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RADIAÇÃO LUMINOSA E FOTOSSÍNTESE EM QUATRO ESPÉCIES LENHOSAS NO INTERIOR DE UM FRAGMENTO DE FLORESTA SECUNDÁRIA SEMIDECIDUAL

SOLAR RADIATION AND PHOTOSYNTHESIS FOUR WOODY SEMI DECIDUOUS SPECIES OF A SECONDARY FOREST FRAGMENT

RESUMO

Avaliou-se a ocorrência de picos de radiação luminosa e a resposta fotossintética de espécies arbóreas em um fragmento de floresta secundária semidecidual, no domínio da Floresta Atlântica. Os três locais estudados apresentavam exposições das encostas e índice de área foliar diferentes. Os resultados mostraram que existe uma marcante variabilidade na intensidade de radiação luminosa no interior do fragmento devido à presença de clareiras e variações na arquitetura das copas que compõem o dossel. Plântulas de quatro espécies arbóreas presentes nos locais estudados foram submetidas, em condição de campo, a curtos intervalos, a altos valores de fluxo de fótons fotossintéticos (FFF), visando simular o efeito dos picos de FFF na fotossíntese. Foi observado um aumento praticamente imediato da fotossíntese líquida nas folhas sob alto FFF (500 μmol.m-2s-1), ficando, no entanto, evidente a ocorrência de estado de indução quando as folhas permaneceram por um longo tempo sob baixo FFF (20 μmol.m-2s-1).

Palavras-chaves:
radiação luminosa; fotossíntese; Floresta Atlântica

ABSTRACT

Sunflecks and their effect on photosynthesis were evaluated in a semideciduous forest fragment in the Atlantic Forest domain, in Brazil. The three sites studied varied in aspect and leaf area index. The results showed that there is a great spatial net energy variability at the lower stratum of the forest studied due to the presence of gaps and variation in crown architecture. Seedling of four species, which occurred in the three sites studied, were submitted, in the field, to photosynthetic active radiation (PAR), at short intervals, using the infrared gas analyzer (IRGA). It was observed an evident induction state when leaves were kept for a long time under low PAR (20 μmol.m-2s-1).

Key words:
solar radiation; photosynthesis; Atlantic Forest

INTRODUÇÃO

As plantas localizadas sob o dossel de uma floresta recebem, na maioria do tempo, radiação solar difusa devido a interceptação da radiação solar direta pela copa das árvores do estrato superior. Entretanto, em alguns horários do dia, os raios solares atravessam as copas do estrato superior incidindo sobre as plantas no subbosque. Essa passagem de raios solares através do dossel da floresta (picos de radiação luminosa), apesar de, geralmente, acontecer em curto espaço de tempo, pode contribuir de maneira significativa para o fluxo de fótons fotossintéticos e, conseqüentemente, para a fixação de carbono (Pearcy et al. 1985PEARCY, R. W., OSTERYOUNG, K., CALKIN, H. W. Photosynthetic responses to dynamic light environments by Hawaiian trees. Plant Physiology, v. 79, p. 896-902, 1985.). Assim, é importante que se conheça o comportamento da radiação luminosa no sub-bosque e as respostas das plantas de subbosque ao fluxo de fótons fotossintéticos, uma vez que a oferta de radiação luminosa ao longo do dia é diferente (quanto a freqüência de ocorrência e intensidade dos raios solares) daquela observada, por exemplo, em plantas totalmente expostas em um dia sem a presença de nuvens, quando a radiação luminosa começa com valores mínimos pela manhã, atinge valores máximos ao meio dia e diminui ao final da tarde.

Estudos em florestas tropicais mostram que os picos de radiação luminosa ocorrem, em média, durante menos de 10% do total de horas de insolação ao longo do dia, mas contribuem com cerca de 35 a 80% do total do fluxo de fótons fotossintéticos (FFF) incidente no sub-bosque (Chazdon et al. 1988CHAZDON, R. L., WILLIANS, K., FIELD, C. B. Interactions between crown structure and light environment in five rain piper species. American Journal of Botany, p. 1459-1471, 1988.; Fernandez & Fecther, 1991FERNANDEZ, D. S., FETCHER, N. Changes in light availability following Hurricane Hugo in Subtropical Montane Forest in Puerto Rico. Biotropica, v. 23, n. 4, p. 393-399, 1991.; Fernandez & Myster, 1995FERNANDEZ, D. S., MYSTER, R.W. Temporal variation and frequency distribution of photosynthetic photon flux densities and landslide in Puerto Rico. Tropical Ecology, v. 36, n. 1, p. 73-87, 1995.; Pearcy & Pfitsch, 1995PERCY, R. W., PFITSCH, W. A. The consequences of sunflecks for photosynthesis and growth of forest understory plants. In: E.D. Schulze, M.M. Caldwell (eds.) Ecophysiology of photosynthesis. New York: Springer, 1995. 343-359p.). Entretanto, apesar da grande contribuição potencial dos picos de radiação luminosa na fixação de carbono pelas plantas de sub-bosque, poucos estudos têm sido desenvolvidos em condições de campo para avaliar a importância de sua variação temporal e espacial. Diante do exposto, o presente trabalho teve como objetivo estudar a ocorrência de picos de radiação luminosa no sub-bosque de um fragmento da Floresta Atlântica e verificar a resposta fotossintética de algumas espécies arbóreas diante de simulação dos picos de FFF.

MATERIAL E MÉTODOS

O presente estudo foi realizado na Estação Experimental Mata do Paraíso, com área de 196 ha, pertencente ao Departamento de Engenharia Florestal da Universidade Federal de Viçosa, localizada no Município de Viçosa, MG (20o45’ S, 42o55’ W e altitude média de 690 m).

As avaliações foram realizadas em três locais (A, B e C) no interior do fragmento florestal. Os locais B e C apresentam exposições diferentes, um a nordeste e outro a sudoeste, respectivamente, com declividade ao redor de 40%. O local A apresenta encosta nordeste, com declividade e posição topográfica semelhantes às encostas citadas anteriormente, mas apresentando vegetação em estádio seral de sucessão menos avançado.

O índice de área foliar (IAF) foi determinado nos três locais de estudo, em quatros épocas do ano (maio, agosto e dezembro de 1999 e março de 2000) com o objetivo de caracterizar a densidade do dossel. A determinação do IAF foi feita através de dois sensores LI-2050, conectados a “dataloggers” LI-2000, marca LI-COR, sendo um sensor instalado em área aberta e outro no interior da floresta. As leituras instantâneas foram realizadas sob luz difusa, preferencialmente ao amanhecer ou no final da tarde, ou em dias nublados, nos mesmos pontos onde foram instalados os sensores para medir o fluxo de fótons fotossintéticos.

A determinação da intensidade e freqüência da incidência do fluxo de fótons fotossintéticos (FFF), a um metro de altura do solo, foram realizadas através da instalação de dois radiômetros pontuais, modelo LI-190, marca LI- COR, conectados a “dataloggers”, modelo CR10, da marca Campbell, e modelos LI-1000 e LI-1400, marca LI-COR. A posição dos radiômetros foi trocada a cada dois dias. As medições foram realizadas entre 06 e 23 de maio de 2000.

As curvas de resposta da fotossíntese em função de FFF, obtidas por Pezzopane (2001)PEZZOPANE, J. E. M. Caracterização microclimática, ecofisiológica e fitossociológica em uma floresta secundária, em Viçosa, MG. Viçosa, MG: UFV, 2001. 225p. Tese (Doutorado em Ciência Florestal) - Curso de Pós-Graduação em Ciência Florestal, Universidade Federal de Viçosa, 2001., indicaram que espécies de locais mais fechados atingem valores próximos a fotossíntese máxima com FFF igual a 100 mmol.m-2s-1 e plantas de locais mais abertos já apresentam valores elevados de fotossíntese neste nível de FFF. Assim, no presente trabalho, a ocorrência de picos de radiação luminosa foi considerada quando os radiômetros registraram valores médios, a cada minuto, acima desse valor. Diante disso, foi determinada a freqüência de ocorrência de FFF, por um minuto, dentro de classes a partir de 100 μmol.m-2s-1, no período.

Para caracterizar a influência dos picos de radiação luminosa na assimilação de carbono, realizou-se simulação de valores elevados de incidência de FFF (500 μmol.m-2s-1) durante um minuto, entre intervalos de dois minutos sob baixa intensidade de FFF (20 μmol.m-2s-1), medindo-se a fotossíntese líquida através de um analisador de gases a infravermelho portátil (IRGA), modelo LI-6400 (marca LI-COR-USA), com fonte de luz artificial. A simulação de picos de radiação luminosa foi realizada em folhas de Croton floribundus, Guatteria sellowiana, Bauhinia forficata no local A e em folhas de Siparuna guianensis no local B. As espécies florestais escolhidas estavam dentre aquelas de maior índice de regeneração total para cada local, de acordo com o trabalho de Volpato (1994)VOLPATO, M. M. L. Regeneração natural em uma floresta secundária sob o domínio da Mata Atlântica: uma análise fitossociológica. Viçosa, MG: UFV, 1994. 123p. Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal de Viçosa, 1994.. Nas medições, foram utilizadas folhas totalmente expandidas, expostas, localizadas em galhos na posição mediana da copa, de plantas com altura entre 0,8 a 1,5 m de altura.

Na tentativa de identificar a ocorrência de estado de indução, folhas de Bauhinia forficata foram submetidas a baixo valor de FFF (20 μmol.m- 2s-1) por 1, 5 e 30 minutos, antes de receberem FFF igual a 500 μmol.m-2s-1, calculando-se o estado de indução, 60 segundos após a simulação de picos de radiação luminosa (IS60), de acordo com proposta de Pearcy et al. (1996)PEARCY, R. W., KRALL, J. P., SASSENRATH-COLO, G. F. Photosynthesis in fluctuating light environment. In: N.R. Baker (ed.) Photosynthesis and the environment. New York: Kluwer, 1996. 321-346p.:

I S 60 = A 60 / A max

em que,

A60 - fotossíntese após 60 segundos de simulação de picos de radiação luminosa

Amax - fotossíntese máxima da espécie.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Picos de radiação luminosa e fotossíntese líquida de plantas no sub-bosque

Medidas realizadas em folhas das quatro espécies estudadas mostraram que a ocorrência de picos de radiação luminosa no interior da floresta pode contribuir significativamente para o aumento da fotossíntese total ao longo de um dia, uma vez que o aumento da intensidade de radiação luminosa por curto espaço de tempo resultou em uma resposta praticamente instantânea da fotossíntese líquida (Figura 1). As espécies com maior fotossíntese líquida (Croton floribundus, Guatteria sellowiana e Bauhinia forficata) estavam no local A, apresentando, assim, maior eficiência no aproveitamento dos picos de radiação luminosa simulados de 500 μmol.m-2s-1. Siparuna guianensis, no local B, apresentou menor fotossíntese líquida.

A diferença entre os locais estudados é esperada, pois as plantas estabelecidas em locais com maior disponibilidade energética apresentam características ecofisiológicas que possibilitam máxima interceptação da luz e maior fixação de CO2 (Pezzopane et al., 2002PEZZOPANE, J. E. M., REIS, G. G., REIS, M. G. F., HIGUCHI, P., POLLI, H. Q. Caracterização ecofisiológica de espécies arbóreas em uma floresta estacional semidecidual secundária. Revista Brasileira de Agrometeorologia, v. 10, p. 273-281, 2002.). Os resultados de resposta fisiológica aos picos de radiação luminosa obtidos no presente trabalho foram semelhantes aos observados por Pearcy et al. (1985)PEARCY, R. W., OSTERYOUNG, K., CALKIN, H. W. Photosynthetic responses to dynamic light environments by Hawaiian trees. Plant Physiology, v. 79, p. 896-902, 1985. e Chazdon et al. (1996)CHAZDON, R., PEARCY, R., LEE, D., FETCHER,N. Photosynthetic responses of tropical forest plants to contrasting light environments. In: S.S. Mulkey, R.L. Chazdon, A.P. Smith (ed.) Tropical forest plant ecophysiology. New York, Chapman & Hall, 1996. 5-55p., para espécies de sub-bosque de floresta tropical.

É interessante notar que as espécies do local A, em especial, não apresentaram a mesma eficiência fotossintética na primeira simulação de picos de radiação luminosa, indicando, aparentemente, a existência de um estado de indução necessário para o aumento da atividade da Rubisco e da condutância estomática. Comportamento semelhante foi observado por Pearcy et al. (1985)PEARCY, R. W., OSTERYOUNG, K., CALKIN, H. W. Photosynthetic responses to dynamic light environments by Hawaiian trees. Plant Physiology, v. 79, p. 896-902, 1985. em espécies de floresta tropical.

Figura 1
Fotossíntese líquida (A) em folhas de quatro espécies florestais submetidas à simulação de picos de radiação luminosa de 500μmol.m-2.s-1, de 1 minuto de duração ( ) aplicados em folhas previamente submetidas a baixa intensidade de fluxo de fótons fotossintéticos (ao redor de 20 μmol.m-2.s-1).
Figure 1.
Net photosynthesis in four tree species leaves under one minute sunfleck (500 μmol.m-2.s-1) simulation applied to leaves previously under low photosynthetic active radiation intensity (about 20 μmol.m-2.s-1).

Foi observada, também, a ocorrência de estado de indução em folhas de Bauhinia forficata, submetidas a baixo valor de FFF (20 μmol.m-2s-1) durante períodos mais longos de tempo, antes de receberem 500 μmol.m-2s-1 (Figura 2). Os resultados mostram que a folha que ficou apenas 1 minuto sob baixa intensidade de FFF atingiu rapidamente um patamar de fotossíntese líquida ao redor de 10 μmolCO2.m-2s-1. Quando o período sob baixa intensidade de FFF foi de cinco minutos, o tempo necessário para atingir o patamar ultrapassou 60 segundos. No caso do período mais longo sob baixa intensidade de FFF (30 minutos), a folha não atingiu o mesmo valor de fotossíntese máxima, mesmo após 90 segundos sob fluxo de 500 μmol.m-2s-1 de FFF, sendo visível a formação de um patamar mais baixo, mostrando a necessidade de um tempo de indução do sistema fotossintético das folhas. Utilizando a equação proposta por Pearcy et al. (1996)PEARCY, R. W., KRALL, J. P., SASSENRATH-COLO, G. F. Photosynthesis in fluctuating light environment. In: N.R. Baker (ed.) Photosynthesis and the environment. New York: Kluwer, 1996. 321-346p., o estado de indução aos 60 segundos após a simulação de picos de radiação luminosa (IS60) foi de 1,0; 0,86 e 0,59 para, respectivamente, 1, 5 e 30 minutos de intervalo sob baixa intensidade de luz. Esses valores são bem mais elevados em relação aos observados por Pons et al. (1992)PONS, T. L., PEARCY, R.W., SEEMAN, J. R. Photosynthesis in flashing light of soybean leaves grown in different conditions. I. Photosynthetic induction state and regulation of ribulose 1,5- bisphosphate carboxylase activity. Plant Cell Environment, v. 15, p. 569-576, 1992. em folhas de soja, possivelmente pelo fato da espécie estudada no presente trabalho apresentar certa tolerância à sombra, o que, de acordo com Pearcy et al. (1996)PEARCY, R. W., KRALL, J. P., SASSENRATH-COLO, G. F. Photosynthesis in fluctuating light environment. In: N.R. Baker (ed.) Photosynthesis and the environment. New York: Kluwer, 1996. 321-346p., torna a resposta estomática mais rápida. Trabalhos realizados em florestas tropicais mostram que a indução limita a assimilação líquida, entre 10 a 25% (Chazdon, 1986CHAZDON, R. L. Light variation and carbon gain in rain forest understorey palms. Journal of Ecology, v. 74, p. 995-1012, 1986.; Pfitsch & Pearcy, 1989PFITSCH, W. A., PEARCY, R. W. Daily carbon gain by Adenocaulon bicolor, a redwood forest understory herb, in relation to its light environment. Oecologia, v. 80, p. 465-470, 1989.; Pearcy et al. 1996PEARCY, R. W., KRALL, J. P., SASSENRATH-COLO, G. F. Photosynthesis in fluctuating light environment. In: N.R. Baker (ed.) Photosynthesis and the environment. New York: Kluwer, 1996. 321-346p.).

Ocorrência de picos de radiação luminosa no subbosque

Os resultados de simulação de picos de radiação luminosa mostraram que a ocorrência de pequenos períodos com maiores valores de FFF é muito importante para o processo fotossintético no sub-bosque da floresta. Assim, a compreensão da dinâmica da vegetação no sub-bosque requer, também, estudo de picos de FFF em curto espaço de tempo.

Figura 2
Fotossíntese líquida (A) em folhas de Bauhinia forficata sob elevada incidência de FFF (500μmmol.m-2s-1), após terem permanecido sob baixo fluxo energético (20 μmol.m-2s-1) durante 1, 5 e 30 minutos.
Figure 2.
Net photosynthesis in Bauhinia forficata leaves under one minute sunfleck (500 μmol.m-2.s-1) simulation applied to leaves previously under low photosynthetic active radiation intensity (about 20 μmol.m-2.s-1) during 1, 5 and 30 minutes exposures.

A freqüência de ocorrência de picos de FFF, por um minuto, dentro de classes a partir de 100 μmol.m-2s-1, no período estudado, é mostrada na figura 3. A disponibilidade de radiação luminosa foi maior no local A (com IAF igual a 3,6), onde, em média, durante 30, 7 e 12 minutos ao longo do dia, a FFF fica, respectivamente, dentro das classes de 100 a 300, 300 a 500 e acima de 500 μmol.m-2s-1. Nos locais B e C, com vegetação de elevado valor de IAF, respectivamente 4,9 e 5,2, a penetração da radiação luminosa foi bem menor. Apesar de valores de IAF próximos ao observado no local C, no local B foram verificadas ocorrências de maiores valores dentro das classes estudadas, possivelmente, devido ao fato de localizar-se em encosta nordeste, coincidente com a trajetória aparente do sol nessa época do ano (maio), resultando em maior penetração dos raios solares através do dossel da floresta.

Figura 3
Tempo médio diário de ocorrência de picos de fluxo de fótons fotossintéticos (FFF), em classes, em três locais no interior de uma floresta secundária, em Viçosa, MG, entre 06 e 23 de maio de 2000.
Figure 3.
Daily average duration of photosynthetic active radiation peaks, in classes, in a secondary semideciduous seasonal forest in Viçosa, Southeastern Brazil.

Em todos os locais predominou a ocorrência de curtos períodos de exposição à valores acima de 100 μmol.m-2s-1, mas os locais A e B apresentaram, com certa freqüência, períodos de tempo maior com altos valores de radiação luminosa em relação ao local C (Figura 4). No local A, por exemplo, nos 18 dias de avaliação, ocorreram oito episódios com FFF acima de 100 μmol.m-2s-1, durante pelo menos 20 minutos, ou seja, além da maior disponibilidade de radiação luminosa, este local deverá apresentar menor limitação na assimilação de CO2 devido a indução, pois os picos de radiação luminosa são, de modo geral, mais longos.

A diferença de disponibilidade de radiação luminosa entre os locais foi mais evidente em dias sem presença de nuvens. Analisando o comportamento de FFF em cada local, baseado em medições de dois sensores, é possível perceber a ocorrência de maior número de picos no local A (Figura 5). Novamente, devido a trajetória aparente do sol, o local B apresenta número superior de picos de FFF em relação ao local C. Outro ponto importante a ser observado é o comportamento extremamente heterogêneo entre os valores de radiação luminosa no sub-bosque da floresta, mesmo dentro de um mesmo local.

A maior ocorrência de picos de radiação luminosa, associada ao maior potencial fotossintético das plantas do local A, resulta em maior taxa de assimilação de CO2 ao longo do dia, por unidade de área foliar, em relação aos locais B e C. Utilizando os modelos que explicam as curvas de resposta da taxa de assimilação de CO2 em função de FFF, estabelecidos para cada espécie por Pezzopane (2001)PEZZOPANE, J. E. M. Caracterização microclimática, ecofisiológica e fitossociológica em uma floresta secundária, em Viçosa, MG. Viçosa, MG: UFV, 2001. 225p. Tese (Doutorado em Ciência Florestal) - Curso de Pós-Graduação em Ciência Florestal, Universidade Federal de Viçosa, 2001., e os valores médios de FFF mostrados na figura 5, simulou-se a fotossíntese líquida ao longo do dia para três espécies nos locais A e B (Figura 6).

Houve uma diferença claramente perceptível quando se comparou a mesma espécie nos dois locais, pois além da maior disponibilidade de radiação luminosa no local A, a espécie Siparuna guianensis apresenta maior eficiência fotossintética neste local. Integrando a fotossíntese líquida ao longo do dia exemplificado na Figura 6 (entre 8:00 e 16:00 h), o total de CO2 assimilado por Siparuna guianensis foi de 58,1 e 28,3 mol CO2.m-2dia-1 para, respectivamente, os locais A e B.

Figura 4
Frequência absoluta de ocorrência de FFF acima de 100 μmol.m-2.s-1, durante 18 dias, em função da classe de tempo, em três locais no interior de uma floresta secundária, em Viçosa, MG, entre 06 e 23 de maio de 2002.
Figure 4.
Frequency of photosynthetic active radiation peaks over 100 μmol.m-2.s-1 over 18 days, in a secondary semideciduous seasonal forest in Viçosa, Southeastern Brazil.

Figura 5
Fluxo de fótons fotossintéticos (FFF), a cada minuto, em dois sensores instalados em três locais no interior de uma floresta secundária em dia sem nuvens, a um metro de altura, em Viçosa, MG (15 de maio de 2000).
Figura 5
Photosynthetic active radiation, per minute, in a clear day, in a secondary semideciduous seasonal forest in Viçosa, Southeastern Brazil.

Figura 6
Fotossíntese líquida média (A), estimada a partir de modelo matemático, no interior de uma floresta secundária, em Viçosa, MG, no dia 15 de maio de 2000. As letras entre parênteses correspondem aos locais estudados.
Figure 6.
Average estimated net photosynthesis in a secondary semideciduous seasonal forest in Viçosa, Southeastern Brazil.

A diferença foi ainda mais evidente quando se comparou Croton floribundus, espécie de alta eficiência fotossintética no local A, com Sorocea guilleminiana, espécie de baixa eficiência no local B. Neste caso, o total diário de CO2 assimilado foi de 82,9 mol CO2.m-2dia-1 para a espécie do local A contra apenas 18,7 molCO2.m-2dia-1 para a espécie do local B. Na simulação realizada não foram consideradas as perdas devido à indução, o que diminuiria a assimilação total de CO2 pelas folhas. Entretanto, a diferença proporcional entre os locais A e B deveriam aumentar, visto que o intervalo entre os picos de FFF é maior no local B.

CONCLUSÕES

  1. A ocorrência de picos de radiação luminosa contribui significativamente para a fixação de carbono, uma vez que as plantas estudadas apresentaram aumento praticamente imediato de fotossíntese líquida, quando simulou-se uma elevação brusca do fluxo de fótons fotossintéticos.

  2. Avaliações em Bauhinia forficata mostraram que a fixação de carbono durante a ocorrência de picos de radiação luminosa depende do tempo que a folha permanece sob baixa disponibilidade energética antes da ocorrência dos picos, evidenciando que existe um estado de indução do processo de assimilação de CO2.

  3. O local com menor IAF apresentou maior frequência de ocorrência e, também, maior tempo de duração de picos de radiação luminosa em relação aos demais locais. Ainda, houve diferença de disponibilidade de radiação luminosa entre locais com valores semelhantes de IAF, devido a influência da exposição da encosta.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Nov 2023
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 2003
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