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Ellwanger e as transformações do Supremo Tribunal Federal: um novo começo?

Ellwanger and the transformations of the Supreme Federal Court: a new beginning?

Resumo

Neste trabalho, procuro reconstruir Ellwanger como um momento de mudança no discurso adotado pelos ministros do STF para descrever e justificar seu poder em uma democracia. Ao longo dos anos 90, o tribunal havia sido no geral contido na maneira como exercia seus poderes e não havia investido em uma pauta de direitos fundamentais. Em contraste com outros tribunais em democracias recentes no mesmo período, o STF não se aproveitou do potencial ganho de legitimidade proporcionado pelo “novo começo constitucional” de 1988. No processo de transformação desse tribunal tímido no STF que temos hoje, Ellwanger pode ser lido como um ponto de virada na narrativa dos ministros. Ao longo do julgamento, o tribunal se apresentou, pela primeira vez desde a Constituição de 1988, como representante local de uma tarefa global: a proteção de direitos fundamentais de indivíduos ou grupos social ou politicamente vulneráveis. Com o voto do ministro Celso de Mello traçando a diferença entre o “velho” STF e a “nova” lógica de atuação, Ellwanger dá ao tribunal a chance de construir um “novo começo”, afirmando-se – no discurso, ainda que não necessariamente na prática – como um protetor de direitos fundamentais.

Palavras-chave:
Supremo Tribunal Federal; Tribunais Constitucionais; Caso Ellwanger; Legitimidade; Direitos Fundamentais

Abstract

This paper provides an account of the Ellwanger case as a transformative moment in how Supreme Federal Court (STF) judges conceive of and justify their role in the Brazilian democracy. Throughout the 90s, the Supreme Court had been overall self-restrained and had not invested in building an agenda of fundamental rights. In this sense, in contrast to high courts in other recent democracies in the same period, the court did not seize upon the “new constitutional beginning” of 1988 to expand its legitimacy. In the transformation from that self-restrained court to the more active one we have today, the Ellwanger case, decided in 2003, is a turning point in the narrative adopted by the STF judges. During that long decision-making process, the court fully articulated, for the first time, a vision of itself as the local representative of a global mission: protecting the rights of socially or politically vulnerable individuals or groups. Judge Celso de Mello’s opinion, in particular, clearly contrasts the “old” STF from the 90s with the “new” proposed role, thus allowing the court to reposition itself – in its discourse, although not necessarily in its actual decision-making – primarily as a protector of fundamental rights.

Keywords:
Supreme Federal Court; Constitutional Courts; Ellwanger case; Legitimacy; Fundamental rights

Min. Ayres Britto: “Como diria Camões, redivivo: ‘cessa tudo que a antiga musa canta, que outro valor mais alto se alevanta’.”

Min. Nelson Jobim: “Camões não conhecia Processo Penal.

(trechos de debates no HC 82.424 – caso “Ellwanger”)

1. Introdução* * Ao longo de 2019 e 2020, versões anteriores deste trabalho foram apresentadas em seminários na FGV Direito SP (no evento “Dossiê Ellwanger”, organizado pela Plataforma de Liberdade de Expressão e Democracia (PLED), e em um seminário do Núcleo de Justiça e Constituição); na Universidade Federal do Rio de Janeiro (FND/UFRJ), que me recebeu como professor visitante entre 2020 e 2021; e no grupo de pesquisa “Judiciário e Democracia” (JUDE) da Universidade de São Paulo (DCP/USP). A versão final se beneficiou de comentários e críticas de diversos participantes nesses eventos, a quem agradeço na pessoa de seus organizadores: Carlos Bolonha, Clarissa Gross, Dimitri Dimoulis, Nikolay Bispo, Pedro Fortes, Rogério Bastos Arantes e Ronaldo Porto Macedo. Agradeço especialmente a Evandro Süssekind, Felipe Recondo, Luiz Gomes Esteves, Guilherme Almeida, Thomaz Pereira e Pedro Jimenez Cantisano pela leitura crítica de múltiplas versões do trabalho, e a Mariana Muniz e Julia Freitas pelo auxílio na pesquisa e revisão.

No dia 5 de outubro de 1988, meia hora antes de sua promulgação oficial, a nova Constituição brasileira garantiu a liberdade de Manoel Fernandes. Fernandes havia sido “preso para averiguações” – prática policial consistente em prender e manter presas, sem autorização judicial e fora do contexto de um flagrante, pessoas consideradas “suspeitas”. A “prisão para averiguação” era prática até então normal, mas, segundo a nova Constituição, “ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente (...)”.1 1 Artigo 5º, LXI, Constituição Federal. A incidência da nova regra seria tão evidente que, segundo o advogado de Fernandes, sua mera presença na delegacia teria feito os policiais liberarem seu cliente: “todo mundo já está sabendo que esse tipo de prisão é ilegal”.2 2 Preso é libertado em São Paulo. O Estado de São Paulo, 06 out. 1988. A nova ordem constitucional parecia ter chegado de maneira clara, imediata e inequívoca. Contudo, o caso de Fernandes não é representativo. Especialmente com relação a direitos fundamentais, a implementação da nova Constituição parece ter sido deliberadamente atrasada, em vários casos, a partir de intervenções e omissões do Supremo Tribunal Federal.

A Constituição criou ampliados mecanismos de controle do poder político e de proteção a direitos fundamentais. Esses dispositivos desenhavam um tribunal ativo – no enfrentamento de questões da ordem do dia da política nacional; no processo de filtragem do conteúdo autoritário da legislação do regime militar; e, também, na proteção de direitos fundamentais. Ao longo dos anos 90, porém, o STF foi no geral tímido em todas essas dimensões. Com exceção de reformas que envolviam servidores públicos e o sistema de justiça, confrontos diretos com o governo federal eram raros. E, com exceção da esfera penal, o tribunal foi pouco ativo em discussões sobre direitos fundamentais, em especial de grupos vulneráveis. Essa contenção relativa se expressava em múltiplos níveis – no resultado das decisões do tribunal, na leitura restritiva que os ministros faziam de muitos dos seus novos poderes, e no adiamento de temas potencialmente delicados.3 3 Ver, p.ex., De Oliveira (2005) (privatizações); Da Ros (2008) (medidas provisórias); Dimoulis (2016) (tendência “passivista” do Supremo); de maneira mais geral, ver Arantes (1997), Mendes (2008), Brinks (2011), Koerner (2013) e Pereira (2016). Para discussões mais gerais sobre do poder de agenda no STF, ver Dimoulis (2008); Arguelhes e Ribeiro (2018). Diante de uma Constituição que configurava e exigia um tribunal constitucional ativo, o Supremo hesitou. Construiu, ao longo dos anos 90, seu próprio script sobre quais seriam seus poderes, contrariando as expectativas de constituintes e da comunidade jurídica e o próprio texto constitucional.

Nesse período, no discurso sobre o seu papel, o STF contrastava com outros tribunais em democracias recentes no mesmo período. Em países como Colômbia (Cepeda-Espinosa, 2004CEPEDA-ESPINOSA, Manuel. Judicial Activism in a Violent Context: The Origin, Role, and Impact of the Colombian Constitutional Court. Washington University Global Studies Law Review, v.3, n. 4, p. 529-700, jan. 2004.), Hungria (Dupré, 2003DUPRÉ, Catharine. Importing law in post-communist transitions: the Hungarian constitutional court and the right to human dignity. Oxford: Hart Publishing, 2003.), Polônia (Sadurski, 2001SADURSKI, Wojciech. Rights Before Courts: A Study of Constitutional Courts in Post communist States of Central and Eastern Europe. Springer, 2001.) e África do Sul (Klug, 2000KLUG, Heinz. Constituting Democracy: Law, Globalism and South Africa’s Political Reconstruction. Cambridge: Cambridge University Press, 2000.), o alinhamento entre uma nova Constituição e um novo regime político foi deliberadamente enfatizado pelo tribunal para anunciar uma nova era jurisprudencial.4 4 Seriam exemplos da ideia de um “novo começo constitucional” – um cenário de transição política que, segundo Ackerman (1997), tenderia a estar associado a expansão do poder de tribunais constitucionais. Esses tribunais se apresentaram publicamente como instituições especializadas na proteção de direitos fundamentais, com reflexos na pauta que escolheram para si e nas ideias com que justificavam sua atuação. Inseriam-se em uma narrativa mais ampla, que se espalhava entre juízes e juristas pelo mundo, segundo a qual tribunais constitucionais fortes resultariam de lições e decisões do pós-guerra quanto aos limites da democracia majoritária.5 5 Segundo Stone Sweet (2012, p. 816), esse “novo constitucionalismo” que surge na Alemanha e se expande para o mundo nas décadas seguintes consiste em: “a model of democracy and state legitmacy that rejects the dogmas of legislative sovereignty, prioritizes fundamental rights, and requires a new mode of constitutional review.” Essa ênfase em direitos seria parte da reação “aos horrores do holocausto e à destruição da Segunda Guerra Mundial”, atingindo quase um status de “civic religion” em diversos países (p. 829). Apesar de sua popularidade, essa narrativa linear – do pós-guerra aos anos 90 – vem vendo problematizada. Ver Hailbronner (2015).

No seu ritmo, o Supremo eventualmente mudou. Na terceira década da Constituição, ainda que se mantenha tímido ou silencioso em certos temas e momentos, o tribunal mudou completamente a chave de interpretação do seu papel. Se o STF dos anos 90 inventava limites onde os constituintes não os tinham criado, o tribunal de hoje parece sempre disposto a ampliar as fronteiras de sua atuação.6 6 Diversos dos elementos que configuram essa atuação acentuada do STF no cenário político começaram ser identificados nos anos 2000. Ver, nesse sentido, Vieira (2008). Essa mudança se operou também no nível das ideias. O STF hoje se insere na narrativa global típica de tribunais constitucionais. Segundo o site do tribunal, sua “missão” institucional é “velar pela integridade dos direitos fundamentais”, “conferir prevalência à essencial dignidade da pessoa humana, “fazer cumprir os pactos internacionais que protegem os grupos vulneráveis expostos a injustas perseguições e a práticas discriminatórias.7 7 O site do STF atribui a autoria do texto ao ministro Celso de Mello. Disponível em: <http://portal.stf.jus.br/hotsites/mincelsomello/ >. Acesso em 25/01/2021. Essas ideias tinham reduzido espaço na pauta e no discurso do tribunal nos anos 90.

Entre esses dois Supremos distintos em comportamento e discurso, o ano de 2003 foi uma confluência de transformações. Primeiro, consolida-se a TV Justiça, criada em agosto de 2002, expondo ao vivo a interação entre ministros e ministras do STF. Segundo, ocorre a primeira efetiva alternância eleitoral de poder na democracia brasileira pós-88, com Fernando Henrique Cardoso transferindo a faixa presidencial para Luiz Inácio Lula da Silva. Terceiro, a mudança geracional em curso na composição do STF dá um salto com a aposentadoria, em 2002 e 2003, dos últimos três ministros indicados pela ditadura militar – Néri da Silveira, Sydney Sanches e José Carlos Moreira Alves. Ingressam em seu lugar ministros que, com diferentes perfis, já haviam desenvolvido suas carreiras sob a Constituição de 1988.

Nesse ano de transformações, o STF decidiu o HC 82.424, o caso Ellwanger. Na formulação do relator original do caso, ministro Moreira Alves, o caso envolveria apenas saber se, pelo texto da Constituição, a discriminação contra judeus seria “prática de racismo”. Ao longo do julgamento, porém, Ellwanger se tornou algo maior – jurídica, política e simbolicamente. Neste trabalho, procuro reconstruir Ellwanger como um momento de anunciação, no STF, do discurso legitimador de tribunais constitucionais como instituições desenhadas para limitar maiorias legislativas e proteger direitos fundamentais no contexto do pós-guerra. Até ali, o tribunal não se aproveitara do potencial ganho de legitimidade do “novo começo constitucional” de 1988. Ellwanger é o ponto de virada na dimensão narrativa – isto é, não quanto a como o STF de fato se comporta, mas a como o tribunal fala sobre o seu próprio poder e o seu papel. Ao longo do julgamento, ministros descrevem o tribunal como representante local de uma tarefa global: a contenção de maiorias que, por ação ou omissão, violariam direitos fundamentais de indivíduos ou grupos politicamente vulneráveis. Com o voto de Celso de Mello traçando a diferença entre o STF “velho” e a “nova” lógica, Ellwanger é a nova chance de um novo começo – no discurso, ainda que não necessariamente na prática – do STF como protetor de direitos fundamentais.

A literatura tem enfocado Ellwanger primariamente do ponto de vista metodológico. Diversos ministros construíram seus votos em termos de um conflito constitucional de princípios (entre liberdade de expressão e dignidade humana ou igualdade), e não apenas de interpretação dos termos de uma regra (no caso, o alcance da expressão “racismo”).8 8 Ver, p. ex, Macedo (2017); Ommati (2007); De Oliveira (2015); Sarlet (2013); Silva, De Oliveira e Rabelo (2011); Da Silva (2011). A ideia de que aplicar direitos fundamentais previstos na Constituição envolveria resolver uma colisão entre princípios era relativamente recente na jurisprudência do STF naquele período. No início da década de 2000, textos acadêmicos no Brasil começaram a apresentar, de maneira integrada, a dimensão metodológica e o que chamo aqui de dimensão narrativa – como se a tarefa de proteção de direitos fundamentais de grupos vulneráveis exigisse ou implicasse logicamente a adoção de determinadas metodologias de decisão baseadas em princípios ou em colisão de direitos fundamentais.9 9 Ver, sobretudo, Barroso (2005); para uma perspectiva crítica, ver Leal (2014). Contudo, as duas dimensões não têm relação necessária entre si. De fato, ao longo do julgamento de Ellwanger, o “novo” ponto de vista metodológico (centrado em conflitos de princípios) aparece, em vários votos, de forma independente da “nova” narrativa. No próprio julgamento, porém, é possível ver a ponte entre as duas dimensões sendo construída em tempo real. Mesmo que não tenham relação necessária, a combinação das duas dimensões, metodológica e narrativa, é fundamental para compreender o percurso do tribunal. O foco deste trabalho, porém, está na dimensão narrativa.

Ellwanger já foi apontado como “ponto de inflexão” da influência de Moreira Alves, líder de uma concepção mais “contida” da atuação do STF (Recondo e Weber, 2019RECONDO, Felipe; WEBER, Luiz. Os Onze. Companhia das Letras, 2019.; Kaufmann, 2019KAUFMANN, Rodrigo. A Grande Dicotomia: o STF entre as Visões de Moreira Alves e Sepúlveda Pertence. Consultor Jurídico, 24.08.2019, Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2019-ago-24/grande-dicotomia-stf-entre-moreira-alves-sepulveda-pertence>. Acesso em: 15 set. 2020.
https://www.conjur.com.br/2019-ago-24/gr...
).10 10 Em reportagem no Valor Econômico no dia da posse do ministro Roberto Barroso, em 26.06.2013, Basile (2013) observou que “a cerimônia [de posse] consolida um movimento que teve início na Corte há exatos dez anos, quando assumiram os ministros Joaquim Barbosa, Carlos Ayres Britto e Cezar Peluso. Desde a inédita tríplice posse no tribunal, em 25 de junho de 2003, o STF passou a deixar de lado as decisões tecnicistas para colocar em prática sentenças humanistas, mais próximas dos anseios da população.” Proponho interpretação mais abrangente, e mais específica. Ellwanger expressa transformações de concepções do papel do STF na democracia brasileira. No eixo dessas mudanças, o caso revela tentativa inédita e deliberada de alinhamento com discursos globais de legitimidade de tribunais constitucionais centrados na proteção a direitos fundamentais. A mudança no discurso, evidentemente, não tem relação necessária com a prática do tribunal dali em diante. Mas ajudar a revelar a identidade do tribunal passado – um STF isolado discursivamente de narrativas globais, trilhando um percurso em que direitos fundamentais eram secundários na prática e no discurso.

O restante desse trabalho está organizado da seguinte forma. A seção 2 discute o “velho” STF, que, em contraste com as expectativas em torno da própria Constituição, mostrava baixa disposição para atuar sobre (e se legitimar por) o que consideraríamos hoje uma pauta de direitos fundamentais. A seção 3 analisa o caso Ellwanger, do percurso judicial feito pelo réu nos anos 90 até o processo decisório no STF. A reconstrução dos votos mostra a progressiva articulação da ideia de que o tribunal tem como tarefa central a proteção a direitos fundamentais de minorias vulneráveis, inserindo o tribunal em uma narrativa global. A seção 4 contrasta essa narrativa com o discurso dos ministros que estavam no tribunal nos anos 90. A ideia do STF como um “tribunal de direitos fundamentais”, voltado para a proteção de grupos vulneráveis, pode parecer banal ou evidente nos dias de hoje. Mas não era nenhuma das duas coisas nos anos 90. Esse discurso, hoje disseminado, não era visível na década anterior a Ellwanger. O julgamento revela uma transformação na maneira pela qual ministros articulam publicamente o papel do tribunal.

2. Um Supremo frustrante (1988-2003)

Agora, os sindicatos vão ter que possuir mais advogados e menos médicos e dentistas” – Luiz Inácio Lula da Silva, setembro de 1988

No Supremo, não se faz justiça quando se quer, se faz justiça quando se pode” – José Carlos Moreira Alves11 11 Citado em Recondo e Weber (2019), p. 171.

2.1 Desfazendo promessas e desenhos constitucionais

Juízes não são necessariamente aliados da mudança. Se um texto constitucional é o anúncio de uma nova era, juízes podem não ouvir a mensagem - ou até discordar dela. No caso brasileiro, na leitura e no uso de muitos dos seus poderes, o STF promoveu uma concepção restritiva própria, distinta em vários aspectos do texto da Constituição e das expectativas criadas em torno dela. O caso do Mandado de Injunção (MI) é exemplar. Para resolver o antigo problema de direitos e garantias que, embora previstos no texto constitucional, jamais se concretizavam devido à falta de legislação regulamentadora, os constituintes determinaram que “conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania.12 12 Artigo 5º, LXXI, Constituição Federal. Em seu discurso na promulgação da Constituição, Afonso Arinos de Mello Franco destacou a responsabilidade do STF na implementação dessa inovação:

“Direito individual assegurado, direito social sem garantia: — eis a situação. O Mandado de Injunção vai ser o instrumento dessas experiências. O desejável é que o Supremo Tribunal Federal, preservando suas tradições de competência, diligência e integridade, se esforce para encaminhar soluções viáveis e realistas, ou para oferecer interpretações aceitáveis às dificuldades, bem como rumos para o enfrentamento gradual dos problemas, que vão aparecer entre a letra do texto e sua implementação.”13 13 Republicado na Gazeta Mercantil de 6.10.1988 com o título “Arinos defende os políticos”. A referência de Mello Franco ao Mandado de Injunção repercutiu na imprensa (p.ex., Arinos alerta para risco de retrocesso. O Globo, p.6, 6 out. 1988)

Na mesma linha, em seu discurso, o presidente da Assembleia Nacional Constituinte (ANC), Ulysses Guimarães, observou:

“Nós, os legisladores, ampliamos nossos deveres. Teremos de honrá-los. A Nação repudia a preguiça, a negligência, a inépcia. (Palmas.) (...) Não esqueçamos que, na ausência de lei complementar [sic], os cidadãos poderão ter o provimento suplementar pelo mandado de injunção. (...)14 14 Discurso de Ulysses Guimarães na Sessão de Promulgação da Constituição Federal.

A Constituição é caracteristicamente o estatuto do homem. (...). Não lhe bastou, porém, defendê-lo contra os abusos originários do Estado e de outras procedências. Introduziu o homem no Estado, fazendo-o credor de direitos e serviços, cobráveis inclusive com o mandado de injunção.”15 15 Discurso de Ulysses Guimarães na Sessão de Promulgação da Constituição Federal.

Os limites exatos do MI foram objeto de controvérsia na ANC (Fulgêncio, 2018FULGÊNCIO, Henrique. Por outros meios: as decisões judiciais como continuidade da política na jurisprudência do Supremo sobre o Mandado de Injunção. Revista de Ciências Sociais, v. 49, n. 2, p. 182, 2018.). No período da promulgação, porém, o MI foi amplamente celebrado, com poucas vozes dissonantes. Repercutiu em reportagens sobre “as inovações que vão mudar a vida do país” e “os novos direitos do cidadão brasileiro16 16 As inovações que vão mudar a vida do país, O Globo, 6 out. 1988 (“Elaborados com base nas Constituições mais avançadas do Mundo, os direitos e garantias da nova Carta estabeleceram instrumentos revolucionários de defesa do cidadão, como o habeas data — que garante a qualquer pessoa acesso a informações mantidas sobre ela pelo Governo —, o mandado de segurança coletivo — que protege o cidadão dos abusos cometidos pelo poder público - e o mandado de injunção, que exige o cumprimento das normas constitucionais.”; Os novos direitos do cidadão brasileiro, Estado de São Paulo, p. 6, 06 out. 1988. . José Sarney, crítico do processo constituinte, destacou que o MI daria ao STF papel fundamental, “adaptando [a execução da Constituição] às novas realidades para ser fiel à alma desta Carta”.17 17 Sarney, destacou o mandado de injunção como um exigindo especificamente intervenção judicial para enfrentar a "auto-aplicabilidade de preceitos não muito definidos e claros", acrescentando que "nesse caso (...) a interpretação passa a ser do Supremo Tribunal Federal (STF) que terá, sem dúvida alguma, esta tarefa nova de interpretar a nova Constituição". Nova Carta recebe primeiros elogios, Jornal do Brasil, p. 2, 05 set. 1988. Antes da promulgação, foi destacado pelo presidente da OAB, Márcio Thomaz Bastos,18 18 Marcio Thomaz Bastos. A OAB e o segundo turno. Jornal de Brasília, 07 ago. 1988. e por juristas como José Afonso da Silva, influente interlocutor de diversos constituintes.19 19 José Afonso da Silva. Mandado de Injunção: Direito do Cidadão, Jornal do Brasil, p. 9, 26 set. 1988; para outras avaliações do MI por juristas, ver p. ex. Eunice Nunes. Mandado de Injunção divide opiniões. Gazeta Mercantil, p. 31, 05 set. 1988. Atentas ao novo instrumento, organizações da sociedade civil se preparavam para demandar direitos prometidos pela Constituição. Em discurso, Luiz Inácio Lula da Silva observou que, dali em diante, os sindicatos iriam “possuir mais advogados e menos médicos e dentistas”.20 20 Sociedade civil já se prepara para reclamar direitos na nova Carta, Jornal do Brasil, p. 4, 14 set. 1988, (“Tão logo a nova Constituição passe a vigorar, a CUT entrará com um mandado de injunção no Supremo Tribunal Federal exigindo que o salário mínimo passe a atender, realmente, às necessidades básicas do trabalhador, como alimentação, habitação, educação, saúde, transporte, lazer etc.”). Nesses debates públicos, a atuação do STF se conectava à efetivação de vários dispositivos, dos direitos sociais21 21 Gestante apela para o mandado de injunção, Correio Braziliense, p. 3, 11 nov. 1988. à limitação dos “juros reais” a 12% (na redação original do artigo 192 da Constituição Federal).22 22 Injunção é discutida no STF, O Estado de São Paulo, p. 6, 20 set. 1988; Miriam Lobardo. Mandado de injunção será avaliado pelo Tribunal Federal de Recursos: STF usa atribuição da nova carta. Gazeta Mercantil, p. 22, 14 out. 1988 [discussão sobre a taxa de juros de 12%]; Para Mayer, injunção exigirá jurisprudência. O Estado de São Paulo, p. 6, 4 out. 1988. (“Várias entidades já anunciaram que, logo após a promulgação, vão recorrer ao STF para garantir a aplicação de dispositivos, como o que fixa os juros em 12% ao ano”); Afinal, que leis já estão valendo?, Correio Braziliense, p. 5, 24 out. 1988, “Três semanas após a promulgação da nova Constituição, muitos brasileiros ainda se perguntam o que mudou efetivamente em suas vidas. Normas econômicas, direitos, garantias no campo individual e social se dividem em dispositivos que já valem — por serem autoaplicáveis —, ou que ainda aguardam leis complementares para entrarem em vigor. O cidadão, em meio a uma avalanche de pareceres técnicos e mandados judiciais, espera. Os habeas data e mandatos de injunção já valem, mas os direitos dos servidores públicos, por exemplo têm poucos dispositivos já vigorando”; Prática da carta exige 450 leis, O Globo, p. 8, 06 out. 1988 (“O novo sistema financeiro, a organização económica e vários dispositivos relativos aos Direitos Individuais e Sociais podem ser indefinidamente adiados, embora o mandado de injunção possa evitar esse problema em uns poucos casos, impedindo a repetição do que aconteceu com diversos dispositivos da inovadora Constituição de 1946, que foram prejudicados pela dependência de lei jamais elaboradas.”); Congresso precisa agir para garantir avanços, O Globo, p. 6, 06 out. 1988.

Essas expectativas foram frustradas pelo STF no julgamento da Questão de Ordem no MI 107 (1989), em 23.11.1989. O tribunal adotou a interpretação de que a decisão em MI serviria apenas para declarar a mora da autoridade legislativa competente. Nenhum juiz, nem mesmo o STF, poderia adotar qualquer arranjo provisório para sanar a omissão, ainda que restrito ao caso concreto.23 23 Para discussão de diferentes visões sobre o MI, ver Arguelhes e Ribeiro (2018). O ministro relator, José Carlos Moreira Alves, reconheceu que sua proposta deixaria o MI com o único efeito prático de constranger politicamente a autoridade omissa. Para Alves, “a Constituição partiu da premissa de que, com a procedência da ação direta [de inconstitucionalidade por omissão] ou do mandado de injunção, o Poder competente, declarada a inconstitucionalidade de sua omissão, não persistirá em atitude omissa”.24 24 MI 107. Essa decisão sempre sofreu críticas, dentro e fora do tribunal. Em 2007, em um dos casos em que o STF mudaria de posição quanto ao em MI, o ministro Marco Aurélio observou:

“É tempo de se refletir sobre a timidez inicial do Supremo quanto ao alcance do mandado de injunção, ao excesso de zelo, tendo em vista a separação e harmonia entre os poderes. É tempo de se perceber a frustração gerada pela postura inicial, transformando o mandado de injunção em ação simplesmente declaratória do ato omissivo, resultando em algo que não interessa em si (...) ao cidadão.”25 25 Ver MI 2.058 (2014).

A frustrante história do MI é exemplar. O STF afirmou uma visão limitada de seu papel na democracia brasileira, e dos poderes de que dispunha para cumpri-lo. Essa visão correspondia muito mais à tradição do tribunal – de atuação sobre a política em casos individuais e concretos, mesmo em períodos de maior independência judicial – do que ao texto constitucional. Aqui, como em tantos outros pontos referentes a essas inovações constitucionais, o STF tinha uma posição diferente da que prevaleceu na ANC – mas conseguiu recolocar em jogo, por interpretação, visões mais próximas daquelas derrotadas no processo constituinte.26 26 Para aplicações dessa ideia a diferentes aspectos do controle de constitucionalidade e da separação de poderes no Brasil, ver Arguelhes (2014); Arguelhes e Prado (2019); Arguelhes (2020).

Há outros exemplos dessa dinâmica. Na construção de uma “jurisprudência defensiva” com relação ao controle concentrado de constitucionalidade, o STF restringiu o acesso às Ações Diretas de Constitucionalidade e Ações Diretas de Constitucionalidade por Omissão, de maneiras sem base textual clara e contra várias manifestações e debates constituintes. Em mensagem institucional e em manifestações individuais de seus ministros no período da redemocratização, o STF expressou discordância com relação a propostas de ampliar a legitimação ativa para propositura de representações de inconstitucionalidade (Arguelhes, 2014_______. Poder Não é Querer: Preferências Restritivas e Redesenho Institucional no Supremo Tribunal Federal Pós-Democratização. Universitas Jus, v. 25, n. 1, 2014). Essa ampliação do acesso ao controle concentrado e abstrato, porém, tinha grande apoio na ANC (Carvalho, 2007CARVALHO NETO, Ernani. Ampliação dos legitimados ativos na Constituinte de 1988: Revisão judicial e judicialização da política. Revista Brasileira de Estudos Políticos, v.96, 2007.). O texto final incluía como legitimados ativos oito instituições ou tipos de atores sociais além do Procurador Geral da República, incluindo entidades de classe de âmbito nacional. Pouco tempo após a promulgação da Constituição, porém, o STF decidiu que, dentre esses novos legitimados, as entidades de classe precisariam mostrar “pertinência temática” para propositura de ADIs.

Um terceiro exemplo está no julgamento da ADI 2, iniciado em 1989 e concluído em 1992. O tribunal decidiu que atos normativos pré-constitucionais não poderiam ser contestados no controle concentrado. Assim, leis aprovadas pela ditadura teriam que ser discutidas no tempo mais longo e incerto do controle concreto de constitucionalidade, chegando ao STF muitos anos após a promulgação da nova Constituição (Arguelhes, 2014). Essa posição permitiu ao tribunal ganhar tempo, fechando a possibilidade de que ADIs fossem ajuizadas sistematicamente, após a nova Constituição, contra leis da ditadura. Criticando essa renúncia de responsabilidade, Sepúlveda Pertence observou em seu voto vencido que “dar o máximo de efetividade, em todos os níveis do ordenamento, ao estalo de valores, princípios e regras da nova Constituição é a missão de que, a meu ver, não se pode demitir o Supremo Tribunal.27 27 Ver ADI 2 (1992). Segundo Leite (2015), essa “jurisprudência restritiva e inflexível do STF [gerou] consequências negativas para a segurança acerca da adequação do ordenamento jurídico brasileiro com a Constituição da República”.

Essas linhas jurisprudenciais restringem o escopo da atuação do STF em múltiplos níveis. Limitam o acesso de diversos atores ao controle abstrato e concentrado; limitam os instrumentos do tribunal no controle de omissões; limitam o alcance da atuação judicial para filtrar legislação do regime anterior. Combinadas, desenham um sistema de controle de constitucionalidade de escopo truncado, no qual grandes temas de direitos fundamentais teriam presença proporcionalmente menor – porque certos atores sociais não poderão levar suas pautas ao tribunal; porque havia pouco sentido prático em se utilizar o tribunal para controlar omissões legislativas; e porque leis da ditadura (como as Leis de Anistia (1979) e de Imprensa (1967), discutidas no STF duas décadas depois) só chegariam ao tribunal pela mais demorada e discreta via recursal.

2.2 A limitada pauta de direitos fundamentais

As decisões discutidas no item anterior eram má notícia para quem pretendesse contestar omissões legislativas ou legislação pré-constitucional no STF, e em especial para entidades da sociedade civil. Ainda assim, alguns temas de direitos fundamentais foram levados ao tribunal, nos anos 90, em casos concretos na via recursal. Mas, em geral, o tribunal não os enfrentou, nem os aproveitou como oportunidades de se apresentar como protetor de direitos fundamentais.

Considere, por exemplo, dois recursos que chegaram ao tribunal em 1995. Tendo adotado uma criança, a servidora pública Fátima Nascimento de Oliveira vinha lutando contra o Estado do Rio Grande do Sul para ter reconhecido seu direito à licença maternidade nos termos da Constituição.28 28 RE 197.807 (2000). A legislação infraconstitucional lhe garantia esse direito, mas em prazo inferior (90 dias) ao do dispositivo constitucional. Em 2000, a 1ª turma do STF decidiu por unanimidade que, por se referir textualmente à “gestante”, o dispositivo não se aplicaria a mães adotivas. Nas instâncias inferiores, as decisões e petições traziam argumentos baseados na interpretação e efetividade da igualdade e da proteção à infância e à adolescência. No STF, porém, nas duas páginas e meia de seu voto, o relator Octavio Gallotti trata a presença da palavra “gestante” no texto constitucional como suficiente para encerrar a questão. Não discute a proteção da infância, nem a eventual inconstitucionalidade na previsão de período menor de licença para mães adotivas. A decisão foi unânime, e esse é o único voto que consta no acórdão.

Também em 1995, anos após uma cirurgia de mudança de sexo, a modelo e atriz Roberta Close recorreu ao STF para afirmar seu direito de alterar seu registro civil. Close, que tinha grande espaço na mídia nacional, vinha tendo seu direito negado no judiciário desde 1990. Invocava expressamente a “dignidade da pessoa humana” e o compromisso constitucional de “promoção do bem de todos, sem preconceitos” ou “quaisquer outras formas de discriminação”, além da proteção à vida, honra e imagem. Em decisão monocrática, o ministro Sydney Sanches negou seguimento ao recurso de Close contra a decisão do TJ/RJ.29 29 O processo não está disponível para consulta no site do STF. Informações obtidas nas reportagens: Ministro quer nova lei para transexual, Folha de São Paulo, 30 set. 1997; Silvana de Freitas. Recurso para mudança do nome de Roberta Close é negado no STF, Folha de São Paulo, 22 fev. 1997; Silvana de Freitas. Procuradoria é contra mudança oficial do nome de Roberta Close. Folha de São Paulo, 20 fev. 1997; Silvana de Freitas; Aureliano Biancarelli. STF vai julgar se Roberto pode ser Roberta. Folha de São Paulo, 16 fev. 1997. Meses depois, o ministro Celso de Mello cobrou publicamente do Congresso Nacional a aprovação de legislação que garantisse o direito à troca de nome de pessoas trans.30 30 Ministro quer nova lei para transexual, Folha de São Paulo, 30 set. 1997.

São dois casos representativos da (baixa) disposição do STF em enfrentar temas de direitos fundamentais. Essa leitura se confirma na (pouca) literatura existente sobre a jurisprudência do tribunal no período. Uma referência relevante é a 2ª edição de Supremo Tribunal Federal: Jurisprudência Política, de Oscar Vilhena Vieira, publicada em 2002, que mapeia as principais decisões do STF sobre direitos fundamentais.31 31 Há poucos trabalhos sistemáticos sobre a jurisprudência do tribunal nos anos 90, e é ainda mais raro encontrar trabalhos que enfoquem as decisões do STF sobre direitos fundamentais. Arantes (1997) enfoca a atuação do tribunal sobre a política a partir de questões de separação de poderes, os limites do Poder Executivo e o desenho do controle de constitucionalidade. Embora direitos fundamentais apareçam em discussões envolvendo o Plano Collor (do problema do confisco em si à vedação de liminares), estão em segundo plano. Em si, a ausência de casos sobre direitos fundamentais em um livro sobre o tribunal e o processo político decisório já nos diz algo sobre a pauta do STF naquele momento. Para uma avaliação recente e mais geral das decisões do STF nesse período, ver Pereira (2016). Muitos dos casos listados por Vieira, inclusive o já citado MI 107, mostram o tribunal adotando posição tímida e/ou decidindo por considerações laterais. Na ADI-MC 1.458 (1996), o STF discute o problema da inconstitucionalidade (por omissão parcial) de lei que fixou o salário mínimo em valor insuficiente para as necessidades exigidas pelo artigo 7º, IV da Constituição. Em decisão unânime, apesar de elogios retóricos à importância do salário mínimo, o tribunal negou a cautelar. Em 2001, com a lei contestada já revogada, o relator entendeu pela perda de objeto.

Na ADI 534 (1992), por sua vez, contestava-se o Plano Collor por violação do direito de propriedade. A cautelar foi negada sob o argumento de que, após 15 meses, não haveria periculum in mora. A ação foi julgada prejudicada em 1992. Outro exemplo está nos MIs 219 e 233 (1990), sobre a não-fixação, pelo Congresso, do número de representantes de São Paulo na Câmara dos Deputados. No MI 219, o STF apenas reconheceu a mora legislativa. No MI 233, entendeu que não havia legitimidade ativa.

Na ADI 815 (1996), instado a se pronunciar sobre a desigualdade de representação gerada pelo teto constitucional de Deputados Federais por Estado, o tribunal apenas se afirmou incompetente para declarar inconstitucionalidade de normas constitucionais originárias. Na MC-ADI 1.494, o STF discutiu artigo do Código de Processo Penal Militar segundo o qual, em caso de crime doloso contra a vida, a autoridade militar enviaria o inquérito à justiça comum. Tratava-se de disputa entre autoridades investigativas e judiciais militares e civis; o acordão discutia competências e procedimentos, sem qualquer perspectiva de direitos fundamentais. Com liminar indeferida em 1997, a ação não foi conhecida em 2001 por ilegitimidade ativa.

Em outros casos citados por Vieira, o tribunal simplesmente mandou cumprir previsão legal expressa ou aplicou entendimento jurisprudencial consolidado. O AgR-RE 271.286, decidido unanimemente pela 2ª turma em 2000, envolvia o fornecimento de medicamentos – mas, no caso, havia previsão legal de que o Estado deveria fornecer o medicamento demandado. Ou seja, pedia-se ao STF apenas que confirmasse a obrigação do Estado de cumprir lei válida. E no RE 102.160, decidido em maio de 1988 (antes da própria Constituição), o tribunal decidiu pela responsabilidade estatal por morte de adolescente detido em delegacia apenas com aplicação de precedentes e súmulas sem qualquer conexão com direitos fundamentais.

Discussões mais explícitas na chave de direitos aparecem em casos sobre processos penais, ou sobre aplicação de garantias do processo penal a “investigados” de maneira mais ampla. Nesse sentido, o RHC 79.785 (2000) (Caso “Jorgina de Freitas”), sobre duplo grau de jurisdição, envolvia possível conflito entre o Pacto de San José da Costa Rica (1992) e a Constituição (que prevaleceu no caso, em detrimento do HC). Outro exemplo é o HC 71.373 (1994), em que uma maioria de ministros entendeu que, em processo de investigação de paternidade, o direito do réu de não produzir prova contra si mesmo prevalece sobre o direito da criança de conhecer sua identidade biológica.

Vieira menciona ainda a ADI 939 (1993), envolvendo a anualidade tributária como cláusula pétrea e a inconstitucionalidade da emenda constitucional que criou o IPMF; a ADI-MC 1.946 (1999), em que se contestou decreto do Governo do Distrito Federal que impedia manifestações com som na praça dos três poderes; e o RE 153.531 (1997), proposto por ONGs contra decisão da justiça estadual em Ação Civil Pública, argumentando que a “Farra do Boi” constituía crueldade com animais. Nos três casos, o tribunal discutiu a aplicação de regras constitucionais com impacto em direitos fundamentais. Não são, porém, casos sobre grupos ou minorias vulneráveis. Envolvem direitos de contribuintes e de cidadãos considerados de maneira geral, e a tensão entre manifestações culturais e crueldade com animais.

Essa é uma pauta bastante limitada. Em contraste, consideremos o caso colombiano. Na primeira década após a promulgação da nova Constituição (1991), o Tribunal Constitucional da Colômbia decidiu, entre outros temas de direitos fundamentais, casos envolvendo o direito prestacional a um “mínimo existencial” (T-426/1992); a descriminalização do uso pessoal de entorpecentes (C-221/1994); a constitucionalidade da censura prévia à divulgação, pela imprensa, de comunicados oriundos de forças paramilitares (T-245/94); a eutanásia (C-239/1997); a necessidade de participação de comunidades indígenas locais no processo de autorização de empreendimentos de impacto socioambiental (SU-039/1997); o direito de menores de idade intersex decidirem sobre intervenções cirúrgicas em suas características sexuais externas (SU-337/1999); o direito ao trabalho de vendedores de rua, diante de legislação que restringia a ocupação de calçadas públicas (SU-360/1999); a constitucionalidade de legislação estabelecendo cotas mínimas para participação de mulheres em instituições estatais (C-371/2000) – entre outros casos envolvendo direitos fundamentais, na década após a promulgação da Constituição de 1991.

O próprio STF de hoje oferece contraste ilustrativo. Os temas da mudança de nome de pessoas trans e da licença maternidade para mães adotivas voltaram à pauta do tribunal duas décadas depois.32 32 A primeira decisão do STF em que o tema gênero foi expressamente discutido foi tomada em 2003, mesmo ano de Ellwanger (Gomes, 2016). O caso (ADI 1946) envolvia uma emenda constitucional que fixava um teto para benefícios previdenciários, incluindo a licença-maternidade, com implicações negativas para a empregabilidade de mulheres. Em 2016, o plenário do STF afirmou que é inconstitucional prever licenças com durações distintas para mães biológicas e mães adotivas.33 33 RE 778.889 (2016). Tese: “Os prazos da licença adotante não podem ser inferiores ao prazo da licença gestante, o mesmo valendo para as respectivas prorrogações. Em relação à licença adotante, não é possível fixar prazos diversos em função da idade da criança adotada.” O único voto vencido foi o ministro Marco Aurélio. Os votos discutem tratados internacionais de direitos humanos, o princípio da igualdade e os dispositivos constitucionais sobre proteção da infância. O relator, ministro Roberto Barroso, traça no pós-guerra as origens da crescente proteção à infância.

Em 2018, o STF reconheceu, por unanimidade, que pessoas trans podem solicitar alteração de nome e sexo no registro civil, sem necessidade de realização de cirurgia.34 34 ADI 4.275 (2018). Em seus votos, ministros registram que a proibição de alteração no registro promove a exclusão de pessoas trans, violando sua dignidade humana.35 35 Ver, p. ex., o voto do Ministro Marco Aurélio no RE 760.422 (2013): “A dignidade da pessoa humana, princípio desprezado em tempos tão estranhos, deve prevalecer para assentar-se o direito do ser humano de buscar a integridade e apresentar-se à sociedade como de fato se enxerga. Solução diversa apenas reforça o estigma que conduz muitos cidadãos transgêneros à depressão, à prostituição e ao suicídio.” O ministro Ricardo Lewandowski, relator de um dos processos, afirmou no voto que “esta Suprema Corte, atenta ao reclamos contemporâneos na luta por reconhecimento, não pode se omitir na luta pela concretização dos direitos fundamentais das pessoas ‘trans’”.36 36 Ver ADI 4.275 (2018), voto do Ministro Ricardo Lewandowski.

No contraste entre essas decisões, sobre os mesmos temas, em décadas distintas, há uma transformação não apenas de pauta e de comportamento, mas também na própria concepção dos ministros sobre o papel do STF. Na passagem entre esses dois tribunais, como veremos na próxima seção, um processo julgado em 2003 (cujo tema vinha transitando no judiciário desde o início dos anos 90) deixou público o conflito entre a concepção antiga e a nova, com a vitória – no discurso dos ministros – desta sobre aquela.

3. O caso Ellwanger

3.1 O caminho até o Supremo (1989-2003)

No HC 82.424, o editor de livros Siegfried Ellwanger afirmava que, pela Constituição brasileira, não seria crime de “prática de racismo” (art. 5º, XLII da Constituição Federal) editar e publicar livros com ideias discriminatórias contra judeus. Segundo a defesa, o dispositivo que estabelecia como crime imprescritível a “prática de racismo” seria aplicável apenas à discriminação contra grupos sociais que constituíssem “raças”, o que não seria o caso dos judeus. Assim, a condenação de Ellwanger por discriminação não configuraria “racismo” e, portanto, não seria imprescritível.

O percurso da controvérsia em torno dos livros de Ellwanger até o STF foi longo. Em 1989, a Câmara Municipal de Porto Alegre havia declarado o editor “persona non grata”, e a Câmara Rio-Grandense do Livro havia excluído a editora (“Revisão”) do seu quadro associativo.37 37 Livro desenterra nazismo no Sul, Estado de São Paulo, p. 16, 8 ago. 1991. Foi o início de uma década de disputas judiciais envolvendo a comercialização dessas obras em feiras do livro e outros eventos.38 38 Livro desenterra nazismo no Sul, Estado de São Paulo, p. 16, 8 ago. 1991. Ver, p.ex., Leo Gerchmann. Editora Revisão é motivo de protestos em Feira do Livro. Folha de São Paulo, 11 out. 2000. (“Não é a primeira vez que os livros da Revisão e sua participação na feira despertam polêmica. Sempre que foi questionado, o escritor entrou na Justiça para garantir sua participação na feira, invocando a liberdade de expressão”); Punks atacam estande de editora, Folha de São Paulo, 09 nov. 2000. (“Um grupo de punks afastou a editora Revisão da Feira do Livro de Porto Alegre. A Revisão pertence ao escritor Siegfried Ellwanger, condenado judicialmente pela prática do anti-semitismo”); Cristina Grillo. Não somos nazistas, diz editor. Folha de São Paulo, 20 ago. 1997. A primeira denúncia criminal foi apresentada pelo Ministério Público Estadual do Rio Grande do Sul em 14.11.1991.39 39 Embora o juízo da 8ª Vara Criminal de Porto Alegre tenha determinado a busca e apreensão de livros da editora Revisão ainda em 1992, Ellwanger foi absolvido na 1ª instância em 1995. Nesse ponto, o editor já tinha contra si um outro processo no TJSP – agora por injúria racial (art. 140, par. 3º do Código Penal), e não pela distribuição e comercialização de material com discriminação racial (Lei 7.716/89, em cujo artigo 20, caput a conduta de Ellwanger havia sido enquadrada). Ver Apelação 878.765/7, 8ª Câmara do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo. Em 31.10.1996, o TJ/RS condenou Ellwanger a dois anos de prisão, convertidos em serviços comunitários.40 40 Conforme informações da reportagem de Silvana Freitas. Por 8 a 3, STF mantém condenação de editor de livros. Folha de São Paulo, 18 set. 2003. Seu antissemitismo já chamava atenção da imprensa nacional.41 41 Ver, p.ex., Carlos Alberto de Souza. Editor acusa filme de farsa. Folha de São Paulo, 11 mar. 1994. Essas controvérsias públicas e disputas processuais se estenderam ao longo dos anos 90. Contudo, o debate na imprensa girava em torno dos limites do crime de “discriminação” diante da liberdade de expressão, direito central na luta pela redemocratização.42 42 Ver, p.ex., reportagem de Cesar Giobbi. Racismo combatido. Estado de São Paulo, 12 nov. 1996. (“a decisão tem por base a Lei Afonso Arinos”). Artigos de membros da comunidade judaica discutem a absolvição de Ellwanger na primeira instância do TJRS (bem Abraham. Absolvição de Neonazista no RS.Folha de São Paulo, 9 ago. 1995; Helio Schwartman. Tolerar a Intolerância, Folha de São Paulo, 6 out. 1995; Israel Levin. O Ovo da Serpente no Brasil. Folha de São Paulo, 5 out. 1995.

A discussão quanto ao antissemitismo ser ou não “racismo” só apareceria em HC impetrado no Superior Tribunal de Justiça (STJ) em 28 de novembro de 2000.43 43 A primeira tentativa de chegar ao STJ se deu em 1992, em recurso em Mandado de Segurança contra busca e apreensão determinadas pela juíza da 8ª Vara Criminal de Porto Alegre. O recurso foi extinto sem julgamento do mérito pela 5ª Turma, por intempestividade (RMS 4.121). A segunda tentativa foi um Recurso Especial em 1998 – mais uma vez sem sucesso, com os ministros da 5ª turma entendendo que o caso envolveria reexame de prova. Surge ali tese de que, como judeus não são “raça”, a condenação por antissemitismo não poderia ser enquadrada na “prática de racismo” tornada imprescritível pela Constituição.44 44 HC 15.155/RS (2001) Trecho do relatório do Min. Gilson Dipp: “[R]efere que o fato imputado ao paciente foi o de delito contra os judeus, que não teria conotação racial, nem seria derivado da prática de racismo, para ser tido como imprescritível, pois a definição de judeu como raça encontra sempre o veemente repúdio de toda a comunidade judaica, tanto pelos antropólogos judeus, pelos rabinos e pela sua intelectualidade (...). Aduz, por outro lado, que a norma constitucional que dispõe sobre a imprescritibilidade do crime de racismo refere-se, em última instância, ao segregacionismo derivado da cor, característico do racismo brasileiro, ressalvando ser inegável que o desejo do constituinte foi o de tornar imprescritíveis os crimes decorrentes da prática do racismo, em conformidade com as características do racismo imperante na sociedade brasileira. (...)” No julgamento, concluído em 18.12.2001, prevaleceu o voto do relator, Gilson Dipp, pela não concessão do HC.45 45 Antecipando um argumento que apareceria no STF, o Ministro Jorge Scartezzini afirma que, nos escritos de Ellwanger, judeus são, sim, considerados de um ponto de vista racializado, ainda que essa não seja uma realidade biológica (p. 16-21 do acórdão). Embora favoráveis ao HC, o parecer do Ministério Público e o voto do ministro Edson Vidigal entendiam que antissemitismo configuraria, sim, “racismo”.46 46 Edson Vidigal discordou da tese de que o constituinte só teria previsto o crime de “racismo” de maneira restrita “[a]o preconceito direcionado às diferenças de raça, propriamente dita”; para o ministro, o dispositivo constitucional englobava “também todos os tipos de discriminação ilegal, seja em relação à religião, nacionalidade, regionalidade, aparência física etc.” Ainda assim, observou que, embora Ellwanger tivesse sido condenado por incitar racismo, a Constituição tornava imprescritível praticar racismo – o que Vidigal acreditava não ser o caso das publicações da editora “Revisão” (ver p. 26-27 do acórdão.). Foi a mesma linha do parecer do MP (p. 27 do acórdão). A defesa afirmava que estava em jogo apenas a atribuição de sentido a um dispositivo legal, para definir a questão da imprescritibilidade. Essa formulação “deflacionária” do problema, que aparece em todos os votos do acórdão do STJ, chegaria ao STF em um novo HC em 12/09/2002.

O HC 82.424, que conhecemos como “o” caso Ellwanger, foi na verdade a segunda tentativa do editor de chegar no STF. Houve antes um Recurso Extraordinário, cujo mérito nunca foi apreciado. Em decisão monocrática de 1999, confirmada pela 1ª turma do STF em 14.03.2000, Moreira Alves considerou que a decisão do TJ/RS que Ellwanger pretendia atacar não poderia ser objeto do recurso.47 47 AI-AgR 247.591 (2000). Embora mantendo, na prática, a decisão condenatória do TJ/RS, essa foi uma típica não-decisão do STF. A expectativa em torno do caso, porém, gerou textos na imprensa que viam na não-decisão uma tomada de posição. “Uma sentença exemplar”, escreveu o então presidente da Confederação Israelita do Brasil, e um futuro presidente da Federação Israelita do Rio de Janeiro considerou que Ellwanger teve “a condenação confirmada” pelo STF.48 48 Jack Terpins. Uma sentença exemplar. Folha de São Paulo, São Paulo, 11 abr. 2000 (“Há poucos dias, o Supremo Tribunal Federal tomou importante decisão: condenou Siegfried Ellwanger por crime de incitação ao racismo.”); Osias Wurman. Nazismo.com. O Globo, Rio de Janeiro, p. 7, 11 jun. 2000. Wurman assinou o texto como “jornalista”. Em artigo de janeiro de 2003, no mesmo jornal, sobre o HC de Ellwanger no STF, assinou como “jornalista e Presidente da Federação Israelita do Rio de Janeiro” (Osias Wurman. Ecos de Hitler, O Globo, p. 7, 24 jan. 2003.) Em editorial, a Folha de São Paulo celebrou a suposta condenação, pelo STF, “por crime de incitação ao racismo, o editor Siegfried Ellwanger a dois anos de reclusão.”49 49 Editorial Nazista Condenado, Folha de São Paulo, 11 abr. 2000. Em reportagem no dia, a Folha observava que “Uma semana depois de ter sido condenado pelo Supremo Tribunal Federal por escrever e distribuir livros racistas, ele ainda vendia seus livros pela Internet.” (Nazismo: Editor ainda vende livros pela Internet. Folha de São Paulo, 11 abr. 2000.) Sinais pontuais, mas visíveis do descompasso entre a lógica da atuação do STF e as expectativas públicas de alguns atores em torno dos problemas colocados por Ellwanger.

3.2 “Um Maracanã jurídico”: Ellwanger no Supremo

Essas expectativas retornariam com força em 2003, no segundo ano do longo processo de julgamento do HC 82.424. Os ministros perceberam, no julgamento, que Ellwanger seria importante. Houve quatro pedidos de vista sucessivos, sugerindo a importância do caso para os ministros. 50 50 Entre 1988 e 2013, 2,2% dos processos tiveram pelo menos um pedido de vista (Falcão, Hartmann e Chaves, 2014). Além disso, o atraso que essas vistas geraram não parece ter sido deliberado. Da primeira vista à conclusão do julgamento, passaram-se alguns meses. Mas, de 1988 a 2013, a duração média de um pedido de vista no Supremo foi de cerca de um ano (Falcão, Hartmann e Chaves, 2014FALCÃO, Joaquim; HARTMANN, Ivar; CHAVES, Vitor. III Relatório Supremo em Números – O Supremo e o Tempo. Rio de Janeiro: Escola de Direito do Rio de Janeiro da Fundação Getúlio Vargas, 2014.). Em Ellwanger, os ministros de fato utilizaram as vistas para considerar novos argumentos e elaborar mais seus votos, e não para manipular a agenda do tribunal.51 51 Para discussão do pedido de vista nesses termos, ver Arguelhes e Hartmann (2017).

O tom inicial do julgamento, porém, foi distinto. Relator do caso, Moreira Alves era pouco afeito a visões ambiciosas do papel da Constituição ou do Supremo. Em seu discurso de abertura dos trabalhos da ANC, em fevereiro de 1987, pediu realismo aos constituintes. Lembrou as palavras de um jurista alemão, segundo o qual “a Constituição não pode solver o abismo entre a pobreza e a riqueza, não pode trazer comida nem casa, nem roupa nem educação nem descanso, ou seja, as necessidades essenciais da vida”.52 52 Trata-se de trecho de obra de Karl Loewenstein, enfatizado pelo próprio ministro Moreira Alves em sua entrevista para o projeto História Oral do STF, p. 92-93. Enquanto as ambições constitucionais vinham se expandindo em recentes constituições como as de Portugal (1976) e Espanha (1978), a única constituição do século XX mencionada pelo ministro foi a de Weimar (1919) – generosa em promessas de direitos sociais, mas implicitamente criticada no discurso como um experimento político fracassado.

Moreira Alves havia sido a principal liderança na construção do pacote jurisprudencial restritivo dos anos 90 (ver Seção 2.1). Seu voto inicial em Ellwanger foi objetivo. Focou na extensão do termo “racismo” na Constituição, na linha “deflacionária” da defesa do editor. Como “judeus” não configuram uma “raça”, não seria possível praticar “racismo” contra judeus, nos termos da Constituição.53 53 Em sua entrevista para o projeto História Oral do STF (FGV Direito Rio), o Ministro se recorda de sua posição nestes termos: “E aí também, eu salientei novamente: portanto, não havia discriminação. Já que todos pertenciam à mesma raça, como é que eu posso discriminar de um para com outro? Mas afinal perdi por três votos. Eu tive dois votos que me seguiram, o do Ayres e o do Marco Aurélio. E perdi, justamente, considerando que judeu é raça. Então o problema foi esse.”, “Eu acho que crime, para ser racial, é preciso que haja discriminação racial. Em havendo discriminação racial, já acho até um exagero se considerar que é imprescritível. Acho um exagero. Mas não chego nem a isso. Eu fico na primeira parte. Não há discriminação e consequentemente não há crime.” (p. 38-39) Cláusulas de imprescritibilidade – sendo uma expansão do poder punitivo do Estado – devem ser interpretadas restritivamente. Com boa parte das treze páginas dedicadas a citações de rabinos, o voto não discute liberdade de expressão, nem apresenta qualquer formulação mais ambiciosa da tarefa do tribunal.

Moreira Alves era o mesmo de sempre, mas o tribunal, não. Ellwanger foi um dos primeiros julgamentos transmitidos pela TV Justiça.54 54 Segundo informações do site Consultor Jurídico, a primeira transmissão ao vivo foi no pedido de Intervenção Federal 2.915, em 14.08.2002 (Débora Pinho. Justube: O dia em que nasceu a TV Justiça. Consultor Jurídico,29 out. 2009). O sistema de transmissão foi criado por lei em agosto de 2002, a partir de iniciativa individual do Ministro Marco Aurélio, sem consulta prévia aos colegas (Recondo e Weber, 2019RECONDO, Felipe; WEBER, Luiz. Os Onze. Companhia das Letras, 2019., p. 92-93). Em Ellwanger, porém, a transmissão ainda não era de fato ao vivo (Recondo e Weber, 2019RECONDO, Felipe; WEBER, Luiz. Os Onze. Companhia das Letras, 2019., p. 92-93). O material era gravado e editado antes de ir ao ar, com cortes de interações mais acaloradas. A transmissão em tempo real e sem edições veio a ser adotada pelo ministro Mauricio Correa, quando se tornou presidente do tribunal em abril de 2003 (Recondo e Weber, 2019RECONDO, Felipe; WEBER, Luiz. Os Onze. Companhia das Letras, 2019., p. 93).

Diante das câmeras, o STF passava também por uma transformação geracional. Durante o julgamento de Ellwanger, os dois últimos ministros indicados pela ditadura militar, Sydney Sanches e Moreira Alves, seriam substituídos em uma leva de três indicações quase simultâneas do recém-empossado presidente Lula.55 55 Além de Sydney Sanches e Moreira Alves, aposentou-se em 2003 o ministro Ilmar Galvão, indicado por Fernando Collor. Ingressaram no STF Cezar Peluso, Carlos Ayres Britto e Joaquim Barbosa – primeiro ministro negro indicado ao tribunal, que não votaria em Ellwanger por ter ingressado na cadeira de Moreira Alves. O efeito combinado dessas transformações institucionais e geracionais foi potencializado nos muitos meses de discussão no tribunal e na imprensa. A exposição em múltiplas sessões de julgamento revelou concepções divergentes sobre o papel do STF.

Ao longo do ano, o caso foi se descolando da narrativa “deflacionária”, dentro e fora do tribunal. Mauricio Corrêa, que havia interrompido o julgamento com um pedido de vista, vota em abril de 2003 inserindo o caso em uma narrativa maior de proteção crescente de direitos humanos após os horrores da 2ª Guerra Mundial. Afirma que a Constituição não protege esta ou aquela “raça”, mas sim qualquer grupo potencialmente exposto a discriminação por origem étnica.56 56 HC 82.424 (2003), p. 580-581. Corrêa cita extensivamente o parecer de Celso Lafer, professor da USP e ex-ministro do governo FHC, no que parece ser uma curiosa e pioneira aparição de amicus curiae em HC – ainda que, como registraria Alves, Lafer não tenha sido convidado pelo relator.57 57 HC 82.424 (2003), p 594.

A grande narrativa de Corrêa cria um problema para Moreira Alves. Diante dessa formulação ampliada, a concessão do HC soaria no mínimo insensível à proteção de direitos humanos. Alves retoma então a palavra para enfatizar seu repúdio às ideias de Ellwanger e ressaltar que interpretar restritivamente a imprescritibilidade também expressa compromisso com direitos fundamentais.58 58 É aqui que surge o conflito entre Alves e Corrêa – com Corrêa criticando Alves por não prestar atenção em seu voto, e Alves afirmando que o voto de Corrêa “praticamente segue a linha de fundamentação do parecer” de Lafer. Ministros batem boca durante julgamento de editor, Folha de São Paulo, 10 abr. 2003. A reportagem narra em detalhes a briga: “Aparentemente magoado com o surgimento da dissidência, Alves acusou Corrêa de ter copiado o parecer elaborado pelo ex-ministro das Relações Exteriores e professor de direito da Universidade de São Paulo Celso Lafer. "O senhor foi descortês comigo", disse Corrêa. Alves reagiu: "Diga-me uma frase que comprove a descortesia. Vou sair daqui a dias. Estou há 27 anos no tribunal. Nenhum colega nunca me disse que sou descortês." Em seguida, Corrêa completou: "Vossa Excelência deu tanta importância a meu voto que passou o tempo todo conversando". Alves retrucou: "Isso aqui não é uma casa de vaidade". O bate-boca prosseguiu e só terminou porque o ministro Marco Aurélio de Mello, presidente do tribunal, interrompeu a sessão.” Para neutralizar a narrativa de Corrêa, Alves faz uma objeção técnica: os instrumentos internacionais mencionados por Corrêa tinham status infraconstitucional, segundo a jurisprudência então vigente do Supremo. Mais ainda, a imprescritibilidade não era exigida em nenhuma normativa internacional na punição a racismo ou discriminação. Contestava, assim, a ideia de que havia vulnerabilidade ou ameaça concreta aos direitos de judeus no Brasil, ou que o caso se conectava a preocupações internacionais a direitos humanos. Concluiu seu segundo voto dizendo que, como juiz, sempre procurou “cumprir a Constituição, sem considerações emocionais que não diziam, nem dizem, respeito à nossa tradição racial”.59 59 HC 82.424 (2003), p. 611.

A retomada da palavra por Alves, para desfazer a impressão de que seria “inimigo do povo judaico”, é um marco inicial da pressão da opinião pública sobre o STF – e o ponto em que o relator percebeu que aquele não era mais o “seu” tribunal (Recondo e Weber, 2019RECONDO, Felipe; WEBER, Luiz. Os Onze. Companhia das Letras, 2019., p. 221-222). De fato, o voto de Corrêa foi percebido dentro e fora do tribunal como uma virada no julgamento, para além do resultado final. Havia algo de diferente na dinâmica decisória. Novas e ambiciosas possibilidades de pensar o papel do STF surgiam nos debates. Dentro e fora do tribunal, Ellwanger cada vez menos seria “apenas uma questão jurídica”.

Do lado de fora, Paulo Sérgio Pinheiro, ex-secretário de Direitos Humanos, observou em artigo publicado durante o julgamento que, como ministro da Justiça de Itamar Franco, Corrêa havia chefiado a delegação brasileira na Conferência Mundial de Direitos Humanos de Viena (1993). Segundo Pinheiro, com a chegada de Corrêa à presidência do STF em abril de 2003, “renovam-se as esperanças do engajamento decisivo desse tribunal na luta pelos direitos humanos”. Nessa luta, Ellwanger seria exemplar, com um “significado que vai muito além de punir um editor e seu crime de racismo. O que está em causa é a capacidade do Estado brasileiro de fazer valer a proteção constitucional dos direitos das minorias.”60 60 O STF e o Racismo, Folha de São Paulo, 8 jun. 2003. (“A decisão desse julgamento tem um significado que vai muito além de punir um editor e seu crime de racismo. O que está em causa é a capacidade do Estado brasileiro de fazer valer a proteção constitucional dos direitos das minorias. Além do racismo arraigado contra os afrodescendentes, a decisão do STF, se seguir a clara indicação de Maurício Corrêa, diz respeito ao enfrentamento de outras formas de discriminação sistemática, de que também são alvo os homossexuais, os povos indígenas e as mulheres”). Pinheiro conclui citando uma expressão de Celso de Mello, que havia votado logo após Corrêa: “aquele que ofende a dignidade de qualquer ser humano, movido por razões de cunho racista, ofende a dignidade de todos e de cada um.61 61 O STF e o Racismo, Folha de São Paulo, 8 jun. 2003.

Por sua vez, o advogado de Ellwanger, Werner Becker, questionava a transformação do julgamento em episódio local da luta global pelos direitos humanos. Procurando influenciar o debate público e os votos ainda pendentes, publicou artigo em 26.06.2003 com o sugestivo título “Uma questão meramente jurídica”.62 62 Werner Becker. Uma questão meramente jurídica. Folha de São Paulo, 26 jun. 2003.

“Não se tratando os judeus de uma raça -afirmativa defendida pelos mais eminentes judeus, à evidência que não se poderia averbar o delito de imprescritível, característica exclusiva dos crimes de racismo prevista no artigo 5, XLII da Constituição brasileira. Ingressei, então, com um pedido de habeas corpus, não ousando nem mesmo afirmar que a conduta do réu não consistia em crime. Limitei-me a pedir que não se averbasse a condenação como imprescritível. O cerne da questão me pareceu simples e puramente jurídico. (...) Se a Constituição quisesse afirmar a imprescritibilidade de todas as condutas discriminatórias, teria dito “todas as condutas discriminatórias”, e não se referiria apenas ao crime de racismo. Questão tão singela e meramente técnica jamais me pareceu capaz de ferir qualquer suscetibilidade. (...)

Foi com espanto que vi o plenário do Supremo Tribunal Federal, no dia 9 de abril, lotado por membros da comunidade judaica, inclusive presente o rabino Sobel, vestido a caráter, exigindo uma reparação pelo voto, estritamente jurídico, proferido por esse ícone da magistratura brasileira, o ministro Moreira Alves. A expressão de raiva e indignação era vista em várias faces, a cada palavra proferida pelo ministro.Em compensação, cada palavra do ministro Maurício Corrêa, em prol da tese contrária, era recebida com claro entusiasmo, dando a impressão de que o plenário da Suprema Corte havia se transformado num Maracanã jurídico.(...) que o santo nome dos direitos humanos não seja tomado em vão, para que as labaredas do radicalismo não levem a uma condenação maior do que o direito brasileiro prevê.”63 63 Werner Becker. Uma questão meramente jurídica. Folha de São Paulo, 26 jun. 2003. [grifos meus]

É a mesma visão de Alves quanto à natureza do problema: uma questão técnica de aplicação da lei penal a um caso concreto, com potencial de privar um indivíduo de sua liberdade por um crime alegadamente prescrito. Não caberia, assim, qualquer discussão mais ampla sobre o problema da proteção a direitos de minorias vulneráveis. Contudo, como perceberam Becker e Moreira Alves, a formulação mais ampla do problema – a de Corrêa, Lafer, Pinheiro e Celso de Mello - ganhava mais tração dentro e aplauso fora do tribunal, agora perigosamente reconfigurado como um “Maracanã jurídico”.

Dentro do tribunal, reações ao voto-vista de Corrêa sinalizavam o rumo do julgamento. Ao descrever instrumentos internacionais de direitos humanos sobre discriminação, Corrêa se desculpa com os colegas pelo voto “cansativo”, afirmando estar sendo “até repetitivo” por se tratar de “questão da mais alta importância”. Em resposta, o ministro Celso de Mello, que votaria a seguir, assegura Corrêa de que “o Supremo Tribunal Federal ouve (...) com a máxima atenção, por considerar que o seu pronunciamento examina (...) matéria impregnada de tantas e tão relevantes consequências que se projetam no plano da tutela constitucional dos direitos pertinentes aos denominados grupos vulneráveis.64 64 HC 82.424 (2003), p. 574.

3.3 Um novo começo, agora também no Brasil

Antecipando voto antes da vista pedida por Gilmar Mendes, Celso de Mello explorou outras implicações da narrativa iniciada por Corrêa. Reconstruiu o cenário da proteção internacional aos direitos humanos nos termos do discurso constitucional que começava a se consolidar, globalmente, a partir dos anos 80. Em seu voto, o compromisso internacional com direitos no pós-guerra ganha contornos institucionais mais concretos.65 65 Essa ideia reflete o que Müller chama de “acordo constitucional do pós-guerra” (2011, p. 146-150). De um ponto de vista interno ao discurso dos juristas europeus, ver Commella (2009). Insere o STF em um contexto global de instituições a tarefa comum de proteção “aos grupos minoritários, especialmente àqueles que se expõem a uma situação de maior vulnerabilidade”.66 66 HC 82.424 (2003), p.633. Mello observa que, com a “consciência universal que se forjou no espírito de todos em torno do valor essencial dos direitos fundamentais da pessoa humana” no pós-guerra, foi preciso “reagir contra essas situações de opressão, degradação e injusta marginalização, dentre outros, de grupos étnicos, nacionais e confessionais.67 67 HC 82.424 (2003), p.623. Essas ameaças contra grupos minoritários em geral colocam um desafio “a todas as instâncias de poder no âmbito do aparelho de Estado e ao Supremo Tribunal Federal”, e os instrumentos internacionais criados nesse contexto criam “deveres irrenunciáveis” para o Estado brasileiro “e aos órgãos nele estruturados, notadamente ao Poder Judiciário e a este Supremo Tribunal Federal, em particular.”68 68 HC 82.424 (2003), p.623 e p.620, respectivamente. Na p.620, também se lê: “É esse, pois, o grande desafio com que nós, Juízes da Suprema Corte deste País, nos defrontamos no âmbito de uma sociedade democrática: extrair, das declarações internacionais e das proclamações constitucionais de direitos, a sua máxima eficácia (...).”

O voto de Mello converte o caso em uma oportunidade para o até então “frustrante” STF se reposicionar em termos discursivos. Casos de direitos fundamentais tipicamente dão a tribunais boas oportunidades de articular e justificar seus poderes, com baixo risco de retaliação por parte de atores políticos (Ginsburg, 2003GINSBURG, Tom. Judicial Review in New Democracies. Cambridge University Press, 2003.). Um caso envolvendo algo tão universalmente repudiado quanto o nazismo seria uma opção particularmente boa para explorar essa dinâmica. No caso, a posição adotada por Corrêa já parecia ter bastante apoio no debate público, e não havia risco de retaliação ou descumprimento da decisão por nenhum ator político ou social relevante, em qualquer hipótese. É nesse caso absolutamente “seguro”, em termos das possíveis consequências para o tribunal, que Mello explora a oportunidade de conectar o STF a uma narrativa mais abrangente da tarefa judicial de proteção a direitos:

“O Supremo Tribunal Federal se reúne para proferir julgamento impregnado de indiscutível valor simbólico, pois, hoje, está em debate, nesta corte, questão que se projeta com máxima intensidade na definição de um dos mais expressivos valores, cujo respeito confere legitimação ético-jurídico à ordem normativa sobre a qual se edifica e se estrutura o próprio estado democrático de direito.”69 69 HC 82.424 (2003), p. 614.

Este “expressivo valor” sobre o qual se fundaria a legitimação da ordem jurídica seria a dignidade humana (“valor fundante do estado e da ordem que lhe dá suporte institucional”).70 70 HC 82.424 (2003), p. 615. Celso de Mello prossegue, então, ressaltando “os marcos históricos que tão bem situam o instante em que este julgamento tem lugar”, ligando o julgamento aos 55 anos da promulgação da Declaração Universal dos Direitos Humanos.71 71 HC 82.424 (2003), p. 616. Aqui, a conexão entre o nacional e o global, e o STF e a narrativa histórica dos tribunais constitucionais, ganha contornos ainda mais densos com a referência à “dignidade da pessoa humana”, presença recorrente na justificação que diversos juízes e tribunais fizeram da expansão de seus próprios poderes em diversos países.72 72 Ver, p. ex., Barak (2015); Dupré (2003).

“Hoje, portanto, muito mais do que realização de um julgamento – e de um julgamento revestido de significação histórica na jurisprudência de nosso país – é chegado o momento de o Supremo Tribunal Federal incluir, em sua agenda, seu claro propósito de afirmar os compromissos do estado brasileiro e de manifestar a preocupação desta Corte com a questão da defesa e da preservação da causa dos direitos essenciais da pessoa humana, que traduzem valores que jamais poderão ser desrespeitados ou esquecidos.”73 73 HC 82.424 (2003), p. 619.

Em sua confirmação de voto, já no fim do julgamento, Mello viria a reforçar essa narrativa. Apontando no caso “o permanente conflito entre civilização e barbárie, cabendo, ao Supremo Tribunal Federal, fazer prevalecer, em toda a sua grandeza, a essencial e inconspurcável dignidade das pessoas”, “acima das pulsões irracionais”, “em prol de todos os cidadãos e em respeito aos milhões de seres humanos que a crueldade inominável do regime nazista (...) destruiu e martirizou” – memória que permanece como “grave advertência (...) de que o MAL jamais deverá triunfar outra vez.”74 74 HC 82.424 (2003), p.944-945. Assim, em contraste com Moreira Alves, e indo além de Maurício Corrêa, Celso de Mello apresenta uma narrativa conscientemente inédita sobre (i) a proteção a direitos humanos fundamentais como tarefa fundamental de tribunais desde o pós-guerra; (ii) a trajetória específica do STF nessa narrativa histórica.

Dos anos 90 em diante, uma versão mais específica da narrativa global começa a se manifestar em decisões de tribunais constitucionais, sobretudo em processos de redemocratização e transição política decorrentes da queda do muro de Berlim e do fim da União Soviética. Nessa versão, o compromisso com a dignidade humana aparece como ideia-síntese da proteção aos direitos fundamentais e do repúdio ao totalitarismo, exigindo e justificando, em termos de desenho institucional, a criação de tribunais constitucionais fortes. A Constituição como texto específico e historicamente contingente cede espaço à Constituição como conjunto de compromissos de toda e qualquer democracia com direitos fundamentais e a dignidade da pessoa humana.75 75 É possível e necessário problematizar a adoção, por juízes e acadêmicos em países do Sul Global, de um discurso de direitos forjado na Europa do pós-guerra e reconfigurado em transições de antigos países socialistas. Ver, nesse sentido, os artigos reunidos em Dann, Bönnemann e Riegner (2020). Além disso, pode-se interrogar as relações entre a consolidação do discurso dos direitos e transformações na economia política global nos anos 80 (Moyn, 2017). Independentemente de a adoção dessas ideias explicar a expansão do poder judicial, ou de ser apenas um efeito ou reflexo dessa expansão, os dois processos – a expansão de certos discursos sobre o poder judicial, e a expansão do poder judicial em si – são contemporâneos, inclusive em alguns países da América Latina, como a Colômbia, com tribunais constitucionais mais ativos já nos anos 90 (Couso, 2010COUSO, Javier. The transformation of constitutional discourse and the judicialization of politics in Latin America. In: Couso et al. (orgs.). Cultures of Legality: Judicialization and political activism in Latin America, Cambridge University Press, 2010.).

Em votos nos anos 90, ministros como o próprio Celso de Mello já vinham destacando a “supremacia da Constituição” e a necessidade de garantir que os outros poderes respeitem os limites constitucionais (Arguelhes, 2020ARGUELHES, Diego Werneck. A palavra e o poder: o STF e a separação de poderes na jurisprudência de Celso de Mello. In: ARGUELHES, Diego; RECONDO, Felipe (orgs.). O Supremo de Celso de Mello: Trajetória, decisões e legado. Belo Horizonte: Letramento, 2020.). Essa defesa da obediência geral à Constituição, porém, é histórica e conceitualmente distinta do discurso que se expande internacionalmente nos anos 90, e que procurei descrever no parágrafo anterior. O controle de constitucionalidade e a supremacia constitucional em si não precisam ser justificados a partir da ideia de proteção a direitos fundamentais de grupos vulneráveis; aliás, essa justificativa não aparece nos debates originais sobre o controle judicial de constitucionalidade nos EUA, nem tem papel relevante nos argumentos utilizados por Hans Kelsen para defender a criação de um tribunal constitucional na década de 20 do século XX.76 76 Ver Kelsen (1942); Rakove (1995). No discurso de Mello, em contraste, a própria tarefa do tribunal constitucional é reconfigurada a partir da ideia de proteção à pessoa: a Constituição é um ponto de partida necessário, mas insuficiente. A atuação do tribunal – na leitura do texto, na interpretação de seus próprios poderes, e no uso que faz desses poderes – deve ser avaliada com base em critério mais ambicioso, o da proteção a direitos fundamentais.77 77 Mais do que uma concepção sobre o papel do tribunal constitucional, essa é também uma narrativa sobre a Constituição. Nessa perspectiva, “mais do que as peculiaridades do processo político nacional que levou a sua promulgação, o que interessa é a sua semelhança com diversas outras constituições promulgadas no período após o fim da Segunda Guerra Mundial, inserindo-a em um movimento transnacional. A Constituição brasileira seria mais uma manifestação concreta do desse novo constitucionalismo” (Pereira, 2016). Nessa perspectiva, Stone Sweet (2000) registra a mudança de discursos de legitimação de tribunais constitucionais, cada vez menos preocupados com “separação de poderes” e cada vez mais concentrados em mostrar que protegem direitos de maneira mais eficaz do que outras instituições.

Nessa perspectiva, um tribunal que não priorize a proteção a direitos fundamentais estaria falhando. Assim, Mello faz uma espécie de mea culpa pelo tribunal, apresentando uma avaliação crítica da performance da instituição neste tema. Reconhece que, “mais de 15 anos após a promulgação da Constituição”, o STF “ainda” não tinha “incluído em sua agenda” o “claro propósito” da proteção aos direitos fundamentais. “Este momento impregnado de sentido histórico impõe um instante de necessária reflexão” sobre como o STF, como tribunal constitucional, vem cumprindo a tarefa de proteção à pessoa.78 78 HC 82.424 (2003), p. 620. Em sua segunda intervenção no caso, Mello insiste no olhar para trás, lembrando que a “nova Constituição completará apenas 15 anos no próximo dia 15 de outubro”.79 79 HC 82.424 (2003), p. 926.

Essas não eram ideias inteiramente novas no discurso de Mello. Ao longo dos anos 90, o ministro vinha desenvolvendo preocupações crescentes com direitos, enfocando primariamente a liberdade e devido processo legal (Gomes, 2020GOMES, Juliana. Celso de Mello, liberdade e processo: o legado de um relator bissexto para os direitos fundamentais. In ARGUELHES, Diego; RECONDO, Felipe (orgs.). O Supremo de Celso de Mello: Trajetória, decisões e legado. Belo Horizonte: Letramento, 2020.). Conforme nos aproximamos de Ellwanger, aparecem sinais mais concretos de uma preocupação, ao menos no discurso, em reorientar as prioridades do tribunal a partir de uma pauta de direitos entendidos de forma mais expansiva. Quando eleito para a presidência do tribunal, na sessão de 22 de maio de 1997, o ministro havia observado ser necessário ampliar “ainda mais a agenda institucional do Poder Judiciário”, que possui um “compromisso histórico e moral com a preservação dos valores fundamentais que protegem a dignidade da pessoa humana”, de que o poder político dos juízes seria “instrumento concretizador”.80 80 No seu discurso de posse, Mello observou que a importância do papel judicial na proteção a direitos crescia “se considerarmos que, pela primeira vez, o Estado brasileiro a partir desse notável e histórico Programa Nacional de Direitos Humanos, elaborado pelo Governo do eminente Presidente Fernando Henrique Cardoso-assume compromissos graves e necessários no plano da tutela e proteção contra os abusos, as iniqüidades e as exclusões sociais.” Em 2001, por ocasião da posse de Marco Aurélio na presidência, Mello destacou as tarefas judiciais “de conferir prevalência à essencial dignidade da pessoa humana, de fazer cumprir os pactos internacionais que protegem os grupos vulneráveis expostos a práticas discriminatórias.”81 81 Discurso do ministro Celso de Mello na posse de Marco Aurélio na presidência do STF, p. 28. Em Ellwanger, o ministro avança nessa direção. Aplica o parâmetro da proteção a direitos para fazer um balanço crítico da atuação do tribunal. E, se o STF deveria ser o exemplar nacional dessa narrativa global, sua performance vinha deixando a desejar.

É apenas após esse balanço crítico que o ministro discute “raça”. Para Mello, sinalizar um “novo começo” na atuação do Supremo era mais importante que o problema específico colocado pelo caso. Ao se descolar das expectativas em torno da nova Constituição, o tribunal perdera a chance de se apresentar como um protetor de direitos fundamentais. Ellwanger é a oportunidade de um ajuste de contas – e de rumo. Uma segunda chance de se voltar, de maneira pública, para as promessas constitucionais de proteção a direitos fundamentais, corrigindo a história recente da instituição. Nesse sentido, é o voto de Celso de Mello, não o de Corrêa, que faz a oposição mais acabada, articulada e ambiciosa à leitura “deflacionária” que Moreira Alves faz de Ellwanger e do próprio papel do STF.

A narrativa construída por Corrêa e Mello é apropriada inclusive por ministros que divergiriam dos dois no resultado. Mesmo votando pela concessão do HC, Marco Aurélio procura também alinhar sua posição à narrativa do pós-guerra. Enfatiza que “a censura de conteúdo sempre foi a arma mais forte utilizada por regimes totalitários”, observando:

“[O]s piores acontecimentos havidos – entre eles, a perseguição aos judeus – sempre ocorreram em momentos de treva no campo das comunicações, de falta de publicidade de modo a permitir o acompanhamento público. Com isso, foram evitadas as reações próprias aos episódios. Encobertos, ganharam proporções alarmantes, predominando a barbárie. A história mostra que a transparência, a revelação dos fatos serve de freio aos homens...”82 82 HC 82.424 (2003), p. 876.

Em Ellwanger, o resultado do voto parece ser menos importante do que a formulação do problema e, no fim das contas, da própria tarefa do tribunal. Após Corrêa erodir a leitura “deflacionária” do caso, como vimos, Moreira Alves retomou a palavra para negar a dimensão maior do caso e deixar claro que não endossava discriminação.83 83 Em sua entrevista para o História Oral do STF, Moreira Alves registrou que, com seu sobrenome, provavelmente seria um “Cristão novo (...)Possivelmente, no século XVII, seria jogado numa fogueira. Considerar-se que eu estou contra os judeus...” (p. 102). O disclaimer de Marco Aurélio é distinto: concede o HC a Ellwanger, mas explica que proteger a liberdade de expressão é também parte da luta contra totalitarismos. Marco Aurélio converge com a narrativa de Corrêa e Mello, mas a disputa para seu lado. Essa disputa foi levada também para a imprensa, em críticas à defesa da liberdade de expressão adotada por Marco Aurélio e Ayres Britto. Em artigo de opinião criticando o voto de Marco Aurélio, ainda durante o julgamento, Celso Lafer louvou a “sensibilidade jurídica de magistrado de corte constitucional” de Maurício Corrêa, que percebera que o argumento da liberdade de expressão implicaria um “deslizamento” nocivo sobre os direitos humanos, e que a Constituição brasileira vedaria o racismo justamente “à luz dessa terrível experiência histórica [do nazismo]”.84 84 Celso Lafer. Racismo – O STF e o Caso Ellwanger. Estado de São Paulo, p. A2, 20 jul. 2003.

Recém-indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Ayres Britto chamou ainda mais atenção do que Marco Aurélio, por ter votado pela absolvição de Ellwanger. Britto considerou que as condutas praticadas pelo editor estavam plenamente protegidas pela liberdade de expressão, ainda que a condenação em si não fosse objeto do HC - “outro valor mais alto se alevanta”, afirmou, citando Camões. Em editorial, o Estado de São Paulo afirmou que Britto havia dado “um voto em favor do racismo”, causando “perplexidade” ao defender a absolvição.85 85 Um voto a favor do racismo, Estado de São Paulo, p. A3, 7 set. 2003. Semanas após seu voto, porém, reportagem no mesmo jornal faz um balanço relativamente favorável da atuação de Britto no STF, descrevendo-o como o “ex-petista” que vinha votando “até mesmo contra interesses do presidente e ex-companheiro Luiz Inácio Lula da Silva”. O texto ressalta a proteção da liberdade de expressão como o elo comum entre Marco Aurélio e Britto, e que os diferencia da posição de Moreira Alves.86 86 Mariângela Galucci. Ex-petista faz crescer ‘minoria’ no STF. Estado de São Paulo, p. A14, 28 set. 2003.

Apesar de contar com menos apoio dentro e fora do tribunal, a posição pró-liberdade de expressão de Britto e Aurélio conseguiu se apresentar como uma narrativa de direitos. Com isso, ao final do tumultuado julgamento, o ministro que mais havia dado o tom do tribunal nos anos 90 ficou isolado. O voto de Moreira Alves – que se aposentou após a terceira sessão de julgamento, em abril de 2003 – é o único que, concedendo o HC, não procura justificar sua posição nem em termos da narrativa mais ampla do papel de tribunais constitucionais, nem ao menos como um conflito entre direitos fundamentais. Ao final do julgamento, a imprensa repercutiu uma frase do então presidente do STF, Maurício Corrêa: “Creio que, pelo menos desde a promulgação da Constituição de 1988, esse tenha sido o caso mais emblemático do contexto dos direitos civis que foi julgado pelo Supremo.87 87 A frase de Corrêa é citada nas reportagens STF decide que antissemitismo é racismo, Estado de São Paulo, p. A12, 18 set. 2003. Rodrigo Rangel. STF nega habeas corpus a acusado de racismo. O Globo, p. 9, 18 set. 2003 Apesar da companhia de dois outros ministros na concessão do HC, Moreira Alves ficou sozinho.

4 A narrativa dos anos 90 no espelho de Ellwanger

Ellwanger é um momento de transformação na narrativa que ministros apresentam para justificar o poder e o papel do STF – cuja tarefa, foco e fonte de legitimação seria então a proteção da pessoa humana. Nesta seção, volto ao STF do “novo começo” frustrado dos anos 90 para contrastá-lo com esse novo discurso. Falar sobre si mesmo como um defensor de direitos fundamentais não é necessariamente agir nesse sentido. O que se propõe neste trabalho é apenas que Ellwanger representa uma virada na primeira dessas dimensões. Mesmo assim, essa virada discursiva não é trivial. Nos anos 90, esse discurso centrado em “direitos fundamentais” não tinha papel relevante nas percepções e ideias dos ministros, com reflexos visíveis nas pautas que o tribunal selecionava para si e nas tarefas institucionais que apresentava como essenciais.

Nas entrevistas do projeto História Oral do Supremo Tribunal Federal, da FGV-Rio, os ministros foram indagados quanto aos casos mais importantes, marcantes ou difíceis na sua atuação no tribunal. Analisando as entrevistas de ministros que estiveram no tribunal ao longo dos anos 90, identifico alguns padrões.88 88 Foram analisadas as entrevistas dos ministros José Carlos Moreira Alves, Célio Borja, Marco Aurélio, Francisco Rezek, Néri da Silveira, Sydney Sanches, Carlos Mário Velloso, Ilmar Galvão, Paulo Brossard, José Paulo Sepúlveda Pertence. No momento de elaboração deste trabalho, Celso de Mello e Ellen Gracie (que estavam no tribunal antes de depois de Ellwanger) ainda não haviam sido entrevistados. Com exceção de temas de direito penal, incluindo extradição, os ministros não citam casos de direitos fundamentais dentre os mais “importantes” ou “difíceis” dos anos 90. Moreira Alves registra uma disputa entre os supermercados Jumbo e Disco, envolvendo o problema jurídico das “tratativas contratuais incompletas”; um caso envolvendo os limites ao poder constituinte decorrente dos Estados, na elaboração de suas constituições; e um caso de direito intertemporal envolvendo a aplicação da nova Constituição ao instituto jurídico da enfiteuse.89 89 Entrevista do Ministro Moreira Alves para História Oral do STF, p. 45.

Néri da Silveira destaca o processo de extradição da cantora Gloria Trevi, em que se discutiu a possibilidade de extração de material genético, contra sua vontade, para averiguar alegação de que tinha sido vítima de estupro por agentes da Polícia Federal.90 90 Entrevista do Ministro Néri da Silveira para História Oral do STF, p. 107. Marco Aurélio – único ministro entrevistado que esteve no STF nos anos 90 e na década seguinte – destaca os casos da Lei de Biossegurança (2008) e da interrupção da gravidez de fetos com anencefalia (2012), respectivamente.91 91 Entrevista do Ministro Marco Aurélio para História Oral do STF, p. 45. Octavio Gallotti, Sepúlveda Pertence, Paulo Brossard, Francisco Rezek e Sydney Sanches e Carlos Velloso destacaram os MS impetrados por Fernando Collor de Mello no processo de impeachment.92 92 Para os ministros que participaram dos julgamentos envolvendo o impeachment de Collor, o roteiro da entrevista os incluía expressamente; da mesma forma, ministros que participaram de Ellwanger foram perguntados sobre o caso. Assim, a comparação deste caso com os outros temas, nesses termos, fica prejudicada. Velloso destaca ainda temas de federação, além de privatizações e planos econômicos (temas que aparecem em diversas entrevistas).

Na percepção desses ministros, os temas importantes e/ou difíceis enfrentados pelo STF ao longo dos anos 90 envolviam sobretudo questões de organização do Estado, incluindo sua atuação na economia e a dimensão federativa; os julgamentos de Collor; e casos de extradição. Os temas de direitos fundamentais associados às grandes decisões do STF na última década estão basicamente ausentes. O caso Collor poderia ser entendido, talvez, como exceção parcial, com o STF intervindo em um processo decisório político, no âmbito do Congresso, para afirmar o devido processo legal e o direito de defesa. Talvez esteja aqui a proximidade possível entre o tribunal e uma pauta de direitos fundamentais, na percepção dos ministros. Entretanto, tratava-se do devido processo legal no julgamento de um indivíduo que, embora alvo de procedimento estatal sancionatório, não integrava minoria vulnerável e ocupava o cargo mais poderoso do país.

Por outro lado, mesmo a intervenção judicial no caso Collor pode ser expressa em vocabulários mais tradicionais sobre a função do tribunal – o STF como o tribunal do habeas corpus, da correção das injustiças na aplicação da lei, e da afirmação de procedimentos no caso concreto.93 93 Nesse sentido, a leitura de Gomes (2020) sobre a jurisprudência de direitos do ministro Celso de Mello pode ajudar a entender a posição geral do STF nos anos 90: um tribunal de garantia de procedimentos, que protegia direitos como resultado dessa função maior. Nessa visão, o caso Collor não seria uma transformação na lógica de atuação da instituição, mas, no máximo, uma ampliação de grau: uma utilização mais vigorosa de instrumentos e modos de atuação de que o STF tradicionalmente já dispunha, sem relação necessária com a ideia de que a proteção a pessoas e grupos vulneráveis seria a tarefa central do tribunal e/ou a justificação última de seu poder.

Os elementos apontados até aqui se reforçam em texto de Carlos Mário Velloso (ministro de 1990 a 2006) intitulado “A Evolução da Interpretação dos Direitos Fundamentais no Supremo Tribunal Federal”, publicado em 2003.94 94 Ver Velloso (2003). No texto, há a informação de que se trata de palestra proferida em 2001. Os casos são basicamente dos anos 90. Velloso destaca temas relativos a direito penal e processo penal e à organização do Ministério Público como órgão de acusação, bem como à extensão dessas garantias processuais em investigações fora do judiciário (p.ex., em comissões parlamentares de inquérito).95 95 Aqui, por exemplo, Velloso destaca a jurisprudência do STF sobre a extensão e procedimentos da garantia constitucional do sigilo bancário – que, embora o ministro conecte o direito à privacidade de forma mais ampla, aparece basicamente em decisões em que o indivíduo é réu ou investigado de alguma forma, isto é, em contextos de repercussão penal. O ministro registra um caso que dividiu o Supremo (6x5) quanto a esse tema, quanto à aplicabilidade da reserva de jurisdição para afastar sigilo bancário invocado pelo Banco do Brasil para não revelar os beneficiários de certos empréstimos públicos subsidiados. Também aponta para temas envolvendo direito tributário e garantias do contribuinte, como a já mencionada emenda constitucional que criou o IPMF, em 1993; problemas de isonomia e direitos de acesso a vagas preenchidas por meio de concurso público, bem como à organização da carreira de servidores públicos; um caso envolvendo igualdade na remuneração de trabalhadores nacionais e estrangeiros trabalhando para a mesma empresa estrangeira no Brasil, e um caso sobre a “dignidade humana” – o já mencionado HC 71.373 (1994). Discutia-se, no caso, se alguém poderia ser obrigado a oferecer material genético para fins de investigação de paternidade, problema semelhante ao do caso Gloria Trevi.

Velloso destaca como um caso “dos mais importantes” da história do STF a Intervenção Federal 114, julgada em novembro de 1991. Moradores de Matupá (MT) lincharam e atearam fogo a três pessoas presas em flagrantes pela polícia, que aparentemente havia viabilizado o linchamento. O Procurador-Geral da República apresentou pedido de Intervenção Federal, alegando que o Estado de Mato Grosso não tinha condições de proteger o direito à vida. O STF julgou improcedente o pedido, por unanimidade. Apesar de votar pela improcedência, Velloso aponta em seu voto que, com a decisão, o STF “deixa abertas as suas portas ⎯ portas, aliás, que nunca estiveram fechadas ao clamor da liberdade ⎯ também para essa forma de tornar efetivos os direitos humanos e assim efetiva a Constituição”.96 96 “[L]ouvo a atitude máscula do Procurador-Geral da República (...), ao fazer a representação a esta Corte, buscando a intervenção federal para o fim de efetivar proteção aos direitos da pessoa humana. (...) Conheço, pois, da representação. Enfrento-lhe o mérito. (...) [S]e tem, no caso, um fato que, não obstante lamentável, que chega a nos envergonhar, é um fato isolado e que está sendo apurado pelas autoridades estaduais, conforme deu notícia o eminente Relator. O indeferimento, no caso, da medida patológica da intervenção federal, é o que se recomenda.” A importância do caso estaria tão somente no reconhecimento, em tese, de que o PGR tem legitimidade para pedir intervenção federal por violação de direitos humanos.97 97 Artigo 34, VII, “b”, Constituição Federal. O próximo pedido de intervenção federal (no Espírito Santo, também por violações de direitos humanos) ocorreu apenas em 2002, tendo sido também rejeitado pelo STF. Talvez as portas até estivessem abertas, em tese, ao longo dos anos 90, para “tornar efetivos os direitos humanos”. Mas quem tentasse atravessá-las não encontraria um STF disposto a utilizar a intervenção federal como instrumento de proteção de direitos.

Podemos assumir que, tanto no texto de Velloso (que ainda estava no tribunal quando o publicou), quanto nas entrevistas do História Oral, o objetivo ou viés dos ministros estaria em mostrar o tribunal na sua melhor luz, inclusive no tema dos direitos. A imagem que surge dessas fontes não é, de fato, a de um tribunal insensível a direitos, especialmente quanto a questões de devido processo legal. Mas os elementos analisados aqui não descrevem um tribunal que prioriza direitos fundamentais em sua pauta, nem que concebe sua atuação a partir da proteção da pessoa humana e de grupos vulneráveis contra maiorias legislativas. Se direitos são centrais para a atuação de tribunais constitucionais, aquele STF formulava sua atuação mais como última instância do poder judiciário, do que propriamente como tribunal constitucional. Mais especificamente, chama a atenção a ausência de uma imagem que é central na narrativa de Celso de Mello em Ellwanger: a da minoria vulnerável que precisa ser protegida de excessos majoritários e quaisquer formas de exclusão. Em vez disso, na pauta de direitos fundamentais dos anos 90, sujeitos de direitos chegavam ao STF nas categorias de contribuintes, servidores públicos (ou participantes de concursos públicos), investigados, presos e réus – ainda que, ao decidir esses casos, os ministros pudessem às vezes falar de igualdade, liberdade e, em alguns raros casos, dignidade humana.98 98 Observando que “a maior preocupação dada ao STF aos temas envolvendo direitos fundamentais é um fenômeno relativamente recente”, Pereira (2016, p.132) observa que a atuação do tribunal nos anos 90 foi marcada pelo que chama de “direito da burocracia”.

Uma última estratégia de análise ajuda a reforçar o contraste entre o discurso endossado por Ellwanger e as ideias do tribunal dos anos 90. Procurei mapear, quantitativamente, nos acórdãos e decisões monocráticas do tribunal, a ocorrência de algumas expressões que revelam a forma pela qual os ministros concebem, justificam e lidam, ao longo de um grande número de casos, com o papel do tribunal. Nos gráficos 1 e 2, constantes do Anexo III, os resultados são apresentados em termos do percentual do total de decisões colegiadas e monocráticas daquele ano utilizam as expressões “declaração universal” e “direitos humanos”; “Dignidade da pessoa humana” ou “dignidade humana”; e “direitos fundamentais”.

As três expressões praticamente não eram utilizadas nos anos 90. Nas últimas duas décadas, a frequência de duas delas – “dignidade humana” e “direitos fundamentais” – começa a aumentar, de maneira constante. Esse aumento se expressa em uma curva acentuada que começa a aparecer, em acórdãos, de 2004 em diante. No caso de “Direitos fundamentais”, o ano de 2003 – o ano ao longo do qual Ellwanger foi decidido – contém um pico de frequência em acórdãos, que precisa ser investigado em trabalhos futuros. Esses dados sugerem uma transformação no vocabulário adotados em votos e decisões monocráticas, e que pode estar relacionada à progressiva adoção do novo discurso apontado neste trabalho.

Vale destacar, ainda, o comportamento das decisões monocráticas de Marco Aurélio e Celso de Mello – os únicos ministros que, tendo participado de Ellwanger, estiveram no tribunal tanto na década de 90, quanto na década de 00. De meia dúzia de referências a “dignidade humana” até janeiro de 2004, passam para mais de 350 e quase 500, respectivamente, de 2004 a 2020 (ver Anexo II). A mudança no discurso parece clara, ainda que não nos diga nada sobre eventuais transformações efetivas na prática decisória. Ellwanger colocou em pauta narrativas e ideias sobre o papel do tribunal que praticamente não eram usadas em decisões nos anos 90, e que, dali em diante, ganhariam mais e mais espaço nos votos dos ministros.

5 Conclusão: um novo Supremo?

No dia 26 de junho de 2013, reportagem do Valor Econômico apresentava a posse de Luís Roberto Barroso no STF como desdobramento de transformações iniciadas em Ellwanger, quando o STF teria começado “a deixar de lado as decisões tecnicistas para colocar em prática sentenças humanistas, mais próximas dos anseios da população.”99 99 Juliano Basile. Posse no STF em dia de protesto consolida mudança de rota. Valor Econômico, 26 jun. 2013. Segundo ministros e ex-ministros ouvidos pela reportagem, o Supremo de antes “era uma Corte mais passiva, que decidia assuntos mais rotineiros”, mas o tribunal pós-Ellwangerpassou a decidir as questões mais importantes para a sociedade”, sendo cada vez mais convocado para dar efetividade a direitos (Cezar Peluso). O STF de 2013 seria “uma outra corte”, “um militante da Constituição (...) humanista, democrática, contemporânea, eminentemente antipreconceituosa [e] densamente principiológica para se adaptar aos novos fatos e ideias” (Ayres Britto); um tribunal disposto a ir além do texto da Constituição (Carlos Velloso), que havia começado a mudar de postura graças e ministros como Celso de Mello, Sepúlveda Pertence e outros ministros “de visão mais humanista sobre o papel do tribunal”, comprometidos com o “avanço das garantias de direitos essenciais dos cidadãos” (Roberto Barroso). Também em 2013, Celso Lafer observou em artigo de opinião que Ellwanger tinha sido “emblemático” e “antecipador” da tendência de intervenção do STF em “temas sensíveis da vida política e social”, no contexto de uma “tutela dos direitos humanos, positivados de maneira abrangente no texto constitucional.”100 100 Celso Lafer. A boca e a língua do justo. Estado de São Paulo, 6 dez. 2013.

Neste trabalho, Ellwanger é reconstruído como um momento de mudança de narrativa e de ideias, não necessariamente de comportamento decisório judicial. As falas citadas no parágrafo acima, feitas por atores engajados nessa narrativa, misturam descrições e aspirações. Mas permitem entrever descrições de aspirações sobre o STF, com um “novo” tribunal afirmando ideais normativos conscientemente diferentes daqueles do tribunal “antigo”. Este trabalho analisa essa mudança nas aspirações publicamente professadas pelos ministros – os critérios normativos pelos quais afirmavam que o tribunal deveria agir, e pelos quais deveria ser avaliado. Ainda que o discurso da expansão do poder dos tribunais constitucionais a partir do pós-guerra frequentemente se afirme como história, a função dessa narrativa, especialmente na voz dos ministros, não é factual, mas sim normativa.

Ellwanger não é uma vitória total ou imediata desta nova maneira de encarar a tarefa do Supremo, nem mesmo no nível do discurso. É uma arena pública em que diferentes “novos” Supremos, em contraste a um mesmo “velho” Supremo, reconhecem-se como aliados no diagnóstico da insuficiência do tribunal antigo e na adoção de um discurso para o tribunal novo. Neste discurso, o tribunal tem por tarefa a proteção a direitos fundamentais, em especial de grupos vulneráveis no processo democrático, e decide conflitos constitucionais reconhecendo os princípios e direitos mais abrangentes em jogo. Além de revelar o novo começo desperdiçado em 1988, o contraste que Celso de Mello ajuda a construir em Ellwanger também indica o que fazer dali em diante: priorizar a atuação em temas de direitos fundamentais, em especial quanto a minorias vulneráveis.

Ao final do julgamento, a importância simbólica de Ellwanger para o tribunal já parecia clara.101 101 Até hoje, é o único acórdão do tribunal que foi publicado sob a forma de livro, poucos meses após o julgamento. (SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Crime de Racismo e Anti-semitismo: um julgamento histórico do STF (Habeas Corpus n. 82.424). Brasília: Brasília Jurídica, 2004). Mas 2003 foi, de fato, o começo de uma nova era – uma mudança nas decisões, e não apenas no discurso? No primeiro “novo começo”, com a promulgação da Constituição de 1988, os constituintes anunciaram, com pompa e circunstância, o momento de o Supremo entrar. Os ministros, porém, discordaram do script. Entraram em cena nos seus próprios termos, frustrando boa parte das expectativas depositadas no “novo começo” constitucional. Em Ellwanger, tenta-se reiniciar o papel do STF na democracia brasileira como um protetor de direitos fundamentais. A promessa talvez seja agora mais promissora; afinal, agora são os próprios ministros – e não legisladores constituintes de fora do tribunal - que prometem abandonar o “velho” Supremo.

Nove meses após o fim do julgamento de Ellwanger, a Confederação Nacional dos Trabalhadores da Saúde propôs a ADPF 54. Na ação, pedia-se ao STF que, fazendo “interpretação conforme a Constituição” de artigos do Código Penal, afirmasse que o tipo penal do aborto não incidiria no caso de fetos anencefálicos, sob o argumento de que seriam incompatíveis com a vida fora do útero (e, assim, não haveria bem jurídico a ser protegido). Na inicial, fazendo referência aos horrores do totalitarismo, o advogado Luís Roberto Barroso invoca como argumento central a dignidade humana, que proibiria forçar uma mulher a levar a termo uma gravidez nesses casos. Se a promessa de Ellwanger é um STF de direitos fundamentais, o ajuizamento da ADPF 54 sugere que ela foi ouvida.

Mas terá sido cumprida? O “novo começo” do discurso se traduziu em realidade? Os dados apresentados neste trabalho sugerem que, de 2004 em diante, e cada vez mais, decisões monocráticas e acórdãos do STF passaram a falar em “dignidade humana” e “direitos fundamentais”. Mas essa mudança de vocabulário foi acompanhada de mudança de padrão decisório – ou mesmo de uma ampliação da presença desses temas na pauta e na agenda do tribunal? É preciso investigar se, quando e em que casos e condições o STF passou a atuar efetivamente na área de direitos fundamentais, conforme a anunciação de Ellwanger. Este texto não tem por objetivo responder a essas questões. Por ora, vale lembrar que a ADPF 54 só veio a ser decidida em 2012 – quase uma década após o “novo começo” discursivo de Ellwanger.

Anexo I

Tabela 1
Votos de ministros(as) do STF no caso Ellwanger

Anexo II

Tabela 2
Expressões “Dignidade Humana” ou “Dignidade da pessoa humana” em decisões do STF. Os números indicados entre colchetes [ ] são os resultados obtidos no sistema de busca do site do STF.
Tabela 3
Expressão “Direitos Fundamentais” em decisões do STF. Os números indicados entre colchetes [ ] são os resultados obtidos no sistema de busca do site do STF.
Tabela 4
Expressões [“Declaração Universal” + “Direitos Humanos”] em decisões do STF. Os números indicados entre colchetes [ ] são os resultados obtidos no sistema de busca do site do STF.

Anexo III

Os dados utilizados nos gráficos foram obtidos na base do projeto “Supremo em Números”, da FGV Direito Rio. As buscas foram realizadas com um termo de leniência no interior da expressão, sensível a variações do tipo “dignidade inalienável da pessoa humana” ou “dignidade fundamental da pessoa humana”.

Gráfico 1. Referências a expressões no texto integral ou ementa de acórdãos

Gráfico 2. Referências a expressões na ementa ou texto integral de decisões monocráticas

  • * Ao longo de 2019 e 2020, versões anteriores deste trabalho foram apresentadas em seminários na FGV Direito SP (no evento “Dossiê Ellwanger”, organizado pela Plataforma de Liberdade de Expressão e Democracia (PLED), e em um seminário do Núcleo de Justiça e Constituição); na Universidade Federal do Rio de Janeiro (FND/UFRJ), que me recebeu como professor visitante entre 2020 e 2021; e no grupo de pesquisa “Judiciário e Democracia” (JUDE) da Universidade de São Paulo (DCP/USP). A versão final se beneficiou de comentários e críticas de diversos participantes nesses eventos, a quem agradeço na pessoa de seus organizadores: Carlos Bolonha, Clarissa Gross, Dimitri Dimoulis, Nikolay Bispo, Pedro Fortes, Rogério Bastos Arantes e Ronaldo Porto Macedo. Agradeço especialmente a Evandro Süssekind, Felipe Recondo, Luiz Gomes Esteves, Guilherme Almeida, Thomaz Pereira e Pedro Jimenez Cantisano pela leitura crítica de múltiplas versões do trabalho, e a Mariana Muniz e Julia Freitas pelo auxílio na pesquisa e revisão.
  • 1
    Artigo 5º, LXI, Constituição Federal.
  • 2
    Preso é libertado em São Paulo. O Estado de São Paulo, 06 out. 1988.
  • 3
    Ver, p.ex., De Oliveira (2005)DE OLIVEIRA, Vanessa. Judiciário e Privatizações no Brasil: Existe uma Judicialização da Política? DADOS – Revista de Ciências Sociais, Rio de Janeiro, v. 48, n. 3, p. 559-587, 2005. (privatizações); Da Ros (2008)DA ROS, Luciano. Poder de Decreto e Accountability Horizontal: Dinâmica Institucional dos Três Poderes e Medidas Provisórias no Brasil Pós-1988. Revista de Sociologia e Política, Curitiba, v. 16, n. 31, p. 143-160, nov. 2008. (medidas provisórias); Dimoulis (2016) (tendência “passivista” do Supremo); de maneira mais geral, ver Arantes (1997)ARANTES, Rogério Bastos. Judiciário e Política no Brasil. São Paulo: Idesp: Editora Sumaré; Fapesp; Educ, 1997., Mendes (2008)MENDES, Conrado. Direitos Fundamentais, Separação de Poderes e Deliberação. Tese de doutorado em ciência política, Universidade de São Paulo, 2008., Brinks (2011)BRINKS, Daniel. Faithful servants of the regime. In G. Helmke & J. Rios-Figueroa (Orgs.), Courts in Latin America. Cambridge: Cambridge University Press, 2011, pp. 128-153., Koerner (2013)KOERNER, Andrei. Ativismo Judicial? Jurisprudência constitucional e política no STF pós-88. Novos estudos CEBRAP, n.96, 2013, pp.69-85. e Pereira (2016)PEREIRA, Jane Reis Gonçalves. “O Judiciário como impulsionador dos direitos fundamentais: entre fraquezas e possibilidades”. Revista da Faculdade de Direito da UERJ, n.29, jun.2016.. Para discussões mais gerais sobre do poder de agenda no STF, ver Dimoulis (2008); Arguelhes e Ribeiro (2018).
  • 4
    Seriam exemplos da ideia de um “novo começo constitucional” – um cenário de transição política que, segundo Ackerman (1997)ACKERMAN, Bruce. The rise of world constitutionalism. Virginia Law Review. V.83, n.4, 1997., tenderia a estar associado a expansão do poder de tribunais constitucionais.
  • 5
    Segundo Stone Sweet (2012, p. 816), esse “novo constitucionalismo” que surge na Alemanha e se expande para o mundo nas décadas seguintes consiste em: “a model of democracy and state legitmacy that rejects the dogmas of legislative sovereignty, prioritizes fundamental rights, and requires a new mode of constitutional review.” Essa ênfase em direitos seria parte da reação “aos horrores do holocausto e à destruição da Segunda Guerra Mundial”, atingindo quase um status de “civic religion” em diversos países (p. 829). Apesar de sua popularidade, essa narrativa linear – do pós-guerra aos anos 90 – vem vendo problematizada. Ver Hailbronner (2015)HAILBRONNER, Michaela. Traditions and Transformations: The rise of the German Constitutional Court. Cambridge University Press, 2015..
  • 6
    Diversos dos elementos que configuram essa atuação acentuada do STF no cenário político começaram ser identificados nos anos 2000. Ver, nesse sentido, Vieira (2008)VIEIRA, Oscar. Supremocracia? Revista Direito GV, v. 4, n. 2, p. 441-464, jul.-dez. 2008..
  • 7
    O site do STF atribui a autoria do texto ao ministro Celso de Mello. Disponível em: <http://portal.stf.jus.br/hotsites/mincelsomello/ >. Acesso em 25/01/2021.
  • 8
    Ver, p. ex, Macedo (2017)MACEDO, Ronaldo Porto. Freedom of Expression: What should we learn from U.S. experience? Revista Direito GV, v. 13, n. 1, p. 274-302, 2017.; Ommati (2007)OMMATI, José Emílio. O Princípio da Proporcionalidade e a Constituição como Ordem Concreta de Valores, Revista de Direito Constitucional e Internacional, v. 15, n. 58, p.109-128, jan.-mar. 2007.; De Oliveira (2015)DE OLIVEIRA, Ygor. O STF e o ‘Caso Ellwanger’: a interferência dos fatores extralegais no processo de delimitação das decisões judiciais. Revista Brasileira de Direito, v. 11, n. 1, p. 46-56, 2015.; Sarlet (2013)SARLET, Ingo. Notas sobre a Dignidade da Pessoa Humana, os Direitos Fundamentais e a Assim Chamada Constitucionalização do Direito. Revista Brasileira de Ciências Criminais, p. 13-43, 2013.; Silva, De Oliveira e Rabelo (2011)SILVA, Adrian; DE OLIVEIRA, Felipe; RABELO, Victor. A Liberdade de Expressão na Constituição Federal de 1988 e no Supremo Tribunal Federal: uma Análise sobre o Caso Siegfried Ellwanger. Estudios constitucionales, v. 9, n. 2, p. 771-790, 2011.; Da Silva (2011).
  • 9
    Ver, sobretudo, Barroso (2005); para uma perspectiva crítica, ver Leal (2014)LEAL, Fernando. O formalista expiatório: leituras impuras de Kelsen no Brasil. Revista Direito GV, v.10, n.1, 2014..
  • 10
    Em reportagem no Valor Econômico no dia da posse do ministro Roberto Barroso, em 26.06.2013, Basile (2013)BASILE, Juliano. Posse no STF em dia de protesto consolida mudança de rota. Valor Econômico, 26 jun. 2013. Disponível em: < https://valor.globo.com/politica/coluna/posse-no-stf-em-dia-de-protesto-consolida-mudanca-de-rota.ghtml>. Acesso em: 17 set. 2020.
    https://valor.globo.com/politica/coluna/...
    observou que “a cerimônia [de posse] consolida um movimento que teve início na Corte há exatos dez anos, quando assumiram os ministros Joaquim Barbosa, Carlos Ayres Britto e Cezar Peluso. Desde a inédita tríplice posse no tribunal, em 25 de junho de 2003, o STF passou a deixar de lado as decisões tecnicistas para colocar em prática sentenças humanistas, mais próximas dos anseios da população.”
  • 11
    Citado em Recondo e Weber (2019)RECONDO, Felipe; WEBER, Luiz. Os Onze. Companhia das Letras, 2019., p. 171.
  • 12
    Artigo 5º, LXXI, Constituição Federal.
  • 13
    Republicado na Gazeta Mercantil de 6.10.1988 com o título “Arinos defende os políticos”. A referência de Mello Franco ao Mandado de Injunção repercutiu na imprensa (p.ex., Arinos alerta para risco de retrocesso. O Globo, p.6, 6 out. 1988)
  • 14
    Discurso de Ulysses Guimarães na Sessão de Promulgação da Constituição Federal.
  • 15
    Discurso de Ulysses Guimarães na Sessão de Promulgação da Constituição Federal.
  • 16
    As inovações que vão mudar a vida do país, O Globo, 6 out. 1988 (“Elaborados com base nas Constituições mais avançadas do Mundo, os direitos e garantias da nova Carta estabeleceram instrumentos revolucionários de defesa do cidadão, como o habeas data — que garante a qualquer pessoa acesso a informações mantidas sobre ela pelo Governo —, o mandado de segurança coletivo — que protege o cidadão dos abusos cometidos pelo poder público - e o mandado de injunção, que exige o cumprimento das normas constitucionais.”; Os novos direitos do cidadão brasileiro, Estado de São Paulo, p. 6, 06 out. 1988.
  • 17
    Sarney, destacou o mandado de injunção como um exigindo especificamente intervenção judicial para enfrentar a "auto-aplicabilidade de preceitos não muito definidos e claros", acrescentando que "nesse caso (...) a interpretação passa a ser do Supremo Tribunal Federal (STF) que terá, sem dúvida alguma, esta tarefa nova de interpretar a nova Constituição". Nova Carta recebe primeiros elogios, Jornal do Brasil, p. 2, 05 set. 1988.
  • 18
    Marcio Thomaz Bastos. A OAB e o segundo turno. Jornal de Brasília, 07 ago. 1988.
  • 19
    José Afonso da Silva. Mandado de Injunção: Direito do Cidadão, Jornal do Brasil, p. 9, 26 set. 1988; para outras avaliações do MI por juristas, ver p. ex. Eunice Nunes. Mandado de Injunção divide opiniões. Gazeta Mercantil, p. 31, 05 set. 1988.
  • 20
    Sociedade civil já se prepara para reclamar direitos na nova Carta, Jornal do Brasil, p. 4, 14 set. 1988, (“Tão logo a nova Constituição passe a vigorar, a CUT entrará com um mandado de injunção no Supremo Tribunal Federal exigindo que o salário mínimo passe a atender, realmente, às necessidades básicas do trabalhador, como alimentação, habitação, educação, saúde, transporte, lazer etc.”).
  • 21
    Gestante apela para o mandado de injunção, Correio Braziliense, p. 3, 11 nov. 1988.
  • 22
    Injunção é discutida no STF, O Estado de São Paulo, p. 6, 20 set. 1988; Miriam Lobardo. Mandado de injunção será avaliado pelo Tribunal Federal de Recursos: STF usa atribuição da nova carta. Gazeta Mercantil, p. 22, 14 out. 1988 [discussão sobre a taxa de juros de 12%]; Para Mayer, injunção exigirá jurisprudência. O Estado de São Paulo, p. 6, 4 out. 1988. (“Várias entidades já anunciaram que, logo após a promulgação, vão recorrer ao STF para garantir a aplicação de dispositivos, como o que fixa os juros em 12% ao ano”); Afinal, que leis já estão valendo?, Correio Braziliense, p. 5, 24 out. 1988, “Três semanas após a promulgação da nova Constituição, muitos brasileiros ainda se perguntam o que mudou efetivamente em suas vidas. Normas econômicas, direitos, garantias no campo individual e social se dividem em dispositivos que já valem — por serem autoaplicáveis —, ou que ainda aguardam leis complementares para entrarem em vigor. O cidadão, em meio a uma avalanche de pareceres técnicos e mandados judiciais, espera. Os habeas data e mandatos de injunção já valem, mas os direitos dos servidores públicos, por exemplo têm poucos dispositivos já vigorando”; Prática da carta exige 450 leis, O Globo, p. 8, 06 out. 1988 (“O novo sistema financeiro, a organização económica e vários dispositivos relativos aos Direitos Individuais e Sociais podem ser indefinidamente adiados, embora o mandado de injunção possa evitar esse problema em uns poucos casos, impedindo a repetição do que aconteceu com diversos dispositivos da inovadora Constituição de 1946, que foram prejudicados pela dependência de lei jamais elaboradas.”); Congresso precisa agir para garantir avanços, O Globo, p. 6, 06 out. 1988.
  • 23
    Para discussão de diferentes visões sobre o MI, ver Arguelhes e Ribeiro (2018).
  • 24
    MI 107.
  • 25
    Ver MI 2.058 (2014).
  • 26
    Para aplicações dessa ideia a diferentes aspectos do controle de constitucionalidade e da separação de poderes no Brasil, ver Arguelhes (2014); Arguelhes e Prado (2019); Arguelhes (2020)ARGUELHES, Diego Werneck. A palavra e o poder: o STF e a separação de poderes na jurisprudência de Celso de Mello. In: ARGUELHES, Diego; RECONDO, Felipe (orgs.). O Supremo de Celso de Mello: Trajetória, decisões e legado. Belo Horizonte: Letramento, 2020..
  • 27
    Ver ADI 2 (1992). Segundo Leite (2015), essa “jurisprudência restritiva e inflexível do STF [gerou] consequências negativas para a segurança acerca da adequação do ordenamento jurídico brasileiro com a Constituição da República”.
  • 28
    RE 197.807 (2000).
  • 29
    O processo não está disponível para consulta no site do STF. Informações obtidas nas reportagens: Ministro quer nova lei para transexual, Folha de São Paulo, 30 set. 1997; Silvana de Freitas. Recurso para mudança do nome de Roberta Close é negado no STF, Folha de São Paulo, 22 fev. 1997; Silvana de Freitas. Procuradoria é contra mudança oficial do nome de Roberta Close. Folha de São Paulo, 20 fev. 1997; Silvana de Freitas; Aureliano Biancarelli. STF vai julgar se Roberto pode ser Roberta. Folha de São Paulo, 16 fev. 1997.
  • 30
    Ministro quer nova lei para transexual, Folha de São Paulo, 30 set. 1997.
  • 31
    Há poucos trabalhos sistemáticos sobre a jurisprudência do tribunal nos anos 90, e é ainda mais raro encontrar trabalhos que enfoquem as decisões do STF sobre direitos fundamentais. Arantes (1997)ARANTES, Rogério Bastos. Judiciário e Política no Brasil. São Paulo: Idesp: Editora Sumaré; Fapesp; Educ, 1997. enfoca a atuação do tribunal sobre a política a partir de questões de separação de poderes, os limites do Poder Executivo e o desenho do controle de constitucionalidade. Embora direitos fundamentais apareçam em discussões envolvendo o Plano Collor (do problema do confisco em si à vedação de liminares), estão em segundo plano. Em si, a ausência de casos sobre direitos fundamentais em um livro sobre o tribunal e o processo político decisório já nos diz algo sobre a pauta do STF naquele momento. Para uma avaliação recente e mais geral das decisões do STF nesse período, ver Pereira (2016)PEREIRA, Jane Reis Gonçalves. “O Judiciário como impulsionador dos direitos fundamentais: entre fraquezas e possibilidades”. Revista da Faculdade de Direito da UERJ, n.29, jun.2016..
  • 32
    A primeira decisão do STF em que o tema gênero foi expressamente discutido foi tomada em 2003, mesmo ano de Ellwanger (Gomes, 2016). O caso (ADI 1946) envolvia uma emenda constitucional que fixava um teto para benefícios previdenciários, incluindo a licença-maternidade, com implicações negativas para a empregabilidade de mulheres.
  • 33
    RE 778.889 (2016). Tese: “Os prazos da licença adotante não podem ser inferiores ao prazo da licença gestante, o mesmo valendo para as respectivas prorrogações. Em relação à licença adotante, não é possível fixar prazos diversos em função da idade da criança adotada.” O único voto vencido foi o ministro Marco Aurélio.
  • 34
    ADI 4.275 (2018).
  • 35
    Ver, p. ex., o voto do Ministro Marco Aurélio no RE 760.422 (2013): “A dignidade da pessoa humana, princípio desprezado em tempos tão estranhos, deve prevalecer para assentar-se o direito do ser humano de buscar a integridade e apresentar-se à sociedade como de fato se enxerga. Solução diversa apenas reforça o estigma que conduz muitos cidadãos transgêneros à depressão, à prostituição e ao suicídio.”
  • 36
    Ver ADI 4.275 (2018), voto do Ministro Ricardo Lewandowski.
  • 37
    Livro desenterra nazismo no Sul, Estado de São Paulo, p. 16, 8 ago. 1991.
  • 38
    Livro desenterra nazismo no Sul, Estado de São Paulo, p. 16, 8 ago. 1991. Ver, p.ex., Leo Gerchmann. Editora Revisão é motivo de protestos em Feira do Livro. Folha de São Paulo, 11 out. 2000. (“Não é a primeira vez que os livros da Revisão e sua participação na feira despertam polêmica. Sempre que foi questionado, o escritor entrou na Justiça para garantir sua participação na feira, invocando a liberdade de expressão”); Punks atacam estande de editora, Folha de São Paulo, 09 nov. 2000. (“Um grupo de punks afastou a editora Revisão da Feira do Livro de Porto Alegre. A Revisão pertence ao escritor Siegfried Ellwanger, condenado judicialmente pela prática do anti-semitismo”); Cristina Grillo. Não somos nazistas, diz editor. Folha de São Paulo, 20 ago. 1997.
  • 39
    Embora o juízo da 8ª Vara Criminal de Porto Alegre tenha determinado a busca e apreensão de livros da editora Revisão ainda em 1992, Ellwanger foi absolvido na 1ª instância em 1995. Nesse ponto, o editor já tinha contra si um outro processo no TJSP – agora por injúria racial (art. 140, par. 3º do Código Penal), e não pela distribuição e comercialização de material com discriminação racial (Lei 7.716/89, em cujo artigo 20, caput a conduta de Ellwanger havia sido enquadrada). Ver Apelação 878.765/7, 8ª Câmara do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo.
  • 40
    Conforme informações da reportagem de Silvana Freitas. Por 8 a 3, STF mantém condenação de editor de livros. Folha de São Paulo, 18 set. 2003.
  • 41
    Ver, p.ex., Carlos Alberto de Souza. Editor acusa filme de farsa. Folha de São Paulo, 11 mar. 1994.
  • 42
    Ver, p.ex., reportagem de Cesar Giobbi. Racismo combatido. Estado de São Paulo, 12 nov. 1996. (“a decisão tem por base a Lei Afonso Arinos”). Artigos de membros da comunidade judaica discutem a absolvição de Ellwanger na primeira instância do TJRS (bem Abraham. Absolvição de Neonazista no RS.ABRAHAM, Ben. Absolvição de Neonazista no RS. Folha de São Paulo, São Paulo, 9 ago. 1995. Disponível em: < https://www1.folha.uol.com.br/fsp/1995/8/09/cotidiano/11.html>. Acesso em: 18 set. 2020.
    https://www1.folha.uol.com.br/fsp/1995/8...
    Folha de São Paulo, 9 ago. 1995; Helio Schwartman. Tolerar a Intolerância, Folha de São Paulo, 6 out. 1995; Israel Levin. O Ovo da Serpente no Brasil. Folha de São Paulo, 5 out. 1995.
  • 43
    A primeira tentativa de chegar ao STJ se deu em 1992, em recurso em Mandado de Segurança contra busca e apreensão determinadas pela juíza da 8ª Vara Criminal de Porto Alegre. O recurso foi extinto sem julgamento do mérito pela 5ª Turma, por intempestividade (RMS 4.121). A segunda tentativa foi um Recurso Especial em 1998 – mais uma vez sem sucesso, com os ministros da 5ª turma entendendo que o caso envolveria reexame de prova.
  • 44
    HC 15.155/RS (2001) Trecho do relatório do Min. Gilson Dipp: “[R]efere que o fato imputado ao paciente foi o de delito contra os judeus, que não teria conotação racial, nem seria derivado da prática de racismo, para ser tido como imprescritível, pois a definição de judeu como raça encontra sempre o veemente repúdio de toda a comunidade judaica, tanto pelos antropólogos judeus, pelos rabinos e pela sua intelectualidade (...). Aduz, por outro lado, que a norma constitucional que dispõe sobre a imprescritibilidade do crime de racismo refere-se, em última instância, ao segregacionismo derivado da cor, característico do racismo brasileiro, ressalvando ser inegável que o desejo do constituinte foi o de tornar imprescritíveis os crimes decorrentes da prática do racismo, em conformidade com as características do racismo imperante na sociedade brasileira. (...)”
  • 45
    Antecipando um argumento que apareceria no STF, o Ministro Jorge Scartezzini afirma que, nos escritos de Ellwanger, judeus são, sim, considerados de um ponto de vista racializado, ainda que essa não seja uma realidade biológica (p. 16-21 do acórdão).
  • 46
    Edson Vidigal discordou da tese de que o constituinte só teria previsto o crime de “racismo” de maneira restrita “[a]o preconceito direcionado às diferenças de raça, propriamente dita”; para o ministro, o dispositivo constitucional englobava “também todos os tipos de discriminação ilegal, seja em relação à religião, nacionalidade, regionalidade, aparência física etc.” Ainda assim, observou que, embora Ellwanger tivesse sido condenado por incitar racismo, a Constituição tornava imprescritível praticar racismo – o que Vidigal acreditava não ser o caso das publicações da editora “Revisão” (ver p. 26-27 do acórdão.). Foi a mesma linha do parecer do MP (p. 27 do acórdão).
  • 47
    AI-AgR 247.591 (2000).
  • 48
    Jack Terpins. Uma sentença exemplar. Folha de São Paulo, São Paulo, 11 abr. 2000 (“Há poucos dias, o Supremo Tribunal Federal tomou importante decisão: condenou Siegfried Ellwanger por crime de incitação ao racismo.”); Osias Wurman. Nazismo.com. O Globo, Rio de Janeiro, p. 7, 11 jun. 2000. Wurman assinou o texto como “jornalista”. Em artigo de janeiro de 2003, no mesmo jornal, sobre o HC de Ellwanger no STF, assinou como “jornalista e Presidente da Federação Israelita do Rio de Janeiro” (Osias Wurman. Ecos de Hitler, O Globo, p. 7, 24 jan. 2003.)
  • 49
    Editorial Nazista Condenado, Folha de São Paulo, 11 abr. 2000. Em reportagem no dia, a Folha observava que “Uma semana depois de ter sido condenado pelo Supremo Tribunal Federal por escrever e distribuir livros racistas, ele ainda vendia seus livros pela Internet.” (Nazismo: Editor ainda vende livros pela Internet. Folha de São Paulo, 11 abr. 2000.)
  • 50
    Entre 1988 e 2013, 2,2% dos processos tiveram pelo menos um pedido de vista (Falcão, Hartmann e Chaves, 2014FALCÃO, Joaquim; HARTMANN, Ivar; CHAVES, Vitor. III Relatório Supremo em Números – O Supremo e o Tempo. Rio de Janeiro: Escola de Direito do Rio de Janeiro da Fundação Getúlio Vargas, 2014.).
  • 51
    Para discussão do pedido de vista nesses termos, ver Arguelhes e Hartmann (2017).
  • 52
    Trata-se de trecho de obra de Karl Loewenstein, enfatizado pelo próprio ministro Moreira Alves em sua entrevista para o projeto História Oral do STF, p. 92-93.
  • 53
    Em sua entrevista para o projeto História Oral do STF (FGV Direito Rio), o Ministro se recorda de sua posição nestes termos: “E aí também, eu salientei novamente: portanto, não havia discriminação. Já que todos pertenciam à mesma raça, como é que eu posso discriminar de um para com outro? Mas afinal perdi por três votos. Eu tive dois votos que me seguiram, o do Ayres e o do Marco Aurélio. E perdi, justamente, considerando que judeu é raça. Então o problema foi esse.”, “Eu acho que crime, para ser racial, é preciso que haja discriminação racial. Em havendo discriminação racial, já acho até um exagero se considerar que é imprescritível. Acho um exagero. Mas não chego nem a isso. Eu fico na primeira parte. Não há discriminação e consequentemente não há crime.” (p. 38-39)
  • 54
    Segundo informações do site Consultor Jurídico, a primeira transmissão ao vivo foi no pedido de Intervenção Federal 2.915, em 14.08.2002 (Débora Pinho. Justube: O dia em que nasceu a TV Justiça. Consultor Jurídico,29 out. 2009).
  • 55
    Além de Sydney Sanches e Moreira Alves, aposentou-se em 2003 o ministro Ilmar Galvão, indicado por Fernando Collor. Ingressaram no STF Cezar Peluso, Carlos Ayres Britto e Joaquim Barbosa – primeiro ministro negro indicado ao tribunal, que não votaria em Ellwanger por ter ingressado na cadeira de Moreira Alves.
  • 56
    HC 82.424 (2003), p. 580-581.
  • 57
    HC 82.424 (2003), p 594.
  • 58
    É aqui que surge o conflito entre Alves e Corrêa – com Corrêa criticando Alves por não prestar atenção em seu voto, e Alves afirmando que o voto de Corrêa “praticamente segue a linha de fundamentação do parecer” de Lafer. Ministros batem boca durante julgamento de editor, Folha de São Paulo, 10 abr. 2003. A reportagem narra em detalhes a briga: “Aparentemente magoado com o surgimento da dissidência, Alves acusou Corrêa de ter copiado o parecer elaborado pelo ex-ministro das Relações Exteriores e professor de direito da Universidade de São Paulo Celso Lafer. "O senhor foi descortês comigo", disse Corrêa. Alves reagiu: "Diga-me uma frase que comprove a descortesia. Vou sair daqui a dias. Estou há 27 anos no tribunal. Nenhum colega nunca me disse que sou descortês." Em seguida, Corrêa completou: "Vossa Excelência deu tanta importância a meu voto que passou o tempo todo conversando". Alves retrucou: "Isso aqui não é uma casa de vaidade". O bate-boca prosseguiu e só terminou porque o ministro Marco Aurélio de Mello, presidente do tribunal, interrompeu a sessão.”
  • 59
    HC 82.424 (2003), p. 611.
  • 60
    O STF e o Racismo, Folha de São Paulo, 8 jun. 2003. (“A decisão desse julgamento tem um significado que vai muito além de punir um editor e seu crime de racismo. O que está em causa é a capacidade do Estado brasileiro de fazer valer a proteção constitucional dos direitos das minorias. Além do racismo arraigado contra os afrodescendentes, a decisão do STF, se seguir a clara indicação de Maurício Corrêa, diz respeito ao enfrentamento de outras formas de discriminação sistemática, de que também são alvo os homossexuais, os povos indígenas e as mulheres”).
  • 61
    O STF e o Racismo, Folha de São Paulo, 8 jun. 2003.
  • 62
    Werner Becker. Uma questão meramente jurídica. Folha de São Paulo, 26 jun. 2003.
  • 63
    Werner Becker. Uma questão meramente jurídica. Folha de São Paulo, 26 jun. 2003.
  • 64
    HC 82.424 (2003), p. 574.
  • 65
    Essa ideia reflete o que Müller chama de “acordo constitucional do pós-guerra” (2011, p. 146-150). De um ponto de vista interno ao discurso dos juristas europeus, ver Commella (2009).
  • 66
    HC 82.424 (2003), p.633.
  • 67
    HC 82.424 (2003), p.623.
  • 68
    HC 82.424 (2003), p.623 e p.620, respectivamente. Na p.620, também se lê: “É esse, pois, o grande desafio com que nós, Juízes da Suprema Corte deste País, nos defrontamos no âmbito de uma sociedade democrática: extrair, das declarações internacionais e das proclamações constitucionais de direitos, a sua máxima eficácia (...).”
  • 69
    HC 82.424 (2003), p. 614.
  • 70
    HC 82.424 (2003), p. 615.
  • 71
    HC 82.424 (2003), p. 616.
  • 72
    Ver, p. ex., Barak (2015); Dupré (2003).
  • 73
    HC 82.424 (2003), p. 619.
  • 74
    HC 82.424 (2003), p.944-945.
  • 75
    É possível e necessário problematizar a adoção, por juízes e acadêmicos em países do Sul Global, de um discurso de direitos forjado na Europa do pós-guerra e reconfigurado em transições de antigos países socialistas. Ver, nesse sentido, os artigos reunidos em Dann, Bönnemann e Riegner (2020). Além disso, pode-se interrogar as relações entre a consolidação do discurso dos direitos e transformações na economia política global nos anos 80 (Moyn, 2017MOYN, Samuel. Not Enough: Human Rights in an unequal world. Yale University Press, 2017.).
  • 76
    Ver Kelsen (1942KELSEN, Hans. Judicial Review of Legislation: a comparative study of the Austrian and American Constitution. Journal of Politics, v. 4, n. 2, p. 183-200, 1942.); Rakove (1995RAKOVE, Jack. The origins of judicial review: a plea for new contexts. Stanford Law Review, v. 49, n. 5, p. 1031-1064, 1995.).
  • 77
    Mais do que uma concepção sobre o papel do tribunal constitucional, essa é também uma narrativa sobre a Constituição. Nessa perspectiva, “mais do que as peculiaridades do processo político nacional que levou a sua promulgação, o que interessa é a sua semelhança com diversas outras constituições promulgadas no período após o fim da Segunda Guerra Mundial, inserindo-a em um movimento transnacional. A Constituição brasileira seria mais uma manifestação concreta do desse novo constitucionalismo” (Pereira, 2016PEREIRA, Jane Reis Gonçalves. “O Judiciário como impulsionador dos direitos fundamentais: entre fraquezas e possibilidades”. Revista da Faculdade de Direito da UERJ, n.29, jun.2016.). Nessa perspectiva, Stone Sweet (2000) registra a mudança de discursos de legitimação de tribunais constitucionais, cada vez menos preocupados com “separação de poderes” e cada vez mais concentrados em mostrar que protegem direitos de maneira mais eficaz do que outras instituições.
  • 78
    HC 82.424 (2003), p. 620.
  • 79
    HC 82.424 (2003), p. 926.
  • 80
    No seu discurso de posse, Mello observou que a importância do papel judicial na proteção a direitos crescia “se considerarmos que, pela primeira vez, o Estado brasileiro a partir desse notável e histórico Programa Nacional de Direitos Humanos, elaborado pelo Governo do eminente Presidente Fernando Henrique Cardoso-assume compromissos graves e necessários no plano da tutela e proteção contra os abusos, as iniqüidades e as exclusões sociais.
  • 81
    Discurso do ministro Celso de Mello na posse de Marco Aurélio na presidência do STF, p. 28.
  • 82
    HC 82.424 (2003), p. 876.
  • 83
    Em sua entrevista para o História Oral do STF, Moreira Alves registrou que, com seu sobrenome, provavelmente seria um “Cristão novo (...)Possivelmente, no século XVII, seria jogado numa fogueira. Considerar-se que eu estou contra os judeus...” (p. 102).
  • 84
    Celso Lafer. Racismo – O STF e o Caso Ellwanger. Estado de São Paulo, p. A2, 20 jul. 2003.
  • 85
    Um voto a favor do racismo, Estado de São Paulo, p. A3, 7 set. 2003.
  • 86
    Mariângela Galucci. Ex-petista faz crescer ‘minoria’ no STF. Estado de São Paulo, p. A14, 28 set. 2003.
  • 87
    A frase de Corrêa é citada nas reportagens STF decide que antissemitismo é racismo, Estado de São Paulo, p. A12, 18 set. 2003. Rodrigo Rangel. STF nega habeas corpus a acusado de racismo. O Globo, p. 9, 18 set. 2003
  • 88
    Foram analisadas as entrevistas dos ministros José Carlos Moreira Alves, Célio Borja, Marco Aurélio, Francisco Rezek, Néri da Silveira, Sydney Sanches, Carlos Mário Velloso, Ilmar Galvão, Paulo Brossard, José Paulo Sepúlveda Pertence. No momento de elaboração deste trabalho, Celso de Mello e Ellen Gracie (que estavam no tribunal antes de depois de Ellwanger) ainda não haviam sido entrevistados.
  • 89
    Entrevista do Ministro Moreira Alves para História Oral do STF, p. 45.
  • 90
    Entrevista do Ministro Néri da Silveira para História Oral do STF, p. 107.
  • 91
    Entrevista do Ministro Marco Aurélio para História Oral do STF, p. 45.
  • 92
    Para os ministros que participaram dos julgamentos envolvendo o impeachment de Collor, o roteiro da entrevista os incluía expressamente; da mesma forma, ministros que participaram de Ellwanger foram perguntados sobre o caso. Assim, a comparação deste caso com os outros temas, nesses termos, fica prejudicada.
  • 93
    Nesse sentido, a leitura de Gomes (2020)GOMES, Juliana. Celso de Mello, liberdade e processo: o legado de um relator bissexto para os direitos fundamentais. In ARGUELHES, Diego; RECONDO, Felipe (orgs.). O Supremo de Celso de Mello: Trajetória, decisões e legado. Belo Horizonte: Letramento, 2020. sobre a jurisprudência de direitos do ministro Celso de Mello pode ajudar a entender a posição geral do STF nos anos 90: um tribunal de garantia de procedimentos, que protegia direitos como resultado dessa função maior.
  • 94
    Ver Velloso (2003)VELLOSO, Carlos. A Evolução da Interpretação dos Direitos Fundamentais no Supremo Tribunal Federal. In: SAMPAIO, José (org.). Jurisdição constitucional e direitos fundamentais. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 347-383.. No texto, há a informação de que se trata de palestra proferida em 2001. Os casos são basicamente dos anos 90.
  • 95
    Aqui, por exemplo, Velloso destaca a jurisprudência do STF sobre a extensão e procedimentos da garantia constitucional do sigilo bancário – que, embora o ministro conecte o direito à privacidade de forma mais ampla, aparece basicamente em decisões em que o indivíduo é réu ou investigado de alguma forma, isto é, em contextos de repercussão penal. O ministro registra um caso que dividiu o Supremo (6x5) quanto a esse tema, quanto à aplicabilidade da reserva de jurisdição para afastar sigilo bancário invocado pelo Banco do Brasil para não revelar os beneficiários de certos empréstimos públicos subsidiados.
  • 96
    “[L]ouvo a atitude máscula do Procurador-Geral da República (...), ao fazer a representação a esta Corte, buscando a intervenção federal para o fim de efetivar proteção aos direitos da pessoa humana. (...) Conheço, pois, da representação. Enfrento-lhe o mérito. (...) [S]e tem, no caso, um fato que, não obstante lamentável, que chega a nos envergonhar, é um fato isolado e que está sendo apurado pelas autoridades estaduais, conforme deu notícia o eminente Relator. O indeferimento, no caso, da medida patológica da intervenção federal, é o que se recomenda.”
  • 97
    Artigo 34, VII, “b”, Constituição Federal.
  • 98
    Observando que “a maior preocupação dada ao STF aos temas envolvendo direitos fundamentais é um fenômeno relativamente recente”, Pereira (2016PEREIRA, Jane Reis Gonçalves. “O Judiciário como impulsionador dos direitos fundamentais: entre fraquezas e possibilidades”. Revista da Faculdade de Direito da UERJ, n.29, jun.2016., p.132) observa que a atuação do tribunal nos anos 90 foi marcada pelo que chama de “direito da burocracia”.
  • 99
    Juliano Basile. Posse no STF em dia de protesto consolida mudança de rota. Valor Econômico, 26 jun. 2013.
  • 100
    Celso Lafer. A boca e a língua do justo. Estado de São Paulo, 6 dez. 2013.
  • 101
    Até hoje, é o único acórdão do tribunal que foi publicado sob a forma de livro, poucos meses após o julgamento. (SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Crime de Racismo e Anti-semitismo: um julgamento histórico do STF (Habeas Corpus n. 82.424). Brasília: Brasília Jurídica, 2004).

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    » http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm
  • BRASIL. 8ª Câmara do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo, Apelação 878.765/7.
  • BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (5ª turma). Habeas Corpus 15.155/RS. Relator Ministro Gilson Dipp. Brasília, 11 dez. 2001
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Reportagens não-assinadas e editoriais:

  • Afinal, que leis já estão valendo?, Correio Braziliense, Brasília, p. 5, 24 out. 1988.
  • Arinos alerta para risco de retrocesso. O Globo, Rio de Janeiro, p. 6, 6. out.1988.
  • Arinos defende os políticos. Gazeta Mercantil, São Paulo, p. 6, 6 out. 1988.
  • As inovações que vão mudar a vida do país, O Globo, Rio de Janeiro, 6 out. 1988
  • Congresso precisa agir para garantir avanços, O Globo, Rio de Janeiro, p. 6, 06 out. 1988.
  • Nazista Condenado, Folha de São Paulo, 11 abr. 2000. Disponível em: < https://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz1104200003.htm>. Acesso em: 18 set. 2020.
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  • Gestante apela para o mandado de injunção, Correio Braziliense, Brasília, n. 9339, p. 3, 11 nov. 1988.
  • Injunção é discutida no STF, O Estado de São Paulo, São Paulo, n. 34838, p. 6, 20 set. 1988.
  • Livro desenterra nazismo no Sul, Estado de São Paulo, p. 16, São Paulo, 8 ago. 1991.
  • Ministro quer nova lei para transexual, Folha de São Paulo, São Paulo, 30 set. 1997. Disponível em: < https://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff300929.htm>. Acesso em: 18 set. 2020. (“O STF negou recurso ajuizado por ela, por uma falha de caráter processual”).
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  • Ministros batem boca durante julgamento de editor, Folha de São Paulo, São Paulo, 10 abr. 2003. Disponível em: < https://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u53526.shtml>. Acesso em: 18 set. 2020.
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  • O STF e o Racismo, Folha de São Paulo, São Paulo, 8 jun. 2003. Disponível em: <https://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz3003200409.htm>. Acesso em: 18 set. 2020.
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  • Nazismo: Editor ainda vende livros pela Internet. Folha de São Paulo, São Paulo, 11 abr. 2000. Disponível em: < https://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc1104200033.htm>. Acesso em: 18 set. 2020.
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  • Nova Carta recebe primeiros elogios, Jornal do Brasil, p. 2, 05 set. 1988.
  • Os novos direitos do cidadão brasileiro, Estado de São Paulo, São Paulo, 06 out. 1988.
  • Para Mayer, injunção exigirá jurisprudência. O Estado de São Paulo, São Paulo, n. 34850, p. 6, 4 out. 1988.
  • Prática da carta exige 450 leis, O Globo, Rio de Janeiro, p. 8, 06 out. 1988.
  • Preso é libertado em São Paulo. O Estado de São Paulo, São Paulo, 06 out. 1988.
  • Punks atacam estande de editora, Folha de São Paulo, São Paulo, 09 nov. 2000. Disponível em: <https://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq0911200016.htm>. Acesso em: 18 set. 2020.
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  • STF decide que antissemitismo é racismo, Estado de São Paulo, São Paulo, p. A12, 18 set. 2003. RANGEL, Rodrigo.
  • Sociedade civil já se prepara para reclamar direitos na nova Carta, Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, p. 4, 14 set. 1988.
  • STF nega habeas corpus a acusado de racismo. O Globo, Rio de Janeiro, p. 9, 18 set. 2003.
  • Um voto a favor do racismo, Estado de São Paulo, São Paulo, p. A3, 7 set. 2003.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Set 2022
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2022

Histórico

  • Recebido
    25 Set 2020
  • Aceito
    20 Jan 2021
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