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Perfil clínico e evolução tardia de pacientes com trombose de stent não-farmacológico

Resumos

INTRODUÇÃO: A trombose de stent é a oclusão súbita de uma artéria tratada com stent em decorrência da formação de trombos. Nosso objetivo foi identificar variáveis associadas à trombose definitiva de stent (TS) em stents não-farmacológicos e avaliar a evolução dos pacientes que apresentaram esse evento. MÉTODOS: Foram analisados pacientes tratados consecutivamente entre dezembro de 2007 e agosto de 2012. Aqueles com TS foram comparados ao grupo sem TS quanto às características clínicas e angiográficas, e evoluções inicial e tardia. RESULTADOS: De um total de 6.495 intervenções coronárias percutâneas (ICPs), foram observados 36 (0,55%) casos de TS, sendo em 18 (50%) precoce, em 14 (38,9%) tardia e em 4 (11,1%) muito tardia. Pacientes com TS mostraram ser mais jovens, com maior prevalência de insuficiência renal crônica e síndrome coronária aguda. TS ocorrereu mais frequentemente em lesões de bifurcação (11% vs. 4%; P = 0,03) ou lesões com presença de trombo visível à angiografia (55,5% vs. 2,8%; P < 0,01). Todos os pacientes foram submetidos a ICP de emergência, sendo observados, na fase intra-hospitalar, infarto do miocárdio (IM) e óbito em 33,3% e 16,6%, respectivamente. O tempo médio de seguimento foi de 30,2 ± 16,3 meses e a descontinuação precoce da terapia antiplaquetária dupla foi verificada em 6 dos 36 casos de TS (16,7%). Na evolução tardia observou-se revascularização do vaso-alvo em 33,3%, IM em 20% e nenhum óbito adicional. CONCLUSÕES: A TS mostrou ser evento com elevada mortalidade hospitalar e alta morbidade tardia. A ocorrência desse evento foi associada a características clínicas e angiográficas de maior complexidade e a menor aderência à terapêutica antiagregante dupla.

Trombose coronária; Angioplastia; Stents


BACKGROUND: Stent thrombosis is the sudden occlusion of a stented coronary artery due to thrombus formation. Our objective was to identify variables associated to definite stent thrombosis (ST) and assess the outcomes of patients treated with bare-metal stents. METHODS: Consecutive patients treated between December 2007 and August 2012 were analyzed. Those with ST were compared to those without ST as to clinical and angiographic characteristics, and early and late outcomes. RESULTS: Of a total of 6,495 percutaneous coronary interventions (PCIs), 36 cases of ST (0.55%) were observed, of which 18 were early (50%), 14 (38.9%) late and 4 (11.1%) very late ST. Patients with ST were younger, with a greater prevalence of chronic renal failure and acute coronary syndromes. ST was more frequent in bifurcation lesions (11% vs. 4%; P = 0.03) or lesions with visible thrombus at angiography (55.5% vs. 2.8%; P < 0.01). All patients were submitted to emergency PCI, and in the in-hospital phase, myocardial infarction (MI) and death were observed in 33.3% and 16.6%, respectively. Mean follow-up was 30.2 ± 16.3 months and early discontinuation of dual antiplatelet therapy was observed in 6 of the 36 cases (16.7%). In the late follow-up target vessel revascularization was observed in 33.3%, MI in 20% and no additional deaths were observed. CONCLUSIONS: ST proved to be an event with high in-hospital mortality and late morbidity. The occurrence of this event was associated to more complex clinical and angiographic characteristics and lower compliance with dual antiplatelet therapy.

Coronary thrombosis; Angioplasty; Stents


ARTIGO ORIGINAL

Perfil clínico e evolução tardia de pacientes com trombose de stent não-farmacológico

Wersley Araújo SilvaI; J. Ribamar Costa JrII; Roberto Ramos BarbosaIII; Jackson StadlerIV; Ricardo A. CostaV; Dimytri A. SiqueiraVI; Rodolfo StaicoVII; Fausto FeresVIII; Áurea J. ChavesIX; Alexandre AbizaidX; Amanda G. M. R. SousaXI; J. Eduardo SousaXII

IMédico cardiologista intervencionista aprimorando do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

IIDoutor. Médico cardiologista intervencionista do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

IIIMédico cardiologista intervencionista do Serviço de Hemodinâmica e Cardiologia Intervencionista do Instituto de Cardiologia do Espírito Santo. Vitória, ES, Brasil

IVMédico cardiologista intervencionista do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

VDoutor. Médico cardiologista intervencionista do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

VIDoutor. Médico cardiologista intervencionista do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

VIIDoutor. Médico cardiologista intervencionista do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

VIIIDoutor. Médico cardiologista intervencionista do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

IXDoutora. Médica cardiologista do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

XLivre-docente. Diretor do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

XILivre-docente. Diretora geral do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

XIILivre-docente. Diretor do Centro de Intervenções em Doenças Estruturais do Coração do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

Correspondência Correspondência: J. Ribamar Costa Jr. Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia Av. Dr. Dante Pazzanese, 500 - Ibirapuera São Paulo, SP, Brasil - CEP 04012-909 E-mail: rmvcosta@uol.com.br

RESUMO

INTRODUÇÃO: A trombose de stent é a oclusão súbita de uma artéria tratada com stent em decorrência da formação de trombos. Nosso objetivo foi identificar variáveis associadas à trombose definitiva de stent (TS) em stents não-farmacológicos e avaliar a evolução dos pacientes que apresentaram esse evento.

MÉTODOS: Foram analisados pacientes tratados consecutivamente entre dezembro de 2007 e agosto de 2012. Aqueles com TS foram comparados ao grupo sem TS quanto às características clínicas e angiográficas, e evoluções inicial e tardia.

RESULTADOS: De um total de 6.495 intervenções coronárias percutâneas (ICPs), foram observados 36 (0,55%) casos de TS, sendo em 18 (50%) precoce, em 14 (38,9%) tardia e em 4 (11,1%) muito tardia. Pacientes com TS mostraram ser mais jovens, com maior prevalência de insuficiência renal crônica e síndrome coronária aguda. TS ocorrereu mais frequentemente em lesões de bifurcação (11% vs. 4%; P = 0,03) ou lesões com presença de trombo visível à angiografia (55,5% vs. 2,8%; P < 0,01). Todos os pacientes foram submetidos a ICP de emergência, sendo observados, na fase intra-hospitalar, infarto do miocárdio (IM) e óbito em 33,3% e 16,6%, respectivamente. O tempo médio de seguimento foi de 30,2 ± 16,3 meses e a descontinuação precoce da terapia antiplaquetária dupla foi verificada em 6 dos 36 casos de TS (16,7%). Na evolução tardia observou-se revascularização do vaso-alvo em 33,3%, IM em 20% e nenhum óbito adicional.

CONCLUSÕES: A TS mostrou ser evento com elevada mortalidade hospitalar e alta morbidade tardia. A ocorrência desse evento foi associada a características clínicas e angiográficas de maior complexidade e a menor aderência à terapêutica antiagregante dupla.

Descritores: Trombose coronária. Angioplastia. Stents.

ABSTRACT

BACKGROUND: Stent thrombosis is the sudden occlusion of a stented coronary artery due to thrombus formation. Our objective was to identify variables associated to definite stent thrombosis (ST) and assess the outcomes of patients treated with bare-metal stents.

METHODS: Consecutive patients treated between December 2007 and August 2012 were analyzed. Those with ST were compared to those without ST as to clinical and angiographic characteristics, and early and late outcomes.

RESULTS: Of a total of 6,495 percutaneous coronary interventions (PCIs), 36 cases of ST (0.55%) were observed, of which 18 were early (50%), 14 (38.9%) late and 4 (11.1%) very late ST. Patients with ST were younger, with a greater prevalence of chronic renal failure and acute coronary syndromes. ST was more frequent in bifurcation lesions (11% vs. 4%; P = 0.03) or lesions with visible thrombus at angiography (55.5% vs. 2.8%; P < 0.01). All patients were submitted to emergency PCI, and in the in-hospital phase, myocardial infarction (MI) and death were observed in 33.3% and 16.6%, respectively. Mean follow-up was 30.2 ± 16.3 months and early discontinuation of dual antiplatelet therapy was observed in 6 of the 36 cases (16.7%). In the late follow-up target vessel revascularization was observed in 33.3%, MI in 20% and no additional deaths were observed.

CONCLUSIONS: ST proved to be an event with high in-hospital mortality and late morbidity. The occurrence of this event was associated to more complex clinical and angiographic characteristics and lower compliance with dual antiplatelet therapy.

Descriptors: Coronary thrombosis. Angioplasty. Stents.

A trombose de stent (TS) é a oclusão súbita de uma artéria tratada com stent em decorrência da formação de trombos, e que se apresenta, na maioria dos pacientes, como morte súbita (~ 20% a 40%), infarto do miocárdio (IM) (~ 50% a 70%) ou necessidade de nova revascularização.1-8

Apesar do aperfeiçoamento da técnica de implante de stent e da terapia antiplaquetária mais efetiva e potente, a TS continua a ocorrer entre 1% e 2% em casos eletivos e em até 5% em pacientes com síndrome coronária aguda.3,6,9-12 Vários estudos observacionais identificaram uma série de fatores de risco clínicos, angiográficos e relacionados ao procedimento para a ocorrência de TS, contribuindo para a identificação de uma população de risco e adoção de medidas preventivas desse evento.3,6,9-11,13

Em decorrência da isquemia miocárdica causada pela oclusão súbita do vaso epicárdico pelo trombo, a revascularização de emergência por meio da intervenção coronária percutânea (ICP) é o tratamento de escolha, no intuito de restaurar a patência do vaso. A aspiração manual do trombo é uma opção atraente e associa-se a maiores taxas de reperfusão miocárdica. A cirurgia de revascularização de emergência é necessária em uma minoria dos casos (< 10%), nos pacientes nos quais não se conseguiu a recanalização do vaso ocluído.1

No presente estudo objetivamos identificar variáveis clínicas e angiográficas e avaliar a evolução tardia de pacientes com TS tratados em um hospital terciário da rede pública de saúde do Estado de São Paulo.

MÉTODOS

Desenho e população do estudo

Realizamos análise retrospectiva dos dados de pacientes tratados no Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia (São Paulo, SP, Brasil), no período de dezembro de 2007 a agosto de 2012. Durante esse período, todos os pacientes submetidos a ICP eletiva ou de emergência tiveram as informações relacionadas às características clínicas, angiográficas e do procedimento e à evolução clínica intra-hospitalar coletadas de maneira prospectiva e armazenadas em um banco de dados eletrônico dedicado, seguindo protocolo preestabelecido.

Para realização deste estudo selecionamos todos os pacientes tratados em nosso serviço com TS em stent não-farmacológico e comparamos suas características clínicas, angiográficas e do procedimento àqueles sem TS. Excluímos os pacientes tratados com stents farmacológicos por representarem a minoria de nossa população e por fazerem parte de protocolos de pesquisa que nem sempre contemplam a ICP da prática clínica diária, a qual almejamos avaliar nesta análise.

Definições

A TS foi definida, de acordo com o Academic Re-search Consortium (ARC)1, como a confirmação angiográfica da presença de trombo, originando-se no interior do stent ou no segmento que envolve os 5 mm proximais ou distais ao stent, associado a pelo menos um dos seguintes critérios, dentro de uma janela de tempo de até 48 horas: sintomas isquêmicos agudos em repouso, novas alterações isquêmicas no eletrocardiograma, elevação e queda típicas dos marcadores de necrose miocárdica, e presença de trombo oclusivo ou não-oclusivo. A TS também foi definida com a confirmação patológica do trombo recente dentro do stent durante autópsia ou pela análise de tecido retirado durante trombectomia.

A TS também foi classificada, de acordo com o tempo de ocorrência após o implante do stent, em: aguda (até 24 horas); subaguda (> 24 horas e até 30 dias); tardia (> 30 dias e até 1 ano); e muito tardia (> 1 ano). A TS aguda e a TS subaguda foram agrupadas como trombose de stent precoce.1

O IM periprocedimento foi definido pela elevação do biomarcador creatina fosfoquinase fração MB > 3 vezes o limite superior do normal no exame realizado até 48 horas pós-procedimento.1 Eventos clínicos adversos maiores (ECAM) foram definidos pelo desfecho combinado de morte por qualquer causa, IM e cirurgia cardíaca de emergência. Sucesso angiográfico foi definido: pela obtenção de fluxo Thrombolysis In Myocardial Infarction (TIMI) grau 3; pela ausência de trombo, dissecção ou perfuração com extravasamento ativo de contraste; e pela estenose residual < 20% (à angiografia coronária quantitativa) no segmento tratado ao final do procedimento. Já o sucesso do procedimento foi definido como sucesso angiográfico mais ausência de ECAM durante a hospitalização índice.

O diagnóstico de insuficiência renal foi estabelecido para os pacientes com clearance de creatinina < 60 ml/min/1,73 m2;.

Procedimento

Os procedimentos de ICP foram realizados de acordo com as recomendações das diretrizes atuais, objetivando resultado angiográfico ótimo após o implante de dispositivo coronário.14 A via de acesso arterial, a escolha do material para realização da ICP (corda-guia, cateter-balão, etc.), o tipo de stent utilizado, a técnica de implante do stent e a terapia medicamentosa adjunta ficaram a critério do operador. Em relação à terapia antitrombótica, o pré-tratamento incluiu aspirina, na dose de 100 mg/dia em caso de uso crônico (> 7 dias) ou dose de ataque de 200 mg administrada > 24 horas antes da ICP, e clopidogrel, na dose de ataque de 300 mg > 24 horas antes da intervenção ou 600 mg antes do procedimento (preferencialmente > 2 horas) em casos de síndrome coronária aguda. Após o procedimento, os pacientes eram orientados a permanecer em uso de terapia antiplaquetária dupla (aspirina 100 mg e clopidogrel 75 mg) por pelo menos um mês em caso de implante de stent(s) não-farmacológico(s) e um ano para stent(s) farmacológico(s). Com relação à terapia antitrombínica durante o procedimento, a heparina intravenosa era administrada na dose de 70 U/kg a 100 U/kg de peso para manter um tempo de coagulação ativada > 250 segundos ou > 200 segundos em caso de administração concomitante de inibidor da glicoproteína IIb/IIIa, utilizado a critério do operador.

Exames complementares eram realizados segundo protocolo da Instituição e incluíam eletrocardiograma com 12 derivações antes, imediatamente após e diariamente após o procedimento, até a alta hospitalar. Já os exames laboratoriais incluíam biomarcadores cardíacos no pré-procedimento, nas primeiras 24 horas pós-procedimento e diariamente até a alta hospitalar.

Análise angiográfica

As análises angiográficas qualitativa e quantitativa foram realizadas no pré e no pós-procedimento. A avaliação qualitativa foi realizada de acordo com os critérios utilizados na classificação do American College of Cardiology/American Heart Association (ACC/AHA),15 sendo consideradas lesões do tipo C quando pelo menos uma das seguintes características estava presente: extensão > 20 mm (lesão difusa); tortuosidade significativa (3 ou mais ângulos > 75 graus no segmento proximal à lesão); angulação significativa da lesão (> 90 graus); lesão de bifurcação com incapacidade de proteção do ramo lateral com a corda-guia; lesão em ponte de veia safena degenerada; e oclusão crônica (> 3 meses). As análises de angiografia coronária quantitativa foram realizadas off-line por operadores experientes com o método, por meio de um programa validado e disponível comercialmente (QAngio XA versão 7,3 - Medis medical imaging systems bv, Leiden, Holanda). A extensão da lesão foi delimitada pela distância entre os pontos imediatamente antes e após a estenose-alvo considerados isentos de ateromatose, ou seja, a transição entre o segmento estenótico e as referências normais. O diâmetro luminar mínimo (DLM) e o diâmetro de referência do vaso (DRV) foram utilizados para calcular a estenose do diâmetro (ED) por meio da seguinte fórmula: ED (%) = [1 - (DLM/DRV)] x 100. Ganho imediato foi definido como a diferença de DLM pré e pós-procedimento (DLM pós-procedimento - DLM pré-procedimento). As variáveis quantitativas foram reportadas nos segmentos intrastent e intrassegmento, o qual incorpora o segmento intrastent mais as bordas 5 mm nas regiões peristent, segundo metodologia previamente descrita.

Análise estatística

Para fins de comparação, a população total foi dividida em dois grupos, de acordo com a ocorrência ou não de trombose, com o objetivo de identificar fatores associados a esse evento adverso. As variáveis qualitativas foram expressas como frequências absolutas e porcentuais e comparadas pelo teste qui-quadrado ou pelo teste exato de Fisher, quando apropriado. Já as variáveis quantitativas foram expressas como média e desvio padrão e comparadas com o teste t de Student. Um valor de P < 0,05 foi considerado significante.

RESULTADOS

Do total de 6.495 ICPs com stents não-farmacológicos realizadas no período, foram observados 36 (0,55%) casos de TS, sendo em 18 (50%) precoce (aguda ou subaguda), em 14 (38,9%) tardia e em 4 (11,1%) muito tardia.

Pacientes com TS eram mais jovens (58,6 ± 11,4 anos vs. 63,7 ± 11,9 anos; P < 0,01) e apresentaram maior prevalência de ICP prévia (100% vs. 14,1%; P < 0,01), insuficiência renal crônica (41,7% vs. 28%; P < 0,01) e procedimentos realizados na vigência de síndrome coronária aguda, quando comparados ao grupo sem TS. Não houve diferença entre os grupos em relação ao gênero, a outras comorbidades ou à prevalência de fatores de risco para aterosclerose (Tabela 1).

A TS ocorreu mais frequentemente em lesões de bifurcação (11% vs. 4%; P = 0,03) ou em lesões com presença de trombo visível à angiografia (55,5% vs. 2,8%; P < 0,01) (Tabela 2). Também mostrou tendência a ocorrer mais em lesões situadas em enxertos degenerados de veia safena (11% vs. 4,5%; P = 0,06) ou em lesões > 20 mm (66,7% vs. 51,3%; P = 0,07).

Na Tabela 3 encontram-se os resultados da análise de angiografia coronária quantitativa dos pacientes com TS.

Entre os pacientes com TS o tempo médio de seguimento clínico foi de 30,2 ± 16,3 meses. A descontinuação precoce da terapia antiplaquetária dupla (< 1 mês para stents não-farmacológicos) foi verificada em 6 dos 36 casos de TS (16,7%).

Todos os pacientes foram submetidos a ICP de emergência, sendo observada, na fase intra-hospitalar, incidência de IM periprocedimento, nefropatia induzida pelo contraste e óbito de 33,3%, 22,2% e 16,6%, respectivamente (Tabela 4). Na evolução tardia observou-se revascularização do vaso-alvo em 33,3%, realizada por meio de cirurgia de revascularização miocárdica na maioria dos casos. Novo IM foi observado em 6 casos (20%), 2 deles resultantes de TS recorrente. Não houve óbitos adicionais.

DISCUSSÃO

Os principais achados de nosso estudo foram: a TS após o implante de stents não-farmacológicos ocorreu na fase tardia (> 30 dias) em 50% dos casos; a descontinuação precoce da terapia antiplaquetária dupla foi verificada em um sexto dos pacientes com TS; a presença de insuficiência renal, lesões em bifurcação ou com trombo evidente à angiografia, e lesões longas ou situadas em enxertos de veia safena degenerados foi mais frequente nos pacientes com TS; e a mortalidade intra-hospitalar nessa população foi elevada (16,7%), assim como a incidência de novos ECAM no seguimento clínico tardio.

Historicamente a TS em stents não-farmacológicos era um evento que ocorria mais frequentemente nos primeiros dias e, por definição, não era relatada após o primeiro mês. Somente após o reconhecimento das tromboses tardias com a braquiterapia surgiram os primeiros relatos de tromboses tardias com os stents não-farmacológicos.16,17 Wenaweser et al.17 demonstraram, numa das maiores séries de pacientes tratados com stents não-farmacológicos, que a TS ocorreu em 1,6% dos casos, sendo aguda em 11%, subaguda em 64% e tardia em 25% dos pacientes.

A TS é um fenômeno complexo e sua etiologia é multifatorial. De acordo com alguns estudos,3,13,18,19 a descontinuação precoce da terapia antiplaquetária dupla (< 1 mês para os stents não-farmacológicos) representa um dos mais importantes fatores associados à TS. Iakovou et al.3 demonstraram, em pacientes tratados com stents farmacológicos, que o preditor independente de TS mais importante foi a descontinuação prematura da terapêutica antiplaquetária [hazard ratio (HR) 89,78, intervalo de confiança de 95% (IC 95%) 29,9-269,6], seguido de insuficiência renal (HR 6,49, IC 95% 2,6-16,15), lesões em bifurcação (HR 6,42, IC 95% 2,93-14,07), diabetes (HR 3,71, IC 95% 1,74-7,89) e fração de ejeção (HR 1,09; IC 95% 1,05-1,36 para cada redução de 10%).

A insuficiência renal está associada a maior taxa de mortalidade, apesar de uma ICP bem-sucedida.20-22 A insuficiência renal está associada a anormalidades na microcirculação e no metabolismo, as quais podem predispor à formação de trombo.23,24 No que diz respeito às lesões de bifurcação, estudos de histopatologia sugerem que os locais de ramificação arterial apresentam baixo cisalhamento e baixa velocidade de fluxo, predispondo ao desenvolvimento de placa aterosclerótica e trombos.25-27

Limitações do estudo

São limitações deste estudo a análise retrospectiva dos dados entre duas coortes com variáveis clínicas não ajustadas e sua realização em um único centro. Adicionalmente, foram incluídos apenas indivíduos com TS atendidos em nossa instituição, o que pode subestimar a real incidência do fenômeno.

CONCLUSÕES

Nesta experiência contemporânea de mundo real, a TS mostrou-se um evento com elevadas taxas de mortalidade hospitalar e morbidade tardia. Conforme demonstrado em outras séries, a ocorrência desse evento foi associada a características clínicas e angiográficas de maior complexidade e a menor aderência à terapêutica antiagregante prescrita.

CONFLITO DE INTERESSES

Os autores declaram não haver conflito de interesses relacionado a este manuscrito.

Recebido em: 10/10/2012

Aceito em: 4/12/2012

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  • Correspondência:

    J. Ribamar Costa Jr.
    Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia
    Av. Dr. Dante Pazzanese, 500 - Ibirapuera
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      25 Fev 2013
    • Data do Fascículo
      Dez 2012

    Histórico

    • Recebido
      10 Out 2012
    • Aceito
      04 Dez 2012
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