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Tramas e interconexões no Supremo Tribunal Federal: Antidiscriminação, gênero e sexualidade

Brazilian Constitutional Court interconnections points: Anti-discrimination, gender and sexuality

Resumo

Trata das interconexões entre as categorias antidiscriminatórias e as dinâmicas de gênero e sexualidade em decisões do Supremo Tribunal Federal sobre homotransfobia, identidade de gênero e doação de sangue por homossexuais. Faz-se uma análise qualitativa das decisões, selecionadas pela temática, impacto e potencial analítico. Identificou-se efetiva relacionalidade entre a hermenêutica judicial e as dinâmicas sociais e políticas de gênero e sexualidade.

Palavras-chave:
Gênero e sexualidade; Direito da Antidiscriminação; Supremo Tribunal Federal

Abstract

This paper addresses the Anti-discrimination, gender, and sexuality interconnection points in Brazilian Constitutional Court decisions on homotransphobia, gender identity, and blood donation by homosexuals. Taking into account the public impact, as well as the analytical potential in such judicial rulings, it identifies an actual relationship between the development of Anti-discrimination Law in legal reasoning and the gender and sexuality social and political dynamic.

Keywords:
Gender and sexuality; Anti-Discrimination Law; Brazilian Supreme Court

Introdução

O direito constitucional brasileiro e o direito internacional dos direitos humanos têm, dentre seus conteúdos fundamentais, a afirmação do direito de igualdade. Inicialmente compreendido como proibição de distinções, sua compreensão evoluiu rumo à proibição de discriminação. Formulado e compreendido, na arena internacional, a partir das violações perpetradas pelos regimes totalitários, assim como, na ordem interna, respondendo à violência praticada pela ditadura militar que se estabeleceu no período da Guerra Fria, a proibição de discriminação ordenada pelo direito de igualdade, no direito brasileiro e no direito internacional, almeja afastar toda e qualquer diferenciação injusta, em especial práticas e regimes de subordinação contra indivíduos e grupos histórica e socialmente injustiçados e vítimas de preconceito e discriminação.

Sem ignorar, muito menos menosprezar o rico e intenso debate em diversos campos (político, social, filosófico, histórico, etc.), é de se salientar que este esforço de efetivação do mandamento antidiscriminatório resultou, na esfera jurídica, na formulação de legislação e jurisprudência específicas. A litigância, a sistematização e a pesquisa acadêmica nestes campos acabaram por demarcar domínios do conhecimento e da prática jurídicos, conhecidos como “direito da antidiscriminação”. Assim designado, tal campo surge a partir da experiência jurídica estadunidense (McCRUDDEN, 1991McCRUDDEN, Christopher. Anti-Discrimination Law. New York: New York University Press, 1991.), com os avanços do movimento de direitos civis pós II Guerra Mundial (POLE, 1993POLE, J. R. The pursuit of Equality in American History. Berkeley: University of California Press, 2. Ed, 1993., p. 311), tendo como marco jurisprudencial indisputável a decisão da Suprema Corte dos Estados Unidos no célebre caso “Brown vs. Board of Education”, de 1954 (SCHWARTZ, 1993, p. 286; RUTHERGLEN, 2001RUTHERGLEN, George. Employment Discrimination Law. New York: Foundation Press, 2001.), passando a exercer uma influência seminal no continente europeu, tanto nos direitos nacionais (BURCA, 2011BURCA, Grainne De. The Trajectories of European and American Antidiscrimination Law. NEW YORK UNIVERSITY SCHOOL OF LAW PUBLIC LAW & LEGAL THEORY RESEARCH PAPER SERIES. WORKING PAPER NO. 11-80. 2011. Disponível em: <http://ssrn.com/abstract=1950697>. Acesso em: 10 abr. 2020.
http://ssrn.com/abstract=1950697...
), como no direito comunitário europeu (COUNCIL OF EUROPE, 2011).

Enquanto a compreensão tradicional do princípio da igualdade expõe o conteúdo e a extensão dessa cláusula constitucional de modo estático, por meio da enunciação de suas respectivas dimensões formal e material arbitrárias (FREDMAN, 2002FREDMAN, Sandra. Discrimination Law. Oxford: Oxford University Press, 2002., p. 7; RIOS, 2002RIOS, Roger Raupp. O princípio da igualdade e a discriminação por orientação sexual: a homossexualidade no direito brasileiro e norte-americano. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002., p. 33; MOREIRA, 2017MOREIRA, Adilson José. O que é discriminação? Belo Horizonte: Letramento: Casa do Direito: Justificando. 2017., p. 17), o conceito de discriminação aponta para a reprovação jurídica das violações do princípio isonômico. Passa-se a atentar para os prejuízos injustos suportados pelos destinatários de tratamentos desiguais, objetivando enfrentar situações de estigma e subordinação experimentadas por grupos discriminados (RIOS, 2008, p. 36; MOREIRA, 2017, p. 67; SOLANKE, 2017). A discriminação enfrentada pelo direito da antidiscriminação é, portanto, tomada por uma perspectiva mais substantiva que formal: importa enfrentar a desigualdade prejudicial e injusta, pois nem sempre a adoção de tratamentos distintos se revela maléfica, sendo mesmo tantas vezes exigida, como alerta a dimensão material do princípio da igualdade (o de tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na medida de suas desigualdades).

As injustiças e as reivindicações na esfera do gênero e da sexualidade têm posto à prova o direito da antidiscriminação, ao mesmo tempo que o desafiam e que propiciam seu desenvolvimento; tal tarefa, por sua vez, que exige uma postura metodológica jurídico-científica, marcada pela inquietação teórica diante da compreensão das categorias jurídicas existentes e sua relação com gênero e sexualidade, atitude diversa de uma abordagem jurídico-instrumental, que se restringe à pergunta sobre a adequação da norma ao caso concreto, sem problematizar o direito enquanto área do conhecimento da realidade (XIMENES, 2018). Para tanto, procedeu-se à exposição, ainda que sucinta, das categorias fundamentais do direito da antidiscriminação e sua presença, explícita ou implícita, em decisões do Supremo Tribunal Federal envolvendo gênero e sexualidade, selecionadas pela temática, impacto e potencial analítico, possibilitando problematizar o “duplo fazer do gênero e do Estado”, em que interconexões entre manifestações institucionais estatais e suas categorias jurídicas não só atuam buscando instituir, por meio de instituições e medidas estatais, estabilização e regramento diante do gênero, como são produzidas na “...trama de sentidos, possibilidades de ação e formas de interdição feitas de e por dinâmicas de gênero” (VIANNA e LOWENKRON, 2017a, p. 5). Trata-se de, longe de oferecer respostas acabadas, suscitar questões e possibilidades para investigações sobre a dinâmica constitutiva entre o direito, enquanto manifestação estatal judicial, e as dinâmicas de gênero.

Com o objetivo de examinar esta equação, este artigo divide-se em duas partes. Na primeira parte, procede à exposição panorâmica dos elementos fundamentais do direito da antidiscriminação, em particular do conceito jurídico de discriminação e das modalidades discriminatórias direta e indireta. A seguir, na segunda parte, toma alguns julgamentos do Supremo Tribunal Federal (STF) envolvendo gênero e sexualidade, deles destacando o tratamento específico empregado a conteúdos jurídicos antidiscriminatórios, buscando aperceber-se das contribuições, desafios e limites ali presentes.

Há, de fato, valioso material nos pronunciamentos do tribunal sobre criminalização da homofobia como “racismo social”, proibição de doação de sangue por homens que tiveram sexo com homens e registro civil de pessoas transexuais, permitindo avançar na reflexão sobre a relação e os resultados desta trajetória em que demandas tão graves, complexas e polêmicas, como as de gênero e sexualidade, exigem e desafiam respostas jurídicas antidiscriminatórias, ao mesmo tempo que as dinâmicas de gênero e sexualidade atuam de forma produtiva na constituição e na formulação das instituições e práticas estatais.

1. Elementos fundamentais do direito da antidiscriminação

Os elementos fundamentais no direito da antidiscriminação são o conceito jurídico de discriminação, as modalidades de discriminação, os critérios proibidos de discriminação, as perspectivas da antidiferenciação e da antissubordinação e as respostas jurídicas disponíveis (de cunho legislativo, políticas públicas e ações afirmativas) (RIOS, 2008RIOS, Roger Raupp. Direito da Antidiscriminação: discriminação direta, indireta e ações afirmativas. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008.). Neste estudo, serão considerados o conceito jurídico de discriminação, suas modalidades, os critérios proibidos de discriminação e as perspectivas da antidiferenciação e da antissubordinação, tomando como casos exemplares discriminações por gênero e sexualidade.

Conceito jurídico de discriminação

O conceito de discriminação merece algumas considerações no sentido de tornar mais clara sua compreensão e de facilitar sua concretização no campo jurídico e nas políticas públicas. Diferentemente do preconceito, que designa percepções mentais e internas negativas em desfavor de indivíduos e grupos socialmente inferiorizados, discriminação é a materialização de atitudes arbitrárias, acarretando violações de direitos. O termo preconceito é utilizado de maneira mais frequente nos domínios da psicologia e das ciências sociais, enquanto o termo discriminação é mais difundido no vocabulário jurídico.

Neste sentido, a partir da análise conjunta da Convenção Internacional sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação Racial1 1 Aprovada pelas Nações Unidas em 21.12.1965 e ratificada pelo Brasil em 27.03.1968. Reza seu artigo 1º, I: “Qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada em raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica que tenha o propósito ou o efeito de anular ou prejudicar o reconhecimento, gozo ou exercício em pé de igualdade de direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural ou em qualquer outro campo da vida pública”. e da Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação contra a Mulher2 2 Aprovada pelas Nações Unidas em 18.12.1979 e ratificada pelo Brasil em 21.03.1981. Diz seu art. 1º, ao definir discriminação: “toda distinção, exclusão ou restrição baseada no sexo que tinha por objeto ou resultado prejudicar ou anular o reconhecimento, gozo, exercício pela mulher, independente de seu estado civil, com base na igualdade do homem e da mulher, dos direitos humanos e das liberdades fundamentais nos campos políticos, econômico, social e civil ou em qualquer outro campo”. , o conceito jurídico de discriminação é “qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência que tenha o propósito ou o efeito de anular ou prejudicar o reconhecimento, gozo ou exercício em pé de igualdade de direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos econômico, social, cultural ou qualquer campo da vida pública.” (RIOS, 2008RIOS, Roger Raupp. Direito da Antidiscriminação: discriminação direta, indireta e ações afirmativas. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008., p. 20). Saliente-se que tal conceito jurídico de discriminação acabou por ser incorporado, com estatura constitucional, no direito interno brasileiro, em virtude da recepção da Convenção Internacional sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência3 3 Internalizada pelo Brasil por intermédio do Decreto nº 6.949, de 25 de agosto de 2009. .

A Convenção Interamericana contra toda forma de Discriminação e Intolerância4 4 Aprovada pela Organização dos Estados Americanos em 06.06.2013, ainda pendente de ratificação pelo Brasil. foi no mesmo sentido, definindo discriminação como “qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência, em qualquer área da vida pública ou privada, cujo propósito ou efeito seja anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou exercício, em condições de igualdade, de um ou mais direitos humanos e liberdades fundamentais consagrados nos instrumentos internacionais aplicáveis aos Estados Partes.” Note-se que a inserção do fragmento “em qualquer área da vida pública ou privada” alargou a amplitude conceitual da discriminação, censurando sua ocorrência em qualquer âmbito da vida social.

A discriminação em nada se confunde com a adoção de medidas de diferenciação positiva, visto que estas possuem caráter positivo, objetivando a efetivação dos direitos, sem, portanto, a ilicitude que caracteriza comportamentos discriminatórios. Nas medidas de diferenciação positiva, encontramos não somente as ações afirmativas, mas também a adoção de medidas de tratamentos especiais requeridos por uma especificidade de um indivíduo ou grupo (RIOS, 2008RIOS, Roger Raupp. Direito da Antidiscriminação: discriminação direta, indireta e ações afirmativas. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008., p. 22).

Modalidades de discriminação

No direito da antidiscriminação, discriminação direta e indireta são as categorias jurídicas que designam as modalidades de discriminação enfrentadas (SCHIEK; WADDINGTON; BELL, 2007; BAMFORTH; MALIK; O’CINNEIDE, 2008BAMFORTH, Nicholas; MALIK, Maleiha; O’CINNEIDE, Colm. Discrimination Law: theory and context. Londres: Sweet & Maxwell, 2008.; FREDMAN, 2002FREDMAN, Sandra. Discrimination Law. Oxford: Oxford University Press, 2002.; RIOS, 2008RIOS, Roger Raupp. Direito da Antidiscriminação: discriminação direta, indireta e ações afirmativas. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008.; MOREIRA, 2017MOREIRA, Adilson José. O que é discriminação? Belo Horizonte: Letramento: Casa do Direito: Justificando. 2017.). Ocorre discriminação direta, quando se dá de modo intencional e consciente; já discriminação indireta, mediante atitudes aparentemente neutras, com impacto prejudicial, ainda que sem intencionalidade. O elemento distintivo é, como se vê, a intencionalidade da discriminação.

A discriminação direta varia de acordo com o instrumento utilizado, podendo o elemento discriminador estar expresso em lei (discriminação explícita), estar presente na aplicação da norma, mesmo que inexistente de forma expressa na legislação (discriminação na aplicação do direito) e na presença intencional de caracteres aparentemente neutros, mas intencionalmente inseridos visando a causar prejuízos (discriminação na concepção).

A discriminação indireta ocorre quando, mesmo desprovida de intenção, uma medida aparentemente neutra impacta, de modo diferenciado e prejudicial, indivíduos e grupos discriminados. Ela pode decorrer desde uma motivação inconsciente - a denominada discriminação indireta inconsciente - até alastrar-se pelas estruturas organizacionais formais e informais, como acontece na discriminação institucional, na reprodução de privilégios invisibilizados ou naturalizados (RIOS, 2008RIOS, Roger Raupp. Direito da Antidiscriminação: discriminação direta, indireta e ações afirmativas. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008., p. 117-153), abrangendo as situações de discriminação estrutural e sistêmica (FRIEDMAN, 1975FRIEDMAN, Robert. Institutional racismo: how to discriminate without really trying. In: PETTIGREW, Thomas. Racial Discrimination in the United States. New York: Harper e Row, 1975.).

Critérios proibidos de discriminação

Dentre os elementos centrais do direito da antidiscriminação, a enumeração dos critérios proibidos de discriminação tem especial importância. Com efeito, a experiência revela que a mera interdição abstrata de arbitrariedade nas distinções, presente nos conceitos jurídicos de igualdade formal e igualdade material, é insuficiente para responder a discriminações perpetradas contra grupos subordinados (RIOS, 2008RIOS, Roger Raupp. Direito da Antidiscriminação: discriminação direta, indireta e ações afirmativas. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008.; MOREIRA, 2017MOREIRA, Adilson José. O que é discriminação? Belo Horizonte: Letramento: Casa do Direito: Justificando. 2017.). O enfrentamento dessas situações exige, a cada momento histórico, a definição dos critérios protegidos, pelo direito da antidiscriminação, de diferenciações prejudiciais no reconhecimento, gozo e exercício de direitos. Longe de um procedimento meramente técnico-jurídico, a definição dos grupos protegidos, que serão incorporados no ordenamento jurídico na forma de critérios proibidos de discriminação, revela a repercussão jurídico-institucional de disputas sociais, nas quais grupos politicamente marginalizados lutam por proteção antidiscriminatória (GERSTMANN, 1999GERSTMANN, Evan. The Constitutional Underclass. Gays, Lesbians, and the Failure of Class-Based Equal Protection. Chicago: The University of Chicago Press, 1999., p. 34). Os critérios proibidos de discriminação funcionam, pois, como mandamentos negativos que determinam que, como base em certo critério, alguém não seja discriminado. Ao reprovarem condutas e efeitos discriminatórios, protegem de tratamento prejudicial indivíduos e grupos que se enquadrem no critério protegido.

Os ordenamentos jurídicos adotam técnicas diversas quanto à definição de tais critérios proibidos de discriminação. Uns enumeram os critérios de forma taxativa por meio de legislação específica; outros contam apenas com previsões genéricas e abstratas. Um terceiro grupo, por sua vez, adota um modelo misto, por meio da enumeração exemplificativa dos critérios proibidos de discriminação. No primeiro grupo, a decisão sobre tais critérios é exclusivamente legislativa; nos demais, compete à legislação e aos tribunais enumerá-los ou adicionar critérios aos já previstos. Nesses, o acréscimo de novos grupos protegidos, seja mediante a compreensão ampliada de critérios já existentes, seja pela inclusão de um critério antes não-previsto, considera: (a) se o grupo é historicamente perseguido; (b) se é estigmatizado; (c) se recebe tratamento desigual prejudicial; (c) se sofre preconceito, estereótipos negativos e hostilidades; (d) se constitui minoria politicamente em desvantagem; (e) se a característica distintiva do grupo, constitutiva de sua identidade, é imutável ou modificável somente a alto e inexigível custo e (f) se tal característica desencadeadora da discriminação em nada impede a participação positiva do grupo na sociedade (WINTEMUTE, 1995).

Um sem-número de questões se coloca na aplicação dos critérios de proibição, independentemente do grupo a que pertence cada ordenamento jurídico. O direito brasileiro demonstra essa realidade. A primeira dessas questões, que toma a atenção de imediato, diz respeito à enumeração exemplificativa contida no artigo 3º, inciso IV, da Constituição de 1988, que possibilita a inclusão de novos critérios proibidos de discriminação; outra questão, muito relevante, concerne à interpretação de cada um dos critérios enumerados. No campo do gênero e da sexualidade, as disputas hermenêuticas são particularmente polêmicas, dada a extensão que se pode verificar na compreensão da enumeração do “sexo” como critério proibido de discriminação, bem com o influxo das dinâmicas sociais de gênero e sexualidade nesses processos.

2. Direito da Antidiscriminação, gênero e sexualidade na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal

Dentre as perspectivas possíveis na investigação dos marcos jurisprudenciais do Supremo Tribunal Federal, as categorias do direito da antidiscriminação revelam-se úteis e mutuamente imbricadas com as tramas e linguagens de gênero e sexualidade, operando no sentido da “relacionalidade profunda entre os jogos de generificação do Estado e estatização do gênero” (VIANNA; LOWENKRON, 2017a). Elas indicam dimensões importantes para o desenho, à execução e o monitoramento das políticas públicas e iniciativas sociais, sem falar em seu papel na conformação das estruturas de dominação social.

Ao perquirir acerca dessa relacionalidade, tomam-se as manifestações judiciais sobre homotransfobia como discriminação inconstitucional e sua compreensão como racismo social, bem como a proibição do uso de banheiros públicos por transgêneros e a doação de sangue por homossexuais. Estas serão referidas às modalidades de discriminação direta e indireta, ao passo que aquelas ao conceito jurídico de discriminação e aos critérios proibidos de discriminação.

Homofobia e “homoafetividade” nas tramas do direito e do gênero

O Supremo Tribunal Federal considerou a homofobia espécie de discriminação por motivo de sexo (Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental n. 132 - BRASIL, 2011), expondo sua compreensão acerca desse critério de proibição de discriminação. Neste julgado, pode-se indagar a conexão entre as manifestações estatais sobre o gênero e da sexualidade e o impregnar, na argumentação jurídica, das dinâmicas do gênero e sexualidade.

Dada à relevância deste marco jurisprudencial, quanto à compreensão do critério proibido de discriminação, bem como os pressupostos de gênero e sexualidade ali presentes, transcreve-se parte emblemática do voto do relator:

(...) é tão proibido discriminar as pessoas em razão da sua espécie masculina ou feminina quanto em função da respectiva preferência sexual. Numa frase: há um direito constitucional líquido e certo à isonomia entre homem e mulher: a) de não sofrer discriminação pelo fato em si da contraposta conformação anátomofisiológica; b) de fazer ou deixar de fazer uso da respectiva sexualidade; c) de, nas situações de uso emparceirado da sexualidade, fazê-lo com pessoas adultas do mesmo sexo, ou não; quer dizer, assim como não assiste ao espécime masculino o direito de não ser juridicamente equiparado ao espécime feminino − tirante suas diferenças biológicas −, também não assiste às pessoas heteroafetivas o direito de se contrapor à sua equivalência jurídica perante sujeitos homoafetivos. O que existe é precisamente o contrário: o direito da mulher a tratamento igualitário com os homens, assim como o direito dos homoafetivos a tratamento isonômico com os heteroafetivos; (BRASIL, 2011, p. 24).

Como deflui claramente do texto, os termos, expressões e estrutura argumentativa reproduzem e reforçam hierarquias das dinâmicas hegemônicas do gênero e da sexualidade. Afirma-se, por exemplo, sobre o “espécime masculino” não ter “o direito de não ser juridicamente equiparado ao espécime feminino”, o que se estende “às pessoas heteroafetivas” não terem o direito de “se contrapor à equivalência jurídica perante sujeitos homoafetivos”.

De modo interconectado, estas hierarquias de gênero e de sexualidade posicionam, na formulação jurídica, homens e “heteroafetivos” como paradigmas do sujeito de direito, a quem se devem contrastar mulheres e “homoafetivos”, sujeitos fora da norma que reclamam equiparação. Esta estrutura argumentativa correlaciona práticas jurídicas estatais e dinâmicas de gênero e sexualidade, seja nas dinâmicas de gênero e de sexualidade, ao posicionar homens e “heteroafetivos” como privilegiados nas relações de dominação, seja na lógica jurídica, elegendo-os como termos de comparação por excelência nos juízos de igualdade (GAVARA DE CARA, 2005GAVARA DE CARA, Juan Carlos. Contenido y Función del Término de comparación en la Aplicación del Principio de Igualdad. Cizur Menor: Aranzadi, 2005.), produzindo um bias masculino e heterossexista inerente à ordem jurídica (BAMFORTH; MALIK; O’CINNEIDE, 2008BAMFORTH, Nicholas; MALIK, Maleiha; O’CINNEIDE, Colm. Discrimination Law: theory and context. Londres: Sweet & Maxwell, 2008., p. 276).

Por sua vez, a designação dos grupos comparados a partir da “afetividade”, e não da sexualidade pela qual são discriminados (RIOS, 2011RIOS, Roger Raupp. Direitos Sexuais, uniões homossexuais e a decisão do Supremo Tribunal Federal (ADPF n. 132-RJ e ADI 4.277). In: Homossexualidade e direitos sexuais: reflexões a partir da decisão do STF. Org. Roger Raupp Rios, Célio Golin e Paulo Gilberto Cogo Leivas. Porto Alegre: Sulina, 2011, p. 69-114.), realizada no julgamento, e antes mesmo, a própria circunscrição da questão no âmbito do direito de família, apontam para uma “...tecnologia política e cultural que opera a constituição de indivíduos e a atribuição de estatutos (tais como ‘sujeito’, ‘cidadão’, ‘profissional’, ‘criminoso’ etc)”, onde se apresenta uma dimensão relacional que envolve atos de deslegitimação e que delimita o grau de adequação e de desejo para determinada projeção ou ideia de Estado”(AGUIÃO, 2017AGUIÃO, Silvia. Quais políticas, quais sujeitos? Sentidos da promoção da igualdade de gênero e raça no Brasil (2003 - 2015). Cad. Pagu, Campinas, n. 51, e175107, 2017. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-83332017000300308&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 10 abr. 2020. Epub 08-Jan-2018. DOI: <https://doi.org/10.1590/18094449201700510007>.
http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
). Ênfase afetivista que revela este duplo fazer do gênero e do Estado, tanto na manifestação judicial, que institucionaliza as relações de dominação, como na perspectiva de indivíduos e setores do movimento social, que a mobilizam (COSTA; NARDI, 2015COSTA, Angelo Brandelli; NARDI, Henrique Caetano. O casamento "homoafetivo" e a política da sexualidade: implicações do afeto como justificativa das uniões de pessoas do mesmo sexo. Rev. Estud. Fem., Florianópolis, v. 23, n. 1, p. 137-150, abr. 2015. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-026X2015000100137&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 10 abr. 2020. DOI: <https://doi.org/10.1590/0104-026X2015v23n1p/137>.
http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
).

Esta relacionalidade das dinâmicas de gênero e sexualidade sobre as manifestações estatais e destas sobre aquelas também se desvela no assimilacionismo familista. Nele conjugam-se o assimilacionismo (onde membros de grupos subordinados ou tidos como inferiores adotam padrões dos grupos dominantes, em seu próprio detrimento) e o familismo (proposição que subordina o reconhecimento de direitos sexuais à adaptação a padrões familiares e conjugais institucionalizados pela heterossexualidade compulsória) (MELLO, 2006MELLO, Luiz. Familismo (anti)homossexual e regulação da cidadania no Brasil. Rev. Estud. Fem., Florianópolis, v. 14, n. 2, p. 497-508, set. 2006. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-026X2006000200010&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 10 abr. 2020. DOI: <https://doi.org/10.1590/S0104-026X2006000200010>.
http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
).

Nos direitos sexuais, o assimilacionismo familista conforma a aceitação estatal da homossexualidade ao pressuposto da inclinação afetiva-familiar, ainda que potencial. Nesta operação, admitem-se as diferenças de gênero e de sexualidade desde que não coloquem em xeque a heterossexualidade compulsória, anulando-se qualquer nota de originalidade, transformação ou subversão do padrão heteronormativo (RIOS, 2018RIOS, Roger Raupp. As uniões homossexuais e a “família homoafetiva”: o direito de família como instrumento de adaptação e conservadorismo ou a possibilidade de sua transformação e inovação. Civilistica.com: Revista eletrônica De Direito Civil, v.2, n. 2, p. 1-21. 2018. Disponível em: <https://civilistica.emnuvens.com.br/redc/article/view/101>. Acesso em: 17 abr. 2020.
https://civilistica.emnuvens.com.br/redc...
). Essas dinâmicas de dominação na esfera do gênero e da sexualidade, em sua interconexão com os fazeres estatais judiciais, exprimem-se, na linguagem dos direitos, na referida “homoafetividade”, substantivo cuja carga assimilacionista familista atua como mecanismo “purificador” e “higienizador” de práticas e identidades sexuais subordinadas e indesejáveis, cujo desvalor é contrabalanceado pela “pureza dos sentimentos”. A sexualidade heterossexual, desse modo, é tomada como referência para nomear o indivíduo “naturalmente” detentor de direitos (o heterossexual, cuja sexualidade não necessita a afetividade purgativa para ser reconhecida), ao passo que a sexualidade homossexual é submetida ao mata-borrão da afetividade.

Trata-se, com efeito, da corporificação de certas ‘identidades’ por certos ‘direitos’ e vice-versa (AGUIÃO, 2017AGUIÃO, Silvia. Quais políticas, quais sujeitos? Sentidos da promoção da igualdade de gênero e raça no Brasil (2003 - 2015). Cad. Pagu, Campinas, n. 51, e175107, 2017. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-83332017000300308&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 10 abr. 2020. Epub 08-Jan-2018. DOI: <https://doi.org/10.1590/18094449201700510007>.
http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
), resultantes das estratégias efetivamente empregadas em busca da “promoção da igualdade de direitos”. Nas dinâmicas de gênero e sexualidade e sua relação com a manifestação estatal, a aludida ADPF n. 32 engendrou juridicamente e, por sua vez, reproduziu social e culturalmente, uma hierarquia dos arranjos familiares, reservando à “união homoafetiva” uma inclusão de terceira classe, abaixo do casamento e da união estável heterossexuais, de primeira e segunda classes, respectivamente. Um atuar no sentido da naturalização do modelo de família heterossexual, procedendo a uma “domesticação heterossexista” de todas as formas de sexualidade diversas deste modelo (RIOS, 2018RIOS, Roger Raupp. As uniões homossexuais e a “família homoafetiva”: o direito de família como instrumento de adaptação e conservadorismo ou a possibilidade de sua transformação e inovação. Civilistica.com: Revista eletrônica De Direito Civil, v.2, n. 2, p. 1-21. 2018. Disponível em: <https://civilistica.emnuvens.com.br/redc/article/view/101>. Acesso em: 17 abr. 2020.
https://civilistica.emnuvens.com.br/redc...
).

Da homofobia à homotransfobia: “racismo social” e a inter-relação dos critérios proibidos de discriminação

Nas decisões do Supremo Tribunal Federal, a relacionalidade entre as dinâmicas de gênero e sexualidade e as manifestações estatais também se exteriorizam no alargamento da proteção de discriminação por motivo de sexo (ÁVILA; RIOS, 2016ÁVILA, Ana Paula Oliveira; RIOS, Roger Raupp. Mutação constitucional e proibição de discriminação por motivo de sexo. Revista Direito e Práxis, [S.l.], v. 7, n. 1, p. 21-47, mar. 2016. Disponível em: <https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/revistaceaju/article/view/17987>. Acesso em: 10 abr. 2020. DOI: <https://doi.org/10.12957/dep.2016.17987>.
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), cujo prolongamento estendeu-se da homofobia para a homotransfobia (BRASIL, 2019a).

Diante da mora legislativa parlamentar, o Supremo Tribunal Federal subsumiu a homotransfobia na Lei n. 7716/89 (que trata basicamente de crimes de racismo), por considerar a homotransfobia uma espécie do gênero “racismo social”. Fundamentou a decisão na “...existência de múltiplas expressões semiológicas propiciadas pelo conteúdo normativo da ideia de `raça’”, compreendendo “raça” como:

“...uma arbitrária construção social, desenvolvida em determinado momento histórico, objetivando criar mecanismos destinados a justificar a desigualdade, com a instituição de hierarquias artificialmente apoiadas na hegemonia de determinado grupo de pessoas sobre os demais estratos que existem em uma particular formação social...” (BRASIL, 2019a, p. 97)

Assim concluindo por uma “essencial correspondência que reúne, sob a mesma lógica discriminatória, todas as formas de preconceito e intolerância contra grupos sociais” (BRASIL, 2019a, p. 81).

No direito da antidiscriminação, as consequências das decisões sobre quais são os critérios proibidos de discriminação e a compreensão de seu conteúdo vão além da enumeração das proteções jurídicas disponíveis. Vocacionadas ao enfrentamento de situações discriminatórias as mais variadas, conclusões sobre determinado critério proibido de discriminação (sexo/orientação sexual/identidade de gênero) podem repercutir diretamente em outro critério proibido de discriminação (raça), como a demonstra a compreensão da homotransfobia como “racismo social”. Em sua elaboração, evidencia-se o entrelaçamento entre os diversos critérios proibidos de discriminação, mormente a dinâmica inter-relacional na concretização do direito da antidiscriminação. São fecundas, pois, as repercussões da compreensão de determinado critério proibido de discriminação para a eficácia de outro critério proibido, uma vez que a compreensão da proibição constitucional da discriminação por motivo de raça apoiou conteúdo decisivo para a proteção em benefício de outro critério proibido de discriminação (homotransfobia).

Sem avançar no debate mais pormenorizado quanto à consideração da homotransfobia como “racismo social”, não há dúvida quanto aos propósitos inspiradores desta proposição. Com efeito, a cada momento em que os diversos critérios proibidos de discriminação são explicitados e adicionados (SCHIEK; WADDINGTON; BELL, 2007, p. 33), o que transparece é a luta por reconhecimento daqueles cujas opressões não eram percebidas (FRASER; HONNETH, 2003FRASER, Nancy; HONNETH, Axel. Redistribution or recognition? A political-philosophical Exchange. New York: Verso, 2003.) ou, ainda mais grave, contra quem deliberadamente se quis excluir da proteção antidiscriminatória (DEHESA, 2010DEHESA, Rafael. Queering the Public Sphere in Mexico and Brazil: sexual rights movements in emerging democracies. Durham: Duke University Press, 2010.).

Não há como negar a magnitude e a urgência do direito constitucional à não discriminação por orientação sexual e identidade de gênero, dadas a intensidade de sua violação e as consequências deletérias da mora legislativa. Por outro lado, há que se evitar efeitos colaterais indesejáveis, cuja atenção não faltou ao voto do relator, quanto à fragilização da garantia da legalidade estrita na tipificação penal, essencial no regime democrático.

Tais efeitos colaterais indesejados, no entanto, não se resumem às garantias constitucionais penais, segundo as quais não pode haver criminalização, muito menos pena, sem a existência de lei prévia incriminadora. Do ponto de vista do “duplo fazer do gênero e do Estado”, pode-se perscrutar a dinâmica crescente que o diferencialismo (PIERUCCI, 1999PIERUCCI, Antônio Flávio. Ciladas da diferença. São Paulo: Ed. 34, 1999.) e a interseccionalidade (CRENSHAW, 2004CRENSHAW, Kimberle. A intersecionalidade na discriminação de raça e gênero. In: VV.AA. Cruzamento: raça e gênero. Brasília: Unifem, 2004. Disponível em: <http://www.acaoeducativa.org.br/fdh/wp-content/uploads/2012/09/Kimberle-Crenshaw.pdf>. Acesso em: 13 abril 2020.
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) apresentam no gênero e na sexualidade, em contraste com a conceituação abrangente e universalizante do “racismo social” como indicador da “essencial correspondência que reúne, sob a mesma lógica discriminatória, todas as formas de preconceito e intolerância contra grupos sociais” (BRASIL, 2019a, p. 81).

Com efeito, ao passo que a produtividade social do gênero e da sexualidade, sempre atenta às diversas opressões e suas interseccionalidades, provoca desdobramentos das “diferenças na diferença”, da manifestação judicial podem derivar-se esmaecimentos para o enfrentamento dos racismos. Não bastasse a especificidade entre as diversas espécies de discriminação, sem confundi-las com a compreensão do fenômeno discriminatório em si e considerado amplamente (ALLPORT, 1979ALLPORT, Gordon. The nature for Prejudice. Cambridge: Perseus Books, 1979.; DOVIDIO, HEWSTONE, GLICK; ESSES, 2013DOVIDIO, John F.; HEWSTONE, Miles; GLICK, Peter; ESSES, Victoria. The SAGE Handbook of Prejudice, Stereotyping and Discrimination. London: Sage, 2013.), os marcadores sociais da diferença entre racismo e sexismo são distintos. Enquanto sexismo e homofobia reportam-se à imputação sexuada dos indivíduos e grupos (BORRILLO, 2010BORRILLO, Daniel. Homofobia: história e crítica de um conceito. Belo Horizonte: Autêntica, 2010., p. 34), racismo e a raça dizem respeito à ascendência étnica (BETHENCOURT, 2018) e a características físicas (SANTOS, 2012), conceitos articulados de variadas formas (POUTIGNAT; STREIFF-FERNART, 1995POUTIGNAT, Philippe; STREIFF-FENART, Jocelyne. Teorias da Etnicidade. São Paulo: Editora UNESP, 1995.), que instituem “uma forma de organização e de exclusão baseada na suposta existência de raças superiores e inferiores, de raças valorizadas e de raças depreciadas” (D`ADESKY, 2001D’ADESKY, Jacques. Pluralismo étnico e multiculturalismo: racismos e anti-racismo no Brasil. Rio de Janeiro: Pallas, 2001., p. 36), resultante de processos sociais de racialização de indivíduos e grupos humanos (GUIMARÃES, 1999GUIMARÃES, Antonio Sérgio Aldrego. Racismo e Anti-Racismo no Brasil. 34 ed. São Paulo: 1999.; ALENCASTRO, 1985ALENCASTRO, Luiz Felipe de. ‘Geopolítica da mestiçagem’. Novos Estudos, São Paulo: CEBRAP, 1985.).

Ao enunciar a proibição da homotransfobia como modalidade de racismo social, propõe uma compreensão jurídica inter-relacionada de critérios juridicamente protegidos de discriminação (raça, orientação sexual e identidade de gênero) num sentido problemático diante das esferas do gênero e da sexualidade. Isso porque, ao definir o “racismo social” de modo universalizante e abrangente de todas as formas de discriminação, discrepa da percepção das “diferenças na diferença”, desnudadas pela sensibilidade das dinâmicas de gênero e sexualidade à interseccionalidade.

Identidade de gênero e critérios proibidos de discriminação: “direito dos banheiros” e registro civil

Examinados conjuntamente, os pronunciamentos do Supremo Tribunal Federal envolvendo identidade de gênero aqui destacados podem ser lidos como indicadores de um amadurecimento na compreensão da identidade de gênero, ao mesmo tempo que também são reveladores de um avanço jurisprudencial em termos antidiscriminatórios. Trata-se do julgamento, ainda em curso, sobre a utilização de banheiros públicos conforme a identidade de gênero autodesignada, contrastado com a decisão plenária definitiva sobre o registro civil de pessoas transexuais.

No primeiro caso, a discussão jurídica acerca do banheiro adequado para as pessoas travestis e transexuais foi levada ao STF por meio do Recurso Extraordinário 845.779 (BRASIL, 2015), que trata de transexual proibida de utilizar o banheiro feminino de um shopping center, que, abalada com a situação, acabou urinando nas próprias roupas. Em primeiro grau, o estabelecimento foi condenado ao pagamento de indenização por danos morais. A sentença foi reformada pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJ/SC), sob o argumento de que tal episódio configura mero dissabor, não tendo condições de lesionar sentimentos ou causar dor.

O julgamento iniciou-se pelo provimento do recurso, com os votos dos Ministros Luís Roberto Barroso e Edson Fachin, em 19 de novembro de 2015. O Ministro Luiz Fux interrompeu o julgamento ao pedir vista do processo, invocando a necessidade de consultar a sociedade, referindo que há mulheres e crianças que se sentem constrangidas e vulneráveis quando se deparam com travestis e transexuais no banheiro feminino. No entanto, ao lançar mão de preocupação pretensamente democrática, acaba, “a pretexto de proteger a privacidade de certas usuárias, expor transexuais femininas a ameaça de lesão e danos graves, concretos e comprovados de violência” (RIOS; RESADORI, 2015RIOS, Roger Raupp e RESADORI, Alice Hertzog. Direitos humanos, transexualidade e “direito dos banheiros”. Revista Direito e Práxis, Rio de Janeiro, Vol. 06, N. 12, 2015, p. 196-227. Disponível em: <https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/revistaceaju/article/view/16715>. Acesso em: 10 abr. 2020. DOI <https://doi.org/10.12957/dep.2015.16715>.
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, p. 216).

Em seu voto, o Relator, Ministro Barroso, destacou que o preconceito decorre da ignorância e, por isso, frisou a importância de se distinguir os conceitos de sexo, gênero e sexualidade, bem como de compreender o que é a transexualidade. Apesar de reconhecer que há disputa na definição do conceito de sexo, lançou mão de definições binárias e essencialistas, que ignoram as discussões sobre o caráter sócio-histórico do sexo (BUNCHAFT, 2016BUNCHAFT, Maria Eugênia. Transexualidade e o “direito dos banheiros” no STF: uma reflexão à luz de Post, Siegel e Fraser. Rev. Bras. Polít. Públicas (online). Brasília, v. 6, n. 3, 2016, p. 222-243. Disponível em: <https://www.publicacoes.uniceub.br/RBPP/article/view/4112>. Acesso em: 10 abr. 2020. DOI: <http://dx.doi.org/10.5102/rbpp/bjpp.v6i3.4112>.
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) e naturalizam um modelo de sujeito inteligível e heteronormativo (BUTLER, 2003BUTLER, Judith. Problemas de gênero: Feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.), ao qual as transexuais e travestis não correspondem. Em tal lógica, a transexualidade é caracterizada como a condição imutável de pessoas que não se identificam com o gênero atribuído ao seu sexo biológico e que buscam corrigir esta inadequação, alterando seus corpos para que correspondam ao gênero pelo qual se identificam. Em que pese o esforço em tratar a transexualidade como uma condição pessoal, e não como patologia, acaba-se reproduzindo a compreensão de que as identidades são fixas, imutáveis, e também a de que há necessidade de conformação ao modelo de sexo e gênero estabelecido como normal.

Ao mesmo tempo que o direito à igualdade é invocado para sustentar a tese de que as pessoas trans devem ser tratadas de acordo com a sua identidade de gênero, inclusive no que tange à escolha de banheiros públicos, mantêm-se os binarismos homem/mulher, feminino/masculino. Esta compreensão, aparentemente neutra, é nutrida por percepções distantes da experiência existencial e do estado da arte do debate sobre sexo e sexualidade, resultando, na prática, na distinção de uma terceira e estigmatizada classe de usuários dos banheiros (RIOS; RESADORI, 2015RIOS, Roger Raupp e RESADORI, Alice Hertzog. Direitos humanos, transexualidade e “direito dos banheiros”. Revista Direito e Práxis, Rio de Janeiro, Vol. 06, N. 12, 2015, p. 196-227. Disponível em: <https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/revistaceaju/article/view/16715>. Acesso em: 10 abr. 2020. DOI <https://doi.org/10.12957/dep.2015.16715>.
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, p. 217).

Por sua vez, o provimento final sobre o registro civil de pessoas transgêneras, assegurando o direito à substituição de prenome e sexo diretamente no registro civil, independentemente de procedimentos médicos ou referendo judicial, tomou caminho substancialmente diverso. Nos termos do relator, Ministro Edson Fachin, a decisão na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 4.275 (BRASIL, 2019b) não só abre espaço para uma compreensão despregada do essencialismo e do binarismo de gênero, como também explicita conteúdos importantes.

Nos campos do gênero e da sexualidade, destacam-se a referência expressa à identidade de gênero conforme os Princípios de Yogyakarta, bem como a abertura do voto do relator à perspectiva não-essencialista,

Sobre esse ponto, deve-se recordar que a identidade de gênero foi definida nesta opinião como a vivência interna e individual do gênero tal como cada pessoa o sente, o qual pode ou não corresponder com o sexo assinalado no momento do nascimento. (...) o reconhecimento da identidade de gênero encontra-se ligada necessariamente à ideia segundo a qual o sexo e o gênero devem ser percebidos como parte de uma construção identitária que resulta da decisão livre e autônoma de cada pessoa, sem que se deve estar sujeita à sua genitália.

Dessa forma, o sexo, assim como as identidades, as funções e os atributos construídos socialmente que se atribuem a diferenças biológicas em todo o sexo assinalado ao nascer, longe de constituir-se em componentes objetivos e imutáveis do estado civil que individualiza uma pessoa, por ser um fato da natureza física ou biológica, terminam sendo traços que dependem da apreciação subjetiva de quem o detenha ou residam em construção da identidade de gênero auto-percebida relacionada com o livre desenvolvimento da personalidade, a autodeterminação sexual e o direito a vida privada”. (par. 93- 95). (BRASIL, 2019b, p. 11, grifei).

A decisão na ADI n. 4275 (BRASIL, 2019b) também se mostra marcante na relação entre o direito da antidiscriminação e as dinâmicas de gênero e sexualidade. Nota-se o caminho argumentativo empreendido pelo relator, que desde o início ressaltou o “diálogo necessário” entre a proibição de discriminação por motivo de sexo e outras cláusulas protetivas, em especial os artigos 2, al. 1, e 26, do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e o artigo 1 do Pacto de São José da Costa Rica. Aqueles, ao proibirem qualquer forma de discriminação e garantirem a todas as pessoas proteção igual e eficaz contra qualquer tipo de discriminação; este, ao afastar qualquer tipo de discriminação, seja por motivo de raça, cor, sexo, idioma, religião, opiniões políticas ou de qualquer outra natureza, origem nacional ou social, posição econômica, nascimento ou qualquer outra condição social.

As referências normativas expostas exemplificam a aludida inter-relação entre os diversos critérios proibidos de discriminação e reafirmam o caráter aberto e exemplificativo da lista de critérios protegidos. Mais ainda: o julgamento manifesta-se de modo claro e definitivo sobre a inclusão das proibições de discriminação por motivo de identidade e de expressão de gênero no direito antidiscriminatório, mediante o diálogo com o direito interamericano dos direitos humanos.

Nas palavras do relator, que expressam sua interpretação de trecho, que transcreve em seu voto, de sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos:

Da forma como redigido, o dispositivo da Convenção Americana necessariamente abarca os transgêneros. É nesse sentido que a Corte Interamericana firmou em sua opinião consultiva:

‘(...) a Corte Interamericana deixa estabelecido que a orientação sexual e a identidade de gênero, assim como a expressão de gênero, são categorias protegidas pela Convenção. Por isso está proibida pela Convenção qualquer norma, ato ou prática discriminatória baseada na orientação sexual, identidade de gênero ou expressão de gênero da pessoa. Em consequência, nenhuma norma, decisão ou prática do direito interno, seja por parte das autoridades estatais ou por particulares, podem diminuir ou restringir, de modo algum, os direitos de um pessoas à sua orientação sexual, sua identidade de gênero e/ ou sua expressão de gênero’. (par. 78). (BRASIL, 2019b, p. 10).

Comparando-se tais manifestações sobre identidade de gênero, contrastam-se compreensões sobre a identidade de gênero como categoria juridicamente protegida de discriminação, reveladoras das dificuldades na incorporação de categorias além do binarismo de gênero e do dimorfismo sexual (AGUIÃO, 2017AGUIÃO, Silvia. Quais políticas, quais sujeitos? Sentidos da promoção da igualdade de gênero e raça no Brasil (2003 - 2015). Cad. Pagu, Campinas, n. 51, e175107, 2017. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-83332017000300308&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 10 abr. 2020. Epub 08-Jan-2018. DOI: <https://doi.org/10.1590/18094449201700510007>.
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). No primeiro caso (dos banheiros), ainda pendente de julgamento, o relator acaba por atrelar-se ao binarismo de gênero, enquanto no segundo (do registro civil), já concluído, afirma-se um paradigma autodeterminativo e não-essencialista quanto à identidade de gênero (SUIAMA, 2011). Neste terreno, também se nota a relacionalidade entre a prática estatal e as dinâmicas políticas e os debates teóricos do gênero e da sexualidade, pois o esforço na conceituação judicial do critério proibido de discriminação deles recebe influxo, ao mesmo tempo em que suas conclusões produzem efeitos na constituição dos sujeitos e na administração das populações.

Esta trajetória sugere que, na compreensão do tribunal quanto à identidade de gênero como critério proibido de discriminação, há efetivamente interfaces entre a elaboração institucional estatal e os debates teóricos e políticos presentes no campo do gênero, expressando o deslocamento que se verifica das políticas de gênero, gestadas nos movimentos sociais LGBT e feminista, para loci estatais institucionalizados (VIANNA; LOWENKRON, 2017b).

Doação de sangue por homens que tiveram sexo com homens (HSH): critérios proibidos de discriminação e modalidades de discriminação direta e indireta

Em outubro de 2017, o STF iniciou o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 5543 (BRASIL, 2017), que trata da inconstitucionalidade do art. 64, IV, da Portaria n. 158/2016 do Ministério da Saúde, e do art. 25, XXX, “d”, da Resolução da Diretoria Colegiada RDC nº 34/2014 da Agencia Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), que proíbem a doação de sangue por homens que mantiveram relações sexuais com outros homens nos últimos 12 meses.

O julgamento, em curso, iniciou-se com o voto do Ministro Relator Edson Fachin, pela inconstitucionalidade por afronta à dignidade humana, aos direitos da personalidade, à igualdade e à liberdade de pessoas homossexuais, sendo acompanhado por Luiz Fux, Luís Roberto Barroso e Rosa Weber. Salientou que, apesar de os dispositivos não proibirem terminantemente a doação de sangue por homossexuais, o lapso temporal torna tal proibição definitiva, violando a forma de ser e de existir dessas pessoas; referiu que a limitação atinge um grupo pelo simples fato de serem como são, não por atuarem de maneira arriscada, enquanto que a (in)aptidão para doar sangue deve ser definida pela conduta e não pela orientação sexual. Daí concluiu por discriminação indireta, pois tal restrição promove limitação desproporcional, mesmo que não intencional, aos homossexuais (BRUNETTO, 2017). O Ministro Alexandre de Moraes, por sua vez, votou pela parcial procedência, entendendo pela possibilidade de doação de sangue por homossexuais, desde que este seja usado depois da realização de testes, que devem respeitar o período da janela imunológica.

Ainda que o julgamento não tenha sido finalizado, a manifestação do relator, acompanhada por outros ministros, por si só, propõe questões de inegável valor analítico. Em sua trama, ela se ocupa de critérios proibidos de discriminação, da distinção entre a proteção antidiscriminatória de identidades e de práticas e das modalidades discriminatórias direta e indireta.

Particularmente quanto aos critérios protegidos de discriminação e sua bifurcação em identidades e práticas, o relator pondera que o prazo inabilitador de 12 meses sem relações sexuais entre homens (= prática + tempo) importa em discriminação voltada contra o grupo e, nessa medida, contra “os modos de ser e de existir” (BRASIL, 2017, p. 11) de homossexuais (= identidade). Mais ainda, segundo a ética da alteridade adotada no voto (“somos aquilo que respondemos ao apelo do Outro”- p. 5 - em apud do filósofo Emmanuel Levinas), a proibição resulta na “negação definitiva de qualquer possibilidade do exercício desse ato maior de alteridade, por qualquer homem homossexual ou bissexual e/ou suas parceiras que possuam vida sexual minimamente ativa” (BRASIL, 2017, p. 11), prejudicando inclusive a solidariedade intra-grupo (p. 26) .

A seu juízo, é inválida a restrição:

“...fundada no grupo de risco, estabelecido pela orientação sexual dessas pessoas, e não pelas suas condutas que poderiam expô-las ao risco. Ao assim disporem, essas normas estabelecem limitação fundada na orientação sexual das pessoas, e não em suas práticas e comportamentos.” (BRASIL, 2017, p. 23)

Tal desenvolvimento argumentativo, atento à identidade e à conduta, não só distinguiu e relacionou essas modalidades distintas de proteção, como também as articulou, buscando desatar a armadilha discriminatória que cria identidades a partir de diferenças criadas por processos sociais que miram nas práticas sexuais (SCOTT, 1998).

No duplo fazer do gênero e do Estado, ao avançar no manejo jurídico das categorias antidiscriminatórias (identidades e práticas protegidas), o voto espelha e irradia o acirrado debate que se verifica nas dinâmicas de gênero e sexualidade, quanto às categorias empregadas, de um lado, pelas abordagens biomédicas e epidemiológicas, e de outro, pelas ciências sociais e pela sociedade civil organizada (ABRASCO, 2017), indicando um campo de disputa de hegemonia (EFREM FILHO, 2018).

Com efeito, a literatura especializada no campo das ciências sociais (PARKER; AGGLETON; PEREZ-BRUMER, 2016PARKER, Richard Parker, AGGLETON, Peter & PEREZ-BRUMER, Amaya G. The trouble with ‘Categories’: Rethinking men who have sex with men, transgender and their equivalents in HIV prevention and health promotion. Global Public Health, 2016. 11:7-8, 819-823. Disponível em: <https://www.tandfonline.com/doi/abs/10.1080/17441692.2016.1185138?journalCode=rgph20>. Acesso em: 10 abr. 2020.
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) não só salienta a insuficiência da categoria HSH (“homens que fazem sexo com homens”) para a compreensão da diversidade sexual e de gênero, comprometendo os resultados das políticas públicas de saúde e direitos humanos, como também adverte para estigmatizações (BOELLSTORFF, 2011BOELLSTORFF, Tom. “BUT DO NOT IDENTIFY AS GAY: A Proleptic Genealogy of the MSM Category.” CULTURAL ANTHROPOLOGY, Vol. 26, Issue 2, pp. 287-312. 2011.; YOUNG; MEYER, 2005) e dicotomias morais (MORA; BRIGEIRO; MONTEIRO, 2018MORA, Claudia Mora; BRIGEIRO, Mauro Brigeiro, MONTEIRO, Simone. “A testagem do HIV entre “HSH”: tecnologias de prevenção, moralidade sexual e autovigilância sorológica.” Physis: Revista de Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, v. 28(2), e280204, p. 2018. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-73312018000200600&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 10 abr. 2020. DOI: <https://doi.org/10.1590/s0103-73312018280204>.
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; PECHENY, 2012PECHENY, M. HSH en América Latina: Itinerario de una categoría, persistencia de una epidemia, malestares en las respuestas. In: REDE SAGAS BRASIL. Interações preventivas com juventudes homossexuais, mulheres lésbicas e pessoas vivendo com HIV/AIDS. Fortaleza: GRAB, 2012.) dela decorrentes.

Desse modo, a dinâmica interconectada do gênero e da sexualidade e dos fazeres institucionais estatais, reveladas nesse julgamento ainda em curso, aponta não só para o influxo dos estudos e do ativismo em gênero e sexualidade no debate jurídico, como também para os impactos do direito da antidiscriminação nas dinâmicas sociais, culturais e políticas, dado que a perspectiva identitária, em vez de substituída pela categoria biomédica “HSH”, foi decisiva no desenvolvimento do voto do relator, já acompanhado com outros ministros (Roberto Barroso, Luiz Fux e Rosa Weber).

Considerações finais

Dentre os diversos âmbitos da realidade social e política, gênero e sexualidade, assim como a experiência jurídica, são dimensões constitutivas da sociabilidade, da individualidade e da trajetória política das coletividades nacionais, locais e globais. No breve período em que a sociedade brasileira, desde a promulgação da Constituição de 1988 até meados do segundo decênio deste século, experimentou a emergência de reivindicações sociais, culturais e políticas, combinada com expansão de direitos e ideais democráticos, é possível vislumbrar a sinergia, ainda que imperfeita, e a relacionalidade, entre as demandas por justiça de gênero e justiça sexual e o desenvolvimento do direito da antidiscriminação.

Nesta trajetória, a justiça nas relações de gênero e na sexualidade reclamam o manejo de categorias antidiscriminatórias aptas não só a descrever, como a colaborar na constituição de políticas públicas e iniciativas sociais igualitárias e equitativas. Essa construção hermenêutica atua no aludido duplo fazer do gênero e do Estado, onde tanto as construções teóricas jurídicas, como a constituição das identidades sexuais e gênero e as relações onde elas se produzem, interconectam-se e se relacionam.

Neste duplo movimento, criam-se condições para a melhor compreensão e a melhor concretização das categorias do direito da antidiscriminação, ao mesmo tempo que seus limites e potenciais epistemológicos são desafiados. Que essa espiral produtiva entre reivindicações por justiça sexual e de gênero se revele mais e mais apta a enfrentar e fortalecer-se diante dos momentos sombrios que a democracia e os direitos humanos, especialmente nas esferas do gênero e da sexualidade, atravessam nos dias de hoje.

Referências bibliográficas

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  • 1
    Aprovada pelas Nações Unidas em 21.12.1965 e ratificada pelo Brasil em 27.03.1968. Reza seu artigo 1º, I: “Qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada em raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica que tenha o propósito ou o efeito de anular ou prejudicar o reconhecimento, gozo ou exercício em pé de igualdade de direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural ou em qualquer outro campo da vida pública”.
  • 2
    Aprovada pelas Nações Unidas em 18.12.1979 e ratificada pelo Brasil em 21.03.1981. Diz seu art. 1º, ao definir discriminação: “toda distinção, exclusão ou restrição baseada no sexo que tinha por objeto ou resultado prejudicar ou anular o reconhecimento, gozo, exercício pela mulher, independente de seu estado civil, com base na igualdade do homem e da mulher, dos direitos humanos e das liberdades fundamentais nos campos políticos, econômico, social e civil ou em qualquer outro campo”.
  • 3
    Internalizada pelo Brasil por intermédio do Decreto nº 6.949, de 25 de agosto de 2009.
  • 4
    Aprovada pela Organização dos Estados Americanos em 06.06.2013, ainda pendente de ratificação pelo Brasil.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Jun 2020
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2020

Histórico

  • Recebido
    19 Abr 2020
  • Aceito
    22 Abr 2020
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