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The art of economic catch-up: barriers, detours and leapfrogging

Lee, Keun. The art of economic catch-up: barriers, detours and leapfrogging. Cambridge: Cambridge University Press, 2019. 300p

Promover o bem-estar da humanidade é vital. Entretanto, alcançar um crescimento econômico sustentável, especialmente nas economias em desenvolvimento, é um grande desafio, o qual tem sido objeto de vasta literatura econômica. Em especial, países como o Brasil necessitam superar a armadilha da renda média e, assim, acelerar a transição para se tornar um país de renda alta. Este é o tema central que Keun Lee, professor de economia da Universidade Nacional de Seul, trata em seu último livro, The art of economic catch-up: barriers, detours and leapfrogging. O livro oferece uma análise muito original sobre o processo de catching up econômico, particularmente sob a ótica do progresso tecnológico. A partir das experiências das economias bem-sucedidas nas últimas três décadas - Coreia do Sul, Taiwan e China -, o livro discute como fomentar uma estratégia viável de desenvolvimento baseada na inovação.

A ideia fundamental é a de que os mecanismos de crescimento diferem substancialmente dependendo do estágio de desenvolvimento. A difícil transição do estágio de renda média para o estágio de renda alta só é possível se uma economia faz desvios (detours) e leapfrogging. Lee afirma que “fazer um desvio pode ser mais rápido do que seguir um caminho direto”. Este aparente paradoxo ilustra um de seus argumentos centrais: as economias de países emergentes precisam explorar um novo caminho na construção de suas capacidades inovadoras, em vez de replicar práticas empregadas pelas economias avançadas. Mais que isso, precisam realizar o estágio final de desenvolvimento - chamado leapfrogging -, no qual superem os países centrais, tentando, assim, serem líderes em alguns setores sob um novo paradigma técnico-econômico.

O livro aborda três questões críticas que inibem o catching up: falha quanto à capacidade das firmas; falha quanto ao tamanho das empresas; e a proteção à propriedade intelectual. A falha quanto à capacidade das firmas refere-se à dificuldade de desenvolvimento das capacidades de inovação. Isto é, empresas de economias emergentes têm conhecimento limitado sobre como conduzir P&D (pesquisa e desenvolvimento) e lançar inovações. Esta falha decorre da falta de oportunidades para aprender e fomentar competências, e não simplesmente devido a uma falha de mercado que leva à falta de incentivos. A falha quanto ao tamanho da empresa diz respeito à dificuldade de geração de grandes empresas. O livro desenvolve o argumento de que as grandes empresas são necessárias para uma transição de renda média para renda alta, uma vez que tais empresas tendem a desfrutar ganhos de escala e promover externalidades, estando, portanto, em melhor posição para a realização de atividades de maior valor agregado como P&D e marketing. A forte proteção à propriedade intelectual é vista como uma barreira para o processo de catching up baseado em inovação. Depois de analisar uma série de estudos empíricos sobre o tópico, o livro conclui que a forte proteção à propriedade intelectual tem impacto negativo sobre as exportações e sobre o processo de aprendizado de economias emergentes.

Para superar estas três questões (duas falhas e uma barreira), o livro fornece aos formuladores de políticas públicas uma série de recomendações referentes aos três desvios (detours) necessários para a construção de capacidades inovadoras. A contribuição prática do livro é sem dúvida excepcional e tem como base a tese de que economias emergentes devem “ser semelhantes, embora diferentes” das economias avançadas. Além de garantir um regime de propriedade intelectual pouco rígido de forma a promover imitações e inovações menores, as outras duas recomendações se destacam pela originalidade. Uma recomendação é que o processo de globalização seja não linear: uma economia inicialmente deve aprender a partir da participação em cadeias globais de valor, mas, em certo ponto, deve reduzir sua dependência em relação a estas cadeias por meio da construção de cadeias domésticas, para então novamente aumentar sua participação de forma a entrar paulatinamente em segmentos de mercado mais sofisticados. Promover o aumento do valor agregado nacional é definido como uma estratégia central para evitar a permanência em segmentos de baixo valor agregado, uma condição típica de economias presas à armadilha de renda média. Outra recomendação refere-se à especialização setorial, apresentada no livro como uma escolha crucial durante o leapfrogging. A economias de renda média deveriam apostar em setores caracterizados por tecnologias de ciclo curto, cuja perspectiva de crescimento é elevada e as barreiras à entrada são baixas, em vez vez de tecnologias de ciclo longo. Inclusive, o livro discute a opção do Brasil e da Índia por fomentar o setor farmacêutico, caracterizado por uma tecnologia de ciclo longo e, portanto, difícil de ultrapassar a hegemonia das economias avançadas. O contraponto é a experiência da Coreia do Sul, que optou por semicondutores e tecnologias de informação e comunicação. A frequência com a qual inovações são introduzidas nestes setores torna o conhecimento obsoleto mais rápido e acelera o aprendizado tecnológico.

Outra tese fundamental do livro é que os grupos empresariais são um mecanismo organizacional importante para o catching up, preenchendo algumas lacunas institucionais necessárias para o fomento a grandes empresas. A partir da experiência de economias bem-sucedidas do leste asiático, o livro defende a ideia de que as grandes empresas facilitam o processo de catching up, pois possibilitam o compartilhamento de recursos escassos, promovem maior desenvolvimento de conhecimento e subsidiam a expansão a novos mercados por meio do acesso a capital. O livro reconhece que as grandes empresas devem ser complementadas por um número considerável de pequenas e médias empresas de relevância internacional, como meio para difundir o crescimento econômico e criar empregos. Ademais, o autor também reconhece algumas ressalvas no uso de grupos empresariais como um mecanismo de desenvolvimento econômico, incluindo o aumento do poder político que pode criar distorções. Entretanto, ele não explica completamente por que este mecanismo parece não ter o mesmo êxito em outras geografias. Por exemplo, muitas economias na América Latina (dentre elas o Brasil) não experimentaram os mesmos efeitos positivos dos grupos empresariais documentados no Leste da Ásia. Como o livro faz inferências com base nos casos mais bem-sucedidos da Coreia do Sul, Taiwan e China, a atribuição de tais induções a outros contextos deve naturalmente ser feita com cuidado.

Para o caso da América Latina (e particularmente o Brasil), o livro sugere a implementação de uma política industrial verde, cujo foco deveria ser em carros elétricos e outras energias renováveis, tais como a energia solar. Como fazem parte do novo paradigma técnico-econômico, as energias renováveis representam uma “janela de oportunidade” única para o leapfrogging da região, dada a sua abundância de recursos naturais. Outro setor promissor seria o de serviços de TI (tecnologia da informação), devido às baixas barreiras à entrada e aos casos de empresas de sucesso já reconhecidos. Pare Lee, um processo catching up exitoso só pode ocorrer se solucionar a tripla armadilha de desenvolvimento da América Latina, a qual torna sua condição inicial particularmente desafiadora, a saber: a maldição de recursos, o legado colonial e o capital humano fraco.

Essas ideias são organizadas em uma estrutura teórica, compreendendo a seguinte dinâmica: “entrydetoursleapfrogging”. Esta teoria constitui uma contribuição seminal do livro e realça as condições particulares da entrada tardia dos emergentes, normalmente associada a segmentos de baixa qualidade. Pode ser de grande ajuda para a realização de novos trabalhos sobre o processo de catching up, do ponto de vista tanto de pesquisa quanto de política pública.

As contribuições teóricas do livro para economia evolucionária são de fato notáveis, especialmente no que diz respeito aos mecanismos necessários para a construção de capacidades inovadoras. O livro avança o pensamento de autores neoschumpeterianos, como Abramovitz (1986ABRAMOVITZ, M. Catching up, forging ahead, and falling behind. The Journal of Economic History, v. 46, n. 2, p. 385-406, 1986.) e Freeman e Perez (1988FREEMAN, C.; PEREZ, C. Structural crises of adjustment, business cycles and investment behaviour. In: DOSI, G. et al. (ed.). Technical change and economic theory. London: Francis Pinter, 1988. p. 38-66), segundo o qual as “janelas de oportunidade” estão abertas para as economias emergentes quando surge um novo paradigma técnico-econômico. O autor não apenas discute as formas de exploração de tais janelas de oportunidades, como também acrescenta as condições necessárias para fazê-lo, notadamente as capacidades inovadoras. “Você pode tanto voar quanto cair pela janela”. Esta é a imagem usada para ilustrar as pré-condições necessárias para a realização do leapfrogging. Além disso, Lee aborda as implicações teóricas à luz da Quarta Revolução Industrial, sugerindo que a onda atual de inovações baseadas nas tecnologias digitais - tais como impressão 3D, Internet das Coisas e inteligência artificial - e na economia compartilhada pode ser uma janela de oportunidade para as economias de países emergentes que estejam preparadas para o leapfrogging, sendo a Malásia e Tailândia os exemplos mais evidentes.

Em suma, as proposições desenvolvidas no livro estão longe do senso comum e são baseadas em argumentos bem fundamentados e que decorrem de uma longa agenda de pesquisa. A leitura é muito agradável e acessível a um público amplo, com uma linguagem não técnica e o uso limitado de jargões. O livro emprega várias metáforas fortes, como “chutar a escada” e “voar em um balão”. Essas metáforas são convincentes, já que evidenciam a ideia de que o catching up não deve ser encarado como uma ciência, mas sim como uma forma de arte, como o próprio título do livro explicita. Um catching up exitoso é uma forma de arte no sentido de que ocorre raramente e requer uma orquestração sofisticada de recursos, timing e pensamento estratégico. Reconhecendo que não existem receitas prontas para o desenvolvimento econômico, Lee apresenta um excelente ponto de partida para economistas, formuladores de políticas públicas e estudantes de inovação em todo o mundo que desejam promover maior bem-estar econômico e social para a humanidade.

Referências

  • ABRAMOVITZ, M. Catching up, forging ahead, and falling behind. The Journal of Economic History, v. 46, n. 2, p. 385-406, 1986.
  • FREEMAN, C.; PEREZ, C. Structural crises of adjustment, business cycles and investment behaviour. In: DOSI, G. et al. (ed.). Technical change and economic theory. London: Francis Pinter, 1988. p. 38-66
  • JENSEN, M. B.; JOHNSON, B.; LORENZ, E.; LUNDVALL, B. Å. Forms of knowledge and modes of innovation. Research Policy, v. 36, n. 5, p. 680-693, 2007.
  • LEE, K. The art of economic catch-up: barriers, detours and leapfrogging, Cambridge: Cambridge University Press, 2019.

Publication Dates

  • Publication in this collection
    14 Jan 2022
  • Date of issue
    Jul-Dec 2019

History

  • Received
    24 Oct 2019
  • Reviewed
    24 Oct 2019
  • Accepted
    06 Nov 2019
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