Acessibilidade / Reportar erro

A COMPATIBILIDADE DOS VALORES DA CIDADANIA ECOLÓGICA COM OS VALORES DAS COMUNIDADES NO PÓS-GUERRA NO CONTESTADO

Resumo

Este artigo tem por objetivo estudar os valores da cidadania ecológica e os valores das comunidades caboclas no período pós-guerra do Contestado, analisando a compatibilidade entre eles. Por meio de abordagem indutiva, a pesquisa procura conceituar e localizar historicamente a cidadania ecológica, resgatando seus principais valores. Em seguida, descreve a cultura cabocla remanescente no oeste catarinense e seus valores inerentes. Estabelecidas essas bases, é demonstrada a compatibilidade entre esses valores por meio do resgate bibliográfico.

Palavras-chave:
caboclos; cidadania ecológica; Contestado; valores

Abstract

his paper aims to study the values of ecological citizenship and the values of the cabocla communities in the post-Contestado War period, analyzing the compatibility between them. Through an inductive approach, the research seeks to conceptualize and historically locate ecological citizenship, rescuing its main values. Then, it describes the cabocla culture remaining in western Santa Catarina and its inherent values. Once these bases are established, the compatibility between these values is demonstrated through bibliographical survey

Keywords:
caboclos; Contestado; ecological citizenship; values

Resumen

Este artículo tiene como objetivo estudiar los valores de la ciudadanía ecológica y los valores de las comunidades caboclas en el período posterior a la Guerra del Contestado, analizando la compatibilidad entre ellos. A través de un enfoque inductivo, la investigación busca conceptualizar y ubicar históricamente la ciudadanía ecológica, rescatando sus principales valores. A continuación, describe la cultura cabocla remanente en el oeste de Santa Catarina y sus valores inherentes. Una vez establecidas esas bases, se demuestra la compatibilidad entre esos valores a través de búsqueda bibliográfica

Keywords:
caboclos; ciudadanía ecológica; Contestado; valores

Introdução

A principal motivação em pesquisar sobre os valores caboclos no pós-guerra no Contestado e os valores da cidadania ecológica veio justamente na perspectiva de trabalhar uma construção comparativa inédita. Esses assuntos requerem atenção de estudo, já que tratam de características em comum que precisam ser resgatadas. Assim, é fundamental conhecer profundamente os valores culturais caboclos e seu processo histórico voltado à preservação de seus hábitos. Do mesmo modo, é imprescindível localizar os valores da cidadania ecológica como referencial para um novo modelo de cidadania. Os valores que serão tratados nesta pesquisa dialogam, interagem e são compatíveis, de maneira que, quando estabelecidos como fruto da relação social, tendem a promover mudanças no panorama vivenciado. O método de abordagem da pesquisa é o indutivo, aliado à técnica de levantamento bibliográfico.

O problema que orienta esta pesquisa envolve a investigação da compatibilidade dos valores da cidadania ecológica com os valores inerentes à cultura cabocla remanescente no oeste catarinense após a guerra do Contestado. A hipótese é afirmativa, de modo que o objetivo deste trabalho é exatamente demonstrar essa compatibilidade.

Para tanto, o artigo está organizado da seguinte maneira: a primeira seção procura localizar historicamente a cidadania ecológica e seus principais valores. Já a segunda seção pretende descrever a cultura cabocla remanescente no oeste catarinense e seus principais valores. Por fim, a terceira seção, de posse das informações obtidas nas partes anteriores, visa demonstrar que os valores inerentes à cultura cabocla remanescente no território em questão são compatíveis com os valores da cidadania ecológica.

1 Cidadania ecológica: referências conceituais

De acordo com Birnfeld ( 2006BIRNFELD, C. A. S. Cidadania ecológica. Pelotas: Delfos, 2006.), na investigação da emergência contemporânea de uma nova dimensão para a cidadania de conteúdo ecológico, há três temáticas distintas em confluência: a cidadania; a emergência do ambientalismo; e o contexto jurídico-político formado pelas emanações normativas relativas ao respectivo momento civilizatório.

Birnfeld ( 2006BIRNFELD, C. A. S. Cidadania ecológica. Pelotas: Delfos, 2006.), antes de demonstrar a emergência de um movimento ambiental global e nacional, de conteúdo ecológico e com significativos reflexos no campo jurídico, resgata em T. H. Marshall ( 1967MARSHALL, T. H. Cidadania, classe social e status. Tradução: Meton Porto Gadelha. Rio de Janeiro: Zahar, 1967.) (1967) o conceito de cidadania. Birnfeld ( 2006BIRNFELD, C. A. S. Cidadania ecológica. Pelotas: Delfos, 2006.) ressalta que Marshall trabalhou o conceito de cidadania em três dimensões, a saber: cidadania civil; cidadania política; e cidadania social. Ainda de acordo com Birnfeld ( 2006BIRNFELD, C. A. S. Cidadania ecológica. Pelotas: Delfos, 2006.), Marshall relaciona a emergência de cada uma dessas dimensões a um século diferente, sendo os direitos civis ligados ao século XVIII, os direitos políticos ao século XIX e os direitos sociais ao século XX.

A cidadania civil trouxe como principal valor a liberdade em seu sentido mais amplo, como um direito a um espaço privado para o exercício de suas religiões, pensamentos e atividades comerciais (HIRSCHMAN, 1995). Além disso, a cidadania civil abarcaria as liberdades individuais como virtudes da burguesia, a meta da superação do controle autocrático estatal e do modelo feudal ( BIRNFELD, 2006BIRNFELD, C. A. S. Cidadania ecológica. Pelotas: Delfos, 2006.).

Os valores da cidadania política relacionam-se com os direitos de participação política e a progressiva extensão do sufrágio a um número maior de setores da população. É a própria conquista democrática 1 1 Nesse novo contexto, com a inserção de um número superior de parcelas da população na ordem de formação da vontade estatal, abre-se a perspectiva de que a vontade estatal possa ser dirigida para satisfazer os interesses da maioria da população, e não apenas da minoria detentora dos meios de produção ( BIRNFELD, 2006). tomada em todos os sentidos possíveis ( BIRNFELD, 2006BIRNFELD, C. A. S. Cidadania ecológica. Pelotas: Delfos, 2006.).

A dimensão social envolve todo o conjunto de valores relacionados ao welfare state, a atuação estatal não mais neutra, mas dirigida especialmente para a garantir o bem-estar da população. Há uma complexidade de fatores que permitem sua emergência, notadamente uma série de lutas sindicais e populares por melhores condições de trabalho e vida, em paralelo a um avanço do comunismo e a uma crise capitalista sem precedentes, da qual resultam várias políticas, no seio do próprio capitalismo, de redistribuição de renda e oportunidades ( BIRNFELD, 2006BIRNFELD, C. A. S. Cidadania ecológica. Pelotas: Delfos, 2006.).

A dimensão ecológica tem suas raízes a partir desse contexto, no qual o sistema produtivo se aperfeiçoa, multiplicando, ao mesmo tempo, as indústrias, os produtos, o mercado de consumo e o comprometimento do meio ambiente.

Além de um rearranjo com relação a suas funções, o Estado-Nação tradicional termina o século XX debilitado e limitado diante de imensos conglomerados privados; ademais, propagam-se acordos transnacionais que expandem os limites territoriais de produção e consumo. Um inédito, generalizado e múltiplo processo de exclusão acentua-se: além da já histórica exclusão da maior parte dos frutos da riqueza pela crescente desigualdade de renda, multiplicam-se contextos de exclusão do próprio processo produtivo pelos crescentes avanços tecnológicos; no pano de fundo, uma exclusão das grandes potencialidades de capacidade criativa, do pensamento crítico, engendrada pelos processos anteriores, em um complexo contexto de cooptação e alienação ( BIRNFELD, 2006BIRNFELD, C. A. S. Cidadania ecológica. Pelotas: Delfos, 2006.).

Ponto culminante, o século XX encerra-se com o vislumbre da maior das exclusões: a exclusão do futuro, da própria possibilidade de perpetuação da espécie humana e do próprio planeta. A expansão demográfica, o efeito estufa, o buraco na camada de ozônio, a contaminação e o esgotamento dos recursos naturais, o genocídio de espécies de animais e plantas, as crises energética, hídrica e alimentar, entre outros riscos ( BIRNFELD, 2006BIRNFELD, C. A. S. Cidadania ecológica. Pelotas: Delfos, 2006.).

A exclusão do futuro conecta-se à ideia da inabilidade desse sistema produtivo em lidar com o próprio planeta. Diz respeito à devastação e ao esgotamento dos recursos terrestres, ao presente e jamais alcançado grau de contaminação e risco para todas as espécies do planeta 2 2 Eric Hobsbawn, em semelhante exposição, demonstra que há pelo menos três efeitos do desenvolvimento capitalista mundial que fogem ao controle: a primeira é a ecologia. Em virtude da destruição da biosfera, da extinção de animais e da mudança de habitat de espécies de plantas e humanos, acaba havendo mudanças extremas. A segunda é a brecha existente entre os países desenvolvidos e os países pobres. O mundo desenvolvido é três vezes maior per capita que o restante da humanidade, consumindo mais e impactando o meio ambiente de maneira mais intensa. A terceira questão é sobre a humanidade ser subordinada à economia que rompe as relações entre seres humanos, com a criação de um vácuo moral, no qual há o anseio do indivíduo pelo aqui e agora ( BLACKBURN, 1993, p. 267). . Trata-se da exclusão de futuro do maior número de espécies vivas do planeta, entre as quais a espécie humana ( BIRNFELD, 2006BIRNFELD, C. A. S. Cidadania ecológica. Pelotas: Delfos, 2006.).

Nessa perspectiva, a dimensão ecológica da cidadania é concebida, de acordo com Birnfeld ( 2006BIRNFELD, C. A. S. Cidadania ecológica. Pelotas: Delfos, 2006.), como sucessiva e paralela às dimensões civil, política e social, trazendo uma reação social aos riscos da exclusão do futuro, tanto quanto a cidadania civil foi uma reação ao modelo feudal, a cidadania política ao absolutismo, e a cidadania social à desigualdade na apropriação dos frutos do processo produtivo. Nesse sentido, incorpora as dimensões anteriores e as respectivas reações, conferindo-lhes novos horizontes. Trata-se de pensar um planeta sustentável que visa garantir existência digna, liberdade de criação e participação política às gerações contemporâneas e àquelas que virão ( BIRNFELD, 2006BIRNFELD, C. A. S. Cidadania ecológica. Pelotas: Delfos, 2006.).

Diante disso, a emergência da dimensão ecológica da cidadania, ao fim do século XX, tem o século XXI como palco para sua consolidação. Há em seu cerne um importante conjunto de valores, cujos principais serão tratados a seguir.

1.1 Os valores da cidadania ecológica

A cidadania ecológica traz em seu arcabouço algumas premissas que são importantes para o exercício dos direitos, dos deveres e das responsabilidades dos cidadãos em relação à questão ambiental. Um ambiente saudável somente pode ser desfrutado pelas futuras gerações se uma luta for travada contra o modelo hegemônico de desenvolvimento que privilegia o mercado e sufoca cada vez mais os recursos naturais.

É necessário combater as ameaças à natureza, além de reconsiderar outros valores intrínsecos que visam incluir e garantir direitos, mesmo nas diferenças, além de considerar todas as espécies de vida e cultura em todas as suas formas e aspectos ancestrais. Com a destruição da natureza, muitos outros processos são impactados, por exemplo, a diversidade das comunidades tradicionais e suas relações com a natureza.

Nessa concepção, considerando os objetivos deste trabalho, resgatam-se estes quatro valores imanentes à cidadania ecológica: (a) sustentabilidade socioambiental; (b) respeito à diversidade natural e cultural; (c) equidade transgeracional: o direito a ter direitos; e (d) antropocentrismo alargado: um novo olhar sobre a posição do homem e da mulher na natureza. A seguir, uma análise mais aprofundada de cada um deles.

1.1.1 Sustentabilidade socioambiental

A sustentabilidade envolve a garantia do meio ambiente e dos recursos naturais para as presentes e futuras gerações. É importante destacar que se trata de uma sustentabilidade socioambiental focada na manutenção do meio ambiente e da qualidade de vida da sociedade como um todo, diferenciando-se da mera sustentabilidade econômica, aplicada historicamente na manutenção e ampliação da troca de mercadorias.

O ser humano sempre se apossou dos recursos naturais para sua mantença e desenvolvimento, alargando as práticas de exploração após a Revolução Industrial. O fator econômico, há séculos, vem exercendo forte pressão no meio ambiente humano, que fica em segundo plano quando há a busca de lucro a todo custo ( BERGAMASCHI; AROSEMENA; GOMES, 2018BERGAMASCHI, J. D. G.; AROSEMENA; R. I. M; GOMES, S. A. A sustentabilidade como um valor. Revista Eletrônica Direito e Política, Itajaí, v. 13, n. 3, p. 1428-1457, 2018. Disponível em: https://siaiap32.univali.br/seer/index.php/rdp/article/view/13724. Acesso em: 30 out. 2021.
https://siaiap32.univali.br/seer/index.p...
).

Diante desse cenário, o conceito de sustentabilidade envolve o controle sensato do uso dos recursos naturais e preservação do meio ambiente para resguardo da saúde e vida humanas e das demais formas de vida, conservando esses recursos para as gerações atuais e para as gerações que estão por vir ( SILVEIRA; AYALA, 2012SILVEIRA, P. G.; AYALA, P. A. A caracterização do princípio de sustentabilidade no direito brasileiro e o transconstitucionalismo como teoria de efetivação. RIDB, ano 1, n. 3, p. 1827-1859, 2012. Disponível em: https://www.cidp.pt/revistas/ridb/2012/03/2012_03_1827_1859.pdf. Acesso em: 31 maio 2023.
https://www.cidp.pt/revistas/ridb/2012/0...
).

Assim, Bosselmann ( 2008BOSSELMANN, K. Direitos humanos, meio ambiente e sustentabilidade. Revista CEDOUA, Coimbra, v. 8, n. 21, p. 9-38, jan. 2008. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/270537805_Direitos_humanos_ambiente_e_sustentabilidade. Acesso em: 5 jun. 2023.
https://www.researchgate.net/publication...
) expressa que se almeja um potencial desenvolvimento de todos os direitos humanos, de modo que expressem que essa humanidade é integrante da biosfera, sendo a natureza detentora de um valor intrínseco e a humanidade responsável por essa natureza. Assim, é essencial que se reconheça a correlação entre direitos humanos e proteção do meio ambiente, pensando sempre que “os direitos humanos preocupam-se com a proteção do bem-estar individual, enquanto o direito ambiental preocupa-se com a proteção do bem-estar coletivo” ( BOSSELMANN, 2008, p. 6BOSSELMANN, K. Direitos humanos, meio ambiente e sustentabilidade. Revista CEDOUA, Coimbra, v. 8, n. 21, p. 9-38, jan. 2008. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/270537805_Direitos_humanos_ambiente_e_sustentabilidade. Acesso em: 5 jun. 2023.
https://www.researchgate.net/publication...
).

Segundo Ayala (2012 apud SILVEIRA; AYALA, 2012, p. 1.832SILVEIRA, P. G.; AYALA, P. A. A caracterização do princípio de sustentabilidade no direito brasileiro e o transconstitucionalismo como teoria de efetivação. RIDB, ano 1, n. 3, p. 1827-1859, 2012. Disponível em: https://www.cidp.pt/revistas/ridb/2012/03/2012_03_1827_1859.pdf. Acesso em: 31 maio 2023.
https://www.cidp.pt/revistas/ridb/2012/0...
),

[…] a consideração de um princípio de sustentabilidade enfatiza um padrão de justiça plural, que integra necessidades humanas e um imperativo de proteção dos recursos naturais, além de proporcionar a afirmação de uma moralidade plural, que agrega uma noção de justiça interespécies e intergeracional.

O próprio conceito de sustentabilidade, além de definir a responsabilidade com as gerações presentes e futuras, presume a obrigatoriedade de o Estado assumir medidas de proteção adequadas, as quais devem demarcar ou neutralizar a ocorrência de danos ao ambiente cuja irreversibilidade total ou parcial seja capaz de desencadear efeitos, destruições e desequilíbrios negativos ( CANOTILHO, 2010CANOTILHO, J. J. G. O princípio da sustentabilidade como princípio estruturante do direito constitucional. Revista de Estudos Politécnicos, Barcelos, v. 8, n. 13, p. 7-18, 2010. Disponível em: https://scielo.pt/pdf/tek/n13/n13a02.pdf. Acesso em: 5 jun. 2023.
https://scielo.pt/pdf/tek/n13/n13a02.pdf...
).

Segundo Veiga ( 2010VEIGA, J. E. da. Sustentabilidade: a legitimação de um novo valor. 2. ed. São Paulo: Senac, 2010.), o sentido essencial de sustentabilidade como um valor retrata a responsabilidade pelas oportunidades e pelos limites que acomodarão as vidas das próximas gerações da espécie humana. Não obstante, a sustentabilidade como valor requer que o desenvolvimento de uma nação se sobreponha a seu crescimento econômico, de modo que raciocine acerca da qualidade de vida dos indivíduos.

1.1.2 Respeito à diversidade natural e cultural

A sociedade atual, multicultural, engloba a diversidade étnica e cultural dos diversos grupos existentes. Todavia, também há a constatação de desequilíbrio no acesso a bens econômicos e culturais dos diversos grupos, sendo os aspectos de classe social, raça, gênero e diversidade cultural marcantes para esses contrastes 3 3 Conforme explicam Baez e Wolf ( 2013), a dimensão cultural da dignidade humana considera as particularidades culturais das pessoas ou do grupo social ao qual elas pertencem, levando em consideração o momento histórico vivido e respeitando os aspectos individuais que as diferenciam umas das outras. , por isso a diversidade cultural pode ser visualizada como parte da própria biodiversidade ( CARDOSO; MUZZETI, 2007CARDOSO, S. M. V.; MUZZETI, L. R. As dimensões da diversidade cultural brasileira. Revista Ibero-Americana de Estudos em Educação (RIAEE), Araraquara, v. 2, n. 1, 2007. Disponível: https://periodicos.fclar.unesp.br/iberoamericana/article/view/451/330. Acesso em: 3 out. 2021.
https://periodicos.fclar.unesp.br/iberoa...
).

Em sua própria formação histórica, a sociedade brasileira detém o pluralismo, com diversos grupos identitários dentro do território nacional reivindicando uma ancestralidade peculiar e com uma história singular de apropriação dos recursos naturais. Esse corpo social também se afirma como novos sujeitos de direitos específicos. O respeito à diversidade cultural e natural desses grupos está ligado à visão humanista alargada e respeitadora da total multiplicidade de energias criadoras existentes na Terra. É fundamental que exista harmonia entre essas forças, além do reconhecimento desses novos valores. É primordial que haja a consideração de todas as formas de dignidade como fundamento principal à preservação da vida, respeitando os direitos fundamentais mínimos assegurados. Deve haver um processo de mudança cultural para abranger o bem-estar do ser humano assentado na felicidade de todos com um novo quadro de valores ( RODRIGUES, 2009RODRIGUES, V. J. C. B. Desenvolvimento sustentável: uma introdução crítica. Lisboa: Principia, 2009.).

É indispensável refletir sobre quem são os sujeitos da diversidade, para que se possa respeitar esses valores culturais de grupos que lutam por seu espaço e que deparam frequentemente uma série de preconceitos e discriminações ( BAVARESCO; TACCA, 2016BAVARESCO, P. R.; TACCA, D. P. Multiculturalismo e diversidade cultural: uma reflexão. Unoesc & Ciência, Joaçaba, v. 7, n. 1, p. 61-68, 2016. Disponível em: https://portalperiodicos.unoesc.edu.br/achs/article/view/8511. Acesso em: 30 out. 2021.
https://portalperiodicos.unoesc.edu.br/a...
).

Segundo Oliveira ( OLIVEIRA, 2015OLIVEIRA, J. M. A diversidade cultural como garantia constitucional. Jusbrasil, 29 jul. 2015. Disponível: https://joaomarcosr.jusbrasil.com.br/artigos/213667955/a-diversidade-cultural-como-garantia-constitucional. Acesso em: 10 dez. 2021.
https://joaomarcosr.jusbrasil.com.br/art...
), firmar a proteção da cultura, que é um valor intrínseco do indivíduo e do coletivo, resultado do princípio da dignidade da pessoa humana e um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito, portanto, enfatiza a proteção à diversidade cultural.

1.1.3 Equidade transgeracional: o direito a ter direitos

Em essência, o conceito de equidade envolve reconhecer, de maneira imparcial, o direito de cada um perante qualquer um. Além disso, o conceito traz em si um senso de justiça em que o tratamento ou o modo de agir com relação a determinada pessoa deve ser baseado no reconhecimento das individualidades e necessidades específicas de cada ser humano, tomado em sua perspectiva transgeracional. A equidade não se restringe às individualidades presentes, devendo abarcar também as gerações futuras, indivíduos que sequer nasceram para manifestar seus desejos e suas necessidades.

A valoração dos inúmeros planos, sejam estes culturais, históricos ou econômicos, torna-se indispensável, afirmando-se, ainda, que cada pessoa dispõe de uma valoração própria, ainda que emparelhada em uma comunidade relativamente homogênea ( MERGULHÃO, 2018MERGULHÃO, M. F. D. O princípio da equidade: por uma nova exegese. Revista Serviam Juris, Rio de Janeiro, v. 3, n. 3, p. 45-57, 2018. Disponível em: http://revistas.icesp.br/index.php/Serviam_Juris/article/view/378. Acesso em: 30 nov. 2021.
http://revistas.icesp.br/index.php/Servi...
).

Para Escorel ( ESCOREL, 2009ESCOREL, S. Equidade em saúde. Dicionário da Educação Profissional em Saúde. Rio de Janeiro: Fiocruz/EPSJV, 2009. Disponível em: http://www.sites.epsjv.fiocruz.br/dicionario/verbetes/equsau.html. Acesso em: 7 dez. 2021.
http://www.sites.epsjv.fiocruz.br/dicion...
), atualmente o princípio da equidade mostra-se relacionado aos direitos das minorias, incluindo a diferença no ambiente público da cidadania, que tem por propósito basilar a igualdade. De acordo com essa perspectiva, compreender as diferenças, as necessidades e as particularidades dos distintos grupos sociais possibilita um bem-estar em substituição de um sistema excludente e desigual ( BARROS; SOUSA, 2016BARROS, F. P. C.; SOUSA, M. F. Equidade: seus conceitos, significações e implicações para o SUS. Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 25, n. 1, p. 9-18, 2016. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/299357712_Equidade_seus_conceitos_significacoes_e_implicacoes_para_o_SUS. Acesso em: 7 dez. 2021.
https://www.researchgate.net/publication...
).

Segundo Arendt ( 1987ARENDT, H. A condição humana. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1987.), a representação da cidadania é também o direito a ter direitos, mesmo na diferença, como fato gerador de igualdade entre os cidadãos 4 4 Nas palavras de Sposati ( 1999, p. 128), “a noção de igualdade só se completa se compartida à noção de equidade. Não basta um padrão universal se este não comportar o direito à diferença. Não se trata mais de um padrão homogêneo, mas de um padrão equânime”. . Sendo assim, a equidade é uma prática fundamental para alcançar os ideais de justiça e cidadania plena capazes de garantir o gozo de uma situação de igual bem-estar para todos os cidadãos ( BARROS; SOUSA, 2016BARROS, F. P. C.; SOUSA, M. F. Equidade: seus conceitos, significações e implicações para o SUS. Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 25, n. 1, p. 9-18, 2016. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/299357712_Equidade_seus_conceitos_significacoes_e_implicacoes_para_o_SUS. Acesso em: 7 dez. 2021.
https://www.researchgate.net/publication...
).

A equidade transgeracional na dimensão ecológica da cidadania envolve o reconhecimento do outro, não apenas o humano e não restrito apenas ao tempo presente, o que implica o necessário alargamento das perspectivas e estratégias de sustentabilidade.

1.1.4 O antropocentrismo alargado: um novo olhar sobre a posição do homem e da mulher na natureza

Especialmente a partir da década de 1970, observa-se, de maneira proeminente, um ajustamento do dever do ente estatal em proteger os bens ambientais. É o começo da perspectiva de um Estado democrático ambiental um pouco mais focado em equilibrar os riscos intrínsecos às atividades econômicas com a preservação do meio ambiente ( ROCHA, 2019ROCHA, A. M. O direito ambiental como novo paradigma estatal. Jus, 30 dez. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/76399/o-direito-ambiental-como-novo-paradigma-estatal. Acesso em: 22 out. 2021.
https://jus.com.br/artigos/76399/o-direi...
).

O antropocentrismo alargado traz em suas bases a compreensão de que o destino do planeta está nas decisões humanas, porém oferece a perspectiva de que nem todas as decisões são admissíveis. O conceito está atrelado a decisões que relacionam o meio ambiente e o ser humano, descortinando novas visões dos bens ambientais, transcendendo a perspectiva meramente econômica ( ROCHA, 2019ROCHA, A. M. O direito ambiental como novo paradigma estatal. Jus, 30 dez. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/76399/o-direito-ambiental-como-novo-paradigma-estatal. Acesso em: 22 out. 2021.
https://jus.com.br/artigos/76399/o-direi...
). Segundo Leite ( 2003, p. 137LEITE, J. R. M. Dano ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.), o antropocentrismo alargado “centra a preservação ambiental na garantia da dignidade do próprio ser humano”, constituindo-se em modelo alargado justamente porque essa proteção ambiental é necessária para a “sobrevivência da própria espécie humana”.

François Ost ( 1997OST, F. A natureza à margem da lei: a ecologia à prova do direito. Tradução: Joana Chaves. Lisboa: Instituto Piaget, 1997.) afirma que, além da crise ecológica com a destruição dos recursos naturais, o vínculo do ser humano com a natureza se alterna em extremos antiéticos e confusos, pois o homem trata a natureza ora como objeto, ora como sujeito das relações jurídicas, quando melhor seria tratá-la como um projeto.

Diante desse constante dilema, Leite ( 2003, p. 76LEITE, J. R. M. Dano ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.) destaca o antropocentrismo alargado como mecanismo mediador perante essas visões, representando o abandono de ideias de separação, dominação e submissão de maneira a buscar “uma interação entre os universos distintos e a ação humana”.

Desse modo, o antropocentrismo alargado diferencia-se do antropocentrismo tradicional, que limita o homem à condição de senhor de todas as criaturas, reconhecendo que o ser humano, por meio de suas idiossincrasias, pode identificar nas demais espécies do planeta, assim como na biosfera como um todo, relações de interdependência e verdadeira parceria, assumindo assim a perspectiva de uma interação com respeito à biodiversidade e ao conjunto de interações naturais, em que eventualmente ocupará a posição de gestor com a finalidade de restaurar e garantir a manutenção da própria natureza com todos os seus elementos.

2 A cultura cabocla remanescente no oeste catarinense

Apesar de não ser um evento tão difundido no ambiente escolar, sobretudo à luz de sua importância histórica, a Guerra do Contestado foi um dos conflitos armados de maiores proporções da história da República. Ocorrida entre 1912 e 1916, teve como causas as mudanças ocorridas na posse das terras, no acesso a recursos e na legitimidade de costumes constituídos por uma camada numerosa da população camponesa pobre que vivia em uma vasta região interiorana no sul do Brasil. Essas mudanças atingiram de maneira decisiva milhares de sertanejos, que se rebelaram em nome daquilo que consideravam seus direitos, demonstrando consciência de que estes estavam sendo atacados pela República ( NUNES, 2017NUNES, D. V. Caboclos contra o progresso: conflito ambiental na guerra do Contestado. 2017. 148 p. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) – Instituto de Ciências Humanas e Sociais, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2017. Disponível em: https://sucupira.capes.gov.br/sucupira/public/consultas/coleta/trabalhoConclusao/viewTrabalhoConclusao.jsf?popup=true&id_trabalho=5288020. Acesso em: 31 maio 2023.
https://sucupira.capes.gov.br/sucupira/p...
).

O Contestado impactou e ainda nos dias atuais influencia a vida e a cultura daqueles que dele sobrevivem e são seus descendentes. De acordo com Tomazi ( 2008, p. 1TOMAZI, G. Heranças e direitos dos jovens do Contestado. Visão Global, Joaçaba, v. 11, n. 1, p. 113-138, 2008. Disponível em: https://periodicos.unoesc.edu.br/visaoglobal/article/view/493/237. Acesso em: 7 dez. 2021.
https://periodicos.unoesc.edu.br/visaogl...
, adaptado),

[…] depois de quase um século, o próprio Contestado já foi ressignificado, de tal forma que a juventude e toda a comunidade cabocla encontram nele um sentido, uma inspiração e uma mística que lhes permitem viver no presente de maneira solidária, com estima e reconhecimento, enfrentando a dura realidade em que se encontram, porém confiantes em dias melhores.

Diante dessa permanência de hábitos, é necessário trazer o conceito de cultura cabocla localizando-a para posteriormente tratar de seus valores. A cultura se faz presente na sociedade como elemento engrandecedor, que reúne valor, incorpora socialmente, expande intelectualmente, transmite costumes, perpetua visões, enaltece a identidade de um povo e forma cidadãos ( BRAGA; SALDANHA, 2014BRAGA, J. C. F.; SALDANHA, B. S. O direito cultural como elemento emancipatório e civilizatório e a efetivação da proteção do patrimônio cultural no Brasil. In: XXIII CONPEDI, 23., 2014, São Paulo. Anais […]. Florianópolis: Conpedi, 2014. p. 330-350. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/328007046_O_Direito_Cultural_como_elemento_emancipatorio_e_civilizatorio_e_a_efetivacao_da_protecao_do_patrimonio_cultural_no_Brasil. Acesso em: 7 dez. 2021.
https://www.researchgate.net/publication...
).

Nessa perspectiva, o direito à cultura cabocla opera como estandarte necessário para o resgate de valores que colaboram para sua permanência cultural mesmo diante de um cenário que só visa silenciá-la.

2.1 Os valores das comunidades caboclas remanescentes no Contestado

Compreende-se a cultura cabocla como um conjunto de valores e representações construídos ao longo da experiência histórica do século XIX “que contém como elementos fundamentais determinada forma de relação com a terra e com a natureza naquela região” ( CARVALHO, 2009, p. 165CARVALHO, T. M. Coerção e consenso na Primeira República: a Guerra do Contestado (1912-1916). 2009. 214 f. Tese (Doutorado em História) – Instituto de Ciências Humanas e Filosofia, Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2009. Disponível em: https://app.uff.br/riuff/bitstream/handle/1/26738/Coer%c3%a7%c3%a3o%20e%20Consenso%20na%20Primeira%20Rep%c3%bablica\_%20A%20Guerra%20do%20Contestado%20%281912%20-%201916%29.pdf?sequence=1&isAllowed=y. Acesso em: 7 nov. 2021.
https://app.uff.br/riuff/bitstream/handl...
).

Como não ocupa posição central nas cidades, a população cabocla tem sua cultura constantemente violentada e ofuscada. Entretanto, isso não significa que essa população deixe de procurar um posicionamento na hierarquia social e urbana ( ZATTA; ROCHA; FRAGA, set./dez. 2020ZATTA, A.; ROCHA, D. L.; FRAGA, N. C. Vozes circundantes no Vale dos Imigrantes: das redes que confirmam a região do Contestado ao ofuscamento das cidades caboclas que resistem oferecendo produto e cultura cabocla secular ao turismo regional. Geographia Opportuno Tempore, Londrina, v. 6, n. 3, p. 122-141, set./dez. 2020. Disponível em: http://anais.uel.br/portal/index.php/contestado/article/view/938/1358. Acesso em: 28 maio 2023
http://anais.uel.br/portal/index.php/con...
).

Brandt ( 2007BRANDT, M. Uso comum e apropriação da terra no município de Fraiburgo-SC: do Contestado à colonização. 2007. 310 f. Dissertação (Mestrado em Geografia) – Centro de Filosofia e Ciências Humanas – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2007. Disponível em: https://repositorio.ufsc.br/xmlui/bitstream/handle/123456789/90647/241372.pdf?sequence=1&isAllowed=y. Acesso em: 31 maio 2023.
https://repositorio.ufsc.br/xmlui/bitstr...
) relata que a colonização do vale do Rio do Peixe lançou valores externos à região, sendo que restaram duas possibilidades para a população local: adaptação ou exclusão. A desterritorialização, desde a guerra santa, promoveu um rompimento da identidade e destruiu as formas de organização social cabocla, o que levou a população a resistir e a lutar ainda mais pela aproximação com seu local natural para a manutenção de sua cultura ( SILVA; SOUZA; CORDEIRO, 2019SILVA, E. F.; SOUZA, D. C.; CORDEIRO, S. M. A. O legado cultural na região do Contestado. Geographia Opportuno Tempore, Londrina, v. 5, n. 3, p. 188-201, 2019. Disponível em: https://www.uel.br/revistas/uel/index.php/Geographia/article/viewFile/37827/26480. Acesso em: 29 nov. 2021.
https://www.uel.br/revistas/uel/index.ph...
).

Fazem parte da cultura sagrada material cabocla: os cruzeiros, as fontes d’água, as igrejas, as grutas, os quadros santos, os cemitérios e as formações naturais onde ocorreram os principais combates durante o conflito ( LINO, 2012LINO, J. A cultura material da Guerra do Contestado como documento histórico. Cadernos do CEOM, Chapecó, ano 25, n. 36, p. 45-70, 2012. Disponível em: https://bell.unochapeco.edu.br/revistas/index.php/rcc/article/view/1152. Acesso em: 7 dez. 2021.
https://bell.unochapeco.edu.br/revistas/...
). No pós-guerra, a cultura, mesmo silenciada, é renovada pelos agentes em cada teatro, por cada conversa, a cada visitante de sua história ( SILVA; SOUZA; CORDEIRO, 2019SILVA, E. F.; SOUZA, D. C.; CORDEIRO, S. M. A. O legado cultural na região do Contestado. Geographia Opportuno Tempore, Londrina, v. 5, n. 3, p. 188-201, 2019. Disponível em: https://www.uel.br/revistas/uel/index.php/Geographia/article/viewFile/37827/26480. Acesso em: 29 nov. 2021.
https://www.uel.br/revistas/uel/index.ph...
). O orgulho de ser caboclo enaltece o patrimônio arqueológico e histórico, a divulgação da memória e a identidade desse grupo étnico e social tão diverso ( LINO, 2012LINO, J. A cultura material da Guerra do Contestado como documento histórico. Cadernos do CEOM, Chapecó, ano 25, n. 36, p. 45-70, 2012. Disponível em: https://bell.unochapeco.edu.br/revistas/index.php/rcc/article/view/1152. Acesso em: 7 dez. 2021.
https://bell.unochapeco.edu.br/revistas/...
).

A cultura da população cabocla pós-guerra no Contestado, embora não imutável, orienta-se pelos costumes locais, almejando, de certa maneira, reforçá-los. Isso é visível, inclusive, com o zelo pela natureza, sob preceitos dos monges relativos ao uso de recursos naturais.

É necessário pensar o caboclo como um ser coletivo no plano da diversidade cultural e da política da diferença, que se reconfigura no plano atual como identidade de etnia perante um universo que ainda mantém um caráter homogeneizado da modernidade e permanência da cultura branca ( LEFF, 2008LEFF, E. Saber ambiental: sustentabilidade, racionalidade, complexidade, poder. 6. ed. Tradução: Lucia Mathilde Endlich Orth. Petrópolis: Vozes, 2008.).

Ainda de acordo com Leff ( 2008LEFF, E. Saber ambiental: sustentabilidade, racionalidade, complexidade, poder. 6. ed. Tradução: Lucia Mathilde Endlich Orth. Petrópolis: Vozes, 2008.), a valorização da cultura cabocla permite reviver o passado no presente e resgatar as memórias e histórias caladas, reconfigurando nesse ser cultural caboclo a atualização dessas significações de oprimidos. Para tanto, é necessário contraditar o discurso que diminui o ser cultural caboclo estimulando suas vozes, mobilizando esses novos atores para abrir novos horizontes nessa história. Diante disso, é primordial fortalecer a esse povo o direito à cultura, legitimando seus preceitos de comunidade sobre seus territórios e espaços étnicos.

Nessa perspectiva e conforme os propósitos deste trabalho, resgatam-se três lutas que expressam valores imanentes à cultura cabocla pós-guerra do Contestado, a saber:

2.1.1 A reivindicação da identidade cultural e de um lugar para sustentabilidade

Há mais de um século, o povo caboclo do oeste catarinense remanescente da guerra no Contestado luta por seu espaço, reivindicando o direito à identidade cultural. Nessa guerra, a população cabocla perdeu boa parte de sua identidade em decorrência do conflito sangrento e cruel ( SILVA; SOUZA; CORDEIRO, 2019SILVA, E. F.; SOUZA, D. C.; CORDEIRO, S. M. A. O legado cultural na região do Contestado. Geographia Opportuno Tempore, Londrina, v. 5, n. 3, p. 188-201, 2019. Disponível em: https://www.uel.br/revistas/uel/index.php/Geographia/article/viewFile/37827/26480. Acesso em: 29 nov. 2021.
https://www.uel.br/revistas/uel/index.ph...
).

O local é o território onde a sustentabilidade se fixa em bases ecológicas e identidades culturais. É o lugar social em que os atores sociais desempenham sua autonomia para conter a degradação ambiental e impulsionar potenciais ambientais, a união gerada diante de sistemas sincrônicos e diacrônicos em planos autogestionários para atender aos anseios dos povos. Refletindo sobre a questão do lugar como elemento importante, não se pode negar que os caboclos detinham um elo com a natureza, demonstrado nos costumes seus anseios políticos e sociais ( NUNES, 2017NUNES, D. V. Caboclos contra o progresso: conflito ambiental na guerra do Contestado. 2017. 148 p. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) – Instituto de Ciências Humanas e Sociais, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2017. Disponível em: https://sucupira.capes.gov.br/sucupira/public/consultas/coleta/trabalhoConclusao/viewTrabalhoConclusao.jsf?popup=true&id_trabalho=5288020. Acesso em: 31 maio 2023.
https://sucupira.capes.gov.br/sucupira/p...
).

Segundo Alier ( 2007, p. 113ALIER, J. M. O ecologismo dos pobres. São Paulo: Contexto, 2007.), uma das questões que remontam à origem da guerra do Contestado foi a distribuição desproporcional no acesso à natureza, “aos benefícios obtidos dos recursos naturais e aos serviços proporcionados pelo ambiente como um sistema de suporte da vida”.

A racionalidade no cenário de guerra no Contestado e no pós-conflito continua sendo a de acumulação por espoliação, que no passado se iniciou com a mercadificação, a privatização da terra, a expulsão e a eliminação violenta dessas populações tradicionais, assim como a permuta de várias formas de direitos de propriedade ( HARVEY, 2003HARVEY, D. A condição pós-moderna. São Paulo: Loyola, 2003.).

Atualmente, o que se reivindica por parte desses novos atores e remanescentes de guerra é a questão do lugar, do acesso à terra, uma vez que é com ela que esses agentes podem reconstruir seus modos de vida e se contrapor às novas formas de degradação ambiental que sofrem ( LEFF, 2008LEFF, E. Saber ambiental: sustentabilidade, racionalidade, complexidade, poder. 6. ed. Tradução: Lucia Mathilde Endlich Orth. Petrópolis: Vozes, 2008.).

A existência do latifúndio favorece a expansão exploratória da madeira e a constante degradação do solo, o que além de transformar a paisagem é responsável por deixar vias intransitáveis. Aquilo que é inviável economicamente permanece no ambiente como descarte, deformando a paisagem. A pequena propriedade de camponeses caboclos é sufocada, pois a dependência econômica da madeira leva a uma situação de normalidade, isso com relação ao cultivo de pinus, que invade os limites das cidades do Contestado ( GEMELLI, 2018GEMELLI, D. D. “Onde planta o pinus não dá mais nada”: degradação da natureza e do trabalho no Contestado e a necessidade da reunificação homem/mulher-natureza (terra-trabalho). 2018. 266 f. Tese (Doutorado em Geografia) – Programa de Pós-Graduação em Geografia, Universidade Estadual Paulista, Presidente Prudente, 2018. Disponível em: https://repositorio.unesp.br/handle/11449/154020. Acesso em: 7 dez. 2021.
https://repositorio.unesp.br/handle/1144...
).

A batalha da comunidade cabocla pós-guerra do Contestado por sua identidade é também a luta por um modo de vida sustentável. É a luta por um contexto de sustentabilidade socioambiental impregnado em sua própria cultura, tal como ocorre com as mais de 200 nações indígenas espalhadas pelo Brasil.

2.1.2 O reconhecimento da igualdade de direitos na diversidade

Diante da luta e resistência cabocla remanescente de guerra, é imprescindível a discussão sobre igualdade no contexto em que vive esse grupo minoritário. A igualdade veta a categorização dos indivíduos e as desequiparações injustificadas, além de determinar a neutralização das injustiças econômicas, históricas e sociais, bem como o respeito à diferença ( BARROSO; OSÓRIO, 2016BARROSO, L. R.; OSÓRIO, A. “Sabe com quem está falando?”: Notas sobre o princípio da igualdade no Brasil contemporâneo. Revista Direito e Práxis, Rio de Janeiro, v. 7, n. 13, p. 204-232, 2016. Disponível em: https://www.redalyc.org/pdf/3509/350944882008.pdf. Acesso em: 8 jun. 2023.
https://www.redalyc.org/pdf/3509/3509448...
).

É preciso não esquecer que os caboclos do Contestado foram objeto de um processo civilizatório guiado pelos europeus ( SEYFERTH, 2002SEYFERTH, G. Colonização, imigração e a questão racial no Brasil. Revista USP, São Paulo, n. 53, p. 117-149, 2002. Disponível: https://www.revistas.usp.br/revusp/article/view/33192. Acesso em: 10 dez. 2021.
https://www.revistas.usp.br/revusp/artic...
). Foi construída uma narrativa fomentada pelos estereótipos que até os dias atuais julga e nega não apenas a condição de existir cabocla, mas seu trabalho e sua relação com a natureza, culpabilizando, criminalizando e esquecendo o povo caboclo ( GEMELLI; CHMURA, 2022GEMELLI, D. D.; CHMURA, M. O povo caboclo no território contestado: Uma análise do processo de invisibilização. Geographia Opportuno Tempore, Londrina, v. 8, n. 1, p. 58-75, 2022. Disponível em: https://ojs.uel.br/revistas/uel/index.php/Geographia/article/view/46711/48428. Acesso em: 31 maio de 2023.
https://ojs.uel.br/revistas/uel/index.ph...
).

Nessa perspectiva, é necessário remediar as injustiças sociais, econômicas e raciais sofridas por esse coletivo, que decorrem diretamente da falta de reconhecimento. De fato, o caboclo não luta pela igualdade com o imigrante, ele quer ser reconhecido em sua diferença, sem estereótipos atribuídos a seus ancestrais e descendentes. É fundamental lutar pela igualdade como reconhecimento quando há mais de um século a perseguição é extremamente visível. Em inúmeros casos, o preconceito é explícito, na rejeição à cor, na exploração do trabalho braçal, na marginalização de caboclos nas periferias das cidades ( ZATTA; ROCHA; FRAGA, set./dez. 2020ZATTA, A.; ROCHA, D. L.; FRAGA, N. C. Vozes circundantes no Vale dos Imigrantes: das redes que confirmam a região do Contestado ao ofuscamento das cidades caboclas que resistem oferecendo produto e cultura cabocla secular ao turismo regional. Geographia Opportuno Tempore, Londrina, v. 6, n. 3, p. 122-141, set./dez. 2020. Disponível em: http://anais.uel.br/portal/index.php/contestado/article/view/938/1358. Acesso em: 28 maio 2023
http://anais.uel.br/portal/index.php/con...
).

É primordial sustentar uma posição contra o discurso hegemônico que levou, e ainda leva, ao controle social a partir de poucos grupos elitizados. São novos campos de luta na criação de consciência e empoderamento dos que se mobilizam para ganhar visibilidade e legitimidade social para o norteamento de mudanças jurídicas mais inclusivas e que não hierarquizem esses grupos marginalizados ( GOMES; FABRIS, jan./mar. 2021GOMES, J. C. A.; FABRIS, L. Paradoxos do direito à igualdade: discriminação, diferença e identidade sob uma perspectiva crítica. RDP, Brasília, v. 18, n. 97, p. 566-603, jan./mar. 2021. Disponível em: https://www.portaldeperiodicos.idp.edu.br/direitopublico/article/view/5412. Acesso em: 31 maio 2023.
https://www.portaldeperiodicos.idp.edu.b...
).

Por isso, a principal reivindicação envolve, ao mesmo tempo, reconhecimento da diversidade e igualdade, além de equidade de tratamento, com a garantia do respeito à diversidade representada pela cultura cabocla.

2.1.3 A luta pela reunificação homem/mulher-natureza no Contestado

O sustento de uma posição contra o discurso hegemônico leva à aproximação do homem/mulher-natureza e é sinônimo de liberdade para a população cabocla. Além disso, representa a reconstrução daquilo que lhe foi negado, a principal base de sua vida: a terra ( GEMELLI, 2018GEMELLI, D. D. “Onde planta o pinus não dá mais nada”: degradação da natureza e do trabalho no Contestado e a necessidade da reunificação homem/mulher-natureza (terra-trabalho). 2018. 266 f. Tese (Doutorado em Geografia) – Programa de Pós-Graduação em Geografia, Universidade Estadual Paulista, Presidente Prudente, 2018. Disponível em: https://repositorio.unesp.br/handle/11449/154020. Acesso em: 7 dez. 2021.
https://repositorio.unesp.br/handle/1144...
).

A estrutura espacial na região do planalto catarinense é identificada pelas práticas exploratórias da natureza e da implementação demasiada do plantio de pinus na região. Logo, é urgente uma reunificação homem/mulher-natureza. A reinserção da população remanescente cabocla com o direito ao ambiente nativo possibilita a superação da racionalidade econômica capitalista ( GEMELLI; CHMURA, 2022GEMELLI, D. D.; CHMURA, M. O povo caboclo no território contestado: Uma análise do processo de invisibilização. Geographia Opportuno Tempore, Londrina, v. 8, n. 1, p. 58-75, 2022. Disponível em: https://ojs.uel.br/revistas/uel/index.php/Geographia/article/view/46711/48428. Acesso em: 31 maio de 2023.
https://ojs.uel.br/revistas/uel/index.ph...
).

O atual panorama sufoca essa população, uma vez que com o monocultivo de pinus todas as relações do povo tradicional são subtraídas, o que configura um novo processo de expulsão populacional. A pequena propriedade de camponeses caboclos é sufocada, pois a dependência econômica da madeira leva a uma situação de normalidade com relação ao pinus, que invade os limites das cidades e da zona rural do Contestado ( GEMELLI, 2018GEMELLI, D. D. “Onde planta o pinus não dá mais nada”: degradação da natureza e do trabalho no Contestado e a necessidade da reunificação homem/mulher-natureza (terra-trabalho). 2018. 266 f. Tese (Doutorado em Geografia) – Programa de Pós-Graduação em Geografia, Universidade Estadual Paulista, Presidente Prudente, 2018. Disponível em: https://repositorio.unesp.br/handle/11449/154020. Acesso em: 7 dez. 2021.
https://repositorio.unesp.br/handle/1144...
). É fundamental repensar e, quem sabe, refazer toda essa história superando as barreiras impostas por repressores e pelo pensamento hegemônico, construindo a história dos vencidos ( GEMELLI; CHMURA, 2022GEMELLI, D. D.; CHMURA, M. O povo caboclo no território contestado: Uma análise do processo de invisibilização. Geographia Opportuno Tempore, Londrina, v. 8, n. 1, p. 58-75, 2022. Disponível em: https://ojs.uel.br/revistas/uel/index.php/Geographia/article/view/46711/48428. Acesso em: 31 maio de 2023.
https://ojs.uel.br/revistas/uel/index.ph...
).

Ivone Gallo ( 1999GALLO, I. C. D’Avila. O Contestado: o sonho do milênio igualitário. Campinas: Editora Unicamp, 1999.) destacou que os caboclos e as caboclas no Contestado se referiam à terra não com sentido de cobiça ou apropriação de sua maior quantidade, mas simplesmente a algo que representa não apenas sua casa, sem fronteiras, a algo que é seu sustento. Esses preceitos foram passados a seus remanescentes como lógica interna criada pelo grupo herdada desde a presença indígena na região. Segundo Marés ( 2003, p. 13MARÉS, C. F. A função social da terra. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2003.), o Contestado é uma amostra de que

[…] quanto mais destrói a natureza, menos vida possibilita, inclusive humana, quanto mais altera os seres vivos, mais se aproxima da morte. Há algo de errado nessa lógica inversa, não é possível que a garantia de um direito individual seja o flagelo do direito dos povos.

A reunificação homem/mulher-natureza no Contestado significa rebater o campo homogêneo de formas de produção e de uma natureza artificializada, produzida mercadologicamente para atender aos interesses do sistema do capital. A consolidação de uma lógica econômica carregada de contradições, interesses e conflitos representou a acentuação das desigualdades, em um território já marcado pela lógica espoliativa de acumulação desde o século passado ( GEMELLI, 2018GEMELLI, D. D. “Onde planta o pinus não dá mais nada”: degradação da natureza e do trabalho no Contestado e a necessidade da reunificação homem/mulher-natureza (terra-trabalho). 2018. 266 f. Tese (Doutorado em Geografia) – Programa de Pós-Graduação em Geografia, Universidade Estadual Paulista, Presidente Prudente, 2018. Disponível em: https://repositorio.unesp.br/handle/11449/154020. Acesso em: 7 dez. 2021.
https://repositorio.unesp.br/handle/1144...
).

Esse reencontro com a natureza proporciona não apenas a reconfiguração das práticas e dos saberes dessa cultura camponesa, mas a manutenção da conservação da biodiversidade e do ciclo biológico ( DIEGUES, 2008DIEGUES, A. C. S. O mito moderno da natureza intocada. 6. ed. São Paulo: Hucitec, 2008.). Esse princípio de reunificar os seres humanos com a natureza vai de encontro ao discurso que sempre os marginaliza.

3 A compatibilidade dos principais valores caboclos com os valores da cidadania ecológica

Diante da exposição dos principais valores, tanto da cidadania ecológica como das comunidades tradicionais caboclas no meio oeste catarinense, esta seção tem por objetivo verificar sua compatibilidade.

A cidadania ecológica envolve um conjunto de reações da sociedade, locais e globais, por diferentes atores sociais, à exclusão da própria possibilidade do futuro da humanidade e do planeta em função da degradação ambiental. Nasce no contexto em que outras formas de exclusão também merecem ser compreendidas e superadas. Em todas as partes do mundo, a cidadania desenvolve-se a partir da segunda metade do século XX, com variados graus de incompletude, projetando-se como efetivo e urgente desafio para o século XXI. Além disso, a cidadania carrega valores com alto grau de ineditismo na história, como a sustentabilidade ecológica, o respeito às diversidades natural e cultural, e a equidade entre presentes e futuras gerações, embalados por uma perspectiva que transcende o antropocentrismo tradicional: o antropocentrismo alargado.

Os valores dos caboclos no pós-guerra do Contestado, embora tenham surgido no início do século XX, com raízes nos séculos anteriores, coadunam-se com os principais valores trazidos pela cidadania ecológica. Ambos os valores demandam importantes mudanças no atual modo de vida da sociedade.

A afirmação de valores comuns à cidadania ecológica e à cultura cabocla, como sustentabilidade, respeito à diversidade e equidade, exige mais participação dos atores sociais e melhor atuação do Estado, que, por sua vez, necessita assumir e enfrentar urgentemente as demandas socioambientais, sobretudo aquelas que já estão conformadas em sua ordem normativa.

Os caboclos, ao reivindicarem suas terras tradicionais, visam à guarda da natureza, prática costumeira herdada de seus ancestrais. A importância da cultura, seja para a constituição de um modelo ecológico, seja para a valorização de hábitos caboclos, chama atenção para o respeito à diversidade e para a atualização da legislação no que tange a novos movimentos e a novas culturas. Nessa concepção, o movimento caboclo antecipa, em meio século, reivindicações dos novos movimentos sociais que estão na raiz da própria cidadania ecológica. É a potencialmente revolucionária possibilidade do sujeito, guindado à categoria de cidadão, influir na formação dos paradigmas normativos destinados à coletividade. É a crença do potencial transformador coletivo apto a engendrar os novos valores e a transformar a atual realidade ( BIRNFELD, 2006BIRNFELD, C. A. S. Cidadania ecológica. Pelotas: Delfos, 2006.).

As demandas caboclas, expressão da diversidade cultural com reflexos na própria biodiversidade, são exemplos da importância da valorização da diversidade, valor imanente à cidadania ecológica. Nessa conjuntura, o respeito à diversidade cultural revela-se pressuposto e chave para o respeito à diversidade natural, a fim de garantir a própria sustentabilidade socioambiental.

Nessa toada, não há como perder de vista que os movimentos caboclos constituem legítimos precedentes de uma variada gama de movimentos sociais com significativo viés ambientalista, entre os quais é possível citar o movimento dos seringueiros da Amazônia, no Brasil, e a organização das mulheres Chipko, na Índia. São grupos que questionam a interferência do capital privado na vida das pessoas, a limitação da capacidade criativa e a alienação da própria cultura, nos contextos global e local. Além disso, clamam pela mudança de tratamento, não com efeitos em seus grupos, mas na própria natureza ( GALTUNG, 1983GALTUNG, J. Los azules y los rojos; los verdes y los partidos: una evaluación de movimientos políticos alternativos. Revista Alternativa, Santiago do Chile, n. 1, 1983. Disponível em: https://revistaalternativas.org/category/chile/. Acesso em: 5 jun. 2023.
https://revistaalternativas.org/category...
). Todos esses movimentos, especialmente os caboclos, na simplicidade de suas demandas diárias pela manutenção de seu modo de vida e sustento, carregam o mesmo olhar requerido pela cidadania ecológica: um antropocentrismo alargado.

Considerações finais

É importante resgatar o objetivo deste trabalho, que foi demonstrar a compatibilidade dos valores da cidadania ecológica com os valores inerentes à cultura cabocla remanescente no oeste catarinense após guerra do Contestado.

Nesse sentido, na primeira seção, foi localizada historicamente a cidadania ecológica, destacando-se quatro de seus valores imanentes: sustentabilidade socioambiental; respeito à diversidade natural e cultural; equidade transgeracional; e antropocentrismo alargado.

A seguir, na segunda seção, foi descrita brevemente a cultura cabocla remanescente no oeste catarinense, destacando-se três de suas principais reivindicações: lugar para a sustentabilidade; igualdade de direitos na diversidade; e reunificação homem/mulher-natureza.

Por fim, na terceira seção, foi feito um resgate das informações anteriormente trabalhadas, verificando-se a compatibilidade dos valores da cidadania ecológica com os valores integrantes das reivindicações da cultura cabocla remanescente no oeste catarinense: na reivindicação de um lugar para o assentamento de uma cultura sustentável, a sustentabilidade socioambiental; na reivindicação pela igualdade de direitos na diversidade, o respeito à diversidade e à equidade; e na reivindicação da reunificação homem/mulher-natureza, uma perspectiva de antropocentrismo alargado e de equidade transgeracional.

Referências

  • ALIER, J. M. O ecologismo dos pobres. São Paulo: Contexto, 2007.
  • ARENDT, H. A condição humana. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1987.
  • BAEZ, N. L. X.; WOLF, A. Dignidade humana e o multiculturalismo. Unoesc International Legal Seminar, Chapecó, v. 2, n. 1, 2013. Disponível em: https://periodicos.unoesc.edu.br/uils/article/view/4028 Acesso em: 31 out. 2021.
    » https://periodicos.unoesc.edu.br/uils/article/view/4028
  • BARROSO, L. R.; OSÓRIO, A. “Sabe com quem está falando?”: Notas sobre o princípio da igualdade no Brasil contemporâneo. Revista Direito e Práxis, Rio de Janeiro, v. 7, n. 13, p. 204-232, 2016. Disponível em: https://www.redalyc.org/pdf/3509/350944882008.pdf Acesso em: 8 jun. 2023.
    » https://www.redalyc.org/pdf/3509/350944882008.pdf
  • BARROS, F. P. C.; SOUSA, M. F. Equidade: seus conceitos, significações e implicações para o SUS. Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 25, n. 1, p. 9-18, 2016. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/299357712_Equidade_seus_conceitos_significacoes_e_implicacoes_para_o_SUS Acesso em: 7 dez. 2021.
    » https://www.researchgate.net/publication/299357712_Equidade_seus_conceitos_significacoes_e_implicacoes_para_o_SUS
  • BAVARESCO, P. R.; TACCA, D. P. Multiculturalismo e diversidade cultural: uma reflexão. Unoesc & Ciência, Joaçaba, v. 7, n. 1, p. 61-68, 2016. Disponível em: https://portalperiodicos.unoesc.edu.br/achs/article/view/8511 Acesso em: 30 out. 2021.
    » https://portalperiodicos.unoesc.edu.br/achs/article/view/8511
  • BERGAMASCHI, J. D. G.; AROSEMENA; R. I. M; GOMES, S. A. A sustentabilidade como um valor. Revista Eletrônica Direito e Política, Itajaí, v. 13, n. 3, p. 1428-1457, 2018. Disponível em: https://siaiap32.univali.br/seer/index.php/rdp/article/view/13724 Acesso em: 30 out. 2021.
    » https://siaiap32.univali.br/seer/index.php/rdp/article/view/13724
  • BIRNFELD, C. A. S. Cidadania ecológica. Pelotas: Delfos, 2006.
  • BLACKBURN, R. Depois da queda: o fracasso do comunismo e o futuro do socialismo. 2. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1993.
  • BOSSELMANN, K. Direitos humanos, meio ambiente e sustentabilidade. Revista CEDOUA, Coimbra, v. 8, n. 21, p. 9-38, jan. 2008. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/270537805_Direitos_humanos_ambiente_e_sustentabilidade Acesso em: 5 jun. 2023.
    » https://www.researchgate.net/publication/270537805_Direitos_humanos_ambiente_e_sustentabilidade
  • BRAGA, J. C. F.; SALDANHA, B. S. O direito cultural como elemento emancipatório e civilizatório e a efetivação da proteção do patrimônio cultural no Brasil. In: XXIII CONPEDI, 23., 2014, São Paulo. Anais […]. Florianópolis: Conpedi, 2014. p. 330-350. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/328007046_O_Direito_Cultural_como_elemento_emancipatorio_e_civilizatorio_e_a_efetivacao_da_protecao_do_patrimonio_cultural_no_Brasil Acesso em: 7 dez. 2021.
    » https://www.researchgate.net/publication/328007046_O_Direito_Cultural_como_elemento_emancipatorio_e_civilizatorio_e_a_efetivacao_da_protecao_do_patrimonio_cultural_no_Brasil
  • BRANDT, M. Uso comum e apropriação da terra no município de Fraiburgo-SC: do Contestado à colonização. 2007. 310 f. Dissertação (Mestrado em Geografia) – Centro de Filosofia e Ciências Humanas – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2007. Disponível em: https://repositorio.ufsc.br/xmlui/bitstream/handle/123456789/90647/241372.pdf?sequence=1&isAllowed=y Acesso em: 31 maio 2023.
    » https://repositorio.ufsc.br/xmlui/bitstream/handle/123456789/90647/241372.pdf?sequence=1&isAllowed=y
  • CANOTILHO, J. J. G. O princípio da sustentabilidade como princípio estruturante do direito constitucional. Revista de Estudos Politécnicos, Barcelos, v. 8, n. 13, p. 7-18, 2010. Disponível em: https://scielo.pt/pdf/tek/n13/n13a02.pdf Acesso em: 5 jun. 2023.
    » https://scielo.pt/pdf/tek/n13/n13a02.pdf
  • CARDOSO, S. M. V.; MUZZETI, L. R. As dimensões da diversidade cultural brasileira. Revista Ibero-Americana de Estudos em Educação (RIAEE), Araraquara, v. 2, n. 1, 2007. Disponível: https://periodicos.fclar.unesp.br/iberoamericana/article/view/451/330 Acesso em: 3 out. 2021.
    » https://periodicos.fclar.unesp.br/iberoamericana/article/view/451/330
  • CARVALHO, T. M. Coerção e consenso na Primeira República: a Guerra do Contestado (1912-1916). 2009. 214 f. Tese (Doutorado em História) – Instituto de Ciências Humanas e Filosofia, Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2009. Disponível em: https://app.uff.br/riuff/bitstream/handle/1/26738/Coer%c3%a7%c3%a3o%20e%20Consenso%20na%20Primeira%20Rep%c3%bablica\_%20A%20Guerra%20do%20Contestado%20%281912%20-%201916%29.pdf?sequence=1&isAllowed=y Acesso em: 7 nov. 2021.
    » https://app.uff.br/riuff/bitstream/handle/1/26738/Coer%c3%a7%c3%a3o%20e%20Consenso%20na%20Primeira%20Rep%c3%bablica_%20A%20Guerra%20do%20Contestado%20%281912%20-%201916%29.pdf?sequence=1&isAllowed=y
  • DIEGUES, A. C. S. O mito moderno da natureza intocada. 6. ed. São Paulo: Hucitec, 2008.
  • ESCOREL, S. Equidade em saúde. Dicionário da Educação Profissional em Saúde. Rio de Janeiro: Fiocruz/EPSJV, 2009. Disponível em: http://www.sites.epsjv.fiocruz.br/dicionario/verbetes/equsau.html Acesso em: 7 dez. 2021.
    » http://www.sites.epsjv.fiocruz.br/dicionario/verbetes/equsau.html
  • GALLO, I. C. D’Avila. O Contestado: o sonho do milênio igualitário. Campinas: Editora Unicamp, 1999.
  • GALTUNG, J. Los azules y los rojos; los verdes y los partidos: una evaluación de movimientos políticos alternativos. Revista Alternativa, Santiago do Chile, n. 1, 1983. Disponível em: https://revistaalternativas.org/category/chile/ Acesso em: 5 jun. 2023.
    » https://revistaalternativas.org/category/chile/
  • GEMELLI, D. D. “Onde planta o pinus não dá mais nada”: degradação da natureza e do trabalho no Contestado e a necessidade da reunificação homem/mulher-natureza (terra-trabalho). 2018. 266 f. Tese (Doutorado em Geografia) – Programa de Pós-Graduação em Geografia, Universidade Estadual Paulista, Presidente Prudente, 2018. Disponível em: https://repositorio.unesp.br/handle/11449/154020 Acesso em: 7 dez. 2021.
    » https://repositorio.unesp.br/handle/11449/154020
  • GEMELLI, D. D.; CHMURA, M. O povo caboclo no território contestado: Uma análise do processo de invisibilização. Geographia Opportuno Tempore, Londrina, v. 8, n. 1, p. 58-75, 2022. Disponível em: https://ojs.uel.br/revistas/uel/index.php/Geographia/article/view/46711/48428 Acesso em: 31 maio de 2023.
    » https://ojs.uel.br/revistas/uel/index.php/Geographia/article/view/46711/48428
  • GOMES, J. C. A.; FABRIS, L. Paradoxos do direito à igualdade: discriminação, diferença e identidade sob uma perspectiva crítica. RDP, Brasília, v. 18, n. 97, p. 566-603, jan./mar. 2021. Disponível em: https://www.portaldeperiodicos.idp.edu.br/direitopublico/article/view/5412 Acesso em: 31 maio 2023.
    » https://www.portaldeperiodicos.idp.edu.br/direitopublico/article/view/5412
  • HARVEY, D. A condição pós-moderna. São Paulo: Loyola, 2003.
  • HIRSCHMAN, A. A retórica da intransigência. São Paulo: Cia das Letras, 1995.
  • LEFF, E. Saber ambiental: sustentabilidade, racionalidade, complexidade, poder. 6. ed. Tradução: Lucia Mathilde Endlich Orth. Petrópolis: Vozes, 2008.
  • LEITE, J. R. M. Dano ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.
  • LEITE, J. R. M. Sociedade de risco e Estado. In: CANOTILHO, J. J. G.; LEITE, J. R. M. (org.). Direito Constitucional Ambiental brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 156-220.
  • LINO, J. A cultura material da Guerra do Contestado como documento histórico. Cadernos do CEOM, Chapecó, ano 25, n. 36, p. 45-70, 2012. Disponível em: https://bell.unochapeco.edu.br/revistas/index.php/rcc/article/view/1152 Acesso em: 7 dez. 2021.
    » https://bell.unochapeco.edu.br/revistas/index.php/rcc/article/view/1152
  • MARÉS, C. F. A função social da terra. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 2003.
  • MARSHALL, T. H. Cidadania, classe social e status. Tradução: Meton Porto Gadelha. Rio de Janeiro: Zahar, 1967.
  • MERGULHÃO, M. F. D. O princípio da equidade: por uma nova exegese. Revista Serviam Juris, Rio de Janeiro, v. 3, n. 3, p. 45-57, 2018. Disponível em: http://revistas.icesp.br/index.php/Serviam_Juris/article/view/378 Acesso em: 30 nov. 2021.
    » http://revistas.icesp.br/index.php/Serviam_Juris/article/view/378
  • NUNES, D. V. Caboclos contra o progresso: conflito ambiental na guerra do Contestado. 2017. 148 p. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) – Instituto de Ciências Humanas e Sociais, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2017. Disponível em: https://sucupira.capes.gov.br/sucupira/public/consultas/coleta/trabalhoConclusao/viewTrabalhoConclusao.jsf?popup=true&id_trabalho=5288020 Acesso em: 31 maio 2023.
    » https://sucupira.capes.gov.br/sucupira/public/consultas/coleta/trabalhoConclusao/viewTrabalhoConclusao.jsf?popup=true&id_trabalho=5288020
  • OLIVEIRA, J. M. A diversidade cultural como garantia constitucional. Jusbrasil, 29 jul. 2015. Disponível: https://joaomarcosr.jusbrasil.com.br/artigos/213667955/a-diversidade-cultural-como-garantia-constitucional Acesso em: 10 dez. 2021.
    » https://joaomarcosr.jusbrasil.com.br/artigos/213667955/a-diversidade-cultural-como-garantia-constitucional
  • OST, F. A natureza à margem da lei: a ecologia à prova do direito. Tradução: Joana Chaves. Lisboa: Instituto Piaget, 1997.
  • ROCHA, A. M. O direito ambiental como novo paradigma estatal. Jus, 30 dez. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/76399/o-direito-ambiental-como-novo-paradigma-estatal Acesso em: 22 out. 2021.
    » https://jus.com.br/artigos/76399/o-direito-ambiental-como-novo-paradigma-estatal
  • RODRIGUES, V. J. C. B. Desenvolvimento sustentável: uma introdução crítica. Lisboa: Principia, 2009.
  • SEYFERTH, G. Colonização, imigração e a questão racial no Brasil. Revista USP, São Paulo, n. 53, p. 117-149, 2002. Disponível: https://www.revistas.usp.br/revusp/article/view/33192 Acesso em: 10 dez. 2021.
    » https://www.revistas.usp.br/revusp/article/view/33192
  • SILVA, E. F.; SOUZA, D. C.; CORDEIRO, S. M. A. O legado cultural na região do Contestado. Geographia Opportuno Tempore, Londrina, v. 5, n. 3, p. 188-201, 2019. Disponível em: https://www.uel.br/revistas/uel/index.php/Geographia/article/viewFile/37827/26480 Acesso em: 29 nov. 2021.
    » https://www.uel.br/revistas/uel/index.php/Geographia/article/viewFile/37827/26480
  • SILVEIRA, P. G.; AYALA, P. A. A caracterização do princípio de sustentabilidade no direito brasileiro e o transconstitucionalismo como teoria de efetivação. RIDB, ano 1, n. 3, p. 1827-1859, 2012. Disponível em: https://www.cidp.pt/revistas/ridb/2012/03/2012_03_1827_1859.pdf Acesso em: 31 maio 2023.
    » https://www.cidp.pt/revistas/ridb/2012/03/2012_03_1827_1859.pdf
  • SPOSATI, A. Exclusão social abaixo da linha do Equador. In: VÉRAS, M. P. B. (ed.). Por uma sociologia da exclusão social: o debate com Serge Paugam. São Paulo: Educ, 1999. p. 126-138.
  • TOMAZI, G. Heranças e direitos dos jovens do Contestado. Visão Global, Joaçaba, v. 11, n. 1, p. 113-138, 2008. Disponível em: https://periodicos.unoesc.edu.br/visaoglobal/article/view/493/237 Acesso em: 7 dez. 2021.
    » https://periodicos.unoesc.edu.br/visaoglobal/article/view/493/237
  • VEIGA, J. E. da. Sustentabilidade: a legitimação de um novo valor. 2. ed. São Paulo: Senac, 2010.
  • ZATTA, A.; ROCHA, D. L.; FRAGA, N. C. Vozes circundantes no Vale dos Imigrantes: das redes que confirmam a região do Contestado ao ofuscamento das cidades caboclas que resistem oferecendo produto e cultura cabocla secular ao turismo regional. Geographia Opportuno Tempore, Londrina, v. 6, n. 3, p. 122-141, set./dez. 2020. Disponível em: http://anais.uel.br/portal/index.php/contestado/article/view/938/1358 Acesso em: 28 maio 2023
    » http://anais.uel.br/portal/index.php/contestado/article/view/938/1358
  • Como citar este artigo (ABNT):
    BIRNFELD, C. A. S.; JACOBSEN, A. S. A compatibilidade dos valores da cidadania ecológica com os valores das comunidades no pós-guerra no Contestado. Veredas do Direito, Belo Horizonte, v. 20, e202334, 2023. Disponível em: http://www.domhelder.edu.br/revista/index.php/veredas/article/%20view/2334. Acesso em: dia mês. ano
  • 1
    Nesse novo contexto, com a inserção de um número superior de parcelas da população na ordem de formação da vontade estatal, abre-se a perspectiva de que a vontade estatal possa ser dirigida para satisfazer os interesses da maioria da população, e não apenas da minoria detentora dos meios de produção ( BIRNFELD, 2006BIRNFELD, C. A. S. Cidadania ecológica. Pelotas: Delfos, 2006.).
  • 2
    Eric Hobsbawn, em semelhante exposição, demonstra que há pelo menos três efeitos do desenvolvimento capitalista mundial que fogem ao controle: a primeira é a ecologia. Em virtude da destruição da biosfera, da extinção de animais e da mudança de habitat de espécies de plantas e humanos, acaba havendo mudanças extremas. A segunda é a brecha existente entre os países desenvolvidos e os países pobres. O mundo desenvolvido é três vezes maior per capita que o restante da humanidade, consumindo mais e impactando o meio ambiente de maneira mais intensa. A terceira questão é sobre a humanidade ser subordinada à economia que rompe as relações entre seres humanos, com a criação de um vácuo moral, no qual há o anseio do indivíduo pelo aqui e agora ( BLACKBURN, 1993, p. 267BLACKBURN, R. Depois da queda: o fracasso do comunismo e o futuro do socialismo. 2. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1993.).
  • 3
    Conforme explicam Baez e Wolf ( 2013BAEZ, N. L. X.; WOLF, A. Dignidade humana e o multiculturalismo. Unoesc International Legal Seminar, Chapecó, v. 2, n. 1, 2013. Disponível em: https://periodicos.unoesc.edu.br/uils/article/view/4028. Acesso em: 31 out. 2021.
    https://periodicos.unoesc.edu.br/uils/ar...
    ), a dimensão cultural da dignidade humana considera as particularidades culturais das pessoas ou do grupo social ao qual elas pertencem, levando em consideração o momento histórico vivido e respeitando os aspectos individuais que as diferenciam umas das outras.
  • 4
    Nas palavras de Sposati ( 1999, p. 128SPOSATI, A. Exclusão social abaixo da linha do Equador. In: VÉRAS, M. P. B. (ed.). Por uma sociologia da exclusão social: o debate com Serge Paugam. São Paulo: Educ, 1999. p. 126-138.), “a noção de igualdade só se completa se compartida à noção de equidade. Não basta um padrão universal se este não comportar o direito à diferença. Não se trata mais de um padrão homogêneo, mas de um padrão equânime”.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Set 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    13 Abr 2022
  • Aceito
    12 Jun 2023
Editora Dom Helder Rua Álvares Maciel, 628, Bairro Santa Efigênia, , CEP: 30150-250, Tel. +55 (31) 2125-8836 - Belo Horizonte - MG - Brazil
E-mail: veredas@domhelder.edu.br