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Acesso via subclávia em implante de válvula aórtica transcateter: uma boa alternativa para candidatos não adequados para a via transfemoral

EDITORIAL

Acesso via subclávia em implante de válvula aórtica transcateter: uma boa alternativa para candidatos não adequados para a via transfemoral

Henrique Barbosa RibeiroI; Josep Rodés-CabauII

IFellow em Cardiologia Intervencionista e Estrutural. Quebec Heart & Lung Institute, Laval University. Quebec city, Quebec, Canadá

IIDoutor. Professor associado e diretor dos Laboratórios de Cateterização e Intervencionista, Quebec Heart and Lung Institute. Quebec City, Quebec, Canadá

Correspondência Correspondência: Josep Rodés-Cabau. Quebec Heart & Lung Institute, Laval University – 2725 Chemin Ste-Foy, G1V 4G5 Quebec City, Quebec, Canada E-mail: josep.rodes@criucpq.ulaval.ca

O implante de válvula aórtica transcateter emergiu como alternativa de tratamento para pacientes com estenose aórtica grave considerada de risco cirúrgico alto ou proibitivo.1 Enquanto a via transfemoral tem sido considerada a abordagem de escolha na maioria dos centros e dos estudos, características não adequadas dos vasos iliofemorais impedem a colocação segura das bainhas em grande número de pacientes. Além do pequeno tamanho das artérias iliofemorais, cerca de um terço dos candidatos a implante de válvula aórtica transcateter apresentam doença vascular periférica significativa.1

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Abordagens alternativas foram desenvolvidas nos últimos anos, tais como as vias transapical, subclávia/axilar e transaórtica. A abordagem transapical tem sido a alternativa mais frequente à abordagem transfemoral quando se utiliza a válvula balão-expansível Edwards SAPIEN (Edwards Lifesciences, Irvine, Estados Unidos) (> 50% dos casos no Registro SOURCE; Tabela 1). Mais recentemente, e mesmo com a disponibilidade de bainhas de perfil mais baixo, o implante de válvula aórtica transcateter transapical é ainda realizado em mais de 30% dos pacientes.4,7,10,11 Entretanto, a abordagem transapical não é uma opção para os pacientes que recebem o sistema CoreValve®, de modo que outras abordagens, tais como a subclávia/axilar e a transaórtica, também foram desenvolvidas. Como é destacado na Tabela 1, mais de 90% dos procedimentos com o sistema CoreValve® foram realizados por via transfemoral e cerca de 5% a 8% deles foram realizados por meio da abordagem subclávia/axilar.

Nesta edição desta Revista Brasileira de Cardiologia Invasiva, Brito Júnior et al.12 relataram a experiência com a via subclávia do Registro Brasileiro de Implante de Válvula Aórtica Transcateter. Entre os 277 pacientes incluídos nesse registro, 8 (2,9%) foram tratados por via subclávia com o sistema CoreValve®, todos eles realizados com anestesia geral e dissecção do vaso. Embora esta seja uma série pequena, em todos os casos foi obtido sucesso do dispositivo e houve apenas uma complicação maior da via de acesso, também relacionada a uma morte, não ocorrendo evento cerebral aos 30 dias de seguimento. É interessante notar que esses resultados são comparáveis aos de outros registros que avaliaram o sistema CoreValve® por via subclávia (Tabela 2).

Além de registros e de séries pequenas, não há, até o momento, dados de estudos randomizados comparando a abordagem transfemoral ou a transapical com a abordagem subclávia. Entretanto, uma análise pareada, ajustada por um escore de propensão, comparou os resultados do procedimento e da evolução de dois anos da via subclávia (n = 141) com os da via femoral (n = 141).13 Esse estudo incluiu todos os pacientes consecutivos submetidos a implante de válvula aórtica transcateter pela via subclávia com o dispositivo CoreValve® 18 F e esses pacientes foram pareados com base nas características clínicas basais (exceto doença vascular periférica) com uma coorte transfemoral. Ambos os grupos apresentaram taxas similares de sucesso do procedimento (97,9% para a via subclávia vs. 96,5% para a via transfemoral; P = 0,47), de complicações vasculares maiores (5% vs. 7,8%; P = 0,33), de sangramentos com risco de vida (7,8% vs. 5,7%; P = 0,48) e de desfechos de segurança combinados (19,9% vs. 25,5%; P = 0,26). Mesmo assim, o grupo da abordagem subclávia apresentou menores taxas de lesão renal aguda/estágio 3 (4,3% vs. 9,9%; P = 0,02), de complicações vasculares menores (2,1% vs. 11,3%; P = 0,003) e de todos os tipos de eventos de sangramento relacionados a complicações vasculares. A sobrevida aos dois anos foi semelhante em ambos os grupos (74 ± 4% vs. 73,7 ± 3,9%; P = 0,78). Deve-se destacar que a abordagem subclávia esteve associada a tempos mais longos do procedimento, embora com tempos de fluoroscopia similares.

De modo geral, esses dados, que incluem registros, pequenas séries e análises pareadas ajustadas por escores de propensão, sugerem que a via subclávia é uma alternativa interessante para o implante de válvula aórtica transcateter e deve ser considerada especialmente em pacientes com calcificação ou tortuosidade graves ou com vasos de pequeno diâmetro, condições que impedem a abordagem femoral. Outro aspecto importante sobre o acesso subclávio é que é necessária análise cuidadosa da anatomia da artéria, procurando um diâmetro mínimo > 6 mm, evitando calcificações circunferenciais ou tortuosidades acentuadas e, também, a presença de marca-passo ipsilateral prévio. Embora um antecedente de cirurgia de revascularização miocárdica, incluindo enxerto de artéria mamária interna esquerda, seja usualmente considerado contraindicação formal, Modine et al.17 demonstraram, recentemente, a viabilidade e a segurança da abordagem subclávia, mesmo nos 19 pacientes com revascularização miocárdica prévia e com artéria mamária interna esquerda patente. Entretanto, um diâmetro da artéria subclávia mínimo de 7 mm e a remoção da bainha durante a colocação da válvula são recomendados nesses casos, para evitar a ocorrência de isquemia miocárdica.

Concluindo, a abordagem transfemoral não é possível em grande proporção de candidatos a implante de válvula aórtica transcateter. Vários estudos anteriores e o trabalho de Brito Júnior et al.12 demonstraram que a abordagem subclávia usando o sistema CoreValve® é uma boa alternativa para os candidatos a implante de válvula aórtica transcateter com artérias iliofemorais não adequadas. Estudos randomizados adicionais são necessários para avaliar a potencial superioridade dessa via em comparação com outras vias alternativas, bem como com o acesso transfemoral.

CONFLITO DE INTERESSES

Josep Rodés-Cabau é consultor da Edwards Lifesciences (Irvine, Estados Unidos) e da St. Jude Medical (St Paul, Estados Unidos). Henrique Barbosa Ribeiro relata não haver conflito de interesses relacionado a este manuscrito.

Recebido em: 1º/9/2012

Aceito em: 2/9/2012

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  • Correspondência:

    Josep Rodés-Cabau.
    Quebec Heart & Lung Institute, Laval University – 2725 Chemin Ste-Foy, G1V 4G5
    Quebec City, Quebec, Canada
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      08 Nov 2012
    • Data do Fascículo
      2012
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