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Geografia Econômica e desenvolvimento: diferentes abordagens nos programas de cursos de graduação no Brasil

Resumo

Na ciência geográfica, a Geografia Econômica é uma das disciplinas que mais se dedica ao debate sobre desenvolvimento. Este artigo tem o objetivo de apresentar e discutir diferentes abordagens de desenvolvimento nos programas da disciplina Geografia Econômica no Brasil, em cursos presenciais de graduação em Geografia oferecidos por instituições públicas. Nesta pesquisa, consultaram-se matrizes curriculares de cursos de graduação em Geografia e se analisaram programas de Geografia Econômica; com a informação obtida, se organizou um banco de dados que sofreu tratamento estatístico, gráfico e cartográfico. Os resultados permitiram identificar os principais autores, obras e as abordagens de desenvolvimento predominantes nos programas de Geografia Econômica - como desenvolvimento desigual, desenvolvimento regional e desenvolvimento sustentável.

Palavras-chave:
Geografia Econômica; Desenvolvimento; Ensino

Abstract

In Geography, one of the most dedicated disciplines to debating development is Economic Geography. This paper aims to present and discuss different approaches to development found in Economic Geography course syllabi in Geography undergraduate programs offered by Brazilian public institutions. After consulting the academic curriculum of undergraduate programs in Geography and analyzing Economic Geography course syllabi, the produced database underwent statistical, graphic, and cartographic treatment. Results allowed us to identify the main authors, works and approaches to development in Economic Geography course syllabi-such as uneven development, regional development and sustainable development.

Keywords:
Economic Geography; Development; Education

Resumen

En ciencia geográfica, la Geografía Económica es una de las asignaturas más dedicadas al debate sobre el desarrollo. El propósito de este artículo es presentar y discutir diferentes enfoques de desarrollo contemplados en los programas de la disciplina Geografía Económica en Brasil, en cursos de grado en Geografía ofrecidos por instituciones públicas. Para realizar esta investigación, se consultarán matrices curriculares de cursos de grado en Geografía y se analizaron programas de Geografía Económica; elaboramos un banco de datos con la información obtenida y posterior tratamiento estadístico, gráfico y cartográfico. Los resultados permitieron identificar los principales autores, obras y los enfoques de desarrollo predominantes en los programas de Geografía Económica - como el desarrollo desigual, el desarrollo regional y el desarrollo sostenible.

Palabras clave:
Geografía Económica; Desarrollo; Enseñanza

Introdução

O debate sobre o desenvolvimento é longevo nas ciências humanas. Na Geografia, sua importância pode ser notada na profusão de conceitos que atravessam sua história e igualmente a Geografia Econômica, disciplina do currículo básico da formação de geógrafos, que vem discutindo o desenvolvimento sob diferentes abordagens teórico-metodológicas e matrizes epistemológicas.

Este artigo tem o objetivo de apresentar e discutir diferentes abordagens de desenvolvimento contempladas nos programas da disciplina Geografia Econômica, em cursos presenciais de graduação em Geografia oferecidos por instituições públicas no Brasil. Esta análise pode ajudar a compreender o tratamento do tema do desenvolvimento pela Geografia considerando seus conceitos, autores e obras mais utilizados e assim subsidiando a reflexão e o aprimoramento da disciplina no ensino superior.

Para fazer esta pesquisa, utilizamos: (1) revisão bibliográfica - principalmente livros e artigos sobre Geografia Econômica e conceitos de desenvolvimento, (2) dados secundários sobre cursos de graduação em Geografia no Brasil, disponíveis na plataforma e-MEC do Ministério da Educação,20 20 Agradecemos a Gustavo Teramatsu, doutorando em Geografia no IG-Unicamp, pelo auxílio no acesso aos dados da plataforma e-MEC. (3) documentos contendo matriz curricular e ementa de cursos presenciais de graduação em Geografia oferecidos por instituições de ensino superior (IES) públicas no Brasil, acessados em website de universidades e institutos e (4) programas de curso de Geografia Econômica em nível de graduação.21 21 Agradecemos aos professores da disciplina Geografia Econômica e coordenadores de curso pela disponibilização dos programas de curso analisados nesta pesquisa. Esses dados subsidiaram a elaboração de um banco de dados da pesquisa e receberam tratamento estatístico, gráfico e cartográfico.

Este artigo está dividido em seis partes. Inicialmente, apresentamos a expansão dos cursos de graduação em Geografia no Brasil, identificando a oferta da disciplina Geografia Econômica. Em seguida, discutimos aspectos da conformação desse subcampo disciplinar. Posteriormente, destacamos os autores e as obras citados nos programas de curso de Geografia Econômica, bem como as menções ao termo desenvolvimento. Por fim, revisitamos diferentes abordagens de desenvolvimento predominantes em Geografia Econômica.

Expansão dos cursos de graduação em Geografia no Brasil

No início da pesquisa, realizamos um levantamento da oferta do curso de graduação - bacharelado e licenciatura - em Geografia, utilizando como fonte principal o conjunto de dados públicos disponibilizados no portal e-MEC (Cadastro Nacional..., [s.d.]), do Ministério de Educação. No portal, foi utilizado como filtro de busca apenas o título geografia no campo curso, incluindo assim, nesse primeiro levantamento, cursos presenciais e a distância. A partir da base de dados em Excel, foram aplicados filtros para as categorias apresentadas (modalidade, categoria administrativa, carga horária e município) gerando uma base de dados secundária mais enxuta, contendo apenas cursos presenciais de instituições públicas.

A partir dessa base contendo o universo inicial de cursos, acessamos o website de cada uma das instituições, encontrando a matriz curricular do curso de graduação em Geografia e conferindo a oferta da disciplina Geografia Econômica. Essa informação foi adicionada numa nova coluna na base de dados, com três categorias: sim - oferece a disciplina, não - não oferece a disciplina e outro - oferece a disciplina com outro nome.

Restringimos a pesquisa ao universo das instituições públicas, por serem em grande número e apresentarem mais facilmente as informações curriculares em seus portais na internet. Entre 2020 e 2021, identificamos a oferta de 169 cursos de graduação em Geografia por instituições públicas no Brasil (Figura 1), número que revela a robustez desse sistema de ensino superior.22 22 Entre 2003 e 2008, havia mais de 300 cursos. Para uma análise detalhada, ver Fiori (2012). São cursos tanto de bacharelado quanto de licenciatura, em muitos casos de formação mista e/ou continuada, produzindo um profissional que se enquadra, muitas vezes, naquilo que Rocha (1996ROCHA, G. O. R. Ensino de geografia e a formação do geógrafo-educador. Terra Livre, São Paulo, v. 11-12, p. 177-188, 1996.) denominou geógrafo-educador. Desse total, 76 cursos (45%) são oferecidos por universidades federais. Outro montante significativo de 75 cursos (mais de 44%) é de universidades estaduais.

Figura 1 -
Brasil: cursos presenciais de graduação em Geografia no ensino público, por tipo de instituição, 2020

Há ainda um conjunto de 18 cursos oferecidos por institutos federais, que já respondem por 11% da oferta. Mais recentes que as universidades, a oferta de cursos de graduação pelos institutos liga-se à expansão do ensino superior que marcou as últimas duas décadas, em conjunto com o Programa de Apoio de Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federas (Reuni), que a partir de 2007 propôs a criação de novos cursos em regiões até então desassistidas, e outras políticas públicas do governo federal (Fiori, 2012FIORI, V. As contradições dos cursos de licenciatura em geografia no Brasil: uma análise territorial e de situação. Tese (Doutorado em Geografia Humana) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2012.; Teramatsu; Straforini, 2022TERAMATSU, G.; STRAFORINI, R. Do Enem ao Sisu: cartografia da interiorização do acesso à educação superior no Brasil. In: MACEDO, F.; MONTEIRO NETO, A.; VIEIRA, D. (Org.). Universidade e território: ensino superior e desenvolvimento regional no Brasil do século XXI. Brasília: Ipea, 2022. p. 123-150.).

Esse fenômeno deve ser analisado na relação recíproca entre educação e território, pois “a difusão desigual - tanto quantitativa como qualitativamente - das instituições de ensino tem muito a ver com esse jogo de influências entre território e fenômeno educacional” (Santos; Silveira, 2000SANTOS, M.; SILVEIRA, M. L. O ensino superior público e particular e o território brasileiro. Brasília: ABMES, 2000., p. 57). Analisando a distribuição geográfica do fenômeno, destaca-se que em todos os estados e no Distrito Federal se oferecem cursos de Geografia em instituições públicas, mas em números contrastantes: desde estados com apenas um curso até Minas Gerais, com cursos em 15 cidades diferentes.

Os cursos de Geografia estão presentes em todas as regiões brasileiras. Os três tipos de instituições públicas apresentam certa complementaridade espacial, havendo em poucos casos superposição de oferta no mesmo lugar, com universidades estaduais e institutos federais, ou campi avançados de universidades federais fora das capitais. Isso revela um esforço conjunto entre os estados e a União para interiorizar a presença do ensino superior público.

Essa capilaridade dos cursos de Geografia resulta de um processo histórico, marcado por períodos de expansão universitária (Fiori, 2012FIORI, V. As contradições dos cursos de licenciatura em geografia no Brasil: uma análise territorial e de situação. Tese (Doutorado em Geografia Humana) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2012.). Até 1959, basicamente só os estados litorâneos e Minas Gerais ofereciam esses cursos, com uma concentração maior nos estados de São Paulo e do Rio de Janeiro. Em 1989, já sob o regime democrático e a nova Constituição Federal, ainda havia estados sem nenhum curso de graduação em Geografia. Foi entre 1996 e 2010 que, segundo Fiori (2012FIORI, V. As contradições dos cursos de licenciatura em geografia no Brasil: uma análise territorial e de situação. Tese (Doutorado em Geografia Humana) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2012.), os cursos de Geografia experimentam uma maior expansão, inclusive para o interior dos estados, alcançando todas as unidades da federação em 2008. Isso se deveu às já mencionadas políticas públicas específicas desse período.

A variável demográfica é importante na interiorização dos cursos de graduação em Geografia, que em muitos casos acompanha as regiões mais populosas, com campi nas principais cidades médias do país, destacados centros regionais, como Santarém-PA, Barreiras-BA, Uberaba-MG e Passo Fundo-RS. Embora apresentando apenas os cursos de Geografia, esse mapa difere do diagnóstico de Santos e Silveira (2011SANTOS, M.; SILVEIRA, M. L. O Brasil: território e sociedade no início do século XXI. 15. ed. Rio de Janeiro: Record, 2011[2001].[2001]) sobre a distribuição geográfica das instituições públicas de ensino superior no Brasil em 1996, quando estavam marcadamente concentradas na faixa litorânea do país.

Para alterar essa tendência concentrada de oferta de cursos superiores no Brasil, foi necessário “um projeto político muito explícito do governo federal de criar condições ampliadas para o desenvolvimento local e regional, bem como a interiorização do desenvolvimento por meio da difusão das universidades, que encontrou eco na escala local para sua consecução” (Teramatsu; Straforini, 2022TERAMATSU, G.; STRAFORINI, R. Do Enem ao Sisu: cartografia da interiorização do acesso à educação superior no Brasil. In: MACEDO, F.; MONTEIRO NETO, A.; VIEIRA, D. (Org.). Universidade e território: ensino superior e desenvolvimento regional no Brasil do século XXI. Brasília: Ipea, 2022. p. 123-150., p. 125).

As universidades federais oferecem o curso de Geografia principalmente na capital dos estados e no Distrito Federal. Em algumas unidades federativas, essas instituições também oferecem em cidades do interior, com destaque para Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Paraíba e Pará, onde há oferta em várias cidades, geralmente destacadas cidades médias (polos regionais) distantes da capital.

Já as universidades estaduais oferecem graduação em Geografia nas principais cidades, além da capital, embora em estados como Espírito Santo, Rondônia e Amapá não exista esse tipo de instituição. Em alguns casos, as universidades estaduais têm boa capilaridade, a exemplo do Paraná (11 cidades oferecem Geografia), de Goiás (dez cidades), da Bahia (sete), de São Paulo (quatro) e do Ceará (três).

Por sua vez, os institutos federais tendem a oferecer o curso de Geografia em diferentes localidades geográficas: (a) lugares com alta demanda para a oferta já existente das universidades, como nas metrópoles de São Paulo, Brasília e Recife, (b) complementando a ação das universidades estaduais ou federais no interior, a exemplo do que ocorre no sertão do Ceará e no interior do Pará, e (c) no interior de estados que não têm universidades estaduais, caso do Espírito Santo e de Rondônia.

A disciplina Geografia Econômica nos cursos de graduação em Geografia no BrasilTabela 1

A disciplina Geografia Econômica é ofertada na ampla maioria dos cursos de Geografia no Brasil (Figura 2). Em apenas oito dos 169 cursos a disciplina não é oferecida, demonstrando sua relevância na formação dos geógrafos brasileiros. Em 125 cursos (74%), a disciplina é oferecida com o próprio nome de Geografia Econômica, o que revela sua consolidação no currículo básico de educação superior no Brasil e, assim, justifica a análise que apresentamos a seguir. Embora existam muitas diferenças entre os cursos de Geografia, sobretudo na formação de professores (Girotto, 2013GIROTTO, E. Entre a escola e a universidade: o produtivismo - aplicacionismo na formação de professores em geografia. Tese (Doutorado em Geografia Humana) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2013.), a constatação de disciplinas recorrentes auxilia na identificação de suas abordagens predominantes. Por sua vez, 36 cursos (21%) oferecem os conteúdos de Geografia Econômica com outros nomes, possivelmente mais antigos que seguem sendo utilizados.

Figura 2 -
Brasil: Oferta da disciplina Geografia Econômica nos cursos presenciais de graduação em Geografia em instituições públicas, 2020

Tabela 1 -
Brasil: cursos presenciais de Geografia em instituições públicas que não oferecem a disciplina Geografia Econômica, 2020

Conforme mencionado, há outros nomes para a disciplina Geografia Econômica (Tabela 2), relativas principalmente com atividades como indústria, comércio e serviços ou economia política.

Tabela 2 -
Brasil: outros nomes da disciplina Geografia Econômica em cursos presenciais de Geografia em instituições públicas, 2020

É importante considerar os outros nomes da Geografia Econômica para valorizar a própria história multifacetada desse subcampo disciplinar. Esses diferentes nomes respondem a diferentes interpretações desse subcampo, mas também a períodos históricos com predominância de determinados enfoques teóricos ou com preferência a análises de determinadas atividades econômicas como a indústria, o comércio e os serviços.23 23 Aloysio Araújo Junior e Carlos Espíndola (2015) analisam os estudos econômicos em Geografia e fazem uma proposta metodológica para o Ensino de Geografia Econômica.

Cabe apontar que essa disciplina consta na grande maioria das matrizes curriculares, inclusive com caráter predominantemente obrigatório, sendo oferecida geralmente nos primeiros semestres letivos e às vezes como pré-requisito para disciplinas subsequentes. Além disso, é nessa disciplina que se aborda mais fortemente o tema do desenvolvimento,24 24 No Brasil, além da Geografia Econômica, outras disciplinas também envolvem o tema do desenvolvimento; por exemplo, a Geografia Urbana, com discussões acerca do desenvolvimento urbano; a Geografia Regional, com o termo desenvolvimento na perspectiva regional; a Geografia Ambiental e/ou Educação Ambiental, com o debate sobre desenvolvimento sustentável; e disciplinas vinculadas ao planejamento, com diversas noções de desenvolvimento (urbano, rural, regional, ambiental). assunto discutido adiante.

A conformação de um subcampo disciplinar

Após o levantamento da oferta da disciplina Geografia Econômica nos cursos de graduação em Geografia das diversas instituições públicas de ensino no Brasil, salientamos aspectos da conformação desse ramo da geografia, que passou por transformações variadas. Em nenhum momento essa trajetória deixou de acompanhar as mudanças gerais por que passava a Geografia, de modo que sua evolução é coerente com a própria ciência e com as crises que ela atravessa.

A Geografia Econômica na Europa se desenvolveu em meados do século XIX, quando o crescimento do comércio internacional acelerou a especialização de cada região na produção em que ela tinha a mais forte vantagem relativa. Ela se apresentava como um subcampo de conhecimento essencialmente descritivo, oferecendo retratos das atividades produtivas, dos fluxos de bens e de grandes mercados (Claval, 2012CLAVAL, P. A diversidade das geografias econômicas. Geographia, v. 14, n. 27, p. 7-20, 2012. doi: https://doi.org/10.22409/GEOgraphia2012.v14i27.a13632.
https://doi.org/10.22409/GEOgraphia2012....
).

Tais estudos tangem ao que poderíamos denominar “fase dos manuais”, quando imperavam a descrição e o inventário, correlata à chamada “geografia do comércio” ou “geografia comercial”, quando começaram a circular textos preocupados em inventariar dados empíricos vinculados a diferentes questões: agricultura, indústria, comércio, população, cidades etc. sobretudo a partir do final do século XIX, época de hegemonia do capital mercantil e da busca de novos mercados por parte das potências industriais europeias25 25 “Essa geografia particular está encarregada de dar conta dos movimentos de mercadorias ‘entre os países do mundo’ (MILL, 1894) e não ultrapassa, como as outras especializações, o nível descritivo. Uma revisão dos índices temáticos dos manuais - Chisholm (1889), Mill (1894), Stamp (1927), Vasconcellos (1916), Smith e Phillips (1946) - permite observar que eles seguem uma mesma estrutura expositiva: destinam os primeiros capítulos aos produtos comercializados, com um detalhe de suas características agronômicas ou técnicas, e deixam os últimos capítulos para os países (ou continentes), com uma identificação das áreas de produção e dos sistemas de transporte a elas vinculadas [...] Um indicador de que esses trabalhos foram concebidos com um caráter principalmente informativo é a grande quantidade de reedições que muitos deles apresentam (George Chisholm chega a vinte edições e Dudley Stamp a dez edições), dada a necessidade de atualizar as numerosas estatísticas incluídas” (Arroyo, 2019, p. 2-3). (Arroyo, 2019ARROYO, M. M. Geografia e comércio internacional: breve revisão bibliográfica. Boletim Campineiro de Geografia, v. 9, n. 2, p. 165-179, 2019. doi: https://doi.org/10.54446/bcg.v9i2.467.
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).

As obras desse período são marcadas pelo “interesse na confecção de inventários sobre recursos e produções, realizando uma descrição de suas características e uma identificação dos principais países ou áreas produtoras e dos intercâmbios comerciais, acompanhadas frequentemente por um relato complementar de caráter regional”, visto que se tratava de muitas obras caracterizadas “pela atenção prioritária dada às atividades mais relacionadas com os recursos naturais, a influência do determinismo ambiental e do historicismo e suas explicações, bem como um distanciamento explícito da teoria econômica, considerada muito abstrata e alheia às preocupações com o espaço” (Méndez, 1997MÉNDEZ, R. Geografía económica: la lógica espacial del capitalismo global. Barcelona, ES: Ariel, 1997., p. 14).

É nesse sentido que, para Claval (2005CLAVAL, P. Geografia econômica e economia. Geotextos, v. 1, n. 1, p. 11-27, 2005. doi: https://doi.org/10.9771/1984-5537geo.v1i1.3028.
https://doi.org/10.9771/1984-5537geo.v1i...
, p. 13), a geografia econômica ficou muito tempo isolada da economia e do resto da geografia, desempenhando um papel muito modesto. “Depois, se aproximou da economia, incorporando muitos resultados da teoria da localização, da teoria das relações internacionais e da macroeconomia” e, posteriormente, “inovou também no domínio dos fenômenos de polarização, do papel da informação e da interpretação das economias externas”. A partir da década de 1950, o desenvolvimento do sistema urbano-industrial e o aprofundamento da divisão social do trabalho colocaram a cidade e a indústria como precursores de uma nova realidade econômica. A complexidade das relações que se estabeleceram levou à necessidade de definir novos campos.

Já a partir da década de 1960, os métodos quantitativos passaram a influenciar bastante não só o pensamento geográfico, mas as ciências sociais em geral, com enfoques classificatórios com ênfase no desenvolvimento de teorias e modelos e do pragmatismo, valendo-se de modelos estatísticos e matemáticos. Trata-se do paradigma da chamada Nova Geografia, de influência anglo-saxônica. Moreira, R. (1980MOREIRA, R. O que é geografia. São Paulo: Brasiliense, 1980. (Coleção Primeiros Passos.)) explica que seu pressuposto é a organização espacial segundo tipologias e combinações de variáveis que se revelam na forma dos arranjos do espaço conforme padrões matemáticos e modelos quantitativos.

A Nova Geografia se manifestou principalmente por meio da quantificação, mas também utilizou outros instrumentos, como os modelos, a teoria dos sistemas, a tese da difusão de inovações, além das noções de percepção e de comportamento e das múltiplas formas de valorizar o empírico e o ideológico. No caso da Geografia Econômica, há forte influência das análises que priorizam a perspectiva locacional e também a proposição de vários modelos, que procedeu por meio de dois caminhos distintos e complementares (Santos, 2008SANTOS, M. Por uma geografia nova: da crítica da geografia a uma geografia crítica. 6. ed. São Paulo: Edusp, 2008[1978].[1978]): no primeiro, parte-se de postulados muitos simples e gradativamente se introduz mais complexidade; e o segundo método é mover-se a partir da realidade, fazendo uma série de generalizações simplificadas. Ambos evidenciaram que o modelo é, por natureza, uma representação da realidade parcial e simplificadora.

Como esclarece Santos (2008SANTOS, M. Por uma geografia nova: da crítica da geografia a uma geografia crítica. 6. ed. São Paulo: Edusp, 2008[1978].[1978], p. 73), “o grande equívoco da chamada ‘geografia quantitativa’ foi o de considerar como um domínio teórico o que era apenas um método e, além do mais, um método discutível”, uma vez que a abordagem e a contribuição quantitativa ou simplesmente estatística são pouco úteis sem o conhecimento sistemático de mecanismos e processos. Ainda de acordo com o autor, uma das razões fundamentais pelas quais a geografia tem conhecido uma evolução tão lenta é o peso que as velhas ideias têm dentro dessa disciplina, e a intitulada geografia quantitativa marca o ponto máximo da desespacialização do espaço, reduzido a uma teia de coordenadas sem relação com o real.

Pode-se dizer que, desde a década de 1970, o econômico se afirma na análise geográfica e ganha importância nas discussões principalmente devido à incorporação do materialismo histórico e dialético como referencial teórico-metodológico, evidente nos postulados da geografia radical, priorizando o enfoque da totalidade. Há uma significativa valorização e afirmação do econômico como elemento explicativo dos processos espaciais e, nesse sentido, a influência da economia política e de sua crítica mostra-se efetiva na medida em que vários de seus conceitos e categorias se internalizam no desvendamento da realidade por parte da Geografia.

Diferentes correntes teóricas que ancoram a Geografia Econômica tentam romper com o evolucionismo e a ideologia do progresso linear. De certa maneira, seguem a pista inaugurada por Trotsky com o desenvolvimento desigual e combinado. Segundo Löwy (1995LÖWY, M. Teoria do desenvolvimento desigual e combinado. Trad. Henrique Carneiro. Actuel Marx, Paris: Presses Universitaires de France, n. 18, p. 73-80, 1995., p. 73-74), essa teoria é uma tentativa “de dar conta da lógica das contradições econômicas e sociais dos países do capitalismo periférico ou dominados pelo imperialismo”, porque está ligada ao postulado de que “ligando todos os países entre si pelo seu modo de produção e seu comércio, o capitalismo fez do mundo inteiro um só organismo econômico e político” (Trotsky apud Löwy, 1995LÖWY, M. Teoria do desenvolvimento desigual e combinado. Trad. Henrique Carneiro. Actuel Marx, Paris: Presses Universitaires de France, n. 18, p. 73-80, 1995., p. 74).26 26 Em diferentes momentos de elaboração do pensamento crítico contemporâneo, recuperam-se as propostas clássicas dos teóricos do imperialismo: desenvolvimento desigual (Vladimir Lênin), revisão da acumulação primitiva (Rosa de Luxemburgo) e desenvolvimento desigual e combinado (Leon Trótsky).

Nunes (2004NUNES, F. G. O econômico na geografia: influências do pensamento econômico na produção geográfica (1970-2001). Tese (Doutorado em Geografia) - Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade Estadual Paulista, Presidente Prudente, 2004.) chama atenção para as principais influências na Geografia brasileira provenientes do pensamento econômico: a teoria da modernização da agricultura, as teorias de Ignácio Rangel, a teoria da renda da terra (rural), a teoria da renda da terra (urbano), as teorias derivadas da economia espacial (crítica), os conceitos e as ideias inspiradas no pensamento marxista, o desenvolvimento regional e a reestruturação industrial.27 27 Para conhecer sistematicamente as principais influências do pensamento econômico na produção geográfica brasileira, ver Nunes (2004).

Autores e obras em destaque nos programas de curso de Geografia Econômica

Para a análise qualitativa dos programas de disciplinas, consideramos os programas de Geografia Econômica e correlatas, isto é, de outras disciplinas com nomes semelhantes (como Geografia Econômica acrescida de outro segmento, por exemplo: Geografia Econômica e Organização do Espaço, Aspectos Econômicos da Análise Geográfica ou Fundamentos de Economia para Geografia). Ao todo, foram levantados 33 programas de disciplinas de instituições relevantes nas diferentes regiões brasileiras. Destes, 22 têm termo desenvolvimento no conteúdo programático, de modo que a análise pormenorizada contemplou esse grupo de programas que aborda o tema expressamente.28 28 Foram levantados 33 programas de ensino nos três tipos de IES públicas, nas diferentes regiões do Brasil, os quais foram solicitados a professores que ministram a disciplina Geografia Econômica e/ou correlatas e a coordenadores de cursos de graduação em Geografia. Esses 33 programas são de cursos de institutos federais (1), universidades estaduais (14) e federais (18); são de Geografia Econômica (19) e correlatas/assemelhadas (14) e são das regiões: Nordeste (9), Centro-Oeste (3), Sudeste (11) e Sul (10).

Estão contidos nos programas de ensino a ementa, o objetivo, a metodologia, os critérios de avaliação, o cronograma das aulas, bem como os conteúdos programáticos e a bibliografia (básica e/ou complementar),29 29 De modo geral, as referências bibliográficas são apresentadas como um último item do programa, às vezes separadas em bibliografia “obrigatória” e “complementar”. Do total de programas analisados, apenas um associou a bibliografia a cada unidade temática do conteúdo programático. sendo estes dois últimos itens objetos de nossa análise. Todos os programas levantados são do período compreendido entre o segundo semestre de 2017 e o segundo semestre de 2020.

Como a Geografia Econômica está como prioritária no rol de disciplinas componentes da formação em nível de graduação, a carga horária predominante identificada nos programas de ensino é de 60 horas-aula, mínima carga horária encontrada, com alguns programas chegando a 136 horas-aula. Na maior parte dos programas, a carga horária consiste em atividades de cunho teórico, sobretudo aulas expositivas dialogadas, porém alguns incluem expressamente também atividades práticas como apresentação de seminários e aulas de campo.

Os conteúdos contemplados nos programas estão subdivididos em unidades temáticas, que abordam desde a relação entre espaço e economia, a evolução da Geografia Econômica e as principais abordagens teóricas até as dinâmicas recentes do capitalismo, como os processos de globalização e financeirização.

Para a análise das referências bibliográficas predominantes nos programas, foi adotada a metodologia utilizada por Firkowski (2015FIRKOWSKI, O. L. C. F. Tendências recentes da geografia industrial no Brasil. In: ENCONTRO DE GEÓGRAFOS DA AMÉRICA LATINA, 15., 2015, Havana. Anais... Havana, 2015.Disponível em: http://observatoriogeograficoamericalatina/egal15/Geografiaindustrial . Acesso em: 20 jun. 2021.
http://observatoriogeograficoamericalati...
), acerca da Geografia Industrial.30 30 Adotamos o método matemático de análise de cluster, que permite agrupar em classes homogêneas um conjunto de dados segundo seu grau de similaridade ou semelhança. Esses agrupamentos são organizados hierarquicamente segundo o nível de similaridade (ou distância), representados pelo dendrograma (diagrama da árvore hierárquica). A similaridade entre as classes pode ser medida a partir das distâncias; no caso deste trabalho, a distância euclidiana (distância métrica entre dados), em que valores mais próximos indicam alta similaridade entre agrupamentos, contra valores mais distantes, que indicam baixa similaridade. Foi utilizada a bibliografia geral e complementar apresentada nos programas, que totalizou 633 referências.

A análise da bibliografia dos programas resultou no total de 239 autores, sendo possível destacar aí aqueles que norteiam o ensino de Geografia Econômica no Brasil (Tabela 3). O autor mais citado é Milton Santos, com 43 ocorrências, seguido de David Harvey, com 41 menções. Armen Mamigonian é o terceiro autor mais mencionado nos programas (26), juntamente com Georges Benko (25). François Chesnais tem 12 ocorrências, seguido de Clélio Campolina Diniz (11). Depois, com 10 menções, estão Domenico Losurdo, Ricardo Méndez e Roberto Lobato Corrêa. Estão também entre os autores mais citados Karl Marx e Neil Smith (9); Eric Hobsbawm e Ignácio Rangel (8); e Eliseu Savério Sposito, Giovanni Arrighi e Manuel Correia de Andrade (7).

Tabela 3 -
Autores por número de menções nos programas de curso de Geografia Econômica

Há uma importante diversidade de autores, entre geógrafos, economistas, historiadores, sociólogos, filósofos; brasileiros e estrangeiros; autores com tendências mais tradicionais, outros que abordam teorias mais contemporâneas; alguns amplamente conhecidos e outros menos, como Ha-Joon Chang.

Além dos principais, que surgem de maneira recorrente, há um conjunto de autores que também são mencionados nos programas, embora ocorram menos: Alain Lipietz, Allen Scott, Antonio Thomaz Júnior, Joseph Schumpeter, Maria Laura Silveira, Michael Storper, Mónica Arroyo, Paul Claval, Pierre Monbeig, Pierre Veltz, Ariovaldo Umbelino de Oliveira, Carlos Brandão, Cláudio Egler, Francisco de Oliveira, István Mészáros, Manuel Castells, Michael Löwy, Neil Brenner, Paul Krugman, Paul Singer, Rogerio Haesbaert, Wilson Cano, Jamie Peck, Caio Prado Júnior, Carlos Walter Porto-Gonçalves, Antônio Carlos Robert Moraes, Wanderley Messias da Costa, Octávio Ianni, Celso Furtado, Leila Dias, Leon Trótsky, Adam Smith, Claude Manzagol, Rosa Luxemburgo, Doreen Massey, Fernand Braudel.

Foram identificadas 416 obras. O livro Condição pós-moderna, de David Harvey, com 14 menções, ao lado de Economia, espaço e globalização na aurora do século XXI, de Georges Benko, com 13, são as obras mais citadas nos programas de Geografia Econômica (Tabela 4).

Segue-se Desenvolvimento desigual, de Neil Smith, com 9 ocorrências. Depois, com 7 ocorrências, estão Por uma outra globalização e Economia espacial, ambas de Milton Santos, bem como A mundialização do capital, de François Chesnais, sendo esta última a quarta obra mais citada. Diferentemente do que ocorria no passado, verifica-se a ausência de qualquer manual ou compêndio como obra de referência que dê aos estudantes uma visão geral dessa especialidade.

Tabela 4 -
Obras por número de menções nos programas de curso de Geografia Econômica

Além das obras mais mencionadas (Quadro 4), há outras que ocorrem menos nos programas, tais como: Trajetórias Geográficas, de Roberto Lobato Corrêa; Fuga da história?, de Domenico Losurdo; A teoria do desenvolvimento desigual e combinado, de Michael Löwy; O capital, de Karl Marx; O Brasil: território e sociedade no início do século XXI, de Milton Santos e María Laura Silveira; O mito do desenvolvimento econômico e Formação econômica do Brasil, de Celso Furtado; Teorias da globalização e A era do globalismo, de Octávio Ianni; As revoluções do capitalismo, de Maurizio Lazzarato; O Fenômeno fundamental do desenvolvimento econômico, de Joseph Schumpeter; e O capitalismo, sua evolução, sua lógica e sua dinâmica, de Paul Singer.

As obras identificadas são principalmente do século XX, muitas publicadas nas últimas décadas, já com várias edições e amplamente utilizadas, mas também em anos recentes, como, por exemplo: A era do capital improdutivo, de Ladislau Dowbor (2017); A economia das desigualdades, de Thomas Piketty (2015); e Conhecimento, inovação e território, de Mario Vale (2012). A bibliografia dos programas apresenta obras de vários países, com destaque do Brasil, dos EUA e da França, mas também da Inglaterra, da Espanha e da Itália. Importa notar que se privilegiam obras traduzidas, visto que todas as obras estrangeiras mais mencionadas têm tradução ao português, exceto Geografía Económica: la lógica espacial del capitalismo global, do geógrafo espanhol Ricardo Méndez, que circula em espanhol.

O desenvolvimento nos programas de cursos de Geografia Econômica

No que tange à análise dos programas, pode-se afirmar que a abordagem do desenvolvimento está presente e perpassa diversas unidades temáticas, com maior ou menor grau de detalhamento. Dos 22 programas analisados (de um total de 33), em oito o termo desenvolvimento é apenas mencionado, mas não há uma desagregação que permita elucidar o enfoque escolhido para seu tratamento. Nesses casos, constam apenas tópicos como “crescimento e desenvolvimento”, “polarização e desenvolvimento” ou “as teorias do desenvolvimento”. Já em outros 14 programas, o termo desenvolvimento é citado no conteúdo programático, e sua abordagem é mais detalhada quanto ao enfoque teórico e os autores que norteiam a discussão.31 31 Em 11 programas (de um total de 33), o termo desenvolvimento não é citado explicitamente, mas contêm tópicos de conteúdo programático que abordam questões relativas a economia espacial, economia regional, economia no capitalismo periférico, centro e periferia na economia mundial e a teoria dos polos de crescimento, de François Perroux.

Nos casos em que os programas apresentam o tema mais detalhadamente, foi possível identificar tópicos destinados a discutir desde abordagens de inspiração marxista, neoclássicas ou da perspectiva keynesiana até novas propostas com vários conceitos alternativos de desenvolvimento, os quais foram surgindo nas últimas décadas, como desenvolvimento local ou desenvolvimento sustentável. Também se identificaram unidades temáticas inteiras com tópicos dedicados a discutir a dimensão espacial do desenvolvimento, sua relação com o território e com políticas territoriais de desenvolvimento, verificando-se ainda a recorrência da preocupação com o desenvolvimento geograficamente desigual.

Gráfico 1 -
Conceitos de desenvolvimento mencionados nos programas de curso de Geografia Econômica

Conforme mencionado, o termo desenvolvimento aparece nos 22 programas analisados, mas cabe ressaltar que num mesmo programa ele pode aparecer com várias adjetivações (Gráfico 1). Assim, verifica-se que predomina “desenvolvimento desigual”, com nove ocorrências. Seguem-se desenvolvimento sem nenhuma adjetivação, com sete, e “desenvolvimento regional”, com três. Outras designações como desenvolvimento urbano-regional, local, sustentável ou territorial aparecem menos. Lembramos que muitas dessas abordagens são comumente contempladas em outras disciplinas do currículo, como, por exemplo: desenvolvimento urbano em Geografia Urbana; desenvolvimento rural em Geografia Agrária; desenvolvimento estratégico em Geografia Política.32 32 Marcelo Lopes de Souza (2013) propõe a discussão do desenvolvimento socioespacial, fundado filosoficamente no princípio de autonomia inspirado em Castoriadis, que o geógrafo inclui entre os conceitos fundamentais da pesquisa socioespacial.

De acordo com Lamberti e Gama (2020LAMBERTI, E.; GAMA, V. Geografia e economia: conexões a partir da temática do desenvolvimento. In: SILVA, P.; SPOSITO, E.; SANTANA, M. (Org.). Geografia e economia: relações e interfaces. Dourados, MS: Ed. UEMS, 2020. p. 32-48.), a abordagem do tema do desenvolvimento na Geografia e na Economia, até o início do século XX, convergia para os condicionantes do progresso material e estava diretamente vinculada à noção de crescimento econômico. Só a partir dos anos 1950 o debate passou a envolver novos problemas, concorrendo para a proposição de diferentes conceitos e interpretações.33 33 Desenvolvimento é um dos verbetes do Glossário de geografia humana e econômica organizado por Eliseu Sposito (2017). Para Porto-Gonçalves (2006PORTO-GONÇALVES, C. W. A globalização da natureza e a natureza da globalização. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira , 2006., p. 64), o debate sobre o desenvolvimento foi por muito tempo pautado não só na ideia de progresso econômico, como também num modelo eurocêntrico, em que a visão de um país desenvolvido corresponderia a um país urbano e altamente industrializado, que seria superior e por isso passível de generalização, de modo que diferentes concepções de desenvolvimento buscaram comparar países, que seriam de “primeiro mundo ou terceiro mundo”; “industrializados ou em vias de industrialização”; “desenvolvidos ou subdesenvolvidos”; “centrais ou periféricos”; “ricos ou pobres”; “vencedores ou perdedores”.

O desenvolvimento é um conceito que tem sido objeto de extensa literatura e ainda está submetido a importantes discussões em diversas áreas do conhecimento. Conforme Clark (2007CLARK, D. A. Visions of development: a study of human values. Cheltenham, GB: Edward Elgar, 2007.) e Moreira, S. e Crespo (2012MOREIRA, S. B.; CRESPO, N. Economia do desenvolvimento: das abordagens tradicionais aos novos conceitos de desenvolvimento. Revista de Economia, v. 38, n. 2, p. 25-50, 2012. Disponível em: https://revistas.ufpr.br/economia/article/view/29899/19361 . Acesso em: 9 mar. 2022.
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), ao longo dos últimos anos, surgiram propostas em torno de novas denominações - como desenvolvimento humano, desenvolvimento local, desenvolvimento sustentável -, que foram alargando o conceito tradicional de desenvolvimento econômico, na busca por tornar mais explícita outras dimensões, como a social, local e ambiental.

Abordagens de desenvolvimento em Geografia Econômica

Desde o fim da Segunda Guerra Mundial, se instalam diversos debates em torno do desenvolvimento e subdesenvolvimento, alguns deles influenciados pelas ideais de Rostow (1961ROSTOW, W. W. Etapas do desenvolvimento econômico. Rio de Janeiro: Zahar, 1961[1959].[1959]), que explica a evolução das sociedades como um processo linear atravessando etapas até alcançar estágios mais avançados caracterizados pela completa modernização. Segunda esta teoria, os países deveriam percorrer cinco estágios de desenvolvimento econômico, ao fim dos quais eles teriam transitado da sociedade tradicional, o estágio mais atrasado e estático, à era do elevado consumo de massa, a quinta e mais avançada etapa de desenvolvimento de uma nação. Ou seja, pontua-se o caráter sequencial do processo de desenvolvimento, caminho ou trajetória que todos os países seguiriam.

Entretanto, nessa época também circulam as críticas de Gunnar Myrdal (1968MYRDAL, G. Teoria econômica e regiões subdesenvolvidas. Rio de Janeiro: Saga, 1968[1957]. [1957]) aos pressupostos de equilíbrio da economia neoclássica, apontando a causação circular cumulativa como mecanismo de persistência das desigualdades, afastando ainda mais as regiões inicialmente menos desenvolvidas das mais avançadas. Assim, a interdependência de relações, atividades e regiões deveria estar no cerne dos estudos sobre desenvolvimento e subdesenvolvimento. Para o autor, a atuação do Estado poderia evitar os processos cumulativos de desequilíbrio tanto entre países como entre regiões de um mesmo país. O círculo vicioso do atraso e da pobreza poderia ser rompido pela aplicação planejada de reformas sociais, políticas e econômicas.

Por sua vez, François Perroux (1955PERROUX, F. Notes sur la notion de pôle de croissance. Economie Appliquée, v. 8, n. 1-2, p. 307-322, 1955.) adverte que o crescimento econômico não se difunde de maneira uniforme pelo espaço, mas se concentra em pontos, criando desequilíbrios entre áreas vizinhas; ou seja, se faz a partir de polos (de núcleos de atividades), propagando-se depois a partir deles. Contestando os modelos neoclássicos de equilíbrio, o autor mostra que a heterogeneidade e o desequilíbrio constituiriam as formas pelas quais o crescimento se manifestaria no espaço econômico. Como explica Manoel Correia de Andrade (1967ANDRADE, M. C. Espaço, polarização e desenvolvimento: a teoria dos pólos de desenvolvimento e a realidade nordestina. Recife: Centro Regional de Administração Municipal, 1967.),34 34 O autor explica a repercussão e os desdobramentos dos estudos sobre polarização no Brasil e menciona a estância de Boudeville, discípulo de Perroux, que trabalhou por três anos no país num contexto de ascensão do planejamento regional. Perroux distingue os termos crescimento e desenvolvimento: os polos de crescimento seriam aqueles que provocam o crescimento do produto e da renda per capita sem acarretar outras mudanças nas estruturas regionais, enquanto os polos de desenvolvimento, além do crescimento do produto, provocam também modificações nas estruturas que favorecem a população da região que ele polariza. Estes últimos geralmente são induzidos, ferramentas de uma política, de uma ação planejada.

É interessante registrar que o diálogo com as elaborações de Perroux permeia a maioria dos textos do livro Geografia ativa (1964) de Pierre George e seus colegas Raymond Guglielmo, Bernard Kayser e Yves Lacoste, ora para aderir, ora para discordar da ideia de polarização como forma de conceber a região. Esse livro expressa, de certa maneira, o movimento de renovação do pensamento geográfico que George e demais colegas franceses promovem na década de 1960, quando prevalece a discussão sobre o planejamento e o papel do Estado num projeto de desenvolvimento. Segundo Pedrosa (2013PEDROSA, B. V. Entre as ruínas do muro: a história da geografia crítica sob a ótica da ideia de estrutura. Tese (Doutorado em Geografia Humana) - Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2013.), essa obra foi propulsora, na América Latina e no Brasil, de uma conscientização do papel da Geografia na transformação social.35 35 Para conhecer o surgimento da geografia crítica na França e nos EUA da ótica da ideia de estrutura, considerando antecedentes e desdobramentos, ver Pedrosa (2013). O autor ressalta o papel pioneiro dos geógrafos franceses Pierre George, Jean Tricart e Jean Dresch no processo de renovação da geografia nos anos 1960. Já circulavam estudos sobre o Terceiro Mundo e o subdesenvolvimento, com a divulgação dos livros de Lacoste Os países subdesenvolvidos (1959) e A geografia do subdesenvolvimento (1965).

Voltando ao pós-guerra, cabe lembrar a criação da Comissão Econômica para América Latina e Caribe (Cepal) em 1948, sob a liderança de Raul Prebisch e Celso Furtado, que promovem uma interpretação do desenvolvimento econômico baseada na divisão internacional do trabalho, constatando a deterioração dos termos de intercâmbio em prejuízo dos países produtores de bens primários. Segundo os cepalinos, uma forma de enfrentar os obstáculos estruturais ao desenvolvimento seria implementar políticas para fomentar uma industrialização por substituição de importações e alcançar uma diversificação econômica, a fim de superar o caráter primário-exportador que coloca os países latino-americanos na periferia do sistema econômico mundial.

Outra contribuição que surge na América Latina nos anos 1960-70 é a teoria da dependência, em torno de duas vertentes (Katz, 2020KATZ, C. A teoria da dependência: 50 anos depois. São Paulo: Expressão Popular, 2020.). Uma concepção marxista, cujos principais expoentes foram Rui Mauro Marini, Theotonio dos Santos e Vania Bambirra, ressalta o caráter necessariamente desigual em que se funda o desenvolvimento capitalista, gerando subdesenvolvimento na periferia do sistema mundial.36 36 Nesse momento, destaca-se a atuação do economista alemão André Gunder Frank, precursor das análises sobre a dependência, ao definir subdesenvolvimento como uma característica intrínseca do capitalismo dependente. Ele considerou que o “desenvolvimento do subdesenvolvimento” ilustrava como a consolidação das economias avançadas era consumada às custas das economias atrasadas. Em seus diversos escritos, esses autores enfatizam a subordinação da industrialização a interesses de empresas multinacionais e a crescente integração global do capital e afirmam que o subdesenvolvimento não poderia ser erradicado com políticas corretivas ou com mais investimento. A outra vertente formula-se em torno do livro Dependência e desenvolvimento na América Latina: ensaio de interpretação sociológica (1969), de Fernando Henrique Cardoso e Enzo Faletto, com a tese do desenvolvimento associado dependente, que sublinha a importância das relações estabelecidas entre os grupos dirigentes locais e as potências centrais e identifica essas conexões com diferentes situações de dependência na associação entre grupos dominantes nacionais e estrangeiros.

Uma preocupação central que permeia a Geografia é o desenvolvimento desigual entre os países e mesmo entre regiões de um mesmo país. Nesse sentido, as diferentes perspectivas mencionadas acima estão presentes nas discussões da disciplina com diferentes ênfases, matizes e críticas.

Milton Santos é um autor muito interessado nesse debate desde a década de 1960, quando publica vários artigos e livros sobre a urbanização nos países subdesenvolvidos analisando características comuns ou diferenças entre grandes cidades. Sua obra de maior destaque na época foi o livro O espaço dividido: os dois circuitos da economia urbana dos países subdesenvolvidos (1975), onde analisa a organização do espaço desigual e seletiva que a modernização capitalista provoca no Terceiro Mundo. Santos critica a teoria dos polos de crescimento, como outras teorias espaciais, porque consideram apenas o circuito superior da economia ao acreditar que só a modernização, pelo estabelecimento de indústrias de ponta, é capaz de estimular o crescimento; contrariamente, essas teorias consideram o circuito inferior como um freio ao crescimento econômico, desconhecendo que ele, na realidade, é um resultado da modernização tecnológica. Em suas palavras, “o crescimento econômico e o desenvolvimento do circuito inferior da economia ocorrem de maneira paralela. Portanto, o crescimento não aparece como o processo capaz de eliminar a pobreza” (Santos, 2003SANTOS, M. Economia espacial: críticas e alternativas. 2. ed. São Paulo: Edusp , 2003[1979].[1979], p. 174). Ao conceber o espaço um componente fundamental da totalidade social e de seu movimento, Santos adota a categoria formação socioespacial para entender as especificidades dos países subdesenvolvidos, e assim questionar a adoção mecânica de modelos e paradigmas ocidentais que pouco conseguem explicar a realidade do Terceiro Mundo.

Neil Smith discute o significado do desenvolvimento desigual sob o capitalismo e sua importância na reestruturação do espaço. O autor procura entender a “Geografia do Capitalismo” em torno do seguinte postulado: “a lógica do desenvolvimento desigual deriva especificamente das tendências opostas, inerentes ao capital, para a diferenciação, mas com a simultânea igualização dos níveis e condições de produção” (Smith, 1988SMITH, N. Desenvolvimento desigual: natureza, capital e a produção de espaço. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil , 1988., p. 19). O capital é investido no ambiente construído, mas, ao mesmo tempo, é retirado e deslocado para outro ponto procurando taxas de lucro mais altas. Ou seja, a imobilização espacial do capital em sua forma material é tão importante quanto sua circulação constante. Essa dialética da diferenciação e igualação permite explicar as escalas espaciais, produzidas pelo capital - a escala global, a escala da nação-Estado, a escala urbana. Há um diálogo muito próximo de Smith com David Harvey,37 37 Smith dialoga sobretudo com as ideias de Harvey em The limits to capital, cuja primeira edição se publica em 1982, mas que só circulou no Brasil 2013, quando foi traduzida ao português. seu professor, autor muito lido na Geografia Econômica, que formula a teoria do desenvolvimento geograficamente desigual, com numerosas publicações discutindo o movimento da acumulação do capital e a forma como se processa em sua expressão espacial.

Um autor importante da geografia crítica brasileira que discute o tema do desenvolvimento é Armem Mamigonian, professor estudioso das relações entre Geografia e Marxismo. Seu entendimento da formação econômica e social brasileira está ancorado sobretudo na proposta de Ignácio Rangel, economista que trata dos ciclos econômicos no capitalismo e as especificidades no Brasil, com algumas discrepâncias em relação às formulações cepalinas e dependentistas. Entre seus principais apontamentos, destaca-se a discussão sobre a inserção dinâmica do Brasil no ciclo longo mundial, conforme definição de Kondratieff, crescendo nas fases expansivas pela inserção na divisão internacional do trabalho e também nas fases depressivas, pela substituição de importações, logrando diminuir a distância do centro do sistema capitalista. Com diferentes estratégias, como a utilização das capacidades ociosas, o Brasil conseguiu construir um edifício industrial completo. A análise também considera os pactos de poder que respaldavam cada momento do processo histórico (Mamigonian, 2000MAMIGONIAN, A. Teorias sobre a industrialização brasileira. Cadernos Geográficos, Florianópolis, v. II, n. 2, 2000., 2019MAMIGONIAN, A. Visão geográfica do Brasil atual: Estado, crises e desenvolvimento regional. Revista Latino-Americana de Geografia Econômica e Social, Foz do Iguaçu, v. 1, n. 1, p. 7-44, 2019.Disponível em: https://revistas.unila.edu.br/geocon/article/view/2124/1884 . Acesso em: 9 mar. 2022.
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).

Uma das leituras mais difundidas sobre a transformação político-econômica do capitalismo do final do século XX é a do livro A condição pós-moderna: uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural de David Harvey (1992HARVEY, D. Condição pós-moderna: uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural. São Paulo: Loyola, 1992[1989].[1989]), onde analisa a transição do fordismo para a acumulação flexível, esta última apoiada na flexibilidade dos processos de trabalho, dos mercados de trabalho, dos produtos e padrões de consumo. Segundo o autor, essa nova acumulação capitalista gera mudanças nos padrões de desenvolvimento desigual, tanto em setores da produção quanto em regiões geográficas. Por sua vez, em Economia, espaço e globalização, Georges Benko (1996BENKO, G. Economia, espaço e globalização na aurora do século XXI. São Paulo: Hucitec, 1996.) apresenta as formulações da escola da regulação, discute a crise do fordismo, estuda a relação entre indústrias de alta tecnologia e desenvolvimento regional e menciona o desenvolvimento local vinculado à descentralização dos níveis de decisão política, econômica e financeira.

Na década de 1990, o discurso do desenvolvimento sustentável foi amplamente difundido a partir da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro em 1992, que, entre outros resultados, estabeleceu uma agenda comum entre os países signatários intitulada Agenda 21.38 38 Os primeiros interesses teóricos e políticos em tratar da chamada questão ambiental do processo de desenvolvimento emergem ainda na década de 1960, quando a obra Primavera silenciosa (1962), de Rachel Carson, e depois o relatório do Clube de Roma (1972), intitulado Os limites do crescimento, levaram ao primeiro grande debate internacional sobre questões ambientais, escassez dos recursos e limites do desenvolvimento econômico e social, reunindo vários chefes de Estado na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, em Estocolmo, em 1972. O Relatório Brundtland, intitulado Nosso futuro comum, publicado em 1987 pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento das Nações Unidas, divulgou pela primeira vez a expressão “desenvolvimento sustentável” como sendo aquele que atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem a suas próprias necessidades. Nem sempre há um consenso a respeito do termo; seu conteúdo varia conforme os agentes que o aplicam. Para alguns setores do movimento ambientalista, representa uma proteção do “verde” sem considerar os aspectos da realidade social e econômica envolvida. Para as empresas, significa a garantia da manutenção de suas altas taxas de lucro, baseadas principalmente na criação e venda de uma série de novas invenções contra a poluição ou a degradação ambiental. E, para alguns governos, o termo está muitas vezes ligado ao pedido de empréstimos internacionais junto a organismos financeiros. Assim, o termo é frequentemente utilizado apenas como um adjetivo a mais, carente de um sentido conceitual ou praxeológico, em que as contradições se expressam nos dissensos, na falta de rigor do discurso, que se adapta e adota sentidos diferentes em relação aos interesses ou às necessidades de cada agente (Diegues, 2003DIEGUES, A. C. S. Sociedades e comunidades sustentáveis. São Paulo: USP/Nupaub, 2003.; Leff, 2006LEFF, E. Racionalidade ambiental: a reapropriação social da Natureza. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2006.). Santos (2005SANTOS, M. A questão do meio ambiente: desafios para a construção de uma perspectiva transdisciplinar. Geotextos, v. 1, n. 1, p. 139-151, 2005[1994]. doi: https://doi.org/10.9771/1984-5537geo.v1i1.3033.
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[1994]) observa que a mídia se tornou o veículo de grandes campanhas envolvendo o financiamento de agências internacionais que atuam retraindo crédito para projetos, impondo uma agenda internacional ao definir o que deve ser discutido, excluindo outros temas essenciais. Bertha Becker (2000BECKER, B. A geopolítica na virada do milênio: logística e desenvolvimento sustentável. In: CASTRO, I. E.; GOMES, P. C. C.; CORRÊA, R. L. (Org.). Geografia: conceitos e temas. 2. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2000. p. 271-307.) entende que o desenvolvimento sustentável e a influência ecológica emergem como uma proposta de cooperação internacional, portanto, uma feição específica e um novo parâmetro da geopolítica mundial contemporânea. Para a autora, o desenvolvimento sustentável revelaria um processo de revalorização da dimensão política do espaço, bem como dos conflitos existentes em várias escalas geográficas.

Considerações finais

A Geografia Econômica experimentou diversas mudanças, que acompanharam as mudanças gerais por que passava a Geografia; assim, sua evolução é coerente com o caminhar da própria ciência. A disciplina está na maioria dos cursos de graduação em Geografia no Brasil - que se expandiram nas últimas décadas em todas as regiões do país - e manifesta a pluralidade de matrizes epistemológicas que caracteriza a ciência geográfica brasileira. Essa diversidade está evidenciada no número de obras e autores mencionados nos programas de curso, que têm as mais distintas origens e orientações filosóficas. Cumpre apontar que nenhum autor ou obra específica é isoladamente majoritária na conformação desses cursos.

O desenvolvimento é um tema destacado no ensino universitário de Geografia Econômica no Brasil. Menos ou mais, os cursos de Geografia Econômica adotam diferentes abordagens de desenvolvimento, desde as clássicas até as mais recentes, que extrapolam a noção de desenvolvimento econômico, como as discussões em torno do desenvolvimento regional, territorial, local, sustentável, estratégico ou endógeno, entre outras. O desenvolvimento desigual é a perspectiva que mais se destaca nos programas de curso analisados.

A pesquisa se debruçou sobre os programas de Geografia Econômica com foco nos conteúdos programáticos anunciados nas unidades temáticas e na bibliografia adotada (autores e obras). Outras possibilidades de investigação que analisem a organização temática e didática das aulas (plano de aula), o perfil dos professores que ministram a disciplina e a percepção dos alunos são caminhos possíveis para melhor compreender o tema do desenvolvimento no ensino universitário. Como incorporar novas abordagens de desenvolvimento nos debates de Geografia Econômica sem abdicar daquelas que acompanharam a evolução da disciplina, continua a ser um desafio às aulas. O conhecimento e a discussão das diversas abordagens por parte de professores e alunos estimulam um ensino plural e comprometido com os desafios da atualidade.

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Editado por

Editor do artigo:

Péter Bagoly-Simó

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Jun 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    28 Fev 2023
  • Aceito
    20 Mar 2023
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