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Experiência clínica com a utilização de plugs vasculares Amplatzer®

Clinical experience with Amplatzer® vascular plugs

Resumos

INTRODUÇÃO: Os plugs vasculares Amplatzer® I e II (PVAs I e II) são dispositivos de nitinol autoexpansíveis e de baixo perfil desenvolvidos para oclusão de estruturas vasculares. Relatamos nossa experiência com esses dispositivos em dois centros brasileiros de referência. MÉTODOS: Estudo retrospectivo dos pacientes que se submeteram a procedimentos de oclusão de estruturas vasculares diversas com PVAs desde 2005. Foram utilizadas próteses 30% a 50% maiores que o vaso-alvo, implantadas sob anestesia geral por via venosa femoral e jugular interna ou arterial femoral e braquial por cateteres terapêuticos ou bainhas longas 5 F a 8 F. RESULTADOS: Foram identificados 14 pacientes (50% do sexo masculino) com mediana de idade de 5 anos (11 meses a 70 anos) e mediana de peso de 15 kg (8 kg a 67 kg). Foram utilizados 17 plugs vasculares, sendo 2 PVAs II e 15 PVAs I, com diâmetros de 4 mm a 16 mm. Em 3 pacientes existiam dois vasos para oclusão, sendo utilizados 2 PVAs em vasos diferentes. Em 3 pacientes com fístulas coronárias houve oclusão completa dos vasos após 24 horas. Em 2 pacientes com anastomose de Blalock-Taussig houve oclusão completa da anastomose, em um deles com auxílio de molas adicionais. Em 3 pacientes com fístulas venovenosas no pós-operatório de Glenn ou Fontan houve oclusão completa dos vasos e melhora da saturação, em um deles com auxílio de molas adicionais. Outro caso de fístula venovenosa apresentava fluxo residual discreto no laboratório, com oclusão na monitorização ecocardiográfica em 24 horas. Em 2 pacientes com fístula arteriovenosa pulmonar foram utilizados, além dos PVAs, outras próteses Amplatzer e molas de Gianturco, permanecendo mínimo fluxo residual em ambos os casos. Em 2 pacientes com colaterais sistêmicopulmonares no pós-operatório de atresia pulmonar com comunicação interventricular, houve oclusão completa com auxílio de molas, sendo um imediato e outro em 24 horas. Em um paciente com síndrome da cimitarra a colateral sistêmica foi ocluída totalmente. Não houve episódios de embolização ou mortalidade. CONCLUSÕES: Os PVAs mostraram-se adequados e versáteis para oclusão de diferentes estruturas vasculares, com facilidade de implante e bons índices de oclusão. Em alguns casos, houve necessidade de uso de outros dispositivos. Nesses casos, os PVAs funcionam bem para ancorar os dispositivos adicionais.

Cardiopatias congênitas; Implante de prótese vascular; Dispositivo para oclusão septal


BACKGROUND: The Amplatzer® vascular plugs I and II (AVPs I and II) are low profile self-expandable devices made of nitinol, designed for vascular occlusions. We report our experience with these devices in two tertiary referral hospitals. METHODS: Retrospective study of patients undergoing vascular occlusion procedures with AVPs since 2005. The devices were 30%-50% larger than the target vessel, deployed under general anesthesia via femoral and internal jugular vein or femoral and brachial artery, and delivered through guiding catheters or 5 F to 8 F long sheaths. RESULTS: Fourteen patients (50% male) at a median age of 5 years (11 months to 70 years) and a median weight of 15 kg (8 kg to 67 kg) were identified. Seventeen AVPs were used: 2 AVPs II and 15 AVPs I, with a diameter ranging from 4 mm to 16 mm. In 3 patients with more than one vessel to occlude, 2 AVPs were implanted in each vessel. In 3 patients with coronary fistula total occlusion of the vessels occurred after 24 hours. In 2 patients with modified Blalock-Taussig shunts, there was total occlusion of the anastomosis, with the use of additional coils in one. In 3 patients with venovenous fistulas after Glenn or Fontan operations, there was complete occlusion of the vessels and improved saturation, with the use of additional coils in one. Another patient with venovenous fistula had mild residual shunt in the lab and total occlusion observed at echocardiographic monitoring within 24 hours. Two patients with multiple pulmonary arteriovenous malformations underwent closure using the AVP, other Amplatzer devices and Gianturco's coils, with minimal residual shunts in all cases. In 2 patients with systemic-pulmonary collaterals in the postoperative period of pulmonary atresia and VSD repair, there was complete occlusion with the aid of additional coils, one immediately after the procedure and the other within 24 hours. In one patient with scimitar syndrome the systemic collateral vessel was totally occluded. There was no embolization or death. CONCLUSIONS: The AVPs were appropriate and flexible devices for occlusion of different vascular sites, with easy deployment and good occlusion rates. Additional coils were required in some cases. In these cases, AVPs worked well to anchor the coils.

Heart defects, congenital; Blood vessel prosthesis implantation; Septal occluder device


ARTIGO ORIGINAL

Experiência clínica com a utilização de plugs vasculares Amplatzer®

Clinical experience with Amplatzer® vascular plugs

Fabrício Leite Pereira; Marcelo Silva Ribeiro; Rodrigo Nieckel Costa; Sergio Luiz Navarro Braga; Valmir Fernandes Fontes; Carlos Augusto Cardoso Pedra

Seção Médica de Intervenções em Cardiopatias Congênitas - Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia - São Paulo, SP, Brasil

Correspondência Correspondência: Carlos Augusto Cardoso Pedra Av. Dr. Dante Pazzanese, 500 - 14º andar - Ibirapuera São Paulo, SP, Brasil - CEP 04012-180 E-mail: carlospedra@dantepazzanese.org.br

RESUMO

INTRODUÇÃO: Os plugs vasculares Amplatzer® I e II (PVAs I e II) são dispositivos de nitinol autoexpansíveis e de baixo perfil desenvolvidos para oclusão de estruturas vasculares. Relatamos nossa experiência com esses dispositivos em dois centros brasileiros de referência.

MÉTODOS: Estudo retrospectivo dos pacientes que se submeteram a procedimentos de oclusão de estruturas vasculares diversas com PVAs desde 2005. Foram utilizadas próteses 30% a 50% maiores que o vaso-alvo, implantadas sob anestesia geral por via venosa femoral e jugular interna ou arterial femoral e braquial por cateteres terapêuticos ou bainhas longas 5 F a 8 F.

RESULTADOS: Foram identificados 14 pacientes (50% do sexo masculino) com mediana de idade de 5 anos (11 meses a 70 anos) e mediana de peso de 15 kg (8 kg a 67 kg). Foram utilizados 17 plugs vasculares, sendo 2 PVAs II e 15 PVAs I, com diâmetros de 4 mm a 16 mm. Em 3 pacientes existiam dois vasos para oclusão, sendo utilizados 2 PVAs em vasos diferentes. Em 3 pacientes com fístulas coronárias houve oclusão completa dos vasos após 24 horas. Em 2 pacientes com anastomose de Blalock-Taussig houve oclusão completa da anastomose, em um deles com auxílio de molas adicionais. Em 3 pacientes com fístulas venovenosas no pós-operatório de Glenn ou Fontan houve oclusão completa dos vasos e melhora da saturação, em um deles com auxílio de molas adicionais. Outro caso de fístula venovenosa apresentava fluxo residual discreto no laboratório, com oclusão na monitorização ecocardiográfica em 24 horas. Em 2 pacientes com fístula arteriovenosa pulmonar foram utilizados, além dos PVAs, outras próteses Amplatzer e molas de Gianturco, permanecendo mínimo fluxo residual em ambos os casos. Em 2 pacientes com colaterais sistêmicopulmonares no pós-operatório de atresia pulmonar com comunicação interventricular, houve oclusão completa com auxílio de molas, sendo um imediato e outro em 24 horas. Em um paciente com síndrome da cimitarra a colateral sistêmica foi ocluída totalmente. Não houve episódios de embolização ou mortalidade.

CONCLUSÕES: Os PVAs mostraram-se adequados e versáteis para oclusão de diferentes estruturas vasculares, com facilidade de implante e bons índices de oclusão. Em alguns casos, houve necessidade de uso de outros dispositivos. Nesses casos, os PVAs funcionam bem para ancorar os dispositivos adicionais.

Descritores: cardiopatias congênitas. implante de prótese vascular. dispositivo para oclusão septal.

ABSTRACT

BACKGROUND: The Amplatzer® vascular plugs I and II (AVPs I and II) are low profile self-expandable devices made of nitinol, designed for vascular occlusions. We report our experience with these devices in two tertiary referral hospitals.

METHODS: Retrospective study of patients undergoing vascular occlusion procedures with AVPs since 2005. The devices were 30%-50% larger than the target vessel, deployed under general anesthesia via femoral and internal jugular vein or femoral and brachial artery, and delivered through guiding catheters or 5 F to 8 F long sheaths.

RESULTS: Fourteen patients (50% male) at a median age of 5 years (11 months to 70 years) and a median weight of 15 kg (8 kg to 67 kg) were identified. Seventeen AVPs were used: 2 AVPs II and 15 AVPs I, with a diameter ranging from 4 mm to 16 mm. In 3 patients with more than one vessel to occlude, 2 AVPs were implanted in each vessel. In 3 patients with coronary fistula total occlusion of the vessels occurred after 24 hours. In 2 patients with modified Blalock-Taussig shunts, there was total occlusion of the anastomosis, with the use of additional coils in one. In 3 patients with venovenous fistulas after Glenn or Fontan operations, there was complete occlusion of the vessels and improved saturation, with the use of additional coils in one. Another patient with venovenous fistula had mild residual shunt in the lab and total occlusion observed at echocardiographic monitoring within 24 hours. Two patients with multiple pulmonary arteriovenous malformations underwent closure using the AVP, other Amplatzer devices and Gianturco's coils, with minimal residual shunts in all cases. In 2 patients with systemic-pulmonary collaterals in the postoperative period of pulmonary atresia and VSD repair, there was complete occlusion with the aid of additional coils, one immediately after the procedure and the other within 24 hours. In one patient with scimitar syndrome the systemic collateral vessel was totally occluded. There was no embolization or death.

CONCLUSIONS: The AVPs were appropriate and flexible devices for occlusion of different vascular sites, with easy deployment and good occlusion rates. Additional coils were required in some cases. In these cases, AVPs worked well to anchor the coils.

Key-words: heart defects, congenital. blood vessel prosthesis implantation. septal occluder device.

A primeira oclusão percutânea de estruturas vasculares foi publicada em 1967 por Porstmann et al.1, que descreveram a oclusão do canal arterial patente com plug vascular de ivalon. Com a evolução tecnológica, vários dispositivos foram desenvolvidos para embolização de estruturas vasculares diversas além do canal arterial patente, sendo os mais populares as molas de Gianturco.2,3 Mais recentemente foi aprovado pelo Food and Drug Administration (FDA), órgão governamental dos Estados Unidos, um grupo de dispositivos conhecidos como plugs vasculares Amplatzer® (AGA Medical, Golden Valley, Estados Unidos).4-10 São dispositivos autoexpansíveis, feitos de uma fina rede de 144 fios de nitinol, de tamanhos variados e liberados de forma controlada. Existem quatro tipos de configuração espacial de acordo com as respectivas gerações de desenvolvimento, estando disponíveis para uso clínico no Brasil a primeira, a segunda, e, mais recentemente, a terceira gerações.

No presente estudo demonstramos nossa experiência com esses dispositivos de primeira e segunda gerações em pacientes com cardiopatias congênitas tratados em dois centros brasileiros de referência.

MÉTODO

Desenho do estudo

Trata-se de estudo descritivo com dados colhidos de forma retrospectiva por meio da revisão dos prontuários dos pacientes que se submeteram a oclusão de estruturas vasculares diversas com plugs vasculares Amplatzer I ou II desde 2005. Os procedimentos foram realizados após obtenção de assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido por parte dos pacientes ou responsáveis legais.

Dispositivos

A primeira geração, conhecida como plug vascular Amplatzer® I (PVA I), é um dispositivo feito de fios ultrafinos de nitinol, de forma cilíndrica (Figura 1), que vem pré-carregado e fixo por mecanismo de rosca em um cabo impulsor de 135 cm. Esse cabo inicialmente era feito de aço inoxidável e apresentava menor flexibilidade. Por isso, o material foi mudado e o nitinol passou a também ser empregado para manufaturação do cabo, aumentando sua flexibilidade sem perda da capacidade de tração e navegabilidade. De forma distinta de outros dispositivos Amplatzer utilizados para oclusão do canal arterial patente, comunicação interatrial ou ventricular, os PVAs não possuem retalhos de dácron em seu interior, o que leva a sensível redução de seu perfil. Os diâmetros disponíveis do PVA I variam de 4 mm a 16 mm, com incrementos de 2 mm, e com comprimentos de 7 mm ou 8 mm quando totalmente expandidos. Após carregado, pode ser transferido para cateteres-guia 5 F a 8 F (Tabela 1).4-6


Os PVAs II apresentam malha ainda mais fina, com trama mais densa em duas ou três camadas, o que permitiu manter suas propriedades oclusivas, reduzindo ainda mais seu perfil. Além disso, houve modificação de sua forma: são três discos de retenção articulados (Figura 2), o que aumenta sua flexibilidade e também sua efetividade para oclusão do vaso-alvo. Está disponível com diâmetros variados com incrementos de 2 mm a partir de 4 mm, chegando a 22 mm (Tabela 2). A recomendação é para que os menores PVAs sejam implantados por cateter-guia 5 F, mas há relatos de uso em cateter 4 F.5,6


Mais recentemente foi desenvolvido o PVA III. Sua forma é elíptica e foi projetado para oclusão mais rápida, uma vez que possui mais camadas de nitinol (Figura 3). É o dispositivo ideal para estruturas de alto fluxo. Esse dispositivo não foi utilizado neste estudo, já que não estava liberado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) durante sua realização.


Na Europa já está disponível a quarta geração (PVA IV), com formato de duplo cone. Por ser bastante flexível e apresentar baixo perfil (Figura 4), o dispositivo é apropriado para vasos mais tortuosos. Pode ser implantado pela bainha Amplatzer® TorqVue Diagnostic Catheter 5 F ou ainda por alguns cateteres-guia 4 F (Cordis Tempo®). A experiência com esse dispositivo ainda é pequena, mas há relato da oclusão de canal arterial patente em prematuros.10


Pacientes

Neste estudo, foram identificados 14 pacientes com cardiopatias congênitas variadas (Tabela 3), 50% dos quais do sexo masculino e com medianas de idade de 5 anos (11 meses a 70 anos) e de peso de 15 kg (8 kg a 67 kg).

Procedimentos

Realizados sob anestesia geral. O acesso vascular foi variado e escolhido conforme a anatomia subjacente. Dos 14 pacientes identificados, em 5 foi utilizada a via venosa femoral, em 3 a via venosa jugular interna, em 5 a via arterial femoral, e em 1 via arterial braquial esquerda. Após a obtenção do acesso vascular, foi administrada heparina 100-150 UI/kg (máximo 5.000 UI) e cefuroxima 30 mg/kg (máximo 2 g). O implante foi realizado por meio de cateteresguia terapêuticos de angioplastia coronária 6-7 F ou bainha longa tipo Mullins de 5-8 F. O diâmetro da prótese selecionada foi cerca de 30% maior que o maior diâmetro do vaso-alvo nas oclusões de estruturas arteriais ou com pouca distensibilidade (anastomose de Blalock-Taussig modificada, por exemplo) e cerca de 50% maior que o vaso-alvo nas estruturas venosas, por serem estas mais complacentes. Antes da liberação do dispositivo, angiografias foram realizadas pelo braço lateral da bainha ou por um sistema em Y conectado ao cateter-guia. Confirmando-se posicionamento adequado, o dispositivo escolhido foi liberado girando o cabo de nitinol no sentido anti-horário. Novas angiografias foram realizadas cerca de 5-10 minutos após a liberação para avaliar a presença e a magnitude de possível fluxo residual. Se o operador julgasse necessário, molas de Gianturco adicionais eram implantadas no local. A profilaxia antibiótica foi mantida com mais duas doses de cefuroxima. Foi orientado o uso de aspirina (3-5 mg/kg) por pelo menos seis meses após o procedimento ou continuadamente nos casos de mal formações arteriovenosas pulmonares ou casos específicos de pós-operatório de anastomose de Blalock-Taussig ou Glenn ou Fontan.

RESULTADOS

Diferentes e variadas estruturas vasculares foram ocluídas. Do total de pacientes, 3 tinham diagnóstico de fístulas coronárias (21%); 4, de fístulas venovenosas no pós-operatório da operação de Glenn ou Fontan (28%); 2, de fístulas arteriovenosas pulmonares (14%); 2, de anastomoses de Blalock-Taussig (14%); 2, de colaterais sistêmico-pulmonares no pós-operatório tardio de correção de atresia pulmonar e comunicação interventricular (CIV) (14%); e 1, de colateral arterial em síndrome de cimitarra (9%) (Tabela 3). Foram utilizados 17 plugs vasculares, sendo 2 PVAs II e 15 PVAs I. Em 3 pacientes existiam dois vasos para oclusão, sendo utilizados 2 PVAs em vasos diferentes. O diâmetro médio dos vasos foi de 8,1 ± 3,1 mm e dos plugs vasculares,11,6 ± 3,4 mm, variando entre 4 mm e 16 mm (Tabela 3).

Fístulas coronárias

O primeiro caso foi o de uma fístula do terço inicial da artéria coronária direita para veia cava superior em paciente de 70 anos. Tal caso foi demonstrado ao vivo para o congresso PICS em Las Vegas (Estados Unidos), em julho de 2007. Um PVA I (diâmetro de 10 mm) foi implantado por via arterial retrógrada, com fluxo residual mínimo e de baixa velocidade imediatamente após o implante. O segundo caso foi o de uma paciente de 2 anos e 14 kg, na qual a fístula tinha origem na porção distal da coronária direita, que se encontrava extremamente dilatada, contornava o anel tricúspide e se esvaziava na cavidade ventricular direita, mais especificamente na parede anterior livre do ventrículo direito. Foi então realizada uma alça arteriovenosa para possibilitar o implante por via venosa anterógrada. Entretanto, um cateter Judkins terapêutico de coronária direita 6 F não progrediu até o vaso-alvo em decorrência da tortuosidade do trajeto e da trabeculação do ventrículo direito. A estratégia foi modificada e a prótese foi implantada por via arterial retrógrada com o mesmo cateter 6 F (Figura 5), com oclusão imediata do vaso no laboratório de cateterismo. Outro paciente possuía uma fístula conectando a porção distal da coronária direita a uma estrutura sacular localizada na ponta do ventrículo direito (Figura 6). Pequenos ramos coronários (ventricular posterior e descendente posterior) originavam-se distalmente ao local de inserção da fístula no ápex do ventrículo direito. Para preservar o fluxo para esses vasos e evitar um possível infarto, optou-se pelo implante do dispositivo na estrutura sacular do ventrículo direito, com mínimo fluxo residual ainda no laboratório de cateterismo. Não foram implantados dispositivos adicionais em nenhum dos casos. Não houve complicações isquêmicas. Em todos os pacientes houve oclusão total das fístulas, confirmada pela ecocardiografia transtorácica realizada no dia seguinte ao procedimento, antes da alta hospitalar.



Anastomoses de Blalock-Taussig modificadas

Uma paciente de 23 anos de idade tinha diagnóstico de transposição corrigida das grandes artérias com atresia pulmonar e possuía duas anastomoses modificadas de Blalock-Taussig. Evoluía com cansaço e dessaturação, havendo suspeita ecocardiográfica de estenoses nas anastomoses. Na avaliação diagnóstica angiográfica, a anastomose esquerda conectava a artéria subclávia esquerda à veia pulmonar superior esquerda e não à artéria pulmonar esquerda. Por esse motivo foi realizada sua oclusão com PVA I de 14 mm e 2 molas de Gianturco adicionais com oclusão total imediata da anastomose (Figura 7). A anastomose direita conectava a artéria subclávia direita à artéria pulmonar direita. Como apresentava estenose importante em todo seu trajeto, foi tratada com implante de 2 stents periféricos após a oclusão da anastomose esquerda. O outro paciente tinha 11 meses de idade e era portador de atresia tricúspide com atresia pulmonar. Encontrava-se em pós-operatório recente de anastomose de Glenn, sendo mantida uma anastomose de Blalock-Taussig modificada à esquerda previamente realizada no período neonatal. Como evoluía com sinais de síndrome de cava superior na unidade de terapia intensiva, optouse pela oclusão da anastomose de Blalock-Taussig. Um PVA II de 6 mm foi implantado por via venosa anterógrada com punção da jugular interna direita, obtendo-se oclusão total imediata ainda no laboratório de cateterismo.


Conexões venovenosas

Quatro pacientes encontravam-se no pós-operatório recente ou tardio da operação de Glenn ou de Fontan e evoluíam com cianose progressiva e dessaturação acentuada. Nesses pacientes foram implantados PVAs I por via venosa com acesso pelas veias jugulares internas direita ou esquerda. Em um paciente foi necessário o uso de molas adicionais. Apenas um paciente apresentou fluxo residual mínimo logo após a liberação dos dispositivos (Figura 8). Um dos pacientes apresentava duas fístulas da veia inominada para a veia cava inferior e cada uma foi ocluída com um PVA I. Houve aumento da saturação em todos os pacientes, com média de 73 ± 5% para 82 ± 7%.


Colaterais sistêmico-pulmonares

Nos 2 pacientes com esses vasos anômalos houve necessidade de implante de molas de Gianturco adicionais, havendo fluxo residual no laboratório de cateterismo em um dos pacientes e oclusão total no controle ecocardiográfico em 24 horas (Figura 9).


Malformações arteriovenosas pulmonares

Os 2 pacientes portadores dessa malformação possuíam vasos nutridores múltiplos, com amplo comprometimento de diferentes segmentos pulmonares. Por esse motivo, foram utilizadas inúmeras molas de Gianturco adicionais em todos os casos, com os PVAs I implantados servindo como ponto de ancoragem para as molas. Em um paciente ainda foi necessário um PVA adicional (Figura 10) e em outro foi implantada prótese Amplatzer® de comunicação interventricular em vaso nutridor. Todos os pacientes apresentavam shunt residual muito discreto imediatamente após o procedimento. Houve normalização da saturação em todos os pacientes, com média de 87 ± 5% para 94 ± 2%. Um paciente apresentou quadro respiratório com dispneia e febre 15 dias após o procedimento de oclusão, sendo feito diagnóstico de pneumonia. Tratado com antibioticoterapia, o paciente recebeu alta em 7 dias. Em todos os pacientes houve orientação para uso contínuo e ininterrupto de aspirina em doses antiagregantes. Durante o seguimento, apresentaram mínimo fluxo residual à ecocardiografia com injeção de microbolhas.


Colateral sistêmica em síndrome de cimitarra

Uma paciente de um ano de idade com síndrome de cimitarra e pulmão hiperluscente era portadora de atresia da artéria pulmonar direita, hipoplasia pulmonar direita, estenoses periféricas múltiplas nas artérias pulmonares esquerdas distais e hipertensão pulmonar leve. Uma colateral da aorta descendente torácica para o pulmão direito de 3 mm foi ocluída por via retrógrada com um PVA I de 4 mm por bainha longa 5 F.

Não houve complicações em nenhum dos procedimentos de oclusão. Não houve embolização ou necessidade de explante ou de troca do dispositivo. Não houve nenhum óbito.

DISCUSSÃO

Diversos dispositivos têm sido utilizados para oclusão das estruturas vasculares, sendo os mais populares as molas de Gianturco.2,3 Apesar de terem baixo custo e de estarem prontamente disponíveis na maioria dos laboratórios de cateterismo, seu implante não é controlado, podendo resultar em posicionamentos inadequados e/ou embolizações para territórios não desejados. Além disso, muitas vezes é necessário o implante de várias molas, especialmente em vasos de alto fluxo, o que pode, paradoxalmente, aumentar os custos do procedimento. A ocorrência de fluxos residuais com esses dispositivos depende do território tratado e da velocidade de fluxo em condições basais, com taxas geralmente superiores a 90%.2,3 Como são implantados por cateteres de baixo perfil (a mola 0,038 polegada é compatível com o uso de cateteres 4 F), tortuosidades podem ser superadas sem maiores dificuldades técnicas. Por outro lado, para aumentar o controle no implante e as taxas de oclusão de vasos não desejados, muitos autores passaram a utilizar alternativamente próteses desenhadas para oclusão do canal arterial patente, da comunicação interatrial e da comunicação interventricular.11-15 Apesar de esses objetivos terem sido alcançados, algumas limitações são evidentes no uso dessas próteses: custos mais elevados, dificuldade de negociar trajetos mais tortuosos e necessidade de uso de cateteres ou bainhas de maior perfil. São, sem dúvida, ainda de grande valia para estruturas vasculares muito grandes e de alto fluxo. Pelos motivos expostos e atendendo à demanda clínica, a AGA Medical (Golden Valley, Estados Unidos) desenvolveu dispositivos mais específicos para oclusão de estruturas vasculares variadas, os plugs ou rolhas ou tapões vasculares, disponíveis desde 2004.4-10 De modo geral, todas as gerações ou tipos de PVAs apresentam características extremamente vantajosas e adequadas para os objetivos contemplados em sua utilização. Como são fabricados com fina malha de nitinol e conectados a um cabo delgado de nitinol, seu implante é factível utilizando-se cateteres ou bainhas de baixo perfil, inclusive em territórios mais tortuosos, como foi demonstrado nesta experiência clínica. Possuem um sistema controlado de implante extremamente simples: confirmando-se o posicionamento adequado da prótese por meio de angiografias de controle, procede-se a sua liberação, desenroscando a prótese do cabo. As taxas de oclusão são, de modo geral, altas, especialmente com o uso das gerações II e III, que possuem 6 pontos de oclusão: 2 nas camadas de rede de nitinol no disco distal, 2 no disco central e mais 2 no disco proximal. Apesar de não existirem trabalhos comparando a eficácia das diversas gerações de PVAs, os das gerações II e III provavelmente são mais apropriados para estruturas de alto fluxo, resultando em maiores taxas de oclusão.

A literatura médica apresenta relatos de casos de oclusão de conexões venovenosas6, fistulas atrioventriculares pulmonares7,8 e fístulas coronárias.9 Estão disponíveis duas grandes séries, sendo a primeira um estudo multicêntrico relatando os resultados do uso exclusivo do PVA I descrita por Hill et al.4, que levou à liberação do uso clínico desse dispositivo pelo FDA, e outra mais recente, com utilização dos PVAs I e II, publicada por Schwartz et al., em um único centro da Filadélfia (Estados Unidos).5

Hill et al.4 descreveram a experiência com PVA I em 11 centros norte-americanos, englobando 52 pacientes com medianas de idade de 9,2 anos e de peso de 20 kg. Foram ocluídas colaterais sistêmico-pulmonares (42%), fístulas atrioventriculares pulmonares (32%) e, em menor porcentagem, colaterais venovenosas, shunts cirúrgicos, canais arteriais patentes e fístulas coronárias. Em poucos casos foram necessários dispositivos adicionais, obtendo-se um total de 94% de oclusão durante o procedimento. Não houve complicações maiores. Um lactente de 2 meses de idade com canal arterial patente de 7 mm foi tratado com PVA de 14 mm, demonstrando pequeno shunt residual e ausência de sopro ao exame físico. Após duas semanas houve reconfiguração do dispositivo, apresentando aumento do shunt e retorno do sopro sistólico ao exame, optando-se por explante do dispositivo e realização de oclusão cirúrgica. Nesse sentido, não é recomendado o uso do PVA I para oclusão de canais arteriais patentes, já que pode exercer efeito de stent no canal, predispondo à ocorrência de hemólise.16

Schwartz et al.5 apresentaram uma série com 50 pacientes nos quais foram utilizados 58 PVAs em 52 vasos-alvo, 57% dos quais compostos dos PVA II, com medianas de idade de 2 anos e de peso de 12,3 kg. Os vasos ocluídos foram canal arterial patente (38%), colaterais venovenosas (27%), colaterais sistêmicopulmonares (10%) e shunts de Blalock-Taussig (8%), entre outros. Em 87% ocorreu oclusão total durante o procedimento e em outros 13% houve oclusão em uma semana. Houve duas complicações menores relacionadas ao acesso vascular.

Os resultados em nossa série de pacientes, que apresentavam malformações variadas, são semelhantes aos previamente descritos, apesar de não termos utilizado os PVAs para oclusão do canal arterial patente e de o PVA I ter sido empregado na maioria dos casos. Do ponto de vista técnico, não houve dificuldades para progressão, implante adequado e liberação dos dispositivos nos vasos-alvo. Obtivemos 57% de oclusão imediatamente após o procedimento, restando fluxos residuais triviais em pacientes com colaterais sistêmico-pulmonares e com fístulas arteriovenosas pulmonares múltiplas, territórios reconhecidamente de alto fluxo. Por esse motivo, optou-se arbitrariamente pelo uso de dispositivos adicionais nesses casos. Talvez se aguardássemos um tempo maior para realização da angiografia de controle poderíamos ter evitado o uso de alguns desses dispositivos adicionais. Nesse contexto, os PVAs funcionaram bem para ancorar as molas, evitando possíveis embolizações ou posicionamentos inadequados. No sentido de aumentar as taxas de oclusão imediata, é possível que o uso do PVA II nesses casos possa aumentar as taxas de oclusão imediata, em decorrência do número maior de pontos de obstrução ao fluxo sanguíneo. Apenas os pacientes com malformações arteriovenosas pulmonares permaneceram com fluxos residuais mínimos durante o seguimento, definidos pela ecocardiografia com injeção de microbolhas. Tal observação deve-se mais à natureza da doença de base, com múltiplos vasos anômalos17, que à possível falha do dispositivo para promover a oclusão. Além disso, é sabido que cerca de 10% dos pacientes com essa enfermidade apresentam recanalização necessitando de reintervenções.15,17 Nossos pacientes não necessitaram de reintervenções por permanecerem com níveis de saturação adequados e fluxos residuais não-significativos. Apesar de este relato englobar um número limitado de pacientes, não houve episódios de embolização ou complicações relacionadas ao procedimento.

CONCLUSÃO

Os PVAs mostraram-se adequados e versáteis para oclusão de estruturas vasculares diversas, com facilidade de implante e ótimos índices de oclusão. Em alguns casos houve necessidade do uso de dispositivos adicionais. Nesses casos os PVAs funcionaram bem para ancorá-los.

CONFLITO DE INTERESSES

Carlos Augusto Cardoso Pedra é consultor da empresa AGA Medical (Golden Valley, Estados Unidos) e da Bioassist, representante da AGA Medical do Brasil. Os demais autores declararam inexistência de conflito de interesses relacionado a este manuscrito.

Recebido em: 20/6/2010

Aceito em: 17/8/2010

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  • Correspondência:

    Carlos Augusto Cardoso Pedra
    Av. Dr. Dante Pazzanese, 500 - 14º andar - Ibirapuera
    São Paulo, SP, Brasil - CEP 04012-180
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      07 Ago 2012
    • Data do Fascículo
      2010

    Histórico

    • Aceito
      17 Ago 2010
    • Recebido
      20 Jun 2010
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