelo jornalista catarinense Altamir Andrade.

Entrevistas: Marcos e Alex1 1 A partir daqui, serão usadas apenas as iniciais dos nomes dos entrevistados. O anonimato não será mantido por se tratar de figuras conhecidas e, principalmente, por terem autorizado a divulgação das identidades.

O projeto de remição de pena pela leitura, assim como nas outras unidades do estado, conta com uma coordenação pedagógica e com professores atuantes. A cada livro lido e resenhado, são abatidos quatro dias da pena. Os livros foram adquiridos via fundo pecuniário e doações da editora Giostri. São romances, peças de teatros e literatura infantojuvenil, privilegiando autores e autoras nacionais. “Sendo o estado laico, a literatura que envolve autoajuda ou caráter religioso não entra no projeto de remição pela leitura, mas o acesso é pleno porque é um direito”.

- Não há censura de tema. Não há censura nenhuma, o que eu penso é sempre na eficiência. Não adianta pegar um romance que tenha 600 páginas, se torna enfadonho por melhor que seja o romance. Uma novela infantojuvenil que atenda jovens de 14 a 16 vai atuar muito bem no sistema prisional onde a escolaridade é nível fundamental, onde eu estou lidando com baixa autoestima, onde eu estou lidando com falta de leitura, com cérebro massacrado por ter se tornado um número... onde eu preciso de uma narrativa linear, de modo que não se bifurque tanto como uma literatura mais sofisticada.

Quanto à motivação para os projetos, o juiz M. afirma que foi devido a sua origem e trajetória com uma educação literária incentivada pela sua família.

- Percebo que os detentos estão trancados em celas sem possibilidade de ter educação, sem possibilidade de trabalhar e ficam ociosos naquele ambiente precário, superlotado, com a lei não sendo aplicada, porque houve uma lei que determinou que eles estejam presos, mas há uma lei de execução penal que diz que eles devem ter acesso à educação e ao trabalho.

M. evoca o vocábulo da lei e da garantia dos direitos para justificar o seu engajamento e atuação direta nos projetos. Diz que, ainda que haja um interesse no ganho do abatimento da pena, a literatura passa a transformar as pessoas que leem. Porém, se posiciona contrário à tentativa de padronização dos projetos realizada pela secretaria estadual, visto que o projeto segue moldes formalistas de educação que se chocam com a realidade concreta do cárcere.

- A partir do momento que você inclui a literatura e a leitura num programa curricular educacional, você torna isso uma obrigatoriedade, você faz com que aquele detento que tem mau comportamento, falta disciplinar, não tenha o direito ao Despertar pela leitura, você faz com que aquele detento que tenha algum déficit educacional se afaste. Você faz com que o detento sinta receio, porque ao final ele vai ser submetido a uma prova. Ele já está sendo submetido a uma prova diariamente na sua vida, 24h por dia, minuto a minuto ele está sendo submetido a uma prova de vida, e você quer que ele se submeta a mais uma prova para despertar pela leitura? É claro que isso não vai funcionar! (...) a leitura tem que entrar de uma forma lúdica, de uma forma voluntária, recreativa. É claro, com cuidado, olhar de respeito para com a literatura. Não é essa a intenção das pessoas que estão trabalhando, mas pode ser usado como mais uma maneira de neutralização do ser humano. Eu já vi projetos, não é esse Despertar pela leitura; já vi projetos de colegas, não necessariamente de Santa Catarina que dizem: ‘são 12 detentos e os 12 detentos vão ler os livros que eu indicar, e os livros que eu indicar serão Guerra e Paz, Crime e Castigo e se eles querem, querem. Vão ter o tempo para ler e no determinado dia o professor vai fazer a prova e eu vou junto e vou ficar olhando a prova sendo feita’. Olha, é uma tortura isso, a forma como foi feito.

M. ficou conhecido como “juiz das causas humanas” e passou a aderir ao rótulo. Constantemente publica imagens de suas visitas à penitenciária e escreve para blogs, jornais ou se pronuncia em entrevistas como um juiz garantista que, apesar de acreditar que a ressocialização seja um mito, uma vez que na sua concepção presos e presas nem sequer teriam sido alguma vez socializados devidamente, luta para que a ressocialização se concretize (BUCH, 09/11/2020BUCH, João Marcos. O mito da ressocialização e a eterna luta por ela. GGN, Cidadania, 9 nov. 2020. Disponível em: https://jornalggn.com.br/opiniao/o-mito-da-ressocializacao-e-a-eterna-luta-por-ela-por-joao-marcos-buch/. Acesso em: 8 fev. 2023.
https://jornalggn.com.br/opiniao/o-mito-...
). Afirma que “existem alternativas ao direito penal, alternativas que trabalham o eu, trabalham a pessoa. (...) você trabalha com o anterior, trabalha com as instituições prévias que falharam e faltaram para que quando a pessoa chegasse aos 18 anos cometesse um crime e fosse presa”.

Dando seguimento, questiono se a educação literária seria uma dessas alternativas.

- A literatura é fundamental numa sociedade, num padrão de civilidade que a gente queira alcançar. Agora, quando se fala em prisões, elas apenas reduzem danos, ela não é a solução, a solução é diminuir o número de pessoas que estão presas. Então eu não vejo a leitura como a descoberta da pólvora pra que dentro das prisões a violência reduza, o problema é muito mais complexo. As prisões existem por n fatores e continuarão existindo se não mudar a nossa estrutura social de pensar e de trabalhar. A literatura para a humanidade é fundamental pra evolução, claro que é. Mas nesse aspecto de prisão, não, ela não é a solução, na minha opinião.

Pergunto o que espera como resultado desses projetos enquanto juiz que opera e faz parte do sistema prisional. M., então, responde:

- O que eu esperava já aconteceu, os livros passaram a fazer parte do dia a dia da unidade prisional, do complexo prisional de Joinville. (...) Eu não posso me alimentar como salvador dessas pessoas, eu tenho que acabar com as prisões, reduzir ao máximo o número de presos. Às vezes eu vejo as pessoas como se aquilo fosse a vida delas e por ali elas mesmas se salvariam e aí os presos acabam ficando em segundo plano.

A oficina literária A Formação do Eu se diferencia do projeto de remição de pena pela leitura pelo incentivo da escrita livre e não unicamente para a produção da resenha do livro lido. Ela se dá a partir de “exercícios de criação que privilegiam, sobretudo, a formação do eu, isto é, da identidade e do resgate da identidade”, e é coordenada pelo escritor e editor idealizador da oficina. O objetivo, segundo A., é promover a escrita de textos literários com o intuito de desenvolver o estímulo e crescimento individual de forma a “incutir no apenado a ideia de valores éticos e morais, a fim de que cada um tenha a possibilidade de reescrever sua própria história”.

Na prática, cada oficina é realizada por um período de seis semanas, com dois encontros semanais com duração de, em média, três horas. Cada participante deve ler pelo menos um livro e resenhá-lo. As primeiras experiências foram coordenadas pelo próprio A., mas pela impossibilidade de estar sempre presente, visto que habita a cidade de São Paulo onde administra sua editora, organizou a formação de uma equipe para atuar no seu lugar.

- Reúno os pedagogos, a psicologia, a terapia ocupacional e digo exatamente como deve ser feito, porque o maior desafio não são os apenados, são os coordenadores que atuam de uma maneira não tão eficaz, sob minha ótica.

A. é fundador e proprietário da editora Giostri, responsável por grandes doações para outros projetos de leitura nas penitenciárias do estado. Ao perguntarmos se, além das doações, ele mantinha contato com outros projetos ou se tem dado formações fora do estado de Santa Catarina, ele diz que já foi convidado por alguns projetos, mas que se recusa quando as práticas não se alinham com seus valores e crenças pessoais. “(...) o projeto não contemplava a vida, o ser humano, contemplava a pesquisa, contemplava a coisa pela coisa, então não me interessava”.

Em Florianópolis, onde contribuiu com o projeto de remição de pena pela leitura, A. faz críticas quanto à finalidade e conduta seguida. “Eu converso e gosto muito do J., respeito o trabalho, mas é um outro olhar. Existe uma preocupação muito maior em ser premiado, em dizer que a coisa acontece do que pensar na vida pós”.

Além disso, A. diz que em 2017 foi convidado pelo professor emérito da Universidade de São Paulo, Roberto da Silva2 2 Silva (2011) tem publicado diversos trabalhos relacionados a educação no cárcere e se alinha a uma perspectiva freireana. , a coordenar o curso “Docência em regimes de privação de liberdade”. “(...) de agosto a dezembro eu coordenei as atividades e ainda publiquei um livro chamado Didática no cárcere. Lá eu trabalhei com 69 professores justamente a questão da eficiência da aplicação pedagógica”.

A. vê o sistema prisional como falido e aponta “o pré e pós cárcere” como importante em projetos como esses.

- Exatamente o que eu acabei de falar pro CNJ, se trabalha esse pré-egresso, se fez todo esse trabalho agora que está sendo feito, deu certo com esses 180 presos, mas quem que vai tutelar esses 180 depois nos primeiros 12 meses de egresso? É esse resultado que interessa pra gente no sistema prisional. Saber se dessas 180 pessoas voltaram 30, voltaram 40, voltaram 10, 120? É isso que interessa. (Informação verbal)

Quando conversamos sobre o projeto elaborado pela Geduc, a prática na unidade de Joinville e a diferença entre ambas, apesar de afirmar que toda ação e atividade de leitura dentro do cárcere é válida, A. expressa certo incômodo com o título Despertar pela leitura. A ideia implícita lhe parece um tanto quanto “religiosa, espiritualista”. Diz que “a gente tem que ter muito cuidado... o projeto é uma planta baixa, se der na mão de outra pessoa vai se transformar em outra coisa”.

- Como humanizar sem estar humanizado? Talvez seja essa a grande problemática do sistema como um todo. Talvez seja essa a problemática de um projeto de despertar pela leitura ou formação, do projeto que seja do país, quando colocado enquanto sistema é colocado para que qualquer um faça. Porque o problema é na formação, o problema da questão educacional é na formação. A educação, ela tá retrógrada, ela é falha, os professores têm um recorte curto, são falhos.

Talvez por ser tão crítico à formação docente e à conduta e ideias de outros operadores, A. dê formações e se sinta capaz, ou mais preparado, que qualquer outro para desempenhar tal função. Na orelha de um de seus livros, Contos tirados de mim: A literatura no cárcere (2016), publicado por sua editora, apresenta a metodologia utilizada e relata a experiência e os contos de alguns presos. Nela se lê:

O resultado é interno, é emocional, é particular. E reflete na vida, nas pessoas ao redor, na convivência, na descoberta de agora saber que aquilo que achou não pode ser mais perdido. Essa é a função da nossa oficina, a de dar vida interna a cada um dos participantes, a de apresentar indiretamente caminhos novos para entrarem em contato com seus sentimentos e com isso refletirem em tudo, seja através de seus personagens ficcionais, ou através do que sentiram ao escrever sobre os seus temas e histórias.

Questionamos qual a concepção de eu a qual o título da oficina se reporta e o que seria exatamente isso. A. relata que, em princípio, existe uma deficiência na construção da identidade de todas as pessoas, mas que os atuantes (professoras, coordenadores psicólogos etc.) seriam as ferramentas ativas dessa reconstrução.

- Eu trabalho nas oficinas essa partida de princípio que essa fundação foi mal elaborada, talvez alguma coisa falhou, uma vez que a pessoa está presa e ninguém escolhe estar preso. Quando essa fundação falha é a hora da gente poder trabalhar essa desconstrução. Ou então essa reconstrução. Eu acredito muito nessa primeira proximidade de construção que é quando você, pela primeira vez, descobre que você pode ser melhor. (...) trabalho sob a ótica do inconsciente, sob a ótica da psicanálise. Eu ensino a reconstrução. Eu desconstruo e reconstruo. A nossa oficina é exatamente isso, se desconstrói e reconstrói, se desconstrói e reconstrói. Só que a gente lida com isso na literatura, só que isso é como um primeiro passo pra vida. Um tipo de semente plantada.

Seguindo o roteiro, perguntamos se a oficina de leitura e a própria literatura podem, além de contribuir para uma educação formal, contribuir também para alguma outra educação. Para A., “a leitura, o livro e o conhecimento salvam”. Eles possibilitam uma saída simbólica do cárcere, que transportaria os presos-alunos para outro universo. Se no começo o preso é atraído apenas pela remição da pena, num segundo momento ele “vai descobrir que os seus conflitos pessoais, por exemplo, são sempre muito pequenos diante de todos da vida. Vai ter soluções muito mais interessantes pra vida se for uma mulher ou um homem, letrada ou letrado”.

Rebatemos tal afirmação dizendo que ainda que a literatura e o livro possam oferecer uma espécie de “liberdade simbólica”, o corpo continua aprisionado. A. é assertivo e responde:

- Continua aprisionado, mas ele vai e volta, o cérebro leva. Mas a maneira que você começa a lidar, quando você começa a lidar de uma maneira muito clara com os deveres e direitos, a própria estada no cárcere passa a ser vista de outra maneira, não vira mais uma intempérie do destino, vira uma passagem. Vamos partir do princípio de que não é bom estar preso, mas estar preso 10 anos não é nada numa vida de 80 anos. Ao mesmo tempo que um dia preso, não posso dizer que tá tudo bem. Então, é simbólico. Eu acho que pode possibilitar o poder de escolha. Eu acho não, eu tenho certeza! O que acontece com quem está na oficina é a possibilidade do poder de escolha. Como são os livros que são esse livre arbítrio, se ele delinquir ou reincidir ou ir procurar emprego ou fazer algo ilegal, é pelo poder de escolha.

Por fim, responde às possíveis críticas que uma oficina ou projeto envolvendo literatura e remição de pena possam vir a receber. Com isso, também deixa clara suas intenções com tal empreendimento:

- O problema não é dar livro, dar xadrez, dar música. O problema é dar possibilidade de uma re tracinho vida [re-vida]. Se não der isso nada funciona. (...) A função da prisão no mundo é o aprisionamento, mas se existe a punição porque então o Estado não vai trabalhar para fazer algo? A pena é essa, estar preso. Então vamos trabalhar o formatório, a forma, ou melhor, a reforma, a reconstituição.

Florianópolis

O Complexo Penitenciário da Agronômica salta aos olhos daqueles que ainda não o naturalizaram na sua localização urbana. Inclui, além da penitenciária, os presídios masculino e feminino, a Casa do Albergado e o Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico e está localizado entre dois dos bairros centrais mais nobres da capital catarinense. Ocupa o espaço de 400 mil m2 em uma rua principal, exatamente atrás do mais tradicional e ativo centro de cultura da região, o Centro Integrado de Cultura (CIC). A Penitenciária foi inaugurada em 1930, a urbanização daquela região, como a conhecemos hoje, se deu trinta anos mais tarde, na década de 1960. Isto é, foi a cidade que se construiu ao redor dela, não ao contrário.

O projeto de remição pela leitura realizado nessa unidade teve início em 2017 por iniciativa do atual coordenador e ex-agente penitenciário que, por intermédio do conhecimento da remição em outras unidades do estado, apresentou a proposta de implementação do projeto Despertar pela leitura para o juiz da VEP, Marcos Germer Condé, responsável pelo cargo na época. Tal empreendimento foi possível por meio da normativa no 001/2010, na qual se prevê a existência de um setor de educação nas unidades prisionais. A Gerência de saúde, educação e promoção social (Gesal) tem três setores: setor social, de saúde e de educação. Atualmente, o setor de ensino conta com um supervisor de ensino - entrevistado para a pesquisa - e três agentes na parte operacional de educação, além das professoras do Ensino de Jovens e Adultos (EJA) e do professor de leitura.

O projeto de remição pela leitura conta com o trabalho de um grupo de estudantes de biblioteconomia da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc). Os primeiros 415 livros a compor o acervo foram adquiridos via doação da Editora Giostri3 3 A editora em questão pertence a um dos idealizadores do projeto realizado na unidade Industrial de Joinville. , de São Paulo, enquanto a segunda leva foi adquirida via doação de diversas entidades. Além disso, acontece nessa unidade a remição por estudo com aulas de EJA, ensino formal e profissionalizante. Com a impossibilidade de atender todos os presos - 1.580 pessoas divididas em dez alas -, o projeto de remição pela leitura preenche as 170 vagas do projeto, dando preferência para aqueles que ainda tem uma longa trajetória de pena a cumprir. Os projetos são opcionais, isto é, não obrigatório, e contam com fila de espera.

A unidade tem uma única biblioteca, portanto, o professor de leitura é responsável por selecionar os livros e distribuir entre os presos-leitores. Aqueles considerados “indisciplinares”, 10% em média, não são autorizados a desfrutarem do benefício das remições.

Entrevista: J.

A entrevista foi realizada em 3 de fevereiro de 2020 com o agente penitenciário responsável pela supervisão da educação e do ensino na penitenciária de Florianópolis. J. tem ensino superior incompleto e ingressou no trabalho de agente prisional. Em 2017, foi convidado pelo diretor da penitenciária da época a implementar o projeto remição pela leitura na capital, inspirado pela experiência da Penitenciária Industrial de Joinville, conduzida pelo juiz de direito da VEP e corregedor do Sistema Prisional da Comarca de Joinville.

J. relata que os livros que fazem parte do projeto seguem os critérios da Recomendação no 44, que os títulos são escolhidos pelo professor orientador de leitura e distribuídos entre os participantes do projeto. Já as doações que não se enquadram são enviadas para entidades carentes ou mantidas no acervo da biblioteca, mas não usadas para remição. Porém, em contradição com a recomendação no 44, diz:

- Livros espíritas e da Igreja Universal já estão fazendo parte da remição por leitura. A Universal fez uma doação ano passado pra gente, de títulos para o projeto. Tinha presos que participavam da religião e queriam livros religiosos.

Para que o projeto aconteça, três agentes prisionais atuam na parte operacional, J. na supervisão e um professor de leitura para auxiliar nas resenhas.

- É um trabalho, como a gente costuma dizer, de facilitadores de ensino. A gente não esquece que é agente, que a gente veste preto, mas também a gente é a ligação entre a parte operacional e a parte educacional, porque educação na penitenciária, no sistema prisional em si, não é uma atividade-fim, é uma atividade-meio. A gente sempre pensa na educação e que a parte fim é a segurança. A gente tem que lembrar que tudo envolve segurança: educação, trabalho, sendo atividades-meios.

Vestir preto significa que existe uma relação de diferenciação e conflito entre os indivíduos que ocupam os muros e as celas. Mesmo coordenando o setor educacional, a imagem é daquele que representa a personificação do controle: “(...) efetivamente o guarda representa e simboliza tudo o que oprime o preso, ou tudo que o preso experimenta (...). Consequentemente, o guarda constitui o alvo imediato de sua hostilidade e a interação entre ambos será frequentemente áspera.” (COELHO, 1987COELHO, Edmundo C. A oficina do diabo: crise e conflitos no sistema penitenciário do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Espaço e Tempo: Iuperj, 1987., p. 84).

Quando questionado sobre a relação entre presos e agentes, J. conta como a remição e a atuação além “do cadeado” pode ser uma moeda de troca para a boa convivência.

- (...) pro preso fazer qualquer coisa dentro do sistema ele tem que ter bom comportamento carcerário. Se não tiver bom comportamento, ele não vence, ele não consegue. Então, o que acontece: se ele não tratar bem o agente, seja nós ou seja outro, ele não vai conseguir as coisas, então ele acaba sendo um pouco mais amistoso porque ele sabe que se começar a ter enfretamento ele não consegue benefício. Porque não é um direito, é um benefício. Então são coisas um pouco diferentes.

J. diz que “a liberação, a forma e o caminho” variam de uma unidade para outra. “Tem a ver com o Tribunal de Justiça”, segundo ele.

- O juiz que vem pra VEP da capital vem pensando em ser ou desembargador, ou já tá na linha pra ser, ou ele tá pensando em alguma coisa dentro do TJ. Então, ele não vai fazer alguma coisa pra dar errado, ele vai se cercar de tudo que ele possa se cercar pra coisa realmente não ser furada e não dar errado pra ele. E isso tem o lado bom e tem o lado ruim: o lado bom é que a coisa fica toda amarrada, o lado ruim é que tu tens a morosidade. Então, por que que Joinville deu certo? Porque o Dr. J. libera verba pecuniária pra fazer o projeto e a ação, mas não existe nada escrito.

Para conseguir a autorização do juiz da VEP, J. conta que decidiu ele mesmo contatá-lo: “Eu mandei uma mensagem privada pro juiz da VEP na época”. Na sua visão, “tudo na capital é mais difícil” visto que as negociações precisam ser feitas diretamente com as instâncias superiores.

- No momento em que eu faço um projeto só na capital, ele não pode continuar em outro lugar. Existe uma linha estadual que a gente batalha. Então, a gente precisa trazer um projeto de oficina literária a nível de estado, que seria parecido com uma remição por leitura, mas que tu tivesse a nível estadual. Daí tu não fica refém da boa vontade de juiz de VEP.

Além da negociação com instâncias superiores e seus posicionamentos ideológicos na forma como concebem as políticas prisionais e os direitos e benefícios daquelas populações, os responsáveis pelos projetos de remição de pena precisam negociar e contar com a boa-vontade dos agentes penitenciários responsáveis por “abrir o cadeado” para que os presos saiam das galerias e sejam acompanhados até a sala de aula ou espaço de estudo, quando existente. Isso gera um trabalho extra para os agentes, além de que muitos não acreditam que os projetos irão surtir resultados.

J. relata a necessidade de o projeto ser estruturado no âmbito estadual, uma vez que as transferências de unidades não são incomuns e a não continuidade faz com que o preso perca a possibilidade de remir a pena. Por outro lado, existe a necessidade de regulação e controle estadual para barrar a arbitrariedade (mobilizada enquanto discricionariedade) dos juízes locais, que podem conceder ou não o cômputo da remição, uma vez que são a última ponta de decisão de todo o processo. Enfatiza ainda que o atual promotor é contra a Recomendação no 44, o que dificulta o seu trabalho.

- Não conheço o novo presidente do TJ ainda, mas preciso ver o que ele quer. É muito mais fácil sentar com o cara e ele falar: “eu sigo algo nessa linha, se tu fizer nessa linha eu vou aprovar, se não, esquece”. (...) Então tu tem que entender o que o TJ quer, o que a Secretaria [Sesp] quer, fazer manobras... Porque alguém tem que abraçar e executar.

Aqui J. deixa claro que não basta ter a decisão, é preciso negociar com órgãos superiores para que a remição seja válida, uma vez que ela pode ser posta em prática, mas barrada no momento de computação da diminuição da pena. Além disso, existem os interesses e manobras dos presos participantes que muitas vezes usufruem da remição de forma pouco alinhada com os interesses dos idealizadores.

- Se o preso sabe que o regime dele vai abrir daqui um ano, ele pensa em quantos dias ele precisa. Às vezes, ele não entra pensando no trabalho e no estudo, ele pensa na remição. Claro, depois ele percebe os benefícios. Tem preso que lê quatro livros por mês, um da remição e mais os sociais, outros leem dez por mês. Só que tem preso que sabe que falta pouco pra cumprir e se mata no projeto pra ir pra casa, aí quando abre o regime ele não vai mais querer participar do projeto, ele é um preso ocioso. Mas eu não posso obrigar. Eu acho que tem que ter oferta pra 70% dos presos, 30% eu não tenho que ofertar. Eu não batalho pra 100% dos presos terem acesso, eu batalho pra 70%, porque já conheço a demanda. Tem preso que vai ficar pouco tempo aqui dentro, que são pena curta. Não vale a pena eu disponibilizar um professor ou despender todo um recurso pro preso amanhã ir embora. Tem que focar na ressocialização dos presos que tu sabe que vai ter um impacto, que vai ter um longo trajeto no sistema prisional. Esses 30% que eu digo que não vale a pena investir são presos que logo vão tá na rua, preso que não quer fazer nada, preso que vai rasgar livro, que vai usar o livro pra esconder droga, que vai perturbar todo mundo. É uma encrenca, não vale.

Não são todos que acessam a remição de pena: em primeiro lugar porque não há vaga para todos, pelos motivos explicitados anteriormente; em segundo porque é necessário ter a alfabetização plena (domínio da leitura e escrita), dando preferência para aqueles que não fazem parte de outros projetos de remição, como o de educação (EJA) e trabalho.

Quando perguntamos qual a maior contribuição da remição pela leitura, J. responde que são o comportamento e as relações interpessoais.

- A leitura não faz um trabalho sozinha. A educação sim é um processo transformador. É uma coisa com baixo investimento pro Estado e com grande retorno. Hoje, pra ter um projeto de remição por leitura, um professor de 40 h custa pro Estado, isso depois tu pode pesquisar com calma, mas vamos jogar 2 mil reais durante dez meses. Vou dar um exemplo burro: um preso custa mais ou menos R$3.500, o professor atende 120 presos em um ano. [Faz cálculos no computador]. Em um ano esse preso vai remir um mês de pena. [Se perde nos cálculos]. A economia que é pro Estado... Ele vai gastar R$20 mil com professor e economizar R$400 mil no final do processo. Se tu for pensar na lógica privada, é lucro, são R$400 mil reais de lucro. Pra remição por leitura eu preciso do quê? Se são 270 presos eu preciso de, pelo menos, duas vezes de livros pra isso aí, vamos jogar 550 pra fazer a rotação ideal. Um livro eu não uso um ano só, dá pra usar dois ou três anos o mesmo livro, porque o preso não vai ler o mesmo livro duas vezes, ele lê um livro a cada mês. Desses 550 livros, ele vai ler no final de 45 meses, nesses 45 meses que dá três anos e meio. Ou seja, eu investi ou não investi, porque o Estado não me fornece livros ainda, foram doações. No final do processo eu tenho lucro, ou quando não pensa em lucro o Estado pensa: eu deixo de gastar R$200 mil com presos. No Despertar pela Leitura hoje são 5,5 mil presos, imagina num projeto por dez meses, dá 220 mil dias de remição, o que dá 600 anos de remição. Pra 5,5 mil, tenho que ter 12 mil livros. Quanto é que custa 12 mil livros hoje? Se for R$40 cada livro, eu não vou gastar meio milhão de reais. Livros que eu vou ter que rotacionar a cada cinco anos. Eu dividi 12 mil livros em cinco anos, sai muito barato pra mim, sai quase de graça.

A relação com os resultados é feita a partir de um cálculo de custos, ou de lucro, como ele mesmo diz. “Esses cálculos malucos, quem me levou a ver foi o Dr. M.”, o juiz da VEP de Joinville.

Sobre o sentido do nome do projeto Despertar pela Leitura, J. afirma que é o despertar para um mundo diferente daquele que muitos presos nasceram e cresceram, longe dos livros e dos estudos. Um certo tipo de “ascensão cultural”.

- Ele começa a ler, ele começa a ver, poh, que o mundo é muito maior do que aquilo: “eu posso ser muito mais coisas, eu posso ser alguém”. Isso transforma, e aí muitas vezes o Despertar desperta ele pra voltar a estudar, pra voltar e se formar. (...) o preso, ele quer participar do Despertar, ele chega: “Seu J., eu quero participar do ensino regular também. Eu quase não sei ler”. Aí ele começa a ver que ele, “poxa, eu tô sendo, me tornando uma pessoa melhor”. É muitas vezes pela leitura que ele se torna uma pessoa diferente. Ele despertou prum mundo.

Se por um lado J. afirma que tem “gente que não tem jeito”, por outro ele acredita que a educação tem o potencial de transformar os indivíduos. Ao questionarmos se tais projetos poderiam ser úteis para diminuir a violência e a criminalidade, ele responde que:

- Contribui! Já diminui a indisciplina dentro da unidade prisional. Tem preso que participa do projeto visando a redução. Esse preso não dura muito no projeto. Vira e mexe ele cai. Tem preso que não, tem preso que quer, que começa a usar o Despertar pela leitura como plataforma pra que ele possa mudar, e a família percebe isso, o advogado percebe isso, e eles começam a injetar, começam a jogar combustível, fomentar. Eu tenho preso que era extremamente problemático e hoje é exemplo dentro da galeria. Por quê? Por causa disso!

Afirma também que essa melhora no comportamento resulta em um afastamento do ilícito e que muitas vezes o preso participante do projeto tem que pedir para mudar de cela, porque já não se identifica com os colegas. Segundo ele, “tudo por causa do livro”.

Quanto à forma de ver os sujeitos participantes dos projetos, nota-se uma ideia de ressocialização para o pagamento de uma dívida com a sociedade.

- Ele cometeu um crime, ele tem que ser punido. Quando ele é punido, ele fica preso um tempo, perde acesso a algumas coisas. Pra isso que serve a cadeia. Quando acaba aquela punição, ele volta pra sociedade. Claro que aqui dentro tem que fazer um trabalho de ressocialização pra ele entender que aquilo que ele fez é errado e possa devolver alguma coisa pra sociedade. Claro que depende muito do fator humano, se ele não quiser mudar as coisas não mudam. O que esse cara sabe fazer que pode ajudar a sociedade? Se ele é engenheiro, colocamos ele pra trabalhar numa indústria dez anos de graça, quer dizer, de graça não, o estado vai pagar pra manter, ele vai estar preso. Esse cara tem que ficar 30, 40, 50 anos que seja. Ele tem que ficar pra devolver pra sociedade. Matar não resolve. Tu vai gastar três reais pra dar um tiro na cabeça de um cara desses? Vai resolver o quê? A maior punição que um cara desses pode ter é deixar cinco anos trancado na cadeia, onde ele vai envelhecer 30. É o maior castigo que tu vai dar pra ele, matando tu estaria dando um alívio.

Por fim, aponta a relação entre prisão e comunidade externa como útil para o que ele chama de melhoria do sistema prisional.

- A gente nunca teve uma melhoria no sistema prisional como nos últimos quatro, cinco anos. Quando se iria pensar que uma acadêmica iria estar fazendo um trabalho sobre sistema prisional. A gente não deixava, pisava o pé na porta, a gente mandava embora, não deixava nem entrar na cadeia. Hoje, diante dos protocolos, a pessoa pode vir e nos ajudar, porque isso é útil pra gente. Hoje a gente dá palestra em ensino superior. Com isso, se consegue mudar a cabeça das pessoas e trazer apoio da sociedade.

Foi essa melhoria da qual J. fala que nos levou a adentrar os muros da prisão, reflexo da transformação da visibilidade da instituição que passou a ter uma maior centralidade na mídia e na própria academia, nas últimas décadas. Ter a comunidade externa como aliada útil não diminui a ordem de segurança e controle, mas tenta mascarar a arbitrariedade inerente nos processos burocráticos já citados. Além do mais, abre espaço para a falsa plasticidade do “façamos juntos/as” e distribui a responsabilidade mesmo que as estruturas sigam rígidas e inabaláveis.

Aproximações

Quadro 1
Categorias constitutivas dos discursos

Empreendedor moral: Joinville

O conceito de “empreendedor moral” foi pensado pelo sociólogo Howard Becker para descrever analiticamente aqueles que tomam as regras, seja as criando ou as impondo. O que cria é chamado de “reformador cruzado”, aquele que julga que nada pode estar certo até que ele possa arbitrar sobre as regras e em seu conteúdo. “O cruzador moral é interessado em impor sua própria moral aos outros, muitos têm fortes motivações humanitárias. Ele não está interessado apenas em levar outras pessoas a fazerem o que julga certo. Ele acredita que se fizerem o que é certo será bom para elas” (BECKER, 2019BECKER, Howard. Outsiders: Estudos de sociologia do desvio. 2.ed.. Rio de Janeiro: Zahar, 2019., p. 155).

Esse reformismo geralmente se apresenta na fórmula de aproximação entre uma classe dominante com uma menos favorecida, com a intenção de “oferecer ajuda”. Os reformistas se utilizam da legitimidade da sua posição de poder para atuarem de forma arbitrária sob o segundo grupo. Eles operam sob a justificativa de uma ação humanitária maior, como por exemplo, as causas dos direitos humanos ou a evolução das sociedades por meio da cultura letrada.

Tornam-se, então, profissionais de erros a serem corrigidos. Com a criação de regras, é feita uma adequação e seleção, criando, assim, um novo grupo de outsiders entre aqueles já subjugados. O que começa com a empreitada de melhora e adequação moral por uma regra, se torna uma organização de imposição. Becker apresenta como exemplo de impositores de regras os policiais, agentes que justificam seu modo de agir para “justificar a existência de sua posição e ganhar respeito daqueles com quem lida” (2019, p. 163).

A questão moral discutida por Durkheim também pode ser aproximada dos casos estudados. Sendo assim, formar moralmente não envolve despertar virtudes particulares. “Para agir com eficácia, sobretudo quando a ação só pode ser exercida durante um período tão breve, é necessário ter um objetivo definido, representado com nitidez; é preciso ter uma ideia fixa, ou um pequeno número de ideias fixas que operem como um polo” (DURKHEIM, 2008DURKHEIM, Émile. Da divisão do trabalho social. São Paulo: Martins Fontes, 2008., p. 37).

Os moralistas são os árbitros da moral a ser empregada, “para uns, é a noção de utilidade, para outros a noção de perfeição, para aquele outro, é a ideia da dignidade humana, etc.” (DURKHEIM, 2008DURKHEIM, Émile. Da divisão do trabalho social. São Paulo: Martins Fontes, 2008., p. 38). Nisso reside o caráter arbitrário dos “empreendedores morais”, a moral escolhida após olhar para si, escolhendo a maneira como ele mesmo a concebe. A questão central está em saber quais interesses sociais e morais devem salvaguardar e com que direito. A sua justificativa não pode ser unicamente pautada na subjetividade, existem interesses de todo o tipo que devem ser considerados. É quase uma unanimidade entre os entrevistados a ideia de algum tipo de falha na trajetória dos indivíduos presos. Uns creem que tal falha diz respeito às instituições sociais fundantes, como família, escola, instituição religiosa etc., indo ao encontro daquilo que Adorno (1991)ADORNO, Sérgio. A socialização incompleta: os jovens delinquentes expulsos da escola. Cadernos de Pesquisa, n. 79, p. 76-80, 1991. chamou de “socialização incompleta”. Do outro lado, há os que apontam para uma falha ou má formação da subjetividade ou fundação mal elaborada, mais voltada aos aspectos morais e valorativos dos indivíduos e na sua maneira de se autoconceber e conceber o mundo. O objetivo definido e a ideia fixa no caso do “empreendedor moral” do respectivo projeto de remição de pena é um tipo de aculturação que busca agregar a cultura literária. Com isso, atribuem seus papéis, justamente, como empreendedores da completude da socialização incompleta, um empreendimento moral que arbitra sobre a subjetividade dos indivíduos presos. Com respaldo da burocracia legal, se apoiam na fatalidade de um problema existente, como o é o superencarceramento e a baixa escolaridade da população prisional.

Apesar de respaldados pela política de remição de pena e de usá-la como meio do empreendimento moral, precisam mostrar que sua atuação é eficaz e vale a pena, e que “o mal com que deve lidar supostamente está sendo de fato enfrentado adequadamente” (BECKER, 2019BECKER, Howard. Outsiders: Estudos de sociologia do desvio. 2.ed.. Rio de Janeiro: Zahar, 2019., p. 164).

Ao reconhecerem a educação, a leitura e o trabalho como importantes na vida dos presos e na própria dinâmica prisional, seriam, na sua própria concepção, os únicos agentes capazes de possibilitar esse salto emancipatório. Eles se autoatribuem como agentes diretos capazes de formulação e salvação do inconsciente do outro, tirando, com isso, a luz da educação como aquela que “salvaria” numa concepção de ideal emancipatório.

A modificação ou reconstrução do “eu” pressupõe que existe um “eu” que deve ser apagado, substituído, que não serve mais. Ao final, se chega a um individualismo culposo que atribui ao indivíduo a responsabilidade não só pelos seus atos ilegais, mas também pela sua condição social precarizada e desviante.

Enfatizam, assim, os aspectos individuais mais que os estruturais como maiores determinantes do ato criminoso. Ou seja, mesmo diante de um cenário social de exclusão e desigualdades, o fator relevante seria a escolha individual do sujeito em cometer o crime. Ao reconhecer certas determinações, condutas e que o próprio indivíduo deve ser ressocializado, tal modelo pretende atuar como agente direto de uma nova identidade, conformando valores e morais, como um novo determinante.

Além disso, de forma mais específica, a oficina de leitura remete às tais estufas das instituições totais sobre as quais falou Goffman (2001)GOFFMAN, Erving. Manicômios, prisões e conventos. 7.ed. São Paulo: Perspectiva, 2001., de modificação e experimentação social de gente. Esse processo tenta interceder na cultura aparente e já interiorizada da vida fora e anterior à experiência no cárcere, tendendo para uma aculturação. Goffman, mesmo quando escreveu detalhadamente sobre isso, optou pelo termo “desculturamento” em vez de “dessocialização”, por entender que este último sugere a perda de capacidades fundamentais para a comunicação e cooperação.

Em O cuidado de si, Foucault se interessou pela constituição de novas subjetividades, pelo contínuo deslocamento da subjetividade na história humana (MISSE, 2017MISSE, Michel. Impressões de Foucault: entrevista com Roberto Machado. Sociol. Antropol., Rio de Janeiro, v. 7, n. 1, p. 17-30, 2017.). Tratou da questão da ética da palavra por meio daquilo que os gregos chamaram de meditatio, regras práticas para a boa leitura e sua finalidade: a meditação, esse com sentido muito diverso daquele empregado na atualidade.

A escrita, por sua vez, seria um passo e processo fundamental para a meditação - meléte, meletân, seria uma forma de exercício de pensamento - e em pensamento, para a incorporação dos discursos (FOUCAULT, 1985FOUCAULT, Michel. História da Sexualidade: O cuidado de si, vol.3. São Paulo: Graal, 1985., p. 428). Foucault aponta a escrita enquanto um fenômeno de cultura e de sociedade da época. Um tipo de jogo em que o pensamento se sobressai ao sujeito.

(...) tornemo-nos o sujeito que pensa com verdade e, deste sujeito que pensa com verdade, tornemo-nos um sujeito que age como se deve. (...) de modo algum é um exercício sobre o pensamento e seu conteúdo. É um exercício pelo qual o sujeito se põe, pelo pensamento, em uma determinada situação (FOUCAULT, 1985FOUCAULT, Michel. História da Sexualidade: O cuidado de si, vol.3. São Paulo: Graal, 1985., p. 430).

Por meio desse exercício possibilitado pela leitura seria possível um deslocamento do que se é e do próprio espaço se pondo numa situação fictícia e constituindo “uma trama sólida de proposições que valham por prescrições, de discursos verdadeiros que sejam ao mesmo tempo princípios de comportamento” e ao mesmo tempo um "elemento do exercício de si” (FOUCAULT, 1985FOUCAULT, Michel. História da Sexualidade: O cuidado de si, vol.3. São Paulo: Graal, 1985., p. 431). Portanto, escutar, ler e escrever se constituem em arte da prática de si, que levaria a um dizer verdadeiro sobre si mesmo. Essa prática foi, segundo o autor, inscrita nos procedimentos indispensáveis à salvação que se aproxima de uma antecipação da confissão cristã, porém, nessa primeira o sujeito é ele próprio sujeito da verdade.

Esse arbítrio da salvação e da reformulação do eu são direcionadas ao indivíduo preso, que seria despido de suas concepções de si mesmo com uma espécie de mudança na chave subjetiva e moral, por meio das habilidades de criação ficcional sobre a sua própria visão de mundo e imaginação, criando um papel de si mesmo. Além disso, promete uma liberdade simbólica “acorporal”.

Desse modo, se tem o ponto de arbitrariedade em tais projetos: a ação de “re-” (dentro de toda a sua infinidade de possibilidades) aos indivíduos presos. Ainda que as regras sejam impostas aos indivíduos, como Durkheim (2008)DURKHEIM, Émile. Da divisão do trabalho social. São Paulo: Martins Fontes, 2008. bem argumentou, se nos conformamos com elas, é porque nos trazem consequências úteis. Enquanto o empreendimento moral é posto em ação, a educação formal e as habilidades de leitura estão de fato se concretizando.

Gerencial: Florianópolis

No caso de Florianópolis, o coordenador atou diretamente com os recursos e capitais sociais que tinha à disposição para, menos por meio da burocracia e mais por meio das relações face a face com os juízes, garantir a execução e liberação da remição de pena.

O modelo típico-ideal gerencial lhe foi atribuído pelo posicionamento enquanto funcionário da burocracia penitenciária, ainda que não ignorasse o seu papel na segurança, em busca de melhorias no funcionamento da instituição, com uma significativa preocupação com os gastos do Estado, sem, com isso, deixar de conceber a educação prisional como um meio de transformação dos indivíduos presos.

Ao se crer que não vale ofertar a remição para aqueles que têm penas curtas, o que se descortina é que o objetivo está longe de ter fins de acesso à educação ou à leitura, por mais que de uma forma ou outra, assim que o preso participa do projeto, isso aconteça independente do discurso empregado. A forma como tal projeto é posto em prática indica uma instrumentalização desse benefício pela ordem arbitrária que garante certos direitos, ainda que no caso da remição pela leitura seja um “benefício”, mas que ao mesmo tempo cria exceções e legaliza suspensões.

(...) o novo sujeito de direitos que não aproveita a oportunidade para se tornar um sujeito prudente será assim responsabilizado; o outro, que não atingir a prudência necessária, continuará a ser disciplinado e perderá os benefícios das “vantagens” adquiridas (CHANTRAINE e KAMINSKI, 2007CHANTRAINE, Gilles; KAMINSKI, Dan. La politique des droits en prison: Police institutionnelle, militantisme juridique, luttes démocratiques. Champ Pénal/Penal Field, Édition spéciale - Séminaire Innovations Pénales, 2007., p. 13).

Se o acesso à educação adentra os muros das prisões por meio das demandas por garantia do direito à educação, uma vez lá dentro, ele opera como um meio para se alcançar outros fins. O vocabulário dos direitos não aparece em nenhum momento da entrevista em Florianópolis. O que fica claro é a educação e o trabalho como vocação correcionalista. Para Baratta (1999)BARATTA, Alessandro. Ressocialização ou controle social: uma abordagem crítica da “reintegração social” do sentenciado. 1999. Disponível em: http://www.ceuma.br/portal/wp-content/uploads/2014/06/BIBLIOGRAFIA.pdf. Acesso em: 2 mar. 2020.
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, a proteção de direitos não se opõe à segurança, ela é o seu principal componente, é uma consequência positiva no controle.

Um ponto importante a ser lembrado é que a remição de pena não é obrigatória, portanto, o que poderia ser lido como direito a educação é na verdade um privilégio disputado: “os privilégios se transformam em direitos formais, mas as exceções justificadas pela necessidade de segurança os transformam novamente em privilégios” (CHANTRAINE e KAMINSKI, 2007CHANTRAINE, Gilles; KAMINSKI, Dan. La politique des droits en prison: Police institutionnelle, militantisme juridique, luttes démocratiques. Champ Pénal/Penal Field, Édition spéciale - Séminaire Innovations Pénales, 2007.).

A dinâmica de benefícios e privilégios obtidos por boa conduta apresenta-se como possibilidade de diversificar a rotina e estar em relação com atividades fora dos muros, como a educação. "A construção de um mundo em torno desses privilégios secundários é talvez o aspecto mais importante da cultura dos internos. Os castigos e privilégios são modos de organização peculiares às instituições totais" (GOFFMAN, 2001GOFFMAN, Erving. Manicômios, prisões e conventos. 7.ed. São Paulo: Perspectiva, 2001., p. 51). Eles são meios de diminuir ou aumentar a pena e ligam-se ao trabalho e à rotina interna. Disso decorrem processos de interação como "gírias institucionais" e diferentes status, que por sua vez, também contribuem na reorganização do eu na carreira moral. Como um exemplo disso temos os regalias, aqueles com permissão para transitar dentro da unidade prisional e realizar alguns trabalhos internos.

Nesse caso específico, pode-se dizer que a lógica que justifica esse projetos é menos a da garantia de direitos - como o coordenador de Florianópolis deixa claro, e mais a racionalidade capitalista-burocrática de gerar menos gastos para o Estado e, com isso, endossar a legitimação da instituição sanando a dívida que os indivíduos presos teriam com a sociedade e, posteriormente, podendo retribuir a ela a tutela e o dinheiro estatal gasto durante o tempo de aprisionamento.

Em ambos os projetos, os presos são pensados em termos de perdas e ganhos, sejam monetários ou comportamentais, a partir de uma “troca por bom comportamento”. Porém, o cômputo do baixo custo visando a saída antecipada dos presos se mostra um cálculo equivocado quando se sabe que o encarceramento não diminui quando um deles cumpre a pena e sai da instituição. Sabe-se que agentes de repressão do Estado trabalham para que outros muitos preencham sua vaga.

Tais projetos se aproximam de um dos pontos do discurso da evolução da penalidade e das políticas de segurança. Mais especificamente, da “filosofia terapêutica da reabilitação suplantada por uma abordagem gerencial centrada numa gestão contábil dos estoques e dos fluxos carcerários, orientada pela preocupação com os custos” (WACQUANT, 2015WACQUANT. Punir os pobres: A nova gestão da miséria nos Estados Unidos. A onda punitiva. 3.ed. Rio de Janeiro: Revan, 2015., p. 27).

Muito além dos cálculos confusos e dissimulados, o que está por trás dessa ideia de ganhos e lucros é a de fazer a população prisional pagar pela própria tutela punitiva do Estado e justificar a ilegitimidade do aprisionamento desproporcional.

Fins alcançados

Na determinação dos fins da ressocialização estão implícitos os valores nos quais os projetos se calcam (ALLEN, 1978ALLEN, Francis A. The Decline of the Rehabilitative Ideal in American Criminal Justice. Cleveland State Law Review, v. 27, n. 2, p. 147-156, 1978.). As políticas de remição de pena, além de garantir o acesso ao trabalho e à educação, visam diminuir parte da pena privativa de liberdade. Nos últimos anos, políticas e iniciativas têm sido formuladas nesse mesmo sentido, como a portaria apresentada, em 2016, pelo então ministro da Justiça, Eugênio Aragão, que institui a Política Nacional de Alternativas Penais com o objetivo de orientar ações, projetos e estratégias de incentivo da aplicação de alternativas à prisão no país e redução do número de presos em 10% até 2019. Com destaques às recentes normativas - resolução no 391/2021 e pela nota técnica conjunta no 72/2021 do DEPEN/CNJ - que dão continuidade e ressaltam a importância e engajamento público em tal questão.

Enquanto estatísticas nacionais, esse objetivo não foi alcançado de maneira pontual. Talvez ainda seja cedo para identificar os possíveis resultados desencarceradores da remição de pena no país e no estado de Santa Catarina. Apesar dos entrevistados acreditarem no potencial diminuição da violência, do crime e do desencarceramento pelos projetos de remição pela leitura, a Geduc e a Seasp ainda não possuem dados sistematizados sobre a reincidência dos participantes dos projetos de remição de pena.

Portanto, os projetos analisados buscam saídas para três possíveis problemas: 1) superlotação, visto que teoricamente o preso sairá mais cedo da prisão; 2) legitimidade da existência da instituição, cuja finalidade é ressocializar, por meio da entrada de direitos e benefícios, como os trabalhistas e educacionais; legitimidade tornada necessária quando sua existência e eficácia são cada vez mais questionadas, além de suas consequências tanto para os cofres públicos quanto na trajetória dos reingressos; e 3) eficácia simbólica, uma vez que estariam enfim cumprindo seu papel de “fazer justiça”, com a privação de liberdade, ao “devolver pessoas melhores” para a sociedade por meio da educação letrada.

É preciso ressocializar, reformular, reconstruir todo um vocabulário que crê na possibilidade de arbítrio sobre a subjetividade alheia. A reformulação, ou mortificação do eu, como chamou Goffman (2001GOFFMAN, Erving. Manicômios, prisões e conventos. 7.ed. São Paulo: Perspectiva, 2001., p. 68), é um tipo de imposição de condutas, uma nova assimilação da dinâmica da instituição por meio de uma carreira moral: “O que o ex-interno conserva de sua experiência institucional nos diz muita coisa a respeito das instituições totais”.

O ideal moral reformador não é nada novo na literatura sobre o tema. Angela Davis (2018)DAVIS, Angela. Estarão as prisões obsoletas? Rio de Janeiro: Difel, 2018. apontou que a relação entre os romances e as penitenciárias já foram usados em campanhas para reformar as prisões. Se por um lado a literatura permitiu acessar narrativas nas experiências e vivências intramuros, ela foi e tem sido mobilizada enquanto instrumento moral de salvação e remodelação das subjetividades. Se antes se poderia perguntar a quem interessava que os/as presos/as permanecessem analfabetos, hoje é válido pensar qual é a motivação que faz com que o acesso a direitos como educação e cultura sejam ofertados sob um status quo de punição.

Embora os projetos de remição de pena pela leitura tenham um caráter moralista de aculturação, não se pode negar que há um avanço no acesso à educação com etapas formativas sendo concluídas, oferecendo a possibilidade a algo que qualquer indivíduo fora das grades poderia desfrutar. A literatura não segue sendo tão aclamada ao longo da história à toa.

Assim que a prisão se abre para novas agendas de direitos humanos, ela ao mesmo tempo mantém sua legitimidade embasada em discursos que ultrapassam o do aniquilamento ou do depósito de gente, visto que estaria dessa vez cumprindo com a velha promessa de devolver para a sociedade aqueles/as que outrora eram bandidos/as. Esses, agora letrados e cultos, podem utilizar da livre escolha de seguir pela ilegalidade ou não. A tutela tardia oferecida pelo Estado parece cumprir sua parte com prisões prontas para reparar a chamada socialização incompleta (ADORNO, 1991ADORNO, Sérgio. A socialização incompleta: os jovens delinquentes expulsos da escola. Cadernos de Pesquisa, n. 79, p. 76-80, 1991.). O que sobra é o peso da responsabilidade individual e a legitimação de uma instituição datada que precisou abraçar demandas dos direitos humanos para se projetar ao longo das próximas longas décadas. Assim, estamos diante de uma dialética entre a entrada de direitos e, posteriormente, benefícios no cárcere e um efeito de responsabilização individual pela ressocialização que, ainda que indiretamente, contribui para a legitimação da própria instituição.

O Estado e suas instituições não mais viram as costas ou deixam morrer4 4 Assim como toda a pesquisa, as considerações finais e os resultados se referem a uma das facetas dos sistemas judiciário e penitenciário, que são múltiplos e nada hegemônicos. A pesquisa não pretende apresentar resultados que possam validar casos de outras regiões do Estado brasileiro com história e geografia diversa desta. , com esse tipo de projeto, passam a oferecer recursos para que a população carcerária possa se educar e ressocializar, proporcionando que seja capaz de cuidar de si mesma e de se assumir autorresponsável, ainda que em um contexto altamente vulnerável. O programa ressocializador tem se justificado enquanto garantia de direitos não perdidos, melhora qualitativa dos indivíduos presos e retorno ao mercado de trabalho formal - e com isso, diminuição dos índices de reincidências -, porém sem dados concretos que possam comprovar tal justificativa. Uma ressocialização que pressupõe a maleabilidade do caráter dos indivíduos e melhora no cenário do sistema prisional sem dados é ideologia, são discursos com fins que não são constatáveis. Como afirmar que a ressocialização se deu em vias de fato?

Sozzo havia trabalhado com a hipótese de que “a imposição da lei nem sempre reverbera em mudanças nas práticas punitivas e estas podem ocorrer fora do sistema penal” (SOZZO apudORBAN, 2020ORBAN, Vanessa. Máximo Sozzo. La inflación punitiva: un análisis comparativo de las mutaciones del derecho penal en América Latina (1990-2015), 2017. Tempo Social, São Paulo, v. 32, n. 3, p. 451-458, 2020., p. 452), assim como, não garantem uma mudança significativa e imediata no quadro do encarceramento. Tais políticas podem implicar prováveis mudanças nas práticas cotidianas dos agentes penais e prisionais.

A questão que fica em aberto e que deve mobilizar a todos e todas nós é - enquanto as prisões ainda existem abarrotadas e aos montes - como oferecer dignidade sem com isso legitimar e endossar o próprio discurso que perpetua o seu crescimento em força e proporção. A verificação de que a remição de pena, especialmente a remição pela leitura, pode e tem operado como um dispositivo disciplinar parece incontornável, ela ocorre dentro da prisão, não poderia ser outra coisa.

A análise oferecida aqui é, evidentemente, situada e esquemática, talvez também provisória. Ela se propõe a olhar sociologicamente para uma política ainda em andamento, não finalizada, que está e pode sofrer modificações na medida da conjuntura política e de seu próprio desenvolvimento.

  • 1
    A partir daqui, serão usadas apenas as iniciais dos nomes dos entrevistados. O anonimato não será mantido por se tratar de figuras conhecidas e, principalmente, por terem autorizado a divulgação das identidades.
  • 2
    Silva (2011)SILVA, Roberto da. Por uma política nacional de educação para os regimes de privação de liberdade no brasil. In: ONOFRE, Elenice Maria C.; LOURENÇO, Arlindo da Silva (Orgs.). O espaço da prisão e suas práticas educativas: Enfoques e perspectivas contemporâneas. São Carlos: EdUFScar, 2011, v. 1. p. 81-118. tem publicado diversos trabalhos relacionados a educação no cárcere e se alinha a uma perspectiva freireana.
  • 3
    A editora em questão pertence a um dos idealizadores do projeto realizado na unidade Industrial de Joinville.
  • 4
    Assim como toda a pesquisa, as considerações finais e os resultados se referem a uma das facetas dos sistemas judiciário e penitenciário, que são múltiplos e nada hegemônicos. A pesquisa não pretende apresentar resultados que possam validar casos de outras regiões do Estado brasileiro com história e geografia diversa desta.

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Editado por

Editor responsável: Michel Misse

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Maio 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    26 Abr 2022
  • Aceito
    17 Jan 2023
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