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Evolução muito tardia da valvotomia percutânea por balão na estenose mitral grave

Resumos

INTRODUÇÃO: A valvotomia mitral percutânea por balão é um procedimento seguro e eficaz em pacientes com estenose mitral grave sintomática selecionados, com resultados imediatos e a longo prazo semelhantes aos da intervenção cirúrgica. Este estudo tem o objetivo de descrever os resultados muito tardios das primeiras valvotomias mitrais percutâneas por balão realizadas em nossa instituição e identificar os fatores preditores de reestenose. MÉTODOS: No período de 1987 a 1991, 200 pacientes consecutivos foram submetidos a valvotomia mitral percutânea por balão. Avaliações clínica e ecocardiográfica foram realizadas antes do procedimento, 48 horas após e, então, anualmente. RESULTADOS: A média de idade foi de 32 ± 12 anos, 86,5% eram do sexo feminino e 80,5% encontravam-se em classe funcional III ou IV da New York Heart Association. A média do escore de Wilkins foi de 7,6 ± 1,2 e o sucesso do procedimento ocorreu em 87,5% (175/200) dos pacientes. Durante o seguimento, foram acompanhados 129 pacientes (74%) por 140 ± 79 meses. Reestenose após o primeiro procedimento ocorreu em 46,5% (60/129) dos pacientes, sendo realizada uma segunda valvotomia mitral percutânea por balão em 25 pacientes, uma terceira em 4 pacientes, e uma quarta em 1 paciente. Em cinco anos, a probabilidade livre de reestenose foi de 85%, em 10 anos foi de 60% e em 20 anos, de 36%. O diâmetro do átrio esquerdo (P = 0,034) e o gradiente transvalvar mitral tanto pré (P = 0,013) como pós-procedimento (P = 0,038) foram preditores de reestenose. CONCLUSÕES: Em seguimento clínico muito tardio, a valvotomia mitral percutânea por balão mostrou que os resultados são duradouros em mais de um terço dos pacientes e que a repetição do procedimento pode ser realizada com segurança em pacientes selecionados. A identificação dos preditores de reestenose é útil para guiar a seleção de casos para o procedimento.

Estenose da valva mitral; Dilatação com balão; Resultado de tratamento


BACKGROUND: Percutaneous balloon mitral valvotomy is safe and effective in patients with severe symptomatic mitral stenosis with immediate and long-term results comparable to those of surgical intervention. This study was aimed at reporting the very late follow-up results of the first percutaneous balloon mitral valvotomies performed at our institution and at identifying predictive factors of restenosis. METHODS: From 1987 to 1991, 200 consecutive patients were submitted to percutaneous balloon mitral valvotomy. Clinical and echocardiographic evaluations were performed prior to the procedure, 48 hours after the procedure and annually thereafter. RESULTS: Mean age was 32 ± 12 years; 86.5% were female and 80.5% were in New York Heart Association functional class III or IV. Mean Wilkins score was 7.6 ± 1.2 and procedure success was observed in 87.5% (175/200) of the patients. During follow-up, 129 patients (74%) were followed up for 140 ± 79 months. Restenosis was observed after the first procedure in 46.5% (60/129) patients and a second percutaneous balloon mitral valvotomy was performed in 25 patients, a third one in 4 patients and a fourth one in 1 patient. The probability of being restenosis-free was 85% at 5 years, 60% at 10 years and 36% at 20 years. Left atrial diameter (P = 0.034), and preoperative (P = 0.013) and postoperative (P = 0.038) transvalvar gradient were predictors of restenosis. CONCLUSIONS: In a very late clinical follow-up, percutaneous balloon mitral valvotomy provided long-lasting results in over one-third of the patients and showed that repeated procedures may be performed safely in selected patients. The identification of restenosis predictors is useful for patient selection.

Mitral valve stenosis; Balloon dilation; Treatment outcome


ARTIGO ORIGINAL

Evolução muito tardia da valvotomia percutânea por balão na estenose mitral grave

Very late follow-up of percutaneous balloon mitral valvotomy in severe mitral stenosis

Gentil Barreira de Aguiar FilhoI; Sebastian LluberasII; Nisia Lyra GomesIII; Luiz Felipe P. de AndradeIV; Mercedes MaldonadoV; Zilda Machado MenegheloVI; Felipe Carrha MachadoVII; Mateus Veloso e SilvaVIII; Cesar A. EstevesIX; Sérgio Luiz N. BragaX; Alexandre AbizaidXI

IMédico residente da Seção de Hemodinâmica do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

IIMédico residente da Seção de Valvopatias do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

IIIMédica assistente da Seção de Valvopatias do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

IVMédico residente da Seção de Valvopatias do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

VMédica assistente da Seção de Ecocardiografia do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

VIDoutora. Chefe da Seção de Valvopatias do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

VIIMédico residente de Cardiologia do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

VIIIMédico residente da Seção de Hemodinâmica do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

IXDoutor. Chefe da Seção Médica em Valvopatias Adquiridas do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

XDoutor. Chefe da Seção de Hemodinâmica do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

XIProfessor livre-docente. Diretor do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

Correspondência Correspondência: Gentil Barreira de Aguiar Filho. Rua Borges Lagoa, 1.209 – Vila Clementino São Paulo, SP, Brasil – CEP 04038-033 E-mail: gentilbarreira@gmail.com

RESUMO

INTRODUÇÃO: A valvotomia mitral percutânea por balão é um procedimento seguro e eficaz em pacientes com estenose mitral grave sintomática selecionados, com resultados imediatos e a longo prazo semelhantes aos da intervenção cirúrgica. Este estudo tem o objetivo de descrever os resultados muito tardios das primeiras valvotomias mitrais percutâneas por balão realizadas em nossa instituição e identificar os fatores preditores de reestenose.

MÉTODOS: No período de 1987 a 1991, 200 pacientes consecutivos foram submetidos a valvotomia mitral percutânea por balão. Avaliações clínica e ecocardiográfica foram realizadas antes do procedimento, 48 horas após e, então, anualmente.

RESULTADOS: A média de idade foi de 32 ± 12 anos, 86,5% eram do sexo feminino e 80,5% encontravam-se em classe funcional III ou IV da New York Heart Association. A média do escore de Wilkins foi de 7,6 ± 1,2 e o sucesso do procedimento ocorreu em 87,5% (175/200) dos pacientes. Durante o seguimento, foram acompanhados 129 pacientes (74%) por 140 ± 79 meses. Reestenose após o primeiro procedimento ocorreu em 46,5% (60/129) dos pacientes, sendo realizada uma segunda valvotomia mitral percutânea por balão em 25 pacientes, uma terceira em 4 pacientes, e uma quarta em 1 paciente. Em cinco anos, a probabilidade livre de reestenose foi de 85%, em 10 anos foi de 60% e em 20 anos, de 36%. O diâmetro do átrio esquerdo (P = 0,034) e o gradiente transvalvar mitral tanto pré (P = 0,013) como pós-procedimento (P = 0,038) foram preditores de reestenose.

CONCLUSÕES: Em seguimento clínico muito tardio, a valvotomia mitral percutânea por balão mostrou que os resultados são duradouros em mais de um terço dos pacientes e que a repetição do procedimento pode ser realizada com segurança em pacientes selecionados. A identificação dos preditores de reestenose é útil para guiar a seleção de casos para o procedimento.

Descritores: Estenose da valva mitral. Dilatação com balão. Resultado de tratamento.

ABSTRACT

BACKGROUND: Percutaneous balloon mitral valvotomy is safe and effective in patients with severe symptomatic mitral stenosis with immediate and long-term results comparable to those of surgical intervention. This study was aimed at reporting the very late follow-up results of the first percutaneous balloon mitral valvotomies performed at our institution and at identifying predictive factors of restenosis.

METHODS: From 1987 to 1991, 200 consecutive patients were submitted to percutaneous balloon mitral valvotomy. Clinical and echocardiographic evaluations were performed prior to the procedure, 48 hours after the procedure and annually thereafter.

RESULTS: Mean age was 32 ± 12 years; 86.5% were female and 80.5% were in New York Heart Association functional class III or IV. Mean Wilkins score was 7.6 ± 1.2 and procedure success was observed in 87.5% (175/200) of the patients. During follow-up, 129 patients (74%) were followed up for 140 ± 79 months. Restenosis was observed after the first procedure in 46.5% (60/129) patients and a second percutaneous balloon mitral valvotomy was performed in 25 patients, a third one in 4 patients and a fourth one in 1 patient. The probability of being restenosis-free was 85% at 5 years, 60% at 10 years and 36% at 20 years. Left atrial diameter (P = 0.034), and preoperative (P = 0.013) and postoperative (P = 0.038) transvalvar gradient were predictors of restenosis.

CONCLUSIONS: In a very late clinical follow-up, percutaneous balloon mitral valvotomy provided long-lasting results in over one-third of the patients and showed that repeated procedures may be performed safely in selected patients. The identification of restenosis predictors is useful for patient selection.

Descriptors: Mitral valve stenosis. Balloon dilation. Treatment outcome.

A valvotomia mitral percutânea com cateter-balão foi descrita pela primeira vez em 1984, por Inoue et al.1, como opção para tratamento de pacientes com estenose mitral grave. Em 1986, Al Zaibag et al.2 passaram a usar a técnica do duplo balão por via transeptal, tendo McKay et al.3 e Palacios et al.4 simplificado a técnica, ao realizar apenas uma punção do septo e dilatação subsequente do orifício para acomodar a passagem dos dois balões.

Atualmente a valvotomia mitral percutânea é considerada método de eleição no tratamento da estenose mitral.5,6 Quando comparada com a comissurotomia mitral cirúrgica, a valvotomia mitral com balão demonstra taxas de sucesso semelhantes ou superiores,7,8 com índices de reestenose equivalentes aos do tratamento cirúrgico convencional.8

Entre as técnicas disponíveis para dilatação da estenose mitral encontramos o duplo-balão convencional,9,10 mais utilizado no passado, o comissurótomo metálico de Cribier,10,11 o duplo-balão com guia único (sistema Multi-Track)10,12,13 e o balão de Inoue,1,9,10 dispositivo mais utilizado na atualidade. Essa técnica possui algumas vantagens quando comparada à do duplo-balão, pois apresenta tempo de procedimento menor, simplicidade, que permite sua realização por um único operador, e, finalmente, posicionamento mais estável do balão no anel mitral. Hoje está comprovado que a área valvar mitral pós-valvotomia é semelhante, independentemente da técnica utilizada.14-16

Ao se avaliar um paciente com estenose mitral é preciso levar em consideração vários fatores para indicar o procedimento: a classe funcional pela New York Heart Association (NYHA), a área valvar mitral, a anatomia valvar, determinada pelo escore ecocardiográfico proposto por Wilkins et al.17, e as lesões valvares associadas. Algumas características podem favorecer melhor evolução: pacientes jovens, anatomia valvar com escore ecocardiográfico de Wilkins ≤ 8 pontos, ritmo sinusal, ausência de regurgitação mitral prévia ao procedimento e comissurotomia cirúrgica prévia.

O objetivo deste estudo foi avaliar os resultados imediatos e a longo prazo das primeiras 200 valvotomias mitrais percutâneas por balão realizadas em nossa instituição. As características basais dos pacientes, os preditores de reestenose e a necessidade de novas intervenções foram também pesquisados.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo observacional longitudinal e retrospectivo de uma coorte de 200 pacientes consecutivos com estenose mitral submetidos a valvotomia mitral percutânea por balão em nossa instituição, no período de agosto de 1987 a julho de 1991. Foram avaliados resultados imediatos e tardios e fatores preditores de reestenose.

Os pacientes que foram submetidos a valvotomia mitral percutânea apresentaram-se sintomáticos, com área valvar mitral ≤ 1 cm² e anatomia favorável pelo escore ecocardiográfico de Wilkins.

Foram contraindicações ao procedimento pacientes com trombo móvel ou em posição de risco (septo ou anel mitral) em átrio esquerdo, insuficiência mitral associada ≥ 2/4+, pela classificação de Sellers et al.18 ou outra valvopatia, doença coronária ou congênita associada com indicação cirúrgica.

Definições

Sucesso do procedimento: obtenção de área valvar mitral final ≥ 1,5 cm² com ausência de refluxo e, quando presente, < 2/4+.

Insucesso: interrupção do procedimento por dificuldade técnica, tamponamento cardíaco ou insuficiência mitral grave que necessitasse de intervenção cirúrgica.

Reestenose ecocardiográfica: área valvar mitral, avaliada ao ecocardiograma pela planimetria e/ou pelo tempo de meia pressão, < 1,5 cm² e/ou perda ≥ 50% do ganho inicial19,20 no seguimento tardio.

Reestenose clínica: retorno dos sintomas com piora da classe funcional, corroborada pelo estudo ecocardiográfico.

Seguimento clínico

Consulta médica 30 dias após o procedimento foi realizada nos pacientes com sucesso, seguida de avaliações anuais. O aparecimento de sintomas ao longo do seguimento foi indicativo da necessidade de reavaliações mais precoces. Ecocardiograma transtorácico foi registrado 48 horas após o procedimento e então anualmente, assim como eletrocardiograma e radiografias do tórax. A indicação de nova intervenção foi baseada na presença de reestenose clínica ecocardiográfica, observando-se os mesmos critérios de indicação do primeiro procedimento.

Análise estatística

Utilizou-se o programa SPSS. Os valores foram expressos como média ± desvio padrão. A variação da área valvar mitral, os gradientes diastólicos médio e máximo, o diâmetro do átrio esquerdo e a fração de ejeção do ventrículo esquerdo foram avaliados pelo teste t de Student. As probabilidades livres de reestenose ao longo do estudo foram analisadas por curvas de Kaplan-Meier. O modelo de regressão de Cox foi utilizado para identificar preditores de reestenose. Valor de P < 0,05 foi considerado estatisticamente significante.

RESULTADOS

As características dos pacientes estão descritas na Tabela 1. A média de idade dos pacientes foi de 32 ± 12 anos, 173 (86,5%) eram do sexo feminino, 39 (19%) encontravam-se em classe funcional II da New York Heart Association (NYHA) e 161 (80,5%) encontravam-se em classe funcional III ou IV. Fibrilação atrial estava presente em 8 pacientes (4%) e 5 (2,5%) foram submetidos a comissurotomia cirúrgica prévia. A técnica do duplo balão convencional foi aplicada em 198 pacientes (99%) e em apenas 2 (1%) foi utilizada a técnica de Inoue. Ao avaliarmos as características ecocardiográficas pré-procedimento (Tabela 2), a média do escore de Wilkins foi de 7,6 ± 1,2 pontos e somente 32 pacientes (16%) tinham escore > 8 pontos. O diâmetro do átrio esquerdo médio foi de 48 ± 6,2 mm, a fração média de ejeção do ventrículo esquerdo foi de 63,1 ± 7,7%, a área valvar mitral prévia medida pelo tempo de meia pressão correspondeu a 0,89 ± 0,23 cm², os gradientes valvares máximo e médio foram, respectivamente, de 22,7 ± 6,4 mmHg e 13,9 ± 5,4 mmHg. Refluxo mitral pré-valvotomia mitral percutânea por balão estava presente em 30 pacientes (15%).

O procedimento obteve sucesso em 175 pacientes (87,5%). Insucesso ocorreu em 24 pacientes (12%), sendo 7 (3,5%) em decorrência de refluxo mitral grave e 17 (8,5%) por problemas técnicos relacionados à curva de aprendizado (12 casos de tamponamento cardíaco, e em 5 não foi possível realizar a punção transeptal (Figuras 1 e 2). Houve um óbito (0,5%) na população analisada.



Os resultados ecocardiográficos obtidos após o procedimento demonstraram área valvar mitral final de 2,1 ± 0,5 cm², com gradientes diastólicos máximo e médio pós-procedimento de 11,5 ± 4,8 mmHg e 4,9 ± 2,8 mmHg, respectivamente. O diâmetro do átrio esquerdo médio foi de 47,6 ± 6,4 mm. Após o procedimento, 70 pacientes apresentaram refluxo mitral 1+/4+ e 9 pacientes, refluxo mitral 2+/4+ (Tabela 2).

Durante o seguimento foram acompanhados 129 pacientes (74%), com seguimento médio de 140 ± 79 meses. Reestenose ocorreu em 60 pacientes (46,5%), sendo realizada uma segunda valvotomia mitral percutânea por balão em 25 pacientes, uma terceira valvotomia mitral percutânea por balão em 4 pacientes e uma quarta valvotomia em 1 paciente. Nos outros pacientes que evoluíram com reestenose, 27 necessitaram de cirurgia e 8 permaneceram em acompanhamento clínico (Tabela 3). Houve declínio progressivo no ganho de área valvar mitral após a segunda, a terceira e a quarta valvotomias, conforme demonstrado na Figura 3.


Em 5 anos a probabilidade livre de reestenose foi de 85%, em 10 anos foi de 60%, e em 20 anos foi de 36%, conforme demonstrado na curva de Kaplan-Meier (Figura 4).


O diâmetro do átrio esquerdo (P = 0,034) e os gradientes transvalvares mitrais pré e pós-procedimento (P = 0,013 e P = 0,038, respectivamente) mostraram ser preditores independentes de reestenose, o que não ocorreu para o escore de Wilkins (P = 0,258) e as áreas valvares mitrais pré e pós-procedimento (P = 0,5 e P = 0,054, respectivamente) (Tabela 4).

DISCUSSÃO

Os resultados a longo prazo do tratamento da estenose mitral por cateter-balão estão bem estabelecidos, permitindo que até 90% dos pacientes tratados permaneçam assintomáticos ou oligossintomáticos em um intervalo de 7 anos,8,21 com resultados semelhantes aos do tratamento cirúrgico,22 porém com menor custo.23 Assim, consolida-se essa modalidade terapêutica como primeira escolha em pacientes com anatomia favorável.

Nos estudos de seguimento tardio,24,25 as populações estudadas diferem quanto ao perfil socioeconômico, étnico, cultural, etário, assim como quanto às características clínicas e ecocardiográficas, e à etiologia da doença mitral.26 Portanto, o reconhecimento dos fatores determinantes do sucesso imediato e a longo prazo são fundamentais para definir a terapêutica, estimar os riscos e avaliar o prognóstico.

Os pacientes do presente estudo apresentavam média de idade de 32 anos quando foram submetidos ao procedimento e pequena prevalência de fibrilação atrial, características semelhantes às encontradas em pacientes provenientes de países em desenvolvimento,27 e diferentes daquelas encontradas em países desenvolvidos, cujos pacientes exibem maior faixa etária e maior incidência de arritmias.28,29 Essa diferença pode ser atribuída a etiologias diferentes da estenose mitral, da estenose reumática, mais frequente em nossa população, e da estenose degenerativa, prevalente no segundo grupo.

Fawzy et al.22,30 apresentaram sobrevida livre de eventos de 79% em 10 anos e de 43% em 15 anos em população com média de idade de 31 anos, sendo ainda maior para aqueles com anatomia favorável (88% em 10 anos e 66% em 15 anos). Os fatores relacionados a melhor prognóstico foram: idade, área valvar pós-procedimento e anatomia valvar prévia. A idade é preditor de reestenose, pois está associada ao maior tempo de evolução da doença e, consequentemente, à possibilidade de maior degeneração valvar.31

No Brasil, Cardoso et al.26 demonstraram sobrevida livre de eventos de 61% em 10 anos em pacientes com média de idade de 35 anos, tendo como preditores a idade, o escore ecocardiográfico e o resultado imediato do procedimento. A magnitude do benefício a longo prazo está fortemente influenciada pelo resultado imediato, sendo a insuficiência mitral com refluxo grave um fator de mau prognóstico, relacionada à necessidade de cirurgia.31,32

Outros fatores estão relacionados ao sucesso tardio, como classe funcional (NYHA), gradiente diastólico médio e presença de fibrilação atrial.32 Entretanto, esses fatores caracterizam pacientes com maior gravidade anatômica e menor probabilidade de sucesso do procedimento.32 Em casos de reestenose, a valvotomia mitral percutânea pode ser realizada como primeira escolha,32 existindo relatos de pacientes submetidos a até quatro procedimentos com bons resultados.33

CONCLUSÕES

A valvotomia mitral percutânea por balão, em casos selecionados, demonstra alto sucesso do procedimento e, no acompanhamento muito tardio, bons resultados, com mais de um terço dos pacientes livres de reestenose. A identificação dos preditores de reestenose é útil para a seleção dos pacientes que se beneficiarão da intervenção.

CONFLITO DE INTERESSES

Os autores declaram não haver conflito de interesses relacionado a este manuscrito.

Recebido em: 8/6/2012

Aceito em: 11/8/2012

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  • Correspondência:

    Gentil Barreira de Aguiar Filho.
    Rua Borges Lagoa, 1.209 – Vila Clementino
    São Paulo, SP, Brasil – CEP 04038-033
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      08 Nov 2012
    • Data do Fascículo
      2012

    Histórico

    • Recebido
      08 Jun 2012
    • Aceito
      11 Ago 2012
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