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A África nos livros didáticos de Geografia de São Paulo (Brasil) e de Berlim (Alemanha)

Resumo

Estudos baseados na representação de unidades espaciais como continentes remetem a uma considerável tradição na Geografia. No entanto, em muitos casos, tais estudos analisam representações sem considerar as bases educacionais e epistemológicas da Geografia como disciplina escolar. Ciente das bases curriculares e da posição particular da Geografia na educação formal, o presente artigo examina como brasileiros e alemães representam a África em seu conteúdo a partir da análise de livros didáticos de Geografia do Ensino Básico (São Paulo, Brasil) e do Secundário inferior e superior (Berlim, Alemanha). Diversas repetições permitiram consolidar categorias que ajudam a compreender tais representações, mas, embora os resultados revelem uma série de semelhanças, prevalecem as diferenças.

Palavras-chave:
África; Livros didáticos; Geografia; Brasil; Alemanha; Geografia escolar

Abstract

Studies on the representation of spatial units, such as continents, look back on a considerable tradition in Geography. Nevertheless, in many cases, the studies analyze representations without considering the educational and epistemological framework of Geography as a school subject. The ambition of this paper is to explore, mindful of the curricular framework and of Geography’s particular position within formal education, how Brazilian and Germany textbook represent Africa. Content analysis served to explore Geography textbooks from Basic Education (São Paulo, Brazil) and lower and upper Secondary (Berlin, Germany). Several iterations led to consolidated categories that helped grasp the representations of Africa. The results show a range of similarities. However, the differences prevail.

Keywords:
Africa; Textbooks; Geography; Brazil; Germany; School Geography

Resumen

Los estudios basados en la representación de unidades espaciales, como los continentes, se remontan a una tradición considerable en la Geografía. Sin embargo, en muchos casos, tales estudios analizan las representaciones sin considerar las bases educativas y epistemológicas de la Geografía como materia escolar. Este artículo tiene como objetivo explorar, conscientes de las bases curriculares y de la posición particular de la Geografía en la educación formal, cómo los libros de texto brasileños y alemanes representan a África en sus contenidos, a partir del análisis de los libros de texto de Geografía para la Educación Básica (São Paulo, Brasil) y la Secundaria inferior y superior (Berlín, Alemania). Varias repeticiones permitieron consolidar categorías que ayudaron a comprender tales representaciones, pero si bien los resultados muestran una serie de similitudes, prevalecen las diferencias.

Palabras-clave:
África; Libros de texto; Geografía; Brasil; Alemania; Geografía escolar

Introdução

De maneiras distintas, por se tratar de formações socioespaciais com trajetórias também diferentes, Brasil e Alemanha têm se empenhado politicamente, sobretudo desde a virada para o século XXI, em rever suas relações com o continente africano. No caso do Brasil, país latino-americano com a maior população negra fora da África (e cujas relações sociais são indelevelmente marcadas por sua violenta história colonial e escravista), a ascensão de Luís Inácio Lula da Silva à presidência (em 2003) foi acompanhada de um duplo movimento, de reparação histórica para as populações afro-brasileiras e de reconciliação política e econômica com o continente africano, efetivado em inúmeras políticas públicas de diversas áreas governamentais. Já na Alemanha, país europeu com uma história colonial particular,19 19 Diferentemente das outras potências coloniais europeias, a Alemanha perdeu todas as suas possessões africanas em consequência da Primeira Guerra Mundial, e, ainda que os antigos laços não tenham sido completamente rompidos, configurou-se uma relação diferente das estabelecidas por ingleses, franceses, portugueses, espanhóis e belgas com a África. De qualquer maneira, cabe ressaltar que, enquanto manteve colônias, a Alemanha foi tão ou mais violenta que as outras potências europeias; veja-se o hoje já mais conhecido caso do genocídio do povo herero, na atual Namíbia, no início do século XX. a efervescência do debate museológico sobre a aquisição e a posse de artefatos africanos colocou o continente na pauta nacional por ocasião da reabertura do Museu Etnológico de Berlim (em 2021), numa discussão crescente no país desde o trabalho pioneiro de Ayim, Oguntoye e Schultz (1986AYIM, M.; OGUNTOYE, K.; SCHULTZ, D. (Org.). Farbe bekennen: Afro-deutsche Frauen auf den Spuren ihrer Geschichte. Berlin: Orlanda Frauenverlag, 1986.) sobre a categoria social dos afro-germânicos e a relação secular do país com a África. Somado a isso, tanto a sociedade brasileira quanto a alemã têm observado, especialmente nas últimas duas décadas, a chegada em seu território de centenas de milhares de africanos e africanas que deixam seu continente de origem por diversas razões (econômicas, políticas, acadêmicas etc.), tornando a necessidade de um melhor conhecimento da África uma ordem do dia nos dois países.

Nesse sentido, uma das principais maneiras de se reconciliar com o passado, conhecer melhor a realidade africana e ampliar as relações presentes, é o desenvolvimento de uma educação formal politicamente responsável sobre a África para crianças e jovens em idade escolar. Dentro deste processo, aparece como fundamental uma abordagem adequada do continente nos livros didáticos utilizados em sala de aula. Com base nisso, o presente artigo faz um esforço qualitativo e exploratório para comparar as diferentes formas com que Brasil e Alemanha, com suas distintas relações históricas e contemporâneas com o continente africano, o abordam em seus livros didáticos. Para tal, articulou-se uma revisão bibliográfica sobre o tema com uma análise do conteúdo dessas obras pela identificação (com auxílio de uma ferramenta computacional) de categorias comuns aos dois universos educacionais selecionados. Ainda que os resultados apresentem distintamente os exemplos brasileiro e alemão, optou-se por fazer uma discussão conjunta dos dois países, seguida de reflexões que concluem o artigo.

Nota-se, no título do artigo, a especificação das cidades de São Paulo (no Brasil) e Berlim (na Alemanha) como foco de análise. Ainda que, no caso brasileiro, os livros didáticos elegidos tenham abrangência nacional (portanto, sem especificidades regionais e/ou locais), no caso alemão, os livros didáticos de Geografia tem escopo regional, e portanto, as obras escolhidas são voltadas especificamente ao público de Berlim-Brandemburgo. Uma vez que, assim como na Alemanha, as políticas públicas de ensino no Brasil tem também desdobramentos ao nível dos estados e municípios, optou-se, visando uma padronização das unidades de comparação, em delimitar o universo amostral nas cidades de São Paulo e Berlim - ainda que, de um ponto de vista prático, o conteúdo dos livros didáticos paulistanos não se diferencie do resto do país.

A África nos livros didáticos

Ao longo das últimas décadas, diversas disciplinas demonstraram interesse em livros didáticos de Geografia. Ao explorar seus conteúdos, formas ou usos, tais estudos têm adotado diferentes perspectivas, e uma revisão bibliográfica de trabalhos focados em livros didáticos de Geografia (que abordam a África) revelou duas direções principais.

O primeiro grupo parte tradicionalmente de fora da Geografia (sobretudo da Educação), e usa os livros didáticos de Geografia como (parte de) sua amostragem. Tais estudos tendem a seguir uma abordagem tópica e privilegiam problemas como racismo, conflitos, gênero ou construção nacional. Desde seus primórdios, esses estudos sobre livros didáticos e mídia educacional exploraram a representação da África em livros didáticos de Geografia. Em seu estudo comparativo, Hillers (1984HILLERS, E. Africa as Presented in Geography Textbooks of West European Countries. Internationale Schulbuchforschung, v. 6, n. 3/4, 363-377, 1984. Available in: https://www.jstor.org/stable/43055443 . Accessed on 6 jan. 2023.
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, p. 363) analisou “a representação de povos e culturas não-europeias (no caso, da África ao Sul do Saara) em livros didáticos recentes de geografia na Bélgica, Inglaterra/País de Gales, República Federal da Alemanha, França e Holanda”. A autora usou métodos qualitativos e quantitativos para analisar um total de 250 livros didáticos, “com base em uma lista comum de áreas-problema etnológico-geográficas sobre o tema ‘pessoas e culturas’” (Hillers, 1984HILLERS, E. Africa as Presented in Geography Textbooks of West European Countries. Internationale Schulbuchforschung, v. 6, n. 3/4, 363-377, 1984. Available in: https://www.jstor.org/stable/43055443 . Accessed on 6 jan. 2023.
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, p. 364). Ainda que as origens dessas “áreas-problema” não sejam reveladas, a lista identificou 14 entradas, que serviram como categorias analíticas (Figura 1). Se não indicou claramente as fontes dessas categorias, Hillers (1984HILLERS, E. Africa as Presented in Geography Textbooks of West European Countries. Internationale Schulbuchforschung, v. 6, n. 3/4, 363-377, 1984. Available in: https://www.jstor.org/stable/43055443 . Accessed on 6 jan. 2023.
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, p. 363) ao menos explicitou os objetivos de seu estudo, que estaria inserido “no contexto de promoção do conhecimento internacional por meio de livros didáticos imparciais, como expresso na declaração de princípios da Unesco e do Conselho Europeu”. O estudo de Hillers (1984HILLERS, E. Africa as Presented in Geography Textbooks of West European Countries. Internationale Schulbuchforschung, v. 6, n. 3/4, 363-377, 1984. Available in: https://www.jstor.org/stable/43055443 . Accessed on 6 jan. 2023.
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) é, de alguma maneira, exemplar de muitos estudos subsequentes, por pautar-se em objetivos normativos definidos por organizações internacionais, mas também por abster-se de questionar as origens e consequências dessas normas e por desconsiderar o conteúdo de Geografia como uma disciplina escolar, ao formular conclusões generalistas e muitas vezes imprecisas. Por exemplo, Hillers (1984HILLERS, E. Africa as Presented in Geography Textbooks of West European Countries. Internationale Schulbuchforschung, v. 6, n. 3/4, 363-377, 1984. Available in: https://www.jstor.org/stable/43055443 . Accessed on 6 jan. 2023.
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, p. 369) entende serem “eurocêntricos” métodos como aprendizagem baseada em problemas, comparações (transferência espacial) e padrões de personificação, mas reivindica objetividade de uma forma surpreendentemente ingênua quando afirma: “os livros possuem uma abordagem didática que impede uma percepção imparcial e uma apreciação de povos e culturas estrangeiras, ao invés de promove-las”. O artigo, contudo, não dá nenhuma evidência disso e tampouco adota uma perspectiva comparativa baseada em representações da Europa ou outros continentes.

Figura 1 -
Áreas-problema como categorias analíticas

Nas décadas seguintes, estudos de vários outros campos do conhecimento trilharam caminhos similares. Um exemplo é o de Loftsdóttir (2007LOFTSDÓTTIR, K. Learning differences? Nationalism, identity and Africa in Icelandic school textbooks. Internationale Schulbuchforschung, v. 29, n. 1, 5-22, 2007. Available in: https://www.academia.edu/878693/Learning_differences_Nationalism_identity_and_Africa_in_Icelandic_school_textbooks . Accessed on 6 jan. 2023.
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, p. 6) sobre nacionalismo, identidade e a África nos livros didáticos de Geografia da Islândia, que, numa abordagem antropológica, entende seus objetos de estudo como “formas de mídia que criam imaginários coletivos de si mesmo e do outro”. Os resultados revelam práticas de racialização e de definição de um “Outro” nesses livros, superenfatizando a tradição (como oposta ao desenvolvimento) e a necessidade de intervenção (europeia) a serviço da modernização, sobretudo por meio da apresentação de uma África (e seus habitantes) carentes de individualismo e agenciamento. Mantendo um discurso pós-moderno, Loftsdóttir (2007LOFTSDÓTTIR, K. Learning differences? Nationalism, identity and Africa in Icelandic school textbooks. Internationale Schulbuchforschung, v. 29, n. 1, 5-22, 2007. Available in: https://www.academia.edu/878693/Learning_differences_Nationalism_identity_and_Africa_in_Icelandic_school_textbooks . Accessed on 6 jan. 2023.
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) acaba, contudo, por afastar suas explicações dos objetivos educacionais da Geografia, bem como de sua gramática disciplinar escolar e das práticas habituais de ensino e aprendizado por meio de livros didáticos.

Em seu estudo do racismo e da imagem da África nos livros didáticos alemães, Marmer et al. (2010MARMER, E.; MARMER, D.; HITOMI, L.; SOW, P. Racism and the Image of Africa in German School and Textbooks. The International Journal of Diversity in Organisations, Communities and Nations, v. 10, n. 5, p. 1-12, 2010. Available in: https://www.zef.de/uploads/tx_zefportal/Publications/a992_Marmer%20Sow%20RacismandtheImageofAfricainGermanSchoolsandTextbooks.pdf . Accessed on 9 dez. 2022.
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) analisaram dois livros didáticos antes de aplicar um questionário a estudantes descendentes de africanos em Hamburgo. Quase três décadas depois, o artigo repete muito da abordagem de Hillers (1984HILLERS, E. Africa as Presented in Geography Textbooks of West European Countries. Internationale Schulbuchforschung, v. 6, n. 3/4, 363-377, 1984. Available in: https://www.jstor.org/stable/43055443 . Accessed on 6 jan. 2023.
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), tanto por falhar na explicitação clara de seu percurso metodológico, quanto por utilizar apenas uma passagem textual de um livro didático para exemplificar, e argumentar, como o ensino de História na Alemanha é eurocêntrico e profundamente racista.

De maneira geral, esses trabalhos apresentam uma utilidade limitada para os agentes envolvidos na elaboração, edição, desenvolvimento e utilização de livros didáticos de Geografia. Ainda que a principal razão para isso siga sendo sua desvinculação da Geografia como disciplina escolar (com seus objetivos educacionais, conceitos e práticas docentes), tais estudos também tendem a ter qualidade metodológica questionável, valendo-se de amostras em geral insuficientes. Mesmo assim, a maior parte deles é bastante liberal em suas conclusões, reivindicando validade universal.

De maneira semelhante à tradição em outros campos do conhecimento, o interesse acadêmico da Geografia e da Geografia Escolar nos livros didáticos da Geografia - o segundo grupo de estudos discutidos aqui - tem também uma origem relativamente distante (Bagoly-Simó, 2021BAGOLY-SIMÓ, P. Doing Research on Geography Textbooks: An Overview of Methods, Samples, and Topics in International and German Journals (1960-2020). In: BAGOLY-SIMÓ, P.; SIKOROVÁ, Z. (Ed.). Textbooks and Educational Media: Perspectives from Subject Education: Proceedings of the 13th IARTEM Conference 2015, Berlin. Cham, CH: Springer, 2021. p. 134-146.). Ao contrário do primeiro grupo, porém, estudos a partir da Geografia (da Educação) exploram diversas camadas e dimensões de conceitos geográficos, bem como suas abordagens, tradições disciplinares e artefatos educacionais.

Num estudo pioneiro, Wright (1979WRIGHT, D. R. Visual Images in Geography Texts: The Case of Africa. Geography, v. 64, n. 3, 205-210, 1979. Available in: https://www.jstor.org/stable/40570214 . Accessed on 27 jan. 2023.
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, p. 205) explora, entendendo a Geografia como “provavelmente a disciplina mais visual no currículo escolar, com exceção de Artes”, de que maneira seus recursos visuais retratam a África. Com base em um conjunto de critérios baseados em assuntos geográficos, o autor aponta algumas deficiências como o papel marginal de atividades secundárias e terciárias, a pouca atenção à tecnologia e a “quase total abstenção de imagens de ofícios e do setor ‘informal’ da economia” (Wright, 1979WRIGHT, D. R. Visual Images in Geography Texts: The Case of Africa. Geography, v. 64, n. 3, 205-210, 1979. Available in: https://www.jstor.org/stable/40570214 . Accessed on 27 jan. 2023.
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, p. 209). O artigo também reflete sobre percepções imagéticas e explica por que algumas imagens acabam parecendo artificiais e inadequadas para representar “naturalmente” a África.

O estudo de Cole (2008COLE, R. The Regionalization of Africa in Undergraduate Geography of Africa Textbooks, 1953 to 2004. Journal of Geography, v. 107, n. 2, p. 61-74, 2008. doi: https://doi.org/10.1080/00221340802186851.
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), por sua vez, analisa como os livros didáticos de Geografia para a graduação regionalizam a África. Tomando os EUA como estudo de caso, e enfocando a segunda metade do século XX (1953-2004), o estudo identificou os três paradigmas iniciais de regionalização de Grigg (1967GRIGG, D. Regions, Models, and Classes. In: CHORLEY, R. J.; HAGGETT, P. (Ed.). Models in Geography. London: Methuen, 1967. p. 461-510.): os pays vidalianos, a região natural, e a região de característica única. Com base numa detalhada revisão histórica do pensamento geográfico sobre regionalização, sua abordagem de métodos mistos revelou uma predominância de perspectivas tradicionais e uma parcela surpreendente de regiões de característica única - o que conduz, na leitura de Cole (2008), a situações de aprendizagem que ainda podem contribuir mais com o ensino e o pensamento crítico.

Na mesma linha, Myers (2001MYERS, G. A. Introductory Human Geography Textbook Representations of Africa. The Professional Geographer, v. 53, n. 4, 522-532, 2001. doi: https://doi.org/10.1111/0033-0124.00302.
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) mapeou como livros didáticos introdutórios de Geografia Humana (para o nível superior) retrataram a África. Dada sua função principal de apresentar fundamentos, os livros didáticos introdutórios usados nos EUA tendem a evitar representações a-históricas e simplificações geográficas, mas algumas representações estereotipadas ainda permanecem (em grande medida, pela limitada atenção dedicada às crises africanas e à vida cotidiana do continente).

Por fim, o trabalho de Usher (2021USHER, J. Africa in Irish Primary Geography Textbooks: developing and applying a Framework to investigate the potential of Irish Primary Geography textbooks in supporting Critical Multicultural Education. Irish Educational Studies, v. 42, n. 1, p. 123-143, 2021. doi: https://doi.org/10.1080/03323315.2021.1910975.
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) sobre as representações da África nos livros didáticos primários de Geografia da Irlanda - à luz da Educação Crítica e Multicultural - explora um objetivo trans-curricular consoante à gramática da Geografia escolar. Para tal, Usher (2021USHER, J. Africa in Irish Primary Geography Textbooks: developing and applying a Framework to investigate the potential of Irish Primary Geography textbooks in supporting Critical Multicultural Education. Irish Educational Studies, v. 42, n. 1, p. 123-143, 2021. doi: https://doi.org/10.1080/03323315.2021.1910975.
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) se ateve aos requisitos curriculares e à elaboração e desenvolvimento de livros didáticos, mas também ao papel dos livros didáticos de Geografia nas salas de aula primárias da Irlanda. Ao contrário dos trabalhos anteriormente apresentados (como Marmer et al., 2010MARMER, E.; MARMER, D.; HITOMI, L.; SOW, P. Racism and the Image of Africa in German School and Textbooks. The International Journal of Diversity in Organisations, Communities and Nations, v. 10, n. 5, p. 1-12, 2010. Available in: https://www.zef.de/uploads/tx_zefportal/Publications/a992_Marmer%20Sow%20RacismandtheImageofAfricainGermanSchoolsandTextbooks.pdf . Accessed on 9 dez. 2022.
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), seus resultados permitem a alunos e professores refletirem sobre as interações entre interdisciplinaridade e os objetivos educacionais da Geografia, com base em resultados obtidos em uma sólida metodologia e amostragens representativas.

Resultados de diversos países - como Usher (2021USHER, J. Africa in Irish Primary Geography Textbooks: developing and applying a Framework to investigate the potential of Irish Primary Geography textbooks in supporting Critical Multicultural Education. Irish Educational Studies, v. 42, n. 1, p. 123-143, 2021. doi: https://doi.org/10.1080/03323315.2021.1910975.
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) na Irlanda, Hemmer e Hemmer (2021HEMMER, I.; HEMMER, M. Das Interesse von Schülerinnen und Schülern an geographischen Themen, Regionen und Arbeitsweisen - ein Bundeslandvergleich zwischen Bayern und Nordrhein-Westfalen. Zeitschrift für Geographiedidaktik, v. 49, n. 1, 3-24, 2021. doi: https://doi.org/10.18452/22789.
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) na Alemanha e Bagoly-Simó (2008BAGOLY-SIMÓ, P. Földrajzdidaktikai kutatások. Bucareste: Didactică și Pedagogică, 2008.) na Romênia - destacam o papel central dos livros didáticos de Geografia no processo de ensino-aprendizagem. Não obstante, pesquisas sobre a África e seu ensino vão além dos livros didáticos, e muitos estudos têm como foco a representação mental da África para os alunos com base em mapas mentais (Harwood; Rawlings, 2001HARWOOD, D.; RAWLINGS, K. Assessing Young Children’s Freehand Sketch Maps of the World. International Research in Geographical and Environmental Education, v. 10, n. 1, p. 20-45, 2001. doi: https://doi.org/10.1080/10382040108667422.
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; Scoffham, 2019SCOFFHAM, S. The world in their heads: children’s ideas about other nations, peoples and cultures. International Research in Geographical and Environmental Education, v. 28, n. 2, 89-102, 2019. doi: https://doi.org/10.1080/10382046.2019.1529712.
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), ou então concepções pessoais dos alunos sobre a África (Obermaier; Schrüfer, 2009OBERMAIER, G.; SCHRÜFER, G. Personal concepts on “Hunger in Africa”. International Research in Geographical and Environmental Education, v. 18, n. 4, p. 245-251, 2009. doi: https://doi.org/10.1080/10382040903251026.
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; Blanco, 2017BLANCO, J. M. M. Prejuicios sobre África en los libros escolares de Educación Secundaria. Historia Actual Online, v. 43, n. 2, p. 169-186, 2017.). Além disso, professores também compartilham modos inovadores de ensinar sobre a África, valendo-se, por exemplo, da literatura africana para estudar cidades (Smiley, 2009SMILEY, S. L. Teaching Africa’s Cities Through Meja Mwangi’s Novels. Journal of Geography, v. 108, n. 4-5, 219-225, 2009. doi: https://doi.org/10.1080/00221340903344870.
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).

Com base nesse diverso quadro de estudos, este artigo procura entender como se organiza o conteúdo sobre a África dos livros didáticos em dois países com Geografias escolares de epistemologias muito diferentes e também bastante diferentes trajetórias e relações com o continente.

Metodologia

Dada a natureza do presente estudo - comparar conteúdos sobre a África em livros didáticos de Geografia do Brasil (especialmente em São Paulo) e da Alemanha (especialmente em Berlim) -, é preciso delimitar nossa amostragem de pesquisa. Para tal, buscou-se compreender, com base numa revisão bibliográfica e documental, simultaneamente os aspectos históricos e institucionais do ensino sobre a África na Geografia escolar das duas cidades selecionadas, subsidiando a definição do nosso universo de pesquisa.

Presente nas discussões escolares desde os tempos do Brasil Império, o conteúdo didático sobre o continente africano foi oficializado pelo governo brasileiro ainda no século XIX, mais especificamente em 1890, na Reforma Benjamin Constant (Ferracini, 2012FERRACINI, R. A. L. A África e suas representações no(s) livro(s) escolar(es) de Geografia no Brasil - 1890-2003. Tese (Doutorado em Geografia Humana) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2012.). Com atualizações - sempre relativamente “atrasadas”, segundo Ferracini (2012FERRACINI, R. A. L. A África e suas representações no(s) livro(s) escolar(es) de Geografia no Brasil - 1890-2003. Tese (Doutorado em Geografia Humana) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2012.) - de conteúdos e orientações teóricas ao longo de todo o século XX, a virada para o XXI representou uma inflexão no ensino escolar sobre África no Brasil, sobretudo a partir da promulgação da Lei n. 10.639/2003, que tornou obrigatório o ensino de história e cultura africana e afro-brasileira no Ensino Básico. Tal obrigação significou, na prática, um duplo movimento relativo ao conteúdo escolar africano no Brasil: por um lado, ele foi sendo paulatinamente incorporado aos currículos escolares oficiais do Ensino Básico em todos os níveis (federal, estadual e municipal) e, por outro, seguiu-se um período de explosão de elaboração, edição e publicação de material voltado à temática africana no país, incluindo compêndios históricos,20 20 Cabe destacar a tradução para o português da coleção História Geral da África, da Unesco, que desde 2011 está disponível on-line e foi distribuída em bibliotecas públicas e universidades de todo o Brasil (Ministro apresenta..., 2010). literatura infanto-juvenil e, mais importante para a discussão deste artigo, novos conteúdos em livros didáticos adotados em escolas brasileiras.

Quanto aos currículos oficiais e pensando especificamente na cidade de São Paulo, os conteúdos sobre África foram incluídos nos últimos anos de cada nível do Ensino Básico: no Ensino Fundamental, no 8º e no 9º ano; no Ensino Médio, apenas no 3º ano (Quadro 1). No Ensino Fundamental, o Currículo da Cidade (2019CURRÍCULO DA CIDADE: Ensino Fundamental - Geografia. São Paulo: Secretaria Municipal de Educação, 2019. Available in: https://educacao.sme.prefeitura.sp.gov.br/wp-content/uploads/2019/05/50634.pdf . Accessed on 27 jan. 2023.
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) de São Paulo prevê o estudo do continente africano em perspectiva internacional, relacionando-o ora com o continente americano, ora com o sistema mundial contemporâneo. Alinhando cada objetivo de aprendizagem com os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável da ONU, o currículo determina ainda que os alunos do 8º e do 9º ano do Fundamental devem adquirir conhecimentos não apenas cartográficos (físicos, políticos, étnicos etc.) sobre o continente, mas também sobre sua diversidade ambiental e sua inserção em processos sistêmicos históricos (colonialismo) e contemporâneos (globalização). Já o penúltimo Currículo do Estado de São Paulo (2011CURRÍCULO DO ESTADO DE SÃO PAULO: Ciências Humanas e suas tecnologias. São Paulo: Secretaria da Educação do Estado, 2011.), de nível estadual, previa para o Ensino Médio um aprofundamento dos conteúdos do Fundamental nas aulas de Geografia do 3º ano, mas um novo Currículo Paulista (2020CURRÍCULO PAULISTA: Etapa Ensino Médio. São Paulo: Secretaria da Educação do Estado , 2020. Available in: https://efape.educacao.sp.gov.br/curriculopaulista/wp-content/uploads/2020/08/CURR%C3%8DCULO%20PAULISTA%20etapa%20Ensino%20M%C3%A9dio.pdf . Accessed on 27 jan. 2023.
https://efape.educacao.sp.gov.br/curricu...
) diluiu esses conteúdos em pequenos tópicos de História e Filosofia, sinalizando uma diminuição do ensino de África na Geografia do Ensino Médio em São Paulo nos próximos anos.

Quadro 1-
Estrutura da educação básica no Brasil e na Alemanha, com destaque (em amarelo) dos anos previstos para o ensino de África em São Paulo e em Berlim-Brandemburgo

Para acompanhar essas novas previsões curriculares, uma miríade de novas publicações sobre o continente africano começou a surgir a partir da promulgação da Lei n. 10.639/2003, e é nesse contexto que analisamos o conteúdo de África em dois livros didáticos brasileiros: Araribá PlusARARIBÁ PLUS: Geografia 8. São Paulo: Moderna, 2018. e GeoconexõesTERRA, L.; ARAÚJO, R.; GUIMARÃES, R. B. Conexões: Estudos de Geografia Geral e do Brasil. São Paulo: Moderna , 2015. v. 3.. Publicados pela editora Moderna em 2018 e 2015 (respectivamente), são já um resultado concreto e consolidado dessa nova previsão de ensino sobre o continente africano a partir da referida lei. Cada qual subsidia um dos níveis da Educação Básica nacional (Fundamental e Médio, respectivamente), constando ambos do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD). Além de fazerem parte do PNLD, uma consulta a professores e ex-professores das redes pública e privada de ensino no município de São Paulo confirmou seu uso frequente em sala de aula, ratificando a relevância da escolha. Cabe ressaltar também que, diferentemente das obras analisadas por Ferracini (2012FERRACINI, R. A. L. A África e suas representações no(s) livro(s) escolar(es) de Geografia no Brasil - 1890-2003. Tese (Doutorado em Geografia Humana) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2012.),21 21 Cujo recorte temporal vai até 2003. com um padrão de autoria bem definido e concentrado em pouquíssimas pessoas, essas fazem parte de um novo modelo editorial de produção de livros didáticos no Brasil, no qual uma grande equipe de profissionais divide as tarefas de elaboração do material sob a supervisão de um grande grupo editorial multinacional22 22 No caso, o grupo espanhol Santillana, que adquiriu a editora Moderna no início dos anos 2000. (Zago, 2012ZAGO, A. B. A representação do continente africano nos livros didáticos de geografia do ensino médio. Dissertação (Mestrado em Educação, História, Política e Sociedade) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2012.).

Já no caso da Alemanha, mais especificamente da cidade de Berlim, os livros didáticos escolares têm como base o plano de estudos de Geografia de Berlim-Brandemburgo, desenvolvido pelo Instituto Estatal de Escolas e Meios23 23 Em alemão, Landeninstitut für Schule und Medien (Lisum). e publicado pelo Senado ou pelo Ministério.24 24 Em Berlim, Senatsverwaltung für Bildung, Jugend und Wissenschaft Berlin (SBJWB) (Departamento de Educação, Juventude e Ciência do Senado de Berlim). Em Brandemburgo, Ministerium für Bildung, Jugend und Sport des Landes Brandemburg (Ministério da Educação, Juventude e Esporte de Brandemburgo). O plano de estudos para a Secundária I (do 7º ao 10º ano) foi publicado em 2015, enquanto o plano para a Secundaria II (11º ao 13º) é de 2006 (SBJW, 2006SBJW. SENAT FÜR BILDUNG, JUGEND UND WISSENSCHAFT BERLIN. Rahmenlehrplan für die gymnasiale Oberstufe: Geographie (Geography Curriculum for Upper Secondary Education), 2006. Available in: https://edumedia-depot.gei.de/bitstream/handle/11163/156/62508697X_2006.pdf?sequence=1 . Accessed on 27 jan. 2023.
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, 2015SBJW. SENAT FÜR BILDUNG, JUGEND UND WISSENSCHAFT BERLIN. Rahmenlehrplan Jahrgangsstufen, p. 7-10. Teil C: Geographie (Geography Curriculum for Grades 7-10, Part C), 2015. Available in: https://bildungsserver.berlin-brandenburg.de/fileadmin/bbb/unterricht/rahmenlehrplaene/Rahmenlehrplanprojekt/amtliche_Fassung/Teil_C_Geografie_2015_11_10_WEB.pdf . Accessed on 27 jan. 2023.
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).

Para o 7º e o 8º ano (Secundária I), é prevista uma abordagem temática geral de áreas naturais, desenvolvimento da população, migrações, pobreza e desigualdade. Para o 9º e 10º anos (ainda na Secundária I), o programa de estudos aborda o continente europeu, mudanças climáticas, o tratamento dos recursos e as conexões globais. Visando verificar a abordagem do continente africano em um contexto mais global, optou-se por utilizar um livro deste último nível (9º e 10º anos), ainda que para contextualizar os conhecimentos prévios que têm os alunos dos anos seguintes, será feita também referência aos conteúdos dos livros de 7º e 8º anos.

O livro escolhido para esse nível (Secundária I) foi o da Série Terra,25 25 Colocado à venda pela editora Klett em 2018. que, com base em estatísticas e consultas a professores, é uma das obras mais usadas na região. O livro tem vários autores (tanto professores ativos quanto um que também trabalha na universidade), projetando ainda o nível de ensino seguinte (Secundária II). Baseia-se nos tópicos do currículo oficial e, além de discussões puramente temáticas, inclui páginas com métodos de trabalho geográficos.

Na Secundária II (11º a 13º ano), o enfoque se dará num livro da Série Diercke,26 26 Publicado pela editora Westermann em 2017. que inclui livros escolares de geografia e atlas, sendo também bastante utilizado em sala de aula. Esse livro prepara os alunos para o exame Abitur27 27 Um grau que dá direito a estudar na universidade. Central realizado em Berlim-Brandenburgo e, como ele pode também ser usado em outras regiões, contém tópicos destinados à Secundária II em geral (apresentando diversos exemplos espaciais e com abordagem temático-regional).

Assim, na amostragem alemã, este artigo se concentra num livro didático do 9º e do 10º ano da Secundária I (Terra) e num livro didático da Secundária II (Diercke), níveis que concentram o estudo da África na educação secundária do país (Quadro 1). Ressalte-se que ambos os livros têm menos de seis anos, de modo que não se pode aquilatar devidamente a evolução dos processos políticos desde sua publicação. Além disso, deve-se ter em conta que, hoje em dia, muitas escolas não usam regularmente apenas um livro didático, mas trabalham simultaneamente com vários (geralmente disponíveis na escola em número suficiente para uma classe). Materiais didáticos digitais também têm sido cada vez mais utilizados, mas em geral o livro didático continua sendo o recurso principal - fato constatado inclusive durante o lockdown da pandemia de Covid-19 (Bagoly-Simó; Hartmann; Reinke, 2020BAGOLY-SIMÓ, P.; HARTMANN, J.; REINKE, V. School Geography under COVID-19: Geographical Knowledge in the German Formal Education. Tijdschrift poor Economische en Sociale Geografie, v. 111, n. 3, 224-238, 2020. doi: https://doi.org/10.1111/tesg.12452.
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).

Definidos os livros didáticos (brasileiros e alemães), escanearam-se as páginas onde constavam referências e discussões sobre o continente africano (no caso brasileiro, unidades inteiras) e, uma vez digitalizadas, se as inseriu na ferramenta computacional MAXQDAMAXQDA. Available in: https://www.maxqda.com/ . Accessed on 9 dez. 2022.
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([s.d.]) para uma análise qualitativa e quantitativa do conteúdo. Com base nesse software, se identificaram e selecionaram todas as ocorrências de conteúdo iconográfico (imagens, gráficos e mapas) e didático (exercícios e recursos de ensino) relativas à África nos livros escolhidos, e todas as entradas foram agrupadas em seis grandes categorias temáticas geográficas: (a) natureza, (b) história, (c) população, (d) política, (e) modernização/desenvolvimento e (f) urbanização. Em alguns casos, foi possível desagregá-las em sub-categorias, e todas as entradas foram contabilizadas e somadas para fins estatísticos. Posto que a comparação entre livros didáticos do Brasil e da Alemanha é um estudo exploratório, cabe ressaltar que as categorias foram formadas inicialmente por um método indutivo (in-vivo-Codes) e depois ajustadas às especificidades das duas amostragens, para que a comparação tivesse uma base comum. As categorias identificadas, bem como uma análise resumida de cada uma delas por país, estão no Quadro 2.

Quadro 2 -
As categorias temáticas identificadas nos livros didáticos escolhidos, com uma análise resumida de cada uma delas por país (Brasil e Alemanha)

Por fim, buscou-se também incluir informações relativas à escala das informações apresentadas: ora continental, ora regional, ora nacional (identificando os países nominalmente). Excluíram-se mapas de escala mundial que exibiam a África, exceto nos casos em que as dinâmicas relativas ao continente fossem centrais para a representação (por exemplo, o tráfico de escravizados).

Resultados: São Paulo (Brasil)

Antes de fazer uma análise mais pormenorizada dos resultados da cidade de São Paulo, destaque-se que, além de pequenas inserções de conteúdo em unidades (capítulos) mais gerais, em ambos os livros escolhidos o continente africano é objeto de unidades inteiras (sendo que, no Araribá PlusARARIBÁ PLUS: Geografia 8. São Paulo: Moderna, 2018., isso acontece em duas unidades).28 28 Todos os continentes são estudados detalhadamente em pelo menos uma unidade de cada livro, por ser essa análise regional a escolha metodológica que estrutura as obras. De todo modo, o fato de a África ser objeto de duas unidades de um dos livros pode ser diretamente relacionado à previsão legal. De qualquer maneira, e apesar desse destaque ao continente africano, cabe aqui ratificar as análises de Anjos (2005ANJOS, R. S. A. A África, a educação brasileira e a geografia. In: SECAD (org.). Caminhos abertos pela Lei Federal n. 10.639/2003. Brasília: MEC/Secad, 2005. p. 167-184. (Coleção Educação para Todos.), p. 175) de que a África “está sistematicamente nas partes finais” dos livros didáticos, e pelo fato de ser o último tema a ser estudado, nem sempre é satisfatoriamente abordada “devido ao tempo escolar exíguo para o cumprimento do programa”. Ainda em uma visão geral, e especialmente no tocante aos mapas utilizados nessas unidades, é importante mencionar também uma representação quase sempre continental da África nos livros analisados, com poucos mapas apresentando escalas regionais ou nacionais - ainda que nas discussões textuais os países sejam recorrentemente escolhidos como referência de análise.

Na primeira categoria (natureza), a maior parte do conteúdo é voltado à introdução das principais paisagens e ecossistemas do continente, de maneira um tanto descritiva e sucinta. Surpreendentemente, as discussões sobre mudanças climáticas são sub-representadas nos livros, aparecendo apenas pontualmente e de maneira ilustrativa (seja a título de exemplo, seja como proposta didática de reflexão para os estudantes). Na segunda categoria (história), 80% do conteúdo é voltado ao colonialismo e à independência das nações africanas, e o principal foco de análise é o papel da herança colonial como entrave ao desenvolvimento contemporâneo do continente. De modo residual, se introduz o papel da África nos grandes movimentos migratórios anteriores ao século XIX, voltando inclusive às primeiras migrações humanas, há 60 mil anos. Já na terceira categoria (população), relativamente ausente em ambos os livros, há certo predomínio de dados demográficos do continente, com pequenas menções a questões de saúde e gênero. Assim como as mudanças climáticas, os aspectos culturais são também supreendentemente sub-representados, enfatizando em geral características étnicas e religiosas das populações africanas sem contudo aprofundá-las ou problematizá-las sob alguma perspectiva teórica mais consolidada.

Em comparação com as três primeiras categorias (natureza, história e população), as duas que se seguem (política e modernização/desenvolvimento) recebem consideravelmente mais atenção nos livros, sendo por isso desdobradas em mais sub-categorias. Reforçando certos estereótipos sobre o continente africano, mais da metade dos registros da categoria política estão na sub-categoria conflitos, que engloba questões étnicas e religiosas assim como disputas geopolíticas e terrorismo, com excessiva representação iconográfica de milícias armadas e imagens de guerra. Nessa sub-categoria, três países africanos são recorrentemente escolhidos a título de exemplo: Ruanda, Serra Leoa e Sudão do Sul. Além de Conflitos, o conteúdo político do livro também tem muitas discussões sobre democracia (com destaque a processos eleitorais recentes em países como África do Sul e Angola, além da chamada Primavera Árabe no norte do continente) e fronteiras/regionalização (mais uma vez, chamando atenção para as consequências do período colonial no continente). Por fim, há também menções ao tema (já não tão emergente) dos refugiados. De modo geral, pode-se afirmar que as discussões na categoria política se alinham aos pressupostos do sistema político internacional prescrito pela ONU, com exceção talvez da colonialidade das fronteiras (e das regiões delas derivadas) no continente, nesse caso, mais próximas de um debate teórico crítico proveniente das Ciências Humanas.

O principal assunto discutido nos livros escolhidos, porém, é o da categoria modernização/desenvolvimento, que poderia também ser denominado economia. De alguma maneira, os livros apresentam discussões e exemplos dos chamados principais “setores” da economia - agricultura (em geral), extrativismo (destaque a Angola) e industrialização (destaque à África do Sul) -, além de sinalizar também algumas discussões sobre circulação. Cabe destacar também os debates sobre a integração regional e a inserção do continente no sistema econômico mundial, e, mais uma vez reforçando certos estereótipos, também é considerável o espaço dedicado a assuntos como pobreza e fome. De maneira incipiente, mas importante, os livros abordam também a questão da inovação e da exclusão digital, tomando como exemplo específico as experiências de países como Gana (exclusão) e Quênia (inovação). De modo geral, ambos os livros têm uma visão positiva do desenvolvimento africano contemporâneo, alinhando-se mais a uma vertente de afro-otimismo (que vê com bons olhos a “ascensão” das economias africanas no século XXI) do que de sua antítese, o afro-pessimismo - ainda que os livros não destaquem claramente o fato de nem todos os países do continente serem passíveis de enquadramento nessa condição ascendente, como argumenta Kauê Santos (2022SANTOS, K. L. Africano: uma introdução ao continente. Rio de Janeiro: Record, 2022.). Mesmo assim, há nas duas obras ponderações sobre as contradições do crescimento (não necessariamente desenvolvimento) africano recente, em que a criação de riqueza e diversidade econômica não levaram necessariamente a uma erradicação da pobreza ou redução da desigualdade interna do continente.

A última categoria identificada nos livros é de urbanização, a única sem sub-categorias internas. Os livros destacam o processo acelerado de urbanização no continente nas últimas décadas, ora apresentando uma África moderna e pungente (como ilustra uma fotografia de duas páginas de Luanda, capital de Angola), ora reforçando o caráter desigual desse processo, na mesma linha de raciocínio das contradições do crescimento/desenvolvimento do continente. Além da já citada imagem de Luanda, os livros destacam os processos de urbanização em países do norte do continente (Egito, Marrocos, Argélia) e na África do Sul, reforçando, apesar de uma visão generalista do continente que perpassa as duas obras, a importância de apresentá-lo como um conjunto de 55 países29 29 De acordo com a União Africana. - ou formações socioespaciais (Santos, M., 1977SANTOS, M. Sociedade e espaço: a formação social como teoria e como método. Boletim Paulista de Geografia, São Paulo, n. 54, p. 81-99, 1977. Available in: https://publicacoes.agb.org.br/boletim-paulista/article/view/1092 . Accessed on 27 jan. 2023.
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) - aos alunos do Ensino Básico da cidade de São Paulo.

Em suma, o conteúdo sobre África presente nos livros didáticos brasileiros analisados caminha entre um alinhamento aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável da ONU - como consta explicitamente no Currículo da Cidade (2019CURRÍCULO DA CIDADE: Ensino Fundamental - Geografia. São Paulo: Secretaria Municipal de Educação, 2019. Available in: https://educacao.sme.prefeitura.sp.gov.br/wp-content/uploads/2019/05/50634.pdf . Accessed on 27 jan. 2023.
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) - e discussões provenientes da academia, ressaltando o persistente papel da História colonial no continente e de alguma maneira remetendo a conceitos como dependência e subdesenvolvimento. Da mesma maneira, as representações iconográficas e os conteúdos discutidos oscilam entre a reprodução de certos estereótipos (como a fome, a pobreza e as guerras) e a apresentação de uma África moderna, urbana e em ascensão, sinalizando uma tentativa de atualização da realidade continental para alunos da Educação Básica, como Ferracini (2012FERRACINI, R. A. L. A África e suas representações no(s) livro(s) escolar(es) de Geografia no Brasil - 1890-2003. Tese (Doutorado em Geografia Humana) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2012.) mostrou ser a tônica histórica desse processo no Brasil. Como explica o autor, os livros didáticos (especialmente no caso da temática africana) são sempre resultado de um embate narrativo entre forças do establishment e discussões encampadas pela militância e pela academia, sendo por isso representativos das contradições do processo histórico e nem sempre totalmente alinhados com as discussões teóricas mais candentes, como se desejaria.

Resultados: Berlim (Alemanha)

De modo geral, sobre os livros didáticos alemães, pode-se afirmar que o continente africano não é visto de maneira muito diferente quando se trata de alguns temas. Em particular, os livros dos anos 7º/8º e 9º/10º frequentemente abordam a África como um continente, sem entrar em detalhes específicos por país (com exceção de alguns capítulos separados sobre Botswana ou Tanzânia), sendo também possível encontrar muitos mapas-múndi que incluem o continente (por exemplo, para ilustrar sua integração ao mercado mundial).

Quanto à primeira categoria (natureza e meio ambiente), devido ao conteúdo previsto no plano de estudos para o 9º e o 10º ano, há poucos elementos no livro didático escolhido que se relacionam com esses temas, havendo apenas duas passagens dignas de destaque: uma sobre as ameaças ao entorno natural no continente africano por causa das mudanças climáticas (ilustradas por um mapa e marcadores), e outra sobre o aumento da desertificação. Especificamente com relação ao entorno natural, há também duas páginas no capítulo especial sobre a Tanzânia focalizando a paisagem do país e discutindo brevemente o clima, a vegetação e o relevo. Cabe sublinhar também que esse capítulo está estruturado de acordo com os conceitos de espaço (Wardenga, 2002WARDENGA, U. Alte und neue Raumkonzepte für den Geographieunterricht. Geographie Heute, v. 23, n. 200, 8-11, 2002.): fatos sobre o espaço natural podem ser encontrados sob o primeiro conceito espacial, geralmente descrito como “espaço contêiner”.30 30 O título desse subcapítulo é “O espaço como objeto espacial”. Além disso, a beleza natural como fator de atração é discutida nas páginas seguintes, onde também se apresentam as boas condições para o cultivo de café. A partir do 11º ano (Secundária II), abordam-se um pouco mais temas relativos à natureza e do meio ambiente, como fatores climáticos e zonas de vegetação (tropical e sub-tropical, savanas e desertos), e também à vida e à atividade econômica nos trópicos constantemente úmidos (mudanças climáticas e desertificação, desertos e ecofarming).31 31 Trata-se de um projeto de ecofarming como exemplo positivo na Tanzânia. Também se pedem aos alunos trabalhos com atlas para a descrição do relevo, do clima e das circunstâncias agrárias, havendo, ademais, alguns gráficos que mostram o mecanismo de uma indústria de biogás (conteúdo também relativo ao tema do desenvolvimento).

No livro didático do 9º e do 10º ano, não há nenhum conteúdo dedicado à segunda categoria (história). Só no livro para a Secundária II há uma página dupla que se refere ao colonialismo e a problemas derivados atualmente nos países pós-coloniais: uma caricatura retrata a África como o continente dos escravizados e mostra, que mesmo após o colonialismo, manteve-se a dependência ao “Ocidente”. O mesmo se passa com a categoria (política): só no livro do 11º ao 13º ano (Secundária II) se discutem, muito brevemente e no contexto do desenvolvimento e do pós-colonialismo, os desafios políticos destes, mas sem entrar em detalhes. Na categoria população, também sem muito destaque, só o livro da Secundária II dá algumas referências específicas. Há uma passagem sobre o desenvolvimento da população com estudos de caso, tomando como diagramas as estruturas etárias da Etiópia e da Nigéria (e relacionando-as com a taxa de fecundidade). A pegada ecológica também se discute nesse contexto. Outra referência coloca a questão de como o “subsaariano” enfrenta o dividendo demográfico. O enfoque dessas páginas segue as diferentes tendências de desenvolvimento e se insere no contexto da sustentabilidade.

Assim como nos livros didáticos de São Paulo (Brasil), nos de Berlim as categorias mais exploradas são as de economia e/ou modernização/desenvolvimento. No que tange à Economia, o primeiro ponto que aparece nos livros didáticos do 9º e do 10º ano é a integração da África no mercado mundial, a partir da utilização de mapas que mostram os fluxos de bens no mercado mundial. Além disso, discute-se a questão da energia, destacando-se o projeto Desertec (mais bem detalhado em duas páginas). Em termos de fornecimento, consumo e emissões de energia global, o continente africano é situado em relação aos demais, mas, de modo geral, o enfoque dessas tendências de desenvolvimento por meio de energias renováveis é positivo. Também há uma introdução ao método “Mistério” (baseado numa história de Gana) no mesmo livro, onde se supõe que os estudantes devem estabelecer conexão entre a terra cultivável dos pequenos agricultores ganeses e o uso de E10 na Alemanha. Outros temas discutidos nessa categoria são os recursos (referentes à superexploração do coltán no Congo, no Malawi, em Ruanda e na África do Sul), os agentes globais (tratando o tema do mercado mundial a partir dos “agentes globais”),32 32 Incluindo um mapa onde fica claro que poucas empresas mundiais são sediadas num país africano. a indústria têxtil (com a já tradicional “viagem do jeans”, apresentando os países africanos onde se realiza parte dessa produção, em precárias condições de trabalho) e o uso da internet (com gráficos circulares do uso de alta tecnologia em todo o mundo mostrando a participação da África como um todo). Nesta última, também fica claro que, embora com pouca representatividade, o acesso à internet em geral vem aumentando consideravelmente no continente, ainda que não se discutam em detalhas os problemas internos de alguns Estados africanos.

Uma página dupla também trata de exportações e importações, nesse caso um pouco mais diferenciadas e tomando o exemplo da Tanzânia. Os parceiros comerciais da Tanzânia, assim como o volume desse comércio, são apresentados em gráficos circulares, e outro gráfico desse tipo mostra as regiões de origem de turistas na Tanzânia. Na mesma página, há um mapa da rede de transporte no continente africano e uma faz referência ao conceito espacial (Wardenga, 2002WARDENGA, U. Alte und neue Raumkonzepte für den Geographieunterricht. Geographie Heute, v. 23, n. 200, 8-11, 2002.) “espaço de relações”, sem propor aos alunos nenhuma tarefa específica. Além do mapa e dos diagramas, há duas fotos na página: de um caminhão, com a legenda “Transporte de mercadorias por caminhão na Tanzânia”, e outra de um homem numa colheita de algodão. Nesse capítulo sobre a Tanzânia também se discute o turismo como fator de desenvolvimento, ainda que não de forma muito bem refletida.

Nos livros para o 11º e 12º anos, o continente africano é representado em sua totalidade várias vezes com gráficos ou mapas, e alguns pontos são melhor abordados durante a análise. O primeiro deles é o land grabbing, com um mapa mostrando os países de origem dos investidores e o número de áreas em hectares. Essa apresentação se complementa com um quadro que mostra também os países atingidos pelo land grabbing, figurando entre os oito primeiros o Sudão, a República Democrática do Congo, Moçambique e Congo. O texto e as tarefas não tratam explicitamente dos Estados, mas sim do problema de modo geral. O segundo ponto é o mercado mundial, mais especificamente a importação e exportação no contexto do desenvolvimento (sendo mencionados os casos de Serra Leoa, Costa do Marfim, Líbia, Ruanda e Nigéria). No terceiro ponto, sobre os Estados agrários, dois gráficos mostram Estados africanos que, vale ressaltar, não são tratados em detalhe no texto sobre “Estruturas econômicas em transformação”. Isso também se aplica a um mapa de fragmentação global, e as tarefas geralmente estão dirigidas a registrar estruturas de exportação. Por fim, há também um estudo de caso do Quênia: o livro didático contém um breve capítulo especial (ao final) sobre o país, centrado no progresso técnico e também na área de conflito da globalização (que também dá título a esse capítulo especial). Além de dados sobre exportações e importações, se discutem a segurança alimentar por meio do progresso técnico e o desenvolvimento do turismo.

Quanto a modernização/desenvolvimento, sobre ambos os livros didáticos pode-se afirmar que apenas quatro referências se vinculam claramente a essa categoria. De uma perspectiva positiva, cabe menção à referência à Desertec no livro para o 9º e o 10º ano, assim como a discussão sobre a Tanzânia e o futuro de algumas indústrias. No livro didático do nível Secundário II, podem-se mencionar a agricultura ecológica e uma página dupla sobre o Quênia. Há ainda um capítulo dedicado ao tema da cooperação para o desenvolvimento, que representa o continente africano por fotos e o nomeia em parte. Outro ponto são as referências à igualdade de gênero, em que se mostra uma foto de uma mulher africana fazendo trabalho físico pesado, mas, de qualquer modo, não se aborda explicitamente um país africano.

Quanto à última categoria (urbanização), não há referências de destaque em nenhum dos livros didáticos escolhidos: não se discute nenhum processo de urbanização específico, mas o livro da Secundária II menciona um modelo de cidade oriental (tomando o exemplo de Marrakech), também no contexto de transformação colonial.

Discussão

Em relação ao espaço geral dedicado à África nos livros didáticos, há uma diferença significativa entre a amostragem brasileira e a alemã, consequência da metodologia escolhida para apresentar o continente. Enquanto a abordagem regional adotada no Brasil, que chega a dedicar até dois capítulos inteiros à discussão sobre a África, permite um foco maior em entidades espaciais, a abordagem temática que domina a Geografia escolar alemã em Berlim permite apenas uma consideração superficial e não sistemática do continente africano e seus espaços, que em geral só aparecem para ilustrar processos mais amplos. Essas diferenças fundamentais têm implicações na distribuição de segmentos de acordo com as categorias.

Na categoria natureza, os livros didáticos brasileiros adotam uma abordagem mais extensa e sistemática, ainda que descritiva. Ao contrário, os livros didáticos alemães apenas tocam aspectos selecionados (como a desertificação e o ecofarming), e é aqui que reside a maior diferença entre os dois casos estudados: uma abordagem mais integrada na Alemanha é contraposta a uma lente mais fortemente físico-natural no Brasil. De qualquer modo, em ambos os casos se menciona a questão alarmante das mudanças climáticas.

A limitada e também genérica atenção dedicada à história não chega a ser surpreendente. A falta de qualquer referência ao passado colonial africano nos livros didáticos do Secundário Inferior alemães é digna de nota e reflexão, mas, de todo modo, e dado o avanço dos estudos sobre Geografia pós-colonial, o impacto desse passado poderia ser mais bem representado nos livros didáticos de ambos os países.33 33 No caso alemão, só no livro didático do Secundário Superior, no capítulo “Países em desenvolvimento na economia mundial: história e presente”, há uma caricatura retratando a África “antes e depois” em relação ao mundo Ocidental, retratando o continente especialmente como fonte de escravizados. No texto que acompanha a caricatura, a referência à América do Sul (e à exploração de seus bens) também é importante, mas, igualmente, o tema não é muito detalhado.

A população africana é a terceira categoria, com uma modesta representação nas amostragens, e impressiona o fato de que em ambos os países se enfatiza a dimensão demográfica com base em aspectos quantitativos. O Brasil olha para os dados demográficos para quantificar a população e seu desenvolvimento, como também a Alemanha, embora usando o estudo de caso africano para introduzir métodos geográficos. Para tanto, a África é arbitrariamente tomada como exemplo, pois as pirâmides populacionais são o grande foco do conteúdo. A categoria também inclui segmentos descritivos com religião e etnia como variáveis (no Brasil), e também sobre o dividendo demográfico que os países africanos podem usar para o desenvolvimento econômico (Alemanha). Além disso, a questão da população é também vinculada à capacidade de movimento, levando às pegadas ecológicas. As tarefas propostas aos estudantes remetem fundamentalmente a uma comparação entre população e desenvolvimento, e da mesma maneira se analisam desafios e oportunidades para os jovens no mercado de trabalho.

A despeito da crescente dinâmica de urbanização na África (como a população), os livros didáticos representam apenas superficialmente o principal tipo de assentamento do futuro da humanidade. Os livros didáticos brasileiros apresentam uma imagem de uma África urbana moderna, contrastando-a com os desafios ligados ao desenvolvimento econômico. No caso alemão, o processo de urbanização é praticamente ignorado, excetuando-se algumas referências ao crescimento urbano em capitais selecionadas.34 34 E o modelo clássico de cidade oriental.

Uma das principais diferenças entre os dois países analisados é a importância conferida à categoria política. A abordagem sintética de aspectos pós-coloniais na amostragem alemã contrasta fortemente com a elaborada representação de assuntos políticos, em quatro sub-categorias, da amostragem brasileira. Uma possível explicação para tal é a limitada sensibilidade (geral) para assuntos pós-coloniais nos livros didáticos de Berlim, na esteira de uma transição para uma abordagem mais temática que se distancia de um detalhamento na escala continental (como feito até 2015).

A categoria economia (ou modernização/desenvolvimento) recebe também grande atenção, mas as diferenças se tornam visíveis nas principais abordagens escolhidas para o tema. No Brasil, uma introdução dos três principais setores da economia prepara o terreno para a discussão sobre desafios do desenvolvimento como a fome, a pobreza, a (des)integração regional e a exclusão digital. De alguma maneira situados entre o afro-otimismo e o afro-pessimismo (mas mais próximos do primeiro), os livros didáticos brasileiros discutem o contraste entre o êxito do crescimento econômico e os desafios correntes ligados à fome e à pobreza. Ao contrário, nos livros didáticos alemães, a escolha por uma abordagem temática só introduz certos temas e aspectos do desenvolvimento como a produção de energia, a exportação de recursos e a infraestrutura para o desenvolvimento. De qualquer modo, a maioria dos tópicos responde a uma perspectiva geral sobre o lugar da África no mercado mundial e, no limite, seu papel na globalização. Estranhamente, a Geografia do Secundário II dedica ainda menos atenção à economia africana, preferindo discutir os problemas do desenvolvimento com base em outros casos regionais. Mesmo assim, uma perspectiva globalista permanece na abordagem de indústrias ecológicas, produção de energia limpa e processo de land grabbing.

Considerações finais

O artigo analisa como duas escolas de Geografia, com diferentes bases epistemológicas e trajetórias e relações bastante distintas com a África, representaram o continente em seus livros didáticos. Diferentemente dos que tomaram livros didáticos de Geografia como amostra (Loftsdóttir, 2007LOFTSDÓTTIR, K. Learning differences? Nationalism, identity and Africa in Icelandic school textbooks. Internationale Schulbuchforschung, v. 29, n. 1, 5-22, 2007. Available in: https://www.academia.edu/878693/Learning_differences_Nationalism_identity_and_Africa_in_Icelandic_school_textbooks . Accessed on 6 jan. 2023.
https://www.academia.edu/878693/Learning...
), este estudo também considerou as gramáticas da disciplina e seus objetivos educacionais. Também em contraste com estudos mais antigos, interessados apenas em aspectos selecionados da África e sua representação (Wright, 1979WRIGHT, D. R. Visual Images in Geography Texts: The Case of Africa. Geography, v. 64, n. 3, 205-210, 1979. Available in: https://www.jstor.org/stable/40570214 . Accessed on 27 jan. 2023.
https://www.jstor.org/stable/40570214...
; Hillers, 1984HILLERS, E. Africa as Presented in Geography Textbooks of West European Countries. Internationale Schulbuchforschung, v. 6, n. 3/4, 363-377, 1984. Available in: https://www.jstor.org/stable/43055443 . Accessed on 6 jan. 2023.
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; Obermaier; Schrüfer, 2009OBERMAIER, G.; SCHRÜFER, G. Personal concepts on “Hunger in Africa”. International Research in Geographical and Environmental Education, v. 18, n. 4, p. 245-251, 2009. doi: https://doi.org/10.1080/10382040903251026.
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; Smiley, 2009SMILEY, S. L. Teaching Africa’s Cities Through Meja Mwangi’s Novels. Journal of Geography, v. 108, n. 4-5, 219-225, 2009. doi: https://doi.org/10.1080/00221340903344870.
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; Marmer et al., 2010MARMER, E.; MARMER, D.; HITOMI, L.; SOW, P. Racism and the Image of Africa in German School and Textbooks. The International Journal of Diversity in Organisations, Communities and Nations, v. 10, n. 5, p. 1-12, 2010. Available in: https://www.zef.de/uploads/tx_zefportal/Publications/a992_Marmer%20Sow%20RacismandtheImageofAfricainGermanSchoolsandTextbooks.pdf . Accessed on 9 dez. 2022.
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; Scoffham, 2019SCOFFHAM, S. The world in their heads: children’s ideas about other nations, peoples and cultures. International Research in Geographical and Environmental Education, v. 28, n. 2, 89-102, 2019. doi: https://doi.org/10.1080/10382046.2019.1529712.
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; Usher, 2021USHER, J. Africa in Irish Primary Geography Textbooks: developing and applying a Framework to investigate the potential of Irish Primary Geography textbooks in supporting Critical Multicultural Education. Irish Educational Studies, v. 42, n. 1, p. 123-143, 2021. doi: https://doi.org/10.1080/03323315.2021.1910975.
https://doi.org/10.1080/03323315.2021.19...
), a ambição aqui é mapear as representações gerais do continente nos diferentes níveis da Educação Básica (Brasil) e Secundária (Alemanha).

De modo geral, os resultados descortinaram diferenças relevantes com base na abordagem escolhida para ensinar Geografia na educação formal. Ao considerar os resultados apresentados aqui, parece altamente questionável o quanto a decisão alemã de voltar a uma abordagem temática na Geografia do Secundário I faz justiça às representações da África. Independentemente da escolha, uma disciplina escolar que abandona o enfoque regional deveria prover informação suficiente para se compreenderem as estruturas globais e suas repercussões na escala regional, e os estudantes em Berlim têm o direito de conhecer esse impacto tanto na África como na Europa. Consequentemente, os responsáveis pelos currículos deveriam avaliar sua decisão de seguir com a abordagem temática na sua forma atual.

Já no caso brasileiro, em que predomina uma abordagem regional mais aprofundada, parece inquestionável o impacto positivo da Lei n. 10.639/2003 no conteúdo dos livros didáticos,35 35 Ressalte-se o esforço louvável de apresentar aos alunos uma África moderna e urbana, bem como as contradições desse desenvolvimento. ainda que o retrocesso no Currículo Paulista (2020CURRÍCULO PAULISTA: Etapa Ensino Médio. São Paulo: Secretaria da Educação do Estado , 2020. Available in: https://efape.educacao.sp.gov.br/curriculopaulista/wp-content/uploads/2020/08/CURR%C3%8DCULO%20PAULISTA%20etapa%20Ensino%20M%C3%A9dio.pdf . Accessed on 27 jan. 2023.
https://efape.educacao.sp.gov.br/curricu...
) mostre a necessidade de fazer ainda mais para “promover um estudo consistente acerca da complexidade [...] do continente” (Santos, K., 2022SANTOS, K. L. Africano: uma introdução ao continente. Rio de Janeiro: Record, 2022., p. 19) - também para que os professores não se sintam constantemente angustiados com a insuficiência de seus conhecimentos sobre o assunto (Aguiar, 2022AGUIAR, F. C. Expressões culturais: angústia necessária ao ensinar sobre as Áfricas. Boletim GeoÁfrica, Rio de Janeiro, v. 1, n. 4, p. 81-82, 2022. Available in: https://revistas.ufrj.br/index.php/bg/article/view/56401/30839 . Accessed on 6 jan. 2023.
https://revistas.ufrj.br/index.php/bg/ar...
). Em linhas gerais, a mobilização política da população negra (majoritária) no Brasil, somada ao advento de governos progressistas e preocupados com a África nas últimas décadas, possibilitou, embora tardiamente, uma representação mais adequada e responsável do continente nos livros didáticos de Geografia. De todo modo, as turbulências políticas dos últimos anos, herdeiras do passado colonial e escravista do país, sugerem fortemente a necessidade de uma incessante batalha pela manutenção dos avanços conquistados, ameaçados por forças políticas retrógradas em ascensão ultimamente.

Um segundo aspecto com importância prática é o tempo como um conceito geográfico chave. Sem dúvida, a história colonial africana pode e deve ser abordada primariamente em outra disciplina, mas entender o impacto das estruturas coloniais no desenvolvimento pós-colonial (também considerando o desenvolvimento específico sob uma ordem global) deveria ser uma dimensão muito mais importante da educação geográfica, assim como indispensável para compreender o desenvolvimento sustentável. Para Blanco (2017BLANCO, J. M. M. Prejuicios sobre África en los libros escolares de Educación Secundaria. Historia Actual Online, v. 43, n. 2, p. 169-186, 2017.), sem uma compreensão profunda da dimensão histórica e da forma como ela é ensinada nas escolas (o que inclui sua abordagem nos livros didáticos de Geografia), não parece possível superar os preconceitos e equívocos formativos dos alunos sobre a África (cuja História vai muito além do período colonial), bem como um combate bem-sucedido à desinformação generalizada que se alastra no presente histórico do continente. Ademais, e olhando particularmente para o Brasil, relações Sul-Sul tradicionais e emergentes poderiam ser mais bem representadas no conteúdo - o que também seria essencial nos livros didáticos alemães.

Este estudo comparativo descortinou importantes diferenças enraizadas nas diferentes epistemologias das escolas de Geografia dos dois países analisados, bem como das trajetórias dessas formações socioespaciais em suas relações com o continente africano. Indubitavelmente, essas diferenças vinculam-se aos igualmente distintos percursos internos da Geografia como disciplina acadêmica e o modo como as sociedades brasileira e alemã veem o desenvolvimento e sua importância na educação. A despeito dos limites deste estudo, acreditamos firmemente que ter um conhecimento espacial profundo, com suas múltiplas facetas, prepara os estudantes para enfrentar desafios contemporâneos e vindouros. Assim, estudos futuros devem considerar também outros países e enfatizar as tarefas dos alunos, bem como desenvolver habilidades e o processo geral de aquisição de conhecimento geográfico sobre a África.

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  • 19
    Diferentemente das outras potências coloniais europeias, a Alemanha perdeu todas as suas possessões africanas em consequência da Primeira Guerra Mundial, e, ainda que os antigos laços não tenham sido completamente rompidos, configurou-se uma relação diferente das estabelecidas por ingleses, franceses, portugueses, espanhóis e belgas com a África. De qualquer maneira, cabe ressaltar que, enquanto manteve colônias, a Alemanha foi tão ou mais violenta que as outras potências europeias; veja-se o hoje já mais conhecido caso do genocídio do povo herero, na atual Namíbia, no início do século XX.
  • 20
    Cabe destacar a tradução para o português da coleção História Geral da África, da Unesco, que desde 2011 está disponível on-line e foi distribuída em bibliotecas públicas e universidades de todo o Brasil (Ministro apresenta..., 2010MINISTRO APRESENTA coleção da Unesco com versão em português. Ministério da Educação. Brasília: 2010. Available in: http://portal.mec.gov.br/ultimas-noticias/222-537011943/16139-ministro-apresenta-colecao-da-unesco-com-versao-em-portugues . Accessed on 16 nov. 2022.
    http://portal.mec.gov.br/ultimas-noticia...
    ).
  • 21
    Cujo recorte temporal vai até 2003.
  • 22
    No caso, o grupo espanhol Santillana, que adquiriu a editora Moderna no início dos anos 2000.
  • 23
    Em alemão, Landeninstitut für Schule und Medien (Lisum).
  • 24
    Em Berlim, Senatsverwaltung für Bildung, Jugend und Wissenschaft Berlin (SBJWB) (Departamento de Educação, Juventude e Ciência do Senado de Berlim). Em Brandemburgo, Ministerium für Bildung, Jugend und Sport des Landes Brandemburg (Ministério da Educação, Juventude e Esporte de Brandemburgo).
  • 25
    Colocado à venda pela editora Klett em 2018.
  • 26
    Publicado pela editora Westermann em 2017.
  • 27
    Um grau que dá direito a estudar na universidade.
  • 28
    Todos os continentes são estudados detalhadamente em pelo menos uma unidade de cada livro, por ser essa análise regional a escolha metodológica que estrutura as obras. De todo modo, o fato de a África ser objeto de duas unidades de um dos livros pode ser diretamente relacionado à previsão legal.
  • 29
    De acordo com a União Africana.
  • 30
    O título desse subcapítulo é “O espaço como objeto espacial”.
  • 31
    Trata-se de um projeto de ecofarming como exemplo positivo na Tanzânia. Também se pedem aos alunos trabalhos com atlas para a descrição do relevo, do clima e das circunstâncias agrárias, havendo, ademais, alguns gráficos que mostram o mecanismo de uma indústria de biogás (conteúdo também relativo ao tema do desenvolvimento).
  • 32
    Incluindo um mapa onde fica claro que poucas empresas mundiais são sediadas num país africano.
  • 33
    No caso alemão, só no livro didático do Secundário Superior, no capítulo “Países em desenvolvimento na economia mundial: história e presente”, há uma caricatura retratando a África “antes e depois” em relação ao mundo Ocidental, retratando o continente especialmente como fonte de escravizados. No texto que acompanha a caricatura, a referência à América do Sul (e à exploração de seus bens) também é importante, mas, igualmente, o tema não é muito detalhado.
  • 34
    E o modelo clássico de cidade oriental.
  • 35
    Ressalte-se o esforço louvável de apresentar aos alunos uma África moderna e urbana, bem como as contradições desse desenvolvimento.

Editado por

Editora do artigo:

Mónica Arroyo

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Jun 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    28 Fev 2023
  • Aceito
    23 Mar 2023
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