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Evolução tardia de pacientes com lesões coronárias complexas tratados com o novo Stent Metálico MGuardTM

Resumos

INTRODUÇÃO: A embolização de fragmentos de ateroma/trombo durante a intervenção coronária percutânea (ICP) ocasiona distúrbios de perfusão da microcirculação. O novo stent MGuardTM, que é revestido com uma rede de polietileno, demonstrou eficácia na prevenção de complicações embólicas durante a ICP primária. No entanto, a evolução clínica tardia de pacientes tratados com o stent MGuardTM permanece desconhecida. MÉTODOS: Uma série de 65 pacientes portadores de lesões coronárias de novo tratados com o stent MGuardTM foi analisada. Os dados clínicos basais, do procedimento e do seguimento clínico tardio (média de tempo, 2,6 ± 1,4 anos) foram coletados retrospectivamente por meio da revisão de prontuários médicos e/ou contato telefônico direto. RESULTADOS: A média de idade foi de 66,1 ± 13,7 anos, 32,3% eram diabéticos, 49,2% tinham infarto agudo do miocárdio (IAM) prévio, e 44,6% apresentaram-se com síndrome coronária aguda. Dois terços das lesões estavam localizados em pontes de safena, quase metade tinha presença de trombo e a maioria foi classificada como tipo B2/C. O stent MGuardTM foi implantado com sucesso em todos os casos. Ao final do procedimento, fluxo TIMI 3 foi alcançado em 93,4% e o sucesso angiográfico foi de 91,8%. No seguimento tardio, as taxas de eventos adversos incluíram óbito cardiovascular em 6,2%, IAM não-fatal em 9,2%, revascularização da lesão-alvo em 9,2% e trombose de stent definitiva/provável em 1,5%. CONCLUSÕES: O seguimento tardio de pacientes com lesões coronárias complexas tratados com o stent MGuardTM demonstrou baixas taxas de revascularização da lesão-alvo e de trombose do stent.

Angioplastia; Stents; Embolia; Trombose coronária


BACKGROUND: The embolization of atheroma/thrombus fragments during percutaneous coronary intervention (PCI) causes microcirculatory perfusion disturbances. The new MGuardTM, a mesh-based bare-metal stent, demonstrated efficacy in the prevention of embolic complications during primary PCI. However, the late clinical outcome of patients treated with the MGuardTM stent remains unknown. METHODS: A series of 65 patients with de novo coronary lesions treated with MGuardTM stent was analyzed. Baseline clinical data, procedure and late clinical follow-up (mean duration, 2.6 ± 1.4 years) data were collected retrospectively by a review of medical records and/or direct telephone contact. RESULTS: Mean age was 66.1 ± 13.7 years, 32.3% of patients were diabetic, 49.2% had a previous acute myocardial infarction (AMI), and 44.6% presented with acute coronary syndrome. Two thirds of the lesions were located in a saphenous vein graft, almost half of the lesions had thrombus and most were classified as type B2/C. The MGuardTM stent was successfully implanted in all cases. At the end of the procedure, TIMI 3 flow was achieved in 93.4% and angiographic success was 91.8%. In the late clinical follow-up, adverse event rates included cardiac death in 6.2%, non-fatal AMI in 9.2%, target lesion revascularization in 9.2% and definite/probable stent thrombosis in 1.5%. CONCLUSIONS: The late follow-up of patients with complex coronary lesions treated with the MGuardTM stent demonstrated low rates of target lesion revascularization and stent thrombosis.

Angioplasty; Stents; Embolism; Coronary thrombosis


ARTIGO ORIGINAL

Evolução tardia de pacientes com lesões coronárias complexas tratados com o novo Stent Metálico MGuardTM

Late clinical follow-up of patients with complex coronary lesions treated with the new MGuardTM Bare-Metal Stent

Guilhermo Guerra GuimarãesI; Ricardo A. da CostaII; Alexandre AbizaidIII; J. Ribamar Costa Jr.IV; Rodolfo StaicoV; Dimytri Alvim SiqueiraVI; Galo MaldonadoVII; Sérgio BragaVIII; Fausto FeresIX; Daniel ChamiéX; Gentil Barreira de Aguiar FilhoXI; Jackson Rafael StadlerXII; Danillo TaiguaraXIII; Luiz Fernando TanajuraXIV; Amanda G. M. R. SousaXV; J. Eduardo SousaXVI

IMédico residente do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

IIDoutor. Médico cardiologista intervencionista do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

IIILivre-docente. Diretor do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

IVDoutor. Médico cardiologista intervencionista do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

VDoutor. Médico cardiologista intervencionista do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

VIDoutor. Médico cardiologista intervencionista do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

VIIMédico cardiologista intervencionista do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

VIIIDoutor. Chefe da Seção de Hemodinâmica do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

IXDoutor. Médico cardiologista intervencionista do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

XMédico cardiologista intervencionista do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

XIMédico residente do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

XIIMédico residente do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

XIIIMédico residente do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

XIVDoutor. Chefe da Seção Médica de Angioplastia Coronária do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

XVLivre-docente. Diretora geral do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

XVILivre-docente. Diretor do Centro de Intervenções em Doenças Estruturais do Coração do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. São Paulo, SP, Brasil

Correspondência Correspondência: Guilhermo Guerra Guimarães. Av. Dr. Dante Pazzanese, 500 – Vila Mariana São Paulo, SP, Brasil – CEP 04012-909 E-mail: guilhermoguerra@bol.com.br

RESUMO

INTRODUÇÃO: A embolização de fragmentos de ateroma/trombo durante a intervenção coronária percutânea (ICP) ocasiona distúrbios de perfusão da microcirculação. O novo stent MGuardTM, que é revestido com uma rede de polietileno, demonstrou eficácia na prevenção de complicações embólicas durante a ICP primária. No entanto, a evolução clínica tardia de pacientes tratados com o stent MGuardTM permanece desconhecida.

MÉTODOS: Uma série de 65 pacientes portadores de lesões coronárias de novo tratados com o stent MGuardTM foi analisada. Os dados clínicos basais, do procedimento e do seguimento clínico tardio (média de tempo, 2,6 ± 1,4 anos) foram coletados retrospectivamente por meio da revisão de prontuários médicos e/ou contato telefônico direto.

RESULTADOS: A média de idade foi de 66,1 ± 13,7 anos, 32,3% eram diabéticos, 49,2% tinham infarto agudo do miocárdio (IAM) prévio, e 44,6% apresentaram-se com síndrome coronária aguda. Dois terços das lesões estavam localizados em pontes de safena, quase metade tinha presença de trombo e a maioria foi classificada como tipo B2/C. O stent MGuardTM foi implantado com sucesso em todos os casos. Ao final do procedimento, fluxo TIMI 3 foi alcançado em 93,4% e o sucesso angiográfico foi de 91,8%. No seguimento tardio, as taxas de eventos adversos incluíram óbito cardiovascular em 6,2%, IAM não-fatal em 9,2%, revascularização da lesão-alvo em 9,2% e trombose de stent definitiva/provável em 1,5%.

CONCLUSÕES: O seguimento tardio de pacientes com lesões coronárias complexas tratados com o stent MGuardTM demonstrou baixas taxas de revascularização da lesão-alvo e de trombose do stent.

DESCRITORES: Angioplastia. Stents. Embolia. Trombose coronária.

ABSTRACT

BACKGROUND: The embolization of atheroma/thrombus fragments during percutaneous coronary intervention (PCI) causes microcirculatory perfusion disturbances. The new MGuardTM, a mesh-based bare-metal stent, demonstrated efficacy in the prevention of embolic complications during primary PCI. However, the late clinical outcome of patients treated with the MGuardTM stent remains unknown.

METHODS: A series of 65 patients with de novo coronary lesions treated with MGuardTM stent was analyzed. Baseline clinical data, procedure and late clinical follow-up (mean duration, 2.6 ± 1.4 years) data were collected retrospectively by a review of medical records and/or direct telephone contact.

RESULTS: Mean age was 66.1 ± 13.7 years, 32.3% of patients were diabetic, 49.2% had a previous acute myocardial infarction (AMI), and 44.6% presented with acute coronary syndrome. Two thirds of the lesions were located in a saphenous vein graft, almost half of the lesions had thrombus and most were classified as type B2/C. The MGuardTM stent was successfully implanted in all cases. At the end of the procedure, TIMI 3 flow was achieved in 93.4% and angiographic success was 91.8%. In the late clinical follow-up, adverse event rates included cardiac death in 6.2%, non-fatal AMI in 9.2%, target lesion revascularization in 9.2% and definite/probable stent thrombosis in 1.5%.

CONCLUSIONS: The late follow-up of patients with complex coronary lesions treated with the MGuardTM stent demonstrated low rates of target lesion revascularization and stent thrombosis.

DESCRIPTORS: Angioplasty. Stents. Embolism. Coronary thrombosis.

A embolização distal de conteúdo aterotrombótico durante a intervenção coronária percutânea (ICP) é um fenômeno indesejável que conduz a obstrução microvascular e diminuição da perfusão miocárdica1, o que pode levar à ocorrência de infarto periprocedimento e, consequentemente, redução da função ventricular e aumento da mortalidade cardíaca.2-4 Várias abordagens terapêuticas, incluindo a utilização de dispositivos dedicados, foram testadas em diferentes cenários clínicos com o intuito de prevenir as complicações embólicas. Os resultados, entretanto, não se mostraram consistentes. Adicionalmente, alguns dispositivos percutâneos estiveram associados a aumento de custo e tempo de procedimento.

O stent MGuardTM (Inspire MD, Tel-Aviv, Israel) é um novo dispositivo metálico de baixo perfil, desenhado especificamente para a prevenção de embolização distal durante a ICP, uma vez que suas hastes metálicas são recobertas por uma dupla rede polimérica. Estudos prévios envolvendo lesões complexas com alto potencial trombogênico (síndrome coronária aguda, ponte de safena degenerada, trombo, etc.) demonstraram eficácia do stent MGuardTM na prevenção de complicações embólicas.5,6 Além disso, o stent MGuardTM mostrou-se superior aos stents convencionais (não-recobertos) em relação à reperfusão do vaso-alvo em pacientes com infarto agudo do miocárdio com supradesnivelamento do segmento ST (IAMCSST) submetidos a ICP primária.7

A despeito dos resultados clínicos promissores obtidos com o stent MGuardTM em várias séries clínicas, a evolução tardia de pacientes com doença arterial coronária tratados com esse dispositivo permanece desconhecida. Logo, o objetivo do presente estudo foi avaliar o seguimento clínico tardio (> 6 meses) de uma série de pacientes tratados com o stent MGuardTM na prática diária em uma instituição pública terciária.

MÉTODOS

Desenho do estudo e população-alvo

A atual análise constitui-se de um estudo observacional, retrospectivo, realizado em um centro único (Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, São Paulo, SP, Brasil). A população do estudo incluiu 65 pacientes (66 lesões coronárias) submetidos a ICP, eletiva ou de emergência, com implante do stent MGuardTM, na rotina do Serviço de Cardiologia Invasiva, entre 2007 e 2012. De maneira geral, o stent MGuardTM era considerado para o tratamento de pacientes portadores de lesões coronárias de novo, em vaso nativo ou em ponte de safena, as quais apresentavam características angiográficas associadas a instabilidade, como trombo, úlcera e defeito de preenchimento, e/ou estavam em vigência de síndrome coronária aguda. Os pacientes do estudo foram selecionados no banco de dados local e a coleta de dados foi realizada por meio da revisão de prontuários e relatórios médicos, angiografias e contato telefônico.

Dispositivo do estudo

As características e especificações do dispositivo MGuardTM já foram reportadas previamente.6 Em resumo, o stent MGuardTM incorpora uma plataforma metálica de aço inoxidável 316L recortada a laser, revestida ou recoberta por uma dupla rede de fibras microscópicas de tereftalato de polietileno, as quais se encontram aderidas às hastes metálicas (Figura 1). Essa rede atua aprisionando o material contido entre o stent e a parede do vaso, prevenindo, dessa forma, a embolização distal de material aterotrombótico durante seu implante. Tem sistema de liberação balão-expansível com balão de baixo perfil, compatível com cateter-guia 5 F.


Procedimento

De forma geral, as ICPs foram realizadas de acordo com as diretrizes atuais. A realização de pré- e/ou pós-dilatação ficou a critério do operador, assim como o uso de inibidores da glicoproteína IIb/IIIa. Os stents MGuardTM eram disponibilizados em diâmetros entre 2,5 mm e 4 mm (com intervalo de 0,5 mm entre cada medida) e extensão entre 12 mm e 40 mm. O tratamento de lesão não-alvo no vaso-alvo ou vaso não-alvo com stent convencional durante o procedimento índex poderia ser realizado, se necessário.

A terapia antiplaquetária dupla pré-procedimento era constituída por aspirina 100-200 mg/dia e dose de ataque de clopidogrel 300 mg, pelo menos 24 horas antes do procedimento, ou 600 mg se < 24 horas. Após a intervenção, aspirina 100-200 mg/dia foi prescrita indefinidamente e clopidogrel 75 mg/dia foi mantido por um mínimo de 6 meses. Durante a ICP, a terapia antitrombínica consistiu em heparina não-fracionada na dose de 100 UI/kg (ou 70 UI/kg em caso do uso de inibidor da glicoproteína IIb/IIIa), objetivando-se alcançar tempo de coagulação ativada > 250 segundos (ou entre 200 segundos e 250 segundos, no caso de uso de inibidor da glicoproteína IIb/IIIa).

Análise angiográfica

As análises angiográficas qualitativas e quantitativas foram realizadas offline por um operador experiente, seguindo protocolo pré-definido. De maneira geral, as cineangiografias pré- e pós-procedimento foram realizadas após a administração intracoronária de nitroglicerina (50-200 µg), em pelo menos duas projeções ortogonais correspondentes, sendo armazenadas em formato digital DICOM. As características morfológicas e a complexidade da lesão foram definidas de acordo com os critérios do sistema de classificação modificado do American College of Cardiology/American Heart Association (ACC/AHA). O fluxo coronário foi determinado de acordo com os critérios do estudo Thrombolysis In Myocardial Infarction (TIMI). As complicações angiográficas durante o procedimento (dissecção, fluxo lento, embolização distal, fenômeno no reflow) foram determinadas de acordo com critérios e definições preestabelecidos. A análise de angiografia coronária quantitativa (ACQ) foi realizada utilizando-se um programa computadorizado dedicado e com detecção semiautomática de bordas do lúmen (QAngio XA, Medis Medical Imaging System, Leiden, Holanda). A ponta do cateter-guia preenchida por contraste foi utilizada para calibração. O diâmetro mínimo do lúmen e o diâmetro de referência do vaso, obtido pela referência interpolada, foram utilizados para calcular o diâmetro da estenose:

DE = (1 - DML / DRV) x 100

onde DE = diâmetro da estenose, DML = diâmetro mínimo do lúmen e DRV = diâmetro de referência do vaso. Ganho imediato foi definido como a diferença do diâmetro mínimo do lúmen pré- e pós-procedimento (DML pós-procedimento - DML pré-procedimento). As análises de ACQ foram reportadas no segmento intrastent e intrassegmento, o qual incluía o segmento intrastent mais os 5 mm das bordas proximal e distal fora do stent.

As análises angiográficas qualitativas e quantitativas foram realizadas em 61 das 66 lesões, uma vez que em 5 casos os filmes angiográficos não estavam disponíveis. Todas as análises foram feitas no laboratório de ACQ do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia.

Seguimento clínico e definições

O seguimento clínico tardio foi realizado por meio de revisão de prontuários e/ou contatos telefônicos diretos. O tempo médio de seguimento clínico foi de 945 dias (2,6 ± 1,4 anos). O objetivo primário foi avaliar a taxa de eventos cardíacos adversos maiores (ECAM), definida como a ocorrência de óbito cardiovascular, infarto agudo do miocárdio não-fatal e revascularização do vaso-alvo. Todos os óbitos foram considerados cardiovasculares, a menos que uma causa não-cardíaca pudesse ser claramente estabelecida. Infarto agudo do miocárdio não-fatal foi definido como elevação maior que três vezes acima do valor de referência laboratorial dos níveis de creatina quinase fração MB (CK-MB), que não implicasse óbito do paciente. Revascularização da lesão-alvo foi definida como nova revascularização por ICP ou cirurgia de revascularização miocárdica do segmento previamente tratado com o stent MGuardTM. Revascularização do vaso-alvo foi definida como nova revascularização por ICP ou cirurgia de revascularização miocárdica do vaso previamente tratado com o stent MGuardTM. Trombose de stent foi definida de acordo com os critérios do Academic Research Consortium (ARC) em: definitiva (presença de síndrome coronária aguda com confirmação angiográfica ou anatomopatológica da oclusão do stent); provável (ocorrência de morte súbita < 30 dias após o procedimento índex ou infarto agudo do miocárdio no território miocárdico tratado, sem confirmação angiográfica da oclusão do stent); e possível (ocorrência de morte súbita > 30 dias após o procedimento índex). A trombose de stent ainda foi classificada de acordo com a ocorrência temporal, incluindo as fases aguda (< 24 horas pós-procedimento), subaguda (entre 24 horas e 30 dias pós-procedimento), tardia (entre 1 mês e 12 meses pós-procedimento) e muito tardia (> 12 meses pós-procedimento). Sucesso angiográfico foi definido como a obtenção de fluxo TIMI 3, sem dissecção e estenose residual < 50% no segmento tratado ao final do procedimento.

Análise estatística

As variáveis qualitativas foram apresentadas como frequências e porcentagens e as variáveis quantitativas, como médias e desvios padrão. A ocorrência de ECAM em função do tempo foi descrita por meio de curvas de Kaplan-Meier.

RESULTADOS

A média de idade foi de 66,1 ± 13,7 anos, 26,2% dos pacientes eram do sexo feminino, 32,3% tinham diabetes e 49,2% tinham infarto agudo do miocárdio prévio. Em relação à apresentação clínica, 44,6% dos pacientes apresentaram-se com síndrome coronária aguda, incluindo 15,4% de IAMCSST (Tabela 1). Das 66 lesões inicialmente consideradas (um paciente teve duas lesões tratadas em dois vasos-alvo distintos), 44 lesões (67,7% dos casos) estavam localizadas em enxertos de ponte de safena. Em relação às características das lesões (n = 61), observou-se alta prevalência de trombos (42,6%) e de pontes de safena degeneradas (37,7%). Consequentemente, lesões com elevada complexidade (tipo B2/C) foram encontradas na maioria dos casos (85,2%). Adicionalmente, a prevalência de fluxo TIMI 0 ou 1 no pré-procedimento foi de 11,5% (Tabela 2).

Durante o procedimento, não foram utilizados filtros de proteção distal em nenhum dos casos. Pré-dilatação da lesão foi realizada em 34,5% dos casos; um total de 70 stents MGuardTM foi implantado nas 66 lesões (1,06 ± 0,2 stent por lesão); e em 60,6% das lesões realizou-se pós-dilatação. Os valores de extensão, diâmetro e pressão de insuflação nominais dos balões e stents utilizados são apresentados na Tabela 3. Complicações angiográficas foram observadas em número relativamente grande de pacientes, sendo lentificação de fluxo coronário anterógrado (16,4%) e no reflow (8,2%) os principais fenômenos observados. Ao final do procedimento, o fluxo TIMI 3 foi alcançado em 93,4% e o sucesso angiográfico foi de 91,8%. A Tabela 4 apresenta os dados de ACQ (n = 61). As médias da extensão da lesão e do diâmetro de referência do vaso no pré-procedimento eram de 13,2 ± 6,8 mm e 2,99 ± 0,68 mm, respectivamente. Ao final do procedimento, a média dos diâmetros da estenose foi < 20%.

Na fase intra-hospitalar, 6 pacientes apresentaram infarto agudo do miocárdio periprocedimento (5 sem onda Q e 1 com onda Q), não sendo observados outros eventos adversos até a alta. No seguimento clínico tardio (média de tempo de 2,6 ± 1,4 anos), as taxas cumulativas de eventos adversos após a alta hospitalar incluíram óbito cardiovascular em 6,2% dos pacientes, infarto agudo do miocárdio não-fatal em 9,2%, revascularização do vaso-alvo em 12,3%, revascularização da lesão-alvo em 9,2%, e ECAM em 23,1%. Com relação à trombose de stent, os eventos classificados como definitivo/provável ocorreram em 1,5% dos pacientes (Tabela 5). A Figura 2 apresenta a curva de sobrevivência livre de ECAM.


DISCUSSÃO

Diversos autores publicaram estudos que demonstraram o desempenho do dispositivo MGuardTM em diferentes cenários. Grube et al.5 publicaram um estudo prospectivo com 41 pacientes com o objetivo de avaliar a viabilidade e a segurança do stent MGuardTM durante a ICP. Foram realizadas monitorizações clínica e laboratorial com biomarcadores cardíacos, eletrocardiografia e angiografia coronária aos 6 meses. Em praticamente metade dos pacientes (56%), o vaso-alvo era ponte de safena; entretanto, nenhum paciente recebeu inibidor da glicoproteína IIb/IIIa ou dispositivo de proteção embólica distal. Mesmo assim, as taxas de sucesso angiográfico e do procedimento foram de 100% e 95%, respectivamente. No seguimento de 6 meses, 19,5% dos pacientes foram submetidos a revascularização do vaso-alvo. Já no acompanhamento muito tardio desses pacientes (12 meses a 27 meses), observou-se apenas uma revascularização do vaso-alvo adicional. Em nossa análise, que incluiu 65 pacientes com perfis clínico e angiográfico complexos, 67,7% dos casos envolviam ponte de safena (metade com morfologia "degenerada"), 15,4% receberam inibidor da glicoproteína IIb/IIIa, mas nenhum utilizou dispositivo de proteção embólica distal. Ao final do procedimento, a taxa de sucesso angiográfico foi de 91,8%. Já no seguimento muito tardio (2,6 ± 1,4 anos), 12,3% dos pacientes foram submetidos a revascularização do vaso-alvo. Esses resultados tardios sugerem taxas de revascularização do vaso-alvo aceitáveis, considerando-se a localização (ponte de safena) e a complexidade das lesões, além da ausência de um componente farmacológico no stent MGuardTM. Estudo realizado por Costa et al.6, que incluiu 30 pacientes com reestudo angiográfico protocolar aos 6 meses, demonstrou perda tardia do lúmen de 1,05 ± 0,77 mm em pontes de safena (n = 16) e de 0,95 ± 0,66 mm (n = 14) em vasos nativos tratados com o stent MGuardTM. Tais valores assemelham-se aos encontrados em estudos com stents convencionais não-farmacológicos utilizados na prática clínica e justificam, pelo menos em parte, as taxas de revascularização da lesão-alvo/revascularização do vaso-alvo encontradas nos estudos mencionados. Outro aspecto relevante é a ausência de impacto negativo, em termos de formação de hiperplasia neointimal, decorrente da presença de cobertura polimérica no stent MGuardTM destinada a impedir a migração de trombo para o leito distal durante a ICP.

Vários estudos também avaliaram o uso do stent MGuardTM nos pacientes em vigência de síndrome coronária aguda. Stone et al.7 publicaram um estudo prospectivo e randomizado (Safety and Efficacy Study of MGuard Stent After a Heart Attack – MASTER), com 433 pacientes, com o objetivo de avaliar o benefício do stent MGuardTM em pacientes com IAMCSST submetidos a ICP em até 12 horas do início dos sintomas. O desfecho primário foi a resolução completa do supradesnivelamento do segmento ST, definida como diminuição > 70% do mesmo. Não foram encontradas diferenças nas características basais dos pacientes entre os grupos, entretanto o grupo submetido ao implante do stent MGuardTM apresentou maior taxa de fluxo TIMI 3 ao final do procedimento (91,7% vs. 82,9%; P = 0,006), bem como maior taxa de resolução completa do supradesnivelamento do segmento ST (57,8% vs. 44,7%; P = 0,008). A análise de subgrupos não mostrou diferenças entre eles. Em relação aos desfechos clínicos após 30 dias, houve tendência a diminuição da mortalidade cardiovascular no grupo MGuardTM (0 vs. 1,9%; P = 0,06), sem diferença estatística para os outros desfechos avaliados. Ainda no cenário das síndromes coronárias agudas, Lindefjeld et al.8 publicaram uma análise com 15 pacientes submetidos a implante do stent MGuardTM em situações de alta carga trombótica, sendo 53% durante IAMCSST. Não foram utilizados filtros de proteção embólica distal, apesar de realizadas 40% das ICPs em pontes de safena, sendo obtido fluxo TIMI 3 em todos os casos. Em nosso estudo, a taxa de fluxo TIMI 3 ao final do procedimento (93,4%) foi semelhante à encontrada no braço tratado com o stent MGuardTM do estudo MASTER (91,7%). Tais achados podem ser justificados pela elevada prevalência de trombo e complicações embólicas nos estudos. Notavelmente, os resultados com o stent MGuardTM demonstraram superioridade em comparação ao grupo controle no estudo MASTER, sugerindo eficácia desse stent na prevenção de embolização distal em comparação ao tratamento convencional.

A eficácia dos dispositivos de proteção embólica distal na prevenção de complicações trombóticas durante a ICP em pontes de safena já foi extensamente validada e incorporada na prática clínica. Todavia, a utilização de tais dispositivos pode ser laboriosa e muitas vezes inviável, além de adicionar custo e tempo ao procedimento. Digno de nota é o fato de que tais dispositivos não foram utilizados durante a ICP em enxertos venosos em vários estudos com o stent MGuardTM; mesmo assim, tal medida não parece ter penalizado os resultados. A possibilidade de abordagem terapêutica de lesões com elevada carga trombótica, envolvendo enxertos venosos degenerados, com um stent de baixo perfil e sem a necessidade de dispositivos de proteção embólica é, sem dúvida, bastante atraente e desejável. Esteves et al.9 publicaram um estudo comparativo, não-randomizado, de ICP em pontes de safena, com 38 pacientes (16 no grupo MGuardTM e 22 no grupo stent convencional com uso de filtro de proteção embólica distal), que demonstrou que esses dispositivos foram similares quanto à ocorrência de ECAM aos 30 dias. Por outro lado, alguns consideram que ambos os dispositivos poderiam atuar de forma sinérgica, principalmente nos casos com elevado conteúdo trombótico. Mesmo que a maioria dos relatos com o stent MGuardTM demonstre taxas relativamente altas de sucesso do procedimento a despeito da não-utilização de dispositivos de proteção embólica em pontes de safena, não existem recomendações formais para seu uso isolado até o momento, em decorrência da falta de análises comparativas. Logo, novos estudos, devidamente desenhados, são necessários para avaliar essa possibilidade.

CONCLUSÕES

O seguimento tardio de pacientes com lesões coronárias complexas tratados com o stent MGuardTM demonstrou baixas taxas de revascularização da lesão-alvo e de trombose do stent.

CONFLITO DE INTERESSES

Os autores declaram não haver conflito de interesses relacionado a este manuscrito.

Recebido em: 8/1/2013

Aceito em: 28/2/2013

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  • Correspondência:

    Guilhermo Guerra Guimarães.
    Av. Dr. Dante Pazzanese, 500 – Vila Mariana
    São Paulo, SP, Brasil – CEP 04012-909
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      09 Maio 2013
    • Data do Fascículo
      Mar 2013

    Histórico

    • Recebido
      08 Jan 2013
    • Aceito
      28 Fev 2013
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