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Sensibilidade fonológica para rima e aliteração em pré-escolares com transtorno fonológico

Resumos

OBJETIVO: Caracterizar o desempenho de um grupo de pré-escolares com transtorno fonológico em tarefas metafonológicas de identificação e produção dos segmentos de rima e aliteração fonológica. MÉTODOS: Participaram 56 pré-escolares de ambos os gêneros, na faixa etária entre 4 e 6 anos de idade, distribuídos em: Grupo Pesquisa, composto por 28 pré-escolares com Transtorno Fonológico; e Grupo de Comparação, composto por 28 pré-escolares com fala normal e sem quaisquer queixas relacionadas à comunicação oral. Foram aplicados: Teste de Linguagem Infantil ABFW - Fonologia; tarefas de identificação e produção de rimas e aliterações, contidas no Teste de Consciência Fonológica: Instrumento de Avaliação Sequencial - CONFIAS. Os dados foram analisados estatisticamente. RESULTADOS: Os pré-escolares com transtorno fonológico mostraram pior desempenho geral de sensibilidade fonológica. Em ambos os grupos, os pré-escolares tiveram mais acertos com o segmento de aliteração e não houve diferença de desempenho entre as tarefas de identificação e produção. No segmento de rima, os pré-escolares apresentaram melhor desempenho na tarefa de identificação. Já no segmento de aliteração, apresentaram melhor desempenho de produção. A produção de rima foi a tarefa mais difícil e a produção de aliteração foi a tarefa mais fácil. CONCLUSÃO: Pré-escolares com transtorno fonológico têm pior desempenho em sensibilidade fonológica do que crianças com fala normal. No entanto, ambos os grupos apresentam melhor desempenho com o segmento de aliteração e não possuem diferenças entre tarefas de identificação e produção.

Distúrbios da fala; Pré-escolar; Transtornos da articulação; Transtornos da linguagem; Linguagem infantil


PURPOSE: To characterize the performance of a group of preschool children with phonological disorder in metaphonological tasks of identification and production of rhyme and alliteration. METHODS: Participants were 56 preschool children of both genders, with ages between 4 years and 0 months and 6 years and 11 months, distributed into: Research Group, comprising 28 preschoolers with phonological disorder, and Comparison Group, comprising 28 preschool children with normal speech and no complaints related to oral communication. The following testes were applied: Child Language Test ABFW - Phonology, tasks of identification and product ion of rhymes and alliteration of the Phonological Awareness Test: Instrument of Sequential Assessment - CONFIAS. Data were statistically analyzed. RESULTS: Preschoolers with phonological disorder had worse overall phonological sensitivity performance. In both groups, children had better scores with the segment of alliteration, and there was no difference in performance between the tasks of identification and production. With rhyme segments, preschoolers showed better performance in the identification task, while with alliteration segments they showed better performance in the production task. Rhyme production was the most difficult task, and alliteration production was the easiest. CONCLUSION: Preschoolers with phonological disorder showed worse performance in phonological sensitivity than children with normal speech. However, both groups showed better performance with the alliteration segment, and showed no differences between identification and production tasks.

Speech disorders; Child; preschool; Articulation disorders; Language disorders; Child language


ARTIGO ORIGINAL ORIGINAL ARTICLE

Sensibilidade fonológica para rima e aliteração em pré-escolares com transtorno fonológico

Phonological sensitivity to rhyme and alliteration in preschoolers with phonological disorder

Ranilde Cristiane Cavalcante CostaI; Thaís Nobre Uchôa SouzaI; Clara Regina Brandão de ÁvilaII

IPrograma de Pós-graduação (Mestrado) em Distúrbios da Comunicação Humana, Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP - São Paulo (SP), Brasil; Faculdade de Fonoaudiologia de Alagoas, Universidade de Ciências da Saúde de Alagoas - UNCISAL - Maceió (AL), Brasil

IIDepartamento de Fonoaudiologia, Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP - São Paulo (SP), Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Ranilde Cristiane Cavalcante Costa R. João Gualberto Pereira do Carmo, 343/1006, Ponta Verde Maceió (AL), Brasil, CEP: 57035-270 E-mail: ranilde@yahoo.com.br

RESUMO

OBJETIVO: Caracterizar o desempenho de um grupo de pré-escolares com transtorno fonológico em tarefas metafonológicas de identificação e produção dos segmentos de rima e aliteração fonológica.

MÉTODOS: Participaram 56 pré-escolares de ambos os gêneros, na faixa etária entre 4 e 6 anos de idade, distribuídos em: Grupo Pesquisa, composto por 28 pré-escolares com Transtorno Fonológico; e Grupo de Comparação, composto por 28 pré-escolares com fala normal e sem quaisquer queixas relacionadas à comunicação oral. Foram aplicados: Teste de Linguagem Infantil ABFW - Fonologia; tarefas de identificação e produção de rimas e aliterações, contidas no Teste de Consciência Fonológica: Instrumento de Avaliação Sequencial - CONFIAS. Os dados foram analisados estatisticamente.

RESULTADOS: Os pré-escolares com transtorno fonológico mostraram pior desempenho geral de sensibilidade fonológica. Em ambos os grupos, os pré-escolares tiveram mais acertos com o segmento de aliteração e não houve diferença de desempenho entre as tarefas de identificação e produção. No segmento de rima, os pré-escolares apresentaram melhor desempenho na tarefa de identificação. Já no segmento de aliteração, apresentaram melhor desempenho de produção. A produção de rima foi a tarefa mais difícil e a produção de aliteração foi a tarefa mais fácil.

CONCLUSÃO: Pré-escolares com transtorno fonológico têm pior desempenho em sensibilidade fonológica do que crianças com fala normal. No entanto, ambos os grupos apresentam melhor desempenho com o segmento de aliteração e não possuem diferenças entre tarefas de identificação e produção.

Descritores: Distúrbios da fala, Pré-escolar, Transtornos da articulação, Transtornos da linguagem, Linguagem infantil

ABSTRACT

PURPOSE: To characterize the performance of a group of preschool children with phonological disorder in metaphonological tasks of identification and production of rhyme and alliteration.

METHODS: Participants were 56 preschool children of both genders, with ages between 4 years and 0 months and 6 years and 11 months, distributed into: Research Group, comprising 28 preschoolers with phonological disorder, and Comparison Group, comprising 28 preschool children with normal speech and no complaints related to oral communication. The following testes were applied: Child Language Test ABFW - Phonology, tasks of identification and product ion of rhymes and alliteration of the Phonological Awareness Test: Instrument of Sequential Assessment - CONFIAS. Data were statistically analyzed.

RESULTS: Preschoolers with phonological disorder had worse overall phonological sensitivity performance. In both groups, children had better scores with the segment of alliteration, and there was no difference in performance between the tasks of identification and production. With rhyme segments, preschoolers showed better performance in the identification task, while with alliteration segments they showed better performance in the production task. Rhyme production was the most difficult task, and alliteration production was the easiest.

CONCLUSION: Preschoolers with phonological disorder showed worse performance in phonological sensitivity than children with normal speech. However, both groups showed better performance with the alliteration segment, and showed no differences between identification and production tasks.

Keywords: Speech disorders, Child, preschool, Articulation disorders, Language disorders, Child language

INTRODUÇÃO

Os diferentes estágios de aquisição e desenvolvimento da linguagem apresentam capacidades perceptivas que concorrem para a identificação de padrões da língua à qual a criança está exposta. Caracterizam-se pela sensibilidade às informações pertinentes, como à distribuição dos segmentos de fala(1). Pode-se, portanto, supor que desde as fases mais precoces do desenvolvimento da linguagem, a criança esteja sensível a pistas acústicas fornecidas pela vogal tônica da palavra (ou, do núcleo da sílaba tônica, no caso da rima) e às características das sílabas e fonemas que iniciam as palavras. Da mesma forma que auxilia a identificação dos vocábulos na fala encadeada e direciona as aquisições fonológicas, poucos anos depois essa sensibilidade permite, em níveis cada vez mais conscientes, a identificação de segmentos da fala.

Nota-se que nas fases iniciais de desenvolvimento ainda não são observadas as condições metacognitivas de subtrair, adicionar, transpor, identificar sílabas ou fonemas, como determinam as demandas mais próximas à época da alfabetização. Durante os anos pré-escolares e no início da alfabetização, as crianças aperfeiçoam a capacidade de prestar atenção às palavras faladas e analisá-las em seus diversos segmentos(2). A habilidade de manipular conscientemente os segmentos da fala encadeada tem sido amplamente investigada e admitida como o conhecimento metalinguístico que as crianças detêm sobre os níveis silábicos, intrassilábicos e fonêmicos das palavras. A maior parte das pesquisas denomina tal habilidade como consciência fonológica(2-12).

Alguns estudos têm investigado as habilidades de consciência fonológica em crianças com Transtorno Fonológico. Fundamentam-se na hipótese de que a alteração fonológica pode advir de déficits de organização e representação dos sons da fala, que podem influenciar o desempenho de tarefas de manipulação consciente dos sons(7,9,13-15). As pesquisas que analisaram a consciência fonológica em crianças com Transtorno Fonológico, de fato, encontraram desempenho metafonológico inferior quando estas foram comparadas a seus pares com desenvolvimento típico de fala(3,4,6-9,12,14).

Entretanto, pouco se sabe sobre como as crianças com Transtorno Fonológico chegam a desenvolver a capacidade de manipular os sons da fala se, ao longo do seu desenvolvimento, não lograram alcançar as regras fonológicas esperadas para cada idade. Embora não sejam numerosas, algumas pesquisas buscaram entender como ocorre o desenvolvimento das habilidades iniciais de consciência fonológica em crianças com Transtorno Fonológico, investigando especificamente seus desempenhos em tarefas com rimas e aliterações(14,16).

Nesta pesquisa, entendeu-se por sensibilidade fonológica a capacidade de identificar e manipular segmentos sonoros de maior extensão ou de início do vocábulo. Ambas as tarefas prescindem do domínio de habilidades metafonológicas de identificação de segmentos menores e intrassilábicos(17). Investigou-se a sensibilidade à rima entre as palavras (ritmo) e às similaridades (ou diferenças) de início do vocábulo. Além disso, como o desempenho da sensibilidade fonológica pode variar em função do tipo de tarefa, por diferir em suas exigências linguístico-cognitivas e perceptivas(18), as atividades propostas neste estudo (de identificação e produção) também foram analisadas segundo os segmentos de rima e aliteração.

O estudo da sensibilidade fonológica em pré-escolares com Transtorno Fonológico justifica-se ao considerarmos que: (1) a sensibilidade fonológica é preditora das capacidades metafonológicas em nível fonêmico, que, por sua vez, são importantes para o processo de alfabetização; (2) a alteração fonológica, ainda presente nesta fase, também pode influenciar negativamente este processo.

Assim, a presente pesquisa teve o objetivo de caracterizar o desempenho de um grupo de pré-escolares com Transtorno Fonológico, em tarefas metafonológicas de identificação e produção dos segmentos de rima e aliteração fonológica.

MÉTODOS

A pesquisa foi aprovada pelos Comitês de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas (UNCISAL), sob número 718/07, e da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), sob número 0300/09. Trata-se de estudo observacional, transversal, desenvolvido na Unidade de Tratamento em Fonoaudiologia Professor Jurandir Bóia Rocha (UTFONO), da Faculdade de Fonoaudiologia de Alagoas da UNCISAL e na escola municipal de educação infantil Escola Parque Monsenhor Luiz Barbosa.

Foram avaliados 56 pré-escolares, 32 meninos e 24 meninas, na faixa etária entre 4 anos e 0 mês e 6 anos e 11 meses, matriculados em escolas de educação infantil da rede pública de Alagoas. As crianças foram divididas em dois grupos: Grupo Pesquisa (GP), composto por 28 pré-escolares com Transtorno Fonológico; e Grupo de Comparação (GC), composto por 28 pré-escolares com fala normal e sem quaisquer queixas relacionadas à comunicação oral, pareados com os pré-escolares do GP, na proporção de 1:1, pelas variáveis idade e gênero. Os grupos eram semelhantes em relação à escolaridade.

Apesar de não ter sido utilizada como variável de estudo, para melhor caracterização da amostra, a gravidade do Transtorno Fonológico foi calculada, por meio do Percentual de Consoantes Corretas - PCC(19) e mostrou variação do grau leve ao severo.

Para a composição do GP, foram estabelecidos como critérios de inclusão: pertencer à faixa etária entre 4 anos e 0 mês e 6 anos e 11 meses; frequentar escola de educação infantil; apresentar audição normal para fala; ter desenvolvimento global, inclusive de linguagem, sem alterações; possuir normalidade de órgãos fonoarticulatórios; apresentar Transtorno Fonológico. Para a composição do GC, foram seguidos os mesmos critérios de inclusão propostos para o GP, com exceção da apresentação do Transtorno Fonológico. Foram estabelecidos os seguintes critérios de exclusão, para ambos os grupos: estar frequentando ou já ter passado por intervenção fonoaudiológica anterior; não ter o consentimento dos pais e/ou responsáveis para a participação na pesquisa.

Todas as avaliações foram realizadas individualmente e em sala silenciosa. As avaliações do GP foram realizadas na UTFONO e as do GC foram realizadas na escola. A disposição e o ritmo de desempenho dos pré-escolares foram respeitados.

Para garantir os critérios de inclusão, os 56 pré-escolares participaram do processo de seleção da amostra que constou de preenchimento do Formulário de Coleta de Dados, triagem do desenvolvimento por meio da utilização da Escala de Desenvolvimento Infantil - Denver I, e avaliação audiológica. Apenas os pré-escolares do GP foram submetidos à avaliação estrutural e funcional do Sistema Motor Oral (SMO), com exame otorrinolaringológico. Para identificar as alterações de fala, os pré-escolares foram submetidos à avaliação fonológica, realizada por meio das provas de Nomeação e Imitação do Teste de Linguagem Infantil ABFW - Fonologia(20).

A avaliação da sensibilidade fonológica foi realizada por meio de aplicação das tarefas de identificação e produção de rimas e aliterações contidas no Teste "Consciência fonológica: instrumento de avaliação sequencial - CONFIAS"(21). As seguintes tarefas foram selecionadas: identificação de sílaba inicial (ISI), produção de palavra que inicia com a mesma sílaba (PSI), identificação de rima (IR) e produção de rima (PR). Estas tarefas possibilitaram a observação do desempenho dos pré-escolares em relação ao segmento testado (aliteração ou rima) e à tarefa exigida (identificação e produção). A análise da sensibilidade fonológica foi feita pelo somatório das quatro tarefas. A análise da rima foi feita pelo somatório das atividades de identificação de rima (IR) e produção de rima (PR); a análise da aliteração feita pelo somatório das tarefas de identificação de sílaba inicial (ISI) e produção de palavra que iniciasse com a mesma sílaba (PSI); a análise de identificação feita pelo somatório das tarefas de identificação de rima (IR) e identificação de sílaba inicial (ISI); a análise da produção feita pelo somatório das tarefas de produção de rima (PR) e produção de palavra que iniciasse com a mesma sílaba (PSI).

A análise estatística foi realizada com Statistical Package for Social Sciences (SPSS) versão 16.0. Para a comparação da sensibilidade fonológica entre os grupos foi usado o teste de Mann-Whitney U. Aplicou-se o teste não-paramétrico de Wilcoxon para a comparação intragrupo do segmento testado (rima e aliteração) e da tarefa exigida (identificação e produção), em ambos os grupos. Os valores foram considerados significativos para p menor que 0,05 (p<0,05), com intervalo de confiança de 95%. O valor do erro beta admitido foi de 0,01. Os resultados serão apresentados por meio de tabelas e os valores de alfa serão apresentados com até quatro casas decimais.

RESULTADOS

Em ambos os grupos, os pré-escolares apresentaram melhor desempenho com o segmento de aliteração do que com o de rima (Tabela 1). Em relação à tarefa exigida, não houve diferença entre identificação e produção em nenhum dos grupos (GP e GC).

Houve diferença entre o GP e o GC quando foram comparados os desempenhos nas tarefas de identificação e produção, tanto em relação à rima quanto à aliteração (Tabela 2). Em ambos os grupos, no segmento de rima, os pré-escolares apresentaram melhor desempenho na tarefa de identificação. Já no segmento de aliteração, os pré-escolares do GP e GC apresentaram melhor desempenho na produção.

Houve diferença entre a produção de rima e a produção de aliteração, tanto no GP quanto no GC. No entanto, as tarefas de identificação foram semelhantes em ambos os grupos (Tabela 3).

Foi realizada a comparação de desempenhos entre os grupos nas tarefas que avaliaram a sensibilidade fonológica, quanto ao segmento testado e à tarefa exigida. A análise mostrou que não houve diferença entre o GP e o GC (Tabela 4).

A análise dos resultados de sensibilidade fonológica mostrou que houve diferença quando se comparou GP com GC, com melhor desempenho do GC (Tabela 5).

DISCUSSÃO

A análise comparativa intragrupo das respostas obtidas, por tarefa (identificação e produção) e por segmento de fala mostrou que, independentemente da tarefa cognitiva, ambos os grupos apresentaram maior facilidade em atividades que envolveram aliteração. Pesquisas anteriores, com crianças sem alteração de fala, também relataram maior facilidade com segmentos iniciais da fala do que com os de rima(2,5,10,14,22,23). Tais resultados indicam também que a percepção desses segmentos ocorreu de forma semelhante em pré-escolares com e sem Transtorno Fonológico. Esses dados confirmam os resultados de outros estudos realizados com crianças com Transtorno Fonológico(3,6).

O melhor desempenho para a aliteração pode estar associado às atividades escolares que costumam priorizar, no processo de aquisição da escrita, tarefas que envolvam o reconhecimento do som e da letra inicial das palavras. Pré-escolares são estimulados a recordar palavras que começam com determinado som ou sílaba, bem como a identificar o som e letra iniciais do seu próprio nome, de seus amigos, familiares e objetos. Apesar de atividades com rimas estarem presentes no contexto educacional e social infantil, por meio de músicas, poemas e parlendas, talvez não haja uma atenção da criança no que se refere às semelhanças e diferenças do segmento final das palavras. Tal fato poderia explicar os resultados desta e das demais pesquisas.

Era esperado que as atividades de identificação fossem mais fáceis que as de produção, pois estas últimas são mais complexas e exigem outros processos linguístico-cognitivos, como o acesso lexical, além da amplitude do vocabulário. Tanto GP quanto GC mostraram diferenças de resultados quando comparados os tipos de tarefa. Não foram encontrados estudos em crianças com Transtorno Fonológico para comparar esse resultado. Entretanto, em crianças sem alteração de fala, observou-se maior facilidade em realizar tarefas que envolvessem a identificação, quando os resultados foram comparados com os obtidos em tarefas de produção(5).

Por outro lado, quando foram comparadas, intragrupo, as tarefas de identificação e produção a partir dos segmentos, os resultados mostraram diferença nos dois grupos de pré-escolares. Em relação à rima, as crianças obtiveram melhor desempenho ao identificá-la do que ao produzí-la. Já para o segmento de aliteração, obtiveram melhor desempenho ao produzir do que ao identificar a sílaba inicial. Conforme discutido no parágrafo anterior, esperava-se que as tarefas de identificação produzissem mais acertos que as tarefas de produção, como ocorrido no segmento de rima. O melhor desempenho na identificação de rima pode estar diretamente associado ao fato dela conter maior saliência acústica na palavra, uma vez que envolve necessariamente o núcleo da sílaba tônica.

A extensão do segmento é outro aspecto que pode ter contribuído para o melhor desempenho da tarefa de identificação de rima. No teste usado para esta pesquisa, as rimas a serem identificadas englobam, em sua maioria, mais do que uma sílaba. Já na aliteração, o segmento a ser identificado é composto apenas por uma sílaba. Já na aliteração, o segmento a ser identificado é composto apenas por uma sílaba. A maioria das palavras utilizadas como estímulo do teste é iniciada por uma sílaba pré-tônica, e não a tônica, a mais saliente e melhor percebida. Assim, o pior desempenho na identificação da aliteração, quando comparado à sua produção, pode, também, ter sido influenciado pelo fato da sílaba a ser analisada não ser a de maior saliência acústica da palavra. Dessa maneira, observa-se que a extensão do segmento a ser analisado e a saliência acústica desse segmento são aspectos importantes a serem considerados quando se investiga a sensibilidade fonológica, devendo também ser considerados durante a intervenção terapêutica.

Também foi possível observar que o GP e o GC identificaram rima e aliteração de forma semelhante. Entretanto, a análise realizada quanto à tarefa de produção mostrou que foi mais fácil para ambos os grupos produzir ou evocar palavras de mesmo início de um dado modelo (aliteração) do que palavras terminadas com o mesmo som do modelo (que rimassem). Foi possível observar que a produção de aliteração foi mais fácil, contrapondo-se à produção da rima. Esses resultados corroboram estudos anteriores realizados com crianças com Transtorno Fonológico(6)e sem alteração de fala(24). Essa diferença entre a produção de aliteração e rima pode estar relacionada à maneira como o léxico mental é acessado. Esse acesso parece ser mais facilmente realizado pelo segmento inicial da palavra quando comparado ao segmento final.

Os resultados desta pesquisa mostraram que o tipo de tarefa influenciou o desempenho dos pré-escolares, evidenciando que a sensibilidade fonológica pode variar em função do tipo de tarefa exigida e do segmento analisado. Assim, a combinação entre o segmento e a tarefa pode determinar diferenças no desempenho. De fato, a literatura aponta que diferentes tarefas requerem maior ou menor exigência para sua realização(18,25).

A análise intergrupo por segmento e por tarefa não evidenciou diferença entre GP e GC. Esse resultado pode sugerir que o desenvolvimento da sensibilidade à rima e à aliteração ocorre independentemente do Transtorno Fonológico. Assim, os resultados desta pesquisa sugerem que as tarefas de sensibilidade fonológica executadas com segmentos de rima e aliteração seguem semelhante percurso de desenvolvimento em pré-escolares com e sem Transtorno Fonológico. Na amostra estudada, esse percurso independeu da presença ou ausência de alteração de fala e mostrou que as habilidades de sensibilidade fonológica em pré-escolares com alteração de fala parecem se desenvolver de modo organizado e semelhante ao evidenciado normalmente(6).

Embora os dois grupos tenham apresentado desenvolvimento semelhante para todas as análises realizadas, a comparação da média geral de acertos em todas as tarefas de sensibilidade fonológica, para os segmentos de rima e aliteração, mostrou melhor desempenho do GC. Pode-se supor que apesar do desenvolvimento ocorrer de forma semelhante ao longo das idades, os pré-escolares com Transtorno Fonológico podem apresentar pior desempenho geral de sensibilidade fonológica. Este resultado corrobora estudos anteriores que demonstraram dificuldades de indivíduos com Transtorno Fonológico para lidar com os segmentos de rima e aliteração(14,16). Entretanto, tais resultados podem também sugerir que, apesar de pior desempenho, a semelhança de padrão de desenvolvimento mostra que a estimulação para a adequada reestruturação do sistema fonológico pode eliminar a diferença encontrada.

O pior desempenho dos pré-escolares com Transtorno Fonológico na sensibilidade fonológica pode estar associado à dificuldade que o transtorno determina na organização e na representação mental dos sons da fala(7,9,13-15). Assim, a imprecisão das representações fonológicas pode ter influenciado o desempenho dos pré-escolares. Esse estudo evidenciou que a dificuldade em manipular conscientemente os sons pode estar presente desde a percepção dos segmentos maiores, como os de rima e aliteração. Estas são habilidades que se desenvolvem precocemente e, em alguma proporção, independem da instrução formal(2).

A análise detalhada dos resultados de sensibilidade fonológica foi determinante para se identificar, entre os grupos, semelhanças no que se refere ao percurso de desenvolvimento da sensibilidade fonológica e diferença em relação à média geral do seu desempenho. Merece referência a necessidade de ampliação do grupo estudado, tanto de pré-escolares com Transtorno Fonológico, quanto em outras populações, para confirmar os resultados obtidos.

CONCLUSÃO

De um modo geral, o grupo de pré-escolares com Transtorno Fonológico mostra baixo desempenho em tarefas de sensibilidade fonológica com rimas e aliterações. No entanto, mostram melhores respostas ao produzir ou identificar palavras a partir de seus segmentos iniciais do que dos de rima. Assim como o grupo sem alterações de fala, não mostram diferenças entre tarefas de identificação e produção de palavras, independentemente do segmento fornecido.

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Recebido em: 9/2/2011

Aceito em: 5/5/2011

Trabalho realizado na Faculdade de Fonoaudiologia de Alagoas, Universidade de Ciências da Saúde de Alagoas - UNCISAL - Maceió (AL) e na Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP - São Paulo (SP), Brasil.

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  • Endereço para correspondência:

    Ranilde Cristiane Cavalcante Costa
    R. João Gualberto Pereira do Carmo, 343/1006, Ponta Verde
    Maceió (AL), Brasil, CEP: 57035-270
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      25 Jul 2011
    • Data do Fascículo
      2011

    Histórico

    • Recebido
      09 Fev 2011
    • Aceito
      05 Maio 2011
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