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Acesso ao ensino superior: efetividade normativa das cotas socioeconômicas

Access to higher education: normative effectiveness of socioeconomic quotas

Resumo

Ações afirmativas são medidas especiais e temporárias que visam a reduzir desigualdades e a garantir oportunidades a sujeitos em situação de vulnerabilidade. Uma delas consiste em reservar vagas em universidades a alunos provenientes de escolas públicas. O objetivo deste artigo é avaliar se esse modelo de ação possui efetividade normativa no âmbito da Faculdade de Direito da UERN e mapear experiências nesse sentido. Trata-se de estudo de caso, com relevância acadêmica, jurídica e social, ao contribuir com o debate acerca do tema, avaliar políticas públicas e impactar na vida institucional. Fruto de pesquisa exploratória, bibliográfica e documental, método dedutivo e abordagem quantitativa, constata que, considerando o universo pesquisado, os ingressantes cotistas concluem o curso de Direito em igual prazo quando comparados com os não cotistas. Assim, essa ação afirmativa tem se revelado efetiva ao atender as expectativas geradas pela lei instituidora, garantindo o ingresso e a formação jurídica de modo equitativo a pessoas de menor poder aquisitivo.

Palavras-chave:
Ações afirmativas; Cotas socioeconômicas; Efetividade normativa

Abstract

Affirmative actions are special and temporary measures that aim to reduce inequalities and guarantee opportunities for vulnerable individuals. One of them is to reserve spots at universities for students from public schools. The purpose of this article is to assess whether this action model has normative effectiveness within the scope of the Faculty of Law of UERN (Rio Grande do Norte, Brazil) and to map experiences in this regard. It is a case study, with academic, legal and social relevance, as it contributes to the debate on the theme, evaluates social policies and impacts on institutional life. As a result of an exploratory, bibliographic and documentary research, deductive method and quantitative approach, finding out that, considering the area analyzed, quota students complete the Law course in the same period when compared to non-quota students. Thus, this affirmative action has been shown to be effective to meet the expectations generated by the instituting law, guaranteeing entry and training in an equitable manner to people with less acquisition power.

Keywords:
Affirmative Actions; Socioeconomic quotas; Normative effectiveness

1 Introdução

De acordo com a narrativa oficial, ações afirmativas1 1 Além do termo ação afirmativa, Haas e Linhares (2012, p. 843) apresentam expressões que são frequentemente usadas como sinônimos para designar o termo ação afirmativa, a saber: “política de cotas, políticas compensatórias, política de reparação, política de promoção de igualdade, política antirracista, ou ainda, política de engajamento, política da diversidade ou política do multiculturalismo”. são “medidas especiais e temporárias, tomadas pelo Estado e/ou pela iniciativa privada, espontânea ou compulsoriamente, com o objetivo de eliminar desigualdades historicamente acumuladas” (BRASIL, 1996, p. 10). Elas visam a garantir uma igualdade tanto de oportunidades quanto de tratamento a determinados grupos sociais e, com isso, compensar perdas provocadas pela discriminação e marginalização, sejam por questões de cunho racial, étnico, socioeconômico, de gênero, entre outras formas de discriminação.

Dentro das modalidades e critérios das ações afirmativas figuram as cotas socioeconômicas, consistentes em garantir percentual de vagas a pessoas em situação de vulnerabilidade social e/ou econômica para ingresso no ensino superior, cujo critério mais frequente tem sido a vinculação do público-alvo à rede pública de ensino. Essa modalidade de ação afirmativa parte do pressuposto de que alunos e alunas que cursam ensino fundamental e médio nas escolas públicas têm, em geral, menor acesso aos conhecimentos necessários aos exames para ingresso na educação superior e, por isso, merecem um tratamento diferenciado.

O objetivo deste artigo é, então, analisar a efetividade normativa das cotas socioeconômicas, previstas na Lei Estadual do Rio Grande do Norte nº 8.258, de 27 de dezembro de 2002, no âmbito da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN), Campus Mossoró, e mapear experiências institucionais semelhantes. O que é feito a partir de um diálogo entre autores e análise de documentos, além do levantamento e avaliação de dados obtidos junto a instâncias oficiais. Para isso, adotamos o método dedutivo, com procedimento bibliográfico e documental, finalidade exploratória e pesquisa de natureza básica, segundo uma abordagem quantitativa.

Na primeira parte, fizemos uma revisão da literatura contemporânea sobre a temática das cotas para fins de ingresso nos cursos de graduação das universidades brasileiras, buscando sempre construir reflexões vinculadas ao contexto das ações afirmativas. Além disso, procuramos analisar as legislações pertinentes e seus respectivos marcos jurídicos-normativos no âmbito das universidades dos estados nordestinos, com exceção de Sergipe2 2 Até a conclusão deste artigo, não existia universidade estadual ou municipal no estado de Sergipe, por isso, ele não foi incluído no presente estudo. , para a identificação dos procedimentos adotados pelas instituições.

Na segunda parte, lançamos o olhar para a Faculdade de Direito da UERN, a fim de avaliar a efetividade normativa das cotas socioeconômicas naquela unidade de ensino. Nesse caso, a estratégia metodológica principal consistiu em levantar informações junto à Diretoria de Admissão, Registro e Controle Acadêmico (DIRCA) sobre a quantidade de ingressantes e de concluintes antes e depois da lei instituidora do sistema de cotas, a fim de avaliar se, com a implementação do sistema de cotas, houve ou não alteração significativa quanto ao tempo de conclusão do curso e atendimento às expectativas geradas pela legislação que institui essas cotas.

2 Ações afirmativas e acesso ao ensino superior: doutrina, legislação aplicada e experiências

Neste tópico, apresentamos, primeiramente, uma revisão da literatura contemporânea sobre as ações afirmativas através de pesquisa bibliográfica e documental, de natureza básica, abordando, em linhas gerais, contexto histórico das ações afirmativas, definições e conceitos, natureza jurídica e enquadramento constitucional, além de analisar a sua incorporação no ordenamento jurídico brasileiro, buscando sempre relacioná-las ao contexto das instituições de ensino superior. Num segundo momento, identificamos, por meio de mapeamento quali-quantitativo, as legislações aplicadas, as experiências e os marcos jurídico-normativos das cotas no âmbito das instituições de ensino superior dos estados nordestinos.

2.1 Ações afirmativas na literatura

A discussão sobre igualdade jurídica começou após as revoluções do final do século XVIII. Nesse período, prevalecia majoritariamente o conceito jurídico de que “todos são iguais perante a lei”, devido à concepção formalista, genérica e abstrata sobre a construção jurídica de igualdade. Para o contexto jurídico-liberal da época, bastaria apenas a positivação como direito fundamental para que a igualdade tivesse sua eficácia assegurada no ordenamento jurídico (GOMES, 2001GOMES, Joaquim B. Barbosa. A recepção do instituto da ação afirmativa pelo direito constitucional brasileiro. Revista de Informação Legislativa, v. 38, n. 151, p. 129-152, 2001. Disponível em: https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/705/r151-08.pdf. Acesso: 5 mar. 2020.
https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstrea...
, p. 130).

Entretanto, essa concepção puramente formalista não se revelou satisfatória na prática, pois ficou evidenciado que a igualdade de direitos perante a lei não era, por si só, suficiente para tornar acessíveis determinados direitos e oportunidades a pessoas socialmente desfavorecidas (DRAY, 1999DRAY, Guilherme Machado. O Princípio da Igualdade no Direito do Trabalho: sua aplicabilidade no domínio específico da formação de contratos individuais de trabalho. Coimbra: Almedina, 1999, 332p.). Era necessária, para tanto, uma postura afirmativa e isonômica das instituições para promoção de uma igualdade substancial, também chamada de igualdade material3 3 “[...] Produto do Estado Social de Direito, a igualdade substancial ou material propugna redobrada atenção por parte do legislador e dos aplicadores do Direito à variedade das situações individuais e de grupo, de modo a impedir que o dogma liberal da igualdade formal impeça ou dificulte a proteção e a defesa dos interesses das pessoas socialmente fragilizadas e desfavorecidas” (GOMES, 2001, p. 131). .

Na mudança de paradigma jurídico-social pós Segunda Guerra Mundial, foram elaboradas novas iniciativas e programas para evitar que a discriminação, que inegavelmente tem um fundo histórico e cultural, finde por perpetuar as iniquidades sociais, seja em questões de mercado ou, até mesmo, na regulação do acesso ao ensino superior público. Devido às reivindicações dos movimentos sociais, principalmente dos movimentos negros, os países tiveram de adotar “[...] melhorias de condições de vida da população negra, eliminando leis segregacionistas e estipulando mecanismos que pudessem, com o passar do tempo, amenizar o largo hiato socioeconômico existente entre negros e brancos” (MOEHLECKE, 2003, p. 198).

Neste contexto, surge o termo ação afirmativa que, de acordo com Moehlecke (2003), tem origem nos Estados Unidos, na década de 1960, como fruto das profundas reivindicações que aconteciam à época, quando se pleiteava igualdade de oportunidades a todos, principalmente no mercado de trabalho daquele país. Lá existiam leis de cunho segregacionista, que através da luta dos progressistas e liberais e, principalmente, dos movimentos negros, foram deixando de existir. Em resposta a essa queda das legislações de segregação, tornou-se necessária a existência de mecanismos que viessem a garantir materialmente que a igualdade alcançasse de fato a todos.

Desde então, as ações afirmativas expandiram-se para além dos Estados Unidos4 4 De acordo com Gomes (2001), ações afirmativas foram, inicialmente, idealizadas como meios tendentes a resolver problemas quanto a marginalização social e econômica do negro na sociedade dos Estados Unidos. Posteriormente, essas medidas foram ampliadas às mulheres, a outras minorias étnicas e nacionais, como os índios e as pessoas com deficiência. , marcando sua presença em países da América, África, Ásia e Europa, onde o termo foi intitulado de ação ou discriminação positiva. Em 1982, a ação afirmativa chegou a figurar no Programa para a Igualdade de Oportunidades, da Comunidade Econômica Europeia. Destacamos que, apesar de terem origens voltadas para um contexto racial dos Estados Unidos5 5 No contexto estadunidense, as cotas no ensino superior iniciaram-se na década de 1960, durante o governo do presidente John Kennedy, que propôs a inclusão dos negros nas Universidades. Por meio dessa primeira experiência de inclusão universitária, contatou-se um aumento expressivo no número de jovens negros ingressantes no ensino superior daquele país (POLETTO; EFROM; RODRIGUES, 2020). , as ações afirmativas também se estendem a outros grupos de caráter étnico, de gênero e socioeconômico em diversos países (MOEHLECKE, 2003).

No Brasil, as primeiras discussões e manifestações quanto às políticas afirmativas também são centradas nos aspectos da discriminação racial contra pessoas negras, que deram origem a uma série de reivindicações sociais, principalmente do Movimento Social Negro na década de 1990, vejamos:

[n]o Brasil, a marcha organizada pelo Movimento Social Negro, realizada em 20 de novembro de 1995 em Brasília, pela comemoração do tricentenário de Zumbi dos Palmares, reivindicava do Estado ações efetivas para a redução das desigualdades raciais. Essa era a postura da militância nos meados da década de 1990 (SANTOS, SOUZA, SASAKI, 2013SANTOS, Hélio; SOUZA, Marcilene Garcia de; SASAKI, Karen. O subproduto social advindo das cotas raciais na educação superior do Brasil. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, Brasília, v. 94, n. 237, p. 542-563, ago. 2013. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2176-66812013000200010&lng=en&nrm=iso. Acesso: 01 mar. 2020.
http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
, p. 547).

Em decorrência das provocações desses movimentos sociais e da expansão das medidas compensatórias no mundo, o Ministério da Justiça do Brasil reconheceu a necessidade de adotar ações e políticas específicas para garantir e assegurar melhores condições no acesso aos serviços públicos à população negra e menos favorecida (BRASIL, 1996). Nesse período, iniciaram-se debates em grupos de trabalhos interministeriais com representantes da sociedade civil, que elaboraram um dos primeiros conceitos oficiais sobre ação afirmativa no Brasil, definindo-as como:

[...] medidas especiais e temporárias, tomadas pelo Estado e/ou pela iniciativa privada, espontânea ou compulsoriamente, com o objetivo de eliminar desigualdades historicamente acumuladas, garantindo a igualdade de oportunidade e tratamento, bem como de compensar perdas provocadas pela discriminação e marginalização, por motivos raciais, étnicos, religiosos, de gênero e outros. (BRASIL,1996, p. 10).

Entre as definições e enquadramentos jurídicos-normativos das ações afirmativas presentes no Brasil, destacamos os conceitos trazidos por Rocha (1996ROCHA, Carmem Lúcia Antunes. Ação afirmativa - O conteúdo democrático do princípio da igualdade jurídica. Revista de Informação Legislativa, Brasília, v. 33, p. 283-295, 1996.), Gomes (2001GOMES, Joaquim B. Barbosa. A recepção do instituto da ação afirmativa pelo direito constitucional brasileiro. Revista de Informação Legislativa, v. 38, n. 151, p. 129-152, 2001. Disponível em: https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/705/r151-08.pdf. Acesso: 5 mar. 2020.
https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstrea...
) e Piovesan (2005PIOVESAN, Flávia. Ações afirmativas da perspectiva dos direitos humanos. Caderno de Pesquisa, São Paulo, v. 35, n. 124, p. 43-55, jun/abr., 2005. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-15742005000100004&lng=em&nrm=iso. Acesso: 08 out. 2019.
http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
), respectivamente:

[...] é concebida como uma forma para se promover a igualdade daqueles que foram e são marginalizados por preconceitos encravados na cultura dominante na sociedade. Por esta desigualação positiva promove-se a igualação jurídica efetiva; por ela afirma-se uma fórmula jurídica para se provocar uma efetiva igualação social, política, econômica no e segundo o Direito, tal como assegurado formal e materialmente no sistema constitucional democrático. A ação afirmativa é, então, uma forma jurídica para se superar o isolamento ou a diminuição social a que se acham sujeitas as minorias. (ROCHA, 1996ROCHA, Carmem Lúcia Antunes. Ação afirmativa - O conteúdo democrático do princípio da igualdade jurídica. Revista de Informação Legislativa, Brasília, v. 33, p. 283-295, 1996., p. 88).

As ações afirmativas se definem como políticas públicas (e privadas) voltadas à concretização do princípio constitucional da igualdade material e à neutralização dos efeitos da discriminação racial, de gênero, de idade, de origem nacional e de compleição física. Na sua compreensão, a igualdade deixa de ser simplesmente um princípio jurídico a ser respeitado por todos, e passa a ser um objetivo constitucional a ser alcançado pelo Estado e pela sociedade (GOMES, 2001GOMES, Joaquim B. Barbosa. A recepção do instituto da ação afirmativa pelo direito constitucional brasileiro. Revista de Informação Legislativa, v. 38, n. 151, p. 129-152, 2001. Disponível em: https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/705/r151-08.pdf. Acesso: 5 mar. 2020.
https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstrea...
, p. 132).

[...] como poderoso instrumento de inclusão social situam-se as ações afirmativas. Elas constituem medidas especiais e temporárias que, buscando remediar um passado discriminatório, objetivam acelerar o processo com o alcance da igualdade substantiva por parte de grupos vulneráveis, como as minorias étnicas e raciais e as mulheres, entre outros grupos” (PIOVESAN, 2005PIOVESAN, Flávia. Ações afirmativas da perspectiva dos direitos humanos. Caderno de Pesquisa, São Paulo, v. 35, n. 124, p. 43-55, jun/abr., 2005. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-15742005000100004&lng=em&nrm=iso. Acesso: 08 out. 2019.
http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
, p. 49).6 6 Piovesan (2005, p. 48-49) destaca que, no âmbito do Direito Internacional dos Direitos Humanos, existem duas formas de combater a discriminação: a primeira, é a forma repressiva e punitiva, objetivando “punir, proibir e eliminar a discriminação”; a segunda, é a forma promocional, “que tem por objeto promover, fomentar e avançar a igualdade”. Para a autora, “[f]az-se necessário combinar a proibição da discriminação com políticas compensatórias que acelerem a igualdade enquanto como processo. Isto é, para assegurar a igualdade não basta apenas proibir a discriminação, mediante legislação repressiva. São essenciais as estratégias promocionais capazes de estimular a inserção e inclusão de grupos socialmente vulneráveis nos espaços sociais”.

Desse modo, pelas definições apresentadas, consideramos que as ações afirmativas representam um aprimoramento jurídico de uma sociedade em que suas leis se pautam pelo princípio da igualdade de oportunidades na competição entre os indivíduos. Nesse sentido, “[...] é necessário e justificável a desigualdade de tratamento trazida pela ação afirmativa no acesso aos bens e aos meios”, pois essa diferenciação é uma forma de restituir tal igualdade, estabelecendo, por isso, caráter temporário à ação, dentro de um âmbito e fim restrito (GUIMARÃES, 1997GUIMARÃES, Antônio S. A. A Desigualdade que anula a desigualdade: notas sobre a ação afirmativa no Brasil. In: SOUZA, J. (org.). Multiculturalismo e racismo: uma comparação Brasil-Estados Unidos. Brasília: Paralelo 15, 1997, p.233-242., p. 233).

Somado a isso, as ações afirmativas também cumprem finalidade pública decisiva para o projeto democrático, pois asseguram a diversidade e a pluralidade social. Essas medidas viabilizam o direito à igualdade, no sentido de se moldar no respeito à diferença e à diversidade. Destarte, torna-se possível, por meio delas, transitar-se da igualdade meramente formal para a igualdade material e substancial (PIOVESAN, 2005PIOVESAN, Flávia. Ações afirmativas da perspectiva dos direitos humanos. Caderno de Pesquisa, São Paulo, v. 35, n. 124, p. 43-55, jun/abr., 2005. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-15742005000100004&lng=em&nrm=iso. Acesso: 08 out. 2019.
http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
, p. 50).

De tal modo, consideramos que, no ordenamento jurídico brasileiro, a mens legis evidencia que a ação afirmativa é medida urgente e necessária, inclusive, com respaldo tanto jurídico, seja nos objetivos e valores da Constituição Federal de 19887 7 Dentre os objetivos, frisamos: construir uma sociedade livre, justa e solidária; erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (BRASIL, 1988). por meio da previsão da igualdade material e ações afirmativas para os grupos socialmente vulneráveis, seja nos tratados internacionais em que o Brasil é signatário.

Por outro lado, destacamos que,

[...] não obstante o fato de que a garantia da igualdade esteja formalmente assegurada na Constituição Federal, assim como a garantia constitucional da dignidade humana e da liberdade igual para todos, são muitos os indivíduos, independentemente de raça, cor, sexo ou credo, que permanecem sem ter acesso às oportunidades mínimas em termos de educação, trabalho, política, saúde, enfim, acesso ao exercício pleno da cidadania, e são deixados à margem da convivência social e da experiência de participação numa sociedade democrática (HAAS; LINHARES, 2012HAAS, Célia Maria; LINHARES, Milton. Políticas públicas de ação afirmativa para admissão em ensino superior são justificadas no Brasil? Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos. Brasília, v. 93, n. 235, p. 836-863, 2012. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2176-66812012000400015&lng=en&nrm=iso. Acesso: 01 mar. 2020.
http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
, p. 849).

No âmbito da literatura brasileira, segundo Machado e Malgadi (2016MACHADO, Carla Silva; MAGALDI, Carolina Alves. Sistema de cotas, trajetórias educacionais e assistência estudantil: por uma educação inclusiva. Revista Eletrônica de Educação, Juiz de Fora/MG, v. 10, n. 2, p. 273-285, 2016. Disponível em: https://doaj.org/article/0a3133a1e7de4701bad2aae511c64610?gathStatIcon=true. Acesso: 01 mar. 2020.
https://doaj.org/article/0a3133a1e7de470...
), o debate em torno das cotas nas universidades públicas ganhou visibilidade a partir dos anos 2000, quando a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e a Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF) adotaram o sistema de cotas por força de lei estadual, instituindo as cotas sociais por meio da Lei Estadual nº 3.524/2000 e, posteriormente, as cotas raciais com a Lei Estadual nº 3.708/2001.

De acordo com Guarnieri e Melo-Silva (2017GUARNIERI, Fernanda Vieira; MELO-SILVA, Lucy Leal. Cotas Universitárias no Brasil: Análise de uma década de produção científica. Psicol. Esc. Educ., Maringá, v. 21, n. 2, p. 183-193, ago. 2017. Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-85572017000200183&lng=en&nrm=iso. Acesso: 18 mar. 2020.
http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
), a UERJ implementou seu primeiro programa de cotas em 2003, dando origem a um período de grandes especulações acerca das consequências desses programas no Brasil, ao mesmo tempo em que também outras universidades estaduais foram incorporando o sistema de cotas ao processo seletivo vigente.

Após a instituição das cotas no Estado do Rio de Janeiro, a medida difundiu-se por vários estados brasileiros e o Distrito Federal, chegando ao estado do Rio Grande do Norte, na UERN. O processo de crescimento foi rápido e significativo nas universidades brasileiras, como destaca Guarnieri e Melo-Silva (2017GUARNIERI, Fernanda Vieira; MELO-SILVA, Lucy Leal. Cotas Universitárias no Brasil: Análise de uma década de produção científica. Psicol. Esc. Educ., Maringá, v. 21, n. 2, p. 183-193, ago. 2017. Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-85572017000200183&lng=en&nrm=iso. Acesso: 18 mar. 2020.
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):

[o] primeiro Programa de Cotas brasileiro foi implementado em 2003 pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ). Desde então, a quantidade de universidades que aderiram ao programa de cotas foi ascendendo rapidamente em um curto período. De 2003 a 2005, 14 universidades aderiram às Cotas, sendo que em 2006 esse número chegou a 43, e em 2010 já somavam 83 instituições de ensino superior com cotas (GUARNIERI, 2008 apud GUARNIERI; MELO-SILVA, 2017, p. 184).

Com o passar dos anos, outras instituições de ensino superior brasileiras foram adotando estas políticas afirmativas em suas respectivas regionalidades: umas por iniciativa própria, outras por força de lei. O processo de implantação das ações afirmativas nas universidades estaduais foi se consolidando por meio de leis estaduais e resoluções de conselhos universitários e os debates sobre o assunto também se intensificaram com o decorrer dos anos (POLETTO; EFROM; RODRIGUES, 2020POLETTO, Daniela Basso; EFROM, Cora; RODRIGUES, Maria Beatriz. Ações Afirmativas no Ensino Superior: revisão quantitativa e qualitativa de literatura. Educare, Heredia, v. 24, n. 1, p. 292-325, abr. 2020 . Disponível em: http://www.scielo.sa.cr/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1409-42582020000100292&lng=en&nrm=iso. Acesso: 1 jun. 2020.
http://www.scielo.sa.cr/scielo.php?scrip...
).

No início, havia uma maior adesão por parte das instituições às cotas de natureza socioeconômica ante as cotas de cunho étnico-racial, o que, segundo estudos, enfraqueceu a questão racial reivindicada por grupos sociais racializados. De acordo com Valentim (2012), o fator socioeconômico das ações afirmativas enfraquece a questão racial porque as cotas direcionadas a estudantes de escola pública são mais presentes do que aquelas voltadas aos estudantes negros, critério baseado numa pertença racial. Portanto, havendo uma resistência da comunidade universitária na aceitação desse segundo grupo como público-alvo beneficiário dessa política.

Conforme Daflon, Feres Júnior e Campos (2013DAFLON, Verônica Toste; FERES JÚNIOR, João; CAMPOS, Luiz Augusto. Ações afirmativas raciais no ensino superior público brasileiro: um panorama analítico. Cadernos de Pesquisa. 2013, vol. 43, n. 148, p. 302-327. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0100-15742013000100015&script=sci_abstract&tlng=pt. Acesso: 15 fev. 2020.
https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S01...
), há uma grande heterogeneidade de critérios para as políticas afirmativas no Brasil, o que culmina em implicações negativas sobre a aceitação dos critérios étnico-raciais, pois as questões socioeconômicas costumam ser mais aceitas como critérios de inclusão8 8 Cabe frisar que, “[a]s diferentes percepções acerca das desigualdades no Brasil se consubstanciaram em desenhos distintos de políticas de ação afirmativa. Se em um conselho universitário ou assembleia legislativa prevaleceu o entendimento de que as desigualdades mais importantes no Brasil são de renda e classe e que as desigualdades raciais daí derivam, isso se traduziu em uma política que visava exclusivamente aos alunos de escola pública ou de baixa renda, isto é, à ação afirmativa foi atribuído o papel de contribuir para solucionar desigualdades sociais. Acreditou-se que, ao contemplar os alunos pobres, seriam atingidos também os alunos pretos e pardos, uma vez que estes se encontram mais concentrados no segmento social focalizado pela política” (DAFLON; FERES JÚNIOR; CAMPOS, 2013, p. 323). .

Em vista disso, em 2010, várias discussões começaram a se desenvolver em torno da (in)constitucionalidade das cotas étnico-raciais. Tais discussões deram origem à Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 186 no Supremo Tribunal Federal (STF), que tratou de questionamentos acerca da constitucionalidade da reserva de 20% das vagas para estudantes negros no sistema de cotas raciais na Universidade de Brasília (UnB)9 9 Dentre as principais críticas às cotas nas discussões da ADPF nº 186 no STF, destacaram-se os seguintes argumentos: “inexistência biológica das raças; caráter ilegítimo das ações de “reparação” aos danos causados pela escravidão em tempo presente; risco de acirrar o racismo no Brasil; possibilidade de manipulação estatística da categoria “parda”; inviabilidade de identificação racial em um país mestiço; a questão da pobreza como determinante da exclusão social”. No que se refere aos argumentos favoráveis às políticas discutidos no STF, concentraram-se na discussão sobre a constitucionalidade das cotas: a relevância para o país, intervenção estatal “como fundamental diante dos quadros de desigualdade raciais remanescentes de fenômenos sociais que precisam ser enfrentados; destacando-se que as “ações afirmativas” atuariam como alternativa para a busca de igualdade através da promoção de condições equânimes entre brancos e negros” e avanço do pluralismo nas diversas instituições nacionais (GUARNIERI; MELO-SILVA, 2017, p. 185). . A discussão reverberou em todo o país e logo foi tida como divisora de águas nas políticas compensatórias no Brasil, vez que foi declarada pela Suprema Corte a conformidade das ações afirmativas à Constituição Federal de 1988 (GUARNIERI; MELO-SILVA, 2017GUARNIERI, Fernanda Vieira; MELO-SILVA, Lucy Leal. Cotas Universitárias no Brasil: Análise de uma década de produção científica. Psicol. Esc. Educ., Maringá, v. 21, n. 2, p. 183-193, ago. 2017. Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-85572017000200183&lng=en&nrm=iso. Acesso: 18 mar. 2020.
http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
).

Dois anos depois, no ano de 2012, foi aprovada no Congresso Nacional a Lei Federal nº 12.711, conhecida como Lei das Cotas10 10 Segundo Poletto, Efrom e Rodrigues (2020, p. 5), “[...] a Lei 12.711/2012 [...] colocou em discussão temas polêmicos e por tanto tempo relegados ao ostracismo na realidade brasileira. Não somente o racismo, como também a desigualdade social e de oportunidades entre estudantes provenientes de diferentes estratos sociais. Para os apoiadores, as mudanças no acesso ao ensino superior refletem em benefícios em outras esferas: desde direitos humanos, até razões mais práticas, de tipo econômico e de novas possibilidades de desenvolvimento social, sem falar, na superação e prevenção da pobreza e marginalização”. , que tornou obrigatória a reserva de 50% das vagas de cada curso e turma nas instituições de ensino superior federais para estudantes egressos de escolas públicas, com subcotas para pretos, pardos e indígenas (BRASIL, 2012). Com esse novo marco normativo no Brasil, a realidade das ações afirmativas no ensino superior do país se consolidou em todo o território nacional.

Desse modo e sob esse paradigma “de estabilidade e relativa homogeneidade legal, os interesses de pesquisa começam a se voltar para os critérios de avaliação e desempenho das políticas, o que é em si um desenvolvimento muito positivo” (DAFLON; FERES JÚNIOR; CAMPOS, 2013DAFLON, Verônica Toste; FERES JÚNIOR, João; CAMPOS, Luiz Augusto. Ações afirmativas raciais no ensino superior público brasileiro: um panorama analítico. Cadernos de Pesquisa. 2013, vol. 43, n. 148, p. 302-327. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0100-15742013000100015&script=sci_abstract&tlng=pt. Acesso: 15 fev. 2020.
https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S01...
, p. 324-325).

Por último, as medidas adotadas legalmente pelas universidades públicas, de maneira geral, representaram e ainda representam um passo importante para democratização e inclusão da temática de ações afirmativas nas instituições de ensino superior, assim como colaboraram para a expansão do ingresso de segmentos e grupos sociais que não tinham tanta participação e expressividade nos espaços de formação educacional do Brasil (SOUSA; SILVA, 2019SOUSA, Francisco Cavalcante; SILVA, Francisca Paloma Lima. Cotas sociais na Universidade: um estudo sobre a aplicação das Ações Afirmativas na Faculdade de Direito da UERN Câmpus Central. Revista para Graduandos / IFSP (REGRASP), v. 4, p. 67-86, 2019. Disponível em http://seer.spo.ifsp.edu.br/index.php/regrasp/article/view/309. Acesso: 30 jan. 2020.
http://seer.spo.ifsp.edu.br/index.php/re...
).

Nesse sentido, percebemos que, através desse longo histórico da incorporação das ações afirmativas no Brasil e no mundo, é também importante compreender as legislações vigentes aplicadas às universidades estaduais, que não são regidas pela Lei Federal das cotas, com vistas a evidenciar as diferentes experiências afirmativas nessas instituições.

2.2 Legislação aplicada e mapeamento de experiências

Para delimitar o campo de investigação da presente pesquisa, optamos por realizar um mapeamento quantitativo das experiências universitárias no âmbito das instituições de ensino superior vinculadas à Associação Brasileira dos Reitores das Universidades Estaduais e Municipais (ABRUEM) na região Nordeste do Brasil.

Esse recorte se fez necessário tendo em vista o propósito de mapear as legislações aplicadas e as experiências próprias dos estados e das universidades estaduais e analisar o “estado da arte” das ações afirmativas na região, destacando suas peculiaridades, contextos e características. A escolha pelas universidades estaduais da região Nordeste, como contexto de investigação nesta pesquisa, justifica-se pelo fato de delimitar o campo de análise das ações afirmativas e identificar os conteúdos jurídicos e marcos normativos que regem essas políticas em âmbito regional, possibilitando fazer comparações e paralelos entre os casos pesquisados, sobremodo com a realidade da UERN e da respectiva Faculdade de Direito.

No que se refere à implementação e aos modelos de cotas para ingresso nos cursos de graduação analisadas neste trabalho, as ações afirmativas das universidades estaduais vinculadas à ABRUEM foram classificadas com base na região brasileira onde estão localizadas. Com isso, foi possível fazer comparações sobre a aplicação das cotas nos diferentes contextos macrorregionais e, em certa medida, identificar a influência de fatores culturais, sociais, étnicos, educacionais e/ou políticos na elaboração e implementação dessas políticas nas universidades selecionadas para este estudo.

Em Alagoas, as ações afirmativas para ingresso no ensino superior são regulamentadas pela Lei Estadual nº 6.542, de 7 de dezembro de 2004, que estabeleceu a reserva de vagas nas universidades públicas destinadas a alunos egressos da rede pública de ensino. Na prática, essa legislação aplica-se à Universidade Estadual de Alagoas (UNEAL) e à Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas (UNCISAL). Essa lei alagoana determina a reserva de 50% das vagas nas universidades estaduais daquele estado para candidatos que concluíram o Ensino Fundamental II, a saber do 6º ao 9º ano, e o ensino médio integral, do 1º ao 3º ano, em escolas públicas (ALAGOAS, 2004).

Na Bahia, a Lei Estadual nº 13.182, de 6 de junho de 2014, que instituiu o Estatuto da Igualdade Racial e de Combate à Intolerância Religiosa naquele estado (BAHIA, 2014), exerceu forte influência na discussão legislativa estadual e corroborou para a elaboração de políticas afirmativas com vistas ao ingresso no ensino superior em quatro universidades.

A Universidade do Estado da Bahia (UNEB)11 11 A UNEB tem, em sua estrutura administrativa, a Pró-Reitoria de Ações Afirmativas (PROAF), responsável pela coordenação geral, supervisão e avaliação do processo permanente de institucionalização da política universitária de ações afirmativas, através da proposição e/ou desenvolvimento, fomento, acompanhamento e normatização das atividades, programas e projetos de inclusão, de promoção da igualdade, de garantia da equidade e de justiça social no âmbito da comunidade universitária. A PROAF desenvolve programas de ações afirmativas que buscam promover práticas de equidade, indistintamente, a todas as diversidades: étnicas, raciais, culturais, de gênero, de geração/faixa etária, de inserção territorial-geográfica, de condições físicas e/ou históricas desvantajosas e outras, que compõem o quadro de estudantes, professores e servidores técnicos e administrativos nos diversos departamentos da Universidade. Disponível em: <https://portal.uneb.br/proaf/>. Acesso em 17 jul. 2020. , por meio da Resolução nº 1.339/2018, regulamentou uma série de modalidades de ações afirmativas destinadas a candidatos que, cumulativamente, tenham cursado todo o Ensino Fundamental II e o Ensino Médio exclusivamente em escola pública, com renda bruta familiar mensal inferior ou igual a quatro salários-mínimos e que não possua título de graduação, exceto para ingresso no processo seletivo de pós-graduação. Do total de vagas ofertadas pela universidade, 40% devem ser reservadas, obrigatoriamente, para candidatos autodeclarados negros (UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA, 2018).

Além disso, a UNEB adota o sistema de sobrevagas, de modo a reservar 5% delas para candidatos indígenas, 5% para candidatos quilombolas, 5% para candidatos ciganos, 5% para candidatos com deficiência, transtorno do espectro autista ou altas habilidades e, por fim, 5% para candidatos(as) transexuais, travestis ou transgêneros. O objetivo da universidade com esse marco normativo é “promover a diversidade de gênero, a eqüidade étnico-racial e a inclusão no ensino superior” (UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA, 2018).

Ainda na Bahia, a Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS) reserva 50% das vagas para candidatos que tenham cursado todo o ensino médio e pelo menos quatro anos letivos do Ensino Fundamental em instituições públicas. Essa modalidade de cota social é destinada a quem não possui título de graduação e para candidato com renda familiar bruta per capita igual ou inferior a 1,5 salário mínimo. Do total de vagas na cota social, 80% deverão ser ocupadas por candidatos que se autodeclararem negros (pretos e pardos) oriundos de escola pública e 20% das vagas para candidatos não negros. No sistema de sobrevagas, é destinada uma para cada um dos seguintes grupos: povos indígenas aldeados, ciganos, quilombolas referendados por suas comunidades, candidatos com deficiência e, também, para candidatos transexuais, travestis ou transgêneros (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE FEIRA DE SANTANA, 2019)12 12 Somado a isso, a UEFS, por meio da Pró-Reitoria de Ações Afirmativas e Assuntos Estudantis (PROAAE), tem como missão propor, planejar e acompanhar as Políticas de Ações Afirmativas no âmbito da Universidade Estadual de Feira de Santana visando atender a comunidade universitária; planejar, implementar, coordenar, e consolidar Programas de Assistência Estudantil que visem ampliar condições para a permanência, prioritariamente, para as (os) estudantes de graduação em situação de vulnerabilidade social e/ou integrante de comunidades tradicionais historicamente excluídos do ensino superior com vistas a contribuir para a promoção social pela educação e planejar, implementar, coordenar, e consolidar as ações de apoio aos estudantes e às entidades estudantis. Disponível em: <http://www.propaae.uefs.br/>. Acesso 17 jul. 2020. .

De modo semelhante, a Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC) destina cota social de 50% das vagas de cada curso e em cada turno para estudantes que tenham cursado todo o Ensino Médio e os últimos quatro anos do Ensino Fundamental em escola pública. E, destas, 75% são destinadas aos estudantes que se autodeclararem negros. Além das vagas estabelecidas, duas sobrevagas são destinadas a indígenas reconhecidos pela Fundação Nacional do Índio (FUNAI) ou a moradores de comunidades remanescentes de quilombos, desde que tenham cursado o Ensino Fundamental II e o Ensino Médio integralmente em escolas públicas (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE SANTA CRUZ, 2011).

Por último, a Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB) destina 50% das vagas para ação afirmativa, sendo 30% destas ocupadas por candidatos autodeclarados pretos ou pardos que estudaram todo o ensino fundamental II e todo o ensino médio na rede pública. Por meio de vestibular tradicional, a UESB destina uma cota adicional para candidato com deficiência, uma para candidato indígena e uma para candidato quilombola (UNIVERSIDADE ESTADUAL DO SUDOESTE DA BAHIA, 2016).

No Ceará, o marco normativo das cotas é a Lei Estadual nº 16.197, de 17 de janeiro de 2017, que dispõe sobre a instituição do Sistema de Cotas nas Instituições de Ensino Superior naquela unidade da federação por um período de dez anos. Sob a vigência dessa lei, as universidades estaduais cearenses ficam obrigadas a adotarem mecanismos afirmativos na composição de seus candidatos no vestibular (CEARÁ, 2017).

A Universidade Estadual do Ceará (UECE) reserva 50% de suas vagas para os estudantes que, simultaneamente, concluíram o ensino médio regular em escolas públicas municipais ou estaduais situadas no estado do Ceará, além de serem economicamente carentes. A UECE adota cota étnico-racial com base no número de pretos, pardos e indígenas do Estado, ficando reservadas 4,65% das vagas para pretos, 61,88% para pardos e 0,23% das vagas para indígenas dentro do percentual da cota social. Ainda são ofertadas 3% de suas vagas da ampla disputa para pessoas com deficiência (CEARÁ, 2017).

De maneira mais abrangente, a Universidade Regional do Cariri (URCA) destina 50% das vagas de todos os cursos e turnos para as cotas sociais e étnico-racial, sendo distribuídas da seguinte forma: a) 32% das vagas destinadas para estudantes que cursaram integralmente o Ensino Médio em escolas públicas federais, estaduais ou municipais com funcionamento no Estado do Ceará e com renda familiar bruta igual ou inferior a 1,5 salário mínimo per capita; b) 68% das vagas são destinadas para estudantes que cursaram integralmente o Ensino Médio em escolas públicas federais, estaduais ou municipais com funcionamento no Estado do Ceará e com renda familiar bruta igual ou inferior a 1,5 salário mínimo per capita, que se autodeclararem pretos, pardos ou indígenas. Destaca-se que 30% das vagas da ampla concorrência na URCA são para os candidatos autodeclarados negros, pardos, indígenas ou pertencentes a comunidades quilombolas, ou seja, que não apresentam os requisitos legais específicos e/ou que não desejam participar da reserva legal de vagas da cota socioeconômica e 10% das vagas da ampla concorrência são para pessoas com deficiência (CEARÁ, 2017).

A Universidade Vale do Acaraú (UVA) destina 50% de suas vagas para os candidatos que tenham concluído o ensino médio em escolas públicas situadas no estado do Ceará e sejam economicamente carentes, ou seja, oriundos de família com renda mensal igual ou inferior a 1,5 salário-mínimo per capita. Assim como a UECE, adota os mesmos percentuais referente a cota étnico-racial com base no número de pretos, pardos e indígenas do Ceará e 3% de suas vagas da ampla disputa para pessoas com deficiência, em cumprimento à Lei Estadual (CEARÁ, 2017).

O Maranhão dispõe da Lei Estadual nº 9.295, de 17 de novembro de 2010, que institui Sistema Especial de Reserva de Vagas na Universidade Estadual do Maranhão (UEMA), para os estudantes oriundos de comunidades indígenas e estudantes negros (MARANHÃO, 2010). A UEMA, através da Lei Estadual e das Resoluções nº 1.250/2017 e nº 1.314/2018, reserva 10% das vagas para candidatos e candidatas negros e negras de comunidades indígenas, desde que eles e elas tenham cursado o ensino médio exclusivamente em escolas públicas (UNIVERSIDADE ESTADUAL DO MARANHÃO, 2018).

Na Paraíba, a Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) reserva 50% das vagas destinadas a candidatos que tenham cursado integralmente as três séries do Ensino Médio em escolas da rede pública e que não tenham concluído curso de graduação. Além disso, esta universidade reserva 5% das vagas para pessoas com deficiência (UNIVERSIDADE ESTADUAL DA PARAÍBA, 2014).

Em Pernambuco, a Universidade de Pernambuco (UPE) condiciona 20% de suas vagas para serem ocupadas por estudantes que tenham cursado integral, exclusiva e regularmente todo o Ensino Fundamental II e Ensino Médio em escolas da rede pública estadual ou municipal, nos termos da Resolução nº 015/2010 alterada pela Resolução nº 017-A/2013 (UNIVERSIDADE DE PERNAMBUCO, 2013).

No Piauí, a Universidade Estadual do Piauí (UESPI) destina 30% das vagas para as políticas de cotas, sendo 15% reservadas para candidatos que cursaram ensino fundamental e médio em escolas públicas. Além disso, são reservadas 15% das vagas da cota social para candidatos negros também oriundos de escolas públicas (UNIVERSIDADE ESTADUAL DO PIAUÍ, 2008).

No Rio Grande do Norte, a primeira experiência com as políticas afirmativas consistiu no sistema de cotas socioeconômicas na UERN, através da Lei Estadual nº. 8.258, de 27 de dezembro de 2002 (RIO GRANDE DO NORTE, 2002), ao estabelecer reserva de vagas nas universidades públicas estaduais para alunos egressos da rede pública de ensino. Em seguida, foram instituídas ações afirmativas voltadas para pessoas com deficiência, mediante a Lei Estadual nº 9.696, de 25 de fevereiro de 2013 (RIO GRANDE DO NORTE, 2013).

A Lei Estadual nº 10.480, de 25 de janeiro de 2019, revogou as Leis de nº 8.258/2002 e 9.696/2013, reordenou todo o sistema de ações afirmativas para fins de ingresso na UERN, preservou o critério socioeconômico e instituiu novo critério de cota social, qual seja, o étnico-racial. Ademais, criou o argumento de inclusão regional nos processos seletivos de vagas iniciais, destinado a candidatos egressos da rede pública de ensino do Rio Grande do Norte (RIO GRANDE DO NORTE, 2019).

Com o novo marco normativo, passaram a existir duas cotas na UERN: (i) a social, subdividida em dois tipos: a) aquela apoiada em critérios socioeconômicos, destinada a candidatos que tenham cursado integralmente os ensinos fundamental e médio em escolas públicas; e b) aquela assentada em critérios étnico-raciais, direcionada a candidatos autodeclarados pretos, pardos ou indígenas. Para a cota social devem ser reservadas, pelo menos, 50% das vagas, e destas 58% devem ser destinadas a candidatos autodeclarados pretos, pardos ou indígenas, conforme indicadores apontados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE); e (ii) para pessoas com deficiência comprovada por profissional cadastrado pelo Sistema Único de Saúde (SUS), reservando-se, nesse caso, 5% das vagas.

A partir desse diagnóstico, podemos verificar que as experiências apontam no sentido de que as ações afirmativas nas universidades estaduais da região Nordeste estão relacionadas a critérios majoritariamente socioeconômicos e de origem escolar. Apenas os estados de Alagoas, Ceará, Maranhão e Rio Grande do Norte possuem leis estaduais próprias para disciplinar a adoção de políticas afirmativas em instituições de ensino superior (ALAGOAS, 2008; CEARÁ, 2017; MARANHÃO, 2010; RIO GRANDE DO NORTE, 2019).

Das universidades nordestinas analisadas, com base no critério regional adotado nesta pesquisa, percebemos que 14 (100%) delas adotam ação afirmativa baseada em critérios socioeconômicos e/ou de origem escolar (“cota social”, “cota socioeconômica” ou “cota por origem escolar”) em seus processos de ingressos nos cursos de graduação. As cotas étnico-raciais, em que se destinam a “grupos minoritários”, estão presentes em 10 (71,44%) das universidades analisadas quando direcionadas a pretos e pardos e, em 9 (64,28%) quando consideradas os candidatos de comunidades indígenas. Já as modalidades de ações afirmativas para pessoas com deficiência estão presentes em 8 (57,14%) universidades. Quatro instituições nordestinas adotam cotas para quilombolas (28%) e 2 (14,28%) para travestis, transsexuais e transgêneros.

Nessa perspectiva, cabe enfatizar as contribuições de Daflon, Peres Júnior e Campos (2013DAFLON, Verônica Toste; FERES JÚNIOR, João; CAMPOS, Luiz Augusto. Ações afirmativas raciais no ensino superior público brasileiro: um panorama analítico. Cadernos de Pesquisa. 2013, vol. 43, n. 148, p. 302-327. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0100-15742013000100015&script=sci_abstract&tlng=pt. Acesso: 15 fev. 2020.
https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S01...
, p. 323) ao afirmarem que “a avaliação dos procedimentos adotados pelas universidades revela uma grande heterogeneidade de experiências que é expressão de diferentes leituras da natureza das desigualdades sociais e raciais no Brasil”. Além disso, a variação das modalidades de políticas revela diferentes identificações de público-alvo, como egressos de escola pública, negros, indígenas, pessoas com deficiência, cotas regionalizadas, alunos de baixa renda, quilombolas, como também revela diferentes critérios de inserção, não só com as cotas, mas também com cotas e acréscimo de vagas (ou sobrevagas), bônus, cotas e bônus, acréscimo de vagas, bônus e acréscimo de vagas.

Por meio do levantamento, identificamos que a maioria das universidades nordestinas analisadas instituem as ações afirmativas através de resoluções administrativas regidas pelos Conselhos Universitários, o que acaba por tornar essas instâncias institucionais em verdadeiras “arenas de disputas” quanto à implementação e avaliação das políticas afirmativas13 13 Em muitos dos casos, os Conselhos Universitários, enquanto espaços de poder no campo acadêmico, acabam dando direção às políticas de ações afirmativas no âmbito das universidades, tornando-se "arena de disputas". De acordo com Batista (2015), em um estudo na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, "essa característica faz desse órgão, através da representação de segmentos sociais, uma arena de disputas por modelos de justiça social para a Educação Superior. Todavia, o acesso aos instrumentos legítimos de expressão e, portanto, a participação no quinhão da autoridade institucional, organiza-se a partir de uma hierarquia institucional cujo resultado, quase sempre, resulta em desigualdade na representação de segmentos nos atos decisórios (BATISTA, 2015, p. 120). . Com exceção dos estados de Alagoas, Ceará, Maranhão e Rio Grande do Norte, que instituíram leis nos respectivos ordenamentos estaduais para regulamentar as ações afirmativas.

Posto esse contexto, percebemos que a falta de lei estadual própria, na maioria dos estados analisados, promove discricionariedade e autonomia para as gestões universitárias deliberarem pela implementação ou não das ações afirmativas, embora susceptíveis a temporalidades de mandatos e subjetividades políticas dos respectivos membros dos conselhos deliberativos e consultivos das universidades14 14 Assim, “[...] os processos internos de demandas pelas políticas variaram muito caso a caso. Em algumas universidades, os movimentos sociais locais passaram a se organizar em reivindicações específicas; em outras, a organização de docentes dentro do campus foi decisiva; em outras, ainda, os núcleos de estudo afro-brasileiros já existentes passaram a ter maior voz; por último, ações inicialmente isoladas de profissionais que passaram a questionar a falta de diversidade em suas universidades foram decisivas para levar a cabo o programa” (PAIVA; ALMEIDA, 2010, p. 86 apud DAFLON; FERES JÚNIOR; CAMPOS, 2013, p. 308-309). . Desse modo, a composição temporária de um conselho universitário, por exemplo, pode levar ao avanço ou ao retrocesso das ações afirmativas, gerando insegurança institucional e jurídica.

Podemos concluir, portanto, que a elaboração de leis estaduais confere maior segurança jurídica, estabilidade institucional e maior homogeneidade normativa para formulação, aplicação e eficácia das ações afirmativas nas instituições de ensino superior. Com os estudos sobre as universidades nordestinas, percebemos que é exatamente como acontece nos estados de Alagoas, Ceará, Maranhão e Rio Grande do Norte, onde as políticas afirmativas são regidas por leis próprias, uma vez que estão ancoradas em legislações mais estáveis nos ordenamentos estaduais. No Rio Grande do Norte, a legislação estadual disciplinou a reserva de vagas para ingresso nos cursos da UERN, conforme analisamos no item seguinte por meio de estudo de caso sobre a Faculdade de Direito.

3 Universidade e inclusão: a efetividade da cota socioeconômica na faculdade de direito da UERN

Neste tópico, faremos a análise da efetividade da cota socioeconômica no âmbito da Faculdade de Direito da UERN. Será feita a uma explanação acerca do objeto escolhido, a forma e amplitude do recorte metodológico, bem como as motivações que levaram à escolha desse recorte. É neste ponto que é realizado também o descerramento dos dados obtidos e levantados na Diretoria de Admissão, Registro e Controle Acadêmico (DIRCA), órgão responsável por consolidar os dados sobre ingressantes e concluintes na UERN.15 15 A Diretoria de Admissão, Registro e Controle Acadêmico (DIRCA), vinculada à Pró-Reitoria de Ensino de Graduação (PROEG), é o órgão responsável pelo registro e controle dos atos acadêmicos do/a discente de graduação na UERN, desde a entrada na instituição até o momento da Colação de Grau. Compete a essa Diretoria a emissão oficial de dados referentes ao ensino de graduação, atendendo à Reitoria, às Pró-Reitorias, Faculdades, Campi e Departamentos, bem assim a pesquisadores e pesquisadoras e à sociedade em geral (UERN, 2019).

3. 1 Delimitação do objeto

Depois de observar realidades normativas e experiências institucionais voltadas às cotas para ingresso nas universidades públicas na região Nordeste, agora analisamos o grau de efetividade na implantação dessa política na UERN, nos termos da Lei nº 8.258, de dezembro de 2002 (RIO GRANDE DO NORTE, 2002).

Para isso, levantamos os dados de ingresso e conclusão regular, antes e depois da implantação dessa lei, enfatizando a realidade da Faculdade de Direito16 16 O curso de Direito da UERN foi criado pela Resolução nº 10/1976, do Conselho Universitário (CONSUNI), e teve sua primeira turma iniciada no ano de 1977 (UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO GRANDE, 1976). , localizada em Mossoró, por se qualificar sui generis para esse tipo de análise, devido a algumas características dessa unidade de ensino.

Na perspectiva histórica, os cursos de Direito no Brasil foram implementados no século XIX com a pretensão de atender à elite político-econômica nacional e nem sempre estavam conectados com a realidade (NOGUEIRA, 2020NOGUEIRA, Jailson Alves. Regulação da educação jurídica: os cursos jurídicos e possibilidades estratégicas para seu fortalecimento. In: JALES, Andrea Maria Pedrosa Silva. Regulação democrática: princípios constitucionais, regime-jurídico administrativo e participação popular. Mossoró: EDUERN, 2020.). Tanto que se criou o tratamento de “Doutor”, a ser conferido aos formados nesse curso, por uma lei imperial de autoria de Dom Pedro I17 17 Existe divergência sobre a validade dessa lei. Embora exista o entendimento de que esta lei não é mais válida, há compreensão divergente. Há o posicionamento de que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) teria revogado o decreto imperial de 1827 ao dispor sobre as formas existentes de obter o título de Doutor. Em contraponto a essa ideia, os defensores de que bacharéis em Direito são doutores, defendem que o título de Doutor mencionado no Decreto Imperial é de natureza “honorífica”, enquanto o que é mencionado na Lei de Diretrizes e Bases da educação é de natureza acadêmica, sendo, portanto, distintos entre si (MONTEIRO, 2014). Há ainda quem se contraponha, dizendo que a interpretação do Decreto como sendo ainda válido é um erro de hermenêutica, baseado em dois pontos. Seria um equívoco a interpretação de forma anacrônica do decreto sem levar em conta as mudanças que aconteceram, e em segundo plano, que a própria lei diria que o título seria obtido em segunda etapa, após defesa de teses, que seria apresentadas em Congregação, e demandaria da aprovação de todos os professores para tal feito (GUIMARÃES, 2016). Mas, por fim, há aqueles que sustentam que a tradição também é fonte de Direito e que o uso do termo Doutor para juristas remonta a tempos ainda mais antigos, com alguns registros que datam desde o século XII, ou ainda mais antigos como as menções bíblicas aos chamados “Doutores da Lei” (MONTEIRO, 2014). (BRASIL, 1827). Na própria sociedade se consolidou esse tratamento, de maneira informal, ainda que as pessoas nem conhecessem a lei. Esse quadro formatou a ideia de que o curso de Direito era o predileto da classe dominante e economicamente abastada, e praticamente inacessível às pessoas das classes populares.

Além do mais, o Curso de Direito possui sempre uma das maiores notas de corte no Sistema de Seleção Unificada (SISU)18 18 Sites voltados para auxiliar postulantes às vagas universitárias trazem informações de que o curso de Direito é um dos que atingem as notas de corte mais altas no SISU (BLOG DO ENEM, 2020; GUIA DA CARREIRA, 2020; MUNDO VESTIBULAR, 2020). Tais informações são aglutinadas com o tratamento que é dado pela mídia (FALCONERY, VIANA, 2020; TRIBUNA DO NORTE, 2019), bem como informações divulgadas pelo próprio Ministério da Educação - MEC comprovam esse fato (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 2015). , por isso alguns o consideram “de elite”, um dos favoritos da população mais rica. Isso leva a uma dificuldade para ingresso de alunos de menor poder aquisitivo e oriundos da rede pública de ensino, de forma a demandar, com maior atenção, uma ação afirmativa, conforme alertam Queiroz e Santos (2006QUEIROZ, Delcele Mascarenhas; SANTOS, Jocélio Teles. Sistema de cotas: um debate. Dos dados à manutenção de privilégios e de poder. Educação & Sociedade, Campinas, v. 27, p. 717-737, 2006.) sobre a realidade da Universidade Federal da Bahia (UFBA):

[s]e observada a origem escolar, o vestibular com reserva de vagas proporcionou uma revolução na UFBA, fazendo ingressar, nos seus cursos mais competitivos, parcela considerável de estudantes oriundos de escolas públicas, que estiveram, historicamente, excluídos desse espaço. A participação de estudantes oriundos das escolas públicas, que era de menos de 27% em cursos como Medicina, Arquitetura e Urbanismo, Direito, Comunicação, Odontologia, Ciências da Computação, Engenharia Civil e Engenharia Elétrica, cresceu consideravelmente, ultrapassando os 43% das vagas a eles reservadas pelo sistema de cotas (QUEIROZ; SANTOS, 2006QUEIROZ, Delcele Mascarenhas; SANTOS, Jocélio Teles. Sistema de cotas: um debate. Dos dados à manutenção de privilégios e de poder. Educação & Sociedade, Campinas, v. 27, p. 717-737, 2006.).

A partir dessa constatação, destacamos que é possível analisar o sucesso (ou não) dessas ações afirmativas, conscientes de que as normas podem ser observadas quanto aos planos da validade, da vigência, da eficácia e da efetividade (NEVES, 1994NEVES, Marcelo. A Constitucionalização Simbólica. São Paulo: Editora Acadêmica, 1994.). Neste trabalho, enfatizamos apenas o plano da efetividade. Para entender se a lei estadual que instituiu as cotas na UERN é dotada de efetividade normativa, precisamos entender esse conceito e dissociá-lo de um outro, o de eficácia normativa, já que ambos podem vir a ser confundidos.

Neves (1994NEVES, Marcelo. A Constitucionalização Simbólica. São Paulo: Editora Acadêmica, 1994.) nos traz uma conceituação e uma diferenciação entre eficácia normativa e efetividade normativa. A princípio, distingue-se logo da eficácia em sentido sociológico, sendo tratada aqui no âmbito jurídico. A eficácia jurídica seria aquela relacionada à aplicabilidade da norma e o seu encaixe e conformidade com o ordenamento jurídico, bem como a sua observância. O intuito desse trabalho, porém, não é analisar a eficácia normativa das leis que instituíram cotas socioeconômicas na UERN, que é mais fácil de ser analisada e mais objetiva, mas sim a sua efetividade normativa, o que se faz mais necessária a atenção e subjetividade para sua detecção.

A efetividade normativa é alcançada quando se atingem os fins para os quais aquela norma foi elaborada. Assim, podemos pensar a efetividade normativa como sendo o cumprimento da mens legis, ou seja, daquilo que é pretendido com a edição do texto normativo (NEVES, 1994NEVES, Marcelo. A Constitucionalização Simbólica. São Paulo: Editora Acadêmica, 1994.). No caso aqui analisado, a partir de uma interpretação teleológica e sistemática, a efetividade normativa será alcançada se as pessoas que eram potencialmente excluídas do acesso ao curso de Direito conseguirem adentrar, permanecer na universidade e concluírem o curso em tempo igual ao dos não cotistas, habilitando-se ao exercício das diversas carreiras jurídicas.

Percebemos, então, que a questão transcende o ponto de a norma ser compatível com o sistema a que pertence, ou seja, gozar de validade. Não basta que a lei tenha sido aplicada, observada e respeitada pelos entes, que goze de eficácia jurídica e social. É necessário, para além disso, que os respectivos dispositivos sejam efetivos, atendam às expectativas geradas pela lei e sejam capazes de promover a inclusão social e reduzir as desigualdades. Noutros termos, sejam dotados de efetividade.

Portanto, é importante observar o plano da efetividade, na ótica da norma ter cumprido (ou não) a finalidade a que se destinava desde a origem, algo que se prolonga no tempo. Essa preocupação procede, pois o fato de uma norma existir e estar conforme o restante do ordenamento jurídico não garante que ela esteja atingindo os fins a que se destina e as expectativas por ela geradas.

Em se tratando de ações afirmativas, alguns objetivos são estabelecidos ao se criarem normas jurídicas, na linha do que afirmam Haas e Linhares (2012HAAS, Célia Maria; LINHARES, Milton. Políticas públicas de ação afirmativa para admissão em ensino superior são justificadas no Brasil? Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos. Brasília, v. 93, n. 235, p. 836-863, 2012. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2176-66812012000400015&lng=en&nrm=iso. Acesso: 01 mar. 2020.
http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
):

a) necessidade de se combater a discriminação que ocorre em certos espaços da sociedade; b) necessidade de se reduzir a desigualdade que atinge certos grupos, por exemplo, aquele marcado pela questão de raça ou gênero; c) transformação social; d) finalidade de acesso à escola e ao mercado de trabalho; e e) finalidade da busca da integração dos diferentes grupos sociais em espaços sociais existentes, mediante a valorização da diversidade cultural que formariam (HAAS; LINHARES, 2012HAAS, Célia Maria; LINHARES, Milton. Políticas públicas de ação afirmativa para admissão em ensino superior são justificadas no Brasil? Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos. Brasília, v. 93, n. 235, p. 836-863, 2012. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2176-66812012000400015&lng=en&nrm=iso. Acesso: 01 mar. 2020.
http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
, p, 844).

Alinhado a essas necessidades, consideramos que o impacto das cotas sociais na UERN, como um todo, tem se notabilizado em números expressivos. Em 2019, a instituição revelou que em alguns cursos o percentual de alunos cotistas chega a 90% (FREIRE, 2019aFREIRE, Iuska. Cotas étnico-raciais ampliam as políticas afirmativas na UERN. Portal UERN, 2019a. Disponivel em: http://portal.uern.br/blog/cotas-etnico-raciais-ampliam-as-politicas-afirmativas-na-uern/. Acesso: 02 jun. 2020.
http://portal.uern.br/blog/cotas-etnico-...
). Não só a adesão pela sociedade tem sido ampla, como existe a satisfação dos cotistas pelo mecanismo, bem como estudos publicados sobre o tema, afastam os receios que poderia haver em torno desse sistema (FREIRE, 2019b).

Posto isso, torna-se imprescindível analisarmos se as ações afirmativas na Faculdade de Direito da UERN conseguiram atingir esses objetivos e, destarte, sabermos se, de fato, elas conseguiram atender ou não à respectiva finalidade. A relevância e o motivo de sabermos se essas metas foram alcançadas, é, primeiro, ter um critério para comprovar ou não a efetividade das cotas socioeconômicas; segundo, mostrar para o meio social que o produto normativo analisado, é útil, eficiente e relevante; e, terceiro, promover, em alguma medida, a própria avaliação da política pública. Essa investigação priorizou, então, a análise de dados sobre ingresso e conclusão do curso, comparando-os com aqueles relativos aos alunos não cotistas.

3.2 Análise dos resultados

Procurando entender se a efetividade normativa de fato existe no contexto das ações afirmativas na UERN, mais precisamente na Faculdade de Direito, buscamos informações junto à DIRCA19 19 Vide nota de rodapé 15. . Verificamos os registros entre 1981, ano de conclusão da primeira turma, e 2018, último ano com informações consolidadas no momento da coleta dos dados20 20 O levantamento dos dados ocorreu nos meses de outubro, novembro e dezembro de 2019. Registramos os agradecimentos a toda a equipe da DIRCA. .

De posse dessas informações, fizemos a média entre aqueles que ingressaram e concluíram no período compreendido entre 1981 e 200621 21 Apesar do longo período histórico de análise e da existência de outras variáveis que possam interferir no resultado final, nós consideramos que o critério estatístico se mostra suficiente à abordagem quantitativa. . Em seguida, comparamos com a média de ingresso/conclusão no período entre 2007 e 2018. Ressaltamos que, apesar da lei das cotas na UERN ser de 2002, o ano de 2007 representa o início do segundo cenário porque é quando as primeiras turmas de cotistas concluíram, haja vista o tempo de duração média do curso ser de cinco anos22 22 Desde a origem até os dias atuais, o curso de Direito da UERN tem duração média de cinco anos. Cf. UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE, 2020. . Portanto, o segundo recorte temporal se inicia nesse ano.

Com base nesse recorte metodológico, construímos a tabela a seguir, alimentada com os dados obtidos junto à DIRCA:

TABELA 1
PROPORÇÃO DE INGRESSANTES E CONCLUINTES DA FAD (1981 - 2018)

Com base na Tabela 1, é possível constatar que, entre 1981 e 2006, a média aritmética entre concluintes e ingressantes corresponde a 71,69 (setenta e um inteiros e sessenta e nove centésimos). Utilizamos o mesmo critério para constatar que, no período de 2007 e 2018, essa média se eleva para 74,1 (setenta e quatro inteiros e um décimo), havendo uma discreta variação para mais.

Optamos por priorizar a abordagem estatística para identificar a relação entre ingressantes e concluintes e, possivelmente, constatar um maior ou menor tempo para conclusão do curso pelos cotistas. Mas, reconhecemos que, além da média aritmética, há outras variáveis, não analisadas neste trabalho, capazes de influenciarem no tempo de permanência na universidade, tais como o aumento de vagas nos processos seletivos, programas de assistência estudantil, projetos de pesquisa e de extensão, acolhimento e acompanhamento psico-pedagógico.

Com efeito, “[...] o enfoque quantitativo, apesar de buscar garantir a precisão dos resultados e evitar as distorções de análise e interpretação, também não pode ser visto como um conjunto de interpretações certas” (GUSTIN; LARA; COSTA, 2012GUSTIN, Miracy Barbosa de Sousa; LARA, Mariana Alves; COSTA, Mila Batista Leite Corrrêa da. Pesquisa quantitativa na produção de conhecimento jurídico. Revista da Faculdade de Direito da UFMG, n. 60, p. 291-316, 2012. Disponível em: https://revista.direito.ufmg.br/index.php/revista/article/view/P.0304-2340.2012v60p291. Acesso: 7 maio 2021.
https://revista.direito.ufmg.br/index.ph...
, p. 296). Todavia, a avaliação aritmética, associada ao cálculo do desvio padrão, confere autenticidade aos resultados encontrados, pois a abordagem quantitativa fornece uma resposta relativamente conclusiva às perguntas da pesquisa, devido a sua padronização e confiabilidade.

Numa investigação estatística mais apurada, foi desenvolvido um gráfico referente aos percentuais de concluintes dos grupos sem ingressantes por cotas, período de 1981 a 2006, e com ingressantes pelo sistema de cotas, período de 2007 a 2018. A fim de identificar a significância dessa diferença, executamos um teste t de Student23 23 É um teste de hipótese que usa conceitos estatísticos para rejeitar ou não uma hipótese nula quando a estatística de teste (t) segue uma distribuição t de Student, permitindo comparar uma amostra com uma população, comparar duas amostras pareadas e/ou comparar duas amostras independentes (BARROS; MAZUCHELI, 2005). , que compara as distribuições das médias dos dois grupos. Essas distribuições podem ser observadas através do gráfico abaixo:

GRÁFICO 1
TESTE t STUDENT INGRESSANTES NA FAD COM COTAS E SEM COTAS

Ao analisarmos o Gráfico 1, podemos observar que o desvio padrão em relação aos discentes que ingressaram após a implantação do sistema de cotas é ligeiramente inferior ao dos que ingressaram antes da adoção do referido sistema. Figurativamente, os percentuais de concluintes com o sistema de cotas iniciam acima de 60, enquanto que sem o referido sistema o número cai para casa de 50, com ambos coeficientes finalizando na casa de 80. Ressaltamos ainda que a variabilidade (desvio padrão = 15,683, conforme Tabela 2) na porcentagem de concluintes do período anterior ao sistema de cotas é maior do que a dos concluintes que ingressaram após a implantação das cotas sociais (desvio padrão = 10,061).

Para verificar se existe diferença significativa entre as porcentagens médias de conclusão dos discentes ingressantes antes e depois da implantação do sistema de cotas sociais na UERN, formulamos as seguintes hipóteses:

H0: não existe diferença entre as porcentagens de conclusão de curso dos discentes que entraram antes e após da implantação das cotas sociais;

H1: existe diferença entre as porcentagens de conclusão de curso dos discentes que entraram antes e após a implantação das cotas sociais.

TABELA 2
T-TEST

Como o valor de t calc = -0,499 encontra-se na região de aceitação (t tab = 2,0211) concluímos que não existe diferença significativa, ao nível de 5%, entre as porcentagens de conclusão de curso dos discentes que entraram antes e após da implantação das cotas sociais. Portanto, confirma-se a hipótese H0.

O tratamento estatístico dos dados estão a revelar a efetividade das ações afirmativas previstas na Lei Estadual nº 8.258, de 27 dezembro de 2002, no âmbito da Faculdade de Direito da UERN. Com adoção do sistema de cotas, não houve redução no número de concluintes dentro do prazo legal de cinco anos. Ao contrário, é perceptível um pequeno aumento de concluintes regulares após adoção da medida (Tabela 1). Não apenas isso, mas também essa média se tornou mais regular e com menor índice de variação, conforme Gráfico 1 e Tabela 2. Com os resultados de uma experiência semelhante, revelada por Queiroz e Santos (2006QUEIROZ, Delcele Mascarenhas; SANTOS, Jocélio Teles. Sistema de cotas: um debate. Dos dados à manutenção de privilégios e de poder. Educação & Sociedade, Campinas, v. 27, p. 717-737, 2006.), que trata dos cotistas na Universidade Federal da Bahia (UFBA), foi verificado que estudantes cotistas aumentaram o percentual de concluintes regulares ou não desistentes.

Ainda no campo da efetividade, podemos considerar que o término do curso é a primeira condição para ingressar no mercado de trabalho. De tal modo, os dados do presente estudo afastam o “senso comum” de que alunos ingressantes através do sistema de cotas são menos competentes, no sentido de que seriam incapazes de concluírem o curso de modo semelhante aos não cotistas.

Em verdade, a finalidade de uma lei para cotas é reduzir as desigualdades sociais pré-existentes. Para isso, não basta que discentes cotistas ingressem na universidade e tenham notas iguais ou melhores do que não cotistas. Mais relevante é que consigam finalizar a graduação, com êxito, o quanto antes e, de posse do diploma de ensino superior, habilitarem-se a galgar melhores condições profissionais e de vida, atendendo as expectativas geradas pela lei.

Para a comprovação da efetividade normativa analisada, constatamos que não houve uma diminuição na média de concluintes, demonstrando que a lei atende aos fins esperados de incluir, na universidade, estudantes da rede pública. Nessa perspectiva, consideramos que preocupante seria se a média de concluintes tivesse sido reduzida após adoção do sistema de cotas, pois demonstraria que os cotistas apenas entravam, mas não permaneciam no espaço universitário ou ficavam por mais tempo do que o esperado.

Não é esse o caso evidenciado pelos dados obtidos junto à DIRCA-UERN, relacionados à Faculdade de Direito. Com as cotas, houve até um percentual de conclusão maior, embora estatisticamente pouco significativo. Mas essa circunstância não afasta a efetividade do sistema aqui analisado, pois não houve redução da média de concluintes. Salientamos ainda que, além da porcentagem de concluintes ter aumentado, sua taxa de variação é mais estável do que antes da adoção do sistema de cotas (Gráfico 1, Tabela 2).

Esse contexto, por si só, já demonstraria que o sistema de cotas sociais na Faculdade de Direito da UERN é efetivo. Adicionados a esses dados, analisamos os parâmetros estabelecidos por Haas e Linhares (2012HAAS, Célia Maria; LINHARES, Milton. Políticas públicas de ação afirmativa para admissão em ensino superior são justificadas no Brasil? Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos. Brasília, v. 93, n. 235, p. 836-863, 2012. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2176-66812012000400015&lng=en&nrm=iso. Acesso: 01 mar. 2020.
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) sobre a finalidade de uma lei de cotas, para observarmos se eles foram ou não alcançadas no âmbito da Faculdade de Direito.

São evidentes os dois pré-requisitos anteriormente mencionados, da “necessidade de se combater a discriminação que ocorre em certos espaços da sociedade” e da “necessidade de se reduzir a desigualdade que atinge certos grupos”, por exemplo, aquele marcado pela questão de raça ou gênero. Não é à toa que, como já mencionado, em alguns cursos da UERN o número de alunos cotistas chega a 90%. No que tange à questão da discrepância no acesso de certos grupos, a redução de desigualdade era visada entre o grupo de vulneráveis economicamente, representado pelos estudantes de escolas públicas, e a classe financeiramente mais abonada.

Quanto aos requisitos de “transformação social”, “finalidade de acesso à escola e ao mercado de trabalho” e “finalidade da busca da integração dos diferentes grupos sociais em espaços sociais existentes, mediante a valorização da diversidade cultural que formariam”, também podemos concluir que eles foram cumpridos. Quanto aos dois primeiros, eles ficam demonstrados pelo fato de que os cotistas ingressantes conseguem concluir o curso tal qual os não cotistas. Em tese, podemos afirmar que esses alunos, ao conseguirem graduar-se, poderão obter colocações profissionais melhores do que se não possuíam diploma de ensino superior. Em relação à integração entre diferentes grupos e à valorização da diversidade cultural, a convivência no espaço universitário tende à aceitação da pluralidade social e respeito às diferenças.

No curso de Direito, essa possibilidade de o sujeito transformar sua realidade é marcante. Isso porque, desde que aprovado no exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o bacharel e a bacharela em Direito não dependem da contratação de alguma empresa ou grupo econômico, que poderiam não se interessar pela ascensão social de indivíduos de classes populares. Pelo contrário, advogados e advogadas podem atuar de forma autônoma e, no setor público, por sua vez, os profissionais da área do Direito (juízes, desembargadores, promotores, delegados, defensores públicos, tabeliões, diplomatas e outros) tendem a ter remunerações superiores a outras categorias profissionais.

É inegável que o sistema de cotas socioeconômicas, previsto na Lei Estadual nº 8.258/2002 (RIO GRANDE DO NORTE, 2002), tem atingido os objetivos a que se destina desde a origem, atendendo às expectativas e aos fins esperados com a lei instituidora. Com base no conceito trazido por Neves (1994NEVES, Marcelo. A Constitucionalização Simbólica. São Paulo: Editora Acadêmica, 1994.) e nos dados encontrados junto à DIRCA, concluímos que essa política de ações afirmativas detém, portanto, efetividade normativa.

4 Conclusão

Com o objetivo de minimizar, quiçá eliminar, as desigualdades sociais persistentes no decorrer da nossa história, o Estado e/ou a iniciativa privada têm adotado medidas especiais e temporárias que buscam promover a igualdade de oportunidades e, com isso, compensar perdas provocadas pela discriminação e marginalização de cunho racial, étnico, socioeconômico, religioso e de gênero, entre outras formas de discriminação. Apesar do discurso oficial, há críticas a esse modelo de política pública uma vez que seus mecanismos são efêmeros e paliativos, por não resolverem de modo definitivo o problema da desigualdade de acesso ao ensino superior.

O conjunto dessas medidas representa as ações afirmativas e, dentro destas, figuram as cotas socioeconômicas, que garantem percentual de vagas nos cursos de graduação para determinados grupos sociais em situação de vulnerabilidade econômica, cujo critério predominante tem sido estudar integralmente na rede pública de ensino. Essa modalidade de ação afirmativa parte do pressuposto de que estudantes que cursaram ensino fundamental e médio nas escolas públicas têm, em geral, menor acesso aos conhecimentos indispensáveis à aprovação nos exames para ingresso na educação superior.

Prática comum nas universidades nordestinas, o sistema de cotas socioeconômicas também foi adotado na Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, por determinação da Lei n° 8.258/2002. Mas a previsão da lei, por si só, não explica o sucesso ou o fracasso de uma política. Foi preciso lhe averiguar a efetividade, ou seja, se ela atingia os fins e as expectativas geradas para os quais fora instituída. Noutras palavras, a efetividade normativa ocorre se a mens legis é atingida.

No caso aqui analisado, a efetividade normativa resta comprovada na medida em que pessoas potencialmente excluídas do acesso ao curso de Direito conseguiram ingressar, permanecer e concluir o curso no mesmo prazo dos não cotistas. Essa conclusão decorre de três parâmetros fundamentais: a) manutenção na média de concluintes, quando comparamos o período anterior e o posterior à adoção das cotas; b) baixo desvio padrão em relação às médias após adoção do sistema de cotas; e c) atendimento aos critérios apontados por Haas e Linhares (2012HAAS, Célia Maria; LINHARES, Milton. Políticas públicas de ação afirmativa para admissão em ensino superior são justificadas no Brasil? Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos. Brasília, v. 93, n. 235, p. 836-863, 2012. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2176-66812012000400015&lng=en&nrm=iso. Acesso: 01 mar. 2020.
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).

Portanto, esse modelo de ação afirmativa tem se mostrado efetivo no âmbito da Faculdade de Direito da UERN, haja vista ter conseguido manter e até ampliar, ainda que discretamente, o índice de conclusão do curso de Direito. Assim, alunos de escolas públicas, que, sem essa atuação afirmativa do Estado, não teriam as mesmas condições de ingressarem no curso de Direito, passam a ter a oportunidade de se habilitarem ao exercício de várias carreiras jurídicas e ao potencial de transformação social.

Ressaltamos que, para além da presente análise e dos resultados aqui encontrados, existem outras perspectivas de avaliação do sistema de cotas na Faculdade de Direito da UERN. A partir da adoção de novos critérios e de outras técnicas de pesquisa, abre-se um leque amplo de investigação sobre o fenômeno. Poderiam ser abordados, por exemplo, os temas relativos ao aumento de vagas nos processos seletivos, programas de assistência estudantil, projetos de pesquisa e de extensão, acolhimento e acompanhamento psicopedagógico e os respectivos impactos na efetividade normativa do sistema de cotas.

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  • UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO GRANDE. Conselho Universitário (CONSUNI). Resolução nº 10/1976, de 6 de setembro de 1976. Cria o curso de Ciências Jurídicas e Sociais. Online. Disponível em http://www.uern.br/controledepaginas/fad-documentos/arquivos/2701image170816090050.pdf Acesso: 21 nov. 2020.
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  • UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE. Pró-Reitoria de Ensino de Graduação. Diretoria de Admissão, Registro e Controle Acadêmico. Apresentação. 2019. Disponível em: http://uern.br/dirca/default.asp?item=uern-dirca-apresenta%E7%E3o Acesso: 9 jun. 2020.
    » http://uern.br/dirca/default.asp?item=uern-dirca-apresenta%E7%E3o
  • UNIVERSIDADE ESTADUAL DA PARAÍBA. Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (CONSEPE). Resolução nº 58, de 13 de Novembro de 2014. Alterar a redação do artigo 2º da RESOLUÇÃO/UEPB/CONSEPE/06/2006 que define a política de reserva de vagas na UEPB. [S. l.], 13 nov. 2014. Disponível em: https://cutt.ly/Aafh8SJ Acesso: 13 abr. 2020.
    » https://cutt.ly/Aafh8SJ
  • UNIVERSIDADE ESTADUAL DE FEIRA DE SANTANA. Conselho Universitário (CONSU). Resolução nº 10, de 7 de Novembro de 2019. Dispõe sobre a reserva de vagas e sobrevagas para os cursos de graduação da UEFS, destinadas a grupos historicamente excluídos, realizada através de Processo Seletivo de Acesso ao Ensino Superior. [S. l.], 7 nov. 2019. Disponível: https://cutt.ly/oaftNjJ. Acesso em: 6 abr. 2020.
    » https://cutt.ly/oaftNjJ.
  • UNIVERSIDADE ESTADUAL DE SANTA CRUZ. Conselho Superior de Ensino, Pesquisa e Extensão (CONSEPE). Resolução nº 64, de 21 de Dezembro de 2006, Resolução nº 90, de 25 de Setembro de 2007 e Resolução nº 50, de 8 de Agosto de 2011. Institui reserva de vagas no processo seletivo para os cursos de graduação da UESC e dá outras providências. [S. l.], 8 ago. 2011. Disponível em: https://cutt.ly/cafokjV Acesso: 6 abr. 2020.
    » https://cutt.ly/cafokjV
  • UNIVERSIDADE ESTADUAL DO PIAUÍ. Conselho Universitário (CONSUN). Resolução nº 7, de 11 de Julho de 2008. Regulamenta a Reserva de Vagas na oferta do Vestibular dos Cursos de Graduação e dá outras providências. [S. l.], 11 jul. 2008. Disponível em: https://cutt.ly/Jafzl04 Acesso: 20 abr. 2020.
    » https://cutt.ly/Jafzl04
  • UNIVERSIDADE ESTADUAL DO SUDOESTE DA BAHIA. Conselho Superior de Ensino, Pesquisa e Extensão (CONSEPE). Resolução nº 52, de 02 de Setembro de 2016. Altera a Resolução CONSEPE nº 37/2008, que dispõe sobre o sistema de reserva de vagas e quotas adicionais no processo seletivo para os cursos de graduação da UESB e revoga as Resoluções CONSEPE nº 21/2010, 67/2010 e 39/2016. [S. l.], 2 set. 2016. Disponível em: https://cutt.ly/qafpWKi Acesso: 6 abr. 2020.
    » https://cutt.ly/qafpWKi
  • 1
    Além do termo ação afirmativa, Haas e Linhares (2012HAAS, Célia Maria; LINHARES, Milton. Políticas públicas de ação afirmativa para admissão em ensino superior são justificadas no Brasil? Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos. Brasília, v. 93, n. 235, p. 836-863, 2012. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2176-66812012000400015&lng=en&nrm=iso. Acesso: 01 mar. 2020.
    http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
    , p. 843) apresentam expressões que são frequentemente usadas como sinônimos para designar o termo ação afirmativa, a saber: “política de cotas, políticas compensatórias, política de reparação, política de promoção de igualdade, política antirracista, ou ainda, política de engajamento, política da diversidade ou política do multiculturalismo”.
  • 2
    Até a conclusão deste artigo, não existia universidade estadual ou municipal no estado de Sergipe, por isso, ele não foi incluído no presente estudo.
  • 3
    “[...] Produto do Estado Social de Direito, a igualdade substancial ou material propugna redobrada atenção por parte do legislador e dos aplicadores do Direito à variedade das situações individuais e de grupo, de modo a impedir que o dogma liberal da igualdade formal impeça ou dificulte a proteção e a defesa dos interesses das pessoas socialmente fragilizadas e desfavorecidas” (GOMES, 2001GOMES, Joaquim B. Barbosa. A recepção do instituto da ação afirmativa pelo direito constitucional brasileiro. Revista de Informação Legislativa, v. 38, n. 151, p. 129-152, 2001. Disponível em: https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/705/r151-08.pdf. Acesso: 5 mar. 2020.
    https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstrea...
    , p. 131).
  • 4
    De acordo com Gomes (2001GOMES, Joaquim B. Barbosa. A recepção do instituto da ação afirmativa pelo direito constitucional brasileiro. Revista de Informação Legislativa, v. 38, n. 151, p. 129-152, 2001. Disponível em: https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/705/r151-08.pdf. Acesso: 5 mar. 2020.
    https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstrea...
    ), ações afirmativas foram, inicialmente, idealizadas como meios tendentes a resolver problemas quanto a marginalização social e econômica do negro na sociedade dos Estados Unidos. Posteriormente, essas medidas foram ampliadas às mulheres, a outras minorias étnicas e nacionais, como os índios e as pessoas com deficiência.
  • 5
    No contexto estadunidense, as cotas no ensino superior iniciaram-se na década de 1960, durante o governo do presidente John Kennedy, que propôs a inclusão dos negros nas Universidades. Por meio dessa primeira experiência de inclusão universitária, contatou-se um aumento expressivo no número de jovens negros ingressantes no ensino superior daquele país (POLETTO; EFROM; RODRIGUES, 2020POLETTO, Daniela Basso; EFROM, Cora; RODRIGUES, Maria Beatriz. Ações Afirmativas no Ensino Superior: revisão quantitativa e qualitativa de literatura. Educare, Heredia, v. 24, n. 1, p. 292-325, abr. 2020 . Disponível em: http://www.scielo.sa.cr/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1409-42582020000100292&lng=en&nrm=iso. Acesso: 1 jun. 2020.
    http://www.scielo.sa.cr/scielo.php?scrip...
    ).
  • 6
    Piovesan (2005PIOVESAN, Flávia. Ações afirmativas da perspectiva dos direitos humanos. Caderno de Pesquisa, São Paulo, v. 35, n. 124, p. 43-55, jun/abr., 2005. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-15742005000100004&lng=em&nrm=iso. Acesso: 08 out. 2019.
    http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
    , p. 48-49) destaca que, no âmbito do Direito Internacional dos Direitos Humanos, existem duas formas de combater a discriminação: a primeira, é a forma repressiva e punitiva, objetivando “punir, proibir e eliminar a discriminação”; a segunda, é a forma promocional, “que tem por objeto promover, fomentar e avançar a igualdade”. Para a autora, “[f]az-se necessário combinar a proibição da discriminação com políticas compensatórias que acelerem a igualdade enquanto como processo. Isto é, para assegurar a igualdade não basta apenas proibir a discriminação, mediante legislação repressiva. São essenciais as estratégias promocionais capazes de estimular a inserção e inclusão de grupos socialmente vulneráveis nos espaços sociais”.
  • 7
    Dentre os objetivos, frisamos: construir uma sociedade livre, justa e solidária; erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (BRASIL, 1988).
  • 8
    Cabe frisar que, “[a]s diferentes percepções acerca das desigualdades no Brasil se consubstanciaram em desenhos distintos de políticas de ação afirmativa. Se em um conselho universitário ou assembleia legislativa prevaleceu o entendimento de que as desigualdades mais importantes no Brasil são de renda e classe e que as desigualdades raciais daí derivam, isso se traduziu em uma política que visava exclusivamente aos alunos de escola pública ou de baixa renda, isto é, à ação afirmativa foi atribuído o papel de contribuir para solucionar desigualdades sociais. Acreditou-se que, ao contemplar os alunos pobres, seriam atingidos também os alunos pretos e pardos, uma vez que estes se encontram mais concentrados no segmento social focalizado pela política” (DAFLON; FERES JÚNIOR; CAMPOS, 2013DAFLON, Verônica Toste; FERES JÚNIOR, João; CAMPOS, Luiz Augusto. Ações afirmativas raciais no ensino superior público brasileiro: um panorama analítico. Cadernos de Pesquisa. 2013, vol. 43, n. 148, p. 302-327. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0100-15742013000100015&script=sci_abstract&tlng=pt. Acesso: 15 fev. 2020.
    https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S01...
    , p. 323).
  • 9
    Dentre as principais críticas às cotas nas discussões da ADPF nº 186 no STF, destacaram-se os seguintes argumentos: “inexistência biológica das raças; caráter ilegítimo das ações de “reparação” aos danos causados pela escravidão em tempo presente; risco de acirrar o racismo no Brasil; possibilidade de manipulação estatística da categoria “parda”; inviabilidade de identificação racial em um país mestiço; a questão da pobreza como determinante da exclusão social”. No que se refere aos argumentos favoráveis às políticas discutidos no STF, concentraram-se na discussão sobre a constitucionalidade das cotas: a relevância para o país, intervenção estatal “como fundamental diante dos quadros de desigualdade raciais remanescentes de fenômenos sociais que precisam ser enfrentados; destacando-se que as “ações afirmativas” atuariam como alternativa para a busca de igualdade através da promoção de condições equânimes entre brancos e negros” e avanço do pluralismo nas diversas instituições nacionais (GUARNIERI; MELO-SILVA, 2017GUARNIERI, Fernanda Vieira; MELO-SILVA, Lucy Leal. Cotas Universitárias no Brasil: Análise de uma década de produção científica. Psicol. Esc. Educ., Maringá, v. 21, n. 2, p. 183-193, ago. 2017. Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-85572017000200183&lng=en&nrm=iso. Acesso: 18 mar. 2020.
    http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
    , p. 185).
  • 10
    Segundo Poletto, Efrom e Rodrigues (2020POLETTO, Daniela Basso; EFROM, Cora; RODRIGUES, Maria Beatriz. Ações Afirmativas no Ensino Superior: revisão quantitativa e qualitativa de literatura. Educare, Heredia, v. 24, n. 1, p. 292-325, abr. 2020 . Disponível em: http://www.scielo.sa.cr/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1409-42582020000100292&lng=en&nrm=iso. Acesso: 1 jun. 2020.
    http://www.scielo.sa.cr/scielo.php?scrip...
    , p. 5), “[...] a Lei 12.711/2012 [...] colocou em discussão temas polêmicos e por tanto tempo relegados ao ostracismo na realidade brasileira. Não somente o racismo, como também a desigualdade social e de oportunidades entre estudantes provenientes de diferentes estratos sociais. Para os apoiadores, as mudanças no acesso ao ensino superior refletem em benefícios em outras esferas: desde direitos humanos, até razões mais práticas, de tipo econômico e de novas possibilidades de desenvolvimento social, sem falar, na superação e prevenção da pobreza e marginalização”.
  • 11
    A UNEB tem, em sua estrutura administrativa, a Pró-Reitoria de Ações Afirmativas (PROAF), responsável pela coordenação geral, supervisão e avaliação do processo permanente de institucionalização da política universitária de ações afirmativas, através da proposição e/ou desenvolvimento, fomento, acompanhamento e normatização das atividades, programas e projetos de inclusão, de promoção da igualdade, de garantia da equidade e de justiça social no âmbito da comunidade universitária. A PROAF desenvolve programas de ações afirmativas que buscam promover práticas de equidade, indistintamente, a todas as diversidades: étnicas, raciais, culturais, de gênero, de geração/faixa etária, de inserção territorial-geográfica, de condições físicas e/ou históricas desvantajosas e outras, que compõem o quadro de estudantes, professores e servidores técnicos e administrativos nos diversos departamentos da Universidade. Disponível em: <https://portal.uneb.br/proaf/>. Acesso em 17 jul. 2020.
  • 12
    Somado a isso, a UEFS, por meio da Pró-Reitoria de Ações Afirmativas e Assuntos Estudantis (PROAAE), tem como missão propor, planejar e acompanhar as Políticas de Ações Afirmativas no âmbito da Universidade Estadual de Feira de Santana visando atender a comunidade universitária; planejar, implementar, coordenar, e consolidar Programas de Assistência Estudantil que visem ampliar condições para a permanência, prioritariamente, para as (os) estudantes de graduação em situação de vulnerabilidade social e/ou integrante de comunidades tradicionais historicamente excluídos do ensino superior com vistas a contribuir para a promoção social pela educação e planejar, implementar, coordenar, e consolidar as ações de apoio aos estudantes e às entidades estudantis. Disponível em: <http://www.propaae.uefs.br/>. Acesso 17 jul. 2020.
  • 13
    Em muitos dos casos, os Conselhos Universitários, enquanto espaços de poder no campo acadêmico, acabam dando direção às políticas de ações afirmativas no âmbito das universidades, tornando-se "arena de disputas". De acordo com Batista (2015BATISTA, Neusa Chaves. Políticas públicas de ações afirmativas para a Educação Superior: o Conselho Universitário como arena de disputas. Ensaio: Aval. Pol. Públ. Educ., Rio de Janeiro, v. 23, n. 86, p. 95-128, fev. 2015. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-40362015000100095&lng=pt&nrm=iso. Acesso: 18 jul. 2020.
    http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
    ), em um estudo na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, "essa característica faz desse órgão, através da representação de segmentos sociais, uma arena de disputas por modelos de justiça social para a Educação Superior. Todavia, o acesso aos instrumentos legítimos de expressão e, portanto, a participação no quinhão da autoridade institucional, organiza-se a partir de uma hierarquia institucional cujo resultado, quase sempre, resulta em desigualdade na representação de segmentos nos atos decisórios (BATISTA, 2015BATISTA, Neusa Chaves. Políticas públicas de ações afirmativas para a Educação Superior: o Conselho Universitário como arena de disputas. Ensaio: Aval. Pol. Públ. Educ., Rio de Janeiro, v. 23, n. 86, p. 95-128, fev. 2015. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-40362015000100095&lng=pt&nrm=iso. Acesso: 18 jul. 2020.
    http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
    , p. 120).
  • 14
    Assim, “[...] os processos internos de demandas pelas políticas variaram muito caso a caso. Em algumas universidades, os movimentos sociais locais passaram a se organizar em reivindicações específicas; em outras, a organização de docentes dentro do campus foi decisiva; em outras, ainda, os núcleos de estudo afro-brasileiros já existentes passaram a ter maior voz; por último, ações inicialmente isoladas de profissionais que passaram a questionar a falta de diversidade em suas universidades foram decisivas para levar a cabo o programa” (PAIVA; ALMEIDA, 2010, p. 86 apud DAFLON; FERES JÚNIOR; CAMPOS, 2013DAFLON, Verônica Toste; FERES JÚNIOR, João; CAMPOS, Luiz Augusto. Ações afirmativas raciais no ensino superior público brasileiro: um panorama analítico. Cadernos de Pesquisa. 2013, vol. 43, n. 148, p. 302-327. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0100-15742013000100015&script=sci_abstract&tlng=pt. Acesso: 15 fev. 2020.
    https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S01...
    , p. 308-309).
  • 15
    A Diretoria de Admissão, Registro e Controle Acadêmico (DIRCA), vinculada à Pró-Reitoria de Ensino de Graduação (PROEG), é o órgão responsável pelo registro e controle dos atos acadêmicos do/a discente de graduação na UERN, desde a entrada na instituição até o momento da Colação de Grau. Compete a essa Diretoria a emissão oficial de dados referentes ao ensino de graduação, atendendo à Reitoria, às Pró-Reitorias, Faculdades, Campi e Departamentos, bem assim a pesquisadores e pesquisadoras e à sociedade em geral (UERN, 2019).
  • 16
    O curso de Direito da UERN foi criado pela Resolução nº 10/1976, do Conselho Universitário (CONSUNI), e teve sua primeira turma iniciada no ano de 1977 (UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO GRANDE, 1976).
  • 17
    Existe divergência sobre a validade dessa lei. Embora exista o entendimento de que esta lei não é mais válida, há compreensão divergente. Há o posicionamento de que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) teria revogado o decreto imperial de 1827 ao dispor sobre as formas existentes de obter o título de Doutor. Em contraponto a essa ideia, os defensores de que bacharéis em Direito são doutores, defendem que o título de Doutor mencionado no Decreto Imperial é de natureza “honorífica”, enquanto o que é mencionado na Lei de Diretrizes e Bases da educação é de natureza acadêmica, sendo, portanto, distintos entre si (MONTEIRO, 2014MONTEIRO, R. C. Advogado é Doutor por direito e tradição. JusBrasil, 2014. Disponivel em: https://drrafaelcm.jusbrasil.com.br/noticias/149904006/advogado-e-doutor-por-direito-e-tradicao#:~:text=O%20título%20de%20doutor%20foi,Universidades%20aos%20acadêmicos%20em%20geral. Acesso: 01 jul. 2020.
    https://drrafaelcm.jusbrasil.com.br/noti...
    ). Há ainda quem se contraponha, dizendo que a interpretação do Decreto como sendo ainda válido é um erro de hermenêutica, baseado em dois pontos. Seria um equívoco a interpretação de forma anacrônica do decreto sem levar em conta as mudanças que aconteceram, e em segundo plano, que a própria lei diria que o título seria obtido em segunda etapa, após defesa de teses, que seria apresentadas em Congregação, e demandaria da aprovação de todos os professores para tal feito (GUIMARÃES, 2016GUIMARÃES, Marina Sartori. Não existe nenhuma lei que obrigue você a chamar advogados de “Doutor. Justificando, 2016. Disponível em: http://www.justificando.com/2016/11/11/nao-existe-nenhuma-lei-que-obrigue-voce-chamar-advogados-de-doutor/. Acesso: 01 jul. 2020.
    http://www.justificando.com/2016/11/11/n...
    ). Mas, por fim, há aqueles que sustentam que a tradição também é fonte de Direito e que o uso do termo Doutor para juristas remonta a tempos ainda mais antigos, com alguns registros que datam desde o século XII, ou ainda mais antigos como as menções bíblicas aos chamados “Doutores da Lei” (MONTEIRO, 2014).
  • 18
    Sites voltados para auxiliar postulantes às vagas universitárias trazem informações de que o curso de Direito é um dos que atingem as notas de corte mais altas no SISU (BLOG DO ENEM, 2020; GUIA DA CARREIRA, 2020; MUNDO VESTIBULAR, 2020). Tais informações são aglutinadas com o tratamento que é dado pela mídia (FALCONERY, VIANA, 2020FALCONERY, Lucas; VIANA, Thayse. Sisu 2020: Veja quais são os cursos com as maiores notas de corte nas universidades federais do Ceará. G1, 2020. Disponivel em: https://g1.globo.com/ce/ceara/noticia/2020/01/22/sisu-2020-veja-quais-sao-os-cursos-com-as-maiores-notas-de-corte-nas-universidades-federais-do-ceara.ghtml. Acesso: 12 jul. 2020.
    https://g1.globo.com/ce/ceara/noticia/20...
    ; TRIBUNA DO NORTE, 2019), bem como informações divulgadas pelo próprio Ministério da Educação - MEC comprovam esse fato (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 2015).
  • 19
    Vide nota de rodapé 15.
  • 20
    O levantamento dos dados ocorreu nos meses de outubro, novembro e dezembro de 2019. Registramos os agradecimentos a toda a equipe da DIRCA.
  • 21
    Apesar do longo período histórico de análise e da existência de outras variáveis que possam interferir no resultado final, nós consideramos que o critério estatístico se mostra suficiente à abordagem quantitativa.
  • 22
    Desde a origem até os dias atuais, o curso de Direito da UERN tem duração média de cinco anos. Cf. UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE, 2020.
  • 23
    É um teste de hipótese que usa conceitos estatísticos para rejeitar ou não uma hipótese nula quando a estatística de teste (t) segue uma distribuição t de Student, permitindo comparar uma amostra com uma população, comparar duas amostras pareadas e/ou comparar duas amostras independentes (BARROS; MAZUCHELI, 2005BARROS, Emílio Augusto Coelho; MAZUCHELI, Josmar. Um estudo sobre o tamanho e poder dos testes t-Student e Wilcoxon. Acta Scientiarum. Technology, v. 27, n. 1, p. 23-32, 2005. Disponível em: https://www.redalyc.org/pdf/3032/303226513002.pdf. Acesso: 7 maio 2021.
    https://www.redalyc.org/pdf/3032/3032265...
    ).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Dez 2022
  • Data do Fascículo
    Oct-Dec 2022

Histórico

  • Recebido
    23 Nov 2020
  • Aceito
    18 Maio 2021
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