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BAMBINI BRASILIANI: A INFÂNCIA DAS CRIANÇAS ITALIANAS E ÍTALO-BRASILEIRAS

BAMBINI BRASILIANI: CHILDHOOD OF ITALIAN CHILDREN AND ITALIAN-BRAZILIAN

MIMESSE, Eliane (org.). Bambini brasiliani: a infância das crianças italianas e ítalo-brasileiras. Jundiaí: Paco, 2013.

A obra Bambini brasiliani: a infância das crianças italianas e ítalo-brasileiras apresenta um estudo sobre o cotidiano das crianças pertencentes aos grupos de imigrantes, em sua maioria da região do Vêneto, que partiram para as regiões Sul e Sudeste do Brasil a partir do ano de 1870.

O volume inicia com a apresentação realizada pela organizadora do livro, Eliane Mimesse, que discorre sobre os conceitos e o tempo de permanência da infância, entendida como uma construção histórica e cultural. Após consta de prefácio, elaborado por Marta Maria Chagas Carvalho, em que a historiadora reflete sobre a temática desenvolvida no livro.

A obra é composta por quatro capítulos que contam as histórias da infância dos pequenos imigrantes, incluindo aspectos sobre alimentação, vestimentas, brinquedos, brincadeiras, trabalho infantil, relações familiares, relações religiosas e os processos de escolarização. O último capítulo discorre sobre a disponibilidade e a importância do trabalho com as fontes documentais sobre o tema encontradas nos mais diversos arquivos, apontando para as possibilidades de investigações sobre a história da criança e da infância.

O primeiro capítulo, intitulado As aventuras e desventuras cotidianas das crianças em São Caetano no início do século XX, de Eliane Minesse, aborda o início da colonização italiana em São Caetano, bem como, o processo de escolarização da cidade.

No que tange a infância, a pesquisadora discorre sobre a história do cotidiano das crianças: as doenças, a mortalidade infantil, os momentos de diversão e de brincadeiras pelas ruas de terra. São abordados temas relacionados com aspectos de mortalidade infantil, de alimentação, de registros de nascimentos, de inexistência das comemorações de aniversário, de vestimentas, de afazeres domésticos de meninos e meninas, de obrigações escolares, de brincadeiras diversas. A autora finaliza afirmando que, apesar de todas as dificuldades enfrentadas essas crianças, foram felizes em suas infâncias. Foram felizes brincando.

No segundo capítulo, A infância contadina nas colônias italianas de Curitiba no Paraná, de autoria de Elaine Maschio, é feita uma análise da infância camponesa na década de 1890, em uma comunidade rural de Curitiba. No estudo são questionadas as relações estabelecidas entre infância, família, trabalho, religião e escola, bem como os modos de brincar que se constituíram no interior da comunidade. As famílias italianas, em sua maioria, eram numerosas, compostas por muitos filhos, diante de condições precárias de sobrevivência. Segundo a autora, a infância era atingida por privações de todos os tipos.

O texto atenta para as vestimentas das crianças, que eram repassadas dos filhos mais velhos para os mais novos: o reaproveitamento fazia parte do cotidiano das famílias O trabalho infantil era visto como parte do processo de subsistência das famílias e, neste contexto, são identificadas as preferências por filhos homens em virtude de que esses dariam continuidade a linhagem da família e ao trabalho no campo. Às meninas eram destinadas os trabalhos domésticos: eram educadas para serem donas de casa, boas mães e a elas cabia a responsabilidade pela educação dos filhos.

Sobre a relação com a religião, a autora discorre sobre os ritos religiosos de que as crianças participavam, entre eles, o batismo, a primeira eucaristia e o crisma, além de participarem das missas e das rezas familiares. No que diz respeito ao processo de escolarização, embora os pais vissem a escola como necessária, o trabalho na roça e os afazeres domésticos impediam as crianças de frequentarem a escola. O capítulo é finalizando com menção aos brinquedos e às brincadeiras das crianças italianas.

O terceiro capítulo, A infância entre imigrantes e ítalo-descendentes no Rio Grande do Sul, de Terciane Ângela Luchese, apresenta o cotidiano das crianças imigrantes e ítalo-descendentes nas colônias de Conde d'Eu, Dona Isabel e Caxias, no que diz respeito à infância e as suas relações com a família, com o trabalho, com a ludicidade e com a escolarização.

A autora contextualiza a imigração no Estado do Rio Grande do Sul, aponta os motivos que levaram os italianos a partir para o Brasil, os interesses brasileiros vistos na imigração, o ingresso desses imigrantes no Rio Grande do Sul, bem como os primeiros anos de colonização.

Luchese assinala que milhares de crianças viveram a epopéia da imigração, sofreram as dificuldades da viagem e conviveram com as doenças, a fome, a miséria e o cansaço. Pela família eram cultivados os laços, a transmissão de valores, saberes, costumes, a divisão das tarefas, a preservação de hábitos alimentares e de rituais religiosos. As festas e as celebrações religiosas eram constantes no cotidiano das famílias de imigrantes.

A educação em casa se fazia pelo medo, caso as crianças desobedecessem eram aplicados castigos físicos. Salienta-se que desde cedo as crianças tinham que ajudar os pais nas tarefas domésticas e no trabalho na roça, depois, em virtude do crescimento econômico, as crianças e jovens passaram a ter outras oportunidades de emprego, trabalhando como aprendizes e recebendo em troca alimentação e um lugar para morar.

O texto aponta aspectos do universo infantil destas crianças, em que os brinquedos e as brincadeiras se constituíam em importantes momentos de ludicidade. São evidenciadas as brincadeiras como o futebol, o jogo de caçador, as brincadeiras de roda, as de cantigas e os brinquedos construídos pelas crianças, como os carinhos de lomba, as bonecas de pano ou de espiga de milho, os balanços nos galhos das árvores.

Na última parte do capítulo a autora apresenta o processo de escolarização das colônias em estudo, lembrando que não havia comodidades no que se referia à escolarização das crianças. A maioria ia para a escola de pés descalços, enfrentava o frio, a geada, a chuva, percorria grandes distâncias a pé e outras, ainda, precisavam cumprir suas tarefas domésticas antes de irem para a escola. Afirma, ainda, que a escola foi desejada e solicitada pelos pais imigrantes. Finaliza o texto enfatizando que as crianças participaram com suas famílias de todos os processos do cotidiano, tenham sido eles alegres ou não.

O quarto e último capítulo, escrito por Carlos de Almeida Prado Bacellar, intituladoA criança e a infância nos desvãos dos acervos arquivísticos, apresenta a utilização de diferentes fontes para a pesquisa sobre a história da criança e da infância, bem como aponta possibilidades de investigações sobre o tema ainda pouco exploradas.

Entre estas possibilidades o autor propõe o estudo sobre as questões referentes ao batismo e ao óbito das crianças, que podem ser verificados pelas fontes arquivadas em cartórios e em igrejas. Segundo o texto, no Brasil, as primeiras pesquisas que se detiveram a explorar esta documentação ocorreram em 1970, nos Estados de São Paulo e do Paraná.

Por meio destes estudos foram verificados os seguintes aspectos sobre o batismo: um aumento na concepção das crianças em determinados meses do ano, uma preferência pela realização dos batizados aos domingos, os repertórios de nomes escolhidos, as questões referentes à filiação, ao abandono, a morte dos recém-nascidos e a escolha dos padrinhos. Os registros de óbito permitiram identificar as precárias condições de vida das famílias do passado e as causas da mortalidade infantil.

Os documentos de caráter censitário, que foram produzidos pelas autoridades públicas, também contribuem para a construção do universo infantil em décadas passadas. O autor cita as listas nominativas de habitantes que possibilitam análises sobre a faixa etária da população e sobre a família e o domicílio. Também salienta a importância dos processos de inventários e testamentos, as fontes em torno da atividade de recepção de imigrantes e os documentos produzidos na educação pública como possíveis análises.

Os textos contidos neste livro trazem importantes contribuições para os estudos sobre a história da infância das crianças italianas e ítalo-brasileiras, ao abordar os mais diferentes aspectos deste universo infantil permeado por momentos de alegria e de dificuldades.

A história oral, entre outros documentos utilizados na composição das pesquisas e na escrita dos textos apresentados, emociona ao evocar as memórias dos sujeitos que vivenciaram esta infância e que pelas suas lembranças nos permitem compreender sobre o que era o ser criança nas décadas passadas.

Saliento a importância deste livro para os pesquisadores que se dedicam a estudar as culturas escolares das escolas étnicas italianas, com ênfase nos sujeitos escolares e para os pesquisadores que estão em busca de novas temáticas para pesquisa, já que no último capítulo da obra são vislumbradas possibilidades de análise para pesquisas sobre a história das crianças e da infância.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Dec 2015

Histórico

  • Recebido
    01 Dez 2014
  • Aceito
    14 Jun 2015
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