Acessibilidade / Reportar erro

PRECIPITAÇÃO E CICLAGEM DE NUTRIENTES EM ECOSSISTEMAS FLORESTAIS

INTRODUÇÃO

Conforme salientado por Pritchett (1979)PRITCHETT, W. L. Properties and Management of Forest Soils. John Wiley & Sons. New York. 1979. 500p., o interesse científico pelo estudo dos solos florestais como componentes de ecossistemas é relativamente recente, tendo se intensificado na medida em que o cultivo de espécies arbóreas passou a assumir maior importância econômica. De fato, o uso de práticas de manejo intensivo nas grandes áreas de reflorestamento introduz alterações em algumas propriedades do solo, as quais repercutem sobre questões fundamentais como as de fertilidade e da produtividade.

A utilização de espécies exóticas, o adensamento de plantios, as técnicas de preparo do solo e a exploração com máquinas pesadas, são algumas das técnicas silviculturais e de exploração florestal que podem causar redução no capital de nutrientes de um ecossistema, comprometendo assim a produtividade contínua pa área.

O solo de um ecossistema florestal apresenta algumas características que o diferenciam significativamente daqueles sob outras formas de cobertura vegetal. Dentre estas, a cobertura florestal e a subsequente camada de folhas caídas e outros materiais orgânicos que cobrem sua superfície, destacam-se pelo fato de criarem condições para o desenvolvimento de microclimas e diversidade de microrganismos diferentes daqueles associados com outros solos. Neste sistema, desenvolvem-se processos naturais como a ciclagem de nutrientes, os quais desempenham-se também de forma peculiar.

A ciclagem de nutrientes em um ecossistema florestal é um processo dinâmico e contínuo, envolvendo transformações químicas, geológicas e biológicas através das quais a matéria orgânica do solo e sua reserva de nutrientes são supridas e mantidas. O ciclo não é fechado; nutrientes são adicionados ou perdidos no ecossistema. Nutrientes obtidos da atmosfera, ou fixados biologicamente, ou ainda liberados pelo processo de intemperismo, são agregados ao sistema. Perdas no ciclo ocorrem por lixiviação, volatização e processos similares. A necessidade de se alcançar um certo nível de equilíbrio nesta troca contínua é que torna importante o conhecimento das características do ciclo para o manejo de solos florestais.

Dentro deste prisma, o presente trabalho procura rever algumas questões relativas aos meios através dos quais ocorrem ganhos e retornos de nutrientes no processo de ciclagem, com ênfase no papel de precipitação quanto à este aspecto. Procura-se também discutir possíveis implicações de manejo e conservação decorrentes das observações da revisão.

CICLAGEM DE NUTRIENTES EM ECOSSISTEMAS FLORESTAIS

O ciclo de nutrientes, numa concepção simples, pode ser entendido como o processo de troca continua de elementos nutricionais entre os componentes vivos e não vivos de um ecossistema (Foth, 1978FOTH, D.H. Fundamentals of Soil Science. John Wiley & Sons. New York. 1978. 436p.). A interdependência entre componentes, característica fundamental de qualquer sistema, é bastante evidente neste processo. A nutrição mineral básica da cobertura vegetal é suprida pela intemperização dos minerais do solo, enquanto que o solo é constantemente modificado pela ação dos compostos orgânicos da vegetação. Por outro lado, microrganismos desempenham um papel relevante na transformação bioquímica de compostos orgânicos, permitindo assim a assimilação de nutrientes pelas raízes das árvores. Todos estes componentes, em interação com a planta e o meio ambiente, respondem pela continuidade do fluxo de nutrientes no ecossistema.

No estudo do processo de transferência de nutrientes entre componentes de um ecossistema florestal, é conveniente a adoção da classificação de Switzer e Nelson (1972)SWITZER, G. L. and NELSON, L.E. Nutrient Accumulation and Cycling in Loblolly pine (Pinus taeda L.) Plantation Ecosystems: The First Twenty Years. Soil Sci. Soc. Am. J. 36: 143-147. 1972., que definem o ecossistema em termos de ciclo geoquímico, ciclo biogeoquímico e ciclo bioquímico. O ciclo geoquímico refere-se à entrada e saída de nutrientes do ecossistema, enquanto que o ciclo biogeoquímico relaciona-se às trocas de nutrientes entre a planta e o solo. Por último, o ciclo bioquímico diz respeito à transferência de nutrientes no próprio interior da biomassa.

Para os objetivos deste trabalho será dada ênfase a alguns aspectos de ciclagem geoquímica de nutrientes. Os ganhos neste ciclo incluem fontes como a precipitação, a fertilização artificial, a fixação biológica de nitrôgenlo e a intemperização da rocha mãe. Por outro lado, as perdas ocorrem com o abate das árvores, por meio de erosão e lixiviação, por enxurrada, e por volatização.

A quantidade de nutrientes perdida ou ganha num ecossistema em um certo período de tempo sofre a influência de fatores como as condições climáticas, as propriedades do solo, tipo de cobertura e fatores locais específicos, como a proximidade de áreas industriais ou do mar (Pritchett, 1979PRITCHETT, W. L. Properties and Management of Forest Soils. John Wiley & Sons. New York. 1979. 500p.). Estes fluxos possuem uma tendência natural ao equilíbrio de uma floresta madura.

Dentre os meio através dos quais ocorrem ganhos e retornos de nutrientes num ecossistema florestal, a precipitação destaca-se por sua grande importância relativa (Peterson e Rolfe, 1982PETERSON, D.L. and ROLFE, G, L. Precipitation Components as Nutrient Pathways in Floodplain and Upland Forests of Central Illinois. Forest Sci 28(2): 321-332. 1982.; Bemhard-Reversat, 1975BERNHARD-REVERSAT, F. Nutrients in Throughfall an Their Quantitative Importance in Rain Forest Mineral Cycles. In: GOLLEY, F.B. and MEDINA, E. Tropical Ecological Systems: Trends in Terrestrial and Aquatic Research. Springer-Verlag. Berlin - New York. 153-159. 1975.). Tanto através do carreamento direto de nutrientes para o solo, como através da lavagem da copa e do escoamento pelo tronco, quantidades expressivas de elementos são levados para a superficie da floresta. Will (1959)WILL, G. M, Nutrient Return in Litter and Rainfall under some Exotic Conifer Stands in New Zealand. N.Z.J. Agric. Res. 2(4) 719-734. 1959., estudando a ciclagem de nutrientes em plantações de coníferas na Nova Zelândia, constatou que quantidades duas vezes maiores de potássio e pelo menos iguais de fósforo eram retornadas pela precipitação quando comparada com a decomposição da manta. No Brasil, Lima (1979)LIMA, W.P. Alteração do pH, Condutividade e das Concentrações de Ca, Mg, e P da Água da Chuva em Floresta de Pinus caribaea Morelet var caribaea. IPEF, Piracicaba 18: 37-54. 1979. observou arraste de 18,1 Kg/ha de Ca e 11,5 Kg/ha de Mg num período de 15 meses em área de Pinus caribaea Morelet var. caribaea, devido à incidência da chuva local. Nye (1961)NYE, P.H. Organic Matter and Nutrient Cycles under Moist Tropical Forest. Plant and Soil. 13(4): 333-346. 1961., investigando a ciclagem de elementos em uma floresta tropical de Ghana, também observou uma maior importância relativa da água da chuva no ganho de K, P e Mg comparativamente à decomposição da manta.

O reconhecimento do papel da precipitação na ciclagem de nutriente não é recente, embora sejam relativamente recentes os estudos que demonstram uma preocupação com aspectos como a qualidade e a composição química da água de escoamento (fluxo através do caule) e da lavagem (fluxo através da copa). Numa recente revisão sobre o papel destes dois fluxos no ciclo de nutrientes em florestas, Parker (1983)PARKER, G.G. Throughfall and Stemflow in the Forest Nutrient Cycle. In: MACFADYEN, A. and FORD, E.D. Advances in Ecological Research 13: 57-133. 1983. chama a atenção para este fato e apresenta uma avaliação das observações e conclusões de aproximadamente 250 publicações sobre o tema. Devido à abrangência e o caráter recente desta revisão, a discussão seguinte nela se baseia, sendo complementada com resultados de algumas outras publicações adicionais.

Fluxo através da Copa

Ao incidir sobre a copa das árvores, a água da chuva ocasiona um processo de lavagem de folhas e galhos que resulta numa substancial alteração na sua qualidade. Elementos presentes nas superfícies lavadas são agregados á água, de modo que a concentração de solutos é aumentada. Este fluxo responde pelo retorno de grandes quantidades de elementos para o solo do ecossistema.

George (1979)GEORGE, M. Nutrient Return by Stemflow, Throughffill and Rainwater in a Eucalyptus Hybrid Plantation. Indian Forester 105(7): 493-499. 1979. mediu o total dos elementos K, Ca, Mg, N e P retomados ao solo através da água de lavagem numa plantação de eucalipto na Índia. As quantidades observadas, em Kg/ha/ano foram 9,40 para K, 8,8 para Ca, 2,0 para Mg, 2,0 para N e 0,1 para P. A concentração de nutrientes na água de lavagem decresceu na ordem de K > Ca > Mg > N > P, enquanto que na água da chuva incidente, a ordem foi Ca > K > Mg > N > P. Outras evidências reunidas por Parker (1983)PARKER, G.G. Throughfall and Stemflow in the Forest Nutrient Cycle. In: MACFADYEN, A. and FORD, E.D. Advances in Ecological Research 13: 57-133. 1983. mostram que, no total, centenas de Kg/ha de nutrientes são retomados ao solo por este fluxo.

A comparação entre a qualidade da água de chuva incidente e a que flui através da copa mostra claramente a magnitude de alteração da qualidade em função da agregação de nutrientes (Quadro 1).

QUADRO 01
Médias ponderadas da concentração de nutrientes na água de chuva incidente e no fluxo através da copa (mg/l)

Os dados reproduzidos no Quadro 1 dizem respeito a diversos tipos de cobertura florestal, o que de certa forma limita a utilização de tais informações para maiores generalizações. Deve ser observado que para cada tipo de floresta a interação da água com a vegetação deverá produzir alterações específicas na composição qualitativa e no arraste de nutrientes. Outros fatores que afetam esta composição incluem o local, a idade do talhão e as espécies que compõem a floresta (Barros, 1979BARROS, N.F. Effects of Eucalyptus on Water Yield and Quality Bol. INPAC. University of Florida. Gainsville, U.S.A. 1979.).

Um dos fatores que afeta mais diretamente a qualidade do fluxo através da copa em relação à quantidade de minerais trazidos da atmosfera e "lavados" das superfícies da árvore é a quantidade de precipitação. Guthrie et al. (1978)GUTHRIE, H.B.; ATTIWILL, P.M. and LEUNING, R. Nutrient Cycling in Eucalyptus obliqua (L’Herit) Forest. II. A Study in a Small Catchment. Aust. J. Bot. 26(2): 189-201. 1978., estudando a ciclagem de nutrientes num povoamento de Eucalyptus obliqua, observaram que existe uma tendência para a ocorrência de concentrações maiores dos nutrientes Ca, Mg, Na e K na água da lavagem em períodos de menor intensidade de precipitação. Esta relação inversa foi também observada para esses nutrientes por Attiwill (1966)ATTIWILL, P.M. The Chemical Composition of Rainwater in Relation to Cycling of Nutrientes in Mature Eucalyptus Florest. Plant and Soil 24(3): 390-406. 1966. em uma floresta madura de Eucalyptus obliqua na Austrália.

Bernhard-Reversal (1975)BERNHARD-REVERSAT, F. Nutrients in Throughfall an Their Quantitative Importance in Rain Forest Mineral Cycles. In: GOLLEY, F.B. and MEDINA, E. Tropical Ecological Systems: Trends in Terrestrial and Aquatic Research. Springer-Verlag. Berlin - New York. 153-159. 1975., analisando a relação entre intensidade de precipitação e o conteúdo de nutrientes da água de lavagem em uma floresta tropical da Costa do Marfim, observou a existência de relações distintas para os quatro elementos avaliados. Para Mg a relação é aparentemente constante; após um certo nível de precipitação não ocorrem aumentos na concentração. Para N e Na, a relação foi positiva, enquanto que para K a relação é inversa. Uma possível explicação para a observação de uma relação positiva no caso de N e Na é a da presença destes elementos em maiores quantidades na água da própria chuya incidente. Portanto, parece mais plausível aceitar-se a hipótese da relação inversa.

Conforme mencionado anteriormente vários outros fatores influenciam a qualidade da água que flui através da copa das árvores. O tipo de floresta evidentemente é um dos mais importantes, conforme sugerido pelos dados do Quadro 2.

QUADRO 2
Comparação entre retorno de nutrientes na água de lavagem para vários tipos de florestas. (Kg/ha/ano)

Embora a comparação direta entre os valores do Quadro 2 seja dificultada pela variedade de climas, latitudes, altitudes, solos, métodos experimentais e outros fatores correlatos, as evidências existentes na literatura deixam pouca dúvida quanto ao efeito da natureza diferencial da copa que intercepta a água da chuva sobre as concentrações e retomo de nutrientes. Parker (1983)PARKER, G.G. Throughfall and Stemflow in the Forest Nutrient Cycle. In: MACFADYEN, A. and FORD, E.D. Advances in Ecological Research 13: 57-133. 1983. cita diversos outros estudos que suportam esta afirmação, indicando inclusive a existência de variabilidade dentro de uma mesma floresta, para árvores individuais.

Fatores relacionados à fertilidade do solo do ecossistema são também relacionados entre aqueles que influem sobre a qualidade da água de lavagem. Jordam et al (1980)JORDAN, C. et al. Nutrient Scavenging of Rainfall by the Canopy of an Amazonian Rain Forest. Biotropica 12: 61-66. 1980., em análise sobre o eido de nutrientes em duas áreas de solos distintos (laterítico e podzólico) da floresta amazônica, obtiveram resultados que sugerem esta relação para Na, K, Mg, NH4 -N, PO4-P, SO4-S. Outras evidências quanto a este aspecto são obtidas da análise de ecossistemas submetidos à fertilização artificial.

Em ecossistemas, onde o capital de nutrientes do solo é aumentado pela fertilização artificial, a quantidade de elementos na água de lavagem aumenta na medida em que aumentam as quantidades de fertilizante aplicado, conforme verificado por Miller et al (1976)MILLER, H. G.; COOPER, J. M. and MILLER, J. D. Effect of Nitrogen Supply on Nutrients in Litter Fall and Crown Leaching in a Stand of Corsican Pine. In: COAKER, TH. and SNAYDON, R. W. The Journal of Appliend Ecology 13(1): 233-248. 1976., para uma floresta de Pinus nigra. Aparentemente a incorporação de nutrientes ao solo ocasiona uma maior concentração de elementos nas folhas das árvores. O aumento da concentração de material nutricional lixiviável na região foliar então explicaria o maior retorno de elementos através da água de lavagem.

Escoamento pelo Tronco

Comparativamente, o fluxo de água da chuva pelo tronco das árvores tende a ter uma menor participação no carreamento do total de elementos para o solo do ecossistema florestal. George (1979)GEORGE, M. Nutrient Return by Stemflow, Throughffill and Rainwater in a Eucalyptus Hybrid Plantation. Indian Forester 105(7): 493-499. 1979., apresenta uma estimativa segundo a qual apenas 8% do total da chuva incidente sobre uma floresta de eucaliptos na Índia escorria através dos troncos de árvores, enquanto que 81% podia ser considerado águade lavagem. Apesar de diferenças na concentração de elementos nos dois fluxos, é claro que o total retornado no segundo tende a ser substancialmente maior.

Segundo Gersper e Holowaychuk (1971)GERSPER, P. L. and HOLOWAYCHUK, N. Some Effects of Stem Flow from Forest Canopy Trees on Chemical Properties of Soil. Ecology 52(4): 691-702. 1971., a percentagem de precipitação que alcança a superficie do solo como água de escoamento varia segundo a espécie de árvores, sendo principalmente relacionada à características de casca. Árvores com cascas lisas e densas usualmente conduzem maiores quantidades de água por escoamento, enquanto que árvores com as cascas ásperas e porosas conduzem menos. Outros fatores como o tamanho e a morfologia da árvore e sua associação com árvores vizinhas também influenciam a quantidade de água de escoamento, de acordo com estes autores.

Parker (1983)PARKER, G.G. Throughfall and Stemflow in the Forest Nutrient Cycle. In: MACFADYEN, A. and FORD, E.D. Advances in Ecological Research 13: 57-133. 1983., estimou que a contribuição do escoamento para o total de nutrientes carreados pela chuva varia entre 1 a 25%, com média em torno de 12%, dependendo de fatores tais como o elemento e o tipo de floresta. No estudo de George (1979)GEORGE, M. Nutrient Return by Stemflow, Throughffill and Rainwater in a Eucalyptus Hybrid Plantation. Indian Forester 105(7): 493-499. 1979., as quantidades de K, Ca, Mg, N e P presentes neste fluxo são respectivamente 21%, 21%, 4%, 5% e 25% do total de elementos carreados pela água da chuva.

Eaton et al. (1973)EATON, J.S.; LIKENS, G.E. and BORMANN, F. H. Throughfall and Stemflow Chemistry in a Northern Hardwood Forest. The Journal of Ecology 61(2): 495-508. 1973., investigando o teor de elementos numa floresta constituída principalmente de espécies de Acer saccharum Marsh., Fagus grandifolia Ehrh e Betula alleghaniensis Britt nos Estados Unidos da América, encontraram percentagens relativas ao total de elementos correspondentes a 10% para K, 8% para Ca, 9% para Mg, 9% para N e 14% para P.

A menor participação relativa no entanto é compensada por uma influência significante do fluxo de água de escoamento pelo tronco nas propriedades químicas do solo, especialmente na região imediatamente vizinha à base do tronco. Gersper e Holowaychuk (1971)GERSPER, P. L. and HOLOWAYCHUK, N. Some Effects of Stem Flow from Forest Canopy Trees on Chemical Properties of Soil. Ecology 52(4): 691-702. 1971. observaram que a concentração de nutrientes no solo de uma área florestal diminuía na proporção em que aumentava a distância da área de solo vizinha ao tronco da árvore. Quanto maiores os fluxos de água de escoamento para uma determinada árvore, mais significativa era a relação constatada neste estudo.

A constatação destes autores é melhor entendida se considerarmos que a água de escoamento tende a apresentar uma maior concentração de nutrientes do que a água de lavagem. Tanto George (1979)GEORGE, M. Nutrient Return by Stemflow, Throughffill and Rainwater in a Eucalyptus Hybrid Plantation. Indian Forester 105(7): 493-499. 1979. como Gersper e Holowaychuk (1971)GERSPER, P. L. and HOLOWAYCHUK, N. Some Effects of Stem Flow from Forest Canopy Trees on Chemical Properties of Soil. Ecology 52(4): 691-702. 1971., e Mina (1967)MINA, V.N. Influence of Stemflow on Soil. Soviet Soil Science 10: 1321-1329. 1967. observaram concentrações maiores na água de escoamento, especialmente para os elementos N, P e K. Na média as diferenças podem chegar até cinco vezes mais N e P. Por outro lado, existem evidências nestes estudos de que a concentração é, a exemplo da água de lavagem, inversamente relacionada ao volume do fluxo de escoamento.

PRECIPITAÇÃO E CICLAGEM: ALGUMAS IMPLICAÇÕES PARA O MANEJO E CONSERVAÇÃO DE SOLOS FLORESTAIS

A planta lenhosa, como qualquer outro vegetal, requer certas quantidades de vários elementos químicos para seu crescimento, desenvolvimento e sobrevivência. Incluem-se entre estes o elementos gasosos (H, O, C), os macronutrientes (Ca, K , Mg, N, P, S) e os micronutrientes (B, Cu, Fe, Mn, Mo, Zn). Para o crescimento em condições ideais, em suprimento balanceado destes elementos é requerido pela árvore, como o é paca qualquer cultura agrícola (Spurr e Barnes, 1973).

O que diferencia a árvore da maior parte das culturas agrícolas neste respeito é a capacidade que possuem as primeiras de encontrar condições favoráveis de crescimento e desenvolvimento em solos com suprimentos relativamente limitados de nutrientes. Em parte, a característica de conservação existente na ciclagem de nutrientes responde por esta característica. Como existe um retorno contínuo de elementos ao solo, poucos são os requerimentos adicionais de nutrientes para a manutenção de produtividade.

Na medida em que o ecossistema não sofre influências externas, o processo de ciclagem se processa normalmente renovando e mantendo as condições de fertilidade do solo. Entretanto, ao se processarem influências externas, como no caso de práticas silviculturais intensivas, existirá sempre o risco do comprometimento do balanço do sistema (Whitehead, 1982WHITEHEAD, D. Ecological Aspects of Natural and Plantation Forests. Forestry Abstracts 43(10): 615-624. 1982.).

Na revisão sobre o papel da precipitação no processo de ciclagem, pôde ser verificado que alterações no ecossistema que venha a reduzir a quantidade dos fluxos de lavagem e o escoamento relativamente à precipitação total, podem trazer sérias consequências para a produtividade do solo do ecossistema. A alteração mais comum neste caso em florestas comerciais é a redução causada pelo abate periódico de árvores.

Segundo Whitehead (1982)WHITEHEAD, D. Ecological Aspects of Natural and Plantation Forests. Forestry Abstracts 43(10): 615-624. 1982., a questão do abate é essencial na avaliação do equilíbrio do ecossistema florestal, sendo fundamentais a acumulação de matéria orgânica e o tratamento criterioso das áreas para o sucesso da manutenção do sistema. Adicionalmente, algum incremento na mineralização das reservas de nutrientes do solo será necessário para o restabelecimento da floresta na área de abate (Pritchett, 1979PRITCHETT, W. L. Properties and Management of Forest Soils. John Wiley & Sons. New York. 1979. 500p.).

Outra implicação interessante é relativa à relação entre fertilização de áreas florestais e seus efeitos sobre o retorno de nutrientes ao solo nos fluxos de água de lavagem e de escoamento. O conhecimento desta relação é importante para a definição de práticas de aplicação de nutrientes em florestas, pois deve-se procurar saber até que ponto o nutriente é "reusado" no ciclo e até que ponto ele sai do sistema ou se torna imobilizado no sistema. Tendo em vista a influência de variáveis como o regime de chuvas e a natureza da floresta sobre o retorno de nutrientes nos fluxos, seria importante que pesquisas fossem desenvolvidas sobre o tema, tanto para as espécies como para as áreas mais utilizadas em atividades florestais intensivas no Brasil.

SUMÁRIO E CONCLUSÕES

Procurou-se discutir nesta breve revisão alguns aspectos relacionados à influência da precipitação na ciclagem de nutrientes em ecossistemas florestais. Foram enfocados especialmente os fatores que influem sobre a qualidade da água de lavagem e de escoamento, assim como a importância destes fluxos no retorno de nutrientes nos solos florestais.

A precipitação exerce um papel fundamental no processo de entrada e retorno de elementos no ecossistema. Tanto através da água de lavagem como através da água de escoamento, centenas de kg/ha/ano de elementos são continuamente agregados aos solos florestais.

A composição destes fluxos é alterada por fatores como a intensidade da chuva, fertilidade da área, tipo de cobertura florestal, idade do talhão, altitude e longitude entre outros. O conhecimento sobre estes fatores é importante para o manejo é conservação de solos, especialmente em áreas sujeitas à perturbações externas, como por exemplo as áreas de reflorestamento.

Na revisão, pode ser observado que praticamente não existe nenhum material na literatura enfocando os assuntos discutidos para as espécies e áreas importantes em atividades de reflorestamento no Brasil. À exceção do trabalho de Lima (1979)LIMA, W.P. Alteração do pH, Condutividade e das Concentrações de Ca, Mg, e P da Água da Chuva em Floresta de Pinus caribaea Morelet var caribaea. IPEF, Piracicaba 18: 37-54. 1979., nenhuma outra publicação foi identificada para o Brasil, o que sugere a necessidade de se promover maior número de pesquisas nesta área no nosso meio.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  • ATTIWILL, P.M. The Chemical Composition of Rainwater in Relation to Cycling of Nutrientes in Mature Eucalyptus Florest. Plant and Soil 24(3): 390-406. 1966.
  • BARROS, N.F. Effects of Eucalyptus on Water Yield and Quality Bol. INPAC. University of Florida. Gainsville, U.S.A. 1979.
  • BERNHARD-REVERSAT, F. Nutrients in Throughfall an Their Quantitative Importance in Rain Forest Mineral Cycles. In: GOLLEY, F.B. and MEDINA, E. Tropical Ecological Systems: Trends in Terrestrial and Aquatic Research. Springer-Verlag. Berlin - New York. 153-159. 1975.
  • EATON, J.S.; LIKENS, G.E. and BORMANN, F. H. Throughfall and Stemflow Chemistry in a Northern Hardwood Forest. The Journal of Ecology 61(2): 495-508. 1973.
  • FOTH, D.H. Fundamentals of Soil Science. John Wiley & Sons. New York. 1978. 436p.
  • GEORGE, M. Nutrient Return by Stemflow, Throughffill and Rainwater in a Eucalyptus Hybrid Plantation. Indian Forester 105(7): 493-499. 1979.
  • GERSPER, P. L. and HOLOWAYCHUK, N. Some Effects of Stem Flow from Forest Canopy Trees on Chemical Properties of Soil. Ecology 52(4): 691-702. 1971.
  • GUTHRIE, H.B.; ATTIWILL, P.M. and LEUNING, R. Nutrient Cycling in Eucalyptus obliqua (L’Herit) Forest. II. A Study in a Small Catchment. Aust. J. Bot. 26(2): 189-201. 1978.
  • JORDAN, C. et al. Nutrient Scavenging of Rainfall by the Canopy of an Amazonian Rain Forest. Biotropica 12: 61-66. 1980.
  • LIMA, W.P. Alteração do pH, Condutividade e das Concentrações de Ca, Mg, e P da Água da Chuva em Floresta de Pinus caribaea Morelet var caribaea IPEF, Piracicaba 18: 37-54. 1979.
  • MILLER, H. G.; COOPER, J. M. and MILLER, J. D. Effect of Nitrogen Supply on Nutrients in Litter Fall and Crown Leaching in a Stand of Corsican Pine. In: COAKER, TH. and SNAYDON, R. W. The Journal of Appliend Ecology 13(1): 233-248. 1976.
  • MINA, V.N. Influence of Stemflow on Soil. Soviet Soil Science 10: 1321-1329. 1967.
  • NYE, P.H. Organic Matter and Nutrient Cycles under Moist Tropical Forest. Plant and Soil. 13(4): 333-346. 1961.
  • PARKER, G.G. Throughfall and Stemflow in the Forest Nutrient Cycle. In: MACFADYEN, A. and FORD, E.D. Advances in Ecological Research 13: 57-133. 1983.
  • PETERSON, D.L. and ROLFE, G, L. Precipitation Components as Nutrient Pathways in Floodplain and Upland Forests of Central Illinois. Forest Sci 28(2): 321-332. 1982.
  • PRITCHETT, W. L. Properties and Management of Forest Soils. John Wiley & Sons. New York. 1979. 500p.
  • SWITZER, G. L. and NELSON, L.E. Nutrient Accumulation and Cycling in Loblolly pine (Pinus taeda L.) Plantation Ecosystems: The First Twenty Years. Soil Sci. Soc. Am. J. 36: 143-147. 1972.
  • WHITEHEAD, D. Ecological Aspects of Natural and Plantation Forests. Forestry Abstracts 43(10): 615-624. 1982.
  • WILL, G. M, Nutrient Return in Litter and Rainfall under some Exotic Conifer Stands in New Zealand. N.Z.J. Agric. Res. 2(4) 719-734. 1959.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Mar 2024
  • Data do Fascículo
    Jan-Dec 1994
Instituto de Florestas da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro Rodovia BR 465 Km 7, CEP 23897-000, Tel.: (21) 2682 0558 | (21) 3787-4033 - Seropédica - RJ - Brazil
E-mail: floram@ufrrj.br